Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00096/10.7BEPNF
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:02/26/2015
Tribunal:TAF de Penafiel
Relator:Cristina Travassos Bento
Descritores:OPOSIÇÃO.
NULIDADE DA SENTENÇA.
OMISSÃO DE PRONÚNCIA.
Sumário:I - Existe nulidade parcial da sentença, por omissão de pronúncia, quando aquela é completamente omissa na apreciação da responsabilidade subsidiária do revertido, nos termos do artigo 24º, nº 1 alínea b) da LGT, relativamente às dívidas de IMI, (apreciando apenas os pressupostos de reversão quanto à dívida de Coimas) e não teceu qualquer justificação para tal omissão.
II – A nulidade parcial da sentença não obsta a que o Tribunal de recurso conheça em substituição do objecto da oposição, mas esse conhecimento só lhe é permitido no caso de os autos fornecerem todos os elementos para o efeito.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:Fazenda Pública
Recorrido 1:N...
Decisão:Concedido provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência os Juízes que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:


I. Relatório

A Fazenda Pública veio interpor recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel que julgou procedente a presente oposição judicial, deduzida por N..., contra o processo de execução fiscal nº 1759200701024574 e apensos.

A Recorrente terminou as suas alegações de recurso formulando as seguintes
conclusões:
A. A Fazenda Pública entende que a douta sentença recorrida labora em omissão de pronúncia, ao não apreciar a questão da ilegitimidade do recorrido objecto desta oposição.
B. Face à prova produzida deveria o Tribunal a quo ter dado como provado aditando-se ao probatório o seguinte:
B. I. O oponente identificou-se, perante a AT, nas declarações anuais, na qualidade de representante legal da originária devedora, no campo 08, referentes aos períodos de tributação:
i) - 2002-01-01 a 2002-12-31, cfr. Doc. 1 da contestação.;
ii) - 2003-01-01 a 2003-12-31, cfr. Doc.2 da contestação.;
iii) - 2004-01-01 a 2004-12-31, cfr. Doc. 3 da contestação.;
iv)2005-01-01 a 2005-12-31, cfr. Doc. 4 da contestação.
B. II. O oponente identificou-se, perante a AT, nas declarações de rendimentos IRC - modelo 22, na qualidade de representante legal da devedora originária, no campo 05, referentes aos seguintes períodos de tributação:
i) - De 2008-01-01 a 2008-12-31, entregue em 2009.05.22, cfr. Doc. 5 da contestação;
ii) - De 2007-01-01 a 2007-12-31, entregue em 2008.05.05, cfr. Doc. 6 da contestação;
iii) - De 2006-01-01 a 2006-12-31, entregue em 2007.05.27, cfr. Doc. 7 da contestação;
iv) - 2005-01-01 a 2005-12-31, entregue em 2006.05.27, cfr. Doc. 8 da contestação;
v) - De 2004-01-01 a 2004-12-31, entregue em 2005.06.27, cfr. Doc. 9 da contestação;
vi) - De 2003-01-01 a 2003-12-31, entregue em 2004.12.23, cfr. Doc. 10 da contestação; e
vii) De 2002-01-01 a 2002-12-31, entregue em 2004.12.23, cfr. Doc. 11 da contestação.
B. III. O oponente identificou-se, perante a AT, na declaração de cessação de actividade para efeitos de IVA, apondo a sua assinatura na qualidade de representante legal da originária devedora, cfr. Doc. 12 e 13 da contestação.
B. IV. O oponente constava como único sócio gerente da originária devedora na CRC, constituindo a forma de obrigar a sociedade mediante a sua assinatura.
B. V. Os destinos da originária devedora dependiam exclusivamente da sua intervenção, sob pena de paralisação da mesma.
C. Ficou demonstrado que o recorrido dirigia de direito e de facto os destinos da sociedade primitiva executada à data em que terminou o prazo para pagamento voluntário dos tributos em questão, como gerente único.
D. O recorrido tinha, obrigatoriamente, uma intervenção pessoal e activa na vinculação da sociedade,
E. Não tendo ficado demonstrado que lhe tenha sido vedado o exercício das funções de administração.
F. Sendo que a douta sentença fez tábua rasa dos elementos de prova carreados para os autos., estando a mesma afectada por omissão de pronúncia por não ter apreciado questão da responsabilidade subsidiária por dívidas no tocante ao IMI, derivada de causa de pedir invocada na oposição.
G. In casu, mostram-se verificados os pressupostos legais de que depende a reversão da execução contra o oponente a titulo subsidiário respondendo pelas dívidas da sociedade comercial originariamente devedora.
H. Quem age em nome e representação da sociedade, quem exterioriza perante terceiros a vontade social, é a gerência ou administração, enquanto órgão externo e representativo, através do concreto exercício de funções levado a cabo pelos gerentes ou administradores,
I. razão pela qual é patente ser imputável ao recorrido, quer por acção quer por omissão, a prática de actos de gestão, consubstanciados na exteriorização da vontade da sociedade e vinculação da mesma perante terceiros em todos os seus actos e contratos, na medida em que forma de obrigar a sociedade era pela intervenção do recorrido – como administrador único da devedora originária – conforme, claramente, resulta dos elementos juntos aos autos.
J. O recorrido não logrou provar a ausência de culpa na insuficiência do património tal como lhe competia.
K. O regime de responsabilidade dos gerentes e administradores pelas dívidas de impostos das suas representadas é regulado pela lei sob cuja vigência ocorrem os respectivos pressupostos da obrigação de responsabilidade.
L. Respeitando a dívida exequenda a IMI do ano de 2007 e estando devidamente comprovada a gerência de facto do recorrido à data do prazo legal para pagamento ou entrega, é aplicável o regime resultante do art. 24º n.º 1 b) da LGT.
M. Tem vindo a jurisprudência a entender que, apesar do ónus probatório da gerência de facto impender sobre a Administração Tributária, “é, também, acertado entender que tal exercício efectivo pode, pelo juiz, ser inferido do conjunto da prova produzida e/ou omitida, usando as regras da experiência, fazendo juízos de probabilidade, etc.” – Ac. do TCA Sul de 09.03.2010 (Proc. 02486/08).
N. Atentos os elementos probatórios juntos aos autos, deverá o Tribunal a quo decidir pela ilegitimidade do recorrido.
O. Assim e salvo o devido respeito, a prova ínsita nos autos e, as consequências necessárias que dali se aferem sustentam a posição da Fazenda Pública, enquanto titular do direito de reversão da execução fiscal contra o responsável subsidiário, devendo ser considerada legitima a reversão contra o recorrido.
P. Deve ser determinada a improcedência da oposição pela convicção da gerência de facto do oponente/recorrido e da culpa do mesmo na insuficiência do património da originária devedora, formada a partir do exame crítico das provas.
Q. Tendo o Tribunal a quo decidido com violação do 24º da LGT no que concerne aos tributos do IMI e ainda os art.s 125º do CPPT, 712º, n.º 1 alínea a) e 668º, ambos do CPC, aplicável ex vi art. 2º e) do CPPT e art. 2º d) da LGT.

Nestes termos e nos mais de Direito aplicável, requer-se a V.as Ex.as se dignem julgar PROCEDENTE o presente recurso e, consequentemente, declarar a nulidade da douta sentença recorrida, com as legais consequências.

O recorrido não apresentou contra-alegações.

Após a subida dos autos a este Tribunal Central Administrativo Norte, a Exma Procuradora-Geral Adjunta emitiu Parecer, a fls. 161 e ss, no sentido de ser negado provimento ao recurso.

Colhidos os vistos legais juntos dos Exmos. Juízes-Adjuntos vem o processo à Conferência para julgamento.


I.I Do Objecto do Recurso - Questões a apreciar e decidir:

A questão suscitada pela Recorrente, delimitada pelas alegações de recurso e respectivas conclusões - artigos 635º, nº4 e 639º CPC, ex vi” artigo 2º, alínea e) e artigo 281º do CPPT - é a de saber (i) se se verifica a nulidade da sentença recorrida, por omissão de pronúncia; (ii) se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento.

II. Fundamentação

II.1. De Facto

No Tribunal a quo, o julgamento da matéria de facto foi efectuado nos seguintes termos:

“III - DOS FACTOS.

A- Dos factos provados, com relevância para a decisão da causa:

1.º - Pelo Serviço de Finanças de Amarante foi instaurado o processo de execução fiscal n.°1759200701024574 Aps., contra a firma M…, Ld.ª, por dívidas à Fazenda Nacional no valor de 14.588,02 euros.
2.° - Em virtude da inexistência de património da firma executada, procedeu-se à preparação do processo para a reversão contra os responsáveis subsidiários.
3.º - De acordo com a informação constante da Conservatória do Registo Comercial de Amarante o Oponente foi o único gerente da firma M…, Ld.a, no período a que respeitam as dívidas.
4° - Dos elementos existentes no referido Serviço de Finanças, nomeadamente o anexo J das declarações anuais entregues em nome da firma executada, verifica-se que o Oponente auferiu rendimentos da categoria A, pagos por aquela empresa - cfr. doc. de fls. 52 dos autos.
5.º - Dos elementos recolhidos pelo Serviço de Finanças junto da Delegação de Amarante do Instituto da Segurança Social, verifica-se que o Oponente, se encontra inscrito e efectuou descontos como sócio gerente da firma executada - cfr. doc. de fls.53 dos autos.
6.° - O ora Oponente assinou documentos na qualidade de gerente da firma executada - cfr. doc. de fls. 54 dos autos.
7.º - Em cumprimento do despacho de 19 de agosto de 2008, o ora Oponente foi notificado, para, querendo, exercer o direito de audição prévia com referência à reversão que se pretendia efectuar - cfr. doc. de fls. 44 dos autos.
8.° - Por despacho de 09.10.2009, do Chefe do Serviço de Finanças, foi revertida a execução contra o Oponente, na qualidade de responsável subsidiário da firma executada.
9.º - Constam como fundamentos do despacho de reversão:
«Dos administradores, directores, ou gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração ou gestão em pessoas colectivas ou entidades fiscalmente equiparadas, por não terem provado não lhes ser imputável a falta de pagamento da dívida, quando o prazo legal de pagamento/entrega da mesma terminou no período de exercício do cargo (art.24°/n°l/b) LGT).
Não são conhecidos bens da Sociedade.
O revertido foi gerente/administrador no período a que respeitam as dívidas e em que elas estiveram em cobrança, conforme consta do Processo Executivo, (art.24° da LGT).» - cfr. doc. de fls.46 dos autos.
10.º - A executada originária cessou a actividade em 01.10.2008.
11.º - A presente Oposição deu entrada supra referido Serviço de Finanças em 18.11.2009.

B- Factos não provados com relevância para a decisão da causa:

Não se provaram outros factos com interesse para a decisão da causa.

*

II.1.1 Ao abrigo do disposto no artigo 662º, nº1 do Código de Processo Civil (CPC), aplicável ex vi artigo 2º, alínea e), e 281º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), acorda-se em aditar (os pontos 12 a 15, nos termos que se seguem:

12º - Em 02.05.2006 o oponente outorgou, na qualidade de gerente da devedora originária “M…, Lda” a procuração que consta de folhas 54 dos autos e que se dá aqui por inteiramente reproduzida para todos os efeitos legais;

13º - O oponente identificou-se, perante a Administração Tributária, nas declarações anuais de impostos, na qualidade de representante legal da originária devedora, no campo 08, referentes aos seguintes períodos de tributação:
-2002-01-01 a 2002-12-31,
-2003-01-01 a 2003-12-31,
-2004-01-01 a 2004-12-31,
-2005-01-01 a 2005-12-31. - cfr. folhas 77 a 80 dos autos;
14º - O oponente identificou-se, perante a Administração Tributária, nas declarações de rendimentos para efeitos de IRC - modelo 22, na qualidade de representante legal da devedora originária, no campo 05, referentes aos seguintes períodos de tributação:
- De 2208-01-01 a 2008-12-31, entregue em 2009-05-22,
- De 2007-01-01 a 2007-12-31, entregue em 2008-05-05,
- De 2006-01-01 a 2006-12-31, entregue em 2007-05-27,
- De 2005-01-01 a 2005-12-31, entregue em 2006-05-27,
- De 2004 -01-01 a 2004-12-31, entregue em 2005-06-27,
- De 2003-01-01 a 2003-12-31, entregue em 2004-12-23,
- De 2002-01-01 a 2002-12-31, entregue em 2004-12-23 – cfr. folhas 81 a 87 dos autos,
15º - O oponente identificou-se, perante a Administração Tributária, na declaração de cessação e actividade para efeitos de IVA, apondo a sua assinatura na qualidade de representante legal da devedora originária – cfr. folhas 88 a 90 dos autos;




II.2. De Direito

II.2.1 N..., deduziu Oposição judicial ao processo de execução fiscal nº1759-2007/01024574 e aps, que tinha sido instaurado contra a sociedade “M…, Lda”, por dívidas relativas a IMI e Coimas dos exercícios de 2002, 2003, 2006 e 2007, com os seguintes fundamentos: falta de fundamentação do despacho de reversão, inconstitucionalidade do artº 8º do RGIT, ilegitimidade do Oponente, consubstanciada pelo não exercício da gerência de facto e na ausência de culpa da insuficiência do património da devedora originária.
A Fazenda Pública veio recorrer da sentença que julgou procedente a oposição e, logo nas primeiras conclusões de recurso, a recorrente esgrimiu a nulidade da decisão recorrida por esta ter incorrido em omissão de pronúncia, dado não ter apreciado a questão da responsabilidade subsidiária do oponente, quanto às dívidas de IMI, derivada da causa de pedir invocada na oposição.
Como pressuposto de abordagem de apreciação da nulidade de sentença suscitada, temos que a Fazenda Pública não coloca em causa o segmento da decisão recorrida que apreciou a responsabilidade subsidiária do oponente relativamente à dívida por coimas – cfr. conclusão Q, sendo de concluir que tal segmento transitou em julgado, tendo-se estabilizado na ordem jurídica.
A omissão de pronúncia assacada à sentença recorrida apenas se refere, assim, ao segmento, segundo ela inexistente, relativo à apreciação da responsabilidade subsidiária do opoente quanto à dívida de IMI.


II.2.2 De acordo com o disposto no artigo 125º nº 1 do CPPT, Constituem causas de nulidade da sentença a falta de assinatura do juiz, a não especificação dos fundamentos de facto e de direito da decisão, a oposição dos fundamentos com a decisão, a falta de pronúncia sobre questões que o juiz deva apreciar ou a pronúncia sobre questões que não deva conhecer“.
Comando legal idêntico se encontra no artigo art. 668º alínea d), actual 615º, o CPC, em obediência ao fixado nº 2 do art. 660º, actual 608º, do CPC, segundo o qual “O juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras (…).”
Existirá, assim, omissão de pronúncia quando o tribunal deixa de apreciar e decidir uma questão, isto é, um problema concreto que haja sido chamado a resolver, (tendo em conta o pedido, a causa de pedir e as eventuais excepções invocadas), ficando apenas exceptuado o conhecimento das questões cuja apreciação e decisão tenha ficado prejudicada em face da solução dada ao litígio.
Consequentemente, a suscitada nulidade só ocorrerá nos casos em que o Tribunal “pura e simplesmente, não tome posição sobre qualquer questão sobre a qual devesse tomar posição, inclusivamente não decidindo explicitamente que não pode dela tomar conhecimento. No entanto, mesmo que entenda não dever conhecer de determinada questão, o tribunal deve indicar as razões por que não conhece dela, pois, tratando-se de uma questão suscitada, haverá omissão de pronúncia se nada disser sobre ela” in Jorge Lopes de Sousa, CPPT, anotado e comentado, volume II, 6ª edição, 2011, Áreas Editora, pág. 363.
A este propósito, importa recordar Alberto dos Reis, segundo o qual “uma coisa é o tribunal deixar de pronunciar-se sobre questão que devia apreciar, outra invocar razão, boa ou má, procedente ou improcedente, para justificar a sua abstenção”, in Alberto dos Reis, Código de Processo Civil, anotado, Volume V, pág. 143.
E ainda neste sentido, entre muitos outros, veja-se o recente acórdão do STA de 12.02.2015 proferido no processo nº01200/12.
No caso em análise, e lida atentamente a p.i, fácil é concluir que o acto de reversão teve por fundamento a insuficiência de bens da executada originária e o exercício da gerência, pelo oponente, no período de constituição da dívida e naquele em que terminou o prazo legal de entrega da prestação tributária pelo agora oponente, tendo a reversão operado nos termos do artigo 24º, nº 1 alínea b) da LGT, tanto quanto às dívidas de coimas, como quanto às dívidas de IMI.
O oponente pretendia ser considerado parte ilegítima para a execução com os fundamentos supra relatados: falta de fundamentação do despacho de reversão, inconstitucionalidade do artº 8º do RGIT, ilegitimidade do Oponente, consubstanciada pelo não exercício de facto da gerência e na ausência de culpa na insuficiência do património da devedora originária.
Ora, a sentença recorrida, na interpretação que dela fazemos, apenas apreciou os fundamentos relativos ao regime jurídico aplicável à responsabilidade subsidiária do oponente por dívidas de Coimas, alheando-se por completo da questão da responsabilidade subsidiária do oponente quanto às dívidas revertidas de IMI. Acresce ainda que, na sentença recorrida, não se teceu qualquer justificação para tal omissão, dado que o seu conhecimento não se mostra prejudicado pela solução dada às demais questões apreciadas e decididas.
A sentença recorrida veio a considerar tão-somente que:
O Oponente alegou que não tinha culpa na insuficiência do património da executada originária para o pagamento das dívidas tributárias.
O Oponente alegou ainda que não se verificavam os pressupostos da responsabilidade subsidiária uma vez que a devedora originária ainda tinha bens suficientes para o pagamento das dívidas tributárias.
Nessa parte, não se apurou que esses bens existissem e que fossem suficientes para o pagamento das dívidas.
Pelo que, existiu fundamento para o exercício do direito de reversão.
Sucede, que, efectivamente a fundamentação do despacho de reversão é omissa quanto à culpa do ora Oponente.
De acordo com o art.24° da LGT, a reversão contra o Oponente ocorreu nos termos da alínea a) e da alínea b) do referido preceito legal porque o facto tributário ocorreu no período em que ele exercia a gerência efectiva da executada e o prazo legal de entrega das dívidas ocorreu em período em que ele ainda exercia a gerência efectiva da mesma.
As execuções por dívidas relativas a contra ordenações, que tinham sido impostas à devedora originária, também não podiam ter revertido contra o Oponente.
As dívidas tributárias dizem respeito a vários processos de Contra Ordenação.
A executada originária foi notificada para o pagamento voluntário e foi posteriormente proferida decisão condenatória no âmbito do respectivo processo de Contra Ordenação.
A sociedade foi notificada dessa decisão e não a impugnou nos termos dos artigos 79°, n.°2 e 80 do RGIT.
Uma vez, que, o pagamento não foi efectuado, foram extraídas certidões da dívida que deram origem ao respectivo processo de execução fiscal.
Os administradores e gerentes podem ser responsabilizados subsidiariamente pelo pagamento de Multas e Coimas aplicadas às sociedades nos termos referidos pelo artigo 8° da Lei 15/01 de 5 de Junho.
Logo, podia entender-se que a reversão da execução não podia ter sido efectuada em relação às quantias devidas pela executada originária a título de Coimas e Despesas em processos de Contra Ordenação fiscal.
Neste sentido decidiu o STA por Acórdãos datados de 12 de Março de 2008 e de 28 de Maio de 2008 proferidos nos processos 01053/07 e 03 1/08 segundo o qual «o princípio da intransmissibilidade das penas constitucionalmente previsto no art.°30.°, n.°3 da CRP aplica-se no domínio contra - ordenacional fiscal.
É materialmente inconstitucional, por violação dos princípios da intransmissibilidade das penas e da presunção de inocência consagradas nos artigos 30º, n.°3 e 32.°, n.°2 da CRP, o disposto no art.° 8.° do Regime Geral das Infracções Tributárias relativo à responsabilidade dos administradores, gerentes e outras pessoas, em relação ao pagamento de Coimas aplicadas à sociedade».
Sucede que o entendimento expresso pelo STA nos processos referidos deve ser abandonado no seguimento da mais recente jurisprudência do Tribunal Constitucional.
Efectivamente, não foram julgadas inconstitucionais as normas das alíneas a) e b) do n.°1 do art.° 8 do RGIT, aprovado pela Lei 15/01 de 5 de Junho, na parte que se refere à responsabilidade civil subsidiária dos administradores e gerentes por coimas aplicadas a pessoas colectivas em processo de contra ordenação.
Idêntico entendimento foi acolhido no Acórdão n.°150/2009 proferido em 25 de Março de 2009.
Nele se decidiu que «o que o art.°8.°, n.°l, alíneas a) e b) do RGIT prevê é uma forma de responsabilidade civil subsidiária dos administradores e gerentes que resulta do facto culposo que lhes é imputável de terem gerado uma situação de insuficiência patrimonial da empresa que tinha sido causadora do não pagamento da dívida ou da Coima que era devida ou de não terem procedido a esse pagamento quando a sociedade ou pessoa colectiva foi notificada para esse efeito ainda durante o período de exercício do seu cargo.
O que está em causa não é, por conseguinte, a mera transmissão de uma responsabilidade contra - ordenacional que era originariamente imputável à sociedade, mas antes a imposição de um dever indemnizatório, que deriva do facto ilícito e culposo que é praticado pelo administrador ou gerente e que constitui causa adequada do dano que resulta para a administração tributária da não satisfação da receita em que se traduzia o pagamento da multa ou coima que eram devidas...
Acresce que a responsabilidade subsidiária dos administradores e gerentes assenta, não no próprio facto típico, que é caracterizado como infracção contra-ordenacional, mas num facto autónomo, inteiramente diverso desse, que se traduz num comportamento pessoal determinante da produção de um dano para a administração fiscal.
É esse facto, de carácter ilícito, imputável ao agente a título de culpa, que fundamenta o dever de indemnizar e que, como tal, origina a responsabilidade civil.
Tudo leva a considerar que não existe na previsão da norma do art.° 8.°, n.°1 alíneas a) e b) do RGIT um qualquer mecanismo de transmissibilidade da responsabilidade contra-ordenacional, nem ocorre qualquer violação do disposto no art.°30.°, n.°3 da Constituição, mesmo que se pudesse entender que a proibição aí contida se torna aplicável no domínio das contraordenações.
Não é a sanção aplicada pelo ilícito contra-ordenacional que se transmite, mas a responsabilidade culposa pela frustração da satisfação do crédito correspondente que se efectiva contra o gerente que, incumprindo deveres funcionais, não providenciou no sentido de que a sociedade efectuasse o pagamento da coima em que estava definitivamente condenada e deixou criar uma situação em que o património desta se tornou insuficiente para assegurar a cobrança coerciva».
Sucede que, a responsabilidade civil por multas e coimas prevista no art.° 8, n.°1 a) da Lei 15/01 de 5 de Junho permite que os gerentes e administradores de sociedades sejam subsidiariamente responsáveis pelas coimas aplicadas a infracções por factos praticados no período do exercício do seu cargo ou por factos anteriores quando tiver sido por culpa sua que o património da sociedade se tornou insuficiente para o seu pagamento.
A prova da culpa do gerente na insuficiência de bens da devedora originária para o pagamento das dívidas relativas a Coimas incumbe à Fazenda Pública.
Ora, o despacho de reversão é completamente omisso nessa prova de culpa e nem sequer alude à mesma.
Os fundamentos da reversão consistiram na inexistência de bens susceptíveis de serem penhorados e no exercício de funções de gerência no período de ocorrência do facto gerador do imposto e naquele em que o mesmo era exigível.
Não há qualquer menção a factos que permitam concluir que o Oponente agiu com culpa nessa insuficiência de bens.
Acompanhamos deste modo a mais recente jurisprudência do STA segundo a qual «o processo de execução fiscal não é o meio processual adequado para a cobrança de dívidas emergentes de responsabilidade civil extracontratual nem é possível a reversão da execução para cobrança de dívidas não tributárias com esse fundamento.
A responsabilidade subsidiária por dívidas de coimas prevista no art.8°, n.°1, alínea a) do RGIT, depende da prova da culpa do responsável na génese da insuficiência do património social para pagamento da dívida, pelo que está afastada a possibilidade de tal responsabilização quando no despacho de reversão não se invoca a existência de culpa.
Neste tipo de processos instaurados na sequência de reversão de coimas, que são formalmente de oposição a execução fiscal, está em causa uma responsabilidade prevista no RGIT. A entender-se que é a oposição à execução o único meio que o revertido pode utilizar para a defesa dos seus interesses, têm de ser asseguradas neste meio processual condições de defesa idênticas as que são proporcionadas ao arguido no processo contra ordenacional, designadamente a possibilidade de conhecer oficiosamente de todas as questões relevantes, em que se inclui a de alterar a decisão do tribunal recorrido sem qualquer vinculação aos termos e ao sentido da decisão recorrida, que é própria dos recursos jurisdicionais em processos de contra ordenações (Ac. do STA de 8/9/2010, recurso 0186/10).
«O art.°8.° do RGIT, interpretado no sentido de que ali se prevê a responsabilidade subsidiária por coimas, efectivada através do processo de execução fiscal contra as pessoas ali mencionadas, é materialmente inconstitucional por violação dos princípios da intransmissibilidade das penas, da presunção de inocência e da violação dos direitos de audiência e defesa consagrados, respectivamente, no n.°3 do art.°30.° e nos n.°s 2 e 10 do art.° 32.°, ambos da CRP.
O processo de execução fiscal não é o meio processual adequado para a cobrança de dívidas emergentes de responsabilidade civil extracontratual nem é possível a reversão da execução para cobrança de dívidas não tributárias com esse fundamento.» (Ac. do STA de 10/11/2010, recurso 0767/10).
Assim sendo, o processo de execução fiscal não podia ter revertido contra o ora Oponente.
Pelo exposto, a Oposição procede. “

Em suma, a M. Juiz a quo não se pronunciou, de todo, sobre a questão colocada, pelo oponente, ao Tribunal, sobre a sua responsabilidade subsidiária relativamente às dívidas revertidas de IMI, questão sobre a qual a sentença não poderia deixar de se pronunciar.
Assim sendo, há que concluir que a sentença incorreu em omissão de pronúncia, verificando-se, pois, a nulidade a que se referem os artigos 615º, nº1, alínea d), do CPC e 125º, nº1, do CPPT.
Relembre-se, como referido supra, que a nulidade em análise abrange a decisão recorrida no segmento referente às dívidas de IMI, pois a decisão ao considerar procedente, in totum, a oposição, e não tendo a Fazenda Pública colocado em crise no presente recurso o segmento decisório, relativo à ilegitimidade do oponente relativa às dívidas de coimas, a mesma transitou em julgado quanto a este (dado a apreciação do recurso se encontrar delimitada pelas alegações de recurso e respectivas conclusões - artigos 635º, nº4 e 639º CPC, ex vi” artigo 2º, alínea e) e artigo 281º do CPPT).

Pelo exposto, cumpre julgar procedente o recurso sob apreciação e, em consequência, declarar a nulidade parcial da sentença recorrida, no que respeita à apreciação da responsabilidade subsidiária do oponente, relativamente às dívidas de IMI, atenta a omissão de pronúncia que acabámos de apreciar, ficando prejudicada a decisão do outro fundamento de recurso, nos termos do disposto no artigo 608.º, n.º 2 ex vi artigo 663.º, n.º 2, ambos do CPC.

II.2.3 Do conhecimento em substituição

Declarada a nulidade parcial da sentença recorrida, há que fazer apelo ao artigo 715º, actual 665º, do CPC, uma vez que a anulação parcial da decisão não tem como efeito incontornável a remessa imediata do processo para o Tribunal a quo, devendo o TCA proceder à apreciação do objecto do recurso se dispuser dos elementos necessários para tal.
A competência conferida à 2ª Instância para reapreciar o julgamento da matéria de facto e alterar, em via de substituição, o julgado em 1ª Instância, apenas é possível se do processo constarem todos os elementos de prova - cfr. artigo 712° n° 1 alínea a), CPC, aplicável ex vi art° 2° alínea e), do CPPT - além da hipótese estatuída na alínea b) do mesmo n° 1 do citado art° 712° (cfr. Miguel Teixeira de Sousa, in “Estudos Sobre o Novo Processo Civil”, Lex, 2a edição, pág. 415).
Vejamos, então.
Nos presentes autos de Oposição judicial, e após o referido supra, resulta da leitura do despacho de reversão que esta teve como fundamento legal a alínea b) do nº 1 do artigo 24º da LGT, onde o legislador estabelece a imputação da falta de entrega ou pagamentos dos tributos ao gestor que, tendo o prazo de pagamento ou de entrega da prestação tributária terminado no seu período de gerência, os não tenha efectuado, a menos que se demonstre que não lhe foi imputável essa falta. Ou seja, demonstrada a gerência de facto pela Administração Fiscal, faz recair sobre o gestor o ónus da prova de que não lhe é imputável a falta de pagamento ou de entrega da prestação tributária, uma vez que tal imputabilidade se presume.
Da leitura da p.i. resulta que o agora oponente, pugnando pela sua ilegitimidade na execução e, para cumprimento do ónus da prova que sobre ele recaía, arrolou prova testemunhal, mas tal prova não foi produzida em 1ª instância, nem a M. Juiz fundamentou a razão pela qual não tinha tal prova sido produzida.
Conclui-se, assim, não ser possível conhecer do mérito dos presentes autos, em substituição do tribunal a quo, em virtude de este Tribunal ad quem não dispor de todos os elementos necessários com relevância para a decisão da causa, sendo necessária, assim a ampliação da matéria de facto em 1ª instância.


II.2.3. Preparando a decisão, formulam-se as seguintes conclusões:

I - Existe nulidade parcial da sentença, por omissão de pronúncia, quando aquela é completamente omissa na apreciação da responsabilidade subsidiária do revertido, nos termos do artigo 24º, nº 1 alínea b) da LGT, relativamente às dívidas de IMI, (apreciando apenas os pressupostos de reversão quanto à dívida de Coimas) e não teceu qualquer justificação para tal omissão.

II – A nulidade parcial da sentença não obsta a que o Tribunal de recurso conheça em substituição do objecto da oposição, mas esse conhecimento só lhe é permitido no caso de os autos fornecerem todos os elementos para o efeito.

III. DECISÃO

Termos em, acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte em conceder provimento ao recurso, anulando-se parcialmente a sentença recorrida, na exacta medida do recurso, e determinando a remessa dos autos ao Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel para que, se a tal nada mais obstar, aí se proceda à necessária ampliação da matéria de facto e demais termos, de acordo com o que fica exposto.

Sem Custas.

Porto, 26 de Fevereiro de 2015
Ass. Cristina Travassos Bento
Ass. Paula Moura Teixeira
Ass. Mário Rebelo