Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00414/20.0BEBRG
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:05/27/2021
Tribunal:TAF de Braga
Relator:Celeste Oliveira
Descritores:GARANTIA, HIPOTECA VOLUNTÁRIA, IMÓVEIS, VALOR PATRIMONIAL, VALOR DE MERCADO
Sumário:1 – Na avaliação dos imóveis oferecidos para garantia do processo executivo por meio de hipoteca voluntária de imóveis onde se indicou o valor patrimonial tributário, não existe obrigatoriedade de a AT considerar como valor dos imóveis o valor de mercado em detrimento do valor patrimonial tributário de que dispunha, nem existe obrigação de proceder a essa avaliação, sem que a mesma tivesse sido solicitada pelos requerentes.*
* Sumário elaborado pela relatora
Recorrente:J.
Recorrido 1:Autoridade Tributária e Aduaneira
Votação:Unanimidade
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

1 – RELATÓRIO

J. e R., melhor identificados nos autos, inconformados com a sentença proferida no TAF de Braga, que julgou improcedente a reclamação do órgão de execução fiscal que apresentaram, visando o despacho proferido pelo Chefe do Serviço de Finanças que não considerou suficiente a garantia oferecida, no âmbito do processo executivo nº 0469202001000578, deduziram o presente recurso formulando nas respectivas alegações as seguintes conclusões:

“III. CONCLUSÕES:
1. Vem o presente recurso interposto da douta sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga – Unidade Orgânica 3 – que julgou improcedente a Reclamação aduzida pelos Recorrentes nos termos do art. 276º do C.P.P.T., do despacho de indeferimento proferido pelo órgão de execução fiscal – Direção de Finanças de Braga – Serviço de Finanças de Vila Verde – do pedido de suspensão de execução, mediante a prestação de garantia idónea apresentado pelos Recorrentes, no âmbito da execução que corre os seus termos sob o n.º 0469202001000578 no serviço de Finanças de Vila Verde.
2. Pretendendo os Recorrentes a suspensão da execução supra melhor identificada, requereram os mesmos junto do órgão de execução fiscal a constituição de hipoteca voluntária sobre os seguintes imóveis de sua propriedade:
A) Artigo urbano inscrito na matriz da União de freguesias (...) sob o artigo 2080-P;
B) Artigo urbano inscrito na matriz da União de freguesias (...) sob o artigo 2080-Q;
C) Artigo urbano inscrito na matriz da União de freguesias (...) sob o artigo 2080-R.
Bem como sobre o imóvel inscrito na matriz da freguesia de (...), sob o artigo 2069-V que, embora sendo sua propriedade apenas na proporção de 1/4, foi expressa e livremente dado à garantia na sua totalidade, mediante consentimento expresso prestado por todos os demais comproprietários.
3. Não obstante, considerou o órgão de execução fiscal que a garantia oferecida, embora idónea, era insuficiente, visto, grosso modo, o valor dos mencionados imóveis ser inferior ao valor do montante exequendo, sendo, ainda certo, que no seu despacho de indeferimento, o órgão de execução fiscal apenas considerou a constituição de hipoteca sobre 1/4 do imóvel inscrito na matriz de (...) sob o artigo 2069-V, ao invés da sua totalidade, conforme expressamente requerido pelos contribuintes.
4. Pois bem, na sequência do despacho de indeferimento proferido pelo órgão de execução fiscal, procederam os Reclamantes à dedução de Reclamação nos termos do art. 276º e seguintes do C.P.P.T., sem, contudo, obterem sucesso, visto, grosso modo, entender o tribunal recorrido que, não tendo o valor do mercado dos mencionados imóveis sido invocado em sede procedimental junto da A.T., não poderia, já em fase processual, ser o mesmo considerado.
Posto o breve introito,
5. Conforme asseverado por Jorge Lopes de Sousa, Benjamim Silva Rodrigues e Diogo Leite de Campos, Lei Geral Tributária anotada e comentada, 4ª. edição, 2012, Editora Encontro de Escrita, p.423, A suspensão da execução enquadra-se no direito constitucionalmente garantido à efectividade da tutela judicial (cfr. artigos 20.º, n.º 1, e 268.º, n.º 4, da Constituição da República Portuguesa), o qual também se encontra reconhecido no artigo 9.º, n.º 1 da LGT”.
6. Por outro lado, e conforme considerado pelo Supremo Tribunal Administrativo, no âmbito do acórdão proferido a 02.03.2016, no âmbito do proc. n.º 0137/16, “O juízo sobre a idoneidade da garantia há-de resultar da avaliação que for efectuada em concreto sobre a susceptibilidade desta assegurar o pagamento da quantia exequenda e do acrescido, aferindo a Administração Tributária designadamente, da suficiência e solidez da garantia oferecida e da capacidade e idoneidade do garante.”
7. Resultando, ainda, do mesmo acórdão que: “Este normativo [máxime art. 199º, n.º 2 do C.P.P.T.] confere à Administração Tributária uma certa margem de discricionariedade para decidir, em função de cada caso concreto, se a garantia prestada é ou não «idónea» para assegurar a cobrança efectiva da dívida exequenda, impondo-se, especificamente, nos casos da hipoteca voluntária e do penhor, a concordância da Administração Tributária. A utilização da expressão “garantia idónea” integra um conceito impreciso, pois que a norma do nº 2 não determina, de forma exacta, quando é que a garantia é idónea para assegurar os créditos do exequente.”
8. Razão pela qual, como se depreende, goza a A.T. de discricionariedade na aferição da idoneidade, ou não, da garantia prestada com o intuito de se suspender a execução, não sendo, contudo, de olvidar que, enquadrando-se a suspensão da execução no direito constitucionalmente garantido à efetividade da tutela judicial, a mesma haverá de ser decretada quando os requisitos para o efeito se achem preenchidos, a fim de se propugnar pela defesa de direitos de índole constitucional dos contribuintes.
9. Pois bem, conforme previamente determinado pelo órgão de execução fiscal, a garantia a prestar pelos contribuintes deveria ascender ao montante de € 101.387,99, sendo que, e tivesse a A.T. procedido a uma avaliação criteriosa e aritmética do peticionado pelos Contribuintes, apuraria que a garantia prestada era idónea e suficiente visto, mesmo antes da realização da perícia nos presentes autos e, portanto, mesmo antes do apuramento do efetivo valor de mercado dos sobejados imóveis, à data do petitório apresentado pelo contribuinte, máxime, do pedido de suspensão da execução mediante a prestação de garantia, o valor dos quatro imóveis no seu computo ascender já aos € 119.084,03.
10. Não obstante, e por razão que se desconhece, considerou a A.T. para efeitos do cálculo aritmético da garantia o valor dos três imóveis de propriedade dos Reclamantes, bem como o valor de 1/4 (sua quota) no imóvel inscrito sob o artigo 2069-V na matriz de (...), quando, expressamente no sentido contrário, requereram os contribuintes a constituição de hipoteca sobre a totalidade da propriedade do referido imóvel.
Por outro lado,
11. Ademais, saliente-se que, durante o iter processual que correu os seus normais termos no tribunal a quo, foi realizada perícia, de modo a que fosse apurado o valor de mercado dos quatro imóveis dados à garantia, tendo sido apurado que, no seu cômputo, o valor de todos os imóveis ascende a € 257.000,00, tendo este mesmo Tribunal considerado a realização da perícia como pertinente.
12. Ora, conforme asseverado pelo Supremo Tribunal Administrativo e Fiscal em acórdão proferido a 02.03.2016, Embora o art. 199º do CPPT, não remeta expressamente para o artº 250º do CPPT no que concerne à forma de determinar o valor dos bens oferecidos como garantia é lícito que se recorra a este preceito legal para a determinação também de tal valor, pois que, a final, será esse o valor de referência se a execução houver que prosseguir pela venda executiva dos bens penhorados oferecidos em garantia.”
13. Mais prosseguindo o supra citado aresto, “Sem prejuízo da determinação do valor dos bens imóveis para venda nos termos do número anterior, quando se mostre evidente que o valor de mercado dos bens é manifestamente superior ao apurado por aquelas regras, a requerimento do executado ou por iniciativa do órgão de execução fiscal pode ainda recorrer-se à determinação do valor com recurso a parecer técnico de um perito especializado e registado na Comissão do Mercado de Valores Mobiliários, seguindo-se a demais tramitação do processo.”
14. Ou seja, existindo nos autos outros elementos que permitam concluir pela suficiência e idoneidade da prestação da garantia tal qual requerida, não podem tais circunstancialismos serem, sem mais, desatendidos, especialmente nas situações como esta sub judice onde, como facilmente se vê, o património dado à garantia a fim de suspender a execução movida contra os contribuintes é, segura e indubitavelmente, suficiente a garantir a proteção dos interesses da A.T.
15. Além de que, e havendo nos autos uma efetiva cognoscibilidade quanto ao valor dos imóveis oferecidos à garantia, não pode o mesmo ser ignorado, sob pena de tal atuação culminar com a prossecução de uma execução em manifesta violação para com as máximas tributárias e constitucionais, visto constituir a suspensão da execução um direito constitucionalmente garantido à efetividade da tutela judicial.
16. Daí que, a manter-se o ato que por este meio se sindica, estar-se-ia a admitir no ordenamento jurídico uma atuação verdadeiramente discricionária do órgão de execução fiscal que, por não encontrar arrimo legal, se afigura verdadeiramente contrário à axiologia e teleologia que constituem o cerne do sistema tributário.
17. Mas prosseguindo, constitui entendimento da sentença recorrida que “Não se relevou o valor de mercado fixado para o prédio 2869 V, na medida em que não tendo sido junta a certidão da conservatória do registo predial, não se conhece sob que titularidade se encontra registado (...)”.
18. Em abono da verdade, e com o devido respeito, muito se espantam os Recorrentes com tal consideração visto que em momento algum se discutiu a propriedade do referido imóvel, pois que assim fosse e pretendesse a A.T. obter qualquer esclarecimento adicional sobre a dita propriedade sempre haveria, nos termos do art. 59º, n.º 1 e n.º 3, al. d) da L.G.T. e no âmbito do principio da colaboração, que requisitar ao contribuinte a junção de documentos que reportasse por necessários ao esclarecimento de hipotéticas duvidas, como esta posta ex novo pelo tribunal a quo quanto à propriedade do imóvel.
19. A este respeito, ainda que no âmbito da discussão de um requerimento de dispensa de garantia, considerou o Supremo Tribunal Administrativo a 09.09.2014 que “(...) no caso de a parte ter cumprido, no momento próprio, o ónus de instrução, juntando os meios de prova que entendeu suficientes, a administração deve, no caso de entender o contrário, isto é, de entender que faltam documentos que na sua perspectiva são essenciais, convidar o requerente a juntar prova adicional ou complementar, isto é, convidá-lo a carrear para o procedimento os elementos de prova que considera em falta para o fim em vista.”
20. Donde, e com o devido respeito que se faz muito, se impugna o entendimento comungado pelo tribunal a quo, nos termos supra citados, visto a discussão sobre a propriedade do imóvel inscrito na matriz de (...) sob o art. 2069-V não ter sequer sucedido na fase procedimental – nunca tendo o órgão de execução fiscal questionado a propriedade do sobejado imóvel – nem, já posteriormente, na fase processual, visto não ter tal questão sido tão pouco suscitada pela Fazenda Pública, no âmbito da sua resposta.
21. Pelo que, nem tão pouco teve o Recorrente oportunidade de quanto a tal circunstancialismo se pronunciar, isto é, exercer o seu constitucionalmente garantido direito ao contraditório.
22. Por tudo quanto dito, deve o presente recurso ser considerado procedente e, por consequência, ser a decisão recorrida substituída por uma outra que proceda à revogação do douto despacho proferido pelo órgão de execução fiscal, atenta a ilegalidade em que o mesmo se arrima, e que, concludentemente, admita a constituição de hipoteca sobre os imóveis supra detalhadamente descritos a fim de, mediante a prestação dessa garantia, se suspender a execução movida contra o aqui Recorrente que corre os seus termos sob o n.º 0469202001000578, junto do Serviço de Finanças de Vila Verde.

Pelo exposto, deverá proceder a alegação dos Recorrentes, revogando-se a decisão recorrida, substituindo-se a mesma por uma outra que proceda à revogação do douto despacho proferido pelo órgão de execução fiscal e decrete a sua substituição por um outro que decrete a suspensão da execução, mediante a constituição de hipoteca voluntária sobre os imóveis dados à garantia, assim se fazendo, a acostumada JUSTIÇA.
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Não houve contra-alegações.
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O Exmo. Procurador-Geral Adjunto junto deste Tribunal parecer pugnando pela improcedência do recurso.
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Foram dispensados os vistos legais, atenta a natureza urgente do processo (artigos 657.º, nº 4 do CPC e 278º, nº 6 do CPPT).
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Objecto do recurso - Questões a apreciar e decidir:

O objecto do presente recurso, delimitado pelas conclusões formuladas (artigos 635º. nº 3 e 4 e 639º, nº 1 e 3, ambos do Código de Processo Civil, «ex vi» do artº 281º CPPT), salvo questões do conhecimento oficioso (artigo 608º, nº 2, in fine), consiste em saber se a sentença padece de erro no julgamento de facto e de direito.
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2.FUNDAMENTAÇÃO
2.1. Matéria de Facto

O Tribunal a quo decidiu a matéria de facto da seguinte foi:

“Resultam provados os seguintes factos:
1. Em 03.01.2020 foi pelo Serviço de Finanças de Vila Verde instaurado o processo de execução 0469202001000578, para cobrança da liquidação de IRS, referente ao ano de 2015, no montante de € 78.957,07 e acrescido, contra os ora Reclamantes.
[cfr. fls. 1-2 do documento 6115201 SITAF]

2. Em 08.01.2020 os Reclamantes apresentaram junto da Autoridade Tributária uma reclamação graciosa da referida liquidação de IRS, que recebeu o n.º 0469202004000021.
[cfr. documento 6115200 SITAF]

3. Em 16.01.2020 os Reclamante foram citados no processo de execução 0469202001000578, com a indicação do valor da garantia a prestar de € 101.387,99.
[cfr. documento 6115200 SITAF]

4. Em 22.01.2020 os Reclamantes apresentaram um requerimento ao serviço de finanças em que pediram a suspensão da execução, através do qual ofereceram a prestação de garantia pela constituição de hipoteca voluntária sobre os imóveis que ali identificaram, indicando o valor patrimonial correspondente, nos seguintes termos: a) artigo urbano 2080-P, com o valor patrimonial de € 26.190,00; b) artigo urbano 2080-Q, com o valor patrimonial de € 21.930,00; c) artigo urbano 2080-R, com o valor patrimonial de € 27.410,00; d) artigo urbano 2069-V, com o valor patrimonial de € 43.554,03.
[cfr. fls. 3-5 do documento 6115201 SITAF]

5. Com o mesmo requerimento, os Reclamantes juntaram a certidão permanente e cadernetas prediais correspondentes aos prédios identificados em a), b), c) do ponto 5 antecedente.
[cfr. fls. 3-20 do documento 6115201 SITAF]

6. No mesmo requerimento, com referência ao prédio identificado em d) do ponto 5 antecedente, os Reclamantes especificaram que “o referido imóvel é propriedade do Executado na proporção de ¼, mas os restantes comproprietários aceitam onerar referido imóvel com hipoteca em favor da Autoridade Tributária”, não juntando qualquer documento.
[cfr. fls. 3-20 do documento 6115201 SITAF]

7. Em 11.02.2020, foi emitida informação com referência ao mesmo pedido que integra o seguinte teor:
“(…) 5. As frações do prédio urbano 2080 (…), têm um valor patrimonial tributário, calculado nos termos do IMI, de € 24.102,58, € 20.181,09 e € 25.218,53, respectivamente, perfazendo (…) € 69.502,20. A Fração V do prédio urbano 2069 (…) tem um valor patrimonial tributário calculado nos termos do IMI, de € 21.073,13, valor este correspondente à proporção de ¼ indiviso pertencente ao executado;
6. A garantia, calculada nos termos do n.º 6 do art. 199.º do CPPT é de € 101.387,99;
Tendo em conta o valor patrimonial tributário global dos imóveis de € 90.575,33, verifica-se que o mesmo é manifestamente insuficiente para garantir o valor das dívidas. Acresce, ainda, que não ter foi feita prova quanto à fração V do prédio (…) inscrito (…) artigo 2069 da inexistência de quaisquer encargos ou ónus por não ter sido apresentada certidão emitida pela Conservatória do Registo Predial.
Tendo em atenção as normas contidas no Código de Procedimento e de Processo Tributário, quanto à constituição de garantias em processo de execução fiscal com vista à suspensão da execução, nos termos do n.º 4 do art.º 49.º e 52.º da LGT, e no sentido de garantir o princípio da igualdade e uniformidade de procedimentos, foram divulgadas as instruções comunicadas através do ofício circulado n.º 60076, de 2010/07/29, das quais, resumidamente, se extrai o seguinte:
a) A exigência de garantia idónea, aferindo-se essa idoneidade em função do tipo e valor do bem como da capacidade de, em caso de incumprimento do devedor, conduzir à efetiva cobrança dos créditos garantidos;
(…)
Assim, considerando os factos apurados poderemos concluir pela insuficiência da garantia prestada, devendo indeferir-se a pretensão do executado quanto à suspensão da execução.”
[cfr. fls. 22-23 do documento 6115201 SITAF]

8. Na mesma data de 11.02.2020, foi proferido despacho, com referência ao mesmo pedido, que apresenta o seguinte teor:
“(…)
Considerando a informação prestada e a verificar-se que a fração V do artigo 2069 (…) não se encontra onerada por quaisquer ónus ou encargos, considera-se que a garantia indicada, a constituir através de hipoteca voluntária sobre as frações indicadas constitui garantia idónea, sendo, no entanto insuficiente para suspensão da execução, pelo que deverá notificar-se o executado de que caso pretenda a suspensão da execução deverá indicar outro bem para reforço da garantia, até ao montante de € 101.387,99, calculada nos termos do n.º 7 do artigo 199.º do CPPT. (…)”
[cfr. fls. 25-26 do documento 6115201 SITAF]

9. O despacho e informação a que se referem os pontos antecedentes foram comunicados aos Reclamantes em 12.02.2020.
[cfr. fls. 24-28 do documento 6115201 SITAF]

10. Em 21.02.2020 foi apresentada a presente Reclamação, visando aquele despacho.
[cfr. documento 6115200 SITAF]

Mais se provou o seguinte,

11. Em 03.03.2020 foi apresentado recurso hierárquico da decisão proferida na reclamação graciosa 0469202004000021.
[cfr. documento 6125326 SITAF]

12. Os prédios identificados em a), b) e c) do ponto 5 antecedente foram adquiridos pelo Reclamante em 27.11.2019, pelo preço global de € 186.000,00, correspondendo a cada um € 62.000,00.
[cfr. documento 6130069 SITAF]

13. Em 04.11.2020, o “valor de mercado” dos prédios identificados em a), b) e c) do ponto 5 antecedente foi determinado, ante os parâmetros atendidos no relatório do perito avaliador constantes do relatório com a mesma data, respetivamente, em 45.000,00, 40.000,00, 47.000,00.
[cfr. documento 6252180 SITAF]
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Com interesse para a decisão a proferir não existem outros factos, provados ou não provados.
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Os factos provados assentam na análise do teor da Reclamação em conjugação com a prova documental que foi junta com a Reclamação e com a prova documental que foi remetida pelo órgão de execução fiscal a estes autos, tendo sido considerados provados os factos alegados pela Reclamante, com relevo para a decisão a proferir que, não tendo sido impugnados, foram corroborados pelos documentos integrados nos autos, igualmente não impugnados, referenciados junto a cada um dos factos assentes.

No que respeita ao ponto 13 dos factos assentes o mesmo resultou da convicção alcançada, ante a prova pericial, considerando os pressupostos e parâmetros especificados no relatório de avaliação, com vista à determinação do “valor de mercado”, representando este “o montante estimado pelo qual o imóvel seria transacionado à data da avaliação entre um comprador e um vendedor interessados, no quadro de uma transação em condições normais de mercado, após a devida comercialização, em que cada uma das partes atua com conhecimento de causa, de forma prudente e sem coação”. Não se relevou o “valor de mercado” fixado para o prédio 2869 V, na medida em que não tendo sido junta a certidão da conservatória do registo predial, não se conhece sob que titularidade se encontra registado, nem os ónus e encargos correspondentes, correspondendo a avaliação efetuada ao valor de propriedade plena e afirmando o Reclamante ser proprietário de ¼ do referido prédio, mais constando do relatório ter sido apurado que o mesmo se encontra arrendado, há mais de 15 anos, sem que tenha sido disponibilizado contrato de arrendamento.
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4- JULGAMENTO DE DIREITO

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelos Recorrentes, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações (art. 635º, nº 4 e 639º, nº 1 do CPC), como bem se percebe da leitura das peças processuais que fazem este recurso, bem como da sentença recorrida, os Recorrentes discordam da sentença que julgou improcedente a reclamação que apresentaram no âmbito do processo de execução fiscal nº 0469202001000578 a correr termos no Serviço de Finanças de Vila Verde, onde solicitaram a suspensão da execução mediante a prestação de garantia oferecendo, para o efeito, a constituição de hipoteca voluntária sobre quatro imóveis, tendo tal garantia, por despacho de 11/02/2020, do Chefe do Serviço de Finanças de Vila Verde, sido considerada idónea, mas insuficiente para a suspensão da execução atento o facto de o valor patrimonial dos mencionados imóveis ser inferior ao valor do montante exequendo e acrescidos.

Dizem os Recorrentes que, por razão que se desconhece, a AT considerou para efeitos de cálculo aritmético da garantia o valor de três imóveis, propriedade dos reclamantes, assim como o valor relativo à quota-parte (1/4) do imóvel inscrito sob o artigo 2069-V na matriz de (...), quando, expressamente no sentido contrário requereram os contribuintes a constituição de hipoteca sobre a totalidade da propriedade do referido imóvel (conclusão 10 do recurso).

Por outro lado, durante o iter processual que correu termos no Tribunal a quo, foi realizada perícia, de modo a que fosse apurado o valor de mercado dos quatro imóveis dados à garantia, tendo sido apurado que, no seu cômputo, o valor de todos os imóveis ascende a €257.000,00, tendo o Tribunal considerado a perícia pertinente (conclusão 11 do recurso), pelo que não se conformam com a sentença recorrida por esta não ter considerado o valor de mercado dos imóveis oferecidos para garantia, valor esse que foi apurado mediante perícia realizada nos presentes autos.

Defendem, ainda, que existindo nos autos outros elementos que permitem concluir pela suficiência e idoneidade da prestação da garantia requerida, não podem tais circunstancialismos serem, sem mais, desatendidos, especialmente nas situações sub judice onde, como se vê, o património dado à garantia a fim de suspender a execução movida contra os contribuintes é, segura e indubitavelmente, suficiente a garantir a protecção dos interesses da AT (conclusão 14 do recurso).

Já no que concerne ao prédio 2869-V não se conformam com o decidido na sentença recorrida quando alude que “não se relevou o valor de mercado fixado para o prédio 2869-V, na medida em que não tendo sido junta a certidão da conservatória do registo predial, não se conhece sob que titularidade se encontra registado (…)”, uma vez que em momento algum se discutiu a propriedade do referido imóvel, pois que assim fosse e pretendesse a AT obter qualquer esclarecimento adicional sobre a propriedade sempre haveria, nos termos do art. 59º, nº 1 e nº 3, al. d) da LGT e no âmbito do principio da colaboração, que requisitar ao contribuinte a junção de documentos que reportasse por necessários ao esclarecimento de hipotéticas dúvidas, como esta posta ex novo pelo Tribunal a quo quanto à propriedade do imóvel (conclusões 17 e 18 do recurso).

Impugnam, portanto, o entendimento do Tribunal a quo, visto a discussão sobre a propriedade daquele imóvel não ter sequer sucedido na fase procedimental – nunca tendo o órgão de execução fiscal questionado a propriedade do imóvel – nem, já posteriormente, na fase processual, visto não ter tal questão sido suscitada pela Fazenda Pública no âmbito da resposta apresentada (conclusão 20 do recurso).

A isto acresce, que não tiveram oportunidade de se pronunciarem sobre tal questão abordada na sentença sob recurso (conclusão 21 do recurso).

Vejamos, antes do mais, o quadro legal aplicável ao caso.
O artigo 52.º da LGT estabelece, sob a epígrafe “Garantia da cobrança da prestação tributária” o seguinte:
1 - A cobrança da prestação tributária suspende-se no processo de execução fiscal em virtude de pagamento em prestações ou reclamação, recurso, impugnação e oposição à execução que tenham por objecto a ilegalidade ou inexigibilidade da dívida exequenda, (…).
2 - A suspensão da execução nos termos do número anterior depende da prestação de garantia idónea nos termos das leis tributárias.”

Sendo que, o artigo 169.º do CPPT, relativo à “Suspensão da execução. Garantias”, dispõe nos seguintes termos:
1- A execução fica suspensa até à decisão do pleito em caso de reclamação graciosa, a impugnação judicial ou recurso judicial que tenham por objeto a legalidade da dívida exequenda, (…) desde que tenha sido constituída garantia nos termos do artigo 195.º ou prestada nos termos do artigo 199.º ou a penhora garanta a totalidade da quantia exequenda e do acrescido, o que deve ser informado no processo pelo funcionário competente.
(…) 8 - Quando a garantia constituída nos termos do artigo 195.º, ou prestada nos termos do artigo 199.º, se tornar insuficiente é ordenada a notificação do executado dessa insuficiência e da obrigação de reforço ou prestação de nova garantia idónea no prazo de 15 dias, sob pena de ser levantada a suspensão da execução.
(…) 13 - O valor da garantia é o que consta da citação, nos casos em que seja apresentada nos 30 dias posteriores à citação”

Diz o artigo 199º do CPPT, sob a epígrafe "Garantias" que:

Artigo 199.º
Garantias
1 - Caso não se encontre já constituída garantia, com o pedido deverá o executado oferecer garantia idónea, a qual consistirá em garantia bancária, caução, seguro-caução ou qualquer meio susceptível de assegurar os créditos do exequente.
2 - A garantia idónea referida no número anterior poderá consistir, ainda, a requerimento do executado e mediante concordância da administração tributária, em penhor ou hipoteca voluntária, aplicando-se o disposto no artigo 195.º, com as necessárias adaptações.
(…)
5 - No caso de a garantia apresentada se tornar insuficiente, a mesma deve ser reforçada nos termos das normas previstas neste artigo.

6 - A garantia é prestada pelo valor da dívida exequenda, juros de mora contados até ao termo do prazo de pagamento voluntário ou à data do pedido, quando posterior, com o limite de cinco anos, e custas na totalidade, acrescida de 25% da soma daqueles valores, exceto no caso dos planos prestacionais onde a garantia é prestada pelo valor da dívida exequenda, juros de mora contados até ao termo do prazo do plano de pagamento concedido e custas na totalidade, sem prejuízo do disposto no n.º 13 do artigo 169.º
7 - As garantias referidas no n.º 1 serão constituídas para cobrir todo o período de tempo que foi concedido para efectuar o pagamento, acrescido de três meses, e serão apresentadas no prazo de 15 dias a contar da notificação que autorizar as prestações, salvo no caso de garantia que pela sua natureza justifique a ampliação do prazo até 30 dias, prorrogáveis por mais 30, em caso de circunstâncias excepcionais.
(…)
10 - Em caso de diminuição significativa do valor dos bens que constituem a garantia, o órgão da execução fiscal ordena ao executado que a reforce ou preste nova garantia idónea no prazo de 15 dias, com a cominação prevista no n.º 8 deste artigo.
(….)”

Por sua vez, o artigo 250º do CPPT, sob a epigrafe “Valor dos bens para venda”, dispõe que:
Artigo 250.º
Valor dos bens para venda
1 - O valor base para venda é determinado da seguinte forma:
a) Os imóveis urbanos, inscritos ou omissos na matriz, pelo valor patrimonial tributário apurado nos termos do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI);
b) Os imóveis rústicos, pelo valor patrimonial actualizado com base em factores de correcção monetária, nos termos do disposto na alínea c) do n.º 1 do artigo 27.º do Decreto-Lei n.º 287/2003, de 12 de Novembro;
c) Os móveis, pelo valor que lhes tenha sido atribuído no auto de penhora, salvo se outro for apurado pelo órgão da execução fiscal, podendo esse apuramento ser precedido de parecer técnico solicitado a perito com conhecimentos técnicos especializados.

(…)
4 - O valor base a anunciar para venda é igual a 70 % do determinado nos termos do n.º 1.”


E ainda, o art. 199º-A, sob a epígrafe “Avaliação da garantia” (aditado pela Lei n° 7-A/2016, de 30/3) dispõe que:

Artigo 199.º-A
Avaliação da garantia
1 - Na avaliação da garantia, com exceção de garantia bancária, caução e seguro-caução, deve atender-se ao valor dos bens ou do património apurado nos termos dos artigos 13.º a 17.º do Código do Imposto do Selo.
2 - Sendo o garante uma sociedade, o valor do seu património corresponde ao valor da totalidade dos títulos representativos do seu capital social determinado nos termos do artigo 15.º do Código do Imposto do Selo.
3 - Sendo o garante uma pessoa singular, deve atender-se ao património desonerado e aos rendimentos suscetíveis de gerar meios para cumprir a obrigação.
4 - O valor determinado nos termos dos números anteriores deve ser deduzido dos seguintes montantes, quando aplicável e sempre que afete a capacidade da garantia:
a) Garantias concedidas e outras obrigações extrapatrimoniais assumidas;
b) Passivos contingentes;
c) Partes de capital do executado, detidas, direta ou indiretamente, na respetiva proporção;
d) Quaisquer créditos sobre o executado
.”

Por último, no n° 1 do art. 13° do CIS, dispõe-se que «O valor dos imóveis é o valor patrimonial tributário constante da matriz nos termos do CIMI à data da transmissão ou o determinado por avaliação nos casos de prédios omissos ou inscritos sem valor patrimonial».

Posto isto, vejamos, agora, o que decidiu a sentença sob recurso, não se olvidando que a reclamação de actos do órgão de execução fiscal regulada no art. 276º do CPPT, tem em vista a impugnação de um acto praticado pelo órgão de execução fiscal e a decisão a proferir deve limitar-se tout court à apreciação da legalidade desse acto.

Como bem refere a sentença recorridaEm termos de enquadramento jurídico das questões a resolver, cumpre atender a que a Reclamação dos atos do órgão de execução fiscal regulada nos artigos 276.º e seguintes do CPPT é talhada para impugnar a legalidade dos atos administrativos em matéria tributária, para a prática dos quais seja competente o órgão de execução fiscal, ou outra autoridade da Administração, desde que apresentem repercussão direta no processo executivo e, neste, afetem os direitos e interesses legítimos do executado ou de terceiro [cfr. artigos 97.º, n.º 1 alínea n), 277.º, n.º 1 e 2 e 278.º, n.º 1, n.º 3 e n.º 4 do CPPT e 101.º d) e 103.º, n.º 2 LGT].”
(…)
Sem prejuízo de deverem ser consideradas por parte da AT as circunstâncias que sejam levadas ao seu conhecimento suscetíveis de determinar dever ser considerado, para efeitos da aferição da suficiência da garantia, valor diferente do valor patrimonial tributário e, quando assim seja, possa e deva esta, em razão dos princípios da proporcionalidade e da adequação, decidir em função de parâmetros de valorização dos bens oferecidos em garantia distintos do VPT.
Ante os factos assentes, verifica-se que no requerimento apresentado perante a AT, em que pediram a suspensão da execução com oferecimento da prestação de garantia, através da constituição de hipoteca, os ora Reclamantes se limitaram a referenciar os valores patrimoniais tributários dos 4 prédios a que se refere o ponto 5 dos factos assentes. Nada referindo no mesmo requerimento a respeito do “valor de mercado” dos mesmos imóveis. E juntaram apenas a certidão da conservatória do registo predial e caderneta predial, em relação aos prédios identificados nas alíneas a), b) e c) do ponto 5 dos factos assentes. Mais referindo que o prédio a que se refere a alínea c) é da titularidade do Reclamante em 1/4, aceitando os restantes comproprietários onerar o referido imóvel com hipoteca a favor da AT, sem juntar qualquer documento ao mesmo referente [cfr. pontos 4 a 6 dos factos assentes].
Verificando-se, ainda, que apenas com base no teor do requerimento apresentado e documentos juntos, foi prestada informação e proferido despacho sobre o mesmo requerimento que apresentam o teor acolhido nos pontos 7 e 8 dos factos assentes, em que foi considerado insuficiente o valor da garantia oferecida e determinada a notificação ao executado para, no caso de pretender a suspensão, indicar outro bem para reforço da garantia.
(…)
“(…) 5. As frações do prédio urbano 2080 (…), têm um valor patrimonial tributário, calculado nos termos do IMI, de € 24.102,58, € 20.181,09 e € 25.218,53, respectivamente, perfazendo (…) € 69.502,20. A Fração V do prédio urbano 2069 (…) tem um valor patrimonial tributário calculado nos termos do IMI, de € 21.073,13, valor este correspondente à proporção de ¼ indiviso pertencente ao executado;
6. A garantia, calculada nos termos do n.º 6 do art. 199.º do CPPT é de € 101.387,99;
Tendo em conta o valor patrimonial tributário global dos imóveis de € 90.575,33, verifica-se que o mesmo é manifestamente insuficiente para garantir o valor das dívidas. Acresce, ainda, que não ter foi feita prova quanto à fração V do prédio (…) inscrito (…) artigo 2069 da inexistência de quaisquer encargos ou ónus por não ter sido apresentada certidão emitida pela Conservatória do Registo Predial.”
“Considerando a informação prestada e a verificar-se que a fração V do artigo 2069 (…) não se encontra onerada por quaisquer ónus ou encargos, considera-se que a garantia indicada, a constituir através de hipoteca voluntária sobre as frações indicadas constitui garantia idónea, sendo, no entanto insuficiente para suspensão da execução, pelo que deverá notificar-se o executado de que caso pretenda a suspensão da execução deverá indicar outro bem para reforço da garantia, até ao montante de € 101.387,99, calculada nos termos do n.º 7 do artigo 199.º do CPPT.”
Ante este circunstancialismo, destaca-se que no requerimento de dispensa de prestação de garantia cabe ao executado requerer a avaliação de imóveis, quando entenda que o VPT é significativamente discrepante do valor de mercado, ou que deve ser atualizado. Não incumbindo ao órgão de execução fiscal proceder à avaliação oficiosa dos bens oferecidos em garantia, quando nada no requerimento que lhe é dirigido se refere de onde decorra a necessidade ou conveniência de proceder a tal avaliação [cfr. neste sentido o acórdão do TCAS de 19.09.2017, processo 2640/16.7BELRS], disponível em www.dgsi.pt].
(…)
Assim, do regime legal instituído e nos termos considerados e melhor explicitados pela jurisprudência dos tribunais superiores acima citada, resulta que é sobre o executado que pretende a suspensão da execução mediante a prestação de garantia, na pendência de meio administrativo ou judicial que visa a anulação do ato tributário, que recai o ónus de invocando explícita ou implicitamente o respetivo direito, provar que se verificam as condições de que tal suspensão depende.
Alegando os factos e instruindo o seu requerimento com os elementos probatórios direcionados à prova dos mesmos factos, designadamente os atinentes à suficiência da garantia com referência ao valor a considerar ser de atribuir aos imóveis sobre que se propõe constituir hipoteca voluntária a favor da AT, ou os atinentes à necessidade ou conveniência de ser efetuada avaliação dos bens em causa, por o valor patrimonial correspondente não dever ser o atendido.
Pois, embora a lei não imponha uma prévia avaliação ad-hoc, esta – por razões de justiça e proporcionalidade – pode e deve ser realizada quando circunstâncias especiais o justifiquem, cabendo ao Reclamante, para esse mesmo efeito, levar ao conhecimento da Administração Tributária as circunstâncias especiais que, a verificarem-se, justificam que a garantia constituída sobre imóveis deva ser valorada, por valor diverso do valor patrimonial tributário destes.
Tal não foi o que sucedeu no caso ora sob apreciação, porquanto no requerimento apresentado pelos Reclamantes perante a AT estes apenas se referiram aos valores patrimoniais dos prédios nele indicados, nada mais alegando, referindo ou requerendo com referência ao valor a ser atendido pela AT, para efeitos da aferição da suficiência da garantia pelos Reclamantes oferecida com vista à suspensão da execução.
Razão pela qual, o despacho impugnado, de acordo com o requerimento e documentos ao mesmo anexos submetidos pelos Reclamantes à apreciação da AT, não se apresenta desconforme ao regime legal instituído.
Pois a AT, considerando o valor correspondente à garantia oferecida, em função do alegado pelos Reclamantes, ou seja, apenas com referência ao valor patrimonial correspondente aos prédios em causa decidiu de modo que não padece do vício que pelos Reclamantes lhe vem assacado: o de que a AT não deveria ter considerado o valor patrimonial tributário e devia ter determinado a avaliação dos referidos prédios, porque o valor que deve ser considerado é o valor de mercado, que se apresenta discrepante do valor patrimonial considerado.
Porquanto, o requerimento apresentado pelos Reclamantes à AT nada referiu explicita ou implicitamente sobre a desadequação da consideração do valor patrimonial tributário dos mesmos, para efeito da aferição do valor da garantia. Pelo contrário, o requerimento dos Reclamantes apenas fez apelo à consideração do valor patrimonial tributário dos prédios.
De modo que, nas circunstâncias reveladas nos presentes autos, conclui-se não poder considerar-se o ato reclamado praticado em violação de lei, por a AT ter recorrido precisamente ao critério ou parâmetro de valorização dos bens oferecidos em garantia previsto na lei, de acordo com o que foi submetido à sua apreciação [cfr. artigos 199.º-A CPPT e 13.º do CIS].
E, ainda, não poder considerar-se que no âmbito do procedimento iniciado pelo requerimento apresentado pelos Reclamantes, a AT tenha omitido ato que lhe incumbisse realizar ou desconsiderado factos ou circunstâncias submetidas à sua apreciação a que devesse atender, por revelarem dever ser ponderada a aplicação de diferente critério do previsto na lei para a aferição da suficiência do valor da garantia.
Ante o requerimento que lhe foi dirigido, não pode entender-se, ao contrário do alegado pelos Reclamantes nesta ação, que a AT devesse ter decidido naquela data com base em parâmetro diferente do valor patrimonial tributário dos prédios e promovido a respetiva avaliação, ou outras diligências instrutórias, de cuja omissão pudesse derivar a ilegalidade da sua atuação.”

Desde já adiantámos que o Tribunal a quo andou bem quando entendeu que a sua apreciação apenas poderia incidir sobre o acto praticado pela AT, com os pressupostos que foram apresentados pelos Recorrentes no seu requerimento de suspensão de execução apresentado em 22/01/2020, a que se alude no probatório.

E, por esse motivo, relativamente à avaliação posterior dos prédios, já em sede judicial, e à consideração do valor de mercado dos imóveis em causa, a sentença é bem explícita quanto a esta questão, uma vez que, como bem refere, “a competência para determinar a suspensão da execução, com aceitação da prestação de garantia através da constituição de hipoteca voluntária cabe à administração tributária”.

Tal não impede que os Recorrentes a qualquer momento possam solicitar à AT a apreciação do pedido de prestação de garantia com base nas avaliações de mercado obtidas, não pode é o Juiz do Tribunal recorrido, alicerçado nesse fundamento, deferir a prestação de garantia mediante hipoteca voluntária com fundamento em novos elementos de que o órgão de execução fiscal não dispunha, porque, em primeira mão, tal decisão é uma competência do órgão de execução fiscal e não do Tribunal, posto que a este apenas compete apreciar a legalidade do acto praticado pelo órgão de execução fiscal.

Atentemos, agora, se a sentença incorreu em erro de julgamento relativamente aos factos apurados e ao direito aplicado.

Vejamos.
Os Recorrentes solicitaram ao Serviço de Finanças de Vila Verde a prestação de garantia, mediante a hipoteca de 4 (quatro) imóveis que ali melhor identificaram, indicando, expressamente, o valor patrimonial de cada um deles, salvaguardando que em relação ao artigo 2069-V eram proprietários na proporção de ¼, mas que os restantes comproprietários aceitavam onerar o dito imóvel com hipoteca a favor da Autoridade Tributária, sem que, no entanto, o tenham provado.

Os Recorrentes apenas em sede de reclamação judicial vêm invocar o valor de mercado dos ditos imóveis, uma vez que, anteriormente, nunca tinham levado ao conhecimento da AT quaisquer circunstâncias que levassem a crer que, para efeitos de garantia hipotecária, se devia atender a valor diverso do valor patrimonial tributário dos ditos imóveis, nomeadamente o valor de mercado.

Atente-se, para ao efeito, ao teor do pedido que apresentaram ao órgão de execução fiscal em 22/01/2020, onde expressamente indicam o valor patrimonial tributário dos prédios oferecidos como garantia (cfr. ponto 4 do probatório).

Destarte, não existe qualquer obrigatoriedade de a AT considerar como valor dos imóveis o valor de mercado em detrimento do valor patrimonial tributário de que dispunha, nem sequer qualquer obrigação de proceder à avaliação nesse sentido, sem que tal lhe tivesse sido solicitado pelos requerentes, neste sentido atente-se à proficiente jurisprudência do STA que no âmbito do processo nº 01248/17 de 29/11/2017 disponível in: www.dgsi.pt. refere que: ”Tendo sido requerida a prestação de garantia por meio de constituição voluntária de hipoteca sobre imóvel, relativamente ao qual se referencia o valor do respectivo VPT e sem que o requerente tivesse (…) trazido ao conhecimento da AT outro valor ou circunstâncias especiais justificativas de que se deva atender a valor diverso (nomeadamente a eventual valor de mercado) daquele VPT (art. 199º-A do CPPT), não se impunha à AT uma avaliação ad hoc para tal efeito”, assim como no processo nº 0563/16, de 13/07/2016, do mesmo Supremo Tribunal que no seu sumário refere:I - Embora o art. 199º do CPPT, não remeta expressamente para o artº 250º do CPPT no que concerne à forma de determinar o valor dos bens oferecidos como garantia é lícito que se recorra a este preceito legal para a determinação também de tal valor, pois que, a final, será esse o valor de referência se a execução houver que prosseguir pela venda executiva dos bens penhorados oferecidos em garantia. II - A lei não impõe uma prévia avaliação ad-hoc dos imóveis para determinar a idoneidade ou a suficiência da garantia oferecida que sobre eles se constitua, embora - por razões de justiça e proporcionalidade – tal avaliação possa e deva ser realizada quando circunstâncias especiais o justifiquem, cabendo ao recorrente trazer ao conhecimento da Administração as circunstâncias especiais que, a verificarem-se, justifiquem eventualmente que a garantia constituída sobre imóveis deva atender a valor diverso do valor patrimonial tributário destes.”.

Dizem os Recorrentes que se a AT tivesse procedido a uma avaliação criteriosa e aritmética do peticionado pelos contribuintes, apuraria que a garantia prestada era idónea e suficiente, mesmo sem a realização da perícia e, portanto, mesmo antes do apuramento do valor de mercado dos sobejados imóveis, pois o valor dos 4 imóveis no seu computo ascendia a €119.084,03, não obstante, e por razões que desconhecem, considerou a AT para efeitos do cálculo aritmético da garantia o valor dos três imóveis propriedade dos Recorrentes, assim como o valor de ¼ (sua quota) no imóvel inscrito sob o art. 2069-V na matriz de (...), quando, expressamente no sentido contrário, requereram a constituição de hipoteca sobre a totalidade da propriedade do referido imóvel (conclusão 9 e 10 do recurso).

Pese embora o assim exposto, o certo é que resulta da factualidade provada (pontos 7, 8 e 9) a fundamentação que presidiu ao modo como a administração tributária considerou o valor de cada um dos imóveis indicados, especialmente do imóvel inscrito sobre o artigo 2069-V, que apenas foi considerado na proporção da quota-parte (1/4) da propriedade dos Recorrentes, a qual foi devidamente notificada aos Recorrentes que, posteriormente, juntaram com petição inicial a decisão com tal informação, tal como se depreende do documento 1 anexo à petição inicial.

Por esse motivo, não vislumbramos como podem os Recorrentes desconhecer as razões da decisão proferida pela AT, pois as mesmas ressaltam ali à evidência.

Diga-se, em abono da verdade, que a hipoteca, sem mais, do imóvel com o artigo nº 2069-V nunca poderia ser considerada na totalidade, porquanto os Recorrentes nunca provaram que os outros alegados comproprietários não se opunham a tal ónus, não bastando a simples alusão a tal facto, como o fizeram no requerimento que apresentaram.
Note-se, ainda, que recai sobre os requerentes a obrigação de instruir o seu pedido com todos os elementos necessários à respectiva apreciação e que não o fazendo só deles próprios se podem queixar.

Pelo que, muito se estranha que os Recorrentes venham, agora, invocar que desconhecem as razões da decisão recorrida, pois ao tomarem conhecimento de tal documento e decisão os Recorrentes souberam dos fundamentos que alicerçaram a decisão de que as garantias eram idóneas, mas insuficientes.

E não se diga, como o fazem os Recorrentes que o património dado à garantia a fim de suspender a execução que lhes foi movida era, segura e indubitavelmente, suficiente a garantir a protecção dos interesses da AT, pois tal prova não resulta dos autos, uma vez que o valor patrimonial tributário dos bens oferecidos para hipoteca não supria o valor a garantir tal como resulta da decisão reclamada.

Também não se vislumbra que fique lascado o direito dos Recorrentes a constituir a suspensão da execução tal como invocam na conclusão 15 do recurso, pois que nada os impede de solicitar junto do órgão de execução fiscal a apreciação de novo pedido com a consideração do valor de mercado dos visados prédios, aliás, mal se compreende que após terem recebido a decisão reclamada os Recorrentes não tenham solicitado à AT a reapreciação do pedido segundo o alegado valor de mercado.

Por fim, e ainda no que concerne ao prédio 2069, sempre se dirá que a decisão reclamada não questionou a propriedade de ¼ do imóvel por parte dos Recorrentes aceitando a quota-parte correspondente como garantia, tal como a sentença recorrida também não o fez, o que verdadeiramente esteve em causa foi a impossibilidade de aceitar a hipoteca da totalidade do prédio, por se desconhecer da não oposição dos restantes comproprietários a tal ónus, uma vez que os Recorrentes não instruíram convenientemente o seu pedido, limitaram-se apenas sugerir tal possibilidade, sem a competente prova.

Acresce esclarecer, que a alegada consideração da propriedade relativa ao prédio 2069V, a que aludem os Recorrentes na conclusão 17ª do recurso, não é uma consideração da sentença recorrida, mas antes da decisão reclamada (cfr. pontos 7 e 8 do probatório) que, como se viu, menciona a questão da certidão da conservatória do registo predial relativa àquele imóvel, mas apenas para aludir ao apuramento de eventuais ónus ou encargos do dito prédio, pelo que as conclusões 18ª a 21ª do recurso não têm, a nosso ver, razão de ser.

Em suma, a sentença recorrida não padece dos vícios que lhe são assacados, mostrando-se o recurso votado ao insucesso.
*** ***

5 - DECISÃO

Face ao exposto, acordam, em conferência, os Juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte em NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO E CONFIRMAR A DECISÃO RECORRIDA que, em consequência, se mantém na ordem jurídica.
*
Custas a cargo dos Recorrentes.
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Porto, 2021-05-27

Maria Celeste Oliveira
Carlos de Castro Fernandes
Manuel Escudeiro dos Santos