Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00585/18.5BEPNF-R1
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:07/03/2020
Tribunal:TAF de Penafiel
Relator:Rogério Paulo da Costa Martins
Descritores:RECURSO JURISDICIONAL; CASO JULGADO; ARTIGO 621º DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL; ARTIGO 145º, N.º2, ALÍNEA A), PRIMEIRA PARTE, A CONTRARIO,
DO CÓDIGO DE PROCESSO NOS TRIBUNAIS ADMINISTRATIVOS;
ARTIGO 12.º, N.º 1, ALÍNEA B) DO REGULAMENTO DAS CUSTAS PROCESSUAIS.
Sumário:1. Não há decisões judiciais tácitas; os tribunais têm o dever de decidir expressa e fundadamente as questões de que lhes cumpre conhecer – artigos 152º, n.º1, e 154º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil.

2. Pelo que a decisão faz caso julgado nos precisos limites e termos em que julga – artigo 621º do Código de Processo Civil. Afirmação que não faz sentido em relação a uma decisão tácita que, por definição, não tem termos.

3. Não existindo nos autos, como se afirma no despacho reclamado, qualquer decisão expressa sobre a reclamação da conta, incompatível com a decisão de indeferimento de que se recorre, não há violação de caso julgado.

4. Sendo certo que a não recusa da petição inicial e a inexistência de despacho pré-saneador destinado a suprir o pagamento de taxa de justiça correspondente à coligação nada definem quanto à questão que se pretende decidida com trânsito em julgado pela simples e evidente razão de que não são decisões, mas, pelo contrário, ausência de decisões.

5. Mostra-se acertada a não admissão do recurso, face ao disposto no artigo 145º, n.º2, alínea a), primeira parte, a contrario, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, e no artigo 12.º, n.º 1, alínea b) do Regulamento das Custas Processuais. *
* Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:J. (e Outros).
Recorrido 1:Centro Hospitalar (...), E.P.E.
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Outros despachos
Decisão:Indeferir a reclamação para a Conferência.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:EM NOME DO POVO

Acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:

J. veio apresentar reclamação do despacho de 19.03.2020, do Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel, que não admitiu, porque legalmente inadmissível, o recurso por si interposto da decisão de indeferimento da reclamação da conta na acção que o Reclamante e outros movem contra o Centro Hospitalar (...), E.P.E..

Invocou para tanto que a decisão recorria viola o caso julgado formal pelo que é susceptível de recurso, nos termos das disposições conjugadas do artigo 629º, n.º 2, alínea a), do Código de Processo Civil, e do artigo 142º, n.º 3, primeira parte, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos.

Por despacho de 21.05.2020 do Relator foi indeferida a reclamação.

Veio agora o Requerente requerer que sobre a mesma recaia acórdão.
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Cumpre decidir já que nada a tal obsta.
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I - Factos com relevo:

1. Com a data de 03.02.2020 e assinado em 04.02.2020 foi proferido despacho pelo M.mo Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel que aqui se dá por reproduzido, a indeferir a reclamação da conta apresentada pelo Autor, ora Reclamante, J. - folhas 18 do SITAF.

2. Deste despacho recorreu o ora Reclamante invocando violação de caso julgado, em requerimento e alegações que aqui se dão por reproduzidos - folhas 9 e 10 a 17 do SITAF.

3. Recurso que não foi admitido por ser inadmissível, face ao valor do mesmo, de 76,50 euros, em despacho de 19.03.2020, objecto da presente reclamação e que aqui se dá por reproduzido – folhas 22 e 23 do SITAF.
*
II - Enquadramento jurídico:

O requerimento em apreço é este:

“1. Entende o Venerando Juiz relator que «Os tribunais têm o dever de decidir expressa e fundadamente as questões de que lhes cumpre conhecer – artigos 152º, n. º1, e 154º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil.» e «Não existindo nos autos, como se afirma no despacho reclamado, qualquer decisão expressa sobre a reclamação da conta, incompatível com a decisão de indeferimento de que se recorre, não há violação de caso julgado...»
PORÉM,
2. Com o devido respeito (que aliás, muito é), a decisão singular não fundamenta o oferecido na reclamação.
3. Na verdade, não tendo o juiz a quo recusado a petição inicial nem proferido qualquer despacho pré-saneador destinado a suprir o pagamento de taxa de justiça correspondente à coligação, a relação processual ficou com força obrigatória dentro do processo, formando-se, assim, caso julgado formal no que tange ao litisconsórcio voluntário, que, por força do disposto no n.º 1 do artigo 620.º do CPC, é vinculativo no processo em que foi proferida a decisão.
DESTARTE,
4. Considerando, a proibição de arbítrio decisório, decorrente não só da segurança jurídica, mas também do processo equitativo (cfr. artigo 20.º, n.º 4, da Constituição), e tendo a decisão a quo violado, por erro de interpretação e aplicação, o artigo 12.º, n.º 1, alínea b) do Regulamento das Custas Processuais (RCP), quiçá violadora dos princípios constitucionais da proporcionalidade, da igualdade e do acesso à Justiça, não pode deixar de se ponderar, como válvula do sistema, a admissibilidade da revista excecional nos termos do art.º 150.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), a interpor para o Supremo Tribunal Administrativo”.

A única questão que aqui se coloca é a de saber se a decisão recorrida viola caso julgado formal, única hipótese em que será recorrível dado o valor em causa, de 76,50 euros, conforme previsto nas disposições conjugadas do artigo 629º, n.º 2, alínea a), do Código de Processo Civil, e artigo 142º, n.º 3, primeira parte, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos.

E claramente o Reclamante carece de razão.

Não há decisões judiciais tácitas.

Os tribunais têm o dever de decidir expressa e fundadamente as questões de que lhes cumpre conhecer – artigos 152º, n. º1, e 154º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil.

Pelo que a decisão faz caso julgado nos precisos limites e termos em que julga – artigo 621º do Código de Processo Civil. Afirmação que não faz sentido em relação a uma decisão tácita que, por definição, não tem termos.

Não existindo nos autos, como se afirma no despacho reclamado, qualquer decisão expressa sobre a reclamação da conta, incompatível com a decisão de indeferimento de que se recorre, não há violação de caso julgado.

Sendo certo que a não recusa da petição inicial e a inexistência de despacho pré-saneador destinado a suprir o pagamento de taxa de justiça correspondente à coligação nada definem quanto à questão que se pretende decidida com trânsito em julgado pela simples e evidente razão de que não são decisões, mas, pelo contrário, ausência de decisões.

E, assim sendo, mostra-se acertada a não admissão do recurso, face ao disposto no artigo 145º, n. º 2, alínea a), primeira parte, a contrario, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, e no artigo 12.º, n.º 1, alínea b) do Regulamento das Custas Processuais.

Não se vislumbrando aqui qualquer arbítrio decisório, nem violação da segurança jurídica ou do processo equitativo (cfr. artigo 20.º, n.º 4, da Constituição), ou sequer dos princípios constitucionais da proporcionalidade, da igualdade e do acesso à Justiça.
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IV - Pelo exposto, os juízes da Secção Administrativa do Tribunal Central Administrativo Norte, acordam em manter o indeferimento da reclamação do despacho que não admitiu o recurso.

Custas pelo Reclamante sem prejuízo do apoio judiciário de que beneficia.
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Porto, 03.07.2020


Rogério Martins
Luís Garcia
Frederico Branco