Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:02276/20.8BEPRT
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:07/21/2021
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Maria Fernanda Antunes Aparício Duarte Brandão
Descritores:CONTENCIOSO PRÉ-CONTRATUAL/IMPUGNAÇÃO DA DECISÃO DE ADJUDICAÇÃO E IMPUGNAÇÃO DE DOCUMENTOS CONFORMADORES DO PROCEDIMENTO;=>
/OBJECTO DO RECURSO JURISDICIONAL/DISCRICIONARIEDADE TÉCNICA/PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DE PODERES;
Recorrente:G., LDA
Recorrido 1:Universidade de Coimbra
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Impugnação Urgente - Contencioso pré-contratual (arts. 100º e segs. CPTA) - Recurso Jurisdicional
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Não emitiu parecer.
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:
RELATÓRIO
G., Lda. propôs acção administrativa de contencioso pré-contratual contra a Universidade de Coimbra, indicando como Contrainteressadas, as seguintes empresas: T., S.A.; C., Lda.; S., Lda.; R., Lda., J., Lda.; V., S.A.; E., S.A. e P., Lda., todas melhor identificadas nos autos.
Formula o pedido nos seguintes termos: “a) a presente acção ser julgada provada e procedente por verificação, por um lado, quanto às peças do procedimento e demais actos de conformação do procedimento concursal e, por outro lado, quanto à decisão de adjudicação consubstanciada no Relatório Final; b)E considerando o modelo de avaliação e os factores calculados nos termos legais devidos, a pontuação devida no factor “Preço” de 60% e no factor “Maisvalia técnica da proposta” de 40% a Concorrente Autora deveria ser sido classificada em primeiro lugar, por ser a proposta economicamente mais vantajosa nos termos dos art.ºs 11.º e 18.º do Programa do Concurso e art.ºs 74.º e 74.º do Código dos Contratos Públicos”.
Por sentença proferida pelo TAF do Porto foi julgada improcedente a acção e absolvidas a Entidade Demandada e as Contrainteressadas dos pedidos.
Desta vem interposto recurso.
Alegando, a Autora formulou as seguintes conclusões:
A) A Autora impugnou nos presentes autos de contencioso pré-contratual a decisão de adjudicação pela entidade demandada da empreitada para a execução da reabilitação das coberturas e fachadas do Colégio de S. Pedro da Universidade de Coimbra, à T., S.A. e ainda impugnar de documentos conformadores do procedimento.
B) Em causa está o modelo definido para avaliação das propostas, factores e expressão matemática respectivas, considerando o erro de cálculo da pontuação global das propostas, em violação do critério de adjudicação da proposta mais vantajosa e, por conseguinte, do disposto nos arts. 1.º-A, 74.º, 75.º, 132.º n.º 1 al. n), 139.º do CCP.
Invalidade do modelo de avaliação:
C) O funcionamento do Júri no tocante às operações de avaliação de mérito das propostas e subsunção dos atributos nos factores que densificam o critério de adjudicação de acordo com o modelo de avaliação previsto no programa do procedimento, tem de respeitar os art.º s 74.º, 75.º, 132.º, n.º 1, al. n) e 139.º, nºs 1 a 4, todos do Código dos Contratos Públicos e tendo presente os princípios que emergem do art.º 1.º, n.º 4, daquele diploma.
D) Tendo em consideração o critério de adjudicação e o modelo de avaliação das propostas encontra-se previsto no artigo 18 do Programa do Concurso: “A adjudicação será feita segundo o critério da proposta mais vantajosa para a entidade adjudicante determinada pela melhor relação qualidade-preço (Art. 74º, nº 1, al. a), do CCP), tendo em conta os seguintes fatores e subfactores, com a respetiva ponderação: a) Preço – 60%; b) Valia técnica da proposta – 40%”.
E) Acontece que no concurso impugnado não se extrai de forma alguma que a análise das propostas tenha resultado de uma ponderação e de uma verdadeira valorização do factor “Preço” em 60% em comparação com a ponderação e valorização do factor “Valia técnica da proposta” em 40%.
F) Basta estarmos atentos à ordenação e classificação final, pois, se compararmos a pontuação final da 1ª classificada podemos concluir que a sua pontuação de 2,71 está distribuída por 0,71 do factor preço e 2,00 do factor valia-técnica.
G) E quanto à pontuação final da 2ª classificada a sua pontuação de 2,63 resulta e 1,03 do factor preço e 1,60 do factor valia-técnica.
H) E, a pontuação da 3ª classificada é de 2,56 com o resultado da soma de 1,16 do factor preço com 1,40 do factor valia-técnica,
I) A pontuação global de cada proposta não corresponde ao resultado da soma das pontuações parciais obtidas em cada factor ou subfator elementar, multiplicadas pelos valores dos respetivos coeficientes de ponderação.
J) Desse cálculo não resulta que a pontuação final das concorrentes ou o modelo de avaliação tenha observado os artºs 1.º-A, 74.º, 75.º, 132.º, n.º 1, al. n) e 139.º, nºs 1 a 4, do CCP.
K) E a Ré conformou o procedimento com as peças de procedimento de Programa de Concurso, Caderno de Encargos, porém, em violação dos art.ºs 40.º, 41.º, 42.º, 44.º, 46.º-A, 50.º, 51.º e 132.º do Código dos Contratos Públicos.
Invalidade por falta de fundamentação:
L) No que respeita à grelha de atribuição das pontuações a cada um dos candidatos não encontramos a respectiva fundamentação quanto à avaliação de cada um dos Concorrentes.
M) A atribuição das pontuações no Relatório Preliminar / Relatório Final são obscuras/confusas/imperceptíveis, que não é possível apurar o sentido das classificações apresentadas na grelha de avaliação.
N) O júri e o acto de avaliação, bem como a entidade demandada, não fundamentaram quer os critérios que acabaram por ser valorados, quer as pontuações atribuídas, nos termos dos art.ºs 152.º, n.º 1 e 153.º, n.º 1, ambos do Código do Procedimento Administrativo e art.º 268.º, n.º 3 da Constituição da República Portuguesa.
O) Considerando o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte de 18-03-2016, processo n.º 3536/14.2BEPRT, conforme sumário que parcialmente se transcreve: Cfr. ACÓRDÃO disponível em http://www.dgsi.pt/jtcn.nsf/-/4A839C0DBE1B25C580257F8F0055D095 4 – A potencial arbitrariedade do júri na avaliação das propostas será tanto menor quanto mais densificada e escalonada esteja a grelha adotada, o que se reveste de acrescida importância, quando, como na presente situação, se está perante a necessidade de avaliar a proposta economicamente mais vantajosa.
P) Pelo que, por não estarmos perante uma grelha de classificação suficientemente densa que dispense outra fundamentação complementar, merece igualmente censura a controvertida decisão concursal por se mostrar insuficientemente fundamentada, à luz do estatuído no art.º 268.º, n.º 3 da CRP, e os art.ºs 152.º, 153.º do CPA.
Erros de cálculo e de atribuição de pontuação no modelo de avaliação:
Q) Quanto ao modelo de avaliação segundo o ponto 18 do Programa do Concurso a respectiva ponderação dos factores: a) Preço – 60%, sendo que considerando a pontuação obtida no factor “Preço” de 60% e no factor “Mais-valia técnica da proposta”
de 40% a Concorrente Autora deveria ser sido classificada em primeiro lugar, por ser a. proposta economicamente mais vantajosa nos termos dos art.ºs 11.º e 18.º do Programa do Concurso e art.ºs 74.º e 74.º do Código dos Contratos Públicos.
R) E quanto à avaliação do factor “valia-técnica” em 40% a sua ponderação encontra-se prevista no artigo 18.1, al. b), do Programa de Concurso, o factor “Valia-técnica da proposta” seria classificado de 1 a 5, avaliado através da seguinte fórmula: VT = (PT + MD)/2 em que: VT – Classificação da Valia Técnica da Proposta; PT – Classificação do Plano de Trabalhos; MD – Classificação da Memória Descritiva. Avaliada através de: b.1) Plano de Trabalhos; b.2) Memória Descritiva.
S) Nesse sentido os art.ºs 11.º, 1, al. c) e d) e 11.6 a 11.10 do Programa do Concurso, nomeadamente para o que aqui releva: “11 – DOCUMENTOS DA PROPOSTA - 11.1 Cada proposta é constituída pelos seguintes documentos: (...)
T) A Autora Concorrente, na sua proposta, quanto ao plano de trabalhos, apresentou os documentos previstos nos art.ºs 11.º, 1, al. c) e d) e 11.6 a 11.10 do Programa do Concurso.
U) Comparativamente a proposta da Concorrente Autora com a proposta da Concorrente T., S.A., o júri do procedimento não atribuiu as pontuações adequadas à respectiva avaliação.
V) Considerando o artigo 11.1, al. c) e 11.6 a 11.10 e o artigo 18 do Programa do Concurso, para efeitos de avaliação da proposta da Autora concorrente no factor “Plano de Trabalhos (PT)” deveria ter sido atribuída a pontuação de 5.
W) E quanto ao subfactor “Memória Descritiva (MD)” em 40%, segundo o artigo 11.1, al. d), do Programa de Concurso também deveria ser atribuída a pontuação de 5.
X) Considerando a pontuação obtida no factor “Preço” de 60% e no factor “Mais-valia técnica da proposta” de 40% a Concorrente Autora deveria ser sido classificada em primeiro lugar, por ser a proposta economicamente mais vantajosa nos termos dos art.ºs 11.º e 18.º do Programa do Concurso e art.ºs 74.º e 74.º do Código dos Contratos Públicos.
Y) Devendo ser revogada a decisão recorrida e substituída por outra que julgue a acção procedente e por verificação, por um lado, quanto às peças do procedimento e demais actos de conformação do procedimento concursal e, por outro lado, quanto à decisão de adjudicação consubstanciada no Relatório Final.
Z) E considerando o modelo de avaliação e os factores calculados nos termos legais devidos, a pontuação devida no factor “Preço” de 60% e no factor “Mais-valia técnica da proposta” de 40% a Concorrente Autora deveria ser sido classificada em primeiro lugar, por ser a proposta economicamente mais vantajosa nos termos dos art.ºs 11.º e 18.º do Programa do Concurso e art.ºs 74.º e 74.º do Código dos Contratos Públicos.


Nestes termos e nos melhores de Direito aplicável, que suprirão, tendo em conta a fundamentação de facto e Direito supra, deve ser julgado procedente o presente recurso e, consequentemente, ser revogada a Sentença, devendo outrossim a acção ser julgada procedente e provada, com as demais consequências daí advindas.
É, pois, o que se
Requer.
A Entidade Demandada juntou contra-alegações, concluindo:
1.ª No presente recurso jurisdicional interposto pela Autora da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, de 20.05.2021, a ora Recorrente limita-se a reiterar a sua discordância relativamente ao modelo definido para avaliação das propostas, factores e expressão matemática respectivas, alegando que ocorreu erro de cálculo da pontuação global das propostas, em violação do critério de adjudicação da proposta mais vantajosa, e reitera o vício imputado ao acto impugnado, de violação dos princípios da legalidade, prossecução do interesse público, proporcionalidade, tutela da confiança, sustentabilidade e responsabilidade, concorrência, publicidade e transparência, proporcionalidade e igualdade de tratamento e não discriminação, e dos arts. 1.º-A, 74.º, 75.º, 132.º n.º 1 al. n) e 139.º do CCP, fazendo completa tábua rasa de toda a fundamentação de facto e de direito vertida no aresto decisório, que ignora por completo, e ao qual não imputa qualquer vício, como lhe competia nos termos do disposto no n.º 2 do art. 144.º do CPTA.
2.ª Não pode merecer acolhimento a motivação aduzida nas alegações de recurso apresentadas pela Recorrente, porquanto assenta a mesma em fundamentos carecem manifestamente de sustentação, e que foram oportunamente refutados pela Universidade de Coimbra em sede de contestação e alegações escritas, e que se reiteram nas presentes contra-alegações, subscrevendo-se na íntegra o entendimento plasmado na sentença recorrida.
3.ª O modelo de avaliação do procedimento em causa está conforme à lei que rege a contratação pública e os resultados de avaliação das propostas reflectem a aplicação desse mesmo modelo de avaliação, pelo que não merece censura a sentença recorrida ao ter concluído que o critério de adjudicação e modelo de avaliação das propostas plasmado no ponto 18. do programa do concurso respeita os normativos aplicáveis e a sua efectiva aplicação às propostas apresentadas não apresenta quaisquer desconformidades, e ao ter decidido pela improcedência da invocada violação das normas do CCP e dos princípios da proporcionalidade e da igualdade, pelo que deverão improceder as conclusões formuladas pela Recorrente nas alíneas E) a K) das suas alegações.
4.ª Não merece censura o entendimento da sentença a quo, ancorado no Acórdão de uniformização de jurisprudência proferido pelo STA em 21.01.2014, no processo n.º 1790/13, de que a definição de uma escala de pontuação com os respectivos explicativos a que corresponde cada pontuação se mostra perceptível a qualquer destinatário normal, e que os quadros classificativos que constam do Relatório Preliminar, reiterados no Relatório Final, se mostram suficientemente elucidativos das razões que determinaram as pontuações atribuídas, bem como do itinerário cognoscitivo e valorativo que levou o Júri do procedimento a classificar as diferentes propostas apresentadas pelos concorrentes, pelo que julgou bem a sentença a quo ao concluir que a decisão de avaliação das propostas está devidamente fundamentada, decidindo pela improcedência do vício de
falta de fundamentação do Relatório Preliminar e do Relatório Final, e consequentemente do acto classificativo que levou à concreta decisão de adjudicação, pelo que terão que improceder as alegações vertidas nas alíneas L) a P) das conclusões do recurso.
5.ª Relativamente à avaliação/pontuação do factor “Preço”, a Autora não concretiza e não demonstra em que termos a proposta que apresentou é a proposta economicamente mais vantajosa, pelo que não merece censura a sentença a quo ao referir que (…) não se alcança como chegaria a Autora ao reclamado primeiro lugar no procedimento concursal, pois certo é que a sua alegação é meramente genérica e conclusiva, não sendo apontados os concretos erros que considera terem sido cometidos (…).
6.ª No que concerne à avaliação/pontuação do factor “Valia Técnica da Proposta”, considerando a discricionariedade de que dispõe o Júri na tarefa de avaliação das propostas no âmbito dos concursos públicos, e a ausência de especificação dos aspectos concretos dos quais se retire a identificação de um qualquer erro grosseiro eventualmente cometido pelo Júri no desempenho dessas funções - que, diga-se, não existe no caso concreto, pois o Júri avaliou o mérito técnico das propostas de forma objectiva, apoiado nos factores pré-definidos - não merece censura a sentença a quo ao ter julgado improcedentes os fundamentos invocados pela Autora tidos como determinantes da invalidade da avaliação feita no procedimento concursal e, consequentemente o pedido de classificação da sua proposta em primeiro lugar, pelo que deverão também improceder as alegações contidas nas alíneas Q) a Z) das conclusões do recurso da Recorrente.
7.ª A decisão da sentença a quo é a única possível face às circunstâncias de facto e de direito em causa e assentes no presente pleito, não existindo outra solução jurídica susceptível de ter sido adoptada, pelo que se requer se dignem julgar improcedente, por manifesta falta de fundamentação de facto e de direito atendível, o recurso interposto pela Autora, assim se fazendo
Justiça!
A Contrainteressada T., S.A. juntou contra-alegações e concluiu:
A) A Recorrente interpôs recurso da Sentença proferida pelo Tribunal a quo, que julgou improcedente os pedidos formulados na ação que propôs, e que, em síntese, visava a impugnação decisão de adjudicação pela R. da empreitada para a execução da reabilitação das coberturas e fachadas do Colégio de S. Pedro da Universidade de Coimbra à ora Contra Interessada, e ainda, a impugnação de documentos conformadores do procedimento.
B) A Recorrente tinha o ónus, no recurso que apresentou, de identificar os vícios/erros de julgamento que apontava à Sentença proferida pelo Tribunal a quo, contudo a mesma não identificou, especificamente, quaisquer vícios ou erros de julgamento dessa decisão.
C) A Recorrente limita-se a reproduzir no seu recurso o teor da P.I. e alegações finais que apresentou nos Autos, reiterando apenas nas suas alegações os vícios que assacou ao ato impugnado, sem ter em consideração a decisão que foi proferida relativamente ao indeferimento das suas pretensões pelo Tribunal a quo.
D) Pelo que no recurso apresentado pela Recorrente esta limita-se a discordar da decisão proferida, sem invocar, objetivamente, quaisquer vícios ou erros de julgamento.
E) Os pedidos da Recorrente na ação relativamente à invalidade do ato impugnado e aos documentos conformadores do procedimento, foram devidamente ponderados pelo Tribunal a quo, e que os considerou, de forma fundamentada, integralmente improcedentes na decisão que produziu.
F) Quanto à alegada invalidade do modelo de avaliação das propostas o modelo patenteado está conforme à lei que rege a contratação pública e os resultados de avaliação das propostas refletem a aplicação desse mesmo modelo de avaliação, pelo que esse modelo não viola quais quer normas do CCP, nem se verifica qualquer violação dos princípios da concorrência, da proporcionalidade e da igualdade.
G) A Sentença esteve bem em defender a validade do modelo de avaliação que consta das peças do procedimento não merecendo por isso, qualquer censura jurídica, nem incorrendo, assim, em qualquer erro de julgamento a decisão proferida pelo Tribunal a quo quanto a esta matéria.
H) Quanto à alegada falta de fundamentação, as classificações atribuídas às propostas dos concorrentes foram devidamente fundamentadas através da valoração por elas obtida e expressa nos vários itens da grelha classificativa.
I) O relatório preliminar mostra-se devidamente fundamentado, sendo percetível o caminho percorrido pela entidade adjudicante para chegar à decisão final tomada.
J) A Sentença não merece qualquer censura jurídica, nem incorrendo, assim, em qualquer erro de julgamento quanto a esta matéria.
K) Quanto à alegada invalidade na avaliação/pontuação do factor “Preço” a argumentação aduzida pela Recorrente não permitiu perceber sequer quais os alegados erros que imputa à avaliação do Júri do Procedimento nos relativamente cálculos aritméticos que fez para a determinação das classificações finais das propostas, maxime no fator “Preço” nem permitiu perceber como da aplicação das fórmulas expressas do procedimento poderia resultar ser a sua proposta a economicamente mais vantajosa, e assim classificada em primeiro lugar.
L) A Sentença não merece, igualmente, qualquer censura jurídica, pelo que não incorreu em qualquer erro de julgamento relativamente a esta matéria.
M) Quanto à alegada invalidade na avaliação/pontuação do factor “Valia Técnica da Proposta” a Recorrente não indicou em concreto quais as razões pelas quais considerava que deveria ter sido classificada com a pontuação de 5 nos subfactores Plano de Trabalhos e Memória Descritiva, nem alegou qualquer ilegalidade cometida pelo Júri do Procedimento na apreciação das propostas ou apontou qual ou quais os erros que detetou na avaliação efetuada.
N) A Sentença não merece, qualquer censura jurídica e nem incorreu em qualquer erro de julgamento também relativamente a esta matéria.
O) A Sentença proferida pelo Tribunal a quo fez uma correta apreciação dos factos e do direito aplicável, ao indeferir integralmente os mesmos por não se verificar: i) a invalidade do modelo de avaliação, nem ii) a invalidade da decisão de adjudicação, por falta de fundamentação, ou por incorreta avaliação da proposta da Recorrente no Fator “Preço” ou Valia técnica da Proposta, nos respetivos subfactores, e na classificação que foi atribuída aos concorrentes.
P) A Sentença proferida pelo Tribunal a quo não merece qualquer juízo de censura ou reparo a qualquer nível, tendo procedido à devida apreciação da matéria de facto relevante para o efeito, e dada como provada, bem como à correta subsunção dos factos ao direito aplicável, não padecendo de qualquer vício ou erro que afete a sua validade.
Q) Os pedidos apresentados pela Recorrente no seu recurso são, assim, totalmente infundados.
Face ao exposto, não incorrendo a Sentença proferida pelo Tribunal a quo de qualquer vício ou erro de julgamento, deve o Tribunal ad quem recusar provimento ao recurso interposto pela Recorrente mantendo, na íntegra, a Sentença recorrida.
O MP, notificado ao abrigo do disposto no artigo 146º/1 do CPTA, não emitiu parecer.
Cumpre apreciar e decidir.
FUNDAMENTOS
DE FACTO

Na sentença foi fixada a seguinte factualidade:
1) Em 18 de Junho de 2020 foi publicado o Anúncio n.º 6400/2020, Diário da República nº 117 série 2, com a abertura do Concurso Público da Empreitada para a execução da reabilitação das coberturas e fachadas do Colégio de S. Pedro da Universidade de Coimbra (cf. Documento n.º 1 junto com a p.i.);
2) O Concurso público tinha por finalidade um contrato de empreitada de obras públicas, para reabilitação de cobertura do edifício, incluindo chaminé, a recuperação das fachadas, a reparação ou substituição de caixilharias de madeira existentes, a conservação e restauro de cantarias, assim como ações de manutenção ordinária;
3) Sendo o valor do preço base do procedimento de 868.760,00€ (oitocentos e sessenta e oito mil e setecentos e sessenta euros);
4) O programa de concurso estabelece no item 18. o seguinte:
“18 – CRITÉRIO DE ADJUDICAÇÃO E MODELO DE AVALIAÇÃO DAS PROPOSTAS
18.1 A adjudicação será feita segundo o critério da proposta mais vantajosa para a entidade adjudicante determinada pela melhor relação qualidade-preço (Art. 74º, nº 1, al. a), do CCP), tendo em conta os seguintes fatores e subfactores, com a respetiva ponderação:
a) Preço – 60%
O preço será classificado de 1 a 5, inversamente proporcional aos valores apresentados. O fator de proporcionalidade será uma unidade que corresponde a 25% do Preço Base.
Os preços serão classificados através da seguinte fórmula:
CP=5 - P
------------------
0,25 ×PBASE
Em que:
CP – Classificação do Preço em Análise;
P – Preço em Análise;
PBASE – Preço Base para o presente procedimento.
b) Valia técnica da proposta – 40%
O fator valia técnica da proposta será classificado de 1 a 5, avaliado através da seguinte fórmula:
VT = (PT + MD)/2
Em que:
VT – Classificação da Valia Técnica da Proposta;
PT – Classificação do Plano de Trabalhos;
MD – Classificação da Memória Descritiva:
Avaliada através de:
b.1) Plano de Trabalhos;
b.2) Memória Descritiva.

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18.2. A Classificação Final será de 1 a 5, e será obtida de acordo com a seguinte fórmula:
CF = CP x 60% + VT x 40%
Em que:
CF = Classificação Final;
P = Classificação do Preço em Análise;
VT = Classificação da Valia Técnica da Proposta.
18.3. Em caso de empate na Classificação Final prevalecerá a proposta que tiver apresentado o valor mais baixo. Se o empate persistir prevalecerá a proposta que tiver melhor classificação no fator “Valia Técnica da Proposta”. Se, mesmo assim, o empate persistir, recorrer-se-á a um sorteio, que obedecerá à seguinte metodologia:
1º Determinar-se-á a seriação dos concorrentes para efeito de estabelecer a ordenação da retirada da bola, pela maior pontuação obtida através de um lance de dados;
2º A cor das bolas significará a seguinte ordenação:
1ª Posição: Bola branca;
2ª Posição: Bola preta;
3ª Posição: Bola vermelha;
4ª Posição: Bola verde;
Deste ato será lavrada ata que será assinada por todos os presentes.
5) A Autora apresentou a sua proposta no procedimento pré-contratual (cfr. Documento n.º 4 junto com a p.i.)
6) Com data de 21-05-2020 o Júri do procedimento elaborou o Relatório Preliminar, do qual resultou que a Autora foi classificada em terceiro lugar, enquanto em primeiro lugar ficou classificada a Concorrente T., S.A. e em segundo lugar a Concorrente a C., Lda. (cfr. Documento n.º 5 junto com a p.i.).
7) Do referido relatório preliminar extrai-se o seguinte:


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8) A Autora pronunciou-se em sede de audiência prévia na qual suscitou a invalidade do modelo de avaliação, quer a invalidade do confronto entre factores e escalas de pontuação e pontuações atribuídas e pelo juízo de ponderação do interesse público, a violação do critério de adjudicação, bem como a falta de fundamentação a respeito da grelha de atribuição das pontuações e por último a errada avaliação/pontuação do factor “Valia-técnica da proposta” da sua proposta (cfr. Documento n.º 6 junto com a p.i.).
9) Com data de 03-10-2020 foi elaborado o Relatório Final tendo sido mantido pelo Júri do procedimento o teor do Relatório Preliminar e Relatório Final e, consequentemente, a adjudicação à Concorrente T., S.A., o qual foi notificado à Autora em 02-11-2020 (cfr. Documento n.º 7 junto com a p.i.).
10) Do referido relatório final extrai-se o seguinte:

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11) A Autora apresentou impugnação administrativa e suscitou que as peças do procedimento infringem a lei, falta de fundamentação da grelha de atribuição das pontuações e errada avaliação/pontuação da Autora (cfr. Documento n.º 8 junto com a p.i.).
12) A Entidade Demandada, em 11-11-2020, notificou a Autora do indeferimento da impugnação administrativa da Autora (cfr. Documento n.º 9 junto com a p.i.).
DE DIREITO
Está posta em causa a sentença que ostenta este discurso fundamentador:
A Autora vem impugnar nos presentes autos de contencioso pré-contratual a decisão de adjudicação pela entidade demandada da empreitada para a execução da reabilitação das coberturas e fachadas do Colégio de S. Pedro da Universidade de Coimbra, à T., S.A. e ainda impugnar de documentos conformadores do procedimento.
A Autora discorda do modelo definido para avaliação das propostas, fatores e expressão matemática respetivas, alegando ainda que ocorreu erro de cálculo da pontuação global das propostas, em violação do critério de adjudicação da proposta mais vantajosa. Invoca ainda a violação dos princípios da legalidade, prossecução do interesse público, proporcionalidade, tutela da confiança, sustentabilidade e responsabilidade, concorrência, publicidade e transparência, proporcionalidade e igualdade de tratamento e não discriminação, e, por conseguinte, do disposto nos arts. 1.º-A, 74.º, 75.º, 132.º n.º 1 al. n), 139.º do CCP.
Vejamos, então, se oferece razão à Autora e, portanto, se, tal como vem alegado, o acto impugnado se mostra inquinado de vício invalidante que decorre da circunstância de ter sido utilizado determinado modelo para avaliação das propostas, fatores/subfactores e expressão matemática respetivas e bem assim como decorrente de erro de cálculo da pontuação global das propostas.
Como resulta do probatório, no caso em apreço, a Entidade Demandada, por Anúncio n.º 6400/2020 de 18 de Junho de 2020, publicado no Diário da República nº 117 série 2, publicitou a abertura de um concurso público da Empreitada para a execução da reabilitação das coberturas e fachadas do Colégio de S. Pedro da Universidade de Coimbra, que tinha por finalidade a celebração de um contrato de empreitada de obras públicas, para reabilitação de cobertura do edifício, incluindo chaminé, a recuperação das fachadas, a reparação ou substituição de caixilharias de madeira existentes, a conservação e restauro de cantarias, assim como ações de manutenção ordinária.
Assim, está em causa um concurso público (não urgente), em consonância com os artigos 16º, nº 1, alínea c), e 130º e seguintes do CCP, no âmbito do qual estão previstas as peças do procedimento enumeradas na alínea c) do nº 1 do artigo 40º do CCP, a saber, o anúncio, como elemento informativo, e, com maior preponderância, o programa do procedimento e o caderno de encargos, os quais enformam o elemento normativo nuclear do procedimento pré-contratual.
Na definição do artigo 41º do CCP, o programa do procedimento é o regulamento que define os termos a que obedece a fase de formação do contrato até à sua celebração, versando, nessa medida, exclusivamente sobre o procedimento de escolha do co-contratante, sem que constitua elemento integrante do contrato a celebrar, como sucede com o caderno de encargos. Assim, o artigo 42º, nº 1, do CCP, estabelece que o caderno de encargos é a peça do procedimento que contém as cláusulas a incluir no contrato a celebrar. Ambos são, no dizer do legislador processual, documentos conformadores do procedimento pré-contratual (cf. artigo 103º do CPTA).
Quanto ao modelo de avaliação
Sob a epígrafe “Critério de adjudicação”, estabelece o artº 74º do CCP o seguinte:
“1 - A adjudicação é feita de acordo com o critério da proposta economicamente mais vantajosa para a entidade adjudicante, determinada por uma das seguintes modalidades:
a) Melhor relação qualidade-preço, na qual o critério de adjudicação é composto por um conjunto de fatores, e eventuais subfatores, relacionados com diversos aspetos da execução do contrato a celebrar;
b) Avaliação do preço ou custo enquanto único aspeto da execução do contrato a celebrar.
2 - Em casos devidamente fundamentados, a entidade adjudicante pode optar por não submeter à concorrência o preço ou o custo, caso em que se estabelece obrigatoriamente um preço fixo ou um preço máximo no caderno de encargos.
3 - A utilização da modalidade prevista na alínea b) do n.º 1 só é permitida quando as peças do procedimento definam todos os restantes elementos da execução do contrato a celebrar.
4 - O convite ou o programa do procedimento deve definir o critério de desempate na avaliação das propostas.
5 - É vedada a utilização do critério do momento de entrega da proposta como critério de desempate.
6 - Podem ser utilizados como critério de desempate, designadamente, os fatores e subfatores estabelecidos nos termos do artigo seguinte, por ordem decrescente de ponderação relativa, ou a proposta que tiver sido apresentada por empresas sociais ou por pequenas e médias empresas, por ordem crescente da categoria das empresas”.
O artigo 74.º, n.º 1, do CCP estabelece, pois, um único critério de adjudicação «proposta economicamente mais vantajosa», que pode ter uma de 2 modalidades alternativas: melhor relação qualidade – preço ou avaliação do preço ou custo enquanto único aspeto da execução do contrato a celebrar, tendo no caso concreto sido adotado a primeira
Por seu turno, o artigo 75.º do CCP estabelece um regime geral sobre o critério de adjudicação da proposta economicamente mais vantajosa prescrevendo que os fatores e os eventuais subfactores que o densificam devem abranger «todos, e apenas, os aspetos da execução do contrato a celebrar submetidos à concorrência pelo caderno de encargos» (n.º 1) e que, para esse efeito, «os fatores e subfactores consideram-se ligados ao objeto do contrato quando estiverem relacionados com as obras, bens ou serviços a executar ou fornecer ao abrigo desse contrato, sob qualquer aspeto e em qualquer fase do seu ciclo de vida» (n.º 4).
O critério legal da proposta economicamente mais vantajosa para a entidade adjudicante relaciona-se com o princípio da concorrência que conforma o regime jurídico da contratação pública (que teve por referência a transposição de diretivas da União Europeia), impondo que na seleção dos fatores e subfactores densificadores se vise uma avaliação das propostas em face de objetivas vantagens económicas para a entidade adjudicante.
Por seu turno, o artigo 132.º n.º 1, al. n) do CCP estabelece que o programa do concurso (regulamento que define os termos a que obedece a fase de formação do contrato até à sua celebração – artº 41º do CCP), além de outras especificações previstas no art.º 132.º do CCP, deve indicar o “modelo de avaliação das propostas”, em conformidade com o previsto no artigo 139.º do referido Código, que estabelece o seguinte:
1 - Caso a determinação da proposta economicamente mais vantajosa se faça pela relação qualidade-preço, ou a avaliação do preço ou custo se decomponha em mais do que um fator de avaliação, o modelo de avaliação das propostas tem de observar o disposto nos números seguintes.
2 - A pontuação global de cada proposta, expressa numericamente, corresponde ao resultado da soma das pontuações parciais obtidas em cada fator ou subfator elementar, multiplicadas pelos valores dos respetivos coeficientes de ponderação.
3 - Para cada fator ou subfator elementar deve ser definida uma escala de pontuação através de uma expressão matemática ou em função de um conjunto ordenado de diferentes atributos suscetíveis de serem propostos para o aspeto da execução do contrato submetido à concorrência pelo caderno de encargos respeitante a esse fator ou subfator.
4 - Na elaboração do modelo de avaliação das propostas não podem ser utilizados quaisquer dados que dependam, direta ou indiretamente, dos atributos das propostas a apresentar, com exceção dos da proposta a avaliar.
5 - As pontuações parciais de cada proposta são atribuídas pelo júri através da aplicação da expressão matemática referida no n.º 3 ou, quando esta não existir, através de um juízo de comparação do respetivo atributo com o conjunto ordenado referido no mesmo número”.
Conforme decorre da matéria de facto, no modelo de avaliação das propostas adoptado - v. clausula 18 do programa de concurso -, isto é, da proposta mais vantajosa para a entidade adjudicante determinada pela melhor relação qualidade-preço tendo em conta os fatores – preço (60%) e valia técnica da proposta (40%)
Ainda de acordo com a mesma cláusula o preço é classificado de 1 a 5, inversamente proporcional aos valores apresentados. O fator de proporcionalidade será uma unidade que corresponde a 25% do Preço Base.
Os preços serão classificados através da seguinte fórmula:
CP=5 - P
------------------
0,25 ×PBASE
Em que:
CP – Classificação do Preço em Análise;
P – Preço em Análise;
PBASE – Preço Base para o presente procedimento.
b) Valia técnica da proposta – 40%
Já o fator valia técnica da proposta é classificado de 1 a 5, avaliado através da seguinte fórmula:
VT = (PT + MD)/2
Em que:
VT – Classificação da Valia Técnica da Proposta;
PT – Classificação do Plano de Trabalhos;
MD – Classificação da Memória Descritiva:
Avaliada através de:
b.1) Plano de Trabalhos;
b.2) Memória Descritiva.
E, de acordo com os quadros anexos que estabelecem a respectiva pontuação a atribuir em função do grau de detalhe e completude do plano de trabalhos e da memória descritiva, com a correspectiva pontuação entre 1 e 4 pontos, proporcional a esse detalhe.
Tendo presente o modelo de avaliação suprarreferido a Entidade Adjudicante no relatório preliminar procedeu à análise comparativa das propostas e quanto ao preço elaborou o quadro seguinte:

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Ainda quanto à valia técnica o júri de acordo com os subcritérios b1) e b)2 atribuiu as seguintes classificações e com as justificações constantes dos qudros 5 e 6:

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Em fase da análise e ponderação plasmadas nos referidos quadros o júri do procedimento procedeu à classificação das propostas, a saber:

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E, em face disso, ordenou as propostas da seguinte forma:

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Após a realização da audiência prévia dos concorrentes, o júri do procedimento elaborou o relatório final no qual foi analisada a pronúncia da ora Autora decidindo que a mesma não continha fundamentos para alterar o que havia sido analisado e projectado no relatório preliminar e, assim, reiterou “os termos, fundamentos e proposta de adjudicação constantes no relatório preliminar”.
A autora sustenta que “da análise das pontuações atribuídas se verifica a omissão de ponderação de vários itens da avaliação da Concorrente Autora que deveria ter ficado em 1.º lugar na avaliação; Inclusive tendo presente que o valor da proposta da Concorrente classificada em 1.º lugar é de 829.117,00€, da Concorrente classificada em 2.º lugar é de 713.062,16€ e em 3.º lugar a proposta da Autora com o valor de 663.538,49€, bem como o critério de adjudicação de proposta economicamente mais vantajosa, a ponderação do preço em 60% e da valia técnica da proposta em 40%, os cálculos errados na avaliação/pontuação das propostas” (artºs 15º e 16º da p.i.); “No Relatório Preliminar e Relatório Final não ocorre uma verdadeira e proporcional ponderação e valorização do factor “preço” em 60% e da “valia-técnica” em 40%2; “E não se extrai de forma alguma que a análise das propostas tenha resultado de uma ponderação e de uma verdadeira valorização do factor “Preço” em 60% em comparação com a ponderação e valorização do factor “Valia-técnica da proposta” em 40%”(artºs 24º e 25º da p.i.).
Mais alega a Autora que a “pontuação final das concorrentes ou o modelo de avaliação tenha observado o art.º 139.º, nºs 1 e 3, do Código dos Contratos Públicos”; “A pontuação global de cada proposta não corresponde ao resultado da soma das pontuações parciais obtidas em cada factor ou subfator elementar, multiplicadas pelos valores dos respetivos coeficientes de ponderação”; “Portanto não se verifica uma verdadeira e proporcional ponderação e valorização do factor “preço” em 60% e da “valia-técnica” em 40%” (artºs 33º a 35º da p.i.)
Acontece, todavia, que desta alegação conclusiva da Autora não é possível vislumbrar a razão da discordância em relação ao efectivo juízo formulado quanto à valia técnica das propostas e dos respectivos preços, sendo certo que resulta do probatório que o critério de adjudicação e modelo de avaliação das propostas plasmado no ponto 18. do programa do concurso respeita os normativos aplicáveis e a sua efectiva aplicação às propostas apresentadas não apresenta quaisquer desconformidades.
Na verdade, no modelo de avaliação foram concretizados em relação ao subfactor “valia técnica” várias escalas de pontuação com recurso a referências esclarecedoras, que permitiram a todos os concorrentes, antecipadamente, ter conhecimento das razões da pontuação que veio a ser adotada na avaliação das propostas, em cada um dos subfactores, pelo Júri do Procedimento.
Todas as fórmulas definidas pela entidade adjudicante no modelo de avaliação para a determinação da “Classificação do Preço em Análise” (CP), “Classificação da Valia Técnica da Proposta” (VT) e “Classificação Final” (CF), contêm uma determinada graduação que garante uma ponderação proporcional bem assim como uma valorização dos fatores e subfactores na determinação da proposta economicamente mais vantajosa.
E, foram essas fórmulas que antecipadamente foram divulgadas e por todos os interessados conhecidas que foram adoptadas aquando da elaboração da classificação final, quer em sede de do relatório preliminar quer em sede de relatório final.
Assim sendo, o modelo de avaliação fixado no programa de concurso acautela uma ponderação e valorização proporcional das propostas e foi efectivamente respeitado aquando da efectiva ponderação dos factores (e subfactores) fixados. No que tange ao Fator “Preço”, estabelece o programa de concurso que “o preço será classificado de 1 a 5, inversamente proporcional aos valores apresentados. O fator de proporcionalidade será uma unidade que corresponde a 25% do Preço Base” – v. 18.1 – e no fator “Valia técnica das propostas” as propostas são classificadas de 1 a 5, definindo, depois, a fórmula a aplicar para o efeito, não se vislumbrando que tais regras não estejam reflectidas nas correspondentes fórmulas fixadas.
Acresce que também a fórmula prevista no ponto 18.2 do programa de concurso para a determinação da Classificação Final reflecte a proporcionalidade e a ponderação definida pela Entidade Demandada para a avaliação das propostas, isto é, preço - 60% - e valia técnica da proposta - 40%.
O modelo de avaliação das propostas mostra-se, assim, em conformidade com as regras do procedimento concursal não se mostrando violados os invocados princípios da proporcionalidade e da igualdade.
*
Quanto à falta de fundamentação
A Autora invoca que na grelha de atribuição das pontuações a cada um dos candidatos não consta a respectiva fundamentação quanto à avaliação de cada um dos concorrentes; que as pontuações do Relatório Preliminar / Relatório Final são obscuras/confusas/imperceptíveis; que o Júri no relatório preliminar e no relatório final não explicitou de forma adequada e suficiente as razões que determinaram a pontuação atribuída à Autora, não sendo possível apurar o sentido das classificações apresentadas; que a valoração numérica definida nas grelhas não expõe de forma suficientemente densa, de forma adequada e suficiente, as razões que levaram ao resultado concreto, pelo que não foi cumprido o dever de fundamentação previsto no n.º 3 do art. 268.º da CRP e nos arts. 152.º e 153.º do CPA, o que constitui uma ilegalidade que afeta a validade do relatório final e da decisão de adjudicação, nos termos do art. 163.º do CPA.
Vejamos.
O direito à fundamentação tem hoje consagração constitucional de natureza análoga aos direitos, liberdades e garantias consagrados no Título II da parte 1ª da CRP - art. 268.º, - vertido em abundante jurisprudência do STA atinente a esta matéria, bem como, desenvolvido por Gomes Canotilho e Vital Moreira, (in Constituição da República Portuguesa Anotada, Wolters Kluwer, Agosto 2010, 4ª edição, Vol. II pp. 816 e ss e Vieira de Andrade, O Dever de Fundamentação Expressa dos Atos Administrativos, 1990, pp. 53 e ss.) - tendo o respetivo princípio constitucional sido densificado nos arts. 152.º e 153.º do CPA.
No que respeita a distinção entre fundamentação formal e fundamentação material, importa ter presente que: uma coisa é saber se a Administração deu a conhecer os motivos que a determinaram a atuar como atuou, as razões em que fundou a sua atuação, questão que se situa no âmbito da validade formal do ato; outra, bem diversa e situada já no âmbito da validade substancial do ato, é saber se esses motivos correspondem à realidade e se, correspondendo, são suficientes para legitimar a concreta atuação administrativa.
Dito isto, a falta ou insuficiência de fundamentação do ato, é um vício de natureza formal (e não substancial), e verifica-se quando o respetivo ato não exterioriza de modo claro, suficiente e congruente, as razões por que apresenta determinado conteúdo decisório. Assim, sendo, a falta ou insuficiência de fundamentação não se confunde com o vício decorrente de erro sobre os pressupostos, que ocorre quando, apesar de o autor do ato ter dado a conhecer as razões em que suporta a decisão, tais razões não são, todavia, apropriadas ou suficientes ou demandavam diversa solução.
Desta forma, a fundamentação deve ser contextual e integrada no próprio ato (ainda que de forma remissiva), expressa e acessível (através de sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito da decisão), clara (de modo a permitir que, através dos seus termos, se apreendam com precisão os factos e o direito com base nos quais se decide), suficiente (permitindo ao destinatário do ato um conhecimento concreto da motivação deste) e congruente (a decisão deverá constituir a conclusão lógica e necessária dos motivos invocados como sua justificação), equivalendo à falta de fundamentação a adoção de fundamentos que, por obscuridade, contradição ou insuficiência, não esclareçam concretamente a motivação do ato.
Ora, resulta do probatório que o Programa de Procedimento, nomeadamente do artigo 18 que a adjudicação seria feita segundo o critério da proposta mais vantajosa para a entidade adjudicante, determinada pela melhor relação qualidade-preço, tendo em conta os seguintes fatores e subfactores, com a respetiva ponderação: a) Preço – 60% O preço seria classificado de 1 a 5, inversamente proporcional aos valores apresentados. O fator de proporcionalidade seria uma unidade que corresponde a 25% do Preço Base. Os preços serão classificados através da seguinte fórmula: CP=5 - P ------------------ 0,25 ×PBASE
Em que: CP – Classificação do Preço em Análise; P – Preço em Análise;
PBASE – Preço Base para o presente procedimento.
b) Valia técnica da proposta – 40% O fator valia técnica da proposta será classificado de 1 a 5, avaliado através da seguinte fórmula: VT = (PT + MD)/2
Em que: VT – Classificação da Valia Técnica da Proposta; PT – Classificação do Plano de Trabalhos; MD – Classificação da Memória Descritiva: Avaliada através de: b.1) Plano de Trabalhos; b.2) Memória Descritiva.
A entidade demandada estabeleceu, por conseguinte, no modelo de avaliação uma escala de pontuação com os respetivos explicativos a que correspondia cada pontuação, explicativos esses que se mostram percetíveis a qualquer destinatário normal.
Com relevância para o caso em apreço remetemos para o Acórdão do STA de 21/01/2014, no Processo n.º 1790/13, que uniformiza a jurisprudência nos seguintes termos: A avaliação das propostas apresentadas em concurso tem-se por fundamentada através da valoração por elas obtida nos vários itens de uma grelha classificativa suficientemente densa, explicitando que, “O dever de fundamentar os actos administrativos cumpre funções múltiplas, em que sobressaem, para além do acréscimo da imparcialidade e da transparência, o esclarecimento («auto» e «hetero») do processo decisório e do seu resultado. Ora, a ponderação das propostas apresentadas num concurso mediante a referência delas aos itens de uma grelha classificativa suficientemente densa, a que se sigam as operações aritméticas que quantifiquem as propostas e permitam a sua graduação recíproca, exprime e comunica logo a valia de cada uma delas - seja sob os vários aspectos parcelares por que foram apreciadas, seja globalmente - bem como os motivos da classificação que obtiveram. Por isso, a jurisprudência habitual do STA - onde se filia o acórdão fundamento - vem dizendo que essas operações de subsunção das propostas aos vários critérios, factores ou itens da referida grelha explicam, «per se», a ponderação que lhes foi atribuída no concurso, sem necessidade de um discurso complementar que, no fundo, redundaria numa fundamentação do já fundamentado. São exemplos dessa linha decisória os acórdãos do Pleno do STA de 31/3/1998 e de 13/3/2003, proferidos, respectivamente, nos recs. ns.º 30.500 e 34.396; linha que persiste neste Supremo, como mostra o aresto, mais recente, de 26/4/2006, tirado no proc. n.º 2083/03 e que aplica a ideia de que o dever de fundamentação pode cumprir-se através do preenchimento de grelhas ou fichas previamente elaboradas. E nada justifica que rompamos com essa jurisprudência, que integralmente satisfaz as funções que a fundamentação prossegue, designadamente a de esclarecer qualquer destinatário dos motivos das pontuações atribuídas às propostas. Assim, e ao invés do que afirma a aqui recorrida, tal solução não fere quaisquer normas ou princípios constitucionais, pois habilita os interessados a compreender os fundamentos do acto classificador e a reagir em conformidade.”
Posto isto, consta do Relatório Preliminar a avaliação das propostas pelo Júri com atenção aos critérios elencados, tendo sido explicitados os cálculos envolvidos na classificação de cada uma das propostas apresentadas, ainda que através da elaboração de quadros, de onde constam as propostas apresentadas e a análise de cada uma delas em função do critério de adjudicação publicitado, com reporte aos factores e subfactores a ter em linha de conta.
Assim, podemos dizer que em sede de relatório preliminar foi efectuada a graduação das propostas dos concorrentes atribuindo a classificação respectiva em cada um dos subfactores, classificação essa que deu origem aos quadros classificativos que constam do relatório preliminar e que se mostram suficientemente elucidativos das razões que determinaram as pontuações atribuídas, bem como o itinerário cognoscitivo e valorativo que levou o Júri do Procedimento a classificar as diferentes propostas apresentadas pelos concorrentes.
Nesta medida, as classificações atribuídas às propostas dos concorrentes foram devidamente fundamentadas através da valoração por elas obtida e expressa nos vários itens da grelha classificativa.
O relatório preliminar mostra-se, pois, devidamente fundamentado e, por isso, não oferece razão à Autora no vício que lhe aponta, sendo percetível o caminho percorrido pela entidade adjudicante para chegar à decisão final tomada.
Quanto ao relatório final, o mesmo reflecte a avaliação do júri do procedimento quanto à pronuncia da Autora apresentada em sede de audiência prévia e remete integralmente para o relatório preliminar no que tange aos fundamentos e proposta de adjudicação, configurando uma concordância integral com a posição assumida no relatório preliminar e, assim, a decisão de adjudicação encontra-se suportada nos fundamentos do relatório prelimiar em que, por sua vez, o relatório final se sustentou.
Em face disso, tendo presente o teor do Relatório Preliminar e do Relatório Final, importa concluir que é possível compreender quais os motivos e critérios para a classificação de cada proposta, por relação ao critério de adjudicação escolhido.
Desta forma, encontra-se devidamente fundamentada a decisão de avaliação de propostas, resultando da pontuação obtida por cada proposta nos vários itens da grelha classificativa, os detalhes que permitem a cabal compreensão dessa classificação. Na verdade, a fundamentação do acto administrativo é suficiente se, no contexto em que foi praticado e atentas as razões de facto e de direito nele expressamente enunciadas, forem capazes ou aptas e bastantes para permitir que um destinatário normal apreenda o itinerário cognoscitivo e valorativo da decisão. É contextual quando se integra no próprio acto e dela é contemporânea. A mesma é, por sua vez, clara quando tais razões permitem compreender sem incertezas ou perplexidades qual foi o referido iter cogcitivo-valorativo da decisão, sendo congruente quando a decisão surge como a conclusão lógica e necessária de tais razões.
Como se concluía no acórdão do STA de 11.02.2010, proc. nº 541/09: “a fundamentação é um conceito relativo e por isso variável, sendo que o que é realmente importante é que através dela o destinatário do acto fique a conhecer das razões que o motivaram, de molde a se poder decidir pela sua impugnação ou aceitação”.
Ora, foi precisamente o que ocorreu no caso em apreço. A fundamentação adoptada pelo júri do procedimento permitiu a todos os concorrentes aferir as razões pelas quais obtiveram a concreta pontuação final, podendo facilmente escrutiná-las, se padecessem de algum erro de facto.
Pelo que, improcede o vício de falta de fundamentação do Relatório Preliminar e do Relatório Final, e consequentemente, do ato classificativo que levou à concreta decisão de adjudicação, nos termos invocados pela Autora.
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Quanto à avaliação/Pontuação do Fator “Preço”
A Autora sustenta que a pontuação global de cada proposta não corresponde ao resultado da somadas pontuações parciais obtidas em cada factor elementar, multiplicadas pelos valores dos respectivos coeficientes de valoração, pelo que não se verifica uma verdadeira e proporcional valorização do factor “preço” em 60% e da “valia técnica” em 40%, acrescentando que tendo em conta as pontuações obtidas pela Autora, deveria a mesma ter sido classificada em primeiro lugar, por ter apresentado a proposta economicamente mais vantajosa.
A avaliação das propostas consiste na atividade desenvolvida pelo júri do procedimento, em função dos fatores e subfatores fixados no programa do procedimento, que se traduz na apreciação do mérito de cada uma das propostas apresentadas ao concurso, pontuando-as de acordo com o critério de adjudicação em cada factor e subfactor e ordenando-as em conformidade com o modelo de avaliação que se mostra estabelecido no procedimento concursal.
Sucede, todavia, que da alegação produzida pela Autora não se antevê quais os erros cometidos pelo Júri do Procedimento nos cálculos aritméticos que fez para a determinação das classificações finais das propostas, nem tão pouco se alcança como chegaria a Autora ao reclamado primeiro lugar no procedimento concursal, pois certo é que a sua alegação é meramente genérica e conclusiva, não sendo apontados os concretos erros que considera terem sido cometidos, razão pela qual não estão reunidas as necessárias condições para deles conhecer de forma a sindicar o acto praticado.
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Quanto à avaliação/pontuação do Factor “Valia Técnica da Proposta”
A Autora discorda das pontuações que lhe foram atribuídas nos subfactores “Programa de Trabalhos” e “Memória Descritiva”, alegando que lhe deveria ter sido atribuída a pontuação de 5 quer no subfactor “Plano de Trabalhos”, quer no subfactor “Memória Descritiva”, concluindo que o Júri do procedimento deveria ter classificado a proposta da Autora em primeiro lugar, por ser a proposta economicamente mais vantajosa.
Mais uma vez a Autora não indica em concreto quais as razões pelas quais considera que deveria ter sido classificada com a pontuação de 5 nos subfactores Plano de Trabalhos e Memória Descritiva, não alegando qualquer ilegalidade cometida pelo Júri do Procedimento na apreciação das propostas nem apontando qual ou quais os erros que detectou na avaliação efectuada.
Acresce que a avaliação das propostas é considerada uma actividade que se enquadra no âmbito da actividade discricionária da administração no domínio da denominada justiça administrativa, e em que os limites da sua sindicabilidade contenciosa restringem-se às situações de legalidade externa, ao erro grosseiro ou manifesto ou então quando estejam em causa princípios gerais a que deveria obedecer qualquer procedimento administrativo, sendo pois, certo que, por maioria de razão, na avaliação do fator “Valia Técnica da Proposta” por banda do júri do procedimento se recorre certamente a tais juízos de discricionariedade técnica - v. Acórdão de 07-04-2017do TCAN proc. n.º 00305/16.9BEMD, segundo o qual, “…na avaliação do factor “Avaliação Técnica” intervém o que por excelência é momento de discricionariedade ou de exercício de poderes discricionários, campo do domínio da denominada “justiça administrativa”, isto é, envolve uma “liberdade de escolha entre várias soluções tidas como igualmente possíveis [a Administração escolhe livremente uma das soluções apontadas na lei, sendo tidas como igualmente boas, qualquer uma delas]. Por outro lado o controlo jurisdicional do poder discricionário obedece apenas ao controlo da legalidade não se estendendo à esfera da oportunidade, onde o poder discricionário ocupa o seu espaço por excelência. Só em casos extremos é que o tribunal poderá imiscuir-se no exercício da discricionariedade técnica da Administração, anulando os correspondentes atos administrativos com fundamento em "erro manifesto de apreciação" – Acórdão pelo TCAN, proferido no Proc. 02778/17.3BEBRG.
Atente-se, ainda, ao Acórdão do STA proc. 01472714, de 20-10-2016, que refere: “VIII. O júri do concurso na atividade de avaliação das propostas encontra-se vinculado ao estrito respeito daquilo que são as regras que se prendam com observância de formalidades e garantias procedimentais, das regras disciplinadoras da competência para a emissão de atos, da instrução probatória e fixação de factualidade que funcionem como pressuposto dos atos procedimentais [mormente, da avaliação das propostas e/ou da adjudicação], bem a todos e apenas aos fatores e subfatores densificadores do critério de adjudicação fixado no programa do procedimento ou decorrente de imposição constante de norma legal, não podendo fazer apelo a outros critérios ou a outros fatores/subfatores que não constem daquele programa ou que contrariem disposição legal imperativa, ou sequer atribuir-lhes ponderações e/ou pontuações/classificações diversas daquelas que se mostram fixadas no mesmo programa, ou ainda fazer apelo a sensibilidades, a juízos dubitativos ou assentes em opiniões veiculadas. IX. O exercício de atividade caraterizada como envolvendo momentos de discricionariedade ou de exercício de poderes discricionários, do domínio da denominada “justiça administrativa”, mostra-se também ele abrangido pela fiscalização jurisdicional, disso sendo exemplos, a ilegalidade por desvio de poder, a admissão da impugnação fundada no erro de facto ou na existência ou inexistência dos pressupostos de facto, na violação dos princípios gerais de direito, na violação de regra de competência, do dever de fundamentação, ou, ainda, na infração do direito de audiência/participação. X. No estrito âmbito da atividade de valoração e pontuação quanto a cada fator e subfator da grelha classificativa por parte do júri de propostas apresentadas nos procedimentos de contratação pública situamo-nos no domínio dum juízo de discricionariedade técnica, da referida “justiça administrativa”, em termos da livre apreciação sobre a valia das propostas ou da margem de livre apreciação de conceitos jurídicos indeterminados, e, como tal, os limites da sua sindicabilidade contenciosa, não respeitando a aspetos vinculados, mostram-se restringidos às situações de legalidade externa, ao erro grosseiro ou manifesto e/ou ao desrespeito dos princípios gerais que enformam o procedimento em questão e a atividade administrativa em geral. XI. Constitui “erro grosseiro” ou “erro manifesto” aquele erro crasso, palmar, ostensivo, que terá necessariamente de refletir um evidente e grave desajustamento da decisão administrativa perante a situação concreta, em termos de merecer do ordenamento jurídico uma censura particular mesmo em áreas de atuação não vinculadas”.
Ora, “se os modelos de avaliação devem prosseguir objectividade e transparência, eliminando puro subjectivismo, devem também permitir «“acomodar” as inovações e as “surpresas” constantes das propostas, e valorizá-las devidamente, o que só sucederá com recurso a expressões que concedam ao júri uma margem de livre apreciação” (Margarida Olazabal Cabral, o concurso público no CCP, in Estudos de Contratação Pública, CEDIPRE -I, Coimbra Editora, 2008, pág. 208).
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Ante o exposto, por não proceder nenhum dos fundamentos invocados pela Autora tidos como determinantes da invalidade da avaliação feita no procedimento concursal, improcede o pedido formulado de classificação da sua proposta em primeiro lugar.
X
Constitui entendimento unívoco da doutrina e obteve consagração legal o de que o objecto do recurso jurisdicional se encontra delimitado pelas conclusões extraídas da motivação, por parte do recorrente, não podendo o tribunal ad quem conhecer de matéria que nelas não tiver sido versada, com ressalva óbvia, dos casos que imponham o seu conhecimento oficioso.
Assim, vejamos,
É objecto de recurso esta sentença que julgou improcedentes os pedidos formulados na ação e que, em síntese, visavam a impugnação da decisão de adjudicação pela Ré da empreitada para a execução da reabilitação das coberturas e fachadas do Colégio de S. Pedro da Universidade de Coimbra à ora Recorrida, e ainda, a impugnação de documentos conformadores do Procedimento.
Em 1º plano há que sublinhar que a Recorrente reincide na argumentação apresentada em 1ª Instância, apontando vícios ao acto, como se a Senhora Juíza não os tivesse enfrentado e escalpelizado, e, quanto a nós, bem.
O probatório não foi posto em causa.
Ora, a Recorrente tinha o ónus no recurso que apresentou, de identificar concretamente os vícios/erros de julgamento que apontava à sentença proferida pelo Tribunal a quo e não o fez.
De facto, a Recorrente limita-se, no essencial, a reproduzir no seu recurso, o teor integral das alegações finais que apresentou nos autos, e reiterando apenas nas alegações de recurso os vícios que já atribuíra ao ato impugnado, sem ter em consideração a peça processual em causa - sentença - e respetiva fundamentação - que foi proferida pelo Tribunal relativamente ao indeferimento das suas pretensões.
Assim, quanto aos fundamentos da sentença e os seus alegados vícios, nada registou nas alegações de recurso, para além da genérica invocação de “erro de julgamento”, embora sem a devida concretização ou fundamentação.
Numa análise mais formalista, esta situação imporia a liminar rejeição do recurso.
Com efeito, trazem-se à liça os Acórdãos do STA, de 15/03/2007 e de 19/12/2006, processos 0209/05 e 0594/06, entre tantos outros, onde expressivamente se afirma que “O objeto do recurso jurisdicional é a sentença recorrida e não o ato administrativo sobre que esta se pronunciou, o que obriga o Recorrente a demonstrar nas alegações e conclusões do recurso o desacerto daquela sentença, indicando as razões que o levam a concluir pela sua anulação ou alteração. Se o não fizer, e se se limitar a repetir os argumentos que o levaram a impugnar o ato recorrido, o recurso terá, fatalmente, de improceder” e que “O recurso jurisdicional tem por objeto a sentença recorrida e não o ato contenciosamente impugnado, o que obriga o recorrente a dirigir a sua crítica à sentença pelos erros que esta cometeu e que devem conduzir à sua revogação, improcedendo o recurso se o recorrente, na sua alegação, se limita a atacar o ato administrativo contenciosamente impugnado, não fazendo qualquer referência crítica às razões e fundamentos da sentença recorrida. Como tem sido reafirmado por este STA, designadamente pelo Pleno (cfr., por todos, o Ac. Pleno da 1ª Secção de 21.09.2000, rec. 38.828), o recurso jurisdicional tem por objeto a sentença recorrida e não o ato contenciosamente impugnado, o que obriga o recorrente a dirigir a sua crítica à sentença pelos erros que esta cometeu e que devem conduzir à respetiva revogação, improcedendo o recurso se o recorrente na sua alegação, se limita a atacar o ato administrativo contenciosamente impugnado, não fazendo qualquer referência crítica às razões e fundamentos específicos da sentença recorrida”.
No entanto sempre se dirá, sem prejuízo do referido, que os pedidos invocados na ação pela Recorrente relativamente ao ato impugnado e documentos conformadores do procedimento - e agora reiterados neste recurso - foram devidamente ponderados pelo Tribunal a quo, que os considerou, de forma fundamentada, integralmente improcedentes na decisão que proferiu.
Ademais, as alegações aduzidas pela Recorrente também não podem ser atendidas, em face do seguinte:
- Da alegada invalidade do modelo de avaliação -
A Recorrente vem novamente invocar nesta sede - mas sem apontar, objetivamente, qualquer vício à decisão recorrida - a sua discordância relativamente ao modelo definido para avaliação das propostas, fatores e expressão matemática respetivas, alegando que ocorreu erro de cálculo da pontuação global das propostas, em violação do critério de adjudicação da proposta mais vantajosa.
E, com base nessa alegação, reiterou nas suas alegações ter ocorrido no procedimento concursal a violação dos princípios da legalidade, prossecução do interesse público, proporcionalidade, tutela da confiança, sustentabilidade e responsabilidade, concorrência, publicidade e transparência, proporcionalidade e igualdade de tratamento e não discriminação, e, por conseguinte, do disposto nos artigos 1.º-A, 74.º, 75.º, 132.º n.º 1 al. n), 139.º do CCP.
Ora, relativamente a essa alegação da Recorrente, foi corretamente entendido na sentença proferida: Acontece que desta alegação conclusiva da Autora não é possível vislumbrar a razão da discordância em relação ao efectivo juízo formulado quanto à alia técnica das propostas e dos respectivos preços, sendo certo que resulta do probatório que o critério de adjudicação e modelo de avaliação das propostas plasmado no ponto 18. do programa do concurso respeita os normativos aplicáveis e a sua efectiva aplicação às propostas apresentadas não apresenta quaisquer desconformidades. Na verdade, no modelo de avaliação foram concretizados em relação ao subfactor “valia técnica” várias escalas de pontuação com recurso a referências esclarecedoras, que permitiram a todos os concorrentes, antecipadamente, ter conhecimento das razões da pontuação que veio a ser adotada na avaliação das propostas, em cada um dos subfactores, pelo Júri do Procedimento. Todas as fórmulas definidas pela entidade adjudicante no modelo de avaliação para a determinação da “Classificação do Preço em Análise” (CP), “Classificação da Valia Técnica da Proposta” (VT) e “Classificação Final” (CF), contêm uma determinada graduação que garante uma ponderação proporcional bem assim como uma valorização dos fatores e subfactores na determinação da proposta economicamente mais vantajosa.
E, foram essas fórmulas que antecipadamente foram divulgadas e por todos os interessados conhecidas que foram adoptadas aquando da elaboração da classificação final, quer em sede do relatório preliminar quer em sede de relatório final.
Assim sendo, o modelo de avaliação fixado no programa de concurso acautela uma ponderação e valorização proporcional das propostas e foi efectivamente respeitado aquando da efectiva ponderação dos factores (e subfactores) fixados. No que tange ao Fator “Preço”, estabelece o programa de concurso que “o preço será classificado de 1 a 5, inversamente proporcional aos valores apresentados. O fator de proporcionalidade será uma unidade que corresponde a 25% do Preço Base” - v. 18.1 - e no fator “Valia técnica das propostas” as propostas são classificadas de 1 a 5, definindo, depois, a fórmula a aplicar para o efeito, não se vislumbrando que tais regras não estejam reflectidas nas correspondentes fórmulas fixadas. Acresce que também a fórmula prevista no ponto 18.2 do programa de concurso para a determinação da Classificação Final reflecte a proporcionalidade e a ponderação definida pela Entidade Demandada para a avaliação das propostas, isto é, preço - 60% - e valia técnica da proposta - 40%. O modelo de avaliação das propostas mostra-se, assim, em conformidade com as regras do procedimento concursal não se mostrando violados os invocados princípios da proporcionalidade e da igualdade.
De facto, face à prova (documental) produzida, constata-se que o critério de adjudicação e modelo de avaliação das propostas plasmado no ponto 18. do programa do concurso cumpre todas as determinações em causa, pois no modelo de avaliação foram concretizados em relação ao subfactor “valia técnica” vários graus valorativos (escalas de pontuação) com recurso a menções descritivas, que permitiram a todos os concorrentes um conhecimento prévio e adequado das razões da valoração que veio a ser adotada na avaliação das propostas, em cada um dos subfactores.
Acresce que todas as fórmulas matemáticas definidas pela Ré no modelo de avaliação para a determinação da “Classificação do Preço em Análise” (CP), “Classificação da Valia Técnica da Proposta” (VT) e “Classificação Final” (CF), têm subjacente graduações adequadas a garantir a proporcional ponderação e valorização dos fatores e subfactores na determinação da proposta economicamente mais vantajosa.
O modelo de avaliação reflete, assim, uma proporcional valorização e pontuação das propostas dos concorrentes, como é expressamente evidenciado nos fatores e subfactores do próprio modelo de avaliação, e plasmado nas fórmulas de cálculo adotadas para o efeito, sendo que os cálculos aritméticos para a determinação da pontuação final a atribuir a cada uma das propostas, foram corretamente efetuados pelo Júri do Procedimento, em conformidade com as fórmulas matemáticas em causa.
O modelo de avaliação das propostas está conforme à lei que rege a contratação pública e os resultados de avaliação das propostas refletem a aplicação desse mesmo modelo de avaliação, pelo que o mesmo não viola quaisquer normas do CCP, nem se verifica qualquer violação dos princípios da concorrência, da proporcionalidade e da igualdade.
Assim sendo, corrobora-se o entendimento do aresto recorrido ao sufragar a validade do modelo de avaliação que consta das peças do procedimento não merecendo, por isso, qualquer censura, nem incorrendo em qualquer erro de julgamento quanto a este segmento.
E o que dizer da alegada falta de fundamentação?
Tão só que a Recorrente vem invocar no seu recurso, reiterando o já alegado na P.I. e alegações finais em sede de acção, que na grelha de atribuição das pontuações a cada um dos candidatos não constaria a respetiva fundamentação quanto à avaliação de cada um dos concorrentes; que as pontuações do Relatório Preliminar / Relatório Final seriam obscuras/confusas/impercetíveis; que o Júri no relatório preliminar e no relatório final não explicitou de forma adequada e suficiente as razões que determinaram a pontuação atribuída à Recorrente, não sendo possível apurar o sentido das classificações apresentadas; que a valoração numérica definida nas grelhas não expõe de forma suficientemente densa, de forma adequada e suficiente, as razões que levaram ao resultado concreto, pelo que que não teria sido cumprido o dever de fundamentação previsto no n.º 3 do artigo 268.º da CRP e nos artigos 152.º e 153.º do CPA, o que constituiria uma ilegalidade que afetava a validade do relatório final e da decisão de adjudicação, nos termos do artigo 163.º do CPA.
Ora, mais uma vez decidiu com acerto o Tribunal a quo, referindo, quanto a esta matéria: a entidade demandada estabeleceu, por conseguinte, no modelo de avaliação uma escala de pontuação com os respetivos explicativos a que correspondia cada pontuação, explicativos esses que se mostram percetíveis a qualquer destinatário normal.
(…)
Nesta medida, as classificações atribuídas às propostas dos concorrentes foram devidamente fundamentadas através da valoração por elas obtida e expressa nos vários itens da grelha classificativa.
O relatório preliminar mostra-se, pois, devidamente fundamentado e, por isso, não oferece razão à Autora no vício que lhe aponta, sendo percetível o caminho percorrido pela entidade adjudicante para chegar à decisão final tomada.
Como é entendimento da jurisprudência em matéria dos procedimentos concursais de contratação pública, as decisões administrativas de classificação ou valoração do mérito devem considerar-se suficientemente fundamentadas desde que dos respetivos relatórios constem, diretamente ou por remissão para outras peças do procedimento, os elementos, fatores, parâmetros ou critérios com base nos quais o órgão decisor procedeu à ponderação determinante do resultado concreto a que chegou.
Sumariou-se no Acórdão do STA de 21/01/2014, proc. 01790/13:
I-…..
II-A avaliação das propostas apresentadas num concurso tem-se por fundamentada através da valoração por elas obtida nos vários itens de uma grelha classificativa minimamente densa.
Como manifestamente se constata dos relatórios produzidos no iter concursal em análise e assim foi considerado na sentença recorrida:
Com relevância para o caso em apreço remetemos para o Acórdão do STA de 21/01/2014, no Processo n.º 1790/13, que uniformiza a jurisprudência nos seguintes termos: A avaliação das propostas apresentadas em concurso tem-se por fundamentada através da valoração por elas obtida nos vários itens de uma grelha classificativa suficientemente densa, explicitando que, “O dever de fundamentar os actos administrativos cumpre funções múltiplas, em que sobressaem, para além do acréscimo da imparcialidade e da transparência, o esclarecimento («auto» e «hetero») do processo decisório e do seu resultado. Ora, a ponderação das propostas apresentadas num concurso mediante a referência delas aos itens de uma grelha classificativa suficientemente densa, a que se sigam as operações aritméticas que quantifiquem as propostas e permitam a sua graduação recíproca, exprime e comunica logo a valia de cada uma delas - seja sob os vários aspectos parcelares por que foram apreciadas, seja globalmente - bem como os motivos da classificação que obtiveram. Por isso, a jurisprudência habitual do STA - onde se filia o acórdão fundamento - vem dizendo que essas operações de subsunção das propostas aos vários critérios, factores ou itens da referida grelha explicam, «per se», a ponderação que lhes foi atribuída no concurso, sem necessidade de um discurso complementar que, no fundo, redundaria numa fundamentação do já fundamentado. São exemplos dessa linha decisória os acórdãos do Pleno do STA de 31/3/1998 e de 13/3/2003, proferidos, respectivamente, nos recs. ns.º 30.500 e 34.396; linha que persiste neste Supremo, como mostra o aresto, mais recente, de 26/4/2006, tirado no proc. n.º 2083/03 e que aplica a ideia de que o dever de fundamentação pode cumprir-se através do preenchimento de grelhas ou fichas previamente elaboradas. E nada justifica que rompamos com essa jurisprudência, que integralmente satisfaz as funções que a fundamentação prossegue, designadamente a de esclarecer qualquer destinatário dos motivos das pontuações atribuídas às propostas. Assim, e ao invés do que afirma a aqui recorrida, tal solução não fere quaisquer normas ou princípios constitucionais, pois habilita os interessados a compreender os fundamentos do acto classificador e a reagir em conformidade.”


Destarte, bem andou o Tribunal, o que equivale a dizer que o aresto em referência não padece de qualquer erro de julgamento quanto a esta temática.
Da alegada invalidade na avaliação/pontuação do factor “Preço” -
Ora, constata-se que também neste domínio a Recorrente se limita a reproduzir no recurso o já alegado na P.I. e alegações finais que produziu, sem, contudo, identificar os vícios que assaca à sentença.
E, neste âmbito, registe-se que nada na argumentação aduzida pela Recorrente permitiu perceber quais os alegados erros que imputa à avaliação do Júri do Procedimento relativamente aos cálculos aritméticos que fez para a determinação das classificações finais das propostas, maxime no fator “Preço” nem permite perceber como da aplicação das fórmulas expressas do procedimento poderia resultar ser a sua proposta a economicamente mais vantajosa, e assim classificada em primeiro lugar.
Como sublinhado na sentença: sucede que da alegação produzida pela Autora não se anteveem quais os erros cometidos pelo Júri do Procedimento nos cálculos aritméticos que fez para a determinação das classificações finais das propostas, nem tão pouco se alcança como chegaria a Autora ao reclamado primeiro lugar no procedimento concursal, pois certo é que a sua alegação é meramente genérica e conclusiva, não sendo apontados os concretos erros que considera terem sido cometidos, razão pela qual não estão reunidas as necessárias condições para deles conhecer de forma a sindicar o acto praticado.
Assim sendo, também relativamente a esta matéria a sentença não merece reparo nem se vislumbra ter incorrido em qualquer erro de julgamento.
Quanto à alegada invalidade na avaliação/pontuação do factor “Valia Técnica da Proposta” -
No que tange a esta alegada invalidade, a argumentação da Recorrente cingiu-se, novamente, a uma mera crítica, infundada, à apreciação técnica da sua proposta levada a cabo pelo Júri do Procedimento - sem apontar quaisquer vícios à sentença proferida - por não se conformar com as classificações que lhe foram atribuídas em conformidade com o modelo de avaliação adotado pela Ré no procedimento de concurso, o que significa que, outra vez, não acertou no alvo.
De todo o modo, nada a apontar à sentença ao referir: Mais uma vez a Autora não indica em concreto quais as razões pelas quais considera que deveria ter sido classificada com a pontuação de 5 nos subfactores Plano de Trabalhos e Memória Descritiva, não alegando qualquer ilegalidade cometida pelo Júri do Procedimento na apreciação das propostas nem apontando qual ou quais os erros que detectou na avaliação efectuada.
Acresce, como bem realçado pela Senhora Juíza, que, integrando a avaliação feita pelo Júri do Procedimento no fator “Valia Técnica da Proposta”, matéria abrangida pela sua discricionariedade técnica, a mesma não é sequer sindicável na sede jurisdicional, sem que exista, no limite e inequivocamente, erro grosseiro nessa avaliação, o que, no caso concreto, manifestamente, não aconteceu, e não foi, sequer, alegado ou demonstrado pela Autora/Apelante.
Tudo, pois, a conduzir à ausência de censura jurídica à decisão proferida pelo Tribunal a quo.
Em suma:
-A Recorrente passou ao lado da sentença, concentrando-se, novamente no acto administrativo impugnado, quando é certo que o objeto do recurso jurisdicional é a sentença recorrida e não o ato administrativo sobre que esta se pronunciou, o que obriga o recorrente a demonstrar nas alegações e conclusões do recurso o desacerto da sentença, indicando as razões que o levam a concluir pela sua anulação ou alteração. Se o não fizer, e se se limitar a repetir os argumentos que o levaram a impugnar o ato recorrido, o recurso terá de improceder - Acórdão deste TCAN de 22/9/2017, proc. 02134/14.5BEPRT;
I-Os recursos jurisdicionais visam modificar as decisões recorridas e daí que o seu objecto sejam os vícios e os erros de julgamento que o recorrente lhes atribua.
II-Daí que se torne imprescindível que o recorrente na sua alegação de recurso desenvolva um ataque pertinente e eficaz aos elementos do silogismo judiciário em que se apoiou a decisão recorrida - Acórdão do STA de 07/01/2009, proc. 0812/08;
-De facto, a Recorrente limita-se, no essencial, a reproduzir no seu recurso, o teor integral das alegações finais que apresentou na acção, repetindo os vícios que já atribuíra ao ato impugnado;
-Assim, quanto aos fundamentos da sentença e os seus alegados vícios, nada registou nas suas alegações de recurso, para além da genérica invocação de “erro de julgamento”, reitere-se, sem a devida concretização ou fundamentação;
-Esta situação inquina, irremediavelmente, o recurso interposto pela Recorrente e deveria impor a sua liminar rejeição;
-Sem prejuízo do afirmado, os pedidos invocados na ação pela Recorrente relativamente ao ato impugnado e documentos conformadores do procedimento - e agora reiterados neste recurso - foram devidamente ponderados pelo Tribunal a quo, que os considerou, de forma fundamentada;
-Não se deteta, nem sequer foi minimamente densificada, a suposta violação no procedimento concursal subjudice dos princípios da legalidade, prossecução do interesse público, proporcionalidade, tutela da confiança, sustentabilidade e responsabilidade, concorrência, publicidade e transparência, proporcionalidade e igualdade de tratamento e não discriminação, e, por conseguinte, do disposto nos artigos 1.º-A, 74.º, 75.º, 132.º/1/n) e 139.º do CCP;
-Por seu turno, o relatório preliminar mostra-se devidamente fundamentado e, por isso, não oferece razão à Autora no vício que lhe aponta, sendo perfeitamente percetível o caminho percorrido pela entidade adjudicante para chegar à decisão final tomada;
-Já quanto à apontada matéria abrangida pela discricionariedade técnica revemo-nos, de igual modo, na leitura do Tribunal a quo;
-A mesma não é sindicável na sede jurisdicional, sem que exista, no limite e inequivocamente, erro grosseiro nessa avaliação, o que, no caso em apreço, manifestamente, não aconteceu, e nem foi, sequer, alegado ou demonstrado pela Recorrente;
-Discricionário significa, “livre dentro dos limites permitidos pela realização de certo fim. O fim é o vínculo: corresponde a um requisito de validade cuja falta produz a invalidade do acto administrativo” - Marcello Caetano, em Direito Administrativo, 1º vol., 1991, pág. 486.
Apelando ao Prof. Mário Aroso: “É, pois, errada a ideia de que “a garantia constitucional de tutela jurisdicional administrativa implicaria uma revisibilidade jurisdicional sem limites da aplicação administrativa de qualquer passagem da lei” Para mais desenvolvimentos, cfr. Sérvulo Correia, “Conceitos jurídicos indeterminados e âmbito do controlo jurisdicional”, em Cadernos de Justiça Administrativa n.° 70, pp. 55 segs.
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Pelo contrário, o equilíbrio entre os princípios da tutela jurisdicio­nal efetiva e da separação e interdependência de poderes é alcançado através da imposição de limites funcionais à jurisdição administrativa. Uma vez que a intervenção dos tribunais no julgamento de litígios emer­gentes de relações jurídico-administrativas envolve um juízo sobre a legi­timidade do exercício de uma outra função do Estado, a função admi­nistrativa, têm necessariamente de decorrer do princípio da separação de poderes limites funcionais a esta atividade de fiscalização, de modo a evitar que ela invada o núcleo essencial da função administrativa Cfr. Vieira de Andrade, A Justiça Administrativa, 15ª ed., Coimbra, 2106, p. 94.
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O legislador do Código de Processo dos Tribunais Administrativos (CPTA) procurou, aliás, garantir o respeito por esses limites funcionais em diversos preceitos, reportados aos momentos processuais em que são maiores as zonas de indefinição e de risco de sobreposição entre as áreas de decisão administrativa e jurisdicional.
(….)
Pode dizer-se que a margem de livre apreciação administrativa se carateriza pela outorga, pela lei, à Administração de prerrogativas de avaliação valorativa ou de prognose no preenchimento de conceitos normativos, cuja aplicação envolve uma indagação, formada a partir de factos existentes e conhecidos (base da prognose), para, servindo-se de princípios reconhecidos de experiência, se projetar sobre a ocorrência (provável) de um acontecimento futuro Cfr. Sérvulo Correia, Direito do Contencioso Administrativo, vol. I, Lisboa, 2005, pp. 622 e segs.
Para que se reconheça a existência de um espaço de livre aprecia­ção da Administração não é suficiente que a resolução autodeterminada de uma concreta situação social se faça através de um juízo valorativo. Exige-se, igualmente, que esta valoração seja própria do exercício da função administrativa. Trata-se de espaços que, no quadro do princípio da separação de poderes, a lei considera adequado reservar para a Ad­ministração, em domínios em que entende que ela dispõe de maior ido­neidade funcional para o efeito, em razão da sua estrutura orgânica, res­ponsabilidade política, legitimidade democrática e específicos meios e procedimentos de atuação Cfr. António Cadilha, “Os poderes de pronúncia jurisdicionais na ação de condenação à prática de ato devido e os limites funcionais da jurisdição administrativa”, em Estudos em Homenagem ao Prof. Doutor Sérvulo Correia, vol. II, Coimbra, 2010, p. 186; Nuno Piçarra, “A Separação de Poderes na Constituição de 1976”, em Nos dez anos da Constituição, Lisboa, 1986, p. 151..
Ora, neste enquadramento, uma das figuras técnico-jurídicas que, quer a jurisprudência, quer a doutrina, tendem a integrar nos espaços de livre apreciação administrativa, destinados a ser exercidos autonoma­mente pela Administração, é a chamada discricionariedade técnica.
No seu sentido mais rigoroso, esta expressão designa a atividade valorativa própria do exercício da função administrativa que tem como especificidade o facto de ser fundamentada em regras ou critérios de na­tureza técnica, cuja aplicação a cada caso concreto não dita, objetivamen­te, uma única solução correta, em termos de demonstração irrefutável, mas, pelo contrário, envolve a formulação de avaliações ou prognoses que a lei reserva para a Administração, por entender que ela dispõe de maior idoneidade funcional para o efeito, e que, por isso, não podem ser repetidas pelo juiz, ainda que através do recurso a prova pericial Para mais desenvolvimentos, cfr. Sérvulo Correia, “Conceitos jurídicos indetermina­dos e âmbito do controlo jurisdicional”, pp. 38 segs...
Com efeito, ao conceder ao agente administrativo prerrogativas de avaliação valorativa ou de prognose no preenchimento de conceitos nor­mativos, “o legislador confia-lhe a 'descoberta', sob responsabilidade ins­titucional administrativa, do sentido de tal juízo; um sentido delimitado mas não determinado por parâmetros jurídicos”, que, por isso, não é apre­ensível por modo hermenêuticoCfr. Sérvulo Correia, “Conceitos jurídicos indeterminados e âmbito do controlo júris­dicional”, p. 39.

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Ora, é esta circunstância que explica que os juízos formulados pela Administração no exercício de prerrogativas de avaliação enquadradas no âmbito da discricionariedade técnica, em sentido verdadeiro e próprio, não possam ser repetidos pelo juiz. Em conformidade com o princípio da separação de poderes, o juiz não pode, na verdade, arrogar-se a “última decisão” na aplicação de normas “através das quais o legislador comete à Administração uma concretização baseada num juízo de prognose ou de valoração metajurídica” - vide o parecer junto ao Proc. 181/16.1 BEMDL;
-Ainda a este respeito sumariou-se no Acórdão do STA de 24/6/2021, proc. 01519/10.0BELRA:
I-O princípio da separação de poderes impede o poder judicial de sindicar o que respeita à “conveniência ou oportunidade” da decisão administrativa;
II-O poder judicial não pode intrometer-se na área reservada à discricionariedade técnica da Administração, a não ser em casos de violação de regras ou princípios jurídicos que se impõem à actividade administrativa, de desvio de poder, ou de erro manifesto;

(…).
Sucumbem, assim, as conclusões da Apelante.

Tal equivale a dizer que a sentença - que se mostra alicerçada na factualidade tida por assente e não questionada, na Doutrina e na Jurisprudência que citou - será mantida na ordem jurídica.
DECISÃO
Termos em que se nega provimento ao recurso.
Custas pela Autora/Recorrente.
Notifique e DN.
Porto, 21/07/2021
Fernanda Brandão
Rogério Martins
Luís Garcia
_____________________________________________
i) Cfr.ACÓRDÃO disponível em http://www.dgsi.pt/jtcn.nsf/-/4A839C0DBE1B25C580257F8F0055D095

ii) Para mais desenvolvimentos, cfr. Sérvulo Correia, “Conceitos jurídicos indeterminados e âmbito do controlo jurisdicional”, em Cadernos de Justiça Administrativa n.° 70, pp. 55 segs.

iii) Cfr. Vieira de Andrade, A Justiça Administrativa, 15ª ed., Coimbra, 2106, p. 94.

iv) Cfr. Sérvulo Correia, Direito do Contencioso Administrativo, vol. I, Lisboa, 2005, pp. 622 e segs

v) Cfr. António Cadilha, “Os poderes de pronúncia jurisdicionais na ação de condenação à prática de ato devido e os limites funcionais da jurisdição administrativa”, em Estudos em Homenagem ao Prof. Doutor Sérvulo Correia, vol. II, Coimbra, 2010, p. 186; Nuno Piçarra, “A Separação de Poderes na Constituição de 1976”, em Nos dez anos da Constituição, Lisboa, 1986, p. 151.

vi) Para mais desenvolvimentos, cfr. Sérvulo Correia, “Conceitos jurídicos indetermina­dos e âmbito do controlo jurisdicional”, pp. 38 segs..

vii) Cfr. Sérvulo Correia, “Conceitos jurídicos indeterminados e âmbito do controlo júris­dicional”, p. 39.