Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00610/19.2BEPRT
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:10/22/2021
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Paulo Ferreira de Magalhães
Descritores:: SUBSÍDIO DE DESEMPREGO; PRESTAÇÕES FUTURAS DEPENDENTES DE CONDIÇÕES INCERTAS; ERRO DE JULGAMENTO.
Sumário:1 - O regime jurídico de proteção social na eventualidade de desemprego dos trabalhadores por conta de outrem consta do Decreto-Lei n.º 220/2006, de 3 de novembro, constituindo uma concretização do direito à segurança social consagrado no artigo 63.º da Constituição da República Portuguesa.

2 – Nos termos do artigo 36.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 220/2006, de 3 de novembro, as prestações de desemprego são devidas desde a data de requerimento expresso nesse sentido a apresentar pelo beneficiário, no prazo de 90 dias contado desde o início da situação de desemprego, a qual coincide com o dia seguinte ao da cessação do contrato de trabalho [Cfr. artigo 21.º, n.º 1 do mesmo diploma legal].

3 – Sempre que estejam verificados os termos e os pressupostos determinantes da concessão das prestações de desemprego, e como regra, está o Réu constituído no dever legal de efectuar o seu pagamento, o qual não é algo que ocorra de forma automática e em termos de constituir um direito impossível de reverter face ao beneficiário, já que o direito a percepcionar o subsídio cessa/suspende-se, desde logo, se o mesmo exercer função remunerada, ou for incurso em processo de formação profissional com atribuição de compensação remuneratória [Cfr. artigos 41.º, 42.º, 50.º, 52.º e 53.º, todos do Decreto-Lei n.º 220/2006, de 03 de novembro].

4 - Tendo o Autor o direito de percepcionar o subsídio de desemprego pelo período ainda não decorrido, até ser completado o computo de 1039 dias, o que lhe advém de forma legal e legitimamente, da decisão contida sob a alínea b) do segmento decisório, de todo o modo, para que o Réu se mantenha constituído nesse dever de pagar, é necessário que o Autor continue a reunir as condições para o efeito, e não se interponha nenhuma razão/fundamento determinante da cessação ou da suspensão desse pagamento, razão pela qual não pode o Instituto da Segurança Social, ser condenado a pagar uma concreta quantia ao Autor, que é relativa a prestações futuras, ainda não vencidas, e sempre dependentes de condições que são de verificação incerta.*
* Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:INSTITUTO DA SEGURANÇA SOCIAL
Recorrido 1:A.
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Especial para Impugnação de Acto Administrativo (CPTA) - Recurso Jurisdicional
Decisão:Conceder provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:
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I - RELATÓRIO

INSTITUTO DA SEGURANÇA SOCIAL, IP [devidamente identificado nos autos] inconformado, veio interpor recurso jurisdicional da Sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, datada de 31 de dezembro de 2019 [pela qual julgou parcialmente procedente o pedido contra si formulado a final da Petição inicial pelo Autor A. – também devidamente identificado nos autos [atinente ao pedido de declaração de nulidade ou a anulação da decisão do Sr. Diretor da Segurança Social, do Centro Distrital do Porto da Entidade Demandada, de 10/01/2019, devendo a mesma ser substituída por outra que defira o requerimento de prestações de desemprego apresentado pelo Autor na sequência do desemprego involuntário de 11/08/2017 e lhe conceda as prestações de desemprego a partir da data de 13/09/2017, no montante diário de 31,34€, pelo período de concessão de 1140 dias; e a condenação da Entidade Demandada a pagar-lhe as prestações de desemprego em falta no valor de 8.235,95€, acrescida dos juros de mora, à taxa legal em vigor, até efetivo e integral pagamento] tendo vindo a condená-lo a pagar ao Autor a quantia de €2.749,20 [quantia esta que veio a ser objecto de rectificação pelo Tribunal a quo, por seu despacho datado de 13 de fevereiro de 2020, tendo-a fixado no montante de €8.235,95].
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No âmbito das Alegações por si apresentadas, elencou a final as conclusões que ora se reproduzem:

“[…]
1 - A SENTENÇA RECORRIDA CONDENA NO PAGAMENTO PRESENTE DE PRESTAÇÕES FUTURAS E DEPENDENTES DE CONDIÇÕES INCERTAS, em flagrante violação dos art. 95 do CPTA, para além dos art.º 41 e 42, e ainda 50, 52 , 53 do Decreto-lei 220/2006, de 3-11.
2 - Já que condena, de imediato, ao pagamento de todas as prestações até ao fim da concessão, incluindo as futuras, sem atender ao requisitos legais de pagamento, (deveres do beneficiário -art. 41 e 42 ) factos futuros e incertos ;
3 - E, por outro lado, sem atender também, à eventual superveniencia de circunstâncias susceptíveis de suspender ou cessar a concessão antes de se ter completado os pagamentos ou de influenciar os reinícios, pelo que, nessa parte da alínea c da condenação deverá ser revogada
- Deverá ser admitido o presente recurso de apelação nos termos dos art. 140 do CPTA.
- Julgando-se procedente o recurso e revogando-se o Acórdão recorrido pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, na parte impugnada, fará o Tribunal Justiça.”
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O Recorrido A., não apresentou Contra alegações.
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O Tribunal a quo proferiu despacho de admissão dos recursos, fixando os seus efeitos.
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O Ministério Público junto deste Tribunal Superior emitiu parecer sobre o mérito do presente recurso jurisdicional, no sentido da improcedência da pretensão recursiva do Recorrente.
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Com dispensa dos vistos legais [mas com envio prévio do projecto de Acórdão], cumpre apreciar e decidir.
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II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelo Recorrente, cujo objecto do recurso está delimitado pelas conclusões das respectivas Alegações - Cfr. artigos 144.º, n.º 1 do CPTA, e artigos 635.º n.ºs 4 e 5 e 639.º, ambos do Código de Processo Civil (CPC), ex vi artigos 1.º e 140.º, n.º 3 do CPTA [sem prejuízo das questões que o Tribunal ad quem deva conhecer oficiosamente], sendo que, de todo o modo, em caso de procedência da pretensão recursiva, o Tribunal ad quem não se limita a cassar a decisão judicial recorrida pois que, ainda que a declare nula, sempre tem de decidir “… o objecto da causa, conhecendo do facto e do direito.”, reunidos que estejam os necessários pressupostos e condições legalmente exigidas.

Assim, as questões suscitadas pelo Recorrente Instituto da Segurança Social, IP, e patenteadas nas conclusões das suas Alegações resumem-se, em suma e a final, em apreciar e decidir sobre se a Sentença recorrida padece de erro de julgamento na vertente da interpretação e aplicação do direito.
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III - FUNDAMENTOS
IIIi - DE FACTO

No âmbito da factualidade considerada pela Sentença recorrida, dela consta o que por facilidade para aqui se extrai como segue:

“[…]
Com relevância para a decisão da causa, são os seguintes os factos provados:

1. O Autor trabalhou na empresa “C., Lda.”, pessoa coletiva n.º (…), com sede na Rua (…), de 1/11/2008 a 11/08/2017, como falso trabalhador independente (cfr. fls. 61 a 69 e 84 do PA em suporte eletrónico e acordo das partes).

2. A fim de ver reconhecida a sua relação de trabalho subordinado, em 02/02/2017, o Autor apresentou uma queixa/denúncia junto da Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT), pugnando pela intervenção fiscalizadora dessa entidade (cfr. fls. 61 a 69 do PA em suporte eletrónico e acordo das partes).

3. Na sequência de ação inspetiva levada a cabo pela ACT, em 24/04/2017, foi entendido que o Autor prestava atividade por conta/benefício da empresa “C., Lda.”, em condições análogas às exigidas por um contrato de trabalho e, consequentemente, comunicado ao Senhor Procurador da República junto do Tribunal do Trabalho de Matosinhos para os efeitos legais (cfr. fls. 61 a 69 do PA em suporte eletrónico e acordo das partes).

4. Em 27/07/2017, o Sr. Procurador da República intentou o competente processo especial de reconhecimento da existência de contrato de trabalho, que correu termos sob o n.º 3829/17.7T8MTS, no Tribunal Judicial da Comarca do Porto, Juízo do Trabalho de Matosinhos, Juiz 3 (cfr. fls. 61 a 69 do PA em suporte eletrónico e acordo das partes).

5. Na sequência, em 11/08/2017, a empresa encerrou as suas instalações e o recorrente viu-se confrontado com uma situação de desemprego involuntário (cfr. fls. 84 do PA em suporte eletrónico).

6. Ainda na pendência da ação judicial atrás identificada, em 13/09/2017, o Autor inscreveu-se no Centro de Emprego de Matosinhos (cfr. fls. 81 do PA em suporte eletrónico).

7. Na sequência da sua inscrição no centro de emprego, em 13/09/2017, o Autor endereçou pedido de esclarecimento escrito ao Diretor Regional da Entidade Demandada, apresentado no Serviço Local de Matosinhos, relativo ao requerimento de prestações de desemprego (cfr. fls. 77/78 do PA em suporte eletrónico).

8. A Entidade Demandada respondeu ao Autor, por ofício de 28/09/2017, informando que a atribuição das prestações de desemprego deve ser requerida no prazo de 90 dias consecutivos a contar da data do desemprego e ser precedida de inscrição para emprego no centro de emprego, bem como que o requerimento, de modelo próprio, é apresentado no centro de emprego da área da residência do beneficiário ou online no sítio da Internet da segurança social e ainda que, em caso de impossibilidade ou de recusa por parte do empregador de entregar ao trabalhador as declarações referidas no n.º 1 do artigo 43.º do Decreto-Lei nº 220/2006, de 3 de novembro, a sua emissão compete à Inspeção-Geral do Trabalho, que, a requerimento do interessado e na sequência de averiguações efetuadas junto do empregador, a deve elaborar no prazo máximo de 30 dias a partir do pedido (cfr. fls. 76 do PA em suporte eletrónico).

9. O Autor renovou o seu pedido de esclarecimento em 30/10/2017 (cfr. fls. 74 do PA em suporte eletrónico).

10. Em 9/11/2017, o Autor apresentou exposição escrita no sentido de ver esclarecidos os contornos que envolviam a sua situação contributiva enquanto beneficiário, informando da existência do processo especial de reconhecimento da existência de contrato de trabalho, com junção dos respetivos documentos (cfr. fls. 71 a 73 do PA em suporte eletrónico).

11. Em 30/11/2017 a empresa “C., Lda.”, apresentou-se à insolvência (cfr. fls. 84 do PA em suporte eletrónico e acordo das partes).

12. Por ofício de 15/12/2017, a Entidade Demandada respondeu à exposição antecedente do Autor, informando o mesmo que deveria dirigir-se ao Centro de Emprego da sua área de residência, fazendo-se acompanhar de documento da cessação da sua atividade como trabalhador independente e Mod. RP 5064-DGSS, que anexou, para inscrição e requerimento do subsídio de desemprego (cfr. fls. 70 do PA em suporte eletrónico).

13. A sentença do processo judicial acima referenciado veio a ser proferida em 19/12/2017, reconhecendo a existência de um contrato de trabalho entre o Autor e a referida empresa desde 01/11/2008, tendo transitado em julgado em 15/01/2018 (cfr. fls. 61 a 69 do PA em suporte eletrónico).

14. Em 22/12/2017, o Autor apresentou no Serviço Local de Matosinhos da Entidade Demandada a certidão da referida sentença judicial, reiterando que foi trabalhador subordinado na empresa "C., Lda." no período de 1/11/2008 a 11/8/2017 (cfr. fls. 58 a 60 do PA em suporte eletrónico e acordo das partes).

15. No dia 06/02/2018, o Juízo do Trabalho de Matosinhos comunicou por escrito à Entidade Demandada a sentença proferida no processo especial de reconhecimento da existência de contrato de trabalho acima identificado (cfr. fls. 29 do PA em suporte eletrónico).

16. Em 09/02/2018, o Autor apresentou nova certidão da aludida sentença, com nota de trânsito em julgado, voltando a insistir para que fosse deferido o seu pedido do subsídio de desemprego (cfr. fls. 58 a 60 do PA em suporte eletrónico).

17. No processo de insolvência da referida empresa foi nomeado um administrador judicial que, após a assembleia de credores de 12/02/2018, em substituição do empregador, assinou, em 17/02/2018, o requerimento de pagamento de créditos emergentes do contrato de trabalho e a declaração de situação de desemprego (cfr. fls. 84 do PA em suporte eletrónico e acordo das partes).

18. Em 20/02/2018, a declaração de situação de desemprego foi entregue pelo Autor no Serviço Local de Matosinhos e, bem assim, enviada ao Centro Distrital do Porto da Entidade Demandada (cfr. fls. 82 e 83 do PA em suporte eletrónico e acordo das partes).

19. Por ofício de 10/01/2019, recebido em 21/01/2019, a Entidade Demandada notificou o Autor do deferimento do seu requerimento, informando nomeadamente que lhe fora atribuído subsídio de desemprego no montante diário de 22,91€, pelo período diário de 679 dias, com início em 20/02/2018, correspondente à data de apresentação do respetivo requerimento, e que lhe foram descontados 101 dias ao período de atribuição do mesmo subsídio, por ter sido aquele apresentado fora do prazo legal de 90 dias a contar da data do desemprego (cfr. fls. 1 do PA em suporte eletrónico e acordo das partes).

20. Em 28/01/2019, o Autor recebeu o valor de 7.812,31 €, a título de subsídio de desemprego, com retroativos à data de 20/02/2018 e, em 28/02/2019, recebeu 687,30 € a título de subsídio de desemprego do mês de fevereiro de 2019 (cfr. fls. 1 e 2 do PA em suporte eletrónico e acordo das partes).

21. A Entidade Demandada pagou um total de 8.499,61 € de prestações de desemprego, relativo ao período de 20/02/2018 a 28/02/2019 (cfr. fls. 1 e 2 do PA em suporte eletrónico e acordo das partes).

Não se provaram outros factos com relevância para a decisão da causa, nomeadamente:
a) Que o Autor tenha requerido o subsídio de desemprego em 13/09/2017;

b) Que, na sequência de tal requerimento e na ausência de decisão, o Autor tenha solicitado, por escrito e verbalmente, informação sobre o estado do processo, sem prejuízo do que ficou provado em 7, 9, 10, 14, 16 e 18 dos factos provados;

c) Que, logo que notificado para o efeito, o Autor tivesse facultado ao Serviço Local de Matosinhos e, bem assim, ao Centro Distrital do Porto da Entidade Demandada, todos os elementos pedidos, designadamente em data anterior a 20/02/2018.
d) Que o registo de remunerações não tenha sido atualizado em conformidade com o que determinou a decisão judicial proferida pelo Tribunal do Trabalho de Matosinhos, prejudicando o Autor no montante diário do subsídio de desemprego.

Os factos provados assentam nos documentos acima respetivamente especificados de forma discriminada.
Os factos não provados sob as alíneas a) a c) resultam desde logo do reconhecimento por parte do Autor, no seu pedido de esclarecimento datado de 13/09/2019 (cfr. fls. 77/78 do PA em suporte eletrónico) de que não tinha requerido o subsídio de desemprego, daí que as sucessivas solicitações apresentadas por este não visassem obter informação sobre o estado do processo, mas sim sobre o modo e o momento para ter acesso ao subsídio de desemprego. Aliás, o cotejo dos documentos de fls. 81 a 84 do processo administrativo assim o confirma. Nessa medida, não houve pedidos de informação ou documentação da Entidade Demandada que o Autor tivesse vindo satisfazer, nomeadamente antes de 20/02/2018, quando entregou a declaração da situação de desemprego e requereu o subsídio de desemprego, nem o processo administrativo ou qualquer outro meio probatório dá suporte a essa alegação.
Por outro lado, considerando a argumentação contrária da Entidade Demandada, o Autor não ofereceu qualquer meio de prova da factualidade constante da alínea d), como lhe competia (cfr. artigo 342º, nº 1 do Código Civil).
Finalmente, não foram consideradas as diligências do Autor posteriores a 20/02/2008, dado que as mesmas não têm interesse para a discussão da causa, atento o objeto desta e a posição final da Entidade Demandada, pese embora as diversas vicissitudes por que passou o procedimento administrativo até à sua conclusão com a atribuição do subsídio de desemprego ao Autor.”
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IIIii - DE DIREITO

Está em causa a Sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Porto, datada de 31 de dezembro de 2019, pela qual, com referência ao pedido formulado pelo Autor contra o Réu ISS, IP, ora Recorrente, a final da Petição inicial, veio a julgar a acção parcialmente procedente, tendo vindo a condenar a entidade demandada nos termos que para aqui se extraem como segue:

IV – DECISÃO:
Em face do exposto, julga-se a presente ação parcialmente procedente e, consequentemente:
a) Anula-se parcialmente a decisão da Entidade Demandada de 10/01/2019 que concedeu o subsídio de desemprego ao Autor pelo período de 679 dias; e
b) Condena-se a Entidade Demandada a substituir, nessa parte, a referida decisão por outra que conceda ao Autor o mesmo subsídio de desemprego, mas pelo período de 1.039 dias; e, por via disso,
c) Condena-se a Entidade Demandada a pagar ao Autor a quantia de 2.749,20€ (dois mil setecentos e quarenta e nove euros e vinte cêntimos), correspondente às prestações de desemprego do período de concessão em falta.

Importa aqui fazer desde já um ponto prévio.

Atento o disposto no artigo 613.º, n.º 2 e 614.º, n.ºs 1 e 2, ambos do CPC, é lícito ao juiz rectificar, por sua iniciativa ou a requerimento de qualquer das partes, e por simples despacho, erros materiais, suprir nulidades e reformar a sentença, sendo que em torno dos erros materiais, eles ocorrem quando se constatarem erros de escrita ou de cálculo ou quaisquer inexactidões devidas a outra omissão ou lapso, e nesse conspecto, quando tenha sido intentado recurso jurisdicional, essa rectificação só pode ter lugar antes de ele subir, podendo então as partes alegar perante o tribunal superior o que entendam de seu direito no tocante à introduzida rectificação.

Ora, considerando que em 15 de janeiro de 2020 foi deduzido pelo Autor um pedido de rectificação da Sentença, e que o mesmo foi deferido por despacho da Mm.ª Juíza datado de 13 de fevereiro de 2020, na medida em que o recurso deduzido pelo Réu ora Recorrente foi apresentado em 17 de janeiro de 2020, e veio a ser admitido em 14 de outubro de 2020, e que as partes [o Autor e o Réu] nada alegaram entretanto neste Tribunal de recurso sobre a introduzida rectificação à alínea c) do segmento decisório, prosseguiremos a apreciação do recurso jurisdicional deduzido pelo Réu, tendo subjacente a introduzida rectificação, que para aqui a extraímos, como segue:

“[…] 3) Condeno a Entidade Demandada a pagar ao Autor a quantia de 8.235,95€ (oito mil duzentos e trinta e cinco euros e noventa e cinco cêntimos), correspondente às prestações de desemprego do período de concessão em falta, até ao limite do pedido.
Custas pela Entidade Demandada.
[…]”

Neste patamar.

O Recorrente não se conforma com o vertido na alínea c) do segmento decisório, sustenta para tanto e em suma [e no que releva para efeitos de apreciação da sua pretensão recursiva], que aceitando o julgado pelo Tribunal a quo, no que é relativo a que o período de concessão a que o Autor tem direito é de 1039 dias [900+240=1140-101] em vez dos 679 dias [780-101] que lhe haviam sido deferidos, que já não aceita todavia, que tenha de proceder ao pagamento imediato da quantia remanescente da concessão, pois não sabe, nem pode saber se existirão ou não no futuro os pressupostos para esse pagamento.

Enfatizou que o novo prazo de concessão da prestação de desemprego que foi alterado pelo Tribunal a quo para 1039 dias, mantém o seu início a 20 de fevereiro de 2018, mas que o prazo de concessão só se esgota em dezembro de 2020, daqui a cerca de um ano no futuro, salvo suspensões de possam ocorrer, que poderão estender mais o prazo para a frente, pois que uma vez deferida a concessão, as prestações de desemprego são periódicas e pagas mensalmente se e enquanto se verificarem os pressupostos do pagamento, e que ao ter condenado no pagamento na actualidade de prestações futuras e dependentes de condições incertas, incorreu em erro de julgamento em matéria de direito, pois violou o disposto no artigo 95.º do CPTA, para além dos artigos 41.º, 42.º, 50.º, 52.º e 53.º, todos do Decreto-Lei 220/2006, de 03 de novembro, por não ter atendido na existência de requisitos legais de pagamento, assim como à eventual superveniência de circunstâncias susceptíveis de suspender ou cessar a concessão antes de se ter completado os pagamentos ou de influenciar os reinícios.

Constituindo os recursos jurisdicionais os meios específicos de impugnação de decisões judiciais, por via dos quais os recorrentes pretendem alterar as sentenças recorridas, nas concretas matérias que os afectem e que sejam alvo da sua sindicância, é necessário e imprescindível que no âmbito das alegações de recurso os recorrentes prossigam de forma clara e objectiva as premissas do silogismo judiciário em que se apoiou a decisão recorrida, por forma a evidenciar os erros em que a mesma incorreu.

Cumpre apreciar e decidir.

Como assim decorre do processado nos autos, em face do que constituía a causa de pedir e o pedido imanente à Petição inicial, e bem assim, no quanto se constituiu o thema decidendum em face do que deduziu o Réu ora Recorrido no âmbito da sua Contestação, o Tribunal a quo veio a identificar apenas uma questão nuclear a decidir, sobre cujo julgamento o Recorrente não deduziu qualquer outra pretensão recursiva.

Assim, e em torno da identificação dessa questão que constituía o núcleo essencial da pretensão impugnatória e condenatória deduzida pelo Autor contra o Réu, o Tribunal a quo fixou-a como sendo decidir ”… se o Autor requereu o subsídio de desemprego na data de 13/09/2017 ou apenas em 20/02/2018 e, em função disso, se o Autor tem direito a subsídio de desemprego desde aquela primeira data e pelo período de 1140 dias, no montante diário de 31,34€, ou somente, como foi decidido, pelo período de 679 dias, no montante diário de 22,91€.”

O Tribunal a quo fixou a matéria de facto que segundo a sua livre apreciação era a devida para efeitos de conhecer do mérito dos autos segundo as várias soluções de direito admissíveis, e sobre este julgamento por si levado a cabo, o Recorrente também não deduziu qualquer pretensão recursiva.

Ora, depois de enunciar o regime jurídico que julgou ser convocável, em sede do discurso fundamentador aportado na Sentença recorrida, o Tribunal a quo decidiu conforme para aqui se extracta o que segue:

Início da transcrição
“[…]
Ora, as prestações de desemprego são devidas desde a data do requerimento (cfr. artigo 36º, nº 1 do Decreto-Lei nº 220/2006). E o prazo de 90 dias para apresentação do requerimento conta-se desde o início da situação de desemprego, a qual coincide com o dia seguinte ao da cessação do contrato de trabalho (cfr. artigo 21º, nº 1 do mesmo diploma legal).

Deste modo, impõe-se concluir que o Autor só veio a requerer o subsídio de desemprego em 20/02/2008 [leia-se 2018], data a partir da qual lhe devem ser pagas as prestações de desemprego, uma vez que é condição da sua atribuição o requerimento expresso nesse sentido, não bastando a situação de desemprego e a inscrição no centro de emprego para esse efeito.
[...]
A controvérsia entre as partes, para além da data a partir da qual seria devido o subsídio de desemprego, tem a ver com a aplicação da cláusula de salvaguarda prevista no artigo 6º do Decreto-Lei nº 64/2012, de 15 de março - que veio alterar o Decreto-Lei nº 220/2006, de 3 de novembro, nomeadamente o citado artigo 37º - com o seguinte teor: “Na primeira situação de desemprego subsidiado, ocorrida após a data da entrada em vigor do presente decreto-lei, é garantido ao beneficiário o período de concessão do subsídio de desemprego a que teria direito no dia anterior àquela data, ao abrigo das normas então em vigor”.

Ora, na redação anterior à referida alteração legal, o Autor teria direito a 900 dias de período de concessão (e não apenas os 780 dias considerados), nos termos do nº 1 d) ii) do artigo 37º do referido diploma legal na sua versão original.

Muito embora não tenha explicitado na fundamentação da decisão impugnada como chegou aos referidos 780 dias de período de concessão, a Entidade Demandada sustenta, na sua contestação, que o Autor não pode beneficiar daquela cláusula de salvaguarda, uma vez que não estaria a trabalhar por conta de outrem em 31/03/2012.

Porém, considerando o disposto nos artigos 255º e 256º, nº 1 c) do Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social e o artigo 186º-O, nº 6 do Código do Processo de Trabalho, a Entidade Demandada não tem razão. Na verdade, a referida sentença judicial fixou o início do contrato de trabalho entre o Autor e o seu empregador em 01/11/2008 (cfr. nº 13 dos factos provados). Deste modo, em 31/03/2012, o Autor estava em condições de beneficiar da cláusula de salvaguarda prevista no artigo 6º do Decreto-Lei nº 64/2012, de 15 de março, pelo que tem direito a 900 dias de período de concessão de subsídio de desemprego, acrescidos de 240 dias e subtraídos de 101 dias, no total de 1.039 dias.

Nessa medida, a pretensão do Autor merece parcial provimento, dado que a decisão impugnada incorreu em erro sobre os pressupostos de direito, violando a lei (artigo 37º do Decreto-Lei nº 220/2006, de 3 de novembro, na sua redação original e artigo 6º do Decreto-Lei nº 64/2012, de 15 de março). Assim sendo, o Autor tem direito a receber mais 120 dias de subsídio de desemprego, no valor diário de 22,91€, no total de 2.749,20€

Pelo exposto, as custas processuais serão repartidas entre as partes na proporção do respetivo decaimento, fixando-se as mesmas em 2/3 para o Autor e 1/3 para a Entidade Demandada (cfr. artigo 527º, n.os 1 e 2 do CPC, ex vi do artigo 1º do CPTA).
*
IV – DECISÃO:
Em face do exposto, julga-se a presente ação parcialmente procedente e, consequentemente:

a) Anula-se parcialmente a decisão da Entidade Demandada de 10/01/2019 que concedeu o subsídio de desemprego ao Autor pelo período de 679 dias; e
b) Condena-se a Entidade Demandada a substituir, nessa parte, a referida decisão por outra que conceda ao Autor o mesmo subsídio de desemprego, mas pelo período de 1.039 dias; e, por via disso,
c) Condena-se a Entidade Demandada a pagar ao Autor a quantia de 2.749,20€ (dois mil setecentos e quarenta e nove euros e vinte cêntimos), correspondente às prestações de desemprego do período de concessão em falta.
[…]”
Fim da transcrição

Com o assim julgado sob a alínea c) não se conforma o Recorrente, que no âmbito das conclusões das suas Alegações sustentou em suma, que o Tribunal a quo errou no julgamento por si prosseguido, quando determinou a sua condenação no pagamento de prestações de desemprego ainda não vencidas, que são futuras e dependentes de condições incertas.

Como vimos supra, o Tribunal a quo veio a rectificar o segmento decisório a que se reporta a alínea c), de cuja fundamentação para aqui extractamos parte, como segue:


Início da transcrição
“[…]
O Autor veio requerer a retificação da sentença, ao abrigo do disposto nos artigos 613º, nº 2 e 614º, nº 1 do Código de Processo Civil (CPC), ex vi do artigo 1º do CPTA, considerando que deve passar a constar da mesma a condenação da Entidade Demandada a pagar ao Autor a quantia correspondente a 360 dias de subsídio de desemprego em falta, com as inerentes consequências no que concerne à condenação
das partes nas custas processuais.
[…]
Ora, ponderando os fundamentos aduzidos, tem o Autor efetivamente razão.
Na verdade, existe uma incongruência lógica entre o antepenúltimo e o penúltimo parágrafos acima transcritos e que se prende com o número de dias de subsídio de desemprego que o Autor tem ainda direito a receber, em relação ao que lhe foi reconhecido pela Entidade Demandada.
Recorde-se que a Entidade Demandada concedeu ao Autor 679 dias de subsídio de desemprego (780–101).
Porém, como se discorre na sentença reclamada, o Autor tem direito, por força da cláusula de salvaguarda prevista no artigo 6º do Decreto-Lei nº 64/2012, de 15 de março, que remete para a redação anterior do artigo 37º, nº 1 d) ii) do Decreto-Lei nº 220/2006, de 3 de novembro, a um período de concessão de subsídio de desemprego que ascende a 1140 dias (900+240, por força da sua idade e antiguidade contributiva, respetivamente), mas a que é necessário descontar 101 dias, nos termos do disposto no artigo 72º, nº 2 deste último diploma legal.
Ora, sendo assim, a diferença entre o período considerado pela Entidade Demandada e o que o Autor tem direito não é apenas de 120 dias (900-870), mas sim de 360 dias (1.039-679).
Deste modo, quando na sentença se refere que “o Autor tem direito a receber mais 120
dias de subsídio de desemprego, no valor diário de 22,91€, no total de 2.749,20€”, há um manifesto erro de cálculo, que importa retificar.
Na verdade, o Autor tem direito a receber mais 360 dias de subsídio de desemprego, no valor diário de 22,91€, no total de 8.247,60€.
Porém, como é bom de ver, esse valor excede o pedido formulado pelo Autor (que, assim sendo, enfermará também de erro de cálculo, salvo melhor opinião), pelo que não pode este tribunal ir além do mesmo (cfr. artigo 609º, nº 1 do CPC, ex vi do artigo
1º do CPTA).
Não obstante, é evidente que, nessa medida, as custas processuais terão de ficar a cargo da Entidade Demandada, dado que a pretensão pecuniária do Autor procede integralmente (cfr. artigo 527º, n.os 1 e 2 do CPC, ex vi do artigo 1º do CPTA).
Ora, a repartição da responsabilidade pelas custas foi uma consequência do erro de cálculo acima assumido e retificado, decorrendo, por isso, de lapso manifesto. Face ao exposto, a parte dispositiva da sentença passa a ter a seguinte redação:
Nestes termos, julgo a ação parcialmente procedente e, consequentemente:
1) (…)
2) (…)
3) Condeno a Entidade Demandada a pagar ao Autor a quantia de 8.235,95€ (oito mil
duzentos e trinta e cinco euros e noventa e cinco cêntimos), correspondente às prestações de
desemprego do período de concessão em falta, até ao limite do pedido.
Custas pela Entidade Demandada.
[…]”
Fim da transcrição

Como patenteado nas conclusões das Alegações de recurso, o Réu não imputa qualquer erro de julgamento ao Tribunal a quo na parte em que, em torno da questão central por si identificada [enunciada supra] veio a julgar que tendo o Autor requerido o subsidio de desemprego em 20 de fevereiro de 2018 que é a partir dessa data que devem ser pagas as prestações de desemprego [e não a partir de 13 de setembro de 2017 como assim sustentava o Autor], por ter sido nessa data que o mesmo apresentou requerimento para esse efeito, irrelevando para o caso, a sua situação de desempregado e a sua inscrição no Centro de Emprego, e bem assim que tendo subjacente o disposto nos artigos 255.º e 256.º ambos do Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social [Lei n.º 110/2009, de 16 de setembro de 2009], o disposto no artigo 36.º, n.º 1 e 37.º do Decreto-Lei n.º 220/2006, de 03 de novembro, e o disposto no artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 64/2012, de 15 de março, que o Autor tem direito a um total de 1039 dias [e não de 679, como sustentado pelo Réu].

Com o que o Recorrente não se conforma é que, em face do julgado pelo Tribunal a quo, de que o Autor tem direito a 1039 dias de subsídio de desemprego, tenha sob a alínea c) do segmento decisório de Sentença recorrida, vindo a condená-lo a pagar a quantia que identificou [de €2.749,20€], correspondente às prestações de desemprego do período de concessão em falta.

E como julgamos, assiste toda a razão ao Recorrente.

Vejamos então por que termos.

O pedido formulado pelo Autor a final da Petição inicial, sob o 2.º parágrafo, partia do pressuposto, atenta a causa de pedir, de que lhe eram devidas as prestações de desemprego desde a data de 13 de setembro de 2017, e pelo período de 1140 dias, sendo que a Petição inicial deu entrada no Tribunal recorrido em 12 de março de 2019.

O pedido que o Tribunal a quo apreciou e decidiu, foi aquele que o Autor formulou a final da Petição inicial, sendo que na Contestação deduzida pelo Réu, o mesmo apenas contrariou a argumentação esgrimida pelo Autor, no sentido de que o cômputo inicial do dia a partir do qual eram devidas as prestações, que no seu entender era o dia 20 de fevereiro de 2018, e que o período de concessão era de 679 dias [780-101], e não de 1039 dias [1140-101].

Como assim resulta dos pontos 20 e 21 do probatório, o Réu pagou ao Autor, no período temporal compreendido entre 20 de fevereiro de 2018 e 28 de fevereiro de 2019, a quantia de €8.499,61.

Ora, a causa de pedir e o pedido que estavam encerrados na Petição inicial, e desde logo, a condenação do Réu no pagamento da quantia de €8.235,95, eram atinentes à condenação no pagamento de prestações em falta, que o Autor tinha contabilizado à razão de €31,34 por dia.

Prosseguindo este Tribunal de recurso na interpretação do pedido formulado pelo Autor, tendo o mesmo [Autor] recebido do Réu, em 28 de janeiro de 2019, com retroactivos reportados à data de 20 de fevereiro de 2018, a quantia de €7.812,31, e em 28 de fevereiro de 2019 o montante de €687,30 referente a fevereiro de 2019, estando o montante diário pelo Réu devidamente fixado [em €22,91, como assim julgou ser o Tribunal a quo, e não de €31,34, como sustentava o Autor], o que restava ser tratado pelo Réu era o pagamento dos subsídios de fevereiro de 2019 em diante, até que seja alcançado o período temporal de 1039 dias [1140-101] com direito a subsídio de desemprego.

Tendo o Autor recebido o subsídio reportado ao mês de fevereiro de 2019 neste mesmo mês [Cfr. ponto 20 do probatório], o que o mesmo peticionava na Petição inicial que apresentou em juízo em 12 de março de 2019, e como estando em falta por parte do Réu, era o pagamento do subsídio diário de €31,34, que no seu entender era devido desde 13 de setembro de 2017 e até 19 de fevereiro de 2019.

Mas este seu entendimento não obteve vencimento, pelo que, tendo o Réu efectuado junto do Autor o pagamento dos subsídios reportados ao período de 20 de fevereiro de 2018 a 28 de fevereiro de 2019, e tendo o Tribunal a quo julgado [Cfr. alíneas a) e b) do segmento decisório] pela condenação do Réu a proferir uma outra decisão [sem margem de discricionariedade na sua actuação – Cfr. artigos 71.º e 95.º do CPTA] que confira ao Autor o subsídio de desemprego, não por 679 dias, mas por 1039 dias, a vinculação da actuação do Réu ocorre, na justa medida em que no âmbito da relação jurídica administrativa se mantenham todos os pressupostos que são determinantes do dever de prestar esse subsídio por parte do Réu, conquanto que não advenha ao seu conhecimento [de forma oficiosa, ou por requerimento apresentado pelo Autor] que o beneficiário deixou de preencher as condições para perceber essas prestações, seja aquelas que que já tinha auferido, seja aquelas que ainda lhe viriam a ser processadas.

Ou seja, face ao que alegou e requereu o Autor a final da Petição inicial, intentada em juízo em 12 de março de 2019, não se pode dizer que o Réu tivesse para com o Autor prestações em falta, e no valor de €8.235,95, já que a última prestação de que foi abonado se reportava ao mês anterior, de fevereiro de 2019.

Pela decisão tomada pelo Tribunal a quo visando o pedido constante do 2.º parágrafo, a que se reporta a alínea c) do segmento decisório, o mesmo liquidou e condenou o Réu no pagamento de todas as prestações de desemprego enquadráveis dentro do período de 1039 dias.

Porém, não foi esse o pedido que o Autor formulou ao Tribunal a quo, sendo que, para efeitos da condenação do Réu no pagamento das prestações de desemprego devidas desde fevereiro de 2019 e até se completar o período integral de 1039 dias, nenhuma outra decisão se mostrava devida, pois que esse cálculo decorre de um mero exercício matemático, de multiplicação do n.º de dias pelo valor diário da prestação, aspecto que não levanta qualquer dúvida na sua execução nem por parte do Réu, nem em torno do conhecimento/expectativa do que tenha a receber o Autor, desde que, como assim defende o Réu, o Autor continue a manter todas as condições para que lhe seja devido o subsídio de desemprego.

Com efeito, tendo subjacente o disposto no artigo 36.º, n.º 1 do Regime jurídico de protecção social da eventualidade de desemprego dos trabalhadores por conta de outrem, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 220/2006, de 03 de novembro, sendo certo que o Autor tem direito a perceber as prestações de desemprego desde a data do requerimento apresentado para esse efeito, não podemos descurar o âmbito e natureza dos deveres obrigações que sobre si impendem.

Ou seja, verificados os termos e os pressupostos determinantes da concessão das prestações de desemprego, e como regra, o Réu está constituído no dever legal de efectuar o seu pagamento.

Só que esse pagamento não é algo que ocorra de forma automática e em termos de constituir um direito impossível de reverter face ao seu destinatário, neste caso, do Autor, já que o direito a percepcionar o subsídio cessa/suspende-se, desde logo, se o mesmo exercer função remunerada, ou for incurso em processo de formação profissional com atribuição de compensação remuneratória [Cfr. artigos 41.º, 42.º, 50.º, 52.º e 53.º, todos do Decreto-Lei n.º 220/2006, de 03 de novembro].

O que significa que, tendo o Autor o direito de percepcionar o subsídio de desemprego pelo período que ainda não decorreu, até ser completado o computo de 1039 dias, o que lhe advém de forma legal e legitimamente, da decisão contida sob a alínea b) do segmento decisório, de todo o modo, para que o Réu se mantenha constituído nesse dever de pagar, é necessário que o Autor continue a reunir as condições para o efeito, e não se interponha nenhuma razão/fundamento determinante da cessação ou da suspensão desse pagamento.

Neste patamar.

O pedido a que se reporta o 2.º parágrafo deduzido a final da Petição inicial, tem como causa de pedir, o vertido sob os respectivos pontos 25.º a 30.º.

Ao contrário do que apreciou e decidiu o Tribunal a quo, não se trata de saber se o Autor tem direito a receber mais “x” dias de subsídio de desemprego, no valor diário de “y”, no total de “z”, para assim julgar procedente o pedido constante do 2.ª parágrafo, antes porém, como havia sido pedido/requerido pelo Autor, em apreciar e decidir sobre se o Réu tinha prestações desemprego em falta para com o Autor [Cfr. pontos 27.º a 30 e 62.º da Petição inicial]. E como já vimos supra, não tinha.

Ou seja e como então expôs o Autor, referiu o mesmo que devia ter recebido o montante de €16.735,56, desde 13 de setembro de 2017 até 28 de fevereiro de 2019, e que apenas recebeu €8.499,61 referente ao período de 20 de fevereiro de 2018 a 28 de fevereiro de 2019, sendo por isso que a quantia que não lhe foi paga e que entende por devida, resulta da diferença entre esses dois montantes, que se fixa em €8.235,95, que é precisamente o montante enunciado pelo Autor a final da Petição inicial sob o 2.º parágrafo.

Assiste assim total razão ao Réu ora Recorrente, já que com a prolação da decisão constante da alínea c), condenou o Réu a pagar uma concreta quantia ao Autor, que é relativa a prestações futuras, ainda não vencidas, e sempre dependentes de condições que são de verificação incerta.

Como apreciamos supra, errou ainda o Tribunal a quo no julgamento por si tirado, quando teve o pedido deduzido sob o 2.º parágrafo, e a quantificação nele patenteada como sendo relativa a prestações de desemprego que o Réu tinha ainda de pagar [que tinha em débito para com o Autor], quando o que é facto é que o Autor formulou esse pedido no estrito âmbito e domínio de que se tratava de um montante devido a título de prestações já vencidas e ainda não pagas pelo Réu, que contabilizou desde 13 de setembro de 2017 até fevereiro de 2019, e à razão diária de €31,34.

De modo que, tem assim a pretensão recursiva do Recorrente que ser julgada procedente.
*

E assim formulamos as seguintes CONCLUSÕES/SUMÁRIO:

Descritores: Subsídio de desemprego; Prestações futuras dependentes de condições incertas; Erro de julgamento.

1 - O regime jurídico de proteção social na eventualidade de desemprego dos trabalhadores por conta de outrem consta do Decreto-Lei n.º 220/2006, de 3 de novembro, constituindo uma concretização do direito à segurança social consagrado no artigo 63.º da Constituição da República Portuguesa.

2 – Nos termos do artigo 36.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 220/2006, de 3 de novembro, as prestações de desemprego são devidas desde a data de requerimento expresso nesse sentido a apresentar pelo beneficiário, no prazo de 90 dias contado desde o início da situação de desemprego, a qual coincide com o dia seguinte ao da cessação do contrato de trabalho [Cfr. artigo 21.º, n.º 1 do mesmo diploma legal].

3 – Sempre que estejam verificados os termos e os pressupostos determinantes da concessão das prestações de desemprego, e como regra, está o Réu constituído no dever legal de efectuar o seu pagamento, o qual não é algo que ocorra de forma automática e em termos de constituir um direito impossível de reverter face ao beneficiário, já que o direito a percepcionar o subsídio cessa/suspende-se, desde logo, se o mesmo exercer função remunerada, ou for incurso em processo de formação profissional com atribuição de compensação remuneratória [Cfr. artigos 41.º, 42.º, 50.º, 52.º e 53.º, todos do Decreto-Lei n.º 220/2006, de 03 de novembro].

4 - Tendo o Autor o direito de percepcionar o subsídio de desemprego pelo período ainda não decorrido, até ser completado o computo de 1039 dias, o que lhe advém de forma legal e legitimamente, da decisão contida sob a alínea b) do segmento decisório, de todo o modo, para que o Réu se mantenha constituído nesse dever de pagar, é necessário que o Autor continue a reunir as condições para o efeito, e não se interponha nenhuma razão/fundamento determinante da cessação ou da suspensão desse pagamento, razão pela qual não pode o Instituto da Segurança Social, ser condenado a pagar uma concreta quantia ao Autor, que é relativa a prestações futuras, ainda não vencidas, e sempre dependentes de condições que são de verificação incerta.
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IV – DECISÃO

Nestes termos, de harmonia com os poderes conferidos pelo artigo 202.º da Constituição da República Portuguesa, os juízes da Secção de Contencioso Administrativo deste Tribunal, Acordam em conferência:

A) em conceder provimento ao recurso interposto pelo Recorrente Instituto da Segurança Social, I.P.;
B) em revogar a alínea c) do segmento decisório constante da Sentença recorrida;
C) em julgar improcedente o pedido formulado pelo Autor ora Recorrido sob o 2.ª parágrafo a final da Petição inicial.
*
Custas a cargo do Autor e do Réu, em 1.ª instância, que fixamos em 2/3 para o Autor e 1/3 para o Réu; e nesta instância, apenas a cargo do Autor.
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Notifique.
*

Porto, 22 de outubro de 2021.


Paulo Ferreira de Magalhães, relator
Antero Salvador
Helena Ribeiro