Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00064/13.7BEAVR
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:04/08/2016
Tribunal:TAF de Aveiro
Relator:Alexandra Alendouro
Descritores:RECONHECIMENTO DE RECIDIVA DE DOENÇA EM SERVIÇO; DL 503/99, DE 20/11;
ERRO NA FORMA DO PROCESSO; CONVOLAÇÃO; CADUCIDADE DO DIREITO DE ACÇÃO
Sumário:Não cabe convolar acção administrativa especial, proposta para reconhecimento de recidiva de doença adquirida ao serviço da Administração e consequente indemnização, ao abrigo do regime jurídico dos acidentes e doenças profissionais, na forma processual considerada adequada pelo tribunal “a quo”, por aplicação dos artigos 37.º n.ºs 1 e 2 alínea b), 46.º n.º 1 do CPTA e 48.º do DL 503/99 de 20/11 – sem oposição da recorrente –, se dos autos resulta o esgotamento do prazo de 1 ano previsto para o exercício do direito de propositura de tal acção – artigo 48.º do DL 503/99.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:ACOF
Recorrido 1:Ministério da Defesa Nacional e outro(s)...
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Especial para Condenação à Prática Acto Devido (CPTA) - Recurso Jurisdicional
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso jurisdicional e, consequentemente, confirmado o aresto recorrido.
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Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:
I – RELATÓRIO
ACOF interpôs recurso jurisdicional do Acórdão (Saneador-Sentença), proferido pelo Colectivo de Juízes do Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Aveiro que, no âmbito da acção administrativa especial proposta contra o MINISTÉRIO DA DEFESA NACIONAL – MARINHA PORTUGUESA e CAIXA GERAL DE APOSENTAÇÕES, julgou procedente a excepção de erro na forma do processo, suscitada pelo Demandado Ministério, não convolável pelo “facto de ter sido ultrapassado o prazo de um ano para intentar a acção para reconhecimento do direito”, absolvendo as Entidades demandadas da instância.
*
Nas alegações de recurso, a Recorrente apresenta as seguintes conclusões que delimitam o objecto do recurso:

“a) A presente decisão consubstancia a sua decisão com base no facto de entender que a A. foi notificada do acto que impugna em data anterior a 03/06/2011.

b) inexiste nos autos documento algum que suporte que a A. foi notificada do acto que lhe foi dirigido.

c) E muito menos o Recorrido M.D.N. justifica ou demonstra ter realizado essa mesma notificação, mormente dos documentos que faz juntar aos autos.

d) Pelo que, em nosso modesto aviso, é tremendamente insuficiente a justificação de que em 17.01.2011 a Junta de Saúde Naval emitiu parecer que a situação da A. resultava de patologia prévia à sua entrada no serviço militar porquanto nunca esse resultado, do colectivo de médicos, foi concretamente notificado à A..

e) O que existe, sim, é a participação da recorrida à CGA mas tal não ultrapassa a inexistência de acto notificado, de forma expressa, à A..

f) Sem prescindir, o prazo apenas começa a correr quando a A. é notificada, pela CGA, da carta junta sob doc. n.º 8 porque foi essa a única notificação que lhe foi dirigida, por referência ao sinistro que identifica nos autos.

g) Como tal, o prazo acha-se respeitado e admissível a possível convolação da forma processual.

Termos em que se deverá dar provimento ao presente recurso…”.


*

A Recorrida Marinha Portuguesa contra-alegou, pedindo que seja negado provimento ao recurso:

A. Não é possível assacar quaisquer vícios a douta sentença proferida que assenta no raciocínio de que a propositura da presente ação de reconhecimento do direito é extemporânea por ter sido intentada depois do prazo legal de um ano.

B. Pois, em bom rigor, o prazo de um ano a que se refere ao artigo 48.º do Decreto-Lei n.º 503/99 inicia a sua contagem a partir da data da notificação do ato expresso que não reconhece o direito.

C. In casu, trata-se do parecer da JSN de 10.01.2011 através do qual se concluiu que a situação clínica da Recorrente resultava de patologia prévia à entrada no serviço militar.

D. O qual foi publicado na OP2 n.º 11 de 17.01.2011, data em que se considera a Recorrente notificada do mesmo,

E. Porquanto, a publicação dos atos relativos a assuntos dos militares é obrigatória, sendo esta realizada, no caso dos dos sargentos e praças, na OP2, veiculada através da internet e intranet da Marinha.

F. É por isso meio idóneo para levar ao conhecimento dos militares as ordens ou decisões das hierarquia militar e de outros assuntos que lhes digam diretamente respeito, como o é o resultado da JSN,

G. E que a Recorrente tinha o dever jurídico de conhecer.

H. Quer isto dizer que a Recorrente considerou-se notificada do parecer da JSN de 10.01.2011 em 17.01.2011, através da publicação na OP2.

I. Ainda que assim não seja, bem andou a douta sentença ao considerar que a recorrente havia demonstrado conhecimento do referido parecer, se não antes, pelo menos em 03.06.2011, data em que apresentou a participação à CGA.

J. Considerando, e bem, manifestamente extemporânea a propositura da ação de reconhecimento de direito em 16.01.2013.

K. Por tudo que vem dito, a douta sentença proferida não é merecedora de quaisquer juízos de censura, devendo a mesma persistir na ordem jurídica.”.


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A Magistrada do Ministério Público, junto deste Tribunal, emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso jurisdicional e, consequentemente, confirmado o aresto recorrido.

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II – DO OBJECTO DO RECURSO:
Nos limites das conclusões expressas nas alegações, a partir da respectiva motivação – artigos 5.º, 608.º, nº 2, 635.º, nº 3 e 4, do CPC – importa apreciar e decidir se o aresto recorrido errou no julgamento de direito, ao considerar insanável o declarado erro na forma do processo utilizada pela Recorrente (acção administrativa especial), por impossibilidade de convolação na forma de processo considerada correcta (acção administrativa comum), atenta a caducidade de propositura da referida acção.

***

III – FUNDAMENTAÇÃO

1. OS FACTOS
A instância a quo julgou provada a seguinte matéria de facto com relevo para a apreciação da suscitada excepção:

A) Em 07.01.2008, a Autora foi incorporada na Marinha Portuguesa, no posto de segundo-grumete recruta, destinada ao Regime de Contrato (cfr. doc. n.º 1 junto com a contestação do Réu Ministério da Defesa Nacional – Marinha Portuguesa – fls. 59 dos autos-processo físico);

B) Em 06.09.2010, a Autora requereu ao Comandante da Escola de Fuzileiros o seguinte:

«Exmo. Sr. Comandante da Escola de Fuzileiros,

930... 2GR ACOF actualmente a prestar serviço na escola de fuzileiros, na Secretaria do Batalhão de instrução, vem expor e requerer o seguinte:

1. A militar incorporou em 07JAN08, tendo o curso iniciado em 09JAN08, tendo no início da incorporação começado a sentir dores na perna direita.

2. Devido á lesão apresentada a militar não concluiu o curso.

3. Na sequência dessa lesão foi aberto o processo de averiguações por doença ou lesão, P.24.48-51/2008.VZEBR-EF8A226, tendo este sido declarado acidente em serviço nos termos da OP2/038/26FEV09.

4. Assim, nos termos da OP2/076/22ABR10 a militar foi dada apta para todo o serviço.

5. Porém, a lesão agravou-se e em 18MAI10 a militar foi considerada insuficientemente apta por um período de 60 dias, conforme OP2/092/18MAI10.

6. Face o exposto a militar foi presente a uma nova consulta da especialidade, no Hospital da Marinha, documento que se anexa e se dá por integralmente seja sujeita a Junta de Saúde naval, por forma a proceder à reabertura do processo reproduzido.

7. Nestes termos, a 930... 2GR ACOF requer que referido nos termos do ponto 3.g) (2, do despacho ALM CEMA n,º 72/05, de 24 de Novembro.

Espera deferimento, ACOF (…)»

(cfr. doc. n.º 3 junto com a contestação do Réu Ministério da Defesa Nacional – Marinha Portuguesa – fls. 124, 125 e 133 dos autos - processo físico);

C) Por despacho do Comandante da Escola de Fuzileiros, datado de 06-09.2010, foi deferido o requerimento da Autora referido na alínea B), constando daquele, entre o mais, o seguinte:
«(…)
4. Face o que antecede, defere-se o requerido, nos termos do ponto 3. G) (2), do Despacho do ALM CEMA n.º 72/05, de 24 de Novembro, devendo a militar ser presente a Junta de Saúde Naval, por forma a confirmar se estamos perante um caso de agravamento ou recidiva da doença adquirida em serviço.»

(cfr. doc. n.º 3 junto com a contestação do Réu Ministério da Defesa Nacional – Marinha Portuguesa – fls. 133 e 134 dos autos-processo físico);

D) Em 17.01.2011, a Junta de Saúde Naval emitiu parecer que, entre o mais, concluiu que:
«A situação clínica da militar resulta de patologia prévia, não referida, à sua entrada no serviço militar.

Não pode ser atribuída a mecanismos externos como sejam quedas, traumatismos ou outros ocorridos no serviço.

A Junta de Saúde Naval mantém a decisão de “incapaz para todo o serviço” determinada na sessão de 19 de Agosto de 2010»

(cfr. doc. n.º 6 junto com a petição inicial – fls. 14 e 15 dos autos-processo físico e doc. n.º 3 junto com a contestação do Réu Ministério da Defesa Nacional – Marinha Portuguesa – fls. 137 e 138 dos autos-processo físico);

E) Em 03.06.2011, a Autora, através do seu Ilustre Mandatário, participou à Ré Caixa Geral de Aposentações, entre o mais, o seguinte:
«(…)
1. No dia 04 de Março de 2009, entre as 08:35h e as 10:25h, a participante, que se encontrava a frequentar o CFBP OC 1.ª Edição 2009, da Escola de Fuzileiros da Marinha Portuguesa, em Lisboa, sofreu um acidente de trabalho.
(…)
7. Em 17 de Janeiro de 2011, em parecer de Junta Médica, foi a participante considerada incapaz para todo o serviço e que a sua situação clínica resulta de patologia prévia, não referida, à sua entrada no serviço militar.
(…)
12. Motivo pelo qual ser este acidente de trabalho descaracterizado como Junta Médica realizou.

13. Daí a razão da presente participação, que se faz nos termos do DL 503/99, de 20 de Novembro.

Termos em que se requer a V. Ex.ª se digne ordenar a autuação deste como acidente de trabalho e ordenar as diligências atinentes e relativas à fase conciliatória.»
(cfr. doc. n.º 7 junto com a petição inicial – fls. 17 a 20 dos autos-processo físico);

F) A petição inicial relativa à presente acção foi remetida a Tribunal, via Site, em 16.01.2013 (cfr. fls. 1 dos autos – processo físico).


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A factualidade que supra se considerou provada resulta da análise dos documentos juntos aos autos, conforme referido a propósito nas alíneas do probatório.”.
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2. O DIREITO
Importa apreciar o mérito do presente recurso, aferindo se assiste razão à Recorrente, quanto ao errado julgamento de direito efectuado pela decisão recorrida, limitado à parte em que julgou não sanável o constatado “erro na forma do presente processo” (o qual, nesta instância, não mereceu oposição), por a tal obstar a caducidade do direito de propositura da acção administrativa comum, legalmente tipificada para a satisfação da pretensão peticionada (de reconhecimento de uma situação de recidiva de doença adquirida em serviço e de consequente pagamento de uma pensão vitalícia e anual de 1,429,77€), nos termos conjugados dos artigos 48.º n.º 1 do DL 503/99, de 20 de Novembro, 37.º n.ºs 1 e 2 alínea b), 46.º n.º 1 do CPTA.

Caducidade fundamentada no esgotamento do prazo de 1 ano previsto no artigo 48.º, n.ºs 1 e 3, do DL n.º 503/99, de 20 de Novembro – diploma que estabelece o regime jurídico dos acidentes em serviço e das doenças profissionais ocorridos ao serviço da Administração Pública.

Vejamos.

O campo de aplicação de cada forma de processo é estabelecido pela lei (avulsa ou codificada), por referência aos diferentes tipos de pretensões que podem ser deduzidos em juízo, o que mais não é do que o efeito jurídico, a finalidade ou resultado que o Autor visa alcançar com a forma processual escolhida “enraizado em certa causa de pedir”. Sendo que “[a] todo o direito, excepto quando a lei determine o contrário, corresponde a acção adequada a fazê-lo reconhecer em juízo, a prevenir ou reparar a violação dele e a realizá-lo coercivamente, bem como os procedimentos necessários para acautelar o efeito útil da acção” – artigo 498.º, n.º 3, do CPC; Alberto dos Reis, in Código de Processo Civil Anotado, Volume II, 3ª Edição 1948, Coimbra Editora, pp. 285 a 289 e in Processos Especiais, Vol. I, p. 8; Acórdão do TCA Norte de 31-01-2008, Proc. 00620/04.BEBRG, in www.dgsi.pt.

Com reporte para os autos, o CPTA/2003 faz corresponder a certos tipos de pretensões certas formas de processo, dizendo qual o modelo de tramitação que deve ser seguido em cada processo, consoante o tipo de pretensões em causa – cfr. artigos 35.º, 37.º e 46.º.

Verificar-se-á erro na forma de processo sempre que a forma processual escolhida pelo Autor não corresponda à estabelecida pela lei, em sintonia com a natureza ou valor da acção, constituindo nulidade de conhecimento oficioso – cfr. artigos 193.º e 196.º do CPC.

Considerando o pedido da presente acção e a análise conjugada dos artigos 37.º n.ºs 1 e 2, alínea b), 46.º n.º 1 do CPTA e 48.º n.º 1 do DL n.º 503/99, de 20 de Novembro, o tribunal a quo considerou verificada a existência de erro na escolha da forma do processo, julgando o meio processual adequado a acção administrativa comum, “pois que é esta a forma processual legalmente tipificada (…) que não a ação administrativa especial” proposta, e, consequentemente, considerou procedente a excepção/nulidade processual de “erro na forma de processo” suscitada pelo Recorrido Ministério.

Ora, a Recorrente, nas respectivas alegações de recurso, não invoca nenhum argumento de impugnação desta parte da decisão recorrida, assim se conformando com o decidido.

Antes dirige a sua contestação para a julgada “falta de utilidade e da pertinência duma convolação para o meio ou forma processual adequado, nos termos do artigo 193.º do CPC ex vi artigo 1º do CPTA” por, nos termos do n.º 1, do artigo 48.º do DL n.º 503/99, se mostrar caducado o direito de acção, atento o decurso do prazo de 1 ano, contado desde o conhecimento pela Recorrente do parecer emitido em 17.01.2011 pela Junta de Saúde Naval, no qual se concluiu que a situação daquela resultava de patologia prévia à sua entrada no serviço militar, e não de qualquer facto ocorrido em serviço, enquanto acto ou omissão relativos à aplicação do DL n.º 503/99. E que, assim, se não justifica proceder à referida convolação, por inutilidade.

A Recorrente fundamenta tal impugnação no facto de, não obstante admitir (implicitamente) ter tido conhecimento do parecer em causa, pelo menos, em data anterior a 03.06.2011, atenta a participação que realizou à Ré Caixa Geral de Aposentações onde dá conta do referido parecer e do seu teor, não ter sido formalmente notificada do mesmo. Razão pela qual, presume-se, o prazo legalmente previsto, de 1 ano, para propositura da acção de reconhecimento da pretensão sub judice, não se ter iniciado.

Apreciemos.

Estabelece o n.º 1, artigo 24º do DL n.º 503/99, de 20 de Novembro que “[N]o caso de o trabalhador se considerar em situação de recidiva, agravamento ou recaída ocorrida no prazo de 10 anos contado da alta, deve apresentar à entidade empregadora requerimento de submissão à junta médica referida no artigo 21.º, fundamentado em parecer médico.”.

Dispondo, por sua vez, o artigo 48.º do DL n.º 503/99, de 20 de Novembro, sob a epígrafe “Acção para reconhecimento do direito”, o seguinte:

“[O] interessado pode intentar, no prazo de um ano, nos tribunais administrativos, acção para reconhecimento do direito ou interesse legalmente protegido contra os actos ou omissões relativos à aplicação do presente diploma, que segue os termos previstos na lei de processo nos tribunais administrativos e tem carácter de urgência.”. – n.º 1

“O prazo de um ano conta-se:

a) Da data da notificação, em caso de acto expresso;

b) Da data da formação de acto tácito de indeferimento da pretensão formulada.”. – n.º 3.

Neste seguimento, lê-se no aresto recorrido, o seguinte:

“(…)

E, conforme decorre da alínea B) do probatório, a Autora apresentou ao Comandante da Escola de Fuzileiros o requerimento a que alude o citado normativo.

Sendo que, tal requerimento foi deferido, tendo sido determinado que a Autora seria presente a Junta de Saúde Naval [cfr. alínea C) do probatório].

Em 17.01.2011, a Junta de Saúde Naval emitiu parecer no qual concluiu que a situação da Autora resultava de patologia prévia à sua entrada no serviço militar, e não de qualquer facto ocorrido em serviço.

(…)

No caso em apreço, a Autora foi notificada do parecer da Junta de Saúde Naval, pelo menos, em data anterior a 03.06.2011, atenta a participação que realizou à Ré Caixa Geral de Aposentações [cfr. alínea E) do probatório].

Portanto, a Autora, nos termos do n.º 1, do artigo 48º do DL n.º 503/99, de 20 de Novembro tinha um ano para intentar acção para reconhecimento do direito, contados da data da notificação do parecer da Junta de Saúde Naval, conforme o disposto na alínea a), do n.º 3 do mesmo normativo, sendo que tal notificação ocorreu em data anterior a 03.06.2011.

Assim, tendo a presente acção sido intentada em 16.01.2013 [cfr. alínea F) do probatório], há muito já estava esgotado o prazo legal para a sua apresentação.

Pelo que, a convolação revela-se de todo inútil, em virtude da extemporaneidade da instauração do adequado meio processual, nos termos do n.º 1, do artigo 48º do DL n.º 503/99, de 20 de Novembro, por se mostrar caducado o direito de acção da Autora.

Assim, pelos motivos supra expostos, julgando-se verificada a nulidade processual do erro na forma de processo e sendo processualmente inadmissível a convolação dos presentes autos em acção administrativa comum, implica a nulidade de todo o processo e conduz à absolvição dos Réus da instância [cfr. alínea b), do artigo 288º, n.º 2, do artigo 576º e alínea b), do artigo 577º, todos do CPC ex vi artigo 1º do CPTA].”.

Ora, é incontestável que o erro na escolha da forma do processo constitui uma nulidade processual, oficiosamente sanável, nos termos dos artigos 193.º, 196.º e 6.º, n.º 2, do CPC, bastando, para tanto, ao tribunal, se a tal nada obstar, corrigir a forma do processo a seguir – in casu, a acção administrativa comum – determinando a autuação do processo em conformidade.

Na verdade, “O erro na forma de processo determina, à luz do princípio da economia processual, a convolação para o meio contencioso adequado para o que importa unicamente a anulação dos atos que, de todo em todo, não possam ser aproveitados, devendo praticar-se os atos que forem estritamente necessários para que o processo se aproxime, tanto quanto possível, da forma legalmente estabelecida, sendo que apenas não podem ser aproveitados os atos que tendo sido praticados envolva uma diminuição de garantias dos demandados.” – cfr. artigo 193.º do CPC e Acórdão do TCAN, de 27.10.2011, P. n.º 01105/10.5BELSB.

Não obstante, no presente caso, tal convolação não se mostra passível de ser determinada, por decurso do prazo de 1 ano, de caducidade do direito de acção, previsto no artigo 48.º do DL n.º 503/99, não estando, assim, reunidos os necessários pressupostos para o aproveitamento de todos ou alguns dos actos processuais já praticados.

Neste contexto, falece razão à Recorrente quando sustenta que o decurso do prazo de um ano não se esgotou, por falta de notificação formal do acto/parecer da Junta de Saúde Naval em causa, uma vez que, resulta claro dos autos que dele tomou cabal conhecimento. O que, implicitamente, admite ao não negar o documento constante dos autos – a participação que apresentou à Ré Caixa Geral de Aposentações a 03.06.2011em que o tribunal a quo se apoiou para dar como assente o conhecimento (inequívoco) da Recorrente, “pelo menos, em data anterior a 03.06.2011”, do referido acto, e no qual, entre o demais, refere o seguinte:
7. Em 17 de Janeiro de 2011, em parecer de Junta Médica, foi a participante considerada incapaz para todo o serviço e que a sua situação clínica resulta de patologia prévia, não referida, à sua entrada no serviço militar.” – cfr. alínea E) do probatório.

Revelam, pois, os autos que a forma como a Recorrente adquiriu conhecimento do parecer da Junta Médica, a si dirigido, lhe possibilitou efectiva cognoscibilidade do mesmo, nos seus elementos essenciais, permitindo-lhe, dessa forma, o acesso à justiça administrativa para reconhecimento dos “direitos” que pretende tutelar, ao abrigo do regime consagrado no DL n.º 503/99 – v. artigo 67.º/1/b), do CPA. Acesso que deveria ter realizado, no prazo legalmente estabelecido para o efeito.

Aliás, e como bem refere a Digna Magistrada do Ministério Público, no parecer junto aos autos, de acordo com o disposto no artigo 329.º do CC, o prazo de caducidade começa a correr, em geral, no momento em que o direito puder ser legalmente exercido.

Termos em que, ao não ordenar o prosseguimento da acção administrativa especial proposta, na forma processual tipificada na lei (acção administrativa comum), por decurso do prazo de 1 ano, de caducidade do direito de acção, previsto no artigo 48.º do DL n.º 503/99, o Acórdão recorrido não merece a censura que lhe foi assacada, improcedendo o alegado erro de julgamento e, consequentemente, o presente recurso.

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IV – DECISÃO
Pelo exposto, os juízes da Secção do Contencioso Administrativo deste Tribunal Central Administrativo acordam em negar provimento ao presente recurso jurisdicional, mantendo a decisão recorrida.
Custas pela Recorrente.
Notifique. DN.

Porto, 8 de Abril de 2016
Ass.: Alexandra Alendouro
Ass.: João Beato
Ass.: Hélder Vieira