Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00575/11.9BEPRT-A
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:02/15/2019
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Ricardo de Oliveira e Sousa
Descritores:SUBSÍDIO DE ALIMENTAÇÃO; ANULAÇÃO DE ATOS DE APLICAÇÃO DE PENAS DISCIPLINARES; DEVER DE RECONSTRUÇÃO DA SITUAÇÃO DE FACTO DE ACORDO COM O JULGADO; ARTIGO 173º DO C.P.T.A.;
ARTIGO 2º DO DECRETO-LEI Nº. 57-B/84, DE 20.02; ARTIGO 300º DA LGTFP.
Sumário:
I- O subsídio de alimentação é um subsídio destinado a compensar o trabalhador pela despesa do almoço, sendo, por isso, apenas devido por cada dia de trabalho efetivamente trabalhado.
II- O dever de reconstituição consagrado no art. 173º do C.P.T.A. no âmbito da anulação de atos de aplicação de penas disciplinares não engloba o pagamento do subsídio de alimentação, pois que o funcionário não esteve ao serviço no período a reconstituir, não podendo, por isso, ser compensado por despesas de almoço em que não incorreu. *
*Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:EZMFS
Recorrido 1:MUNICÍPIO DE VNG
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Execução para pagamento de quantia certa - arts. 170.º e seguintes CPTA - Recurso Jurisdicional
Decisão:
Negar provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido da rejeição do presente recurso jurisdicional por o valor da sucumbência não permitir a sua recorribilidade.
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Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:

I – RELATÓRIO
EZMFS, devidamente identificado nos autos, intentou no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto a presente Execução para Pagamento de Quantia Certa contra o MUNICÍPIO DE VNG, peticionando a condenação deste no pagamento de juros de mora, à taxa legal, que se vencerem sobre os vencimentos, subsídios de férias e de natal no valor € 5,143,00, bem como no pagamento dos subsídios de refeição no valor de € 4,013,80, acrescido dos respetivos juros de mora, à taxa legal de 4%, que se venceram sobre os ditos subsídios de refeição, no valor € 367,65, tudo no montante global de € 9,525,09.
O T.A.F. do Porto julgou esta ação executiva parcialmente procedente, nos termos que constam de fls. 26 a 30 dos autos [suporte físico], ou seja, (i) condenando “(…) o executado a, no prazo de 30 dias, pagar ao exequente juros de mora, à taxa legal, relativos aos vencimentos e subsídios de Natal e de férias - que o exequente deixou de auferir desde 2011 em virtude do ato emitido em 17/12/2010 e até à sua reintegração em 01/12/2015-, contabilizados e calculados desde o momento em que cada um dos vencimento e subsídios de Natal e de férias eram devidos, e até ao momento em que foram efetivamente pagos, ou seja, até fevereiro de 2016 (…)”, todavia, (ii) absolvendo o Executado “(…) do pedido no que concerne ao pagamento dos subsídios de refeição ou de alimentação e respetivos juros de mora (…)”.
É da decisão de absolvição do Executado “(…) do pedido no que concerne ao pagamento dos subsídios de refeição ou de alimentação e respetivos juros de mora (…)” que o Recorrente veio interpor o presente RECURSO JURISDICIONAL, para o que alegou, apresentando para o efeito as seguintes conclusões, que delimitam o objeto do recurso:
(…)
A) A douta sentença sob recurso, ao interpretar o art.° 2.° do Decreto-Lei n.° 57-B/84, de 20 de Fevereiro, no sentido de o subsídio de refeição só ser devido quando haja efectiva prestação de trabalho, desconsiderando a hipótese de o trabalhador se encontrar numa situação de disponibilidade para o prestar, incorre em erro de julgamento, violando tal preceito legal.
B) A mesma douta sentença interpreta e aplica erradamente o invocado preceito legal, em conjugação com o art.° 173.°, n.° 1, do CPTA e o art.° 300.° da LGTFP, ao considerar que, em sede de execução do douto acórdão anulatório da decisão punitiva aplicada ao exequente, não lhe é devido o valor do subsídio de refeição desde 2011 e 1/12/2015 e respectivos juros de mora, não obstante a não prestação efectiva do trabalho pelo exequente se dever exclusivamente a facto imputável ao executado
C) As normas ínsitas nos citados art.° 300.° da LGTFP, art.° 173.° do CPTA e art.° 2.° do Decreto-Lei n.° 57-B/84, de 20 de Fevereiro, devidamente conjugadas e interpretadas como são na douta sentença sob recurso no sentido de sentido de que, pela mera razão de que a inexistência de prestação efectiva de trabalho, não obstante a disponibilidade para o fazer, determina a inexistência do direito ao subsídio de refeição, são materialmente inconstitucionais por violação do princípio da legalidade da administração, da justiça, da igualdade e da proporcionalidade.
Nestes termos e nos demais de direito, deve ser concedido provimento ao presente recurso, com a consequente revogação da douta sentença recorrida e a final condenação do executado ao pagamento do valor do subsídio de refeição e correspondentes juros, como é de JUSTIÇA (…)”.
*
O Recorrido Município de VNG apresentou contra alegações que concluiu da seguinte forma:
“(…)
I. O Recorrido limitar-se-á a pugnar pela manutenção do Julgado, tal qual decidido, louvando-se nessa parte impugnada no acerto da sua prolacção;
II. No iterim do efeito executório de decisão administrativa até à sua anulação judiciosa, pretensa disponibilidade para o serviço não releva e é incompatível com prestação efectiva de trabalho;
III. E o Instituto da Reconstituição da situação, face à anulação da decisão administrativa não comporta pagamento de subsídio de alimentação e, “a fortiori de juros, por elementar hermenêutica do disposto no Artigo 2º, do DL 57-B/84, de 20 de Fevereiro, pois esse direito provê tão-só prestação efectiva de trabalho, como decidido.
IV. O direito ao subsídio de alimentação supõe disponibilidade efectiva ao serviço, que não ficta.
V. Este é o entendimento que dimana da Lei que está conforme os princípios constitucionais da C.R.P., não tendo sido violadas quaisquer normas, devendo manter-se o julgado “qua tale” e improcedentes a conclusões do recurso.
Suprido o omitido, pela improcedência do Recurso, a acostumada Justiça (…).
*
O Tribunal a quo proferiu despacho de admissão do recurso, fixando os seus efeitos e o modo de subida.
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O Ministério Público neste Tribunal emitiu parecer no sentido da rejeição do presente recurso jurisdicional, por o valor da sucumbência não permitir a sua recorribilidade, o que se mostra já apreciado no despacho antecedente.
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Com dispensa de vistos prévios – artigo 36.º n.º 2 do C.P.T.A. – cumpre, pois, apreciar e decidir, já que nada a tal obsta.
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II – DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO - QUESTÕES A DECIDIR
O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, de acordo com o disposto nos artigos 144.º n.º 2 e 146.º n.º 4 do CPTA e dos artigos 5.º, 608.º n.º 2, 635.º n.ºs 4 e 5 e 639.º do novo CPC ex vi dos artigos 1.º e 140.º do CPTA.
Neste pressuposto, as questões essenciais a dirimir resumem-se a saber se a sentença recorrida, ao absolver o Réu do pedido de pagamento dos subsídios de refeição, interpretou e aplicou erradamente o artigo 2º do Decreto-Lei nº. 57-B/84, de 20.02, em conjugação com o art.° 173.°, n.º 1, do CPTA e o art.° 300.° da LGTFP, e, quando assim não se entenda, se as normas ínsitas nos citados art.° 300.° da LGTFP, art.° 173.° do CPTA e art.° 2.° do Decreto-Lei n.° 57-B/84, de 20 de Fevereiro, devidamente conjugadas e interpretadas no sentido de sentido de que, pela mera razão de que a inexistência de prestação efetiva de trabalho, determina a inexistência do direito ao subsídio de refeição, são materialmente inconstitucionais por violação do princípio da legalidade da administração, da justiça, da igualdade e da proporcionalidade.
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III – FUNDAMENTAÇÃO
III.1 – DE FACTO
Na decisão recorrida deram-se como provados os seguintes factos, sem reparos nesta parte:
1. Em 17.12.2010, através de deliberação, o agora executado aplicou ao agora exequente a sanção disciplinar de despedimento;
2. O exequente, em 18.02.2011, propôs ação administrativa especial contra o agora executado, que correu termos neste Tribunal com o n.º de processo 575/11.9BEPRT, e na qual o exequente peticionou a este Tribunal a anulação do ato punitivo referido no ponto anterior;
3. Após várias vicissitudes, em 17.04.2015, o Venerando Tribunal Central Administrativo Norte proferiu Acórdão em que, para além de conceder provimento ao recurso jurisdicional apresentado contra o Acórdão proferido por este Tribunal em 20/12/2013, julgou procedente a ação administrativa com o n.º de processo 575/11.9BEPRT e anulou o ato descrito no ponto 1 deste probatório;
4. Tendo sido apresentado recurso de revista pelo agora executado, o Supremo Tribunal Administrativo proferiu Acórdão em 29.10.2015, através do qual rejeitou a revista;
5. O Acórdão descrito no ponto anterior foi notificado às partes através de ofícios expedidos em 03.11.2015;
6. Em 01.12.2015, o executado reintegrou o exequente;
7. Em fevereiro de 2016, o executado procedeu à eliminação da menção da pena disciplinar resultante do ato emitido em 17/12/2010 do registo disciplinar do exequente, e procedeu ao pagamento ao exequente da quantia ilíquida de 56.725,74 Euros, atinente a vencimentos e subsídios de férias e de Natal desde 2011 e até 01.12.2015.
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III.2 - DO DIREITO
Cumpre decidir, sendo que as questões que se mostram controversas e objeto do presente recurso jurisdicional, como se viu supra, consistem em saber se a sentença recorrida, na parte em que desatendeu o pedido no que concerne ao pagamento dos subsídios de refeição ou de alimentação e respetivos juros de mora, incorreu em erro de julgamento de direito, por violação do artigo 2º do Decreto-Lei nº. 57-B/84, de 20.02, em conjugação do artigo 173º, nº.1 do CPTA e o artigo 300º da LGTFP, e, quando assim não se entenda, se as normas ínsitas nos citados art.° 300.° da LGTFP, art.° 173.° do CPTA e art.° 2.° do Decreto-Lei n.° 57-B/84, de 20 de Fevereiro, devidamente conjugadas e interpretadas no sentido de sentido de que, pela mera razão de que a inexistência de prestação efetiva de trabalho, determina a inexistência do direito ao subsídio de refeição, são materialmente inconstitucionais por violação do princípio da legalidade da administração, da justiça, da igualdade e da proporcionalidade.
Vejamos.
O Recorrente pediu ao Tribunal a quo a condenação do R. no pagamento de juros de mora, à taxa legal, que se vencerem sobre os vencimentos, subsídios de férias e de natal no valor € 5,143,00, bem como no pagamento dos subsídios de refeição no valor de € 4,013,80, acrescido dos respetivos juros de mora, à taxa legal de 4%, que se venceram sobre os ditos subsídios de refeição, no valor € 367,65, tudo no montante global de € 9,525,09.
Todavia, o T.A.F. do Porto, para o que ora nos interessa , absolveu o Recorrido “(…) do pedido no que concerne ao pagamento dos subsídios de refeição ou de alimentação e respetivos juros de mora (…)”.
Fê-lo, quanto a esta pretensão, com a seguinte fundamentação jurídica:
“(…)
Dissolvida a primeira controvérsia, importa indagar do direito a aplicar no que concerne à pretensão do exequente de recebimento dos subsídios de refeição desde 2011 e até 01/12/2015, incluindo os respetivos juros de mora.
Nesta temática, a dúvida quanto ao direito a aplicar é também inexistente, em virtude, se não mais, da claríssima Jurisprudência editada pelo Venerando Tribunal Central Administrativo Norte em 15/07/2016, no processo 01954/07.1BEPRT-A. Com efeito, a Veneranda Instância exarou no mencionado Aresto o seguinte:
“(…)
III - Enquadramento jurídico.
Determina o artigo 173º nº 1 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos: “Sem prejuízo do eventual poder de praticar novo acto administrativo, no respeito pelos limites ditados pela autoridade do caso julgado, a anulação de um acto administrativo constitui a Administração no dever de reconstituir a situação que existiria se o acto anulado não tivesse sido praticado, bem como de dar cumprimento aos deveres que não tenha cumprido com fundamento no acto entretanto anulado, por referência à situação jurídica e de facto existente no momento em que deveria ter actuado.”
Já no domínio do anterior recurso contencioso de anulação, se entendia que o caso julgado é constituído pela decisão de anulação do acto recorrido e pelo vício que fundamenta a decisão pelo que a eficácia do caso julgado se circunscreve ao vício que determinou a sentença, estando a Administração Pública impedida de, em sede de execução, renovar o acto anulado com reiteração dos vícios que motivaram a decisão de anulação.
Consistindo a execução da decisão judicial anulatória na reconstituição da situação hipotética em que se encontraria o exequente não fora a prática do acto anulado, ou seja, na prática de novo acto, de sentido idêntico ou de sentido contrário, mas isento do vício que o inquinava.
Neste sentido vejam-se os acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 12.12.2001, recurso 43741-A (Pleno), de 02.10.2001, recurso 34044-A e de 14.02.2002, recurso 48079.
No domínio da acção administrativa especial, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, o Supremo Tribunal Administrativo em acórdão de 30.01.2007, no processo 040201-A, decidiu (sumário):
I - A sentença anulatória de um acto administrativo tem um efeito constitutivo, que, em regra, consiste na invalidação do acto impugnado, fazendo-o desaparecer do mundo jurídico desde o seu nascimento. Tem, também, um outro efeito, próprio de toda e qualquer sentença de um tribunal, seja qual for a natureza deste, que advém da força do caso julgado, apelidado de efeito conformativo (também designado de preclusivo ou inibitório), que exclui, no mínimo, a possibilidade de a Administração reproduzir o acto com os mesmos vícios individualizados e condenados pelo juiz administrativo. Ainda, um outro efeito, existe que é o da reconstituição da situação hipotética actual (também chamado efeito repristinatório, efeito reconstitutivo ou reconstrutivo da sentença). Segundo este princípio, a Administração tem o dever de reconstituir a situação que existiria se não tivesse sido praticado o acto ilegal ou se o acto tivesse sido praticado sem a ilegalidade. Finalmente, por a Administração não querer, não saber ou não poder, proceder à reconstituição da situação que era definida pelo julgado anulatório, nada mais restando ao administrado, ao abrigo do quadro normativo definido (art°173° n°1 do CPTA), do que ir novamente ao tribunal solicitar a execução do julgado. São os designados efeitos ultraconstitutivos da sentença de anulação, que se manifestam hoje no processo de execução de julgados, pelo qual os interessados podem obter a especificação do conteúdo dos actos e operações a adoptar pela Administração e o prazo para a sua prática (art°179° n°1 do CPTA), a declaração de nulidade dos actos desconformes com a sentença e a anulação dos que mantenham, sem fundamento válido, a situação ilegal.
(…)
X - A obrigatoriedade reconhecida ao caso julgado material reside essencialmente na necessidade de assegurar estabilidade às relações jurídicas, não permitindo que litígios, com o mesmo objecto e entre as mesmas partes, se repitam indefinidamente, em prejuízo da paz jurídica imposta pelo interesse público. “
A este propósito ensina Freitas do Amaral, em “A execução das sentenças dos tribunais administrativos”, 2ª edição, Almedina, 1997, páginas 91 a 93:
“(…)
Uma vez que o acto ilegal foi anulado, parece que num ponto todos estarão de acordo quanto à definição do que deve ser o conteúdo da execução de sentença que o anulou: a Administração não pode ficar inactiva, sem nada fazer, deixando subsistir a situação produzida pelo acto ilegal (…).
Este acto é, decerto, um acto renovável e isso quer dizer que a autoridade que o praticou pode legalmente praticá-lo de novo, definindo a sua situação jurídica ou a do particular interessado nos mesmos termos em que ela foi definida no acto anterior, desde que não repita o vício que determinou a anulação.
Daqui não é legítimo extrair, porém, a ilação de que à autoridade administrativa seja permitido manter-se na inércia, a pretexto de a situação jurídica decorrente do acto ilegal poder permanecer tal e qual, idêntica a si própria, após a renovação do acto anulado.
A verdade é, antes, que enquanto o acto ilegal não for renovado, a sua anulação obriga a considerá-lo como nunca tendo existido.
A passividade da Administração constituiria aqui uma autêntica inexecução de sentença, pois a ordem jurídica violada não seria reintegrada: o funcionário demitido continuaria afastado do serviço por força de uma punição ilegal, o prédio demolido continuaria destruído por virtude de uma deliberação ilegal, a licença recusada continuaria por outorgar mercê de um despacho ilegal.
Ora é patente que isto não pode consentir-se: a fim de que seja reintegrada a ordem jurídica, a Administração tem de fazer alguma coisa de positivo – tem de praticar um novo acto administrativo, com efeitos retroactivos que substitua o acto ilegal.
(…)
O que se pretende sublinha é, tão-somente, que a Administração tem o dever de, em execução de sentença, definir de novo a situação jurídica ou a do particular interessado, mas agora de harmonia com a lei.”
E, na mesma linha, Vieira de Andrade, em “A Justiça Administrativa (Lições) ”, 7ª edição, Almedina, 2005, página 223 (com sublinhado nosso):
“As sentenças de provimento, para além dos seus efeitos directos – constitutivos, na anulação ou meramente declarativos (de apreciação), na declaração de nulidade ou de inexistência – geram, em regra, por força da retroactividade dos seus efeitos, a obrigação para a Administração de reconstruir a situação de facto de acordo com o julgado, além de ter de actuar no respeito pelo decidido (diz-se, por isso, que produzem “ efeitos ultra-constitutivos”. Efeitos que não deixam de produzir-se quando o pedido tenha sido de estrita anulação (…), embora, como vimos, seja admissível e provável que o restabelecimento da situação constitua objecto de pedido cumulado com o pedido anulatório.”.
A reconstrução da situação de facto de acordo com o julgado não engloba o pagamento de subsídio de refeição. Com efeito este destina-se a compensar os gastos com alimentação dos funcionários que têm de tomar as refeições fora de casa e, por isso, a sua atribuição só se justifica nos casos em que o funcionário exerça de facto as suas funções, como o demonstra o facto de essa atribuição se não fazer numa série de situações, entre elas se encontrando as férias, a doença, o casamento, o nojo, o cumprimento das penas disciplinares, etc. – vd. art. 2º nº 2 do DL nº 57-B/84, de 20/02 e 29º nº 8 da Lei nº 100/99, de 31/03, em vigor à data em que se poderiam vencer os subsídios de refeição.
Ora no período em que é reclamado o subsídio de alimentação o representado do autor não esteve ao serviço e, por isso, não foi forçado a fazer as suas refeições fora de casa.
Não pode o autor ser, por isso, compensado por despesas que não teve.
Neste sentido ver o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 19.05.2004, no processo nº 0222/04, de 19/05/2004.
(…)
Da Jurisprudência que vem de se transcrever dimana, cristalinamente, que o subsídio de refeição, porque umbilicalmente indissociável da prestação efetiva de trabalho, não é devido ao agora exequente. Realmente, destinando-se este subsídio a compensar uma despesa, naturalmente não há lugar ao direito a recebê-lo se não ocorre o facto jurídico em que assenta a existência da dita despesa. De modo mais simples, se não há despesa, não pode haver compensação pela realização da mesma.
Deste modo, e no que interessa ao caso em discussão, impera concluir que não assiste ao exequente, mesmo em sede de reconstituição da sua situação, o direito a receber o pretendido subsídio de refeição desde 2011 e até 01/12/2015. E não subsistindo direito ao subsídio de refeição, logicamente, também não há lugar ao pagamento dos correspetivos juros moratórios.
(…)”.
Desta sentença discorda o Recorrente, que lhe imputa erro de julgamento de direito.
Mas sem razão, como veremos.
O Tribunal a quo mais não fez do que acolher na sentença recorrida aquilo que foi já afirmado reiteradamente pela jurisprudência dos Tribunais Superiores desta jurisdição, no sentido de que o dever de reconstituição consagrado no art. 173º do C.P.T.A. no âmbito da anulação de atos de aplicação de penas disciplinares não engloba o pagamento do subsídio de alimentação.
Neste sentido, podem ver-se os seguintes Acórdãos:
- do Tribunal Central Administrativo Sul, de 26.02.2015, tirado no processo nº. 05834/10, , que, a propósito do dever de reconstituição consagrado no art. 173º do CPTA no âmbito da anulação de atos de aplicação de pena disciplinar de inatividade, julgou que “(…) a reintegração efectiva da ordem jurídica violada a realizar em sede de execução do acórdão exequendo só é alcançada através da condenação da entidade executada a pagar à exequente o valor correspondente aos vencimentos que a mesma deixou de auferir pela privação do exercício das suas funções em consequência do acto ilegal que foi anulado. A quantia em causa abrange os vencimentos a que a exequente tinha direito, bem como os subsídios de férias e de Natal, mas já não o subsídio de alimentação, pois que este apenas é pago quando o funcionário presta serviço efectivo. (…)” [destaque nosso].
- deste Tribunal Central Administrativo Norte, de 15.07.2016, tirado no processo 01954/07.1BEPRT-A, que, a este propósito, expendeu: “A reconstrução da situação de facto de acordo com o julgado não engloba o pagamento de subsídio de refeição. Com efeito este destina-se a compensar os gastos com alimentação dos funcionários que têm de tomar as refeições fora de casa e, por isso, a sua atribuição só se justifica nos casos em que o funcionário exerça de facto as suas funções, como o demonstra o facto de essa atribuição se não fazer numa série de situações, entre elas se encontrando as férias, a doença, o casamento, o nojo, o cumprimento das penas disciplinares, etc. – vd. art. 2º nº 2 do DL nº 57-B/84, de 20/02 e 29º nº 8 da Lei nº 100/99, de 31/03, em vigor à data em que se poderiam vencer os subsídios de refeição.”
- do Tribunal Central Administrativo Sul, de 18.05.2017, tirado no processo nº. 13029/16, de 18.05.2017, que, no domínio versado, entendeu: “(…) As remunerações que o executado terá de calcular e pagar ao associado do recorrente incluem os subsídios de férias e Natal (cfr. art. 17º n.º 3, do DL 184/89, de 2/6, – diploma em vigor à data em que são devidos os referidos subsídios -, e, actualmente, art. 150º n.º 2, da LTFP), mas não o subsídio de refeição [cfr. Ac. do TCA Norte de 15.7.2016, proc. n.º 1954/07.1 BEPRT-A (“1. A reconstrução da situação de facto de acordo com o julgado anulatório do acto que aplicou a pena de aposentação compulsiva não engloba o pagamento de subsídio de refeição.”)] [destaque nosso].
- do Tribunal Central Administrativo Sul, de 01.06.2017, no processo nº. 03477/08, que reafirma o expendido no aresto do Tribunal Central Administrativo Sul, de 18.05.2017, tirado no processo nº. 13029/16, de 18.05.2017.
Não se vislumbra, nem descortina, qualquer argumento de natureza jurídica ou prática para inverter a direção seguida na apontada jurisprudência, assomando a mesma, a nosso ver, como a mais concordante e consentânea com o bloco legal aplicável ao caso versado nos autos, pelo que a ela aderimos.
Na verdade, o subsídio de alimentação, como o próprio nome indica, é um subsídio destinado a compensar o trabalhador pela despesa do almoço.
Por isso, é pago por referência a cada dia de trabalho efetivamente trabalhado, ou seja, caso o funcionário falte ao trabalho, ou mesmo no período de férias, este valor não é devido pela entidade empregadora.
Logo, não tendo o Recorrente estado ao serviço no período reclamado, não pode ser compensado por despesas de almoço em que não incorreu, situação que tem um verdadeiro efeito de implosão em relação ao defendido pelo mesmo nesta matéria.
Deste modo, e à luz da fundamentação que agora expressamente se avoca, é mandatório concluir pelo fracasso do Recorrente na demonstração da verificação do erro de julgamento de direito da sentença recorrida.
Finalmente, refira-se que alegação em torno da inconstitucionalidade do artigo 2º do Decreto-Lei nº. 57-B/84, de 20.02, em conjugação do artigo 173º, nº.1 do CPTA e o artigo 300º da LGTFP, quando interpretado no sentido concordante com a posição jurisprudencial aqui acolhida, carecia de mais e melhor densificação e justificação, o que só por si determina a sua não verificação.
Com efeito, a alegação que o Recorrente mobiliza neste domínio é manifestamente insuficiente no sentido da sua conformação com a violação dos princípios invocados, não constituindo suporte para logicamente se concluir a necessidade, ou, sequer, a probabilidade da inconstitucionalidade suscitada nos autos.
Concludentemente, nenhuma inconstitucionalidade quanto ao ora perfilhado se divisa por violação dos principio da legalidade da administração, da justiça, da igualdade, e da proporcionalidade.
Mercê de tudo o quanto ficou exposto, deverá ser concedido negado provimento ao presente recurso jurisdicional, confirmando-se a sentença recorrida.
Ao que se provirá em sede de dispositivo.
***
IV – DISPOSITIVO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção do Contencioso Administrativa deste Tribunal, de harmonia com os poderes conferidos pelo artigo 202º da CRP, em negar provimento ao recurso jurisdicional “sub judice”, confirmando a sentença recorrida.
Custas a cargo do Recorrente.
Notifique-se.
Porto, 15 de fevereiro de 2019,
Ass. Ricardo de Oliveira e Sousa
Ass. Fernanda Brandão
Ass. Frederico de Frias Macedo Branco