Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00076/11.5BECBR
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:03/15/2019
Tribunal:TAF de Coimbra
Relator:Maria Fernanda Antunes Aparício Duarte Brandão
Descritores:DISPENSA DE PRODUÇÃO DE PROVA; EXECUÇÃO DE SENTENÇA; CAUSA LEGÍTIMA DE INEXECUÇÃO; APOSENTAÇÃO DO EXEQUENTE
Sumário:
I-Não se impõe ao julgador a realização de todas e quaisquer diligências requeridas pelas partes, podendo e devendo o juiz rejeitar as que reputar inúteis.
II-No caso concreto, independentemente dos motivos subjacentes à tomada da decisão de aposentação, e independentemente do momento em que a mesma foi requerida (28/04/2010) e do momento a partir do qual começou a produzir efeitos (maio de 2011), certo é que o Exequente ficou definitivamente desligado do serviço, e que a passagem à situação de aposentação configura um facto extintivo da relação jurídica de emprego público, o que impede que o Exequente possa ser candidato ao concurso e, eventualmente, vir a tomar posse no lugar;
II.1-assim, com a aposentação do Exequente surgiu uma impossibilidade objectiva de produção dos efeitos pretendidos, porquanto o concurso é agora irrepetível;
II.2-os actos do procedimento não podem repetir-se apenas para se verificar se o Exequente seria provido no lugar de Professor Associado, de forma a poder eventualmente reconstituir o que poderia ter sido a sua carreira até ao momento da aposentação;
II.3-para ser proferido um acto substitutivo do que foi anulado, necessário seria que o Exequente reunisse, à data da repetição, as condições pessoais para o efeito, quais sejam a de lhe ser possível ser candidato ao dito concurso, para aí ser avaliada a sua candidatura, o que não ocorre;
II.4-só fazia sentido para a entidade Executada renovar o acto anulado, isto é, prosseguir o concurso para preenchimento da vaga aberta, se o candidato, único concorrente, estivesse em condições pessoais de a vir a preencher, e ser provido na respectiva vaga, o que não se verifica;
II.5-não há interesse do Exequente, digno de tutela judicial, que justifique a ficção de um acto sem qualquer utilidade;
II.6-não há princípio ou regra de direito que imponha à Administração a ficção de um acto inócuo;
II.7-repetir e/ou prosseguir com o concurso para o qual o único candidato concorrente já se encontra em situação de aposentação, não podendo preencher a respectiva vaga, por se encontrar na situação de aposentado, representaria desenvolver esforços e despender recursos humanos e materiais sem qualquer utilidade, o que poria em causa o interesse público, tal como foi invocado pela Executada como fundamento da existência de causa legítima de inexecução. *
*Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:AFQN
Recorrido 1:Universidade C...
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Especial para Impugnação de Acto Administrativo (CPTA) - Recurso Jurisdicional
Decisão:
Negar provimento a ambos os recursos
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido do não provimento dos recursos
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:

RELATÓRIO
AFQN, residente na Avenida A…, 3000-010 Coimbra, por apenso à acção administrativa especial que correu termos no TAF de Coimbra sob o nº 76/11.5BECBR, instaurou acção executiva para execução de sentença, contra a Universidade C..., ambos melhor identificados nos autos, pedindo:
-a execução da sentença, concretizando que a mesma consiste na admissão do Exequente ao Concurso Documental para provimento de uma vaga de Professor Associado do 8º Grupo, Subgrupo de Ortopedia, da Faculdade de Medicina da Universidade C..., aberto pelo Edital nº 940/2009, publicado na 2ª Série do Diário da República nº 172, de 04/09/2009, e na avaliação da sua candidatura de acordo com os critérios de selecção constantes do referido edital, com efeitos retroagidos à data de publicação do mesmo.
Pediu ainda a fixação de prazo não superior a 30 dias para a execução da sentença, sob pena de imposição de uma sanção pecuniária compulsória ao Reitor da Universidade C... no montante de €100,00 diários por cada dia de atraso no cumprimento.
Por sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra foi julgada improcedente a acção, por provada a existência de causa legítima de inexecução, e em consequência, foi absolvida a Executada do pedido e determinada a notificação do Exequente e da Executada para, no prazo de 20 (vinte) dias acordarem no montante da indemnização devida pelo facto da inexecução.
Desta vem interposto recurso.
O Recorrente põe ainda em causa o despacho que dispensou a requerida produção de diligências probatórias.
*
Alegando, o Exequente formulou as seguintes conclusões:
a) No despacho de fls. … dos autos, o Tribunal a quo dispensou a produção de diligências probatórias.
b) Contudo, o Tribunal a quo não deu como provada, nem permitiu a produção de prova (nem testemunhal, nem por declarações de parte, nem por confissão), para além do mais, que o exequente não teria requerido a aposentação caso o procedimento concursal em análise nos autos principais tivesse decorrido de acordo com a Lei, dado que a aposentação teve causa única e exclusiva a conduta do Júri no citado procedimento, da violação do princípio da igualdade por parte da executada, que a obtenção do título de Prof Associado da Faculdade de Medicina da Universidade C... vale por si e que o bloqueio de acesso ao mencionado procedimento concursal constitui uma gravíssima ofensa ao exequente.
c) E isto sem prejuízo da junção aos autos do documento junto sob o nº 5 da petição de execução.
d) Sendo que tais matérias de facto são relevantes para a boa decisão da causa.
e) No ordenamento jurídico português compete ao julgador – também em sede de processo executivo – realizar ou ordenar todas as diligências úteis ao apuramento da verdade, atentos os princípios da justiça, da verdade material, do inquisitório, da tutela jurisdicional efectiva e da promoção do acesso à justiça.
f) Assim, ao dispensar a produção de diligências probatórias, o Tribunal a quo impediu, indiscutivelmente, a prova dos factos alegados, o que influi de forma relevante na decisão da causa.
g) Ao decidir como decidiu, violou, de forma grave, os princípios de justiça, da procura da verdade material, do inquisitório, da tutela jurisdicional efectiva e da promoção do acesso à justiça, consagrados nos artºs 2º, 20º, 202º e 203º da Constituição da República Portuguesa. Ilegalidade e inconstitucionalidades essas que aqui se invocam para todos os efeitos legais.
h) Acresce que, a interpretação do artº 177º, nº 4, do CPTA no sentido de não exigir que o Tribunal realize / ordene todas as diligências probatórias úteis ao apuramento da verdade, para prova dos factos alegados pela parte, então tal interpretação é inconstitucional por violação dos art.ºs 2º, 20º, 202º e 203º da CRP e dos princípios de justiça, da procura da verdade material, do inquisitório, da tutela jurisdicional efectiva e da promoção do acesso à justiça.
i) O que é, igualmente, gerador de nulidade. O que se requer seja declarado e, em consequência, seja ordenada a realização de prova testemunhal, de declarações de parte e por confissão para prova da matéria de facto alegada nos art. 7º a 11º, 14º a 16º e 17º da petição de execução e art.ºs 19º a 24º, 27º a 29º e 30º da réplica, seguindo-se os demais trâmites legais, com as legais consequências.
Sem prescindir:
j) mas mesmo que se considere inexistir a invocada nulidade e se julgue que os autos continham já todos os elementos para poder ser proferida decisão final, como foi – o que se não aceita – mesmo assim, considerando apenas os elementos existentes nos autos, mostra-se, em nosso entender, provado que inexiste causa legítima de inexecução de decisão judicial.
k) Na verdade, não se encontram preenchidos, nos presentes autos, nenhum dos pressupostos do nº 1 do artº 163º do CPTA, aplicável por força do artº 175º, nº 2, do mesmo diploma legal. Assim:
l) de acordo com a matéria de facto dada como provada no ponto 1 dos factos provados da sentença recorrida, consigna-se na decisão judicial que se deu à execução, para além do mais, que: “O que logicamente lhe assiste, posta a causa procedente da invalidade do acto impugnado é ser admitido a continuar no concurso até final, sendo avaliada a sua candidatura segundo os critérios de selecção constantes do programa respectivo (…)” – sublinhado nosso
m) Sendo que, a declaração judicial de invalidade do acto da executada tem como consequência necessária que os seus efeitos retroajam à data de publicação do respectivo Edital e abertura do Concurso, isto é, que as condições para apresentação da candidatura e os efeitos do concurso, por força de decisão judicial que se deu à execução, têm de ser reportados à data da abertura do concurso - 04 de Setembro de 2009 (Edital nº 940/2009, publicado no DR, 2ª Séria, nº 172, de 04.09.2009). E, assim sendo, a data muito anterior à aposentação do exequente, que só produziu efeitos a Maio de 2011.
n) Aliás, parece-nos manifesto que os efeitos da declaração judicial de invalidade do acto da executada têm necessariamente que retroagir à data de publicação do respectivo Edital e abertura do Concurso, sob pena de assim se não entender estar-se perante a violação dos princípios gerais da actividade administrativa e do Estado de Direito Democrático, constitucionalmente consagrados nos art.ºs 1, 2º, 3º, 266º e 268º da Constituição da República Portuguesa e previstos nos art.ºs 3 º e ss. do CPA, porquanto inexistiria, na prática, qualquer efeito de tutela dos direitos e interesses dos administrados e censura à actuação da Administração. Ilegalidade e inconstitucionalidade essas que aqui se invocam para todos os efeitos legais.
o) Acresce que, a interpretação do artº 173º, nº 1, do CPTA no sentido de a declaração judicial de anulação de um acto administrativo (do acto da executada) de não admissão a concurso no âmbito de um concurso / edital não ter como consequência o dever da Administração de reconstituir a situação à data de publicação do respectivo Edital e abertura do Concurso, então tal interpretação é inconstitucional por violação dos art.ºs 1º, 2º, 3º, 266º e 268º da CRP e dos princípios gerais da actividade administrativa e do Estado de Direito Democrático.
p) Pelo que, inexiste qualquer impossibilidade absoluta ou qualquer prejuízo – que não foi alegado, nem provado pela Ré / executada – para o interesse público a execução da decisão judicial dada à execução.
q) Acresce que, também a petição inicial que deu origem aos autos principais deu entrada em juízo em 14.01.2011, isto é, igualmente em data anterior à produção dos efeitos da aposentação do recorrente (Maio de 2011).
r) Aliás, se a Ré entendesse que existia fundamento para não cumprir com decisão judicial que viria a ser proferida nos autos principais, sempre o teria ter alegado – o que não fez - aquando o seu conhecimento da aposentação do Autor, que produziu efeitos a Maio de 2011, por inutilidade superveniente da lide.
s) O que se compreende, porquanto também aí entendeu – e bem – que a eventual anulação do acto administrativo em análise a ser decretada – como efectivamente veio a ocorrer – os seus efeitos sempre seriam reportados a data de publicação do respectivo Edital e abertura do Concurso.
t) Assim, deve a sentença recorrida ser revogada e, em consequência, ser julgada improcedente a invocação de existência de causa legítima de inexecução de decisão judicial e determinar-se que a executada dê cumprimento ao Acórdão através dos actos melhores descritos na petição de execução, bem como a fixação de prazo não superior a 30 dias para a sua execução, sob pena de imposição de uma sanção pecuniária compulsória ao Reitor da Universidade C..., no montante de 100 €/diários por cada dia de atraso no seu cumprimento, com as legais consequências,
assim se fazendo, com o suprimento, JUSTIÇA!
*
A Universidade C... contra-alegou, concluindo:
1.ª Ao determinar no n.º 4 do art. 177.º do CPTA que “…o tribunal ordena as diligências instrutórias que considere necessárias…”, quis o legislador deixar bem claro que é ao julgador que compete aferir da relevância da factualidade alegada perante as várias soluções plausíveis para as questões de direito colocadas, assistindo-lhe o poder de dispensar essa prova, no caso de concluir que ela é manifestamente impertinente, inútil ou desnecessária; sem impor diligências probatórias, a lei deixa ao critério do julgador a tarefa de aferir da sua necessidade, na medida em que é “inútil assentar factos, bem como provar factos sem relevo para a boa decisão da causa que se possam mostrar controvertidos”.1)
2.ª A factualidade invocada pelo Recorrente como sendo matéria que, alegadamente, carece de prova, não releva para a questão em discussão no presente pleito, designadamente, não relevam para a questão de saber se existe ou não existe causa legítima de inexecução do julgado anulatório, a prova do alegado pelo Exequente nos artigos 7.º a 11.º e 14.º a 16.º da petição de execução, e artigos 19.º a 24.º e 27.º a 29.º da réplica, tal como, saber se caso não tivesse sido praticado o acto anulado, o exequente teria sido provido no lugar de Professor Associado e não teria requerido a aposentação, saber se ocorreu, por parte da Executada, a alegada violação do princípio da igualdade por alegado modo distinto de tratamento de situações similares, saber se a exclusão do concurso foi causa de danos morais e patrimoniais alegadamente sofridos pelo Exequente.
3.ª Ainda que a dispensa da realização de diligências probatórias constituisse nulidade, apenas poderia consubstanciar uma nulidade processual, já que a hipótese não integra o elenco que é próprio das nulidades da sentença e que consta do art. 615.º do CPC; no entanto, e em conformidade com o disposto no art. 195.º n.º 1 do CPC, a omissão de um acto ou de uma formalidade que a lei prescreva, só produzem nulidade quando a lei o declare ou quando a irregularidade cometida possa influir no exame ou na decisão da causa”; ora, no geral da tramitação processual, a lei não prescreve que deva ter sempre lugar a produção de prova, antes conferindo ao juiz o poder de ajuizar da necessidade da sua produção; e no caso concreto o Meritíssimo Juiz a quo entendeu, e bem, que não era necessária a realização de diligências instrutórias, na medida em que os factos cuja prova o Exequente pretendia fazer em nada influenciariam a decisão a tomar sobre se se verificava ou não, a existência de causa legítima de inexecução.
4.ª O despacho recorrido não merece censura, devendo os alegados vícios de ilegalidade e inconstitucionalidade invocados pelo Recorrente ser julgados improcedentes, mantendo-se na íntegra o despacho do Meritíssimo Juiz a quo que decidiu ser desnecessária a prática de diligências instrutórias.
5.ª Independentemente dos motivos subjacentes à tomada da decisão de aposentação, e independentemente do momento em que a mesma foi requerida (28.04.2010) e do momento a partir do qual começou a produzir efeitos Maio de 2011), certo é que o Exequente ficou definitivamente desligado do serviço, e que a passagem à situação de aposentação configura um facto extintivo da relação jurídica de emprego público, o que impede de forma incontornável que o Exequente possa ser candidato ao concurso e, eventualmente, vir a tomar posse no lugar; com a aposentação do Exequente surgiu uma impossibilidade objectiva de produção dos efeitos pretendidos, porquanto o concurso é agora irrepetível.
6.ª Os actos do procedimento não podem repetir-se apenas para se verificar se o Exequente seria provido no lugar de Professor Associado, de forma a poder eventualmente reconstituir o que poderia ter sido a sua carreira até ao momento da aposentação; para ser proferido um acto substitutivo do que foi anulado, necessário seria que o Exequente reunisse, à data da repetição, as condições pessoais para o efeito, quais sejam a se lhe ser possível ser candidato ao dito concurso, para aí ser avaliada a sua candidatura, o que não se verifica; só faz sentido para a entidade Executada renovar o acto anulado, i. é., prosseguir o concurso para preenchimento da vaga aberta, se o candidato, único concorrente, estiver em condições pessoais de a vir a preencher, e ser provido na respectiva vaga, o que não se verifica.
7.ª Não há interesse do Exequente digno de tutela judicial que justifique a ficção de um acto sem qualquer utilidade; não há princípio ou regra de direito que imponha à Administração a ficção de um acto inócuo; a aposentação voluntária do Exequente consubstancia uma impossibilidade objectiva e absoluta de se proceder à repetição do procedimento concursal, porque o exequente deixou de reunir as condições necessárias para se candidatar a um eventual concurso e também deixou de reunir as condições para eventualmente poder vir a preencher a vaga aberta pelo dito concurso.
8.ª Repetir e/ou prosseguir com o concurso para o qual o único candidato concorrente já se encontra em situação de aposentação, não podendo preencher a respectiva vaga, por se encontrar na situação de aposentado, é desenvolver esforços e despender recursos humanos materiais sem utilidade, o que põe em causa o interesse público, tal como foi invocado pela Executada como fundamento da existência de causa legítima de inexecução; pelo que, bem decidiu o Meritíssimo Juiz a quo, ao julgar pela impossibilidade de reconstituição da situação hipotética actual, e, consequentemente, pela existência de causa legítima de inexecução.
9.ª O despacho que dispensa a realização de diligências instrutórias não violou os princípios da justiça, da procura da verdade material, do inquisitório, da tutela jurisdicional efectiva e da promoção do acesso à justiça, consagrados nos arts. 2.º, 20.º, 202.º e 203.º da CRP, e a sentença recorrida não incorreu em erro de julgamento nem violou os princípios gerais da actividade administrativa e do Estado de Direito Democrático, constitucionalmente consagrados nos arts. 1.º, 2.º, 3.º, 266.º e 268.º da CRP e previstos no art. 3.º e seguintes do CPA.
Considerando que não se verificam os vícios assacados ao despacho e à sentença recorridos, que o Tribunal a quo julgou bem ao considerar desnecessária a realização de diligências instrutórias e ao decidir pela existência de causa legítima de inexecução da sentença proferida no âmbito do processo principal, deve o presente recurso ser julgado improcedente, por manifesta falta de fundamentação de facto e de direito, mantendo-se na íntegra o despacho e a sentença recorridos, assim se fazendo, inteira Justiça!
*
O MP, notificado nos termos e para os efeitos contidos no artº 146º/1 do CPTA, emitiu parecer no sentido do não provimento dos recursos.
A este respondeu o Exequente, reiterando que os recursos devem ser julgados procedentes, com as legais consequências.
*
Cumpre apreciar e decidir.
FUNDAMENTOS
DE FACTO

Na sentença foi fixada a seguinte factualidade:
1. Em 18.04.2012 foi proferida sentença no âmbito da Acção Administrativa Especial n.º 76/11.5BECBR, em que foi Autor AFQN e Entidade Demandada a Universidade C..., que aqui se dá por reproduzida e transcreve parcialmente:
“(…)
Pede:
- A Anulação da deliberação de 27/9/2010 do Júri do Concurso Documental para provimento de uma vaga de Professor Associado do 8.º Grupo, Subgrupo de Ortopedia, da Faculdade de Medicina da Universidade C..., aberto, perante a Reitoria da mesma Universidade, pelo Edital n.º 940/2009 publicado no DR, 21 Série, n.º 172, de 4 de Setembro de 2009, pela qual deliberação foi decidido manter o preconizado em reunião anterior de 14 de Abril p.p. e comunicado ao Autor para exercício da sua audiência prévia, isto é, a sua exclusão do concurso por se “entender que o seu curriculum global reveste o nível científico e pedagógico compatível com a categoria de professor associado a que (…) concorreu”
- A condenação da Ré à prática de acto tido por devido, que “se consubstancia na admissão do Autor como Professor Associado da Faculdade de Medicina da Universidade C..., com as legais consequências”.
(…)
Decisão
Nestes termos e com o fundamento exposto, julgando a acção parcialmente procedente, anula-se a deliberação impugnada.
No mais julga-se a acção improcedente.
(…)” – cfr. fls. 240 a 244 da Acção Administrativa Especial n.º 76/11.5BECBR de que os presentes autos constituem um apenso.
2. Em 19.06.2015 foi proferido acórdão pelo Tribunal Central Administrativo do Norte no âmbito do recurso da sentença identificada no ponto anterior do probatório, interposto pela Universidade C..., pelo qual foi negado provimento ao mesmo – fls. 297 a 302 da Acção Administrativa Especial n.º 76/11.5BECBR de que os presentes autos constituem um apenso.
3. O Exequente está aposentado desde Maio de 2011 – acordo decorrente da posição processual das partes de acordo com o alegado nos artigos 13.º da petição inicial e 30.º da contestação.
4. O Exequente recebeu o ofício datado de 21.10.2015, elaborado pelo Reitor da Universidade C..., sob o assunto Processo n.º 76/11.5BECBR. Causa legítima de inexecução de decisão judicial”, que aqui se transcreve:
“No seguimento do acórdão, de 19 de junho de 2015, preferido pelo Tribunal Central Administrativo do Norte, o qual confirmou a sentença proferida em primeira instância, mantendo a anulação da deliberação do júri do procedimento concursal, venho informar que, conforme despacho reitoral de 16 de outubro, e em virtude de se encontrar aposentado desde maio de 2011 é intenção da Universidade C... não executar a decisão supra mencionada, por entender que estão reunidos os pressupostos dos artigos 163.º, n.º 1 e 175.º, n.º 2 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA).
Com efeito, a aposentação de V. Exa. consubstancia uma impossibilidade absoluta de proceder à repetição do procedimento concursal na medida em que deixou de possuir condições para se candidatar a um eventual concurso. Neste sentido, a proceder-se à sua repetição, a prática deste ato não se consubstanciaria na execução da decisão porquanto V. Exa., enquanto parte vencedora no processo judicial e interessado, não possui, atual e futuramente, os requisitos para se poder candidatar (vide, neste sentido, o Acórdão do Tribunal Central Administrativo do Norte, Proc. 00417-A/2002, de 30.11.2012).
Em segundo lugar, e em consequência do primeiro argumento, não se pode deixar de considerar que a repetição do concurso, por ser inútil, traria graves inconvenientes para o interesse público, uma vez que a sua realização acarretaria custos inadmissíveis e desnecessários ao nível de recursos materiais e humanos.
Assim, a sua concretização, em consonância com a decisão judicial proferida, consubstanciaria um ato desnecessário e inútil, e, por isso, atentatória para o interesse público.” – cfr. documento 3 junto com a petição inicial.
5. Em 17.11.2015 foi assinado o aviso de recepção da resposta do Exequente ao ofício identificado no ponto anterior do probatório, cuja cópia junta como documento 4 com a petição inicial aqui se dá por reproduzida – cfr. documento 4 junto com a petição inicial.
6. A petição inicial dos presentes autos deu entrada em juízo em 09.03.2016 – cfr. registo de envio da petição inicial via SITAF.
Em sede de factualidade não provada o Tribunal consignou: Não existem quaisquer outros factos com relevo que importe fixar como não provados.
*
DE DIREITO
Atente-se no discurso fundamentador da decisão sob censura:
A questão a decidir nos presentes autos consiste em saber se é viável a execução integral do julgado, ou se, por se verificar a existência de uma causa legítima de inexecução, a Executada está desonerada do seu cumprimento.
Cumpre apreciar e decidir.
De acordo com o n.º 1 e 2 do artigo 175.º do CPTA e artigo 163.º do CPTA a causa legítima de inexecução deve ser invocada pela administração no prazo de três meses de que esta dispõe para o cumprimento espontâneo da sentença, podendo ainda ser invocada na contestação (cfr. artigo n.º 3 do artigo 177.º do CPTA).
No caso em apreço a Executada invocou a existência de causa legítima de inexecução no prazo de que dispunha para a execução voluntária do julgado (cfr. ponto 4 do probatório), pelo que a presente execução foi intentada nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 6 do artigo 176.º do CPTA. Assim, cumpre apreciar se a causa aí invocada e reiterada em sede de contestação legitima, de facto, a inexecução da sentença.
Dispõe o n.º 1 e n.º 2 do artigo 173.º do CPTA que a execução do julgado anulatório implica para a Administração o dever de praticar os actos jurídicos, ainda que dotados de eficácia retroactiva, necessários à reintegração efectiva da ordem jurídica violada, mediante a reconstituição da situação que existiria se o acto ilegal não tivesse sido praticado, com referência à situação jurídica e de facto que existia no momento em que o acto deveria ter sido praticado. Neste sentido, a possibilidade de execução afere-se pela viabilidade objectiva de se proceder à reconstituição da situação hipotética actual.
Nos termos do n.º 2 e 3 do artigo 175.º do CPTA só constituem causa legítima de inexecução a impossibilidade absoluta e o grave prejuízo para o interesse público na execução da sentença, exigindo-se ainda que as circunstâncias invocadas sejam supervenientes ou não estivessem em condições de ser invocadas pela Administração no processo declarativo. Acresce que a impossibilidade de execução não se reconduz à mera dificuldade ou onerosidade do cumprimento da sentença, sendo necessário que exista um impedimento irremovível de natureza legal ou física. Então, só situações excepcionais é que tornam lícita a inexecução das sentenças e, em consequência, determinam que seja arbitrada uma indemnização ao exequente (cfr. artigo 178.º do CPTA).
Por outro lado “a declaração jurisdicional de inexistência de causa legítima de inexecução por impossibilidade depende, necessariamente, do sentido em que for decidida a questão de saber qual o conteúdo da execução, já que só em relação a comportamentos certos e determinados faz sentido perguntar se a sua prática é ou não impossível” (cfr. acórdão do Pleno do STA, de 12.11.97, proferido no âmbito do processo n.º 22.444-A).
Revertendo ao caso concreto importa, em primeiro lugar, determinar em que consiste o cumprimento da sentença exequenda.
No âmbito do processo principal foi decidido anular a deliberação de 27/9/2010 do Júri do Concurso Documental para provimento de uma vaga de Professor Associado do 8.º Grupo, Subgrupo de Ortopedia, da Faculdade de Medicina da Universidade C... que determinou a exclusão do Exequente do concurso por se ter entendido que o seu curriculum não revestia o nível científico e pedagógico compatível com a categoria de professor associado em concurso (cfr. pontos 1 e 2 do probatório).
Assim, o respeito pelo caso julgado implicaria para a Executada a prática de um acto expurgado do vício anteriormente cometido (sob pena de nulidade, cfr. alínea i) do n.º 2 do artigo 161.º CPA e n.º 2 do artigo 158.º do CPTA). Concretamente, em consequência da anulação do referido acto, à Executada incumbiria retomar o concurso desde a fase em que o Exequente foi excluído, procedendo à sua admissão e avaliação do currículo de acordo com os critérios de selecção constantes do edital.
Sucede que foi apurado nos autos que o Exequente está aposentado desde Maio de 2011 (cfr. ponto 3 do probatório). Com a passagem à situação de aposentação o Exequente ficou definitivamente desligado do serviço. Aliás, a passagem à situação de aposentação configura um facto extintivo da relação jurídica de emprego público, o que impede que o Exequente possa tomar posse do lugar aberto a concurso (cfr. neste sentido o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 05.06.2008, proferido no âmbito do processo n.º 040201ª, disponível em www.dgsi.pt). Logo, é impossível a reconstituição da situação hipotética actual.
A tal conclusão não obsta o facto de a reconstituição da situação atender a data anterior à aposentação do Exequente, pois se é certo que o vínculo laboral apenas cessou na pendência da acção principal, também é indubitável que o candidato que seria admitido no âmbito daquela reconstituição está juridicamente impossibilitado de ocupar o lugar a que se candidata, sendo irrelevante para a decisão dos presentes autos a motivação subjacente à tomada da decisão de aposentação. Acresce que, a intenção do legislador plasmado no artigo 173.º do CPTA não é a de ficcionar uma reconstituição para daí retirar eventuais consequências indemnizatórias, mas sim a de proceder a uma efectiva reconstituição da situação hipotética actual.
Por fim, quanto à alegação do Exequente de violação do princípio da igualdade, embora o mesmo não explicite em que medida tal princípio é violado, diga-se apenas que não se perspectiva de que modo a invocação de causa legítima de inexecução no caso em apreço poderia violar tal princípio constitucional.
Face ao exposto, verifica-se a existência de uma causa legítima de inexecução da sentença proferida no âmbito do processo principal.
Em face do decidido supra, fica prejudicado o conhecimento do demais peticionado quanto à estipulação de prazo para o cumprimento da sentença e da imposição de uma sanção pecuniária compulsória.
Atento o disposto no artigo 178.º do CPTA cumpre ordenar a notificação do Exequente e da Executada para acordarem no montante da indemnização devida pelo facto da inexecução.
X
Em discussão nos presentes autos estão as seguintes questões:
-nulidade do despacho a dispensar a requerida produção de diligências probatórias por violação dos princípios de justiça, da procura da verdade material, do inquisitório, da tutela jurisdicional efectiva e da promoção do acesso à justiça;
-erro de julgamento por a sentença ter concluído pela existência de causa legítima de inexecução.
Vejamos:
Do despacho -
O Exequente interpõe recurso do despacho proferido em 19/05/2016, que indeferiu a pretendida produção de diligências probatórias.
É univocamente entendido pela doutrina e foi consagrado pela lei adjectiva e pela jurisprudência, que o objecto do recurso jurisdicional é delimitado pelas conclusões extraídas da motivação, por parte do recorrente, estando vedado ao tribunal ad quem conhecer de matéria que nelas não tiver sido versada, com ressalva óbvia dos casos em que se imponha o seu conhecimento oficioso.
Assim, analisadas as conclusões da peça processual, resulta que o Recorrente começa por imputar ao despacho a nulidade secundária ou atípica prevista no artigo 195º do CPC de 2013 e ainda a afronta a inúmeros princípios constitucionais.
Avança-se, já, que carece de razão.
Na verdade, prescreve a norma do nº 4 do artigo 117º do CPTA que “Junta a réplica do autor ou expirado o respetivo prazo sem que ele tenha manifestado a sua concordância com a eventual contestação apresentada pela Administração, o tribunal ordena as diligências instrutórias que considere necessárias, findo o que se segue a abertura de vista simultânea aos juízes-adjuntos, caso se trate de tribunal colegial”. O que se traduz num poder ou faculdade que é posto na disponibilidade do julgador, que, assim, pode e deve aquilatar da necessidade da realização de diligências instrutórias, tendo em vista a descoberta da verdade material e a boa decisão da causa.
A ser assim, não se impunha ao Senhor Juiz que, em quaisquer circunstâncias, determinasse a abertura de um período de produção de prova, mas, tão-somente, que ponderasse da eventual necessidade da efectivação das diligências probatórias, o que efectivamente fez (cfr. o teor do despacho recorrido).
Compete, pois, ao juiz aferir da necessidade ou não de produzir prova. Como o Supremo Tribunal Administrativo tem vindo a entender “(…) a falta de inquirição de testemunhas não constitui nulidade porque não surge como diligência cuja realização se imponha inelutavelmente ao juiz, antes cabendo a este avaliar se a questão a dirimir no processo é meramente de direito ou, sendo também de facto, constam do processo todos os elementos pertinentes para a decisão e, nesse caso, decidir-se pelo imediato conhecimento do pedido. Compete ao juiz aferir da necessidade ou não de produzir prova, decidindo “se deve ou não realizar diligências que forem requeridas, podendo oficiosamente realizar as diligências que entender úteis para a descoberta da verdade, em relação aos factos alegados ou de que oficiosamente possa conhecer (…)”. Ou seja, a lei não prescreve que deve haver sempre lugar a produção de prova, antes conferindo ao juiz o poder de ajuizar da necessidade da sua produção; pelo que não havendo essa imposição legal, se o juiz dispensa a produção de prova não se pode dizer que foi preterida uma formalidade legal geradora de nulidade processual. O que não obsta a que a omissão de diligências de prova, quando existam factos controvertidos que possam relevar para a decisão da causa possa afectar o julgamento da matéria de facto, acarretando a anulação da sentença por défice instrutório com vista a obter o devido apuramento dos factos.” - Acórdão de 09/04/2014, proferido no Proc. 01869/13.
A lei não impõe a produção da prova oferecida pelas partes. Ora, se a lei a não prescreve, não se pode sustentar que a sua falta gere nulidade. A nulidade processual consiste num desvio entre o formalismo prescrito na lei e o formalismo efectivamente seguido nos autos; por isso, o despacho que dispensou a realização das diligências probatórias requeridas não constitui nulidade processual à luz do artº 195º do CPC - omissão de um acto ou formalidade que a lei prescreva - pois que o CPTA não estabelece a obrigatoriedade de produção de prova (testemunhal ou outra), antes confere ao juiz o poder de avaliar/ajuizar da necessidade da sua produção.
Na verdade, a produção da prova testemunhal arrolada (ou outra) está dependente da constatação da sua “necessidade” para a decisão da causa segundo o juízo de aferição do julgador, pelo que, não constituindo uma formalidade legal vinculadamente imposta pelo CPTA, a sua preterição não consubstancia uma nulidade.
Como se sumariou no Acórdão do TCAS de 03/02/2009, Proc. 02087/07: I)-A falta de inquirição das testemunhas, no caso sub judice, não constitui nulidade porquanto cumpre ao juiz avaliar se a questão a dirimir no processo é meramente de direito ou, sendo também de facto, se constam já do processo todos os elementos pertinentes para a decisão e, nesse caso, decidir-se pelo imediato conhecimento do pedido, sem que haja produção de prova.
II)- Quanto à instrução do processo de acção administrativa especial, vale plenamente o princípio do inquisitório, podendo o relator ordenar as diligências de prova que considere necessárias para o apuramento da verdade, bem como indeferir as diligências requeridas que considere claramente desnecessárias (artº 90º nº 1 do Código de Processo dos Tribunais Administrativos).
III)-…. a falta de inquirição das testemunhas oferecidas pela A. não constitui omissão de um acto que a lei prescreva. A lei não prescreve que deve haver sempre a inquirição das testemunhas, antes permitindo ao juiz aferir da necessidade desse acto.
IV)- Em matéria de produção de prova aplica-se o regulado na lei processual civil (cfr. artºs 513º a 645º do CPC) mas, quando o considere claramente desnecessário, o juiz ou relator pode indeferir requerimentos dirigidos à produção de prova ou recusar a utilização de certos meios desta, mediante decisão fundamentada (artº 90º, nº 2 do Código de Processo dos Tribunais Administrativos).
V)- A razão de ser deste regime prende-se com a necessidade de obviar ao risco de, em processos em que domina a prova documental, o requerimento de outro tipo de prova, em especial, a prova testemunhal, vir a ser utilizado como expediente dilatório, sendo essa solução plenamente justificável, em ordem aos elementares princípios da economia e celeridade processuais.
(…).
De resto, na economia da concreta decisão a proferir, justifica-se e, inclusive, impõe-se a asserção do julgador do TAF de Coimbra.
Deste modo, improcede, de todo, a imputada nulidade secundária, razão pela qual se secunda o juízo firmado pelo Tribunal a quo em tal despacho.
Invoca, ainda, o Exequente a inconstitucionalidade da interpretação do citado nº 4 do artigo 177º do CPTA, por violação dos princípios da justiça, da procura da verdade material, do inquisitório, da tutela jurisdicional efectiva e da promoção do acesso à justiça, consagrados nos artigos 2º, 20º, 202º e 203º, da CRP.
Trata-se, todavia, de meras alegações - vagas, difusas, genéricas e inconsistentes -, não se mostrando devidamente substanciado e, ademais, não se divisando como é que tais princípios se mostram afrontados, no caso em apreço.
Constitui doutrina administrativa e jurisprudência uniforme e pacífica, que não se impõe ao julgador a realização de todas e quaisquer diligências requeridas pelas partes, podendo e devendo o juiz rejeitar as que reputar inúteis.
Como a seguir se descortinará, não se vislumbra a omissão de diligências essenciais para a descoberta da verdade material, mormente a inquirição de testemunhas, expressamente dispensada no despacho em crise.
Desta forma, a decisão sub judice não incorreu na violação dos aludidos princípios constitucionais e legais; antes se pautou pelo cumprimento do dever de boa gestão processual.
Assim sendo, não merece censura, também, quanto a esta parte.
Da sentença -
Na óptica do Recorrente esta enferma de erro de julgamento de direito ao concluir pela presença de causa legítima de inexecução.
Não secundamos este entendimento.
Como emerge da doutrina firmada no Acórdão do STA, de 12/03/2008, no âmbito do Proc. 0341A/032), É sabido que, no âmbito da execução de sentenças anulatórias de actos administrativos, a Administração deve procurar reconstituir a situação atual hipotética, isto é, deve procurar repor a situação que existiria se o acto ilegal não tivesse sido praticado por forma a que a ordem jurídica seja reintegrada. O que passa pela realização, agora, do que se deveria ter realizado se a ilegalidade não tivesse inquinado o procedimento, isto é, passa pela prática dos actos jurídicos e das operações materiais necessárias à mencionada reconstituição e pela eliminação da ordem jurídica de todos os efeitos positivos ou negativos que a contrariem. -vd. art.º 173.º do CPTA, F. do Amaral, A Execução das Sentenças dos Tribunais Administrativos, pág. 45, e Acórdãos do Pleno do STA de 13/03/2003 (rec. 44140-A) e da Secção de 3/03/2005 (rec. 41.794-A) e numerosa jurisprudência neles citada.
Este é o princípio geral.
Todavia, casos há em que essa forma de execução do julgado não pode ser realizada, quer porque a referida reconstituição é impossível quer porque, atento o grave prejuízo para o interesse público que dela decorreria, não é exigível pelo que, nesses casos, a lei admite que a Administração invoque essa impossibilidade ou essa inexigibilidade como fundamento para a recusa da reconstituição da realidade nos termos atrás mencionados, cumprindo ao Tribunal verificar a procedência dos fundamentos invocados e, sendo caso disso, desonerá-la da obrigação de executar a sentença. - vd. n.º 2 do art.º 175 e n.º 1 do art.º 163.º, ambos do CPTA e citada jurisprudência.
E no Acórdão, também do STA, de 12/04/2007, proferido no Proc. 0291/06, referiu-se: Estamos em sede executiva de decisão anulatória em que se apresenta como questão prioritária saber se é viável a execução nos termos exactos de reconstituição da situação que existiria não fora o acto anulado, ou se, pelo contrário, deve declarar-se a existência de causa legítima de inexecução, por impossibilidade absoluta, como vem alegado.
A possibilidade de execução afere-se pela viabilidade objectiva de reconstituir, através de actuações jurídicas e materiais adequadas, a situação que existiria se não tivesse sido praticado o acto anulado, por referência à situação jurídica e de facto existente no momento em que um acto válido deveria ter tido lugar, como decorre do n.º 1 do artigo 173.º do CPTA.
(…) Esta constatação da impossibilidade jurídica de reconstituição da situação que existiria se não tivesse sido praticado o acto anulado com o vício que justificou a anulação obsta em absoluto a que a execução de julgado se concretize por forma diferente da fixação de indemnização, pois essa execução ou se concretiza através dessa reconstituição ou através de indemnização pela inexecução, não havendo suporte legal para soluções alternativas de semirreconstituição ou pseudo-reconstituição mesmo que subjectivamente aparentem ser equilibradas.
Num Estado de Direito, em que os Tribunais estão sujeitos à lei, o aplicador do direito não pode sobrepor os seus critérios pessoais aos juízos legislativamente formulados pelos órgãos estaduais a quem constitucionalmente incumbe a produção legislativa, mesmo que esteja convicto de que as soluções que ele próprio adoptaria se fosse o legislador são mais adequadas dos que as previstas na lei.
Sendo esta a linha de actuação e tendo ainda presente que o aqui Recorrente não especificou e/ou densificou os assacados erros, na interpretação das normas jurídicas aplicadas, tem de soçobrar a sua argumentação.
De facto, não basta apelar ao desrespeito dos princípios constitucionais e das normas legais aplicáveis; é necessário densificar tal alegação, o que ora não sucedeu.
Sem qualquer suporte fáctico e/ou jurídico, tal apenas evidencia a total falta de fundamento do recurso em análise.
Em suma:
-ao determinar no nº 4 do artº 177º do CPTA que “…o tribunal ordena as diligências instrutórias que considere necessárias…”, quis o legislador deixar bem claro que é ao julgador que compete aferir da relevância da factualidade alegada perante as várias soluções plausíveis para as questões de direito colocadas, assistindo-lhe o poder de dispensar essa prova, no caso de concluir que ela é manifestamente impertinente, inútil ou desnecessária;
-dito de outro modo, sem impor diligências probatórias, a lei deixa ao critério do julgador a tarefa de aferir da sua necessidade, na medida em que é inútil assentar factos, bem como provar factos sem relevo para a boa decisão da causa que se possam mostrar controvertidos;
-a factualidade invocada pelo Recorrente como sendo matéria que, alegadamente, carece de prova, não releva para a questão em discussão no presente pleito, designadamente, não relevam para a questão de saber se existe ou não existe causa legítima de inexecução do julgado anulatório;
-ainda que a dispensa da realização de diligências probatórias constituisse nulidade, apenas poderia consubstanciar uma nulidade processual, já que a hipótese não integra o elenco que é próprio das nulidades da sentença e que consta do artº 615º do CPC;
-no entanto, e em conformidade com o disposto no artº 195º/1 do CPC, a omissão de um acto ou de uma formalidade que a lei prescreva, só produzem nulidade quando a lei o declare ou quando a irregularidade cometida possa influir no exame ou na decisão da causa, condicionalismo esse que aqui se não verifica;
-no geral da tramitação processual, a lei não prescreve que deva ter sempre lugar a produção de prova, antes conferindo ao juiz o poder de ajuizar da necessidade da sua produção;
-no caso concreto o Senhor Juiz entendeu, e bem, que não era necessária a realização de diligências instrutórias, na medida em que os factos cuja prova o Exequente pretendia fazer em nada influenciariam a decisão a tomar sobre se se verificava ou não, a existência de causa legítima de inexecução;
-o despacho recorrido não merece reparo, arredando-se, de todo, as faladas inconstitucionalidades;
-por outro lado, independentemente dos motivos subjacentes à tomada da decisão de aposentação, e independentemente do momento em que a mesma foi requerida (28/04/2010) e do momento a partir do qual começou a produzir efeitos (maio de 2011), certo é que o Exequente ficou definitivamente desligado do serviço, e que a passagem à situação de aposentação configura um facto extintivo da relação jurídica de emprego público, o que impede, de forma incontornável, que o Exequente possa ser candidato ao concurso e, eventualmente, vir a tomar posse no lugar;
-com a aposentação do Exequente surgiu uma impossibilidade objectiva de produção dos efeitos pretendidos, porquanto o concurso é agora irrepetível;
-os actos do procedimento não podem repetir-se apenas para se verificar se o Exequente seria provido no lugar de Professor Associado, de forma a poder eventualmente reconstituir o que poderia ter sido a sua carreira até ao momento da aposentação;
-para ser proferido um acto substitutivo do que foi anulado, necessário seria que o Exequente reunisse, à data da repetição, as condições pessoais para o efeito, quais sejam a de lhe ser possível ser candidato ao dito concurso, para aí ser avaliada a sua candidatura, o que não ocorre;
-só fazia sentido para a entidade Executada renovar o acto anulado, isto é, prosseguir o concurso para preenchimento da vaga aberta, se o candidato, único concorrente, estivesse em condições pessoais de a vir a preencher, e ser provido na respectiva vaga, o que não se verifica;
-não há interesse do Exequente, digno de tutela judicial, que justifique a ficção de um acto sem qualquer utilidade;
-não há princípio ou regra de direito que imponha à Administração a ficção de um acto inócuo;
-a aposentação voluntária do Exequente consubstancia uma impossibilidade objectiva e absoluta de se proceder à repetição do procedimento concursal, porque o mesmo deixou de reunir as condições necessárias para se candidatar a um eventual concurso e também deixou de reunir as condições para eventualmente poder vir a preencher a vaga aberta pelo dito concurso;
-repetir e/ou prosseguir com o concurso para o qual o único candidato concorrente já se encontra em situação de aposentação, não podendo preencher a respectiva vaga, por se encontrar na situação de aposentado, representaria desenvolver esforços e despender recursos humanos e materiais sem qualquer utilidade, o que poria em causa o interesse público, tal como foi invocado pela Executada como fundamento da existência de causa legítima de inexecução, leitura que o Tribunal a quo acolheu, ao julgar pela impossibilidade de reconstituição da situação hipotética actual, e, consequentemente, pela existência de causa legítima de inexecução.
Contrariamente ao alegado, o despacho que dispensou a realização de diligências instrutórias não violou os princípios da justiça, da procura da verdade material, do inquisitório, da tutela jurisdicional efectiva e da promoção do acesso à justiça, e a sentença recorrida não incorreu em erro de julgamento nem violou os princípios gerais da actividade administrativa e do Estado de Direito Democrático, constitucionalmente consagrados. Tal equivale a dizer que o presente recurso está totalmente votado ao insucesso.
***
DECISÃO
Termos em que se nega provimento ao recurso, mantendo-se, na íntegra, o despacho e a sentença recorridos.
Notifique e DN.
Porto, 15/03/2019
Ass. Fernanda Brandão
Ass. Frederico Branco
Ass. Nuno Coutinho
-*-
1) Cf. Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, de 14-08-2015, proc. nº 00217/15.3BECBR, disponível para consulta em www.dgsi.pt.

2) Sumário
I-No âmbito da execução de sentenças anulatórias de actos administrativos, a Administração deve procurar reconstituir a situação actual hipotética, isto é, deve procurar repor a situação que existiria se o acto ilegal não tivesse sido praticado o que passa por realizar agora o que se deveria ter realizado se a ilegalidade não tivesse inquinado o procedimento, por forma a que a que a que a ordem jurídica reintegrada seja aquela que existiria se aquela ilegalidade não tivesse ocorrido.
II-Todavia, casos há em que essa forma de execução do julgado não pode ser realizada, quer porque a referida reconstituição é impossível quer porque, atento o grave prejuízo para o interesse público que dela decorreria, não é exigível pelo que, nesses casos, a lei admite que a Administração invoque essa impossibilidade ou essa inexigibilidade como fundamento para a recusa da reconstituição da realidade nos termos atrás mencionados, cumprindo ao Tribunal verificar a procedência dos fundamentos invocados e, sendo caso disso, desonerá-la da obrigação de executar a sentença.

(….)