Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00799/14.7BEPRT
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:10/16/2014
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Cristina Flora
Descritores:RECLAMAÇÃO
VALOR ACTUALIZADO DE VENDA
ART. 250.º DO CPPT
Sumário:I. O erro de julgamento de facto ocorre quando se conclua, da confrontação entre os meios de prova produzidos e os factos dados por provados ou não provados, que o juízo feito está em desconformidade com a prova produzida, independentemente da convicção pessoal do juiz acerca de cada facto;
II. O apuramento do valor base dos bens para venda em execução fiscal encontra-se regulado no art. 250.º do CPPT, e deste modo, não há lugar à aplicação supletiva do art. 812.º do CPC.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:Autoridade Tributária e Aduaneira
Recorrido 1:M...
Decisão:Concedido provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

I. RELATÓRIO

A FAZENDA PÚBLICA vem recorrer da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) do Porto, que julgou procedente a reclamação do acto de execução fiscal que ordenou o prosseguimento da execução e consequente venda, por leilão electrónico do prédio misto pertencente à executada M….

A Recorrente Fazenda Pública apresentou as suas alegações, e formulou as seguintes conclusões:

A. Vem o presente recurso interposto da Douta Sentença que julgou procedente a reclamação de actos do órgão de execução fiscal interposta, nos termos do disposto no art. 276º do CPPT, do despacho proferido pelo chefe de finanças do Porto 2 (OEF), no âmbito do processo de execução fiscal (PEF) n.º 3182201001017403 e apensos, que ali corre termos e, que indeferiu o pedido de sustação da execução fiscal e anulação da venda designada para o dia 08.04.2014, na modalidade de leilão electrónico, do prédio misto inscrito na matriz predial da freguesia de G..., concelho de Vila do Conde, sob os artigos U-...e R-....

B. Com interesse para a presente acção, a reclamante alicerça a sua pretensão com os seguintes argumentos:

a. o imóvel encontra-se onerado com hipoteca a favor da Caixa de Crédito Agrícola, pelo que, o resultado da venda beneficiaria exclusivamente o credor hipotecário;

b. o valor base para venda do imóvel é muito inferior ao seu valor real e de mercado.
C. Perante a factualidade dada como assente, concluiu o Tribunal a quo pela procedência da reclamação, decretando a ilegalidade do despacho reclamado, uma vez que, a determinação do valor base para venda do prédio rústico se fundamentar numa avaliação desactualizada.

Ora,
D. Ressalvado o devido respeito com o que desta forma foi decidido, não se conforma a Fazenda Pública, sendo outro o seu entendimento, já que considera que a Douta Sentença sob recurso padece de erro de julgamento de facto e de direito, como a seguir se argumentará e concluirá.

Desde logo,
E. considera a Fazenda Pública existir erro de julgamento, dado que da prova produzida não se podem extrair as conclusões em que se alicerça a decisão proferida, porquanto, de molde a subsumir a situação real respigada dos autos à boa decisão da causa, o Probatório deverá ser corrigido de acordo com a verdade factual, ao abrigo do disposto no nº 1 do art. 662º do CPC,

F. pois, não se concorda com a convicção do Tribunal, no que tange à factualidade dada como assente e constante do ponto 7, uma vez que, conforme consta do probatório – edital e “print” da publicação da venda electrónica a fls. 45 e 46 dos presentes autos de reclamação, o valor base do prédio rústico em causa, para efeitos de marcação de venda foi actualizado, conforme disposto na alínea b) do nº 1 do art. 250º do CPPT, para €165 691,34, daí resultando o valor base total para venda de € 258 391,94 [(€203 440,00 + 165 691,34) x 70% (nº 4 do art. 250º do CPPT)], que, de outra forma, seria impossível alcançar.

G. Fica assim cabalmente demonstrado, em contradição com os factos provados, que o valor atribuído ao prédio misto objecto de venda encontrava-se, à data da marcação da venda, devidamente actualizado, segundo as normas legais em vigor [art.s 17º a 46º do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI)] e, em conformidade com o disposto nas alíneas a) e b) do nº 1 do art. 250º do CPPT.

Por outro lado,
H. também não se concorda com a Douta Sentença na aplicação do disposto no art. 812º do CPC para sustentar a decisão quanto à determinação do valor base de venda dos imóveis.

Efectivamente,
I. Dispõe a alínea e) do art. 2º do CPPT, que o Código de Processo Civil é “de aplicação supletiva ao procedimento e processo judicial tributário, de acordo com a natureza dos casos omissos”, ou seja, as normas do CPC só serão aplicáveis quando exista falta de regulamentação no CPPT e nos diplomas a que se refere o seu art. 1º.

J. Ora, a norma do CPC invocada na Douta Sentença, regula a venda no processo de execução, matéria que se encontra especialmente prevista na legislação fiscal – cfr. secção IX (da venda de bens penhorados) do CPPT, nos artigos 248º a 258º, onde se define todo o regime da venda dos bens penhorados, nomeadamente a forma de determinação do valor base dos bens para efeitos de marcação de venda e prevista no art. 250º do CPPT.

K. Assim, falecendo o requisito da omissão previsto no art. 2º do CPPT, salvo o devido respeito por melhor opinião, as normas do CPC relativas à determinação do valor base de venda dos imóveis (art. 812º), não são subsidiariamente aplicáveis ao processo de execução fiscal.

L. Padece assim a Douta Sentença sob recurso de erro de julgamento de facto e de direito, porquanto fez errónea interpretação dos factos e aplicação do disposto nas normas legais aplicáveis in casu, art. 250º do CPPT.

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A Recorrida, não apresentou contra-alegações.
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Foram os autos a vista do Magistrado do Ministério Público que emitiu parecer no sentido de que o recurso merece provimento.
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Sem vistos, atenta a natureza urgente do processo (cfr. art. 278.º, n.º 5, do CPPT e art.657.º, n.º 4, do CPC), vêm os autos à conferência para decisão.
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As questões a apreciar e decidir são as seguintes:

_ Aferir se a sentença enferma de erro de julgamento de facto relativamente à matéria vertida do ponto 7, porquanto o valor atribuído ao prédio se encontrava actualizado à data da marcação da venda, em conformidade com o disposto nas alíneas a) e b) do n.º 1 do art. 250.º do CPPT, e arts. 17.º a 46.º do CIMI (conclusões E), F) e G));
_ Determinar se é ou não aplicável o disposto no art. 812.º do CPC, como se entendeu na sentença recorrida (conclusões H) a L)).

II. FUNDAMENTAÇÃO

1. Matéria de facto

A decisão recorrida deu como provada a seguinte matéria de facto:

“1. Em 08.04.2010, o Serviço de Finanças do Porto, 2 instaurou o Processo de Execução Fiscal 3182201001017403 contra a Reclamante, M…, onde se visava a cobrança coerciva de dívidas de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares do ano de 2007, e respectivos juros – cfr. Certidões de dívida constantes de fls. 231 e seguintes dos autos;
2. No âmbito do Processo de Execução Fiscal id. em 1., em 18.10.2013 foi realizada penhora incidindo sobre o bem imóvel, prédio misto, inscrito na respectiva matriz sob os artigos U-...e R-..., freguesia de G..., concelho de Vila do Conde e descrito na Conservatória do Registo Predial de Vila do Conde sob o n.º749/20000228 – cfr. Certidão do Registo Predial de Vila do Conde constante de fls. 254 e seguintes dos autos;
3. Esta penhora – id. em 2. – foi levada a registo pela Apresentação 3535 da mesma data, garantindo a quantia exequenda de €111 424, 48 – cfr. Certidão do registo predial de Vila do Conde constante de fls. 254 e seguintes dos autos;
4. Sobre este bem imóvel – descrito em 2. – incide uma hipoteca voluntária, registada pela Ap. 41 de 10.07.2001, a favor da caixa de Crédito Agrícola Mútuo, CRL, sendo o montante máximo assegurado de 310 079 000$00 (€1 546 667, 53) – Cfr. Certidão do registo predial de Vila do Conde constante de fls. 254 e seguintes dos autos;
5. Ainda sobre este bem incide uma penhora, registada pela Ap. 1982 de 03.09.2009, em favor da Caixa de Crédito Agrícola Mútuo, CRL, sendo o montante máximo assegurado de €1 119 809, 33, determinada no âmbito do processo de execução n.º 1976/09.8TBVCD do Tribunal Judicial da comarca de Vila do Conde – cfr. Certidão do registo predial de Vila do Conde constante de fls. 254 e seguintes dos autos;
6. O prédio urbano, artigo 25 da freguesia de G..., encontra-se inscrito na respectiva matriz desde 1937 sendo o seu valor patrimonial actual (para efeitos de Imposto Municipal sobre Imóveis) de €203 440 e foi determinado no ano de 2011 – cfr. certidão de teor constante de fls. 259 dos autos para o qual se remete e cujo teor se dá por inteiramente reproduzido para todos os efeitos legais;
7. O prédio rústico, artigo 1… da freguesia de G..., encontra-se inscrito na respectiva matriz desde 1975 sendo o seu valor patrimonial actual de €8 910, 42 e foi determinado no ano de 1989 – cfr. certidão de teor constante de fls. 260 dos autos para a qual se remete e cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais;
8. Em 15 de Janeiro de 2014, no Serviço de Finanças do Porto, 2 no âmbito do Processo de Execução Fiscal 3182201001017403 e apensos, foi lavrado despacho determinando a venda do imóvel penhorado nos autos, na modalidade de leilão electrónico, designando para o seu termo o dia 08.04.2014 e fixando o valor base para a venda em €258 391, 94 – cfr. Despacho constante de fls. 264 dos autos e Edital constante de fls. 266 documentos para os quais se remete e cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais;
9. Em 20.01.2014 a Executada foi notificada da venda Judicial agendada que se encontra identificada em 8. – cfr. notificação de fls. 269 (frente e verso) dos autos para a qual se remete e cujo teor se dá por integralmente reproduzido para os efeitos legais;
10. Em 31.01.2014 a Executada dirigiu ao Serviço de Finanças do Porto 2 um requerimento onde, considerando que, sobre o imóvel cuja venda foi determinada incidem outros ónus, se pretende que a venda agendada seja dada sem efeito – cfr. requerimento de fls.13 e 14 dos autos para o qual se remete e cujo teor se dá por inteiramente reproduzido para todos os efeitos legais;
11. Este requerimento veio a ser indeferido com a seguinte fundamentação: “(…)quanto á sustação da presente execução em virtude de já existir uma penhora anterior e também ao facto de estar a decorrer uma venda para o mesmo imóvel no âmbito de um processo do tribunal e não havendo informação de que o bem foi efectivamente vendido, teve este serviço em conta o disposto no n.º3 do art. 218º do Código de Procedimento e Processo Tributário, (…) não havendo necessidade de ser aplicada legislação subsidiária. No que diz respeito ao valor dos créditos não cabe ao Órgão de Execução Fiscal pronunciar-se sobre a suspensão da venda com base na diferença de valores entre o créditos reclamado pelos credores e o da dívida exequenda e acrescidos (…) a venda foi marcada após o termos do prazo de reclamação de créditos. Quanto á prescrição dos processos executivos, verifica-se que a mesma não ocorreu (…) ” – cfr. parecer e decisão do Órgão de Execução Fiscal constante de fls. 17 e seguintes dos autos para o que se remete e cujo teor se dá por inteiramente reproduzido para os efeitos legais;
12. Em 12.03.2014 a Executada foi notificada do despacho identificado em 11 – cfr. fls. 290 (frente e verso) dos autos;
13. Em 24.03.2014 deu entrada no Serviço de Finanças do Porto – 2 a presente Reclamação de Acto do Órgão de Execução Fiscal – cfr. informação elaborada pelo Órgão de Execução Fiscal a fls. 7 e seguintes dos autos.
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Inexistem quaisquer outros factos provados ou não provados com relevância para a decisão da causa.
A convicção do Tribunal formou-se com base em todos os documentos juntos aos autos, uma vez que todos estes dali resultam com toda a clareza e bem ainda atenta a credibilidade que encerram.”
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Ao abrigo do preceituado no artigo 662.º do CPC, acorda-se em alterar o número 7) da matéria de facto, e aditar um número 14, nos termos que se seguem:

7. O prédio rústico, artigo 1… da freguesia de G..., encontra-se inscrito na respectiva matriz desde 1975, sendo o seu valor patrimonial fixado no ano de 1989 de €8 910,42 (cfr. certidão de teor constante de fls. 260 dos autos e documentos de fls. 261, 265 e 266, todos dos autos).
14. Em 15/01/2014, no âmbito do processo de execução fiscal, foi actualizado o valor patrimonial do prédio rústico referido na alínea anterior, para o montante de 165.691,34€, ao abrigo do art. 250.º, n.º 1 do CPPT e da Portaria n.º 1337/2003 (cfr. documentos de fls. 261, 265 e 266 dos autos).

2. Do Direito

Conforme resulta dos autos, a sentença recorrida julgou procedente a reclamação do acto de execução fiscal que ordenou o prosseguimento da execução e consequente venda, por leilão electrónico do prédio misto da reclamada, entendo, em síntese, que não foi respeitada a formalidade prevista no art. 812.º do CPC, porquanto a avaliação do prédio rústico foi efectuada em 1989, ou seja, para lá dos 6 anos previsto naquele normativo.

Invoca a Recorrente, desde logo, que a sentença enferma de erro de julgamento de facto relativamente à matéria vertida do ponto 7, porquanto o valor atribuído ao prédio se encontrava à data da marcação da venda actualizado em conformidade com o disposto nas alíneas a) e b) do n.º 1 do art. 250.º do CPPT, e arts. 17.º a 46.º do CIMI (conclusões E), F) e G)).

O erro de julgamento de facto ocorre quando se conclua, da confrontação entre os meios de prova produzidos e os factos dados por provados ou não provados, que o juízo feito está em desconformidade com a prova produzida, independentemente da convicção pessoal do juiz acerca de cada facto.

Conforme resulta da matéria de facto, a sentença recorrida deu como provado no ponto 7 o seguinte facto: “7. O prédio rústico, artigo 1… da freguesia de G..., encontra-se inscrito na respectiva matriz desde 1975 sendo o seu valor patrimonial actual de €8 910, 42 e foi determinado no ano de 1989 – cfr. certidão de teor constante de fls. 260 dos autos para a qual se remete e cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais;”.

Na conclusão G) das suas alegações de recurso a Recorrente sindica o erro de julgamento de facto do seguinte modo: “não se concorda com a convicção do Tribunal, no que tange à factualidade dada como assente e constante do ponto 7, uma vez que, conforme consta do probatório – edital e “print” da publicação da venda electrónica a fls. 45 e 46 dos presentes autos de reclamação, o valor base do prédio rústico em causa, para efeitos de marcação de venda foi actualizado, conforme disposto na alínea b) do nº 1 do art. 250º do CPPT, para €165 691,34, daí resultando o valor base total para venda de € 258 391,94 [(€203 440,00 + 165 691,34) x 70% (nº 4 do art. 250º do CPPT)], que, de outra forma, seria impossível alcançar.”.

Da análise dos documentos de fls. 261, 265 e 266 dos autos resulta que o valor patrimonial do prédio rústico ora em causa foi actualizado, em 15/01/2014, para 165.691,34€, ou seja, em data anterior à publicação do anúncio de venda e do edital de venda e convocação de credores. Essa actualização teve por fundamento o disposto no art. 250.º, n.º 1 do CPPT e a Portaria n.º 1337/2003, tal como resulta daqueles documentos.

É certo que em 1989 foi fixado o valor patrimonial de 8.910,42€, mas não foi esse o valor que serviu de base à venda, mas o valor actualizado (165.691,34€) determinado em 15/01/2014, para esse mesmo efeito.

Por conseguinte, o facto dado como provado no ponto 7) não está em conformidade com os documentos junto aos autos, pois havia que dar como provado apenas que aquele era o valor patrimonial que foi fixado no ano de 1989, e não o actual, posto que, posteriormente, verifica-se uma determinação daquele valor patrimonial ao abrigo do disposto no art. 250.º do CPPT.

Nestes termos, e ao abrigo do art. 662.º do CPC, alteramos a matéria de facto dada como provada: “7. O prédio rústico, artigo 1… da freguesia de G..., encontra-se inscrito na respectiva matriz desde 1975, sendo o seu valor patrimonial fixado no ano de 1989 de €8 910,42 – cfr. certidão de teor constante de fls. 260 dos autos e documentos de fls. 261, 265 e 266, todos dos autos).”

Impunha-se, ainda, aditar um facto (n.º 14) à matéria dada como provada, referente à actualização do valor patrimonial do prédio rústico, que foi efectuada nos termos do art. 250.º do CPPT: “14. Em 15/01/2014, no âmbito do processo de execução fiscal, foi actualizado o valor patrimonial do prédio rústico referido na alínea anterior, para o montante de 165.691,34€, ao abrigo do art. 250.º, n.º 1 do CPPT e da Portaria n.º 1337/2003 (cfr. documentos de fls. 261, 265 e 266 dos autos)”.

Alterada a matéria de facto, conforme supra exposto, então, assiste razão à Fazenda Pública quanto ao invocado erro de julgamento da matéria de facto, pois a sentença recorrida assentou no entendimento de que a avaliação do imóvel datava de 1989, e concluiu, erroneamente, que o imóvel não era avaliado há mais de 6 anos, tendo julgado procedente a reclamação com fundamento no disposto no art. 812.º do CPC.

Da factualidade alterada e aditada resulta manifestamente, por um lado, que o valor patrimonial do prédio, à data da venda, foi actualizado, e por outro lado, que no valor de venda publicitado foi considerada a actualização do valor do prédio rústico.

Na verdade, considerando que o valor do prédio urbano é de 293.440,00€ (n.º 6 dos factos provados) somado ao valor actualizado do prédio rústico (165.691,34€) e considerando apenas 70% desse valor, como estatui o n.º 4 do art. 250.º do CPPT, então, apuramos o montante de 258.391,94€ que corresponde ao valor base de venda foi fixado (cfr. n.º 8 dos factos provados), pelo que resulta inequívoco que foi considerado o valor actualizado do prédio rústico, apurado nos termos e para efeitos do art. 250.º do CPPT.

Acresce que, in casu, não é aplicável o disposto no art. 812.º do CPC, como entendeu a sentença recorrida, pois não estarmos perante um caso de omissão de regulamentação no CPPT.

O apuramento do valor base dos bens para venda em execução fiscal encontra-se regulado no art. 250.º do CPPT, e deste modo, não se justifica a aplicação supletiva do Código de Processo Civil, tal como invoca a Fazenda Pública nas conclusões de recurso (conclusões H) a L)).

O art. 2.º alínea e) do CPPT dispõe que o Código de Processo Civil é “de aplicação supletiva ao procedimento e processo judicial tributário, de acordo com a natureza dos casos omissos”. O que significa que “as normas do CPC só serão subsidiariamente aplicáveis se houver uma lacuna, de natureza adjectiva, na regulamentação do CPPT e dos diplomas a que se refere o seu artigo 1.º.” (cfr. Ac. do STA de 28/03/2007, proc. n.º 026/07).

No âmbito sistemático do Código do Procedimento e do Processo Tributário, o art. 250.º do CPPT encontra-se no título IV que versa sobre a execução fiscal, mais precisamente na secção IX (“Da venda dos bens penhorados”) do capítulo II (“Do processo”). Deste modo, aquele preceito legal, sob a epígrafe “Valor base dos bens para venda” dispõe sobre a forma da determinação do valor base para a venda de bens no âmbito do processo de execução fiscal.

Ou seja, o legislador regulou no CPPT a forma como o valor da venda no processo de execução fiscal será determinado, pelo que não existe qualquer omissão de regulamentação para que se possa, supletivamente, aplicar o disposto no art. 812.º do CPC, que regula o valor base da venda no processo de execução comum.

Assim sendo, não se verifica o pressuposto do caso omisso para que se possa aplicar supletivamente o Código Processo Civil, nos termos da alínea e) do art. 2.º do CPPT, pelo que, a sentença recorrida, ao ter aplicado ao caso dos autos o disposto no art. 812.º do CPC, enferma, de igual modo, de erro de julgamento de direito.

Por conseguinte, o recurso merece provimento, devendo a sentença recorrida ser revogada, e consequentemente, ser julgada improcedente a reclamação.

3. Sumário

I. O erro de julgamento de facto ocorre quando se conclua, da confrontação entre os meios de prova produzidos e os factos dados por provados ou não provados, que o juízo feito está em desconformidade com a prova produzida, independentemente da convicção pessoal do juiz acerca de cada facto;
II. O apuramento do valor base dos bens para venda em execução fiscal encontra-se regulado no art. 250.º do CPPT, e deste modo, não há lugar à aplicação supletiva do art. 812.º do CPC.

III. DECISÃO

Em face do exposto, acordam em conferência os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte, em conceder provimento ao recurso interposto, revogando-se a decisão recorrida, e consequente, julgar improcedente a reclamação.
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Sem custas.
D.n.
Porto, 16 de Outubro de 2014.
Ass. Cristina Flora
Ass. Ana Patrocínio
Ass. Ana Paula Santos