Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte | |
Processo: | 00415/11.9BECBR |
Secção: | 2ª Secção - Contencioso Tributário |
Data do Acordão: | 03/08/2018 |
Tribunal: | TAF de Coimbra |
Relator: | Pedro Vergueiro |
Descritores: | RECURSO DE CONTRA-ORDENAÇÃO NULIDADE DA SENTENÇA POR OMISSÃO DE PRONÚNCIA E POR FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO PAGAMENTO POR CONTA COIMA PRESSUPOSTOS |
Sumário: | I) Em termos de omissão de pronúncia, embora o julgador não tenha que analisar todas as razões ou argumentos que cada parte invoca para sustentar o seu ponto de vista, incumbe-lhe a obrigação de apreciar e resolver todas as questões submetidas à sua apreciação, isto é, todos os problemas concretos que haja sido chamado a resolver no quadro do litígio (tendo em conta o pedido, a causa de pedir e as eventuais excepções invocadas), ficando apenas exceptuado o conhecimento das questões cuja apreciação e decisão tenha ficado prejudicada pela solução dada a outras. II) Em relação à nulidade da sentença por falta de fundamentação, há que ter em atenção que aquilo que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação; a insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, afecta o valor doutrinal da sentença, sujeita-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade, sendo que a decisão recorrida conheceu da matéria em apreciação nos autos, elencando a realidade de facto que esteve na base da decisão, a qual foi enquadrada em termos que permitiram à ora Recorrente apreender tal situação, tal como o presente recurso bem evidencia. III) As entidades que exerçam, a título principal, actividade de natureza comercial, industrial ou agrícola, bem como as não residentes com estabelecimento estável em território português, devem proceder ao pagamento do imposto em três pagamentos por conta, com vencimento em Julho, Setembro e 15 de Dezembro do próprio ano a que respeita o lucro tributável. IV) Se as referidas entidades não procederem a esse pagamento, ainda que parcialmente, no prazo de 90 dias, contado do terminus de cada uma daquelas “prestações”, incorrem, pelo menos, na prática de uma infracção punível com coima variável entre o valor da prestação em falta e o seu dobro ou, sendo essa infracção imputada a título de negligência, variável entre 15% e metade do imposto em falta (arts. 104º nº 1 al. a) do CIRC e 114º nºs 2 e 5 al. f) do RGIT). V) Os pagamentos por conta são calculados com base no imposto liquidado nos termos do nº 1 do artigo 90º relativamente ao período de tributação imediatamente anterior àquele em que se devam efectuar esses pagamentos, devendo o sujeito passivo proceder à sua entrega nos termos do nº 1 do art. 104º do CIRC. VI) Não comete a infracção referida em IV) o sujeito passivo que num determinado ano procede tempestiva e integralmente ao pagamento por conta por referência ao imposto que à data desse pagamento se encontrava liquidado relativamente ao ano anterior, ainda que posteriormente, por força da apresentação de nova declaração de rendimentos (Mod. 22) venha a ser liquidado, relativamente ao ano transacto, um imposto de valor superior.* * Sumário elaborado pelo Relator. |
Recorrente: | M..., Lda. |
Recorrido 1: | Fazenda Pública |
Decisão: | Concedido provimento ao recurso |
Aditamento: |
Parecer Ministério Publico: |
1 |
Decisão Texto Integral: | Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: 1. RELATÓRIO “M…, Lda.”, devidamente identificada nos autos, inconformada, veio interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, datada de 04-10-2012, que julgou improcedente a pretensão pela mesma deduzida na presente instância de RECURSO DE CONTRA-ORDENAÇÃO relacionada com a decisão proferida em 10-02-2011 pelo Sr. Chefe da Divisão de Justiça Tributária, invocando a respectiva delegação do Sr. Director de Finanças, pela qual a sociedade Recorrente foi condenada no pagamento de uma coima no valor de € 24.923,89, por falta de entrega de pagamento por conta nos termos do art. 96º nº 1 al. a) do Código do IRC. JUSTIÇA” Não foram produzidas contra alegações. Colhidos os vistos dos Exmºs Juízes Desembargadores Adjuntos, vem o processo submetido à Conferência para julgamento. 2. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que as questões suscitadas resumem-se, em suma, ema analisar a invocada nulidade da sentença por omissão de pronúncia e por falta de fundamentação bem como apreciar o invocado erro de julgamento tendo presente que decisão recorrida concluiu no sentido da verificação dos pressupostos com referência ao ilícito imputado à ora Recorrente, sem olvidar a matéria da aplicação da coima no sentido de a mesma dever ser especialmente atenuada. 3. FUNDAMENTOS 3.1 DE FACTO Neste domínio, consta da decisão recorrida o seguinte: “… A - Foi elaborado pelo Serviço de Finanças da Lousã, o «Auto de Notícia» com o n.º C0001149676/2010 (cfr. doc. a fls. 4 dos autos que aqui se dá, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzido). B - Foi expedido ofício dos Serviços de Finanças da Lousã intitulado «Notificação de Defesa/Pagamento c/Redução Artº 70 RGIT», para a sede da Recorrente (cfr. docs. a fls. 6 a 8 dos autos que aqui se dão, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzidos). C - A Recorrente através do seu Advogado apresentou junto dos serviços de Finanças da Lousã, uma exposição escrita que designou por «Defesa Escrita» (cfr. docs. a fls. 9 a 14 dos autos que aqui se dão, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzidos). D - Por despacho do Sr. Chefe da Divisão Tributária de 23.09.2010, aposto na informação n.º 209/2010, foi determinado que a Recorrente seria notificada para exercer de novo a sua defesa (cfr. doc. a fls. 40 a 42 dos autos que aqui se dá, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzido). E - Foi expedido ofício dos Serviços de Finanças da Lousã intitulado «Notificação de Defesa/Pagamento c/Redução Artº 70 RGIT», para a sede da Recorrente (cfr. docs. a fls. 43 a 44 dos autos que aqui se dão, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzidos). F - Por despacho do Sr. Chefe da Divisão de Justiça Tributária, invocando a respectiva delegação do Sr. Director de Finanças, datado de 10.02.2011, aposto na informação n.º 12/2011 foi dada a concordância a aplicação da coima valorada em € 24.923,98 (cfr. doc. a fls. 48 a 55 dos autos que aqui se dá, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzido). G - Foi expedido ofício dos Serviços de Finanças da Lousã intitulado «Notificação de Defesa/Pagamento c/Redução Artº 70 RGIT», para a sede da Recorrente (cfr. doc. a fls. 60 dos autos que aqui se dá, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzido). H - Em documento intitulado «Decisão da Fixação de Coima», com data de 10.02.2011, encontra-se exarado despacho do Sr. Chefe da Divisão de Justiça Tributária, do qual se retira que foi aplicado à Recorrente a "[ ... ] coima de Eur. 24.923,89, cominada no(s) Art(s)º 114 nº2, 5 f) e 26 nº 4, do RGIT, com respeito pelos limites do Artº 26º do mesmo diploma, sendo ainda devidas custas (Eur. 51,00), nos termos do Nº 2 do Dec-Lei Nº 29/98 de 11 Fevereiro […]" (cfr. doc. a fls. 57 a 58 dos autos que aqui se dá, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzido). I - A Recorrente foi notificada da decisão referida na alínea anterior por carta registada expedida pelos serviços de Finanças da Lousã em 22.02.2011 (cfr. docs. a fls. 60 a 61 dos autos que aqui se dão, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzidos). J - Em 22.03.2011, a Recorrente através do seu Advogado, deu entrada no serviço de Finanças da Lousã, de uma exposição escrita que designou por «Alegações» (cfr. doc. a fls. 62 a 91 dos autos que aqui se dá, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzido). * A convicção do Tribunal assentou nos documentos juntos pelas partes aos autos e que não foram objecto de qualquer forma de impugnação.Inexistindo matéria de facto controvertida, não se revelou necessária a realização de qualquer diligência de prova ou a recolha de outros elementos para o efeito.” Levando em consideração que a factualidade subjacente aos autos em análise se baseia essencialmente em prova documental, este Tribunal julga provados mais os seguintes factos que se reputam relevantes para a decisão e aditando-se, por isso, ao probatório nos termos do art. 431º, al. a), do C. P. Penal (“ex vi” do art. 3º, al. b), do R.G.I.T. e do art. 74º, nº 4, do Regime Geral das Contra-Ordenações e Coimas, aprovado pelo D.L. nº 433/82, de 27/10): K) Com referência ao exercício do ano de 2007, a ora Recorrente apresentou em 07-05-2008 um declaração de IRC, modelo 22 com matéria colectável apurada no montante de € 276.721,28 e colecta no valor de € 53.344,26 (fls. 49 destes autos). L) Nesta sequência, a Recorrente efectuou três pagamentos por conta do ano de 2008, de € 15.681,00 cada (fls. 86 a 88 destes autos). M) Em 17-03-2009, a ora Recorrente apresentou uma declaração de substituição com referência ao exposto em K), resultando matéria colectável no valor de € 1.016.464,09 e colecta no valor de € 203.292,81 (fls. 49 destes autos). 3.2 DE DIREITO Assente a factualidade apurada cumpre, agora, entrar na análise da realidade que envolve o presente recurso jurisdicional, impondo-se, desde logo, indagar da pertinência da invocada nulidade da sentença por omissão de pronúncia e por falta de fundamentação nos termos apontados pela Recorrente, com referência ao disposto no art. 379º nº 1 als. a) e c) do C. Proc. Penal. Nas suas alegações, a Recorrente refere que a Sentença Recorrida comete omissão de pronúncia ao não se pronunciar sobre o pedido formulado pela Recorrente na PI, de que fosse requerido ao Fisco, a junção aos autos do Relatório de Inspecção à Recorrente ao exercício de 2007, o qual se encontra na base do presente processo, em violação do disposto no art. 95.º n.º 1 do CPTA, apontando depois que a Sentença recorrida padece de vicio de fundamentação, porquanto, em relação à alegação da Recorrente, de que a decisão proferida no processo de contra-ordenação vertente viola o art. 29.º n.º 5 da CRP, a Sentença recorrida apresente apenas um juízo conclusivo de que tal não sucede, sem se apresentar fundamentada de facto ou de direito, sendo que a Sentença recorrida não explica porque motivo considera que a decisão de aplicação de coima em crise nos presentes autos não viola o princípio de "ne bis in idem". A partir daqui, é manifesto que a Recorrente não tem razão no que diz respeito à invocada nulidade da sentença por falta de fundamentação, dado que, é ponto assente que a decisão recorrida conheceu da matéria em apreciação nos autos, elencando a realidade de facto que esteve na base da decisão, a qual foi enquadrada em termos que permitiram à ora Recorrente apreender tal situação, tal como o presente recurso bem evidencia. Tal significa que não tem qualquer virtualidade a alegação de que a sentença não está fundamentada de facto e de direito, até porque a decisão aponta que “Na presente situação, a Recorrente, ao contrário do que alega, não veio a ser duplamente sancionada pelo mesmo facto, resultando do acto recorrido apenas um facto que serve de base a uma punição e a uma coima. Não há aqui, ou noutros autos que se conheçam, uma duplicação da mesma punição sobre o mesmo facto”, o que traduz a apreciação da realidade em apreço, impondo-se sublinhar que o facto de o Tribunal recorrido ter, segundo a Recorrente, valorado de forma indevida determinados elementos envolve apenas matéria que poderá colocar o valor doutrinal da referida decisão e não justificar a suscitada nulidade da sentença. Por outro lado, em relação à matéria da omissão de pronúncia, cabe notar que deixar de conhecer de questão de que devia conhecer-se é diferente de deixar de apreciar qualquer consideração, argumento ou razão produzida pela parte, na medida em que quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista, sendo essencial é que o tribunal decida a questão posta, não tendo que analisar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão, ou seja, o julgador não tem que analisar e a apreciar todos os argumentos, todos os raciocínios, todas as razões jurídicas invocadas pelas partes em abono das suas posições, apenas tem que resolver as questões que por aquelas lhe tenham sido postas, o que significa que só haverá nulidade da sentença por omissão de pronúncia, quando o julgador não tiver conhecido de questões que aquelas submeteram à sua apreciação. 2 - Os pagamentos por conta dos contribuintes cujo volume de negócios do exercício imediatamente anterior àquele em que se devam efectuar esses pagamentos seja igual ou inferior a (euro) 498 797,90 correspondem a 70 % do montante do imposto referido no número anterior, repartido por três montantes iguais, arredondados, por excesso, para euros. 3 - Os pagamentos por conta dos contribuintes cujo volume de negócios do exercício imediatamente anterior àquele em que se devam efectuar esses pagamentos seja superior a (euro) 498 797,90 correspondem a 90 % do montante do imposto referido no n.º 1, repartido por três montantes iguais, arredondados, por excesso, para euros. 4 - No caso referido na alínea d) do n.º 4 do artigo 8º, o imposto a ter em conta para efeitos do disposto no n.º 1 é o que corresponderia a um período de 12 meses, calculado proporcionalmente ao imposto relativo ao período aí mencionado. 5 - Tratando-se de sociedades de um grupo a que seja aplicável pela primeira vez o regime especial de tributação dos grupos de sociedades, os pagamentos por conta relativos ao primeiro exercício são efectuados por cada uma dessas sociedades e calculados nos termos do n.º 1, sendo o total das importâncias por elas entregue tomado em consideração para efeito do cálculo da diferença a pagar pela sociedade dominante ou a reembolsar-lhe, nos termos do artigo 96º. 6 - No exercício seguinte àquele em que terminar a aplicação do regime previsto no artigo 63º, os pagamentos por conta a efectuar por cada uma das sociedades do grupo são calculados nos termos do n.º 1 com base no imposto que lhes teria sido liquidado relativamente ao exercício anterior se não estivessem abrangidas pelo regime. 7 - No exercício em que deixe de haver tributação pelo regime especial de tributação dos grupos de sociedades, observa-se o seguinte: a) Os pagamentos por conta a efectuar após a ocorrência do facto determinante da cessação do regime são efectuados por cada uma das sociedades do grupo e calculados da forma indicada no número anterior; b) Os pagamentos por conta já efectuados pela sociedade dominante à data da ocorrência da cessação do regime são tomados em consideração para efeito do cálculo da diferença que tiver a pagar ou que deva ser-lhe reembolsada nos termos do artigo 96º.” Por seu lado, o então art. 96º nº 1 al. a) do CIRC dispunha o seguinte: a) Em três pagamentos por conta, com vencimento em Julho, Setembro e 15 de Dezembro do próprio ano a que respeita o lucro tributável ou, nos casos dos n.ºs 2 e 3 do artigo 8.º, no 7.º mês, no 9.º mês e no dia 15 do 12.º mês do respectivo período de tributação; …”
4. DECISÃO Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal, de harmonia com os poderes conferidos pelo art. 202.º da Constituição da República Portuguesa, em conceder provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida e, nesta medida, julgar procedente o recurso judicial e, em consequência, anular a decisão administrativa que aplicou à Recorrente a coima aqui em causa. Sem custas. Notifique-se. D.N.. Porto, 08 de Março de 2018 Ass. Pedro Vergueiro Ass. Ana Patrocínio Ass. Ana Paula Santos |