Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:02168/12.4BEPRT
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:02/15/2013
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Catarina Almeida e Sousa
Descritores:EXECUÇÃO FISCAL; GARANTIAS; PENHORA; NOMEAÇÃO DE BENS À PENHORA PELO EXECUTADO (ARTº 215º, Nº 4 DO CPPT); FORMALIDADES
Sumário:I. De acordo com a jurisprudência pacífica dos tribunais superiores, não colhe, como critério legal para a aceitação de uma garantia, o seu maior ou menor grau de liquidez, pelo que não faz qualquer sentido defender, como se refere no acto reclamado, com apelo ao artigo 74º da LGT (ónus da prova), que, no caso em apreço, o ónus recai sobre o contribuinte, no entanto, verifica-se que da petição não resulta provada a impossibilidade de constituição de garantia bancária, caução ou seguro-caução.
II. Em matéria de garantias aptas a suspender a execução, não impende sobre o executado qualquer ónus de provar que lhe é impossível prestar garantia, concretamente, através de garantia bancária, caução ou seguro-caução.
III. A penhora pode ter lugar, nos termos previstos no nº3 do artigo 194º do CPPT, no momento em que se procura efectuar a citação e são encontrados bens penhoráveis. Noutros casos, o executado pode pagar a dívida (ou deduzir oposição ou requerer a dação em pagamento, por exemplo) no prazo de 30 dias a contar da citação (artigo 203º, nº1 do CPPT), só se procedendo à penhora findo que esteja esse prazo, de acordo com o artigo 215º, nº1 do CPPT.
IV. Resulta do nº4 do citado 215º do CPPT que o direito de nomear bens à penhora compete sempre ao exequente, no caso à Fazenda Pública, devendo, contudo, ser admitida a penhora em bens indicados pelo executado, desde que daí não resulte prejuízo.
V. Tendo o executado nomeado bens à penhora, antes de decorrido o prazo de que dispunha, de 30 dias, para efectuar o pagamento da dívida exequenda, ao abrigo do disposto no artº 215º, nº 4 do CPPT, das duas uma: ou por uma qualquer razão a Administração Tributária, perante a indicação de um concreto bem, dispõe logo de elementos para não admitir a penhora do bem indicado por daí resultar prejuízo para a Fazenda ou, então, tudo se terá que processar nos termos previstos para a penhora ordenada, em primeira linha, sobre bens indicados pela Administração.
VI. Quer isto dizer que, neste contexto, quer a penhora incida sobre bens nomeados pela Fazenda, quer sobre bens indicados pelo executado, ao abrigo do artigo 215º, nº4 do CPPT, deve o órgão da Administração Tributária observar as regras aplicáveis à penhora, designadamente no que toca à sua extensão (artigo 217º do CPPT) ou às formalidades a observar quanto à penhora dos diversos tipos de bens (artigos 221º a 232º do CPPT).
VII. Assim, perante o uso da possibilidade prevista na 2ª parte, do nº4 do artigo 215º do CPPT, por parte da executada, e não tendo a Administração recusado a indicação do bem a penhorar por daí resultar prejuízo para a Fazenda, cabia ao órgão da execução fiscal, porque o bem em causa, não tem um valor predeterminado (aliás, a Reclamante admite mesmo a dificuldade na fixação do valor do equipamento em causa) formular um juízo sobre o valor do bem ou, se tal carecesse de conhecimentos especializados, recorrer ao auxílio de um perito.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:Fazenda Pública
Recorrido 1:A..., Lda.
Decisão:Negado provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os Juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:
1. Relatório
A Fazenda Pública (Recorrente), não se conformando com a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, em 19 de Novembro de 2012, que julgou procedente a reclamação que foi deduzida pela sociedade comercial A…, Lda (Recorrida) contra o despacho do Director de Finanças Adjunto da Direcção de Finanças do Porto, de 20 de Março de 2012, proferido no âmbito do processo de execução fiscal nº 3174201201003500, que indeferiu o pedido de admissão de nomeação à penhora do bem consistente numa Linha Universal OCN, combinada de tretilagem e endireitamento de barras maciças e barras redondas, quadradas e hexagonais, no valor comercial de € 400.000, com vista à garantia e suspensão do referido processo executivo, dela veio interpor o presente recurso jurisdicional, formulando as seguintes conclusões:
A. Vem o presente recurso interposto da douta sentença que julgou procedente a reclamação de actos do órgão de execução fiscal interposta, nos termos do disposto no Art.º 276º do CPPT, do despacho proferido em 20/03/2012, pelo Exmo. Sr. Director de Finanças Adjunto, substituto legal do Exmo. Sr. Director de Finanças do Porto, no âmbito do processo de execução fiscal n.º 3174201201003500 (adiante designado PEF), que corre termos no Serviço de Finanças Porto 1, e que indeferiu o pedido de admissão de nomeação de bens à penhora de uma máquina, para efeito de suspensão da execução.
B. Considera a Fazenda Pública que a sentença sob recurso padece de erro de julgamento sobre a matéria de facto quando não levou à última consequência a distribuição do ónus da prova reflectida no despacho reclamado e admitida na sentença, mas afastada pelo princípio da colaboração.
C. Para o cabal esclarecimento desta questão, reputa a Fazenda Pública de necessária a transcrição integral do segmento da informação que sustenta o despacho reclamado designado, que deverá passar a constar do ponto G dos Factos Provados e cujas partes omitidas consideramos relevantes para a ponderação das características do despacho reclamado.
D. Como resulta claro do despacho, foi o défice probatório, da responsabilidade da reclamante, que conduziu ao indeferimento do requerido, e só assim se compreende que na transcrita conclusão da informação se saliente que “não se encontra demonstrada a impossibilidade de serem constituídas garantias de maior liquidez ou preferenciais, nem sequer a idoneidade da garantia oferecida”
E. Assim, considera a Fazenda Pública que a decisão do indeferimento não se centrou na idoneidade da garantia, mas num pressuposto lógico anterior à avaliação dessa idoneidade e que a interpretação que a douta sentença faz do despacho reclamado materializa erro na sua apreciação.
F. Entende a Fazenda Pública que o apelo ao Princípio da Colaboração no presente contexto deve ser moldado às exigências dos interesses presentes no âmbito do processo de execução fiscal, não tendo a douta sentença ponderado devidamente a índole pública e indisponível da obrigação de imposto legalmente liquidado.
G. Perante um requerimento desacompanhado que qualquer meio probatório pertinente não cabe à AT reunir todos os elementos necessários à suspensão pretendida, em respeito pelas regras do ónus da prova previstas nos art. 74º da LGT e no art. 342º do Código Civil, que são criadas pelo legislador como reflexo do equilíbrio dos interesses em conflito na relação jurídica.
H. Considera-se também que a douta sentença a quo incorreu em erro de julgamento sobre a matéria de direito, atenta a interpretação sustentada do art. 199º do CPPT, uma vez que, vigora no nosso ordenamento jurídico o princípio da indisponibilidade dos créditos tributários, enunciado no n.º 2 do art. 30º da Lei Geral Tributária (LGT) e, aflorado no n.º 3 do art. 85º do CPPT.
I. Portanto, a suspensão da cobrança da prestação tributária em sede de execução fiscal depende de garantia idónea, que pode consistir em garantia bancária, caução, seguro-caução ou qualquer meio susceptível de assegurar os créditos da Fazenda Pública (art. 52º, n.ºs 1 e 2 LGT e art.s 169º, n.º 1 e 199º do CPPT).
J. O conceito de garantia idónea depende de concreta avaliação pelo órgão de execução com respeito pelos princípios da vinculação à lei, na actividade administrativa tributária, da indisponibilidade dos créditos fiscais e da proibição da concessão de moratórias no seu pagamento, assumindo que a suspensão tem um carácter verdadeiramente excepcional, por ser proibida nos casos não previstos da lei (cfr. art. 36º, n.º 3 da LGT).
K. A lei aponta preferencialmente para certos tipos de garantia, atento o seu maior grau de liquidez, autonomia e certeza inerente ao seu recebimento, cuja hierarquização se encontra reflectida na ponderação concretizada no despacho reclamado, em respeito pelo disposto no Art.º 199º do CPPT.
L. No caso da garantia bancária e do seguro-caução, existem entidades de supervisão que controlam a actividade de emissão de garantias, exigindo a constituição de reservas, fundos de garantia ou fundos autónomos, que operam como contra-garantias.
M. Assim, a AT está vinculada a aceitar a garantia bancária, a caução e o seguro-caução, desde que suficientes, e a contrario não existe fundamento legal para sustentar que está obrigada à aceitação de qualquer outra garantia, muito menos as de maior vulnerabilidade, como é o caso desta penhora.
N. Até porque, como resulta do despacho reclamado, foi da iniciativa da reclamante a nomeação de um bem móvel à penhora, requerimento esse que não foi acompanhado de qualquer meio de prova capaz de sustentar a sua pretensão, designadamente, da necessária prova documental daquela impossibilidade de prestação, bem como da idoneidade da garantia a oferecer, bem sabendo a reclamante que impendia sobre si esse ónus de prova, plasmado no art. 342º do Código Civil (CC) e, no art.º 74º da LGT.
O. E, nos termos do disposto no art. 215º do CPPT, cabendo à AT aquilatar da idoneidade da garantia, cabia à reclamante fornecer os elementos que permitissem formular a conclusão exigida no n.º 4 daquele normativo, no que respeita à ausência de prejuízo para o credor tributário, nomeadamente demonstrando que sobre o bem não impediam ónus.
P. Acresce que, segundo o teor do pedido efectuado, sobre que incidiu o despacho aqui em discussão, a reclamante acolheu para si a ordem de preferência das garantias a prestar do art. 199º do CPPT, tal como a AT a entende, o que enfraquece de forma manifesta a sua pretensão.
Q. Entende, pois a Fazenda Pública, com a ressalva do devido respeito, que a douta sentença sob recurso enferma de erro de julgamento sobre a matéria de facto e de direito, porquanto fez errónea interpretação e aplicação do disposto nas normas legais aplicáveis in casu, mais concretamente as que regem o ónus da prova, designadamente o art. 74º da LGT e no art. 342º do Código Civil, e a prestação da garantia para efeitos de suspensão do PEF, mais concretamente os arts. 52º da LGT e 199º do CPPT.
Termos em que, deve ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se a douta decisão recorrida, por verificação de erro de julgamento sobre a matéria de facto e de direito.
*
A Recorrida apresentou contra-alegações, defendendo, em síntese, que “não merece pois qualquer censura a sentença recorrida, pelo que, na esteira do entendimento sancionado na primeira instância, até corroborada por doutas decisões proferidas pelo Supremo Tribunal Administrativo, deve ser a mesma decisão proferida pela Administração Tributária anulada, mantendo-se pois consonantemente a decisão proferida”.
*
Neste Tribunal, a Exma. Magistrada do Ministério Público emitiu parecer, defendendo que deve ser negado provimento ao recurso, mantendo-se a sentença recorrida.
*
Com dispensa dos vistos legais, atenta a natureza urgente do processo, cumpre agora apreciar e decidir já que a tal nada obsta.
Questões a decidir:
Conforme entendimento pacífico dos Tribunais Superiores, são as conclusões extraídas pelo recorrente, a partir da respectiva motivação, que operam a fixação e delimitação do objecto dos recursos que àqueles são submetidos, sem prejuízo da tomada de posição sobre todas e quaisquer questões que, face à lei, sejam de conhecimento oficioso e de que ainda seja possível conhecer.
Assim sendo, as questões que constituem objecto do presente recurso, são as seguintes:
(i) – Saber se a sentença recorrida errou no julgamento de facto por não ter feito constar da alínea G dos factos provados o teor integral do despacho reclamado, concretamente por as partes omitidas se afigurarem relevantes para a ponderação das características do despacho reclamado;
(ii) – Saber se a sentença recorrida errou no julgamento de direito ao considerar que o despacho reclamado, que indeferiu o pedido de admissão de nomeação à penhora do bem consistente numa Linha Universal OCN, combinada de tretilagem e endireitamento de barras maciças e barras redondas, quadradas e hexagonais, com vista à garantia e suspensão do referido processo executivo nº 3174201201003500, formulado pela Executada, padece do vício de violação de lei por infracção dos artigos 74º da L.G.T e 342º do C.C - errando na aplicação das regras do ónus da prova - do artigo 199º do C.P.P.T e dos artigo 52º e 59º da LGT.
2. Fundamentação
2.1. De facto
2.1.1. Matéria de facto dada como provada na 1ª instância
A) Em 10/01/2012 foi autuado pelo Serviço de Finanças do Porto – 1 o processo de execução fiscal n.º 3174201201003500, contra a sociedade comercial “A…, Lda.”, NIPC 5…, para cobrança coerciva de dívidas provenientes de IRC relativas a 2004, no montante global de 135.255,69 € - cfr. fls. 53/56 dos autos.
B) A dívida em cobrança no processo de execução fiscal identificado na alínea A) corresponde à liquidação n.º 2011 831 0027276, de 04/11/2011.
C) A ora reclamante apresentou contra o acto de liquidação a que se alude em B) reclamação graciosa autuada com o n.º 3174201204000277, e impugnação judicial autuada com o n.º 3174201203000150 – cfr. Informação de fls 258 dos autos.
D) E deduziu oposição ao processo de execução fiscal referida em A), a qual foi autuada com o n.º 3174200 1204000277 – idem.
E) Em 26/01/2012 a ora reclamante apresentou no Serviço de Finanças do Porto – 1 um requerimento, através do qual pediu a admissão de nomeação de bens à penhora de “uma linha Universal OCN, combinada de tretilagem e endireitamento de barras maciças e barras redondas, quadradas e hexagonais, no valor comercial de € 400 000” – cfr fls 262/263 dos autos.
F) O bem oferecido em garantia a que se alude na alínea E) consta da factura n.º 52/95, emitida pela sociedade O.C.N. SPA, no montante total de 1.260.750 Liras – cfr. fls 33 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
G) Acerca do requerimento referido na alínea que antecede foi emitido parecer cujo teor ora se transcreve:
“1. A competência para a apreciação da garantia impende sobre o Director de Finanças do Porto em virtude do seu valor ser superior a 500 unidades de conta;
2. Através do ofício-circulado n.º 60.076 de 2010.07.29 foram divulgadas instruções aos Serviços com vista a harmonizar os procedimentos e práticas dos Serviços da DGCI à face da lei vigente em matéria de prestação de garantias em execução fiscal”,
3. Na esteira do referido ofício os Serviços deverão dar “preferência à constituição de garantia bancária, caução ou seguro-caução. Concretizando a razão da preferência é referido que “O artigo 199.º do CPPT, no seu n.º 1, revela preferência pela constituição destes tipos de garantia e da hipoteca, distinguindo-as positivamente das que constam do n.º 2 do mesmo artigo, ou seja, do penhor e da hipoteca voluntária, e tal deve-se ao facto de estas últimas garantias incidirem sobre bens cujo valor pecuniário é de mais incerta ou indirecta realização ou execução”.
5. Dispondo-se, assim, uma ordem de preferência na constituição de garantias que começa pela garantia bancária, caução ou seguro-caução e, “quando não seja possível a constituição das garantias referidas no n.º 1 do artigo 199.º do CPPT, deve dar-se preferência à constituição de garantias sobre bens imóveis, sob a forma de hipoteca voluntária”.
6. Dispondo-se ainda nas referidas instruções que:
a. “Apenas em caso de absoluta impossibilidade de constituição de garantias bancária, caução, seguro-caução ou, secundariamente, de hipoteca, é que se deverá admitir a constituição de garantia sobre bens móveis, como seja o caso do penhor”
b. A penhora de bens apenas servirá de garantia nos casos referidos no n.º 4 do artigo 199.º do CPPT, cujo plano prestacional não decorra de situações de insolvência ou procedimento extrajudicial de conciliação (PEC), e nos casos de suspensão do processo de execução de acordo com o que se dispõe no artigo 169.º do CPPT”.
7. Nos termos previstos no n.º 1 do artigo 74.º da LGT, “o ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos da administração tributária ou dos contribuintes recai sobre quem os invoque.” No caso em apreço, o ónus recai sobre o contribuinte, no entanto, verifica-se que da petição não resulta provada a impossibilidade de constituição de garantia bancária, caução ou seguro-caução;
8. Afigurando-se, assim, em obediência aos princípios plasmados no referido ofício que não poderá ser aceite a garantia oferecida porquanto não pertence ao elenco das garantias prioritariamente aceites;
CONCLUSÃO
Em face do exposto, não se encontra demonstrada a impossibilidade de serem constituídas garantias de maior liquidez ou preferenciais, nem sequer a idoneidade da garantia oferecida porquanto nada demonstra que o valor atribuído pela executada corresponda ao seu real valor) afigura-se não ser de dar provimento ao requerido e, consequentemente, dever prosseguir a execução com vista à constituição de garantias do cumprimento da obrigação tributária” – cfr. fls 258/259 dos autos.
H) Sobre o parecer a que se alude na alínea G) recaiu despacho de concordância proferido pelo Senhor Sub-Director de Finanças do Porto, em substituição legal do Director, datado de 20/03/2012 – cfr. fls 257 dos autos.
I) Em 13/04/2012 foi expedido o ofício n.º 2654, por carta registada com aviso de recepção, assinado em 16/04/2004, dando conhecimento à ora reclamante do despacho mencionado na alínea H) – cfr fls 268 dos autos.
J) Com data de 04/03/2008, o Serviço de Finanças do Porto – 1 remeteu à ora reclamante o ofício n.º 2408, do qual consta, entre o mais, o seguinte:
“(…)
Assunto: NOTIFICAÇÃO DE PENHORA DE IMÓVEIS
PROCESSOS DE EXECUÇÃO FISCAL N.º 3174201201003283, 3174201201003470 e apensos
EXECUTADO: A…, NIPC 5…
Fica V. Ex.ª /essa entidade, por este meio NOTIFICADA, das penhoras de imóveis, efectuadas por este Serviço de Finanças, em 02/04/2012, no âmbito da execução fiscal em referência que aqui corre seus termos, conforme fotocópias autenticadas dos autos de penhora que se anexam, e cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido (…)” – cfr fls 38/46 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
K) A presente reclamação foi apresentada no Serviço de Finanças do Porto – 1, em 26/04/2012 – cfr. carimbo aposto a fls 8 dos autos.
Factos não provados
Para além dos supra referidos, não foram provados outros factos com relevância para a decisão da causa.
Motivação da matéria de facto
A convicção do Tribunal relativamente à matéria de facto provada resultou do exame crítico dos documentos e Informações constantes dos autos, os quais não foram impugnados e aqui se dão por integralmente reproduzidos para todos os devidos efeitos legais”.
*
Ao abrigo do disposto no artigo 712º do CPC, dada a sua relevância para a decisão da causa, adita-se a seguinte matéria de facto, que também resulta provada documentalmente:
L) De acordo com o print junto pelo Serviço de Finanças do Porto 1 relativo à Tramitação do processo nº 3174201201003500 a citação pessoal da executada data de 17/01/12 – cfr. fls. 56 dos autos.
M) No requerimento a que alude o ponto E) dos factos provados, intitulado pela Requerente “Nomeação de bens à penhora”, o requerente submeteu à consideração do Chefe do Serviço de Finanças a aceitação da penhora sobre o bem móvel indicado, aí referindo que o fazia ao abrigo do artigo 215º, nº4 do CPPT – cfr. fls. 32, frente e verso dos autos.
N) Ao requerimento a que alude a alínea E) não foi junto qualquer documento ou requerida qualquer diligência de prova.

2.2. De direito

A primeira questão aqui suscitada prende-se com o erro no julgamento da matéria de facto.
Entende a Recorrente, nos termos que ficaram apontados, que o Tribunal a quo, no ponto G dos factos provados, no qual transcreveu parcialmente o teor do acto reclamado (mais precisamente da informação que lhe está subjacente), devia ter aí feito incluir o seu teor integral, pois que as partes omitidas são consideradas pela Recorrente relevantes para a ponderação das características do despacho reclamado.
Em concreto, pretende a Recorrente que se faça incluir naquele ponto G o segmento do despacho reclamado que se reporta aos factos, pois que é a partir daí que, do seu ponto de vista, se extraem relevantes consequências jurídicas na análise da decisão sindicada, mormente no que respeita à correcta apreensão das razões que determinaram o indeferimento do pedido formulado, em especial no que foi entendido (pelo despacho reclamado) como um défice probatório da responsabilidade da executada/ Reclamante.
No caso, os aludidos factos referem:
“Da consulta ao sistema informático, do processo de execução fiscal em epígrafe e dos documentos juntos resulta a seguinte factualidade:
1. Foi instaurado o processo executivo 3174201201003500 contra a executada supra identificada e para cobrança de € 135.255,69 e acrescido relativo a IRC/2004;
2. Contra a liquidação que esteve na origem desta execução fiscal, a executada apresentou a reclamação graciosa no 3174201204000277 e ainda a impugnação judicial no 3174201203000150;
3. Contra a execução fiscal em apreço, a executada deduziu a oposição judicial n° 3174201209000038;
4. Por requerimento registado sob a entrada n° 31742012E001444 de 2012.01.26, veio a executada, tendo por objectivo a suspensão da execução, nomear à penhora para constituição de garantia “Uma linha Universal OCN, combinada de tretilagem e endireitamento de barras maciças e barras redondas, quadradas e hexagonais, no valor comercial de € 400 000”. Não junta qualquer documento, factura ou outro, que permita aferir da correcta atribuição de valor aos bens oferecidos;
5. A requerente alegou manifesta impossibilidade de constituição de garantia bancária, caução ou seguro-caução, mas nunca juntou qualquer documento que comprove o alegado”.
Vejamos, então, adiantando-se, desde já, que entendemos que a Recorrente tem razão quanto a este aspecto.
O teor da alínea G dos factos provados, tal como consta supra, dá-nos conta do teor parcial da informação elaborada pela Direcção de Finanças do Porto, sobre a qual recaiu o despacho de concordância do autor da decisão de indeferimento objecto de reclamação apresentada ao abrigo do artigo 276º do CPPT. Em concreto, a referida alínea G reporta-se a parte da mencionada informação, concretamente ao seu segmento denominado parecer.
Porém, esse parecer é antecedido pelo elenco dos factos que constam da mesma informação, factos esses que, como facilmente se percebe da leitura de toda a informação, foram determinantes do sentido da decisão de indeferimento.
Portanto, independentemente daquilo que a final se vier a julgar, quanto à validade ou invalidade do acto reclamado, há que aceitar as razões da Recorrente no sentido de que a matéria de facto deve ser aditada nos termos propostos, pois que, em tese, dela se podem extrair, e a Recorrente assim faz, relevantes efeitos jurídicos.
Assim, modificando o ponto G dos factos provados, passa a sua redacção a ser a seguinte:
G) Sobre o requerimento referido na alínea que antecede foi emitida, pela Direcção de Finanças do Porto, a informação cujo teor integral se transcreve (cfr. fls. 257 a 259 dos autos):
OS FACTOS
Da consulta ao sistema informático, do processo de execução fiscal em epígrafe e dos documentos juntos resulta a seguinte factualidade:
1. Foi instaurado o processo executivo 3174201201003500 contra a executada supra identificada e para cobrança de € 135.255,69 e acrescido relativo a IRC/2004;
2. Contra a liquidação que esteve na origem desta execução fiscal, a executada apresentou a reclamação graciosa no 3174201204000277 e ainda a impugnação judicial no 3174201203000150;
3. Contra a execução fiscal em apreço, a executada deduziu a oposição judicial n° 3174201209000038;
4. Por requerimento registado sob a entrada n° 31742012E001444 de 2012.01.26, veio a executada, tendo por objectivo a suspensão da execução, nomear à penhora para constituição de garantia “Uma linha Universal OCN, combinada de tretilagem e endireitamento de barras maciças e barras redondas, quadradas e hexagonais, no valor comercial de € 400 000”. Não junta qualquer documento, factura ou outro, que permita aferir da correcta atribuição de valor aos bens oferecidos;
5. A requerente alegou manifesta impossibilidade de constituição de garantia bancária, caução ou seguro-caução, mas nunca juntou qualquer documento que comprove o alegado.
PARECER
1. A competência para a apreciação da garantia impende sobre o Director de Finanças do Porto em virtude do seu valor ser superior a 500 unidades de conta;
2. Através do ofício-circulado n.º 60.076 de 2010.07.29 foram divulgadas instruções aos Serviços com vista a harmonizar os procedimentos e práticas dos Serviços da DGCI à face da lei vigente em matéria de prestação de garantias em execução fiscal”,
3. Na esteira do referido ofício os Serviços deverão dar “preferência à constituição de garantia bancária, caução ou seguro-caução. Concretizando a razão da preferência é referido que “O artigo 199.º do CPPT, no seu n.º 1, revela preferência pela constituição destes tipos de garantia e da hipoteca, distinguindo-as positivamente das que constam do n.º 2 do mesmo artigo, ou seja, do penhor e da hipoteca voluntária, e tal deve-se ao facto de estas últimas garantias incidirem sobre bens cujo valor pecuniário é de mais incerta ou indirecta realização ou execução”.
5. Dispondo-se, assim, uma ordem de preferência na constituição de garantias que começa pela garantia bancária, caução ou seguro-caução e, “quando não seja possível a constituição das garantias referidas no n.º 1 do artigo 199.º do CPPT, deve dar-se preferência à constituição de garantias sobre bens imóveis, sob a forma de hipoteca voluntária”.
6. Dispondo-se ainda nas referidas instruções que:
a. “Apenas em caso de absoluta impossibilidade de constituição de garantias bancária, caução, seguro-caução ou, secundariamente, de hipoteca, é que se deverá admitir a constituição de garantia sobre bens móveis, como seja o caso do penhor”
b. A penhora de bens apenas servirá de garantia nos casos referidos no n.º 4 do artigo 199.º do CPPT, cujo plano prestacional não decorra de situações de insolvência ou procedimento extrajudicial de conciliação (PEC), e nos casos de suspensão do processo de execução de acordo com o que se dispõe no artigo 169.º do CPPT”.
7. Nos termos previstos no n.º 1 do artigo 74.º da LGT, “o ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos da administração tributária ou dos contribuintes recai sobre quem os invoque.” No caso em apreço, o ónus recai sobre o contribuinte, no entanto, verifica-se que da petição não resulta provada a impossibilidade de constituição de garantia bancária, caução ou seguro-caução;
8. Afigurando-se, assim, em obediência aos princípios plasmados no referido ofício que não poderá ser aceite a garantia oferecida porquanto não pertence ao elenco das garantias prioritariamente aceites;
CONCLUSÃO
Em face do exposto, não se encontra demonstrada a impossibilidade de serem constituídas garantias de maior liquidez ou preferenciais, nem sequer a idoneidade da garantia oferecida porquanto nada demonstra que o valor atribuído pela executada corresponda ao seu real valor) afigura-se não ser de dar provimento ao requerido e, consequentemente, dever prosseguir a execução com vista à constituição de garantias do cumprimento da obrigação tributária” – cfr. fls 258/259 dos autos.
Procede, pois, esta primeira questão colocada.
Vista que está esta primeira questão, passemos ao que se segue: saber se a sentença recorrida errou no julgamento de direito ao considerar que o despacho reclamado, que indeferiu o pedido de admissão de nomeação à penhora do bem consistente numa Linha Universal OCN, combinada de tretilagem e endireitamento de barras maciças e barras redondas, quadradas e hexagonais, com vista à garantia e suspensão do referido processo executivo nº 3174201201003500, formulado pela Executada, padece do vício de violação de lei, por infracção dos artigos 74º da L.G.T e 342º do C.C, errando na aplicação das regras do ónus da prova, do artigo 199º do C.P.P.T e dos artigos 52º e 59º da LGT.
Analisando o teor integral do despacho reclamado é bem patente que a Administração Tributária indeferiu a requerida nomeação de um determinado bem móvel à penhora, formulada ao abrigo do artigo 215º, nº4 do CPPT, por duas ordens de razões:
- por um lado (naquilo que parece ter sido a razão, se não primacial, pelo menos mais desenvolvida no despacho recorrido) por, nos termos do Ofício-Circulado nº 60.076, de 29/07/2010, cumprir à Administração dar preferência às garantias elencadas no nº1 do artigo 199º do CPPT, atenta a maior liquidez das mesmas (garantia bancária, caução ou seguro-caução), sendo que, no caso, a Requerente não demonstrou a impossibilidade de serem constituídas as apontadas garantias preferenciais;
- por outro lado, porque não se provou a idoneidade da garantia oferecida, pois que a Requerente não demonstrou que o valor por si atribuído ao bem indicado (de € 400.000) correspondia ao seu real valor, já que não juntou qualquer documento, factura ou outro, que permita aferir da correcta atribuição de valor ao bem oferecido.
Ora, como se percebe facilmente, a qualquer das razões apontadas para justificar a não aceitação do bem nomeado à penhora pela Executada, ora Recorrida, está subjacente a questão do ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos invocados. Com efeito, defende a Administração, competia à executada provar, nos termos previstos no artigo 74º da LGT, a impossibilidade de constituição de garantia bancária, caução ou seguro-caução, da mesma forma que lhe competia provar que o valor atribuído ao bem indicado correspondia ao seu valor real.
Vejamos, por partes, começando pela reiterada invocação da interpretação do artigo 199º, nº1 do CPPT, à luz Ofício-Circulado nº 60.076, de 29/07/2010.
Quanto a este aspecto, adiante-se, pouco ou nada cabe acrescentar à sentença recorrida, a qual, de resto, seguiu de perto jurisprudência unânime dos Tribunais Superiores no respeitante a esta matéria.
Diz-se na sentença recorrida, e bem, que:
“(…) O órgão de execução fiscal, louvando-se no ofício circulado n.º 60.076 de 29/07/2010, donde decorre que “(…) o artigo 199.º do CPPT, no seu n.º 1 revela preferência pela constituição destes tipos de garantia, distinguindo-as positivamente das que constam do n.º 2 do mesmo artigo, ou seja, do penhor e da hipoteca voluntária, e tal deve-se ao facto de estas últimas garantias incidirem sobre bens cujo valor pecuniário é de mais incerta ou indirecta realização ou execução”, e que “quando não seja possível a constituição das garantias referidas no n.º 1 do artigo 199.º do CPPT, deve dar-se preferência à constituição de garantias sobre bens imóveis, sob a forma de hipoteca voluntária”, concluiu que “em obediência aos princípios plasmados no referido ofício, não poderá ser aceite a garantia oferecida porquanto não pertence ao elenco das garantias prioritariamente aceites”.
Assim, considerando não ter sido demonstrada a impossibilidade de serem constituídas garantias de maior liquidez ou preferenciais, nem sequer a idoneidade da garantia oferecida (porquanto nada demonstra que o valor atribuído pela executada corresponda ao seu real valor), indeferiu, sem mais, o pedido de prestação de garantia formulado pela reclamante.
Ora, há que convir que a interpretação que a Administração Tributária faz do citado preceito legal não tem qualquer apoio ou suporte na letra da lei.
É certo que a interpretação não deve cingir-se à letra da lei, no entanto, esta constitui sempre o ponto de partida, cabendo-lhe desde logo, como assinala Baptista Machado, “uma função negativa: eliminar aqueles sentidos que não tenham qualquer apoio, ou pelo menos, qualquer correspondência ou ressonância nas palavras da lei.” (in Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, 1999, 11.ª Reimpressão, pág. 182 e ss), sendo certo que “na fixação do sentido e alcance da lei, o intérprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados” (cfr. artigo 9.º do C.C.).
Com efeito, considerando que o mencionado preceito contém uma tipificação expressa (garantia bancária, caução e seguro-caução), seguida de um conceito aberto (“ou qualquer meio susceptível de assegurar os créditos do exequente”), podemos concluir que a enunciação de garantias aí previstas é meramente exemplificativa.
Assim, contrariamente ao entendimento que vem sendo sufragado pela Administração Tributária, não foi intenção do legislador restringir as formas de prestação de garantias às que aí se encontram expressamente previstas. Ao invés, a expressão contida na parte final do preceito “ou qualquer meio susceptível de assegurar os créditos do exequente”, autoriza-nos a concluir que o legislador pretendeu abranger qualquer garantia que se revele suficiente para assegurar o crédito tributário.
Não vislumbramos, pois, qualquer hierarquia entre as garantias previstas no n.º 1 e no n.º 2, nem entre estas e as que não têm consagração expressa, com o intuito de dar preferência às garantias cuja realização ou execução seja feita de forma certa, directa e imediata.
Na verdade, se o legislador pretendesse consagrar uma ordem de preferência relativamente às garantias, à semelhança do regime previsto para a penhora no artigo 219.º do CPPT tê-lo-ia feito de forma expressa. Se não o fez, não pode a Administração Tributária pretender fazê-lo através de simples ofício-circulado.
Entendemos, pois, que o legislador não pretendeu conceder à Administração Tributária um poder de escolha quanto às formas que as garantias podem revestir, pelo que o órgão de execução fiscal não dispõe de um poder discricionário para aceitar ou não determinada garantia idónea.
(…)
Assim, o legislador não confere ao órgão de execução fiscal um poder de escolha, porquanto associa uma única consequência jurídica à situação jurídica por si definida: a prestação de garantia idónea, ou seja, suficiente para assegurar o crédito tributário e acrescido, determina a suspensão do processo de execução fiscal.
Tem sido este, aliás, o entendimento sufragado pela jurisprudência do STA de forma pacífica e reiterada (vide, entre tantos outros, os acórdãos de 14/03/2012, 15/02/2012, 21/09/2011 e de 07/11/2011, proferidos nos processos n.ºs 0208/12, 0126/12, 0786/11 e 1006/11, respectivamente.
No citado aresto de 14/03/2012, acerca da idoneidade da garantia prestada através de fiança, refere-se o seguinte: “O legislador, na definição da idoneidade legalmente necessária da garantia a prestar para efeito da suspensão do processo executivo, apenas exigiu que a mesma fosse suficiente para assegurar o pagamento dos créditos em cobrança e do acrescido.
Assim, e pese embora uma inegável margem de discricionariedade que assiste à AT nesta matéria, a verdade é que não podem relevar-se como fundamentos válidos os atinentes ao grau de liquidez da garantia.
Como ficou dito no referido acórdão desta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de 15 de fevereiro passado, «[n]a execução fiscal confluem dois interesses conflituantes: o da administração fiscal na realização da cobrança célere dos seus créditos e o direito do executado em discutir a legalidade da dívida exequenda. Dando prevalência ao primeiro, a lei faz depender a suspensão da execução da prestação de garantia idónea, que cubra a totalidade da dívida exequenda. O que significa que a garantia há de ser adequada a satisfazer o interesse da exequente, mas sem onerar ou afetar de forma grave os interesses legítimos do executado. Uma garantia bancária ou um seguro-caução oferecem à exequente maior liquidez imediata do que uma hipoteca ou um penhor de coisas, mas, por outro lado, trata-se de garantias que são mais onerosas para o executado, dado que quer a hipoteca quer o penhor não envolvem encargos com repercussões imediatas na esfera patrimonial do requerente.
Assim se compreende que legislador tenha consagrado no art. 199º do CPPT um conceito amplo de garantia idónea, com vista a acautelar a maior ou menor dificuldade para o executado em conseguir, sem onerar excessivamente a sua situação, apresentar garantia adequada a suspender a execução. E, no mesmo sentido, se deve entender o facto de não se estabelecer nenhuma preferência ou qualquer graduação das garantias, em conformidade com a sua maior ou menor eficácia resultante da maior ou menor liquidez imediata.
Em conformidade com a melhor doutrina, diz-se que na lei processual fiscal vigora como que “um princípio geral da equivalência da caução, penhora e outras garantias idóneas, como a hipoteca (uma vez que, na presença de qualquer uma delas, a execução se suspende até decisão da oposição deduzida), devendo ser aceite pelo órgão exequente aquela que, sem prejuízo do credor, melhor sirva os interesses do executado” (Neste sentido, cfr. RUI DUARTE MORAIS, A Execução Fiscal, 2ª ed., Almedina, Coimbra, 2006, p.78.) (…)”
Portanto e em suma, como tem sido jurisprudência pacífica, não colhe, como critério legal para a aceitação de uma garantia o seu maior ou menor grau de liquidez, pelo que não faz qualquer sentido defender, como se refere no acto reclamado, com apelo ao artigo 74º da LGT (Ónus da prova), que no caso em apreço, o ónus recai sobre o contribuinte, no entanto, verifica-se que da petição não resulta provada a impossibilidade de constituição de garantia bancária, caução ou seguro-caução.
Com efeito, e se bem vemos a questão, em matéria de garantias aptas a suspender a execução, não impende sobre o executado qualquer ónus de provar que lhe é impossível prestar garantia, concretamente, através de garantia bancária, caução ou seguro-caução.
Contudo, no caso em apreço, a questão essencial, como decorre de todo o circunstancialismo que está na origem quer do requerimento inicial, quer do despacho que se lhe seguiu, não se prende tanto com a interpretação do artigo 199º do CPPT mas, sim, com o artigo 215º, nº4 do CPPT e com a prova do valor do bem que o executado indicou com vista à penhora.
Expliquemo-nos de forma mais detalhada.
Inserido no Capítulo II – Do processo - Secção VII – Da apreensão de bens – Subsecção II – Da penhora, encontramos o artigo 215º do CPPT, nos termos do qual se dispõe que:

Penhora, ocorrências anómalas, nomeação de bens à penhora
1 - Findo o prazo posterior à citação sem ter sido efectuado o pagamento, procede-se à penhora.
2 - A penhora pode ser efectuada por via electrónica.
3 - Se, no acto da penhora, o executado ou alguém em seu nome declarar que os bens a penhorar pertencem a terceiros, deve o funcionário exigir-lhes a declaração do título por que os bens se acham em poder do executado e a respectiva prova, efectuando-se a penhora em caso de dúvida.
4 - O direito de nomear bens à penhora considera-se sempre devolvido ao exequente, mas o órgão da execução fiscal poderá admiti-la, nos termos da lei, nos bens indicados pelo executado, desde que daí não resulte prejuízo (os sublinhados são nossos).
Foi com expressa invocação deste dispositivo legal que o executado apresentou o requerimento que deu origem ao acto reclamado e relativamente ao qual foi apresentada a reclamação ao abrigo do artigo 276º do CPPT.
Como se sabe, a penhora pode ter lugar, nos termos previstos no nº3 do artigo 194º do CPPT, no momento em que se procura efectuar a citação e são encontrados bens penhoráveis. Noutros casos, o executado pode pagar a dívida (ou deduzir oposição ou requerer a dação em pagamento, por exemplo) no prazo de 30 dias a contar da citação (artigo 203º, nº1 do CPPT), só se procedendo à penhora findo que esteja esse prazo, de acordo com o artigo 215º, nº1 do CPPT.
Resulta do nº4 do citado 215º do CPPT que o direito de nomear bens à penhora compete sempre ao exequente, no caso à Fazenda Pública, devendo, contudo, ser admitida a penhora em bens indicados pelo executado, desde que daí não resulte prejuízo. Isto é assim, sem prejuízo, naturalmente, das regras sobre a prioridade a considerar na ordem dos bens a penhorar ou no que respeita às limitações absolutas e relativas à penhora de bens.
Temos, assim, que, nesta fase, no termo dos 30 dias para o pagamento da dívida (a contar da citação), sem que o mesmo seja efectuado, a exequente pode e deve proceder à penhora de bens com vista à garantia da dívida exequenda. E aqui, os bens a penhorar podem ser os nomeados pela Administração Tributária ou, como vimos, também pode ocorrer que a penhora incida sobre bens indicados pelo executado, dependendo a admissibilidade de tal hipótese de daí não resultar prejuízo (para a Fazenda ou para o processo, subentende-se).
Foi, pois, desta possibilidade que a executada lançou mão - indicar um bem à penhora antes da exequente exercer o seu direito de nomear bens à penhora. E fê-lo, conforme se retira da factualidade assente, antes de decorrido o prazo de que dispunha, de 30 dias, para efectuar o pagamento da dívida exequenda. De resto, no caso, a execução fiscal foi instaurada em 10/01/12 e o aludido requerimento foi apresentado em 26/01/12, portanto quando nem 30 dias haviam decorrido da data da autuação do processo executivo (sendo que a citação só teve lugar em 17/01/12).
E, assim sendo, das duas uma: ou por uma qualquer razão a Administração Tributária, perante a indicação de um concreto bem, dispõe logo de elementos para não admitir a penhora do bem indicado por daí resultar prejuízo para a Fazenda ou, então, tudo se terá que processar nos termos previstos para a penhora ordenada, em primeira linha, sobre bens indicados pela Administração.
Quer isto dizer que, neste contexto, quer a penhora incida sobre bens nomeados pela Fazenda, quer sobre bens indicados pelo executado, ao abrigo do artigo 215º, nº4 do CPPT, deve o órgão da Administração Tributária observar as regras aplicáveis à penhora, designadamente no que toca à sua extensão (artigo 217º do CPPT) ou às formalidades a observar quanto à penhora dos diversos tipos de bens (artigos 221º a 232º do CPPT).
E assim sendo, como entendemos que é, “o juízo sobre a suficiência dos bens, nos casos de eles não terem uma valor predeterminado, é formulado pelo funcionário que procede à penhora, podendo em casos de complexa avaliação, ser nomeado um perito, sem prejuízo da realização da imediata diligência. Este juízo sobre a suficiência dos bens é reportado à data da penhora”vide, Jorge Lopes de Sousa, in CPPT, anotado e comentado, III Volume, Áreas Editora, pág. 589, em anotação ao artigo 217º.
No mesmo sentido nos encaminha o disposto no artigo 221º do CPPT, relativo à formalidade de penhora de móveis, nos termos do qual se dispõe, além o mais, que:
Na penhora de móveis observar-se-á designadamente o seguinte:
a) (…)
b) O depositário é escolhido pelo funcionário, podendo a escolha recair no executado;
c) Na penhora lavrar-se-á um auto que será lido em voz alta e assinado pelo depositário ou por duas testemunhas, onde se registe o dia, hora e local da diligência, se mencione o valor da execução, se relacionem os bens por verbas numeradas, se indique o seu estado de conservação e valor aproximado e se refiram as obrigações e responsabilidades a que fica sujeito o depositário a quem será entregue uma cópia;
d) (…)
Portanto, também aqui temos presente a questão atrás referida da avaliação do bem, ou pelo menos de um juízo sobre os valores dos bens, quando ele não tiver um valor predeterminado – cfr. neste sentido, Jorge Lopes de Sousa, na obra citada, pág. 609, reiterando a ideia avançada anteriormente de que “em casos em que a avaliação dependa de conhecimentos especializados o funcionário poderá recorrer à ajuda de um perito (art. 849º, nº2 do CPC)”
Recuperando o caso concreto, e com vista a encaminhar o raciocínio até ao final, temos que, perante o uso da possibilidade prevista na 2ª parte, do nº4 do artigo 215º do CPPT, por parte da executada, e não tendo a Administração recusado a indicação do bem a penhorar por daí resultar prejuízo para a Fazenda, cabia ao órgão da execução fiscal, porque o bem em causa, não tem uma valor predeterminado (aliás, a Reclamante admite mesmo a dificuldade na fixação do valor do equipamento em causa – cfr. ponto 11 da p.i de reclamação) formular um juízo sobre o valor do bem ou, se tal carecesse de conhecimentos especializados, recorrer ao auxilio de um perito.
Ora, vimos já que, para além da invocação do artigo 199, nº1 do CPPT (leia-se, do “critério” da preferência pela liquidez), a Administração Tributária indeferiu a pretensão da executada por entender, o que a Recorrente aqui reitera, que a executada, ao contrário daquilo que lhe competia, não provou o valor do bem tal como o indicou, de € 400.000, pois que, como aponta o despacho, não junta qualquer documento, factura ou outro, que permita aferir da correcta atribuição de valor aos bens oferecidos. É, pois, patente que não esteve aqui subjacente qualquer ideia de prejuízo para a Fazenda (215º, nº4 do CPPT) mas antes o alegado não cumprimento do ónus da prova quanto ao valor do bem sobre o qual a executada pretendia que incidisse a penhora.
Pelas razões que expusemos, o juízo sobre o valor do bem podia e devia ser levado a cabo pela Administração, inclusivamente através do recurso a um perito. Portanto, também aqui, em nossa opinião, não se coloca qualquer questão quanto ao invocado ónus da prova que alegadamente impendia sobre a executada, no que concerne ao valor do bem.
E aqui, neste concreto ponto, nos afastamos daquele que foi, em parte, o entendimento da Mma. Juíza revelado na sentença recorrida.
Com efeito, na sentença recorrida refere-se, a dado passo, que “pese embora o ónus de demonstrar a suficiência da garantia oferecida para acautelar o crédito exequendo e acrescido recaia sobre a executada, isso não desonera a Administração Tributária de, antes de indeferir a garantia com esse fundamento, encetar as diligências necessárias, nomeadamente solicitando à reclamante os elementos relevantes para apurar o valor real e actual do bem oferecido em garantia.
Assim o impunha, desde logo, o princípio da colaboração inscrito no artigo 59.º da LGT, que estabelece que o dever de colaboração da administração tributária com os contribuintes compreende, entre outras obrigações, “a notificação do sujeito passivo ou demais interessados para esclarecimentos das dúvidas sobre as suas declarações ou documentos” (cfr. alínea d) do n.º 3 do preceito).
É que, na análise que vimos fazendo, não há aqui que chamar à colação o princípio da colaboração, a que alude a Mma. Juíza. A emissão de um juízo sobre a avaliação do bem impunha-se à Administração (por si ou com recurso à ajuda de perito), por essas serem as regras atinentes à penhora de bens móveis, nos termos supra explicados.
Em conclusão, perante o uso da possibilidade prevista no artigo 215º, nº4 do CPPT, não podia o indeferimento da admissão do bem oferecido estribar-se na falta de prova, por parte da executada, do valor do bem, tal como foi indicado.
Assim sendo, em face do que vem dito, forçoso é concluir que o despacho reclamado padece de vício de violação de lei, devendo a sentença recorrida que o anulou, manter-se, ainda que, em parte, com fundamentação diversa daquela que foi invocada.
Improcedem, pois, as conclusões de recurso que vínhamos analisando.
*
3. Decisão
Assim, pelo exposto, acordam os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte em negar provimento ao recurso, confirmando a sentença, com a fundamentação que se deixou expressa.
Custas pela Recorrente.
Porto, 15 de Fevereiro 2013
Ass. Catarina Almeida e Sousa
Ass. Nuno Bastos
Ass. Irene Neves