Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:02119/09.3BEPRT
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:06/04/2020
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Ana Patrocínio
Descritores:IMI, FIXAÇÃO DO VALOR PATRIMONIAL TRIBUTÁRIO, 1.ª AVALIAÇÃO DE PRÉDIO, NOTIFICAÇÃO INSUFICIENTE, CONSEQUÊNCIAS NO ACTO DE LIQUIDAÇÃO SUBSEQUENTE
Sumário:I – A falta de remessa dos elementos que enformaram o acto da 1.ª avaliação, aquando da respectiva notificação ao sujeito passivo, não constitui vício que afecte a legalidade desse anterior acto, já que a notificação, enquanto comunicação desse acto, lhe é exterior e posterior.

II - Contudo, pode o interessado, nos termos do artigo 37.º, n.º 1 do CPPT, dentro de 30 dias ou dentro do prazo para reclamação, recurso ou impugnação ou outro meio judicial que desta decisão caiba, se inferior, requerer a comunicação da fundamentação integral do acto que tenha sido omitida na notificação ou a passagem de certidão que a contenha, isenta de qualquer pagamento.

III – Cabe às autoridades administrativas ou aos tribunais apreciar, com razoabilidade, se o pedido do interessado de notificação integral da fundamentação do acto é ou não meramente dilatório.

IV – Não sendo dilatório, pois existia efectivamente fundamentação do acto não comunicada com a notificação; se a Administração Tributária não passar a certidão requerida nem efectuar notificação dos requisitos omitidos, o acto notificado permanecerá ineficaz em relação ao notificado irregularmente, não decorrendo o prazo para uso do meio de impugnação administrativa, designadamente requerer segunda avaliação do prédio, ou contenciosa que pretender utilizar.

IV – Esta inoponibilidade ao interessado do acto de fixação do valor patrimonial tributário afecta a validade dos actos de liquidação que lhe sucederam, por privação do contribuinte da possibilidade de requerer segunda avaliação de forma esclarecida, impossibilitando a formação de acto tributário consequente, ou seja, do respectivo acto de liquidação de imposto municipal sobre imóveis (IMI), até que lhe seja concedido tal direito. *
* Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:P., S.A.
Recorrido 1:Autoridade Tributária e Aduaneira
Votação:Unanimidade
Decisão:Conceder provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido de dever ser negado provimento ao recurso.
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

I. Relatório

P., S.A., contribuinte n.º (...), com sede na Rua (…), (...), interpôs recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, proferida em 17/09/2019, que julgou improcedente a Impugnação Judicial deduzida contra o acto tributário de liquidação de Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI), referente aos anos de 2005 e 2006, no valor de €11.137,60, referente ao prédio registado sob o artigo n.º 3145 da matriz urbana da freguesia de (...)/(...), visando o acto de indeferimento de reclamação graciosa com o mesmo objecto.

A Recorrente terminou as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões:
“1.ª – Vai o presente recurso interposto da sentença dada em 17 de Setembro de 2019, que julgou “improcedente a presente impugnação e [absolveu] a Fazenda Pública do pedido.”
2.ª – A impugnação deduzida (fls. 2/11) foi precedida de reclamação graciosa (2.º apenso), com a finalidade de ser decidida a revogação do despacho de indeferimento daquela reclamação e anuladas as liquidações efectuadas em IMI, anos de 2005 e 2006, referentes ao prédio inscrito, à época, na matriz urbana da freguesia de (...), sob o artigo 3145, actual artigo 7120 da união de freguesias de (...) e (...).
3.ª – A reclamação graciosa que constitui o 2.º apenso, atento o seu teor, a sua tramitação, os documentos que a instruem e a(s) decisão/ões finais de que foi objecto, é, no entendimento da Impugnante/Recorrente (I/R), complemento essencial para a apreciação e o julgamento do presente recurso.
4.ª – São duas as questões trazidas a este recurso:
- o tratamento dado à reclamação graciosa que precedeu a presente impugnação, subvertendo o rito processual, de tal modo que prejudica a compreensão da sequência dos actos procedimentais praticados;
- e, fundamentalmente, a ausência de explicação da alteração do VPT do prédio aqui em causa, de 105.335,75 € para 1.113.760,00 €.
5.ª – A análise da reclamação graciosa revela um descuido inaceitável na respectiva tramitação, observável quer na forma, quer na ordem, quer no tempo em que ali se mostram praticados os vários actos procedimentais (cfr. fls. 12 a 27 dos autos).
6.ª – Semelhante actuação procedimental, inobservando as normas reguladoras da reclamação graciosa, entre outras os arts. 73.º/2 e 75.º/1 do CPPT, consubstancia ilegalidade, nos termos e para os efeitos previstos no art. 99.º do mesmo Código, admitindo-se mesmo que enquadrável na sua alínea d) Preterição de outras formalidades legais., como um dos exemplos ali enunciados de ilegalidade.
SEM CONCEDER
7.ª – Jamais à I/R foi dado a conhecer o fundamento da alteração do VPT do prédio em causa nestes autos, de 105.335,75 € para 1.113.760,00 €.
8.ª – E essa fundamentação teria de obedecer, no mínimo, aos requisitos de há muito afirmados na lei – arts. 268.º/3 da CRP; 77.º/1 da LGT e, à época, 124.º/1 e 125.º/1 e 2 (actualmente, arts. 152.º/1 e 153.º/1 e 2) do CPA.
9.ª – Nesse desconhecimento dos fundamentos da alteração referida na conclusão 10.ª, a I/R requereu a passagem de certidão donde constassem os elementos que, no seu entendimento, tinham sido omitidos.
10.ª – E fê-lo nos precisos termos do requerimento que está nos autos a fls. 15/16.
11.ª – O requerimento foi apresentado em 1 de Fevereiro de 2008 e, apesar de recebido pela I/R mais de 1 ano depois de requerido, não presta os esclarecimentos pedidos, como facilmente se constata comparando os esclarecimentos pedidos com a informação prestada.
12.ª – Acresce que a fundamentação da alteração do VPT do prédio em causa não é contextual.
13.ª – Com a evidência revelada pelos próprios autos, trata-se de uma fundamentação elaborada “a posteriori”
14.ª – e mesmo assim, insuficiente.
15.º – Nessas circunstâncias não se justificava que fosse requerida, como não foi, segunda avaliação.
16.ª – De acordo com a jurisprudência dominante dos Tribunais Superiores do Contencioso Tributário a fundamentação “a posteriori” não é, em regra, admissível
17.ª – e a fundamentação insuficiente é equivalente à falta de fundamentação.
18.ª – Requerida que foi a fundamentação integral do acto e tendo esta sido dada de modo insuficiente e “a posteriori”, tal devia ter sido levado aos factos dados por provados na sentença recorrida.
19.ª – Julgando como julgou, a sentença sob recurso não fez correcta interpretação das normas que foram sendo indicadas no desenvolvimento das presentes alegações, designadamente do art. 268.º/3 da CRP, do art. 77.º/1 da LGT, dos arts. 152.º/1 e 153.º/1 e 2 do CPA, e do art. 662.º do Código de Processo Civil.
Nestes termos e nos mais, de Direito, aplicáveis, e sempre com o douto suprimento de V. Excias., requer a revogação da sentença recorrida e a prolação de ACÓRDÃO a conceder provimento ao presente recurso, com as inerentes consequências, para que assim se cumpra a LEI e faça JUSTIÇA.”
****
A Recorrida não contra-alegou.
****
O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de dever ser negado provimento ao recurso.
****
Com dispensa dos vistos legais, tendo-se obtido a concordância dos Meritíssimos Juízes-adjuntos, nos termos do artigo 657.º, n.º 4 do CPC; cumpre apreciar e decidir.
****
II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que importa analisar se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento de facto e de direito ao decidir que o acto de indeferimento da reclamação graciosa não enferma das ilegalidades que lhe são assacadas e que a utilização do mecanismo previsto no artigo 37.º do CPPT, tendo em vista a comunicação da fundamentação do acto tributário, não tem a virtualidade de impedir a emissão das liquidações de IMI em apreço.

III. Fundamentação
1. Matéria de facto
Na sentença prolatada em primeira instância foi proferida decisão da matéria de facto com o seguinte teor:
“Com relevância para a decisão a proferir nos presentes autos, consideram-se provados os seguintes factos não enunciados supra:
1. Em 8.01.2008 o Chefe do Serviço de Finanças de (...) 4 remeteu a P., SA a ficha n.º 001918513 respeitante ao valor patrimonial tributário que foi fixado ao prédio urbano inscrito na matriz predial da freguesia de (...), sob o artigo 3145 em resultado da avaliação efectuada – cfr. fls. 15 do processo administrativo (PA) junto aos autos.
2. A P., SA foi notificada da ficha descrita em 1. em 24.01.2008.
3. Em 1.02.2008 a P., SA requereu junto do Serviço de Finanças de (...) 4 a fundamentação integral do valor patrimonial tributário do imóvel descrito em 1. – cfr. fls. 11 e 12 do processo de reclamação graciosa (RG) junto aos autos.
4. Em 3.04.2008 foi emitida a liquidação de IMI n.º 2005 467012303 do ano de 2005 no montante de €5.568,80 e respeitante do prédio descrito em 1. – cfr. fls. 14 do processo de RG junto aos autos.
5. Em 3.04.2008 foi emitida a liquidação de IMI n.º 2006 444072803 do ano de 2006 no montante de €5.568,80 e respeitante do prédio descrito em 1. – cfr. fls. 15 do processo de RG junto aos autos.
6. Das liquidações a que se alude em 4. e 5., P., SA deduziu reclamação graciosa – cfr. fls. 3 a 10 do processo de RG junto aos autos.
7. Em 27.03.2009 foi elaborada pelo Serviço de Finanças de (...) 4 proposta de decisão da reclamação graciosa – cfr. fls. 20 e 21 do processo de RG junto aos autos.
8. Sob a proposta a que se alude em 7. recaiu despacho da mesma data com o seguinte teor: “Com os elementos constantes na proposta de decisão abaixo efectuada, no uso de competência subdelegada de competências nº 28002/08 de 24 Novembro indefiro a presente reclamação” – cfr. fls. 20 do processo de RG junto aos autos.
9. O Serviço de Finanças de (...) 4 remeteu a L. Sociedade de Advogados R.L., na qualidade de mandatário da P., SA o ofício n.º 2467, respeitante a notificação para o exercício do direito de audição – cfr. fls. 22 do processo de RG junto aos autos.
10. P., SA exerceu o direito de audição – cfr. fls. 23 a 27 do processo de RG junto aos autos.
11. Em 15.07.2009 foi proferido despacho de indeferimento da reclamação graciosa descrita em 6. nos seguintes termos: “(…) em 27 de Março de 2009, foi proferido projecto de despacho no sentido do indeferimento do pedido, o qual foi notificado ao reclamante (…).
Em exercício do direito de audição, o reclamante não apresenta factos novos susceptíveis de alterarem o fundamento que levaram à proposta de indeferimento da reclamação (…) .
Nestes termos, mantenho a decisão constante do projecto de despacho, convertendo-o em definitivo, no uso de competência própria (…)
Do indeferimento do pedido, notifique-se o reclamante para, querendo, recorrer hierarquicamente da decisão (…)” – cfr. fls. 50 do processo de RG junto aos autos.
12. Em 1.06.2009 o Serviço de Finanças de (...) 4 remeteu a P., SA o ofício n.º 3828 com o seguinte teor. “(…) tendo sido remetido pelo S.F. de V.N. Gaia 2 em 31/03/2009 a este Serviço de Finanças (…) o vosso pedido de informação integral sobre a avaliação do prédio urbano artº 3145 da freguesia de (...) (…) avaliado em 2007/12/17 pelo perito Avaliador T., foi solicitado ao mesmo, em 24/04/2009 o parecer sobre os fundamentos da avaliação. (…)
Foi entregue nesta data o referido parecer técnico solicitado por V. Exª, relativamente ao artº 3145 freguesia (...) o qual se junta uma cópia em anexo tendo em vista o esclarecimento técnico pretendido (…)” – cfr. fls. 57 do processo de RG junto aos autos.
13. O ofício a que se alude em 12., foi recebido em 1.06.2009 – cfr. fls. 58 do processo de RG junto aos autos.
14. Em 16.07.2009 o Serviço de Finanças de (...) 4 remeteu a P., SA o ofício n.º 6895 respeitante ao indeferimento da reclamação graciosa descrita em 6. – cfr. fls. 32 do processo de RG junto aos autos.
15. O ofício a que se alude em 14., foi recepcionado em 23.07.2009 - fls. não numeradas do processo de RG junto aos autos.
16. P., SA procedeu ao pagamento do montante de €5.996,07 e de €5.934,46 relativamente à prestação de Junho de 2008 respeitante às liquidações de IMI n.º 2005 467012303 e n.º 2006 444072803 – cfr. fls. 16 e 17 do processo físico.
**
Factos não provados
Não se mostram provados outros factos, além dos supra referidos.
As demais asserções da douta petição constituem meras considerações pessoais e conclusões de facto e/ou direito.
**
Motivação da decisão de facto
O Tribunal considerou provada a matéria de facto relevante para a decisão da causa com base na análise crítica e conjugada dos documentos juntos aos autos, que não foram impugnados, assim como, na parte dos factos alegados pelas partes que não tendo sido impugnados [cfr. artigo 74º da Lei Geral Tributária (LGT)], também são corroborados pelos documentos juntos, cfr. predispõe o artigo 76º n.º 1 da LGT e artigo 362º e seguintes do Código Civil.”
***
2. O Direito

A Recorrente não se conforma com a sentença recorrida que julgou improcedente a impugnação por si dirigida ao acto de indeferimento proferido na reclamação graciosa em que visou as liquidações de IMI dos anos de 2005 e 2006, relativas ao prédio inscrito na matriz predial urbana da freguesia de (...), sob o artigo 3145.
Questionou aquela decisão de indeferimento invocando violação do princípio da participação, por entender que a notificação para o exercício do direito de audição, antes da obtenção da fundamentação da avaliação que solicitou ao abrigo do artigo 37.º do CPPT, a impediu de requerer a 2.ª avaliação e ilegalidade por vício de violação de lei, em primeiro lugar, porque o despacho datado de 27.03.2009 (cfr. ponto 7 dos factos provados) foi um despacho definitivo e, em segundo lugar, porque tendo as liquidações sido emitidas sem que estivessem reunidas as condições para que pudesse requerer esclarecidamente a segunda avaliação do prédio, não estando fixado definitivamente o valor patrimonial tributário, deveriam ser anuladas.
A sentença recorrida não atendeu nenhum destes fundamentos, alertando que o despacho a que acima se alude não é um despacho definitivo, enquadrando-se no processamento da reclamação graciosa que intentou e que esta não serve o propósito de requerer a 2.ª avaliação. Assim, decorridos 30 dias a partir da notificação da 1.ª avaliação, sem que tenha sido requerida a 2.ª avaliação, nada impedia a emissão das liquidações, apesar de lhe assistir o direito de, como fez, solicitar a fundamentação ao abrigo do artigo 37.º do CPPT e ver, assim, diferida a possibilidade de requerer a 2.ª avaliação até à obtenção dessa fundamentação, ou de avançar com a impugnação judicial.
Discorda a Recorrente alegando que a sentença incorreu em erro de julgamento de facto e de direito. Persiste na ilegalidade do procedimento de reclamação graciosa, dizendo que subverte o rito processual, de tal modo que prejudica a compreensão da sequência dos actos procedimentais praticados e, indica, fundamentalmente, como questão a trazer a este recurso, a ausência de explicação da alteração do valor patrimonial tributário (VPT) do prédio aqui em causa de €105.335,75 para €1.113.760,00. Acrescenta que apenas lhe foi dada a conhecer a fundamentação dessa alteração já na pendência dos autos e, mesmo assim, é insuficiente, pelo que não se justificava que fosse requerida a 2.ª avaliação, como não foi.
Como é sabido o IMI, nos termos do artigo 1.º do respectivo Código (CIMI), «incide sobre o valor patrimonial tributário dos prédios rústicos e urbanos situados no território português».
De acordo com o disposto no artigo 113.º, n.º 1, do mesmo Código, «[o] imposto é liquidado anualmente, […] com base nos valores patrimoniais tributários dos prédios e em relação aos sujeitos passivos que constem das matrizes em 31 de Dezembro do ano a que o mesmo respeita».
O pagamento do imposto é a efectuar «em duas prestações, nos meses de Abril e Setembro, desde que o seu montante seja superior a (euro) 250» (cfr. artigo 120.º, n.º 1, do CIMI), sendo que, para efeito da respectiva cobrança, dispõe o artigo 119.º do CIMI que «[o]s serviços da Direcção-Geral dos Impostos enviam a cada sujeito passivo, até ao fim do mês anterior ao do pagamento, o competente documento de cobrança» (n.º 1), sendo que, se tal documento não for recebido, o contribuinte «deve solicitar em qualquer serviço de finanças uma 2.ª via» (n.º 3).
O mesmo artigo 119.º determina, no seu n.º 1, que a nota de cobrança deve conter a «discriminação dos prédios, suas partes susceptíveis de utilização independente, respectivo valor patrimonial tributário e da colecta imputada a cada município da localização dos prédios».
A Recorrente indica, fundamentalmente, como questão a trazer a este recurso, a ausência de explicação da alteração do VPT do prédio aqui em causa de €105.335,75 para €1.113.760,00, sendo que, das normas referidas, resulta que a lei não exigiu que a fundamentação da fixação do VPT constasse da nota de cobrança a enviar ao sujeito passivo.
Compreende-se que não tenha feito essa exigência, pois, em sede de IMI, a lei prevê um procedimento de determinação da matéria tributável – a avaliação do prédio (artigo 14.º do CIMI) – que termina com o acto de fixação do VPT que serve de base à liquidação do imposto. Este acto, como é sabido, é um acto destacável para efeitos de impugnação contenciosa, pelo que é autonomamente impugnável, numa excepção ao princípio da impugnação unitária que, em regra, vigora no processo tributário (cfr. artigo 134.º do CPPT) e que se encontra «em sintonia com o preceituado no artigo 86.º, n.º 1, da LGT, em que se estabelece que os actos da avaliação directa são directamente impugnáveis» - cfr. JORGE LOPES DE SOUSA, in Código de Procedimento e de Processo Tributário, anotado e comentado, volume II, anotação 5 ao artigo 134.º, pág. 433.
Como salienta JORGE LOPES DE SOUSA, «tratando-se de actos destacáveis e inexistindo qualquer restrição relativa às ilegalidades que podem ser objecto de impugnação contenciosa, os vícios de que enferme o referido acto de avaliação apenas poderão ser arguidos em impugnação do acto de avaliação e não do acto de liquidação que seja praticado com base naquele, já que a atribuição da natureza de acto destacável tem por fim, precisamente, autonomizar os vício deste acto para efeitos de impugnação contenciosa».
O que significa, para além do mais, que o sujeito passivo do IMI deverá ser notificado da avaliação e do resultado da mesma – a fixação do VPT – antes de ser efectuada e notificada a liquidação do imposto.
Importa referir que as liquidações de IMI impugnadas nos presentes autos não respeitam à cobrança normal referida, nos termos do artigo 119.º do CIMI. Em 2006 e 2007, terá sido liquidado e cobrado o IMI relativo aos anos de 2005 e 2006 do prédio inscrito sob o n.º 3145 (como consta da notificação remetida à Recorrente). Em 17/12/2007, foi realizada a primeira avaliação, atribuído o VPT ao prédio, apurado nos termos do artigo 38.º e seguintes do CIMI, e actualizada a matriz em 10/03/2008, motivado pela primeira transmissão do prédio na vigência do IMI; sendo nessa sequência que foram efectuadas, em 03/04/2008, as liquidações impugnadas e indicado o mês de Junho de 2008 como data de cobrança do imposto desses mesmos anos de 2005 e 2006.
Estando em causa duas liquidações efectuadas fora do prazo legalmente previsto, pois que se tratavam de liquidações referentes aos anos de 2005 e 2006 levadas ao conhecimento do seu destinatário em 2008, a AT deveria ter dado a conhecer ao contribuinte todos os elementos que suportam a liquidação, nomeadamente: o valor patrimonial sobre que incide, a base legal que lhe permite sustentar a aplicação do novo valor, se foi ou não fixado em avaliação e, se sim, a data em que a mesma foi realizada e por que motivo, além de que existe ínsito no processo administrativo (fls. 17 da reclamação graciosa) um documento de cobrança do IMI referente ao ano de 2007 assente no anterior VPT - €105.335,75, o que pode suscitar dúvida quanto à compreensão da alteração e da origem dos novos valores entretanto tributados.
Contudo, a indicação da questão, autonomizada neste recurso, assente na ausência de explicação da alteração do valor patrimonial tributário (VPT) do prédio aqui em causa de €105.335,75 para €1.113.760,00, poderá entender-se que se afasta um pouco das questões suscitadas na petição inicial e que foram julgadas na primeira instância.
Vejamos na sentença recorrida a decisão quanto à invocação de não estar definitivamente fixado o VPT antes da emissão das liquidações impugnadas:
«(…) Alega também a Impugnante que em sede de reclamação graciosa deveriam ter sido anuladas as liquidações uma vez que não estava ainda fixado definitivamente o valor patrimonial do imóvel.
Vejamos.
Nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 76.º do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI) “Quando o sujeito passivo ou o chefe de finanças não concordarem com o resultado da avaliação directa de prédios urbanos, podem, respectivamente, requerer ou promover uma segunda avaliação, no prazo de 30 dias contados da data em que o primeiro tenha sido notificado”
Acresce que, como resulta do n.º 1 do artigo 118.º do CIMI “Enquanto não tiver decorrido o prazo de 30 dias contados a partir da notificação da primeira avaliação ou não se tornar definitivo o resultado da segunda avaliação, quando requerida, fica suspensa a liquidação do imposto, salvo se for apresentada impugnação judicial, que não tem efeito suspensivo”
Por outro lado, o n.º 1 do artigo 37.º do CPT determina que “Se a comunicação da decisão em matéria tributária não contiver a fundamentação legalmente exigida, a indicação dos meios de reacção contra o acto notificado ou outros requisitos exigidos pelas leis tributárias, pode o interessado, dentro de 30 dias ou dentro do prazo para reclamação, recurso ou impugnação ou outro meio judicial que desta decisão caiba, se inferior, requerer a notificação dos requisitos que tenham sido omitidos ou a passagem de certidão que os contenha, isenta de qualquer pagamento”, estabelecendo ainda o seu n.º 2 que “se o interessado usar da faculdade concedida no número anterior, o prazo para a reclamação, recurso, impugnação ou outro meio judicial conta-se a partir da notificação ou da entrega da certidão que tenha sido requerida”.
“Do resultado das segundas avaliações cabe impugnação judicial, nos termos definidos no Código de Procedimento e de Processo Tributário” - n.º 1 do artigo 77.º do CIMI.
Retornando ao caso dos autos e como resulta da factualidade assente, pontos 1. a 3., a Impugnante após ter sido notificada da 1ª avaliação realizada ao prédio urbano inscrito na matriz predial da freguesia de (...), sob o artigo 3145, requereu em 24.01.2008 ao abrigo do disposto no artigo 37.º do CPPT e junto do Serviço de Finanças de (...) 4 a fundamentação integral do valor patrimonial tributário fixado.
Tal fundamentação haveria de ser notificada à Impugnante por meio do ofício n.º 3828 em 1.06.2009 (cfr. ponto 12. da factualidade assente).
No entanto, previamente a essa notificação, a Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) emitiu em 3.04.2008 as liquidações de IMI controvertidas (cfr. pontos 3. e 4 do probatório)
Ora, como decorre do normativo supra mencionado (artigo 118.º n.º 1 do CIMI), a liquidação do imposto somente fica suspensa enquanto não tiver decorrido o prazo de 30 dias contados a partir da notificação da primeira avaliação ou enquanto não se tornar definitivo o resultado da segunda avaliação, quando requerida.
No caso presente não resulta dos autos que tenha ocorrido qualquer uma daquelas condições para que as impugnações tivessem que ter ficado suspensas.
Nessa medida e decorridos os 30 dias após a notificação à Impugnante do resultado da avaliação, que ocorreu em 24.01.2008, a AT emitiu 3.04.2008 as liquidações devidas (cfr. pontos 1., 2., 4. e 5. do probatório).
Apesar de assistir à Impugnante o direito de ao abrigo do disposto no artigo 37.º do CPPT requerer a fundamentação do acto tributário, tal actuação não tem a virtualidade de impedir a emissão das liquidações.
A Impugnante, após a notificação da fundamentação requerida, tinha ao seu dispor prazo para querendo efectuar o pedido de 2ª avaliação e/ou deduzir impugnação, como resulta claro do disposto no n.º 2 do artigo 37.º do CPPT, não lhe tendo sido coarctado nenhum direito com a emissão das liquidações impugnadas.
Pelo exposto, improcede o alegado quanto ao vício de violação de lei respeita. (…)»
Assim, a pedra de toque da análise do presente recurso reside em dilucidar as consequências do pedido de comunicação da fundamentação integral do acto de fixação do valor patrimonial tributário, nomeadamente, nos actos de liquidação impugnados subsequentes.
Como já referimos, o VPT deve sempre ser notificado ao sujeito passivo do IMI antes da liquidação do imposto. Aliás, a LGT faz depender a eficácia da decisão do procedimento da sua notificação (cfr. artigo 77.º, n.º 6), exigência reafirmada pelo n.º 1 do artigo 36.º do CPPT, que dispõe: «os actos em matéria tributária que afectem os direitos e interesses legítimos dos contribuintes só produzem efeitos em relação a estes quando lhes sejam validamente notificados».
Ora, conforme emana dos pontos 1 e 2 do probatório, a Recorrente foi notificada, em 24/01/2008, da fixação do VPT, mas, considerando os seus termos não totalmente compreensíveis e tendo em vista conhecer todos os motivos de facto e de direito (a fundamentação) por que o VPT foi fixado no montante de €1.113.760,00, em 01/02/2008, a Recorrente requereu junto do Serviço de Finanças de (...) 4 a fundamentação integral do valor patrimonial tributário do imóvel descrito no ponto 1. do probatório.
Nesta conformidade, a Recorrente, em 01/02/2008, fez uso do mecanismo previsto no n.º 1 do artigo 37.º do CPPT, que, sob a epígrafe “Comunicação ou notificação insuficiente”, estabelece o seguinte: «Se a comunicação da decisão em matéria tributária não contiver a fundamentação legalmente exigida, indicação dos meios de reacção contra o acto notificado ou outros requisitos exigidos pelas leis tributárias, pode o interessado, dentro de 30 dias ou dentro do prazo para reclamação, recurso ou impugnação ou outro meio judicial que desta decisão caiba, se inferior, requerer a notificação dos requisitos que tenham sido omitidos ou a passagem de certidão que os contenha, isenta de qualquer pagamento».
Comentando o preceito, JORGE LOPES DE SOUSA, in Código de Procedimento e de Processo Tributário, anotado e comentado, Volume I, 6.ª edição, 2011, pág. 349, nota 3 a), afirma: «Este art. 37.º só tem a ver com a notificação dos actos, destinando-se a estabelecer as consequências das deficiências das notificações e não o regime dos vícios dos actos notificados. No âmbito do art. 37.º a Administração apenas pode suprir as deficiências da notificação, mas não as do acto notificado».
Dito de outra forma: uma coisa são as irregularidades ou vícios próprios do acto notificado que o contribuinte tem o direito de impugnar, outra são as irregularidades da notificação relativas a um acto que contém os elementos exigidos por lei, mas eles não foram enviados na respectiva notificação. Neste caso, só neste caso, impõe-se o recurso ao disposto no artigo 37.º do CPPT sob pena de o contribuinte perder o direito a ser notificado dos elementos que existem, mas não lhe foram comunicados – cfr. Acórdão do TCA Sul, de 25/01/2018, proferido no âmbito do processo n.º 01205/11.4BELRS.
Antes de mais, afigura-se útil relembrar a sequência cronológica subjacente aos factos: a Recorrente foi notificada do VPT fixado ao prédio e, tempestivamente, requereu a sua fundamentação integral ao abrigo do artigo 37.º do CPPT. Não tendo requerido a 2.ª avaliação no prazo de 30 dias, pois aguardava a disponibilização da fundamentação em falta (para apreciar se existiam motivos para solicitar essa 2.ª avaliação), foram emitidas as liquidações. Somente na pendência da reclamação graciosa apresentada contra estas liquidações de IMI veio a obter a fundamentação requerida. Entretanto, foi a reclamação graciosa indeferida.
Como vimos, a sentença recorrida decidiu nada impedir que, ao abrigo do artigo 76.º do CIMI, a Recorrente requeresse a 2.ª avaliação, no prazo de 30 dias a contar da notificação efectuada em 24/01/2008.
Porém, pressupunha-se que tivesse sido realizada uma notificação válida, sem preterição de quaisquer formalidades legais, para que a mesma fosse eficaz.
Efectivamente, em face do artigo 268.º, n.º 3 da Constituição da República Portuguesa (CRP), que estabelece a obrigatoriedade de os actos que afectem direitos ou interesses legalmente protegidos dos cidadãos serem fundamentados e a sujeição dos actos administrativos a notificação dos interessados, parece que a eficácia deste tipo de actos, como o em apreço, está dependente da sua notificação com a respectiva fundamentação e, sem tal notificação integral do acto, a notificação não será válida e, consequentemente, não será eficaz em relação ao notificado – cfr. artigos 77.º, n.º 6 da LGT e 36.º, n.º 1 do CPPT.
Não podemos deixar de alertar para a hipótese de o mecanismo previsto no artigo 37.º do CPPT poder ser abusivamente utilizado como expediente dilatório da imediata eficácia dos actos com a notificação dos mesmos. Suspeitando-se dessa possibilidade, caberá às autoridades administrativas ou aos tribunais (conforme os casos) apreciar com razoabilidade se o pedido do interessado de notificação integral da fundamentação do acto é ou não meramente dilatório.
O critério correcto, em termos de razoabilidade, não poderá deixar de ser o de não considerar dilatório o pedido de notificação da fundamentação, sempre que não for manifesto, na perspectiva do destinatário, que foi efectuada a notificação integral do acto – cfr. JORGE LOPES DE SOUSA, in Código de Procedimento e de Processo Tributário, anotado e comentado, 4.ª edição, 2003, pág. 217.
In casu, não existem indícios que o pedido, nos termos do artigo 37.º do CPPT, tenha tido subjacente apenas uma intenção dilatória, já que a notificação enviada consubstancia somente a ficha da 1.ª avaliação do prédio, sem explicações acerca de como foram obtidos alguns valores, e, sensivelmente um ano após, a AT acabou por satisfazer o solicitado, remetendo à Recorrente o parecer técnico sobre os fundamentos em que se baseou a avaliação, ou seja, a (suposta) fundamentação integral do acto.
Se a Administração Tributária não passar a certidão requerida nem efectuar notificação dos requisitos omitidos, o acto notificado permanecerá ineficaz em relação ao notificado irregularmente, não decorrendo o prazo para uso do meio de impugnação administrativa ou contenciosa que pretender utilizar - – cfr. JORGE LOPES DE SOUSA, in Código de Procedimento e de Processo Tributário, anotado e comentado, 4.ª edição, 2003, pág. 218.
Lembramos que aquando da emissão das liquidações de IMI em crise ou da sua notificação ainda nenhuma certidão ou comunicação com a fundamentação em falta da fixação do VPT havia sido entregue à Recorrente, pelo que a acto notificado em 24/01/2008 era ineficaz.
As formalidades legais em matéria tributária assumem uma relevância fundamental por terem sido os modos que o legislador elegeu para, neste caso, levar ao conhecimento dos contribuintes os actos de natureza tributária que afectam, ou podem afectar os seus direitos. Não são apenas o veículo que dá a conhecer ao contribuinte o acto tributário, mas são também o modo como a Administração Tributária se apresenta a cumprir o seu dever de actuação em conformidade estrita com a lei, sem margem para qualquer critério de oportunidade ou de gestão de meios.
Como se referiu no Acórdão do STA, de 13/12/2017, proferido no âmbito do processo n.º 0679/17, remetendo para jurisprudência do Tribunal Constitucional, as formalidades relativas a notificações de actos tributários ou de actos em matéria tributária que afectem ou possam afectar os direitos e interesses dos contribuintes com protecção legal existem para garantia de que se mostra respeitado o princípio constitucional da segurança inerente ao Estado de Direito, de que, aos destinatários dos actos da Administração, será dado conhecimento de todos os elementos que integrem o acto tributário, ou o acto em matéria tributária, e o princípio da tutela jurisdicional efectiva que sairia esvaziado se o contribuinte não conhecesse todos os elementos que lhe permitam a defesa judicial dos seus direitos.
A notificação insuficiente, com omissão da fundamentação integral do acto de fixação do VPT, não pode produzir efeitos, designadamente para pedir a 2.ª avaliação do prédio, dado que a Recorrente não estava, ainda, na posse de todos os elementos que lhe permitissem, de forma esclarecida, decidir se concordava ou discordava da avaliação realizada. Tal preterição de formalidade legal essencial afecta a validade dos actos de liquidação que lhe sucederam, por privação do contribuinte da possibilidade de requerer segunda avaliação, impossibilitando a formação de acto tributário consequente até que lhe seja concedido tal direito.
Conclui-se, assim, que a notificação referida nos pontos 1 e 2 do probatório se mostra incompleta e insuficiente. Em tal caso, aquela decisão de fixação da matéria tributável, do VPT, efectuada ao abrigo do disposto nos artigos 38.º e seguintes do CIMI, como decisão procedimental em procedimento autónomo, carece de eficácia por falta validade da notificação ao interessado – cfr. n.º 4 e 6, do artigo 77.º da LGT e n.º 1, do artigo 36.º do CPPT.
Reiteramos, nestes termos, as consequências jurídicas sobre a validade dos actos subsequentes de liquidação do IMI - sendo a decisão de fixação do VPT ineficaz perante o interessado, não seria possível proceder à prática do acto subsequente. Não sendo a notificação efectuada em 24/01/2008, sem a fundamentação integral do acto, oponível à Recorrente, os actos de liquidação consequentes padecem de ilegalidade, em resultado da ineficácia do acto verificada naquele procedimento de fixação do VPT.
Nesta conformidade, a reclamação graciosa apresentada contra as liquidações de IMI, relativas aos anos de 2005 e 2006, devia ter sido deferida, impondo-se a eliminação da ordem jurídica desse acto de indeferimento e, consequentemente, serão, também, anulados os mencionados actos de liquidação, com a restituição do imposto comprovadamente pago – cfr. ponto 16 da decisão da matéria de facto.
Pelo exposto, sendo de conceder provimento ao recurso e revogar a sentença recorrida, fica prejudicado o conhecimento das restantes questões colocadas no mesmo, designadamente as respeitantes ao “rito processual” da reclamação graciosa.
Todavia, a impugnante, na sua petição inicial, havia, igualmente, solicitado a condenação da AT ao pagamento dos juros indemnizatórios que forem devidos.
O direito a juros indemnizatórios previsto no n.º 1 do artigo 43.º da LGT, derivado de anulação de um acto de liquidação, depende de ter ficado demonstrado no processo que esse acto está afectado por erro - sobre os pressupostos de facto ou de direito - imputável aos serviços, de que tenha resultado pagamento de dívida tributária em montante superior ao legalmente devido; se a anulação de um acto de liquidação for baseada unicamente em vício formal [de falta de fundamentação] tal não implica a existência de erro de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido, pelo que inexiste, nesse caso, direito a juros indemnizatórios – cfr. Acórdão do Pleno do STA da Secção de Contencioso Tributário, de 28/11/2018, proferido no âmbito do processo n.º 087/18.0BALSB.
Ora, como os actos de liquidação de IMI em apreço não podiam ter sido praticados no momento temporal em que efectivamente foram, os mesmos estão afectados por erro - sobre os pressupostos de facto e de direito - imputável aos serviços (violação de lei). Demostrando o ponto 16 do probatório que foi pago imposto em excesso, haverá lugar à inerente restituição do imposto já pago e a condenação da Administração Fiscal ao pagamento dos juros indemnizatórios que forem devidos, nos termos dos artigos 43.º, n.º 1 da LGT e 61.º, n.º 3 do CPPT.

Conclusões/Sumário

I – A falta de remessa dos elementos que enformaram o acto da 1.ª avaliação, aquando da respectiva notificação ao sujeito passivo, não constitui vício que afecte a legalidade desse anterior acto, já que a notificação, enquanto comunicação desse acto, lhe é exterior e posterior.
II - Contudo, pode o interessado, nos termos do artigo 37.º, n.º 1 do CPPT, dentro de 30 dias ou dentro do prazo para reclamação, recurso ou impugnação ou outro meio judicial que desta decisão caiba, se inferior, requerer a comunicação da fundamentação integral do acto que tenha sido omitida na notificação ou a passagem de certidão que a contenha, isenta de qualquer pagamento.
III – Cabe às autoridades administrativas ou aos tribunais apreciar, com razoabilidade, se o pedido do interessado de notificação integral da fundamentação do acto é ou não meramente dilatório.
IV – Não sendo dilatório, pois existia efectivamente fundamentação do acto não comunicada com a notificação; se a Administração Tributária não passar a certidão requerida nem efectuar notificação dos requisitos omitidos, o acto notificado permanecerá ineficaz em relação ao notificado irregularmente, não decorrendo o prazo para uso do meio de impugnação administrativa, designadamente requerer segunda avaliação do prédio, ou contenciosa que pretender utilizar.
IV – Esta inoponibilidade ao interessado do acto de fixação do valor patrimonial tributário afecta a validade dos actos de liquidação que lhe sucederam, por privação do contribuinte da possibilidade de requerer segunda avaliação de forma esclarecida, impossibilitando a formação de acto tributário consequente, ou seja, do respectivo acto de liquidação de imposto municipal sobre imóveis (IMI), até que lhe seja concedido tal direito.

IV. Decisão

Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte, em conceder provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida e julgar a impugnação judicial procedente, anulando os actos impugnados de indeferimento da reclamação graciosa e de liquidação de IMI, referentes aos anos de 2005 e 2006, emitidos em 03/04/2008, com as legais consequências.

Custas a cargo da Recorrida em ambas as instâncias; nesta instância, as custas não incluem a taxa de justiça, uma vez que não contra-alegou.

Porto, 04 de Junho de 2020


Ana Patrocínio
Cristina Travassos Bento
Paulo Ferreira de Magalhães