Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00492/12.5BEVIS
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:05/13/2021
Tribunal:TAF de Viseu
Relator:Cristina da Nova
Descritores:IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO, DOCUMENTO INTERNO ELABORADO PELA AT VALOR COMO PROVA, ÓNUS DA PROVA DA NOTIFICAÇÃO,
REGISTO DE ENCERRAMENTO E EXTINÇÃO DA SOCIEDADE, SÓCIOS LIQUIDATÁRIOS
Sumário:1- Cabe à Administração Tributária o ónus de demonstrar a efetiva notificação da avaliação.

2- Um print extraído do sistema informático da Administração Tributária não pode deixar de ser considerado como documento interno elaborado pela própria Administração, para efeitos internos, não oponível ao contribuinte, e não prova nem a remessa da avaliação em causa para o domicílio do sócio liquidatário, nem muito menos o seu recebimento.

3- Nenhuma presunção existe, nem nenhuma garantia há de que o print junto esteja em conformidade com os elementos com base nos quais foi, alegadamente (pela Fazenda), elaborado, o registo e carta, esses sim, com valor probatório.

4- Dado estar em causa avaliação dos prédios aquando da 1ª transmissão ao abrigo do regime do CIMI, o valor patrimonial tributário do prédio resultante da avaliação, bem como a possibilidade de requerer segunda avaliação deve ser notificado ao sujeito passivo por via postal registada, nos termos do disposto no artigo 15º-E do DL. nº 287/2003.

5- O art. 160.º, n.º 2 do CSC, estatuiu que a sociedade considera-se extinta, mesmo entre os sócios sem prejuízo do disposto nos artigos 162.º a 164.º, pelo registo do encerramento da liquidação. Com a extinção da sociedade cessa a personalidade jurídica e judiciária, à semelhança do que acontece com a morte de qualquer pessoa singular.

6- Ainda que demonstrado o envio do ofício para notificação de sociedade extinta, não produz qualquer efeito jurídico.

Neste caso são os sócios liquidatários que terão de ser chamados às relações jurídicas da extinta sociedade e, por conseguinte, serão estes que deverão, por maioria de razão, ser notificados de todos os atos com ela relacionados.*
* Sumário elaborado pela relatora
Recorrente:S., Lda
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:Unanimidade
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido de dever ser negado provimento ao recurso.
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:
*

1. RELATÓRIO

A Recorrente, S., Lda., melhor identificada nestes autos, interpôs recurso da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto que julgou procedente a exceção da falta de procedimento de revisão quanto ao preço declarado, absolvendo a Fazenda Pública do pedido.

Formula nas respetivas alegações (cfr. fls.) as seguintes conclusões que se reproduzem:

«1) Deve alterar-se o facto dado como provado em 7., de que a recorrente recebeu as notificações das avaliações dos prédios, para facto não provado, pois as ditas notificações foram efetuadas na pessoa da recorrente quando já estava extinta pelo que é como se nunca tivessem existido.

2) Não tendo a recorrente recebido a notificação relativa às avaliações dos bens imóveis, para cumprir como o artigo 58º-A, n.º 2 do CIRC, não lhe podia ter dado cumprimento.

3) Consequentemente, não tendo a recorrente sido notificada, também não podia lançar mão do pedido de 2ª avaliação - artigo 76º do CIMI - e do pedido de revisão do artigo 129º do CIRC.

4) Pelo que a liquidação recorrida viola o disposto no artigo 58º-A, n.º 2 do CIRC, no artigo 76º do CIMI e, ainda, no artigo 129º do CIRC.

Por outro lado,
5) A recorrente não estava obrigada a adotar, na determinação do lucro tributável, os valores normais de mercado que, no caso, não podiam ser inferiores aos valores patrimoniais tributários definitivos que serviram de base à liquidação do imposto municipal sobre as transmissões onerosas de imóveis, conforme artigo 58º-A do CIRC;

6) A recorrente estava obrigada a adotar na determinação do lucro tributável - artigo 73º do CIRC - os valores de mercado - artigo 74º do CIRC - na adjudicação dos bens imóveis aos sócios, na dissolução, liquidação e partilha, como o fez.

7) Sendo que os valores de mercado - artigo 74º do CIRC - fazem parte de um conceito indeterminado e que valores normais de mercado são um conceito determinado pelo artigo 58º-A, n.º 2 do CIRC.

8) Pelo que a liquidação recorrida viola o artigo 74º do CIRC.

Sem prescindir, que,

9) No caso, para apreciação dos vícios, a adjudicação dos bens aos sócios a valores de mercado não cabe na necessidade de prova do preço efetivo, conforme n.º 7 do artigo 129º do CIRC;

10) O que cabe no pedido de revisão do artigo 129º do CIRC são as transmissões onerosas de bens imóveis, a valores normais de mercado, onde existem preços.

11) Não cabem no pedido de revisão do artigo 129º do CIRC, as equiparações a transmissões onerosas, consagradas nomeadamente no CIMT, no artigo 2º, n.º 5, e), das adjudicações aos sócios nas partilhas das sociedades.

12) Pelo que a sentença erra por fazer depender a exceção invocada no artigo 129º, n.º 7 do CIRC e deve por isso conhecer a situação de fundo em discussão.

13) Ademais, a exigência do artigo 129º, n.º 7, do CIRC, é sobre o quantum da diferença e nada mais, pelo que viola a lei estabelecida não conhecer o restante alegado na Petição Inicial, com base neste pressuposto, nomeadamente vício de fundamentação e outros.

Sem prescindir, ainda, que,
14) A recorrente não foi notificada dos meios de defesa, conforme determinava o artigo 36º, n.º 1, do CPPT, nomeadamente para efeitos de deduzir o pedido de revisão exigido, segundo a AT e a douta sentença recorrida, com base no artigo 129º do CIRC, o que por vício de violação da lei conduz à anulação da liquidação recorrida.
Nestes termos e nos mais de direito que V. Exas. doutamente suprirão, deve a douta decisão recorrida ser revogada e substituída por outra que aprecie os vícios e erros alegados, e, consequentemente, determine a anulação da liquidação recorrida com todas as consequências legais, para que assim se faça JUSTIÇA.»
*

A Recorrida não apresentou contra-alegações.
*
O Exma. Procuradora-Geral Adjunta deste tribunal emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso mantendo a sentença recorrida: «O art. 58°-A do Código do IRC (actual art 64°), foi aditado pelo Decreto-Lei n.° 287/2003, de 12 de Novembro e veio determinar, na prática, que os sujeitos passivos de IRC, alienantes ou adquirentes, devem declarar para efeitos de determinação do lucro tributável o valor patrimonial tributário (VPT), caso o valor da transacção tenha sido inferior.
Esta disposição legal impõe que devem ser adoptados os valores normais de mercado, que não poderão ser inferiores ao VPT definitivo, apurado nos termos dos arts. 37° e seguintes do Código do IMI.
Tal imposição legal consubstancia contudo uma verdadeira presunção, tendo em conta que o art. 129° do Código do IRC permite a prova do preço efectivo da transmissão. O sujeito passivo de IRC que aliene um bem imóvel deve contabilizar a venda pelos "valores normais de mercado".
Caso não o faça e proceda à autoliquidação do exercício em causa com base num valor abaixo do VPT definitivo, terá de entregar uma declaração de rendimentos posterior, desta vez, de substituição, nos termos do art. 58°-A, n.° 3 e art. 114°, ambos do CIRC.
O mesmo acontece nos casos em que o VPT definitivo apenas é apurado posteriormente, como na situação em que a avaliação patrimonial, da qual resultará o VPT, apenas é efectuada em data posterior à entrega da Declaração Modelo 22.
Nestas situações, o sujeito passivo fica igualmente adstrito à entrega de declaração de substituição, nos termos expostos, durante o mês de Janeiro do ano seguinte àquele em que o VPT se tornou definitivo, de acordo com o disposto no art. 58°-A, n.° 4 do CIRC.
O regime exposto assenta no critério dos valores normais de mercado, deixando em segundo plano o valor efectivamente praticado, dando sobretudo prevalência ao VPT quando superior aos montantes declarados.
O critério do VPT definitivo, quando superior ao valor declarado, surge assim como um indicador que poderá ser afastado pela administração tributária, nos termos do art. 58°-A, n.° 6 do CIRC, mas também pelo sujeito passivo, de acordo com o disposto no art. 129° do mesmo diploma.
O regime do art. 129° do CIRC permite ao sujeito passivo de IRC a prova de que o preço efectivamente praticado nas transmissões de direitos reais sobre imóveis foi inferior ao VPT, não sendo aplicável o art. 58°-A, n.° 2 do CIRC.
Para conseguir produzir esta prova, o sujeito passivo deverá entregar requerimento nesse sentido, em Janeiro do exercício seguinte àquele em que ocorreu a transmissão se o VPT definitivo já estiver determinado, ou nos 30 dias seguintes à data em que a avaliação do imóvel se tornou definitiva. Este pedido desencadeia um procedimento à semelhança do pedido de revisão da matéria colectável, previsto no art. 91° e 92° da LGT, por força do art. 129°, n.° 3 da CIRC e tem efeito suspensivo da liquidação adicional a operar.No entanto, ao apresentar este requerimento, o sujeito passivo deve fazê-lo acompanhar de autorização de acesso às contas bancárias pela DGCI, do sujeito passivo e dos seus administradores e gerentes, relativamente ao exercício em que ocorreu a transmissão e ao anterior.
O contribuinte, perante a exigência deste regime, poderá optar, em alternativa ou cumulativamente, pela impugnação do acto que fixou o VPT, pela avaliação subsequente do imóvel, caso haja lugar, mas assim, a liquidação adicional de IRC não será suspensa, nem tão pouco o prazo para dedução do pedido de demonstração do preço efectivo do art. 129°, aqui em análise.
Não foi feita prova pela impugnante que o preço constante da escritura foi o real e que o valor normal de mercado é inferior ao valor patrimonial tributário ( VPT)
Por isso, perante tal constatação, a AT teria que proceder à liquidação adicional do imposto tendo em conta o valor da avaliação, tanto mais que a impugnante não demonstrou comprovadamente o valor que alega, como era seu ónus, cfr art° 74 da LGT.
Como tal e reiterando o que foi referido pela bem fundamentada sentença sob recurso, não se verifica qualquer erro quanto ao facto dado como provado em 7, porquanto, além do mais, a mandatária da recorrente recebeu as notificações das avaliações dos prédios, a recorrente continuava a ter existência jurídica, não havia sido declarada falida e não se encontrava extinta .
A recorrente poderia pois ter usado todos os meios de defesa ao seu alcance e fazer prova do preço efectivamente praticado nas transmissões.
Não obstante, diga-se que as questões suscitadas pela recorrente foram devidamente objecto de apreciação em 1a instância e que não é admissível no recurso o conhecimento de questões que não foram colocadas nem apreciadas na decisão recorrida e que não são de conhecimento oficioso.
Pelo exposto, entendemos que a sentença recorrida não enferma de erro de julgamento quanto à matéria de facto ou de direito, pelo que emitimos parecer, no sentido da improcedência do recurso, com a sua consequente manutenção .
*

Colhidos vistos dos Exmos. Juízes adjuntos, foi o processo à Conferência para julgamento.

2. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR.

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objeto do recurso delimitado pelas conclusões das respetivas alegações.

[a] saber se a sentença incorreu em erro de julgamento porque a recorrente não foi notificada do resultado das avaliações dos bens imóveis para dar cumprimento ao art. 58.ºA do CIRC nem ao art. 76.º do CIMI e se há que alterar o facto provado em 7. para não provado, do qual consta que a Recorrente recebeu as notificações das avaliações dos prédios, não se verificando a exceção invocada pela recorrida.

3.FUNDAMENTOS de FACTO

Em sede factual o Mº. Juiz do Tribunal “quo” fixou probatório do seguinte modo:

«1.A Impugnante, “S., Lda.”, Contribuinte Fiscal nº (…), foi submetida a acção inspectiva credenciada pela Ordem de Serviço nº OI201200108, de 23/2/2012, que teve início em 12/2/2012 e terminou em 14/5/2012, relativamente ao exercício de 2009.
2. A Impugnante encontrava-se colectada pela actividade de ¯comércio a retalho noutros estabelecimentos não especificados com predominância de produtos alimentares, bebidas e tabaco” (CAE 47112).
3. No exercício de 2009 a Impugnante encontrava-se sujeita ao regime de transparência fiscal previsto no artigo 6º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas, mediante o qual foi imputado aos sócios o resultado líquido do exercício de 2009 no montante de € 215.494,03, para o qual contribuíram os proveitos decorrentes das mais-valias provenientes da alienação de imóveis no montante de € 446.961,49.
4. A sociedade comercial “S., Lda.”, Contribuinte Fiscal nº (…), no exercício de 2009, declarou ter recebido rendas no montante de € 60.742,71, e proveitos extraordinários no valor de € 156.432,85, sendo € 154.906,02 provenientes de ganhos em imóveis (mais-valias), e € 1.526,83 de outros ganhos extraordinários, montantes que abatidos dos custos contabilizados em € 1.681,53 conduziram a um resultado líquido do exercício de € 215.494,03.
5. Em 22/5/2009, no Cartório Notarial de Tarouca, foi outorgada escritura pública de dissolução, liquidação e partilha da sociedade comercial “S., Lda.”, Contribuinte Fiscal nº (…), tendo partilhado os imóveis identificados no quadro de fls. 9 do processo administrativo apenso, que se dá por reproduzido, em partes iguais entre os sócios J., Contribuinte Fiscal (…), e F., Contribuinte Fiscal (…).
6. No decurso da acção inspectiva aludida em 1, a Administração Tributária apurou que a Impugnante, em 8/6/2009, entregou uma declaração modelo 22, na qual reflectiu o valor de € 446.961,49, relativo à alienação dos imóveis mencionados em 3 e 5, sem atender aos valores patrimoniais resultantes da avaliação fiscal especificados no quadro de fls. 9/10, no montante global de € 1.966.600,00.
7. A Administração Tributária remeteu à Impugnante e ao sócio adquirente respectivo, sob registo postal, o resultado da avaliação efectuada aos imóveis constantes do quadro de fls. 9 do processo administrativo apenso, com excepção das avaliações relativas às fracções “E”, “FB” e “JB” do artigo urbano inscrito sob o artigo nº 1671º da freguesia da Sé, nas datas e sob os registos mencionados na documentação constante do Anexo 2 do Relatório de Inspecção, que se encontra a fls. 75 e seguintes do processo administrativo apenso.
8. A Impugnante não deduziu pedido de 2ª avaliação em relação aos imóveis identificados em 5 e 7, nem requereu a instauração de procedimento destinado a provar o preço efectivo praticado nessas alienações, nos termos previstos no artigo 129º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (actual 139º do mesmo diploma).
9. A presente impugnação foi apresentada em 25/9/2012.
FACTOS NÃO PROVADOS
Nada mais se provou com interesse para o conhecimento do mérito.»
*
4. Apreciação jurídica do Recurso.

4.1.A recorrente impugna a matéria de facto constante do n.º 7 do acervo factual provado, com o seguinte teor: A Administração Tributária remeteu à Impugnante e ao sócio adquirente respectivo, sob registo postal, o resultado da avaliação efectuada aos imóveis constantes do quadro de fls. 9 do processo administrativo apenso, com excepção das avaliações relativas às fracções “E”, “FB” e “JB” do artigo urbano inscrito sob o artigo nº 1671º da freguesia da Sé, nas datas e sob os registos mencionados na documentação constante do Anexo 2 do Relatório de Inspecção, que se encontra a fls. 75 e seguintes do processo administrativo apenso.

Como resulta da sentença recorrida foi entendido que atos tributários de avaliação dos imóveis foram notificados à recorrente e sócio, sob registo postal, do resultado da avaliação.
O Mmº. Juiz apoiou-se exclusivamente no conteúdo constante do print retirado da base de dados da própria da recorrida/Fazenda Pública: o documento de fls. 1 a 75 do anexo 1 do P.A., o qual constitui um print extraído do sistema informático da Administração Tributária.

Porém, tal print não pode deixar de ser considerado como documento interno elaborado pela própria Administração, para efeitos internos, não oponível ao contribuinte, e não prova nem a remessa da avaliação em causa para o domicílio do sócio liquidatário, nem muito menos o seu recebimento cfr. Com os acórdãos deste TCAN de 12-04-2013, proc. n.º 1727/07BEPRT e de 18-12-2014, proc. n.º 00850/06BEPRT. . Nenhuma presunção existe, nem nenhuma garantia há de que o print junto esteja em conformidade com os elementos com base nos quais foi, alegadamente (pela Fazenda), elaborado, o registo e carta, esses sim, com valor probatório.

Ademais, não se está perante uma situação de prova impossível uma vez que a Administração pode juntar aos autos o registo comprovativo do envio da avaliação para o domicílio fiscal do sujeito passivo, designadamente por via da exibição de um registo coletivo.
Contudo, nada mais consta dos autos que permita sustentar a efetiva ocorrência da notificação da ora recorrente e dos sócios liquidatários.

Com efeito, cabe à Administração Tributária o ónus de demonstrar a efetiva notificação da avaliação. Deste modo, errou o Tribunal a quo ao dar como provada a efetiva ocorrência da notificação das avaliações dos imóveis em causa, pois que o aludido documento que constitui o anexo 1 não é, para tanto, suficiente.

Cotejados os elementos documentais junto ao p.a., de fls. 1 a 75 do (anexo 1), não há dúvida que o facto 7 não pode ter a redação que lhe foi dada pelo tribunal recorrido.

Na verdade, nenhuma das 75 folhas do anexo 1, permite afirmar que foi remetido à impugnante e ao respetivo adquirente (sócio liquidatário da sociedade impugnante) sob registo postal o resultado da avaliação dos imóveis.
Tais documentos são prints juntos ao p.a., como o detalhe da avaliação dos vários imóveis, donde consta a avaliação por força da 1.ª transmissão na vigência do IMI e a indicação da data de emissão dos ofícios de notificação o número do registo do CTT bem como a situação de recebido em 16-09-2011 (fls. 40 e seguintes do anexo 1.).

Assim, o n.º 7 passará a conter a seguinte factualidade:

7.Consta dos documentos que constituem o anexo 1 do P.A, prints de detalhes sobre a 1.ª avaliação dos imóveis a que alude o quadro de fls. 9 do relatório de inspeção, com a identificação do n.º dos ofícios de notificação quer à impugnante (…) quer ao sócio liquidatário com o NIF n.º (…), constando neles as datas de emissão, nº do registo dos CTT e a situação de recebido em 16-09-2011.

Por outro lado, importa aditar um facto oficiosamente por decorrer dos documentos apresentados pela S. juntamente com a petição de impugnação [fls.11, cópia da certidão permanente de registos das sociedades], que atendendo à ordem estabelecida na sentença acrescerá ao n.º 5 do acervo factual provado:
Em 28-05-2009 foi registada a dissolução e liquidação da sociedade de S., Lda., e cancelada a matrícula.

4.2. Estabilizada a matéria de facto, importa agora averiguar se o tribunal incorreu em erro de julgamento ao absolver a Fazenda Pública do pedido por falta de uma condição de impugnabilidade da liquidação do IRC de 2009.

Dado estar em causa avaliação dos prédios aquando da 1ª transmissão ao abrigo do regime do CIMI, o valor patrimonial tributário do prédio resultante da avaliação, bem como a possibilidade de requerer segunda avaliação deve ser notificado ao sujeito passivo por via postal registada, nos termos do disposto no artigo 15º-E do DL. nº 287/2003.

Conforme resulta do probatório a AT junta prints dos quais consta que enviou ofício para notificação da S..

O art. 5.º das Sociedades Comerciais (CSC) determina que as sociedades gozam de personalidade jurídica e existem como tais a partir da data do registo definitivo do contrato pelo qual se constituem.
Por sua vez, o art. 160.º, n.º 2 do CSC, estatuiu que a sociedade considera-se extinta, mesmo entre os sócios sem prejuízo do disposto nos artigos 162.º a 164.º, pelo registo do encerramento da liquidação.
Com a extinção da sociedade cessa a personalidade jurídica e judiciária, à semelhança do que acontece com a morte de qualquer pessoa singular.

Não olvidou, porém, a lei que, mesmo após a extinção da sociedade, podem ainda subsistir relações jurídicas que anteriormente a tinham tido como sujeito. No caso em apreço, extinta a sociedade, os bens que tiverem sido partilhados pertencem aos sócios (art. 163.º e 164. do CSC e art. 26.º da LGT)
Decorre do quadro legal, que a sociedade liquidada e dissolvida com o respetivo registo é uma sociedade extinta, não existe.
Neste caso são os sócios liquidatários que terão de ser chamados às relações jurídicas da extinta sociedade e, por conseguinte, serão estes que deverão, por maioria de razão, ser notificados de todos os atos com ela relacionados.

Como se viu, e decorre da lei, os bens imóveis foram partilhados pelos sócios de modo que quem deve intervir nas relações jurídico-tributárias respeitantes, nomeadamente aos imóveis, são os ex-sócios, os liquidatários.

Decorre, por conseguinte, que embora não demonstrada nos autos a notificação a que alude a administração tributária no que respeita ao procedimento de avaliação dos prédios urbanos, na sequência da 1.ªtransmisssão após 2003, certo é que a mesma ainda que houvesse sido demonstrada inexoravelmente não tem qualquer relevo jurídico, pois é notificar alguém que já não existe.

Esta questão, põe, também, uma outra, que entendemos estar implicitamente sanada. A impugnação vem encabeçada pela S., com matrícula já cancelada, sendo a procuração emitida a advogado forense pelos liquidatários da S., dissolvida, liquidada e extinta desde 22-05-2009.

Deste modo a impugnação deveria ser encabeçada pelos liquidatários, mas, com pouco rigor vem identificada a aludida sociedade, entende-se, contudo, ser esse o propósito.

Aqui chegados, importa agora, analisar a notificação do sócio liquidatário que a sentença assentou ter ocorrido.

A questão jurídica a resolver consiste, pois, em determinar se o registo postal das cartas que contém a notificação é passível de ser demonstrado pelos prints da administração.

O facto de a notificação corresponder ao exercício de uma atividade documentada, em virtude da qual se comunica oficiosamente ao interessado um determinado ato tributário e que lhe dá a eficácia desejada, tem como consequência que a prova da sua existência pertence à Administração.
É a administração tributária quem toma a iniciativa de dirigir a notificação ao contribuinte e por isso é ela quem tem o ónus de demonstrar que o fez de forma correta, cumprindo os requisitos formalmente exigidos pelas normas procedimentais.
No caso dos autos, a notificação respeita ao resultado da avaliação dos prédios urbanos partilhados pelos sócios da S..


O registo da carta faz presumir que o seu destinatário provavelmente a receberá, ou terá condições de a receber, três dias após a data registo. Trata-se, pois, de uma presunção legal destinada a facilitar à administração tributária a prova de que a notificação foi introduzida na esfera de cognoscibilidade do notificando. Mas a «presunção» que tem por base o registo postal, não existe se o registo não for feito.

No caso concreto, a recorrida Fazenda Pública não juntou aos autos os recibos da expedição das cartas sob registo.
Nestas condições, cabe concluir encontrar-se o julgamento da matéria de facto, inscrito na sentença, inquinado por défice instrutório, porquanto existe a possibilidade séria de a produção da prova em falta implicar o estabelecimento de outro, sobretudo, mais alargado cenário factual, capaz de, pela sua amplitude, esclarecer melhor todos os acontecimentos, com repercussão no sentido da decisão do mérito da causa Ac. de 18-12-2014 na qual a relatora foi adjunta, no processo n.º 00850/06BEPRT, disponível em www.dgsi.pt
Não se pode, pois, manter o decidido que terá que ser anulado volvendo os autos à 1ª instância para a realização das diligências tendentes a apurar da real situação relacionada com a sorte dos registos postais descritos nos autos e bem assim a correspondência entre o resultado da avaliação dos imóveis e os aludidos registos conforme já referido e, posteriormente, ser aí proferida decisão em face dos elementos de prova recolhidos.
*

5. DECISÃO

Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal em conceder provimento ao recurso, anulando-se a sentença recorrida, a fim de ser feita a necessária ampliação e aquisição de prova quanto à notificação do resultado da avaliação dos imóveis partilhados.

Sem custas.

Porto, 13 de Maio de 2021

Cristina da Nova
Ana Paula Santos
Margarida Reis
____________________________________
i) cfr. Com os acórdãos deste TCAN de 12-04-2013, proc. n.º 1727/07BEPRT e de 18-12-2014, proc. n.º 00850/06BEPRT.