Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00574/08.8BECBR
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:01/15/2015
Tribunal:TAF de Coimbra
Relator:Pedro Vergueiro
Descritores:OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO FISCAL.
DECISÃO DA MATÉRIA DE FACTO.
CADUCIDADE.
EXIGIBILIDADE DA DÍVIDA.
NULIDADE DA CITAÇÃO.
INEXISTÊNCIA DE IMPOSTO.
ILEGALIDADE DA LIQUIDAÇÃO DA DÍVIDA.
FUNDAMENTOS DE OPOSIÇÃO.
CONVOLAÇÃO.
Sumário:I) Ao TCA assiste o poder de alterar a decisão de facto fixada pelo tribunal “a quo” desde que ocorram os pressupostos vertidos no art. 712.º, n.º 1 do CPC (actual art. 662º), incumbindo-lhe, nessa medida, reapreciar as provas em que assentou a decisão impugnada objecto de controvérsia, bem como apreciar oficiosamente outros elementos probatórios que hajam servido de fundamento à decisão sobre aqueles pontos da factualidade controvertidos.
II) Quando se analisam os elementos vertidos a fls. 117 a 119 do PEF apenso nos termos descritos no ponto 2. do probatório, constata-se que a data de 04-07-2007 diz respeito à notificação relativa à liquidação de IVA de 2006, o que significa que, de acordo com o disposto no art. 712º nº 1 do C. Proc. Civil, se impõe a alteração do probatório, fazendo consignar que: “2. A executada foi notificada da liquidação oficiosa do IVA de 2002 e respectiva nota de demonstração, por documento de cobrança de fls. 109, cujo prazo de pagamento terminava em 25/11/2004, tendo antes sido notificada em 9/3/2004 para efeitos de audição prévia da liquidação oficiosa, sendo que em 11-06-2004 foi enviada a aludida notificação relativa ao ano de 2002, a qual foi devolvida em 24-06-2004 com a indicação de “Não Reclamado”, tendo sido remetida nova notificação em 29-06-2004 dirigida à aqui Recorrente na pessoa do Presidente do Conselho de Administração, a qual não foi devolvida (fls. 31-32 destes autos), sendo que a partir desta precisão, resulta claro que a pretensão da Recorrente não pode ser atendida, pois que a notificação da liquidação de IVA de 2002 não está relacionada com a data referida no ponto 2. do probatório, a qual respeita, como se disse, à liquidação de IVA de 2006, o que retira qualquer virtualidade ao exposto pela Recorrente com referência à questão acima descrita.
III) A nulidade da citação não consubstancia fundamento de oposição à execução fiscal, nos termos do disposto no art. 204.º do CPPT, não sendo subsumível, designadamente, na previsão da alínea i) do n.º 1 daquele artigo e, como nulidade, deverá ser invocada perante o órgão da execução fiscal [cf. n.ºs 1 e 2 do art. 191.º do Código de Processo Civil (CPC), que corresponde ao art. 198.º na anterior versão do Código], com possibilidade de reclamação para o tribunal tributário de eventual decisão desfavorável (art. 276.º do CPPT), pois que a oposição, que tem a natureza de uma contestação, visa, em regra, a extinção da execução fiscal, enquanto a nulidade da citação apenas pode determinar a repetição do acto com suprimento das irregularidades que determinaram a anulação e a repetição dos actos subsequentes que, porque dependentes da citação anulada, tenham sido também anulados. Assim, porque a nulidade da citação não tem como efeito a extinção da execução fiscal não pode ser erigida, em circunstância alguma, em fundamento de oposição à execução fiscal.
IV) No que concerne à alínea a) do n.º 1 do art. 204º do CPPT prevê-se como fundamento de oposição à execução fiscal a inexistência do tributo nas leis em vigor à data dos factos a que respeita ou não estar autorizada a sua cobrança à data da liquidação, se se tratar de um tributo relativamente ao qual ela dependa de autorização, ou seja, está-se, aqui, perante aquilo que doutrinal e jurisprudencialmente se designa por ilegalidade abstracta ou absoluta da liquidação, que se distingue da «ilegalidade em concreto» por na primeira estar em causa a ilegalidade do tributo e não a mera ilegalidade do acto tributário ou da liquidação; isto é, na ilegalidade abstracta a ilegalidade não reside directamente no acto que faz aplicação da lei ao caso concreto, mas na própria lei cuja aplicação é feita, não sendo, por isso, a existência de vício dependente da situação real a que a lei foi aplicada nem do circunstancialismo em que o acto foi praticado.
V) A partir daqui, resulta claro que a situação descrita pela Recorrente não se subsume ao exposto, na medida em que aquilo que se discute, como bem refere a decisão recorrida, é a legalidade em concreto da dívida exequenda e sobre esta estatui a al. h) do art. 204º: ilegalidade da dívida exequenda, sempre que a lei não assegure meio judicial de impugnação ou recurso contra o ato de liquidação, de modo que, em função do probatório, tal equivale a dizer que, neste caso, a lei processual tributária contempla a impugnação para apreciar da legalidade da divida em concreto, analisar da validade do ato de liquidação, ou seja, a oponente dispunha de meio processual adequado para por em crise a legalidade da liquidação mediante impugnação prevista no art. 99° do C.P.P.T. pelo que lhe está vedado deduzir oposição com tais fundamentos.
VI) Quanto à possibilidade convolação (art. 97º nº 3 da LGT e art. 98º nº 4, do CPPT), porque não é cindível a petição inicial, não existe nos casos, como o dos autos, em que nesta tenham sido também invocados fundamentos próprios da oposição à execução fiscal.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:Indústria Transformadora de Papeis..., S.A.
Recorrido 1:Fazenda Pública
Decisão:Negado provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:
1. RELATÓRIO
“Indústria Transformadora de Papéis… (I…), S.A.”, identificada nos autos, inconformada veio interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, datada de 15-10-2013, que julgou improcedente a pretensão pela mesma deduzida na presente instância de OPOSIÇÃO com referência à execução fiscal nº 3387200101026810 a correr termos no serviço de finanças do Porto 4, originariamente instaurada contra a sociedade “C… Lda.”, e contra si revertida por dividas de IVA relativas aos anos 1999, 2000 e 2001.

Formulou nas respectivas alegações (cfr. fls. 146-155), as seguintes conclusões que se reproduzem:
“(…)
1. Verifica-se a caducidade da liquidação oficiosa do IVA.
2. O processo executivo 0752200601004590 terá, possivelmente (dizemos, possivelmente, dada a falta da informação necessária) por base liquidação oficiosa do IVA, referente ao ano de 2002.
3. Ora, dispõe o art. 88° do CIVA que, só poderá ser liquidado imposto nos prazos e nos termos previstos nos artigos 45° da lei geral tributária.
4. Fixa neste normativo legal que, o direito de liquidar os tributos caduca, se a liquidação não for validamente notificada ao contribuinte, no prazo de quatro anos.
5. Porque a liquidação nunca foi notificada á exequenda deve ter-se por assente que o direito de liquidação, que está na origem destes autos, há muito caducou.
6. Pelo que sempre a executada deve ser absolvida do pedido.
7. E, ainda que se entenda, quanto a esta matéria que a notificação aconteceu a 4 de Julho de 2007, sempre havia decorrido mais de 4 anos.
8. Logo, e sempre, caducou o direito de liquidação oficiosa e, por isso, o direito de exigir o pagamento deste IVA.
Sem prescindir,
9. O Tribunal “a quo”, mal, não se pronuncia quando às demais questões suscitadas em sede de petição inicial, por entender que estas questões só em sede de impugnação judicial poderiam ser apreciadas. Ora,
10. Como alegado em sede de petição inicial, a executada foi citada na modalidade de citação com hora certa tendo a mesmo sido feita mediante afixação, no local, e na alegada presença de duas testemunhas, da nota de citação, pelo que,
11. Sempre que a citação haja consistido na afixação da nota de citação, nos termos do artigo 240º, nº 3, como foi o caso, deveria ainda ser enviada, no prazo de 2 dias úteis, carta registada ao citando, comunicando-lhe a data e o modo pelo que o acto se considera realizado, o prazo para o oferecimento da defesa e as cominações aplicáveis à falta desta, o destino dado ao duplicado e a identidade da pessoa em quem a citação foi realizada.
12. A verdade é que tal obrigação não foi cumprida, razão pela qual deve a citação ser dada sem efeito, concluindo-se pela falta de citação da executada. Além disso,
13. A presente oposição tem por fundamento a inexistência do imposto, alegadamente em falta, a falta da notificação da liquidação de parte do tributo executado, no prazo de caducidade, a anulação da dívida exequenda e, a ilegalidade da liquidação da dívida exequenda.
14. À executada apenas foram “entregues” as “certidões de título executivo”.
15. Ora, este facto, impossibilita que a executada exerça, em pleno, o seu direito de defesa e contraditório,
16. E isto é assim porquanto, as citações em causa não contêm a devida, e legalmente exigida, fundamentação.
17. Assim, a falta de fundamentação da citação, deve determinar a nulidade de todo o processado. Caso assim não se entenda,
18. Além do processo 0752200601004590, também os processos
0752200701002333, 0752200801000144, terão possivelmente (dizemos, possivelmente, dada a falta de informação necessária), por base a liquidação oficiosa do IVA, referente ao ano de 2005 e 2006, respectivamente.

19. Enquanto os processos 0752200701003755, 0752200701003755 e 0752200701004751 são devidos por aplicação de coimas, possivelmente (dizemos, possivelmente, dada a falta de informação necessária), por não entrega do tributo ou das declarações.
20. Importa dizer que a executada se encontra encerrada, seguramente há mais de 15 anos e, quase de certeza, há mais de 20 anos.
21. Não tendo qualquer actividade, não gerando lucros ou praticando qualquer acto que lhe imponha a prática de qualquer obrigação fiscal ou a entrega de qualquer tributo.
22. Mas, mais do que isso a verdade é que a executada, há mais de 15 anos e, talvez mesmo há mais de 20 anos, não tem órgãos administrativos.
23. Toda a gente moradora em Ponte de Sótão e Góis, bem como esta Repartição de Finanças, sabe que a executada, há mais de 15 anos que não labora.
24. Há mais de 15 anos que não faz qualquer transacção, não retêm IVA, etc.
25. E, mesmo conhecendo esta realidade, o Serviço de Finanças inventa actos para inventar a cobrança de impostos, não fazendo uso do seu direito de cobrar as contribuições devidas, mas sim, abusando de um direito que a lei lhe confere, desvirtuando-o e adulterando-o.
26. A executada está em fase de dissolução e liquidação, precisamente para conseguir pagar as suas dívidas ás finanças, as efectivamente devidas, o que não é o caso das cobranças nos processos à margem referenciadas.
27. Antes de mais, importa dizer que a notificação do apuramento do imposto teria de indicar os elementos e os actos ou factos através dos quais chegaram ao conhecimento da administração fiscal que havia lucros ou IVA retido e necessidade de apresentar as consequentes declarações.
28. Não tendo sido assim, sempre as citações são nulas e não podem produzir qualquer efeito, como nulo será todo o processado. Mais do que isso,
29. É verdade que o cumprimento das obrigações impostas pelo CIVA será fiscalizado, em geral, e dentro dos limites da respectiva competência, por todas as autoridades e, em especial, pela Direcção-Geral das Contribuições Impostos.
30. Mas, a fiscalização aludida, terá de se reger segundo o fixado no artigo 63° da lei geral tributária,
31. Assim, impunha-se que este Serviço de Finanças, antes de proceder a liquidações oficiosas e aplicações de multa por alegado incumprimento das obrigações fiscais, inspeccionasse devidamente a executada.
32. Impunha-se que desenvolvesse todas as diligências necessárias ao apuramento da situação tributária da executada.
33. A Direcção de Finanças, ao invés de dar cumprimento ao seu dever de fiscalização, preferiu fazer liquidações oficiosas indevidas e aplicar coimas que não são admissíveis.
34. Mas, ainda que assim não se entenda, sempre se há-de considerar o comportamento da executada como um acto continuo e não um seguimento de actos,
35. Pelo que, a considerar-se que o comportamento da executada é punível, então, só se poderia aplicar uma coima, e não três.
36. A verdade é que sobre esta matéria o Tribunal “a quo” decidiu não se pronunciar.
37. Entendeu o Tribunal “a quo” que estes argumentos só podem ser analisados em sede de impugnação.
38. A oponente discorda.
39. De facto, os factos alegados, e acima referidos, têm pleno cabimento em sede de oposição à execução.
40. A oposição poderá ter por fundamentos, que no caso concreto se verificam:
a. Inexistência do imposto..., ou…, não estar autorizada a sua cobrança à data em que tiver ocorrido a respectiva liquidação;
b. Prescrição da dívida exequenda;
c. Falta da notificação da liquidação do tributo no prazo de caducidade;
d. Pagamento ou anulação da dívida exequenda;
e. Ilegalidade da liquidação da divida exequenda, sempre que a lei não assegure meio judicial de impugnação ou recurso contra o acto de liquidação;
41. Assim, sendo a prescrição de conhecimento oficioso, e verificando-se a mesma, sempre o Tribunal “a quo” deveria ter reconhecido a mesma e determinar a absolvição da oponente.
42. E, quanto aos demais argumentos, provados e documentados, deveria a oposição ter sido julgada procedente.
43. Por último, e ainda que assim não se considere, deveria o Tribunal “a quo” convolar a oposição à execução em impugnação, o que também não fez.
44. Aliás, neste sentido pronunciou-se este Supremo Tribunal Administrativo, em acórdão de 26 de Setembro de 2012.
45. Termos em que, deve a decisão recorrida ser revogada e substituída por outra que absolva a executada/oponente dos pedidos formulados nos processos supra referidos, anulando-se a liquidação oficiosa de imposto, bem como as coimas fixadas, isto caso se considere que o processado até agora não é nulo, o que, só por cautela de patrocínio, se admite.
46. Ou, caso assim não se entenda, sempre convolada a presente oposição em impugnação judicial.”

A recorrida Fazenda Pública não apresentou contra-alegações.

O Ministério Público junto deste Tribunal pronunciou-se pela improcedência do presente recurso.

Colhidos os vistos dos Exmºs Juízes Desembargadores Adjuntos, vem o processo submetido à Conferência para julgamento.


2. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelos Recorrentes, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que as questões suscitadas resumem-se, em suma, apreciar a invocada caducidade da liquidação oficiosa do IVA de 2002 com reflexo na exigibilidade da dívida exequenda e bem assim indagar da relevância do exposto em relação à citação efectuada, à inexistência do imposto e a ilegalidade da liquidação da dívida exequenda enquanto fundamento de oposição à execução fiscal, sem olvidar a referência à figura da prescrição.

3. FUNDAMENTOS
3.1. DE FACTO
Neste domínio, consta da decisão recorrida o seguinte:
“…
1. Foram instauradas execuções fiscais nº 0752-2006/01004590 e apensos 2007/01002333 e 2008/01000144 para pagamento do IVA do ano de 2002, no montante de € 1.496,40, IVA de 2005 no valor de 1.496,40 e IVA de 2006, no valor de 1.496,40 e à executada foi enviada citação por carta registada devolvida em 19/12/06, por ofício de citação de fls. 13 a 16 do p.e.f. remeteu-se à C…, na qualidade de liquidatária da sociedade, oficio para citação da executada, conjuntamente com os documentos de identificação da dívida em cobrança com data de 23/1/2008, ocorrendo a mesma em 4 de abril de 2008; (documentos do p.e.f. apenso e bem assim a posição da oponente relativamente á data da citação)
2. A executada foi notificada da liquidação oficiosa do IVA de 2002 e respetiva nota de demonstração, por documento de cobrança de fls. 109, cujo prazo de pagamento terminava em 25/11/2004, tendo antes sido notificada em 9/3/2004 para efeitos de audição prévia da liquidação oficiosa e em 4/7/2007 foi notificada por carta registada com a/r na pessoa do seu administrador Carlos… (fls. 117 a 119 do p.e.f.);
*
FACTOS NÃO PROVADOS.
Nada de relevante a indicar.
FUNDAMENTAÇÃO.
*
Os factos descritos assentaram nos documentos e informações oficiais acima identificados.”
«»
3.2. DE DIREITO
Assim sendo, assente a factualidade apurada cumpre, então, antes de mais, entrar na análise da realidade em equação nos autos, sendo que a este Tribunal, está cometida, desde logo, a tarefa de indagar da relevância do exposto pela Recorrente a propósito da caducidade da liquidação oficiosa do IVA de 2002, matéria onde aponta que o processo executivo 0752200601004590 terá, possivelmente (dizemos, possivelmente, dada a falta da informação necessária) por base liquidação oficiosa do IVA, referente ao ano de 2002, sendo que dispõe o art. 88° do CIVA que, só poderá ser liquidado imposto nos prazos e nos termos previstos nos artigos 45° da lei geral tributária e fixa neste normativo legal que, o direito de liquidar os tributos caduca, se a liquidação não for validamente notificada ao contribuinte, no prazo de quatro anos, de modo que, porque a liquidação nunca foi notificada à executada deve ter-se por assente que o direito de liquidação, que está na origem destes autos, há muito caducou, pelo que sempre a executada deve ser absolvida do pedido e, ainda que se entenda, quanto a esta matéria que a notificação aconteceu a 4 de Julho de 2007, sempre havia decorrido mais de 4 anos, logo, e sempre, caducou o direito de liquidação oficiosa e, por isso, o direito de exigir o pagamento deste IVA.

Neste domínio, a sentença recorrida ponderou que:
“…
A oponente invoca factualmente a al. e) do n.º 1 do art. 204° do C.P.T., ou seja, o que antes deste diploma se configurava como inexigibilidade da dívida (al.h) do art. 286° do CPT)
A oponente alega que não foi notificada da liquidação oficiosa do IVA de 2002.
Só com a notificação da liquidação, a dívida tributária se torna certa e exigível, é o que resulta do art. 45° do LGT em conjugação com o art. 268°, n.º 2 da C.R.P.
Já temos como adquirido que a eventual irregularidade da notificação não gera qualquer vício de forma do ato notificado pois que não respeita à validade do mesmo mas à sua eficácia.
Tal notificação não constitui mais que um acto complementar que apenas assegura a plena eficácia do acto comunicado. Cfr. Acórdão do STA de 12/10/04, recurso 6038/01, de 24/4/02, in Fiscalidade n° 6 pág. 38. e de 3/5/06 no processo 0154/06 in www,dgsi.pt/.

Todavia, resulta que a oponente foi notificada para exercer o seu direito de audição relativamente à liquidação oficiosa e, posteriormente, foi notificada da liquidação.
A falta de notificação do acto de liquidação implica a inexigibilidade da dívida exequenda e esta era fundamento de oposição, enquadrável na al. h) do art. 286° do C.P.T. e al. e) do CPPT, contudo a circunstancialismo fáctico dos autos não confirma a falta de notificação.

Com este pano de fundo, não podemos deixar de notar que a Recorrente, no essencial, limita-se a reiterar o exposto em sede de petição inicial, sem nunca referir em que medida a argumentação e julgamento expendidos na sentença recorrida estão errados ou imperfeitos, devendo conduzir a conclusão diferente, como se lhe impunha nos termos do disposto nos artigos 684º e 685º-A, n.ºs. 1 e 2, ambos do C. Proc. Civil na redacção com interesse, sendo que nem sequer coloca em causa a matéria de facto que serviu de fundamento a tal julgamento, o que poderia ser determinante para uma eventual procedência do presente recurso, se o julgamento feito tivesse sido expressamente posto em causa.
Pois bem, como se refere no sumário do Ac. do S.T.A. de 02-06-2004, Proc. nº 047978, www.dgsi.pt, “o objecto do recurso jurisdicional é a sentença recorrida e não o acto administrativo sobre que esta se pronunciou, o que obriga o Recorrente a demonstrar nas alegações e conclusões do recurso o desacerto daquela sentença, indicando as razões que o levam a concluir pela sua anulação ou alteração”, sendo que, “se o não fizer, e se se limitar a repetir os argumentos que o levaram a impugnar o acto recorrido, o recurso terá, fatalmente, de improceder.”.
Sendo assim, como é, neste âmbito, cabe apenas relevar a afirmação de que, quanto a esta matéria, ainda que a notificação se tenha verificado a 4 de Julho de 2007, sempre havia decorrido o tal prazo de 4 anos.
Ora, o Acórdão do Pleno da Secção do Contencioso Tributário do S.T.A. de 17/3/2011, Proc. nº 01076/09, www.dgsi.pt, decidiu, tal como resulta do respectivo sumário, que «na redacção do n.º 4 do artigo 45.º da LGT dada pelo artigo 43.º da Lei n.º 32-B/2002, de 30-12, o prazo, de 4 anos, em relação ao IVA, conta-se, não a partir da data em que o facto tributário ocorreu, mas a partir do início do ano civil seguinte àquele em que se verificou a exigibilidade do imposto»; e que «tendo em conta que o efeito extintivo do direito à liquidação do IVA é o decurso do "inteiro" prazo de caducidade e não a ocorrência do seu "dies a quo", a nova redacção do n.º 4 do artigo 45.º da Lei Geral Tributária é aplicável ao prazo em curso, atento ao disposto na parte final do n.º 2 do artigo 12.º do Código Civil».
Tal significa que, “in casu”, o prazo de 4 anos a que alude o Recorrente, com referência ao IVA de 2002, teve o seu início em 01-01-2003, de modo que, no momento da notificação vertida no probatório (04-07-2007, seria manifesto que o prazo a que alude o art. 45º da LGT já se encontraria esgotado.
No entanto, situação em apreço não pode ter esta leitura, pois que quando se analisam os elementos vertidos a fls. 117 a 119 do PEF apenso nos termos descritos no ponto 2. do probatório, constata-se que a data de 04-07-2007 diz respeito à notificação relativa à liquidação de IVA de 2006, o que significa que, de acordo com o disposto no art. 712º nº 1 do C. Proc. Civil, se impõe a alteração do probatório, fazendo consignar que: “2. A executada foi notificada da liquidação oficiosa do IVA de 2002 e respectiva nota de demonstração, por documento de cobrança de fls. 109, cujo prazo de pagamento terminava em 25/11/2004, tendo antes sido notificada em 9/3/2004 para efeitos de audição prévia da liquidação oficiosa, sendo que em 11-06-2004 foi enviada a aludida notificação relativa ao ano de 2002, a qual foi devolvida em 24-06-2004 com a indicação de “Não Reclamado”, tendo sido remetida nova notificação em 29-06-2004 dirigida à aqui Recorrente na pessoa do Presidente do Conselho de Administração, a qual não foi devolvida (fls. 31-32 destes autos).
A partir desta precisão, resulta claro que a pretensão da Recorrente não pode ser atendida, pois que a notificação da liquidação de IVA de 2002 não está relacionada com a data referida no ponto 2. do probatório, a qual respeita, como se disse, à liquidação de IVA de 2006, o que retira qualquer virtualidade ao exposto pela Recorrente com referência à questão acima descrita.

A Recorrente refere depois que o Tribunal “a quo”, mal, não se pronuncia quando às demais questões suscitadas em sede de petição inicial, por entender que estas questões só em sede de impugnação judicial poderiam ser apreciadas. Ora, como alegado em sede de petição inicial, a executada foi citada na modalidade de citação com hora certa tendo a mesmo sido feita mediante afixação, no local, e na alegada presença de duas testemunhas, da nota de citação, pelo que, sempre que a citação haja consistido na afixação da nota de citação, nos termos do artigo 240º, nº 3, como foi o caso, deveria ainda ser enviada, no prazo de 2 dias úteis, carta registada ao citando, comunicando-lhe a data e o modo pelo que o acto se considera realizado, o prazo para o oferecimento da defesa e as cominações aplicáveis à falta desta, o destino dado ao duplicado e a identidade da pessoa em quem a citação foi realizada e a verdade é que tal obrigação não foi cumprida, razão pela qual deve a citação ser dada sem efeito, concluindo-se pela falta de citação da executada.
Por outro lado, à executada apenas foram “entregues” as “certidões de título executivo”, facto que impossibilita que a executada exerça, em pleno, o seu direito de defesa e contraditório, e isto é assim porquanto, as citações em causa não contêm a devida, e legalmente exigida, fundamentação, sendo que a falta de fundamentação da citação, deve determinar a nulidade de todo o processado.

Neste domínio, crê-se pertinente considerar o exposto no Ac. do S.T.A. de 07-05-2014, Proc. nº 0283/14, www.dgsi.pt., onde se ponderou que “… Como este Supremo Tribunal Administrativo tem vindo a afirmar repetida e uniformemente, a nulidade da citação não consubstancia fundamento de oposição à execução fiscal, nos termos do disposto no art. 204.º do CPPT, não sendo subsumível, designadamente, na previsão da alínea i) do n.º 1 daquele artigo e, como nulidade, deverá ser invocada perante o órgão da execução fiscal [cf. n.ºs 1 e 2 do art. 191.º do Código de Processo Civil (CPC), que corresponde ao art. 198.º na anterior versão do Código], com possibilidade de reclamação para o tribunal tributário de eventual decisão desfavorável (art. 276.º do CPPT). …
A oposição, que tem a natureza de uma contestação, visa, em regra, a extinção da execução fiscal, enquanto a nulidade da citação apenas pode determinar a repetição do acto com suprimento das irregularidades que determinaram a anulação e a repetição dos actos subsequentes que, porque dependentes da citação anulada, tenham sido também anulados. Assim, porque a nulidade da citação não tem como efeito a extinção da execução fiscal não pode ser erigida, em circunstância alguma, em fundamento de oposição à execução fiscal. …”

Diga-se ainda que invocada a nulidade da citação em processo de oposição à execução fiscal, há que ponderar a possibilidade de convolação da petição inicial em requerimento dirigido à execução fiscal (art. 97º nº 3 da LGT e art. 98º nº 4, do CPPT), possibilidade que, porque não é cindível a petição inicial, não existe nos casos, como o dos autos, em que nesta tenham sido também invocados fundamentos próprios da oposição à execução fiscal, de modo que, não pode acolher-se a pretensão do Recorrente neste domínio (conclusão 43ª).

Sobre o mais a que alude a Recorrente no sentido de que os impostos não são devidos por estar encerrada a actividade, não gerando qualquer lucro e os actos de liquidação são ilegais pois não resultaram dos necessários procedimentos inspectivos, a decisão recorrida considerou que “o que verdadeiramente está em causa é a legalidade em concreto da dívida exequenda e sobre esta estatui a al. h) do art. 204º: ilegalidade da dívida exequenda, sempre que a lei não assegure meio judicial de impugnação ou recurso contra o ato de liquidação.
Acontece, porém, que neste caso a lei processual tributária contempla a impugnação para apreciar da legalidade da divida em concreto, analisar da validade do ato de liquidação.
A oponente dispõe de meio processual adequado para por em crise a legalidade da liquidação mediante impugnação prevista no art. 99° do C.P.P.T. pelo que lhe está vedado deduzir oposição com tal fundamento.
Se a liquidação foi feita indevidamente a oponente deveria impugná-la, reagindo contra a ilegalidade da liquidação (cfr. C.P.T. anotado de Alfredo de Sousa e José Paixão e Ac. da 2ª instância de 26/9/95 in Coleção de Acórdãos, 1995, pág. 153 e anotação ao art. 204° do C.P.P.T do Conselheiro Jorge Lopes de Sousa, pág. 846)
Ora, se tais fundamentos não podem ser analisados no âmbito da oposição deixa naturalmente de ter interesse saber factualmente se a oponente laborou e praticou atos passíveis de IVA ou se essa atividade gerou lucro. …”.

Pois bem, no que concerne à alínea a) do n.º 1 deste artigo prevê-se como fundamento de oposição à execução fiscal a inexistência do tributo nas leis em vigor à data dos factos a que respeita ou não estar autorizada a sua cobrança à data da liquidação, se se tratar de um tributo relativamente ao qual ela dependa de autorização, ou seja, está-se, aqui, perante aquilo que doutrinal e jurisprudencialmente se designa por ilegalidade abstracta ou absoluta da liquidação, que se distingue da «ilegalidade em concreto» por na primeira estar em causa a ilegalidade do tributo e não a mera ilegalidade do acto tributário ou da liquidação; isto é, na ilegalidade abstracta a ilegalidade não reside directamente no acto que faz aplicação da lei ao caso concreto, mas na própria lei cuja aplicação é feita, não sendo, por isso, a existência de vício dependente da situação real a que a lei foi aplicada nem do circunstancialismo em que o acto foi praticado.
A partir daqui, resulta claro que a situação descrita pela Recorrente não se subsume ao exposto, na medida em que aquilo que se discute, como bem refere a decisão recorrida, é a legalidade em concreto da dívida exequenda e sobre esta estatui a al. h) do art. 204º: ilegalidade da dívida exequenda, sempre que a lei não assegure meio judicial de impugnação ou recurso contra o ato de liquidação.
Ora, o probatório informa que “foram instauradas execuções fiscais nº 0752-2006/01004590 e apensos 2007/01002333 e 2008/01000144 para pagamento do IVA do ano de 2002, no montante de € 1.496,40, IVA de 2005 no valor de 1.496,40 e IVA de 2006, no valor de 1.496,40 e à executada foi enviada citação por carta registada devolvida em 19/12/06, por ofício de citação de fls. 13 a 16 do p.e.f. remeteu-se à C…, na qualidade de liquidatária da sociedade, oficio para citação da executada, conjuntamente com os documentos de identificação da dívida em cobrança com data de 23/1/2008, ocorrendo a mesma em 4 de abril de 2008; (documentos do p.e.f. apenso e bem assim a posição da oponente relativamente á data da citação)” e que “a executada foi notificada da liquidação oficiosa do IVA de 2002 e respetiva nota de demonstração, por documento de cobrança de fls. 109, cujo prazo de pagamento terminava em 25/11/2004, tendo antes sido notificada em 9/3/2004 para efeitos de audição prévia da liquidação oficiosa e em 4/7/2007 foi notificada por carta registada com a/r na pessoa do seu administrador Carlos… (fls. 117 a 119 do p.e.f.)”
Tal equivale a dizer que, neste caso, a lei processual tributária contempla a impugnação para apreciar da legalidade da divida em concreto, analisar da validade do ato de liquidação, ou seja, a oponente dispunha de meio processual adequado para por em crise a legalidade da liquidação mediante impugnação prevista no art. 99° do C.P.P.T. pelo que lhe está vedado deduzir oposição com tais fundamentos.
Quanto à possibilidade convolação (art. 97º nº 3 da LGT e art. 98º nº 4, do CPPT), como já ficou dito, possibilidade que, porque não é cindível a petição inicial, não existe nos casos, como o dos autos, em que nesta tenham sido também invocados fundamentos próprios da oposição à execução fiscal.
Finalmente, quanto ao facto de a prescrição ser de conhecimento oficioso, e verificando-se a mesma, sempre o Tribunal “a quo” deveria ter reconhecido a mesma e determinar a absolvição da oponente, cabe notar que para além de não ser curial, tal como faz a Recorrente, limitar-se a apontar a figura da prescrição sem alegar qualquer elemento no sentido de consubstanciar uma verdadeira questão no domínio apontado, tem de entender-se que o âmbito do recurso extravasa o âmbito da decisão recorrida: ao pretender-se que o tribunal de recurso conheça da prescrição sem limitação ao âmbito possível do conhecimento da mesma questão pelo tribunal recorrido está-se a pretender integrar no objecto do recurso matéria que não fazia (nem podia fazer) parte do objecto da decisão recorrida, o que significa que não pode agora este Tribunal de recurso, por para tanto não lhe assistir poder jurisdicional, conhecer de qualquer outra questão suscitada, ainda que do conhecimento oficioso, como é o caso da prescrição (Note-se que nada impede que a recorrente suscite a questão da prescrição no âmbito do processo de execução fiscal, podendo recorrer para o Tribunal Tributário de eventual decisão que lhe indefira essa pretensão).
Daí que na improcedência das conclusões da alegação da recorrente, se impõe, nos termos acima expostos, confirmar a decisão aqui sindicada, com todas as legais consequências.
Improcede, por conseguinte, o presente recurso jurisdicional.
4. DECISÃO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal, de harmonia com os poderes conferidos pelo art. 202.º da Constituição da República Portuguesa, em negar provimento ao recurso jurisdicional interposto pela Recorrente, mantendo-se a decisão judicial recorrida.
Custas pela Recorrente.
Notifique-se. D.N..
Porto, 15 de Janeiro de 2015
Ass. Pedro Vergueiro

Ass. Vital Lopes

Ass. Ana Paula Santos