Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00352/18.6BEPNF
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:09/16/2021
Tribunal:TAF de Penafiel
Relator:Ana Patrocínio
Descritores:REJEIÇÃO LIMINAR, CADUCIDADE DO DIREITO DE ACÇÃO, LOCAL DA APRESENTAÇÃO DA PETIÇÃO DE OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO
Sumário:I - O indeferimento liminar só terá lugar quando for de todo em todo impossível o aproveitamento da petição inicial, isto tendo em atenção que o princípio da pronúncia sobre o mérito se sobrepõe a questões formais que não interfiram e ponham em causa o mesmo.

II - Assim, o despacho de indeferimento liminar só é admissível quando a improcedência da pretensão do autor for tão evidente e, razoavelmente, indiscutível, que torne dispensável assegurar o contraditório (artigo 3.º, n.º 3, do CPC) e inútil qualquer instrução e discussão posterior.

III - A oposição à execução fiscal é deduzida tempestivamente quando efectuada no prazo de 30 dias a contar da citação pessoal, nos termos da alínea a) do n.º 1 do mesmo artigo 203.º do CPPT.

IV – O incumprimento do local da apresentação da petição de oposição à execução fiscal, previsto no artigo 207.º do CPPT como sendo no órgão da execução fiscal onde pender a execução (n.º 1), não contende com a excepção de caducidade do direito de acção, atentas as circunstâncias do presente caso e a natureza do processo de oposição.*
* Sumário elaborado pela relatora
Recorrente:J.
Recorrido 1:IGFSS, I.P.
Votação:Unanimidade
Decisão:Conceder provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido de dever ser concedido provimento ao recurso.
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Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

I. Relatório

J., contribuinte fiscal n.º (…), residente na Rua (…), interpôs recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel, proferida em 03/03/2021, que rejeitou a oposição ao processo de execução fiscal n.º (PEF) 1302201600299090 e apensos do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, I.P. (IGFSS, I.P.), no montante de €59.944,58.

O Recorrente terminou as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões:

“1. Da decisão proferida pelo Tribunal a quo resulta a rejeição liminar da oposição por se encontrar intempestiva;
2. É do entender do Recorrente que a sentença proferida pelo tribunal a quo é ambígua;
3. Embora, tenha existido lapso no local da apresentação da Oposição do Recorrente, certo é que, o tribunal a quo mal andou no procedimento quanto à mesma;
4. O aqui Recorrente foi citado, através de terceira pessoa, para o PEF 1302201600299090 e apensos do IGFF em 24/05/2018 (data de assinatura do aviso de receção);
5. O tribunal a quo recebe a Oposição do aqui Recorrente em 12/06/2018
6. E, apenas remete a mesma para o IGFSS – Secção de Processo Executivo do Porto II, por ofício, em 14/09/2018 sendo aí recebida a 17/09/2018;
7. Nos termos da alínea a) do número 1 do artigo 203.º do CPPT, o prazo para deduzir oposição à execução fiscal é de 30 dias.
8. Sendo o aqui Recorrente citado através de terceira pessoa, o prazo para deduzir oposição terminava a 28/06/2018,
9. Sendo que, o tribunal remete ao órgão e local competente em 14/09/2018,
10. Três meses depois de rececionar a Oposição fiscal pelo Oponente/aqui Recorrente (o Recorrente apresentou o articulado junto do tribunal em 12/06/2018),
11. O Recorrente não compreende o espaço temporal - que se verifica demasiado longo – para remeter ao órgão competente;
12. Oponente entregou a Oposição com antecedência ao término do prazo;
13. Poderá ter existido, por parte do tribunal a quo, uma inércia do mesmo;
14. O Tribunal deveria ter notificado o Oponente para se fazer cumprir os termos do art.º 207.º do CPPT;
15. Assim, estaria o Oponente na possibilidade de corrigir o ato, em tempo útil.
16. O Recorrente não concorda com a caducidade do direito, pelo ato ser praticado intempestivamente,
17. A intempestividade do ato processual deveu-se à inércia do próprio Tribunal a quo.
18. Tendo o tribunal a quo, sem notificação ao Oponente, devolvido o processo para onde corre a execução fiscal, e, este último, voltar a devolver ao tribunal onde efetivamente foi apresentada a oposição, constitui um ato inútil que poderia ser evitado (nos termos do art.º 130.º do Código Processo Civil e art.º 2.º do CPPT);
19. E, conforme se depreende pelo teor do Acórdão do STA, de 09-01-2019, verifica-se que o tribunal a quo ao não devolver o processo ao órgão competente, com fundamento em praticar ato inútil, admite o articulado;
20. A sentença proferida deverá ser revogada e ser admitida a Oposição fiscal apresentada, seguindo os ulteriores termos processuais.”
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Não houve contra-alegações.
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O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de dever ser concedido provimento ao recurso.
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Com dispensa dos vistos legais, tendo-se obtido a concordância dos Meritíssimos Juízes-adjuntos, nos termos do artigo 657.º, n.º 4 do CPC; submete-se o processo à Conferência para julgamento.
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II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelo Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, impondo-se conhecer se o mesmo incorreu em erro de julgamento ao rejeitar liminarmente a presente oposição, por verificação da excepção de caducidade do direito de acção.

III. Fundamentação
1. Matéria de facto

No despacho prolatado em primeira instância foi proferida decisão da matéria de facto com o seguinte teor:

“Com relevância para a decisão da causa, o Tribunal julga provado:
A) O oponente foi citado pessoalmente para o PEF 1302201600299090 e apensos do IGFSS em 24/5/2018, data em que foi assinado o aviso de receção, por terceira pessoa (fls. 34 a 39 do PEF apenso e confissão do oponente na petição inicial).
B) Em 12/6/2018, o oponente remeteu a petição inicial da oposição ao Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel (fls. 1 a 39).
C) A petição inicial da oposição foi remetida por este Tribunal ao IGFSS – Secção de Processo Executivo do Porto II, por ofício de 14/9/2018 (fls. 41 do PEF apenso).
D) A petição inicial da oposição foi aí recebida em 17/9/2018 (fls. 64 do PEF apenso).
2.2 – Motivação.
A matéria de facto provada resulta da análise crítica e conjugada do teor dos documentos juntos aos autos pela administração tributária e pelo próprio oponente, identificados em cada um dos factos provados.”

2. O Direito

Uma sentença tem por obrigação conhecer do pedido e da causa de pedir, ditando o direito para o caso concreto. Contudo, na situação em análise, está em crise um despacho de indeferimento liminar, proferido nos termos do artigo 209.º, n.º 1, alínea a) do Código de Procedimento e de Processo Administrativo (CPPT): [“Recebido o processo, o juiz rejeitará logo a oposição por um dos seguintes fundamentos: a) Ter sido deduzida fora do prazo; (…)”].
O despacho liminar tem, portanto, como objectivo aferir da eventual rejeição da oposição, designadamente quando for extemporânea, de manifesta improcedência, ou que a causa de pedir não se coadune com nenhum dos fundamentos previstos no artigo 204.º do CPPT.
Ora, in casu, constata-se que a decisão recorrida rejeitou liminarmente a petição de oposição ao abrigo do disposto na alínea a) do artigo 209.º do CPTT por entender que foi deduzida fora do prazo.
A decisão prolatada em primeira instância, para melhor compreensão, tem o seguinte teor:
«O executado citado para o PEF pode deduzir oposição nos termos dos arts. 203.º e seguintes do CPPT.
O prazo para apresentação da oposição, previsto no art. 203.º, n.º 1, do CPPT, é um prazo de caducidade. Só impede a caducidade a prática, dentro do prazo legal ou convencional, do ato a que a lei atribua o efeito impeditivo (art. 331.º, n.º 1, do Código Civil (CC)).
A caducidade do direito de ação é uma exceção dilatória insuprível, de conhecimento oficioso, que obsta ao prosseguimento do processo e ao conhecimento do mérito da ação e dá lugar à absolvição da instância do réu (arts. 89.º, n.ºs 1, alínea h), e 2, do CPTA, 278.º, n.ºs 1, alínea e), e 2, 576.º, n.ºs 1 e 2, 578.º do CPC, ex vi 2.º, alíneas c) e e), do CPPT).
No caso em apreço, o oponente foi citado para a execução em 24/5/2018, conforme foi julgado provado em A), com base nos documentos de fls. 34 a 39 do PEF apenso e da sua própria confissão.
O prazo para apresentar a oposição terminou no dia 3/7/2018 ou, no máximo, em 6/7/2018, nos termos dos arts. 139.º, n.º 5, e 245.º, n.ºs 1, alíneas a) e b), e 4, do CPC e a petição inicial da oposição só foi apresentada no IGFSS em 17/9/2018, conforme resulta do facto provado D), depois de para aí ter sido remetida por este Tribunal em 14/9/2018.
Logo, o direito de ação do oponente caducou no dia 3/7/2018, pelo que a oposição apresentada em 17/9/20218 é extemporânea.
Apesar do oponente ter remetido a petição inicial da oposição diretamente para este Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel por fax e correio registado remetidos em 12/6/2018, esta apresentação da petição inicial não é válida, porquanto a petição inicial teria de ter sido apresentada no IGFSS – Secção do Processo Executivo do Porto II, onde corre o PEF.
A data da apresentação da oposição Tribunal Administrativo e Fiscal não é válida por ter sido apresentada a uma entidade que não tem competência para a receber. A data da apresentação da petição inicial a uma entidade administrativa incompetente não vale como data da apresentação da petição inicial. Isto é, a data da apresentação da petição inicial neste Tribunal Administrativo e Fiscal em 12/6/2018 não é válida e não aproveita ao oponente.
De resto neste sentido pronunciou-se já o Colendo Supremo Tribunal Administrativo. A propósito de situações idênticas podem invocar-se os acórdãos de 25/5/2005, 20/12/2006 e 31/8/2011, da 2.ª secção do Supremo Tribunal Administrativo, processos n.ºs 310/05, 473/06 E 737/11, disponíveis em www.dgsi.pt, citando-se parte deste último, em que a situação apreciada foi de um recurso nos termos do art. 146.º-B do CPPT, cuja petição inicial foi apresentada no Serviço de Finanças, quando deveria ter sido apresentada neste Tribunal Administrativo e Fiscal, situação inversa à dos autos, mas que substancialmente reconduz-se à mesma questão de direito, porquanto são processos judiciais específicos, com tramitação especial (no caso do acórdão citado é um recurso previsto no art. 146.º-B do CPPT e no caso dos autos é um processo de oposição previsto no art. 203.º do CPPT):
“A única questão em apreciação no presente recurso é a de saber se a decisão recorrida incorreu em erro de direito, por desacertada interpretação das normas contidas no artigo 146.°-B do CPPT e nos artigos 77.° e 34.° do CPA, ao julgar que o requerimento de interposição de recurso judicial apresentado no Serviço de Finanças dentro do prazo de 10 dias previsto no artigo 146.º-B do CPPT, e remetido por esse serviço ao Tribunal Tributário de 1ª Instância já depois de esgotado esse prazo legal, deve ser considerado como intempestivamente apresentado. (…)
Donde resulta, claramente, que se trata de um processo com uma tramitação específica, diferente da tramitação do processo de impugnação judicial, cuja petição inicial reveste a forma de simples requerimento onde se devem justificar sumariamente as razões da discordância com o acto recorrido, que não tem que ser subscrito por advogado mas que está sujeito a algumas regras sob pena de rejeição. E uma dessas regras é a de que a petição inicial seja apresentada no Tribunal Tributário de 1ª Instância da área do domicílio fiscal dos recorrentes, como decorre à evidência do disposto no n.º 1 do citado preceito legal. O que se compreende, dada a natureza urgente do processo (n.º 7 do artigo 89.º-A da LGT), assim se visando impedir a demora na remessa da petição de recurso ao tribunal caso ela pudesse ser apresentada nos serviços periféricos locais.
Sendo assim, por se tratar de um processo especial e urgente, que tem regras próprias de tramitação, não se podem aplicar as disposições do processo de impugnação judicial, previstas nos artigos 102.º e seguintes do CPPT, nomeadamente as regras constantes do artigo 103º, segundo as quais «a petição é apresentada no tribunal tributário competente ou no serviço periférico local onde haja sido ou deva legalmente considerar-se praticado o acto» (n.º 1), «no caso de a petição ser apresentada em serviço periférico local, este procederá ao seu envio ao tribunal tributário competente no prazo de cinco dias após o pagamento da taxa de justiça inicial» (n.º 3) e «a petição inicial pode ser remetida a qualquer das entidades referidas no n.º 1 pelo correio, sob registo, valendo, nesse caso, como data do acto processual a da efectivação do respectivo registo postal» (n.º 6).
Esta é, aliás, a posição firmada pela jurisprudência deste Supremo Tribunal, como se pode ver pela leitura dos acórdãos proferidos em 25/05/2005, em 20/12/2006, em 12/07/2007 e em 16/01/2008, nos processos nºs 0310/05, 0473/06, 0525/07 e 01/08, respectivamente, e que ora se reitera.
Por outro lado, não assiste razão aos Recorrentes quando defendem a aplicabilidade da norma constante do artigo 77.º do CPA, pois que se trata de norma de aplicação supletiva, que só pode ser chamada perante casos omissos (artigo 2.º do CPPT), e que, por isso, não é aplicável a este processo judicial tributário com tramitação própria e específica sobre o local de apresentação da respectiva petição inicial.
Como se deixou explicado nos acórdãos acima citados, designadamente naquele que foi proferido no recurso n.º 01/08, o artigo 146.º-B do CPPT «patenteia que não estamos perante caso omisso, ao impor que a petição de recurso “da decisão da administração tributária que determina o acesso directo à informação bancária que lhe diga respeito” seja formalizada “em requerimento apresentado no tribunal tributário de 1ª instância da área do seu domicílio fiscal”. Ao assim estabelecer o legislador afastou-se do regime que consagrou para o processo de impugnação judicial, cuja petição tanto pode ser apresentada «no tribunal tributário competente» como «no serviço periférico local onde haja sido ou deva legalmente considerar-se praticado o acto» (cfr. o artigo 103º nº 2 do CPPT).
Entre as razões para esta diferenciação avulta a natureza de urgente que o mesmo legislador atribui a estes recursos -vd. o artigo 146º-D do mesmo diploma. A urgência implica, naturalmente, a aceleração dos trâmites do processo, com redução dos prazos para os actos a praticar pelas partes, pela secretaria, pelo Ministério Público e pelo juiz, e a tramitação em férias. Mas também aconselha que se adoptem todas as práticas que possam contribuir para apressar, não só a marcha do processo, como a própria introdução em juízo.
Daí que o artigo 146º-B do CPPT determine várias medidas tendentes a evitar delongas: a petição é, logo, apresentada no tribunal, em dez dias a partir da notificação da decisão recorrida, sem exigência de formalidade especial, sem necessidade de ser subscrita por advogado, devendo a prova, que só pode ser documental, acompanhá-la, e a oposição é oferecida em dez dias com os elementos de prova.
Ao que se sucede a tramitação em férias, e com prazos reduzidos. (…)
De resto, o regime a que o recorrente apela e está consagrado no artigo 77º do CPA integra-se no capítulo respeitante à «marcha do procedimento» (administrativo), não tratando do lugar de apresentação de petições dirigidas aos tribunais, mas daquele em que devem entregar-se os requerimentos dirigidos aos órgãos da Administração.
Acresce que a regra geral contida no seu nº 1 não deixa de ser a da apresentação «nos serviços dos órgãos aos quais são dirigidos», regulando os nºs 2 e 3 as situações em que se trate de órgãos centrais com (nº 2) ou sem «serviços locais desconcentrados» na área de residência do requerente (nº 3). Conceitos estes – os de “órgãos centrais” e de “serviços locais desconcentrados” – que não têm aplicação aos órgãos jurisdicionais.».
Por outro lado, atenta a natureza do meio processual em causa, que deve ser considerado uma acção administrativa especial (cfr. Jorge de Sousa, CPPT anotado e comentado, a fls. 1071), ainda que estivéssemos perante um caso omisso, sempre se imporia a aplicação subsidiária do CPTA e não do CPA, sendo que, nos termos do artigo 78.º CPTA, a instância se constitui com a propositura da acção e esta só se considera proposta com a recepção da petição inicial na secretaria do tribunal ao qual é dirigida ou com a remessa da mesma, nos termos em que esta é admitida na lei processual civil.»

Por último, sustentam os Recorrentes que se tratou de um erro desculpável e que, por isso, se deve aplicar o disposto no artigo 34.º do CPA e, consequentemente, considerar que o recurso deu entrada na data da sua apresentação no serviço de finanças; o que significaria considerar que o recurso foi atempadamente interposto.

Também aqui carecem de razão.
A clareza do preceito que impõe a apresentação do requerimento no tribunal competente, e não em qualquer serviço da administração, afasta, desde logo, a desculpabilidade do erro. Por outro lado, como se deixou dito no acórdão proferido no processo n.º 0473/06, o Código do Procedimento Administrativo «aplica-se ao processamento dos processos ou petições que corram nos serviços da Administração e, consequentemente, o disposto no citado normativo - que se destina a regulamentar as situações em que a petição é, por erro, apresentada num órgão administrativo incompetente para a sua apreciação – não tem aplicação in casu, pois que o que ora ocorreu foi que a petição foi apresentada num serviço administrativo quando devia ter sido apresentada no Tribunal. Sendo assim, e sendo diferentes e incomparáveis a situação retratada nos autos e aquela que se encontra regulamentada no art.º 34.º do CPA não é possível a aplicação subsidiária deste ao processamento do presente processo».
O que se acaba de dizer não contraria os princípios pro actione e do acesso ao direito, com consagração no artigo 20.º n. 1 da Constituição, pois que o facto de a lei processual dever ser interpretada no sentido de promover a emissão de pronúncia sobre o mérito das pretensões formuladas não implica a dispensa de os interessados as dirigirem, em tempo, a quem a lei designa como competente para a sua apreciação.
Nesta conformidade, não merece reparo a decisão recorrida, improcedendo todas as conclusões da alegação do recurso.”.

Volvendo ao caso concreto, a petição inicial do recurso tem de julgar-se validamente apresentada no dia 17/9/2018 (factos provados em C) e D)), data em que foi apresentada no IGFSS-Secção de Processo Executivo do Porto II, e como tal é extemporânea, por ter caducado o direito de ação do oponente em 3/7/2018 ou no máximo em 6/7/2018 (arts. 139.º, n.º 5, e 245.º, n.ºs 1 e 4, do CPC, 203.º, n.º 1, do CPPT e 331.º, n.º 1, do CC).
A caducidade do direito de ação é uma exceção dilatória insuprível, de conhecimento oficioso, que obsta ao prosseguimento do processo e ao conhecimento do mérito da ação e dá lugar à absolvição da instância do réu e ao indeferimento liminar da petição se apreciada no despacho liminar (arts. 89.º, n.ºs 1, alínea h), e 2, do CPTA, 278.º, n.ºs 1, alínea e), e 2, 576.º, n.ºs 1 e 2, e 578.º do CPC, ex vi 2.º, alíneas c) e e), do CPPT).
Assim, nos termos do disposto no art. 209.º, n.º 1, alínea a), do CPPT, a oposição tem de ser rejeitada liminarmente atenta a sua intempestividade e consequente caducidade do direito de ação.
A esta decisão não obsta sequer a invocação do princípio pro actione porquanto resulta da própria notificação realizada ao oponente a forma e prazo de apresentação do processo adequado a contestar judicialmente a citação, o processo de oposição, resultando de forma clara e pacífica do art. 207.º do CPPT, o local de apresentação da oposição – “no órgão de execução fiscal onde pender a execução” ou “no órgão da execução fiscal deprecado” – o que afasta a existência de justificação para qualquer lapso.
3 – Decisão.
Pelo exposto, rejeito liminarmente a oposição.»
O indeferimento liminar só terá lugar quando for de todo impossível o aproveitamento da petição inicial, isto tendo em atenção que o princípio da pronúncia sobre o mérito se sobrepõe a questões formais que não interfiram e ponham em causa o mesmo. Assim, o despacho de indeferimento liminar só é admissível quando a improcedência da pretensão do autor for tão evidente e, razoavelmente, indiscutível, que torne dispensável assegurar o contraditório (artigo 3.º, n.º 3, do CPC) - entendido na sua dimensão positiva de direito de influir activamente no desenvolvimento e no êxito do processo - e inútil qualquer instrução e discussão posterior.
Daí que a jurisprudência tenha vindo a afirmar que o despacho de indeferimento liminar, dada a sua natureza “radical”, na medida em que coarcta à partida toda e qualquer expectativa de o autor ver a sua pretensão apreciada e julgada, encontrando a sua justificação em motivos de economia processual, deve ser cautelosamente decretado – cfr., por exemplo, Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 24/02/2011, proferido no âmbito do processo n.º 765/10.
Vejamos, agora, se no presente caso estão verificados os requisitos para a rejeição liminar da petição inicial, ou seja, se o seguimento do processo não tem razão alguma de ser e seja desperdício manifesto de actividade judicial - cfr. ALBERTO DOS REIS in Código de Processo Civil anotado, Coimbra Editora, 3.ª edição – reimpressão, vol. II, pág. 373.
Efectivamente, apurou-se, conforme consta do despacho recorrido, que a presente oposição foi apresentada em 12/06/2018 e que o Recorrente havia sido citado em 24/05/2018.
Nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 203.º do CPPT, a oposição à execução fiscal pode ser deduzida no prazo de 30 dias a contar da citação pessoal, ou, não a tendo havido, da primeira penhora.
O prazo para deduzir oposição é um prazo judicial, para efeitos do preceituado no artigo 20.º, n.º 2 do CPPT. Com efeito, o processo de execução fiscal tem natureza judicial, na sua globalidade, apesar de haver uma parte do mesmo que é processada perante órgãos da administração tributária.
Como prazo de natureza judicial, aplica-se o regime do CPC – cfr. artigo 20.º, n.º 2 do CPPT. Logo, corre continuamente, mas suspende-se em férias judiciais, transferindo-se o seu termo para o primeiro dia útil seguinte quando terminar em dia em que os tribunais estejam encerrados ou seja concedida tolerância de ponto – cfr. artigo 138.º, n.º 1 a 3 do CPC.
Ora, linearmente, tendo a petição inicial sido apresentada em 12/06/2018, constata-se que desde a data da citação pessoal do Recorrente em 24/05/2018 (aviso de recepção assinado por terceira pessoa) ainda não havia, claramente, decorrido o prazo de 30 dias previsto no referido artigo 203.º do CPPT.
Não ignoramos que a petição de oposição à execução fiscal deve ser apresentada no órgão de execução fiscal onde pender a execução, segundo o disposto no artigo 207.º, n.º 1 do CPPT. Sendo que, no caso, a petição inicial foi directamente apresentada no tribunal de primeira instância (competente).
Compreendemos as razões do legislador para a escolha do lugar para dar início ao processo de oposição, dado que o órgão de execução fiscal deve remeter ao tribunal as informações que reputar convenientes, poderá pronunciar-se sobre o mérito da oposição e revogar o acto que lhe tenha dado fundamento – cfr. artigo 208.º do CPPT.

Como resulta claro do teor da decisão recorrida transcrita, o Meritíssimo Juiz a quo considerou que o direito de acção do oponente caducou no dia 03/07/2018, pelo que, tendo a oposição sido apresentada em 17/09/2018, a mesma seria extemporânea. Para tanto, motivou que, apesar do oponente ter remetido a petição de oposição directamente para o TAF de Penafiel em 12/06/2018, esta apresentação da petição inicial não é válida, porquanto a mesma deveria ter sido apresentada no IGFSS – Secção do Processo Executivo do Porto II, onde corre o processo de execução fiscal.

No nosso entendimento, a questão a decidir não contende com a excepção de caducidade do direito de acção, prendendo-se, antes, com a consequência jurídica de a oposição ter sido tempestivamente apresentada, de forma indevida - não no órgão de execução fiscal onde está pendente o processo de execução fiscal, mas no tribunal.

Reforçamos o que referimos no intróito deste julgamento - que o despacho de indeferimento liminar deve ser cautelosamente decretado, dado que coarcta a expectativa de o autor ver a sua pretensão apreciada por um tribunal.

De facto, o meio processual oposição prevê expressamente a apreciação liminar, definindo, inequivocamente, as situações em que o juiz rejeitará logo a oposição, limitando esses fundamentos à intempestividade da apresentação da mesma, à falta de alegação de algum dos fundamentos admitidos no n.º 1 do artigo 204.º do CPPT e ser manifesta a improcedência da oposição – cfr. artigo 209.º do CPPT.

Ora, nas circunstâncias do caso concreto, entendemos não se verificar o fundamento previsto neste artigo 209.º do CPPT, nomeadamente, o vertido na sua alínea a), dado que, na nossa óptica, o incumprimento do local da apresentação da petição de oposição à execução fiscal, previsto no artigo 207.º do CPPT como sendo no órgão da execução fiscal onde pender a execução (n.º 1), não contende com a excepção de caducidade do direito de acção.

Em sintonia com o que vimos dizendo, num primeiro momento, o tribunal recorrido optou por tentar suprir a irregularidade do local onde foi apresentada a petição de oposição, proferindo um primeiro despacho liminar em 25/06/2018, com o teor de fls. 41 do processo físico, constatando o incumprimento do lugar da apresentação da petição inicial, determinando a baixa dos autos ao “serviço de finanças”, por forma a dar cumprimento à razão de ser da apresentação no órgão de execução fiscal onde pendia a execução, ou seja, o disposto no artigo 208.º do CPPT, e fixando custas pelo incidente no montante de 1 UC.
Tal despacho judicial foi cumprido, tendo o IGFSS, I.P. prestado as informações que reputou convenientes, pronunciando-se sobre o mérito da oposição e concluindo deverem os autos prosseguir os ulteriores termos, determinando a remessa dos mesmos ao Tribunal Administrativo e Fiscal competente, onde havia já, em 12/06/2018, sido apresentada a petição de oposição, acompanhados de cópia certificada do processo de execução fiscal e apensos em causa – cfr. fls. 44 a 76 do processo físico.
Foi na sequência do despacho que originou o suprimento da irregularidade constatada que foi prolatada a presente decisão recorrida, o que se nos afigura inadmissível.
Com efeito, observamos a sanação da irregularidade, promovida oficiosamente pelo tribunal competente, e, perante tal suprimento, este mesmo tribunal entendeu que a petição de oposição somente teria sido apresentada na data em que o tribunal recorrido remeteu a petição ao órgão de execução fiscal para cumprimento do disposto no artigo 208.º do CPPT. Note-se que a petição de oposição somente foi recebida no órgão de execução fiscal em 17/09/2018 (cfr. alínea D do probatório), depois de uma primeira tentativa em 10/09/2018 (cfr. fls. 42 e 43 do processo físico). Salientamos, ainda, que o primeiro despacho liminar foi proferido dentro do prazo de 30 dias para a apresentação da oposição (em 25/06/2018) e que foi o cumprimento tardio do despacho judicial que impulsionou o recebimento no IGFSS, I.P. somente em 17/09/2018, como alerta o Recorrente.

A verdade é que a petição inicial foi apresentada em prazo e, com fundamento na sua intempestividade, não poderia ser rejeitada ao abrigo do disposto no artigo 209.º, n.º 1, alínea a) do CPPT. A ratio legis da apresentação da petição de oposição no órgão de execução fiscal onde pende a execução foi, a nosso ver, adequadamente promovida pelo tribunal recorrido, tendo sido cumprido o disposto no artigo 208.º do CPPT. Aliás, aquando da prolação do primeiro despacho liminar, jamais poderia ter sido rejeitada a oposição ao abrigo do disposto no artigo 209.º, n.º 1, alínea a) do CPPT, dado que era tempestiva (12/06/2018), não sendo o incumprimento do local de apresentação da petição inicial motivo de rejeição nos termos desse artigo 209.º do CPPT. Nesta conformidade, o despacho de aperfeiçoamento proferido em 24/06/2018 mostra-se plenamente ajustado ao caso concreto.

Não questionamos ter sido o Recorrente a incumprir o disposto no artigo 207.º do CPPT. Contudo, tendo o tribunal recorrido permitido o suprimento dessa incorrecção, apresenta-se inadmissível que, posteriormente, se aproveite da sua ineficiência no cumprimento dos despachos judiciais para considerar a petição de oposição extemporânea, atenta a data de recepção no IGFSS, I.P. (17/09/2018).

Pelos motivos expostos e por ser nossa convicção não estarmos perante situações idênticas, afastamos a jurisprudência acolhida e em que se fundou o despacho recorrido.

Efectivamente, refere a decisão recorrida que a posição defendida - de que a data da apresentação da petição inicial a uma entidade que não tem competência para a receber não vale como data da apresentação da petição inicial - se encontra firmada pela jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo, “como se pode ver pela leitura dos acórdãos proferidos em 25/05/2005, em 20/12/2006, em 12/07/2007 e em 16/01/2008, nos processos nºs 0310/05, 0473/06, 0525/07 e 01/08, respetivamente, e que ora se reitera.”

Todavia, todos os acórdãos citados se reportam ao processo urgente de recurso do acto de fixação do rendimento tributável por métodos indirectos (artigos 89.º-A da LGT e 146.º-B do CPPT), tendo a solução adoptada sido justificada pela natureza urgente do processo.

Ora, o presente processo de oposição não assume legalmente esse carácter urgente, muito menos tal premência parece atendível, desde logo pela circunstância de a remessa da oposição ao órgão de execução fiscal ter sido determinada em 25/06/2018 e a mesma só ter sido recebida no IGFSS, I.P. em 17/09/2018.

Pelo exposto, não se verificando a excepção de caducidade do direito de acção, não poderia o tribunal recorrido fazer operar o disposto no artigo 209.º, n.º 1, alínea a) do CPPT, devendo os autos prosseguir para eventual despacho de recebimento da oposição, se a tal nada mais obstar.

Conclusões/Sumário

I - O indeferimento liminar só terá lugar quando for de todo em todo impossível o aproveitamento da petição inicial, isto tendo em atenção que o princípio da pronúncia sobre o mérito se sobrepõe a questões formais que não interfiram e ponham em causa o mesmo.

II - Assim, o despacho de indeferimento liminar só é admissível quando a improcedência da pretensão do autor for tão evidente e, razoavelmente, indiscutível, que torne dispensável assegurar o contraditório (artigo 3.º, n.º 3, do CPC) e inútil qualquer instrução e discussão posterior.

III - A oposição à execução fiscal é deduzida tempestivamente quando efectuada no prazo de 30 dias a contar da citação pessoal, nos termos da alínea a) do n.º 1 do mesmo artigo 203.º do CPPT.

IV – O incumprimento do local da apresentação da petição de oposição à execução fiscal, previsto no artigo 207.º do CPPT como sendo no órgão da execução fiscal onde pender a execução (n.º 1), não contende com a excepção de caducidade do direito de acção, atentas as circunstâncias do presente caso e a natureza do processo de oposição.

IV. Decisão

Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte, em conceder provimento ao recurso, revogar a decisão recorrida e determinar a remessa do processo ao Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel para prossecução dos autos, se a tal nada mais obstar.
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Custas a cargo da Recorrida, que não incluem a taxa de justiça, por não ter contra-alegado.
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Porto, 16 de Setembro de 2021


Ana Patrocínio
Paula Moura Teixeira
Conceição Soares