Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01301/08.5BEBRG
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:02/15/2012
Tribunal:TAF de Braga
Relator:Irene Isabel Gomes das Neves
Descritores:ATESTADO MEDICO
INFORMAÇÃO VINCULATIVA
PRINCÍPIO DA IGUALDADE
PRINCIPIO DA JUSTIÇA MATERIAL
Sumário:Sumário: Face ao teor da informação vinculativa n.º 1717/08 da Direcção-Geral de Finanças, sob pena de violação dos princípios da igualdade e da justiça material, a administração fiscal tem de relevar os atestados médicos entregues pelos contribuintes para efeitos de beneficio fiscal previsto no artigo 16.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais, relativamente aos anos de 2004 a 2007, emitidos à luz do regime anterior ao Decreto-Lei n.º 202/96, de 23 de Outubro, independentemente da data em que aqueles foram notificados para apresentarem novo atestado.*
* Sumário elaborado pelo Relator
Recorrente:Fazenda Pública
Recorrido 1:M... e L...
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os Juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:
I - RELATÓRIO
M… e L…, com os sinais nos autos, impugnaram a decisão de indeferimento da reclamação graciosa proferida no processo 234820080400082, relativa a liquidação oficiosa 20075004595894, referente ao ano de 2003.
No Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, foi proferida sentença, em 19 de Junho de 2009, que julgou procedente a impugnação, decisão com que a Fazenda Pública não se conformou, tendo interposto o presente recurso jurisdicional.
Alegou, tendo concluído da seguinte forma:
1º. A factualidade e as respectivas circunstâncias que estão na génese da emissão das conclusões da “informação vinculativa” nº 1717/08, da D.S.I.R.S não são idênticas às que foram alegadas pelos impugnantes, justificando e motivando aqueloutros o procedimento administrativo excepcional (não discricionário) previsto no nº3 daquela informação, verificados que sejam pela administração tributária, os condicionalismos e os limites aí consignados, em contraponto ao procedimento – regra, seguido pela administração fiscal, em conformidade com os nºs. 1 e 2 da cit. Informação.
2º. Ora, quanto à situação da impugnante mulher, não esteve em questão uma impossibilidade de, em 2007, obter um novo atestado médico de incapacidades ao abrigo da Tabela Nacional de Incapacidades aprovada pelo D. 341/93, de 30.09, complementada pelas normas e critérios essencialmente previstos no D.L. nº302/96, de 23.10, sendo que não foram trazidos ao processo o resultado da avaliação a que a impugnante se submeteu em Setembro de 2007.
3º. A situação da impugnante mantém, tal como é configurado pelos impugnantes e considerando os factos, dados como assentes, no probatório, não se enquadra no âmbito material da excepção consignada em 3. da dita informação vinculativa.
4º. O âmbito da excepção, balizado temporalmente e em pressuposto concretos, constitui em si mesmo um limite ao arbítrio da administração tributária no que concerne à aceitação (ou não) de uma prova (ou meio de prova) de uma deficiência fiscalmente relevante.
5º. A alteração dos rendimentos declarados em 2003, nos termos do art. 66º do CIRS, como acto prévio e pressuposto da liquidação impugnada, foi motivada e justificada na lei e jurisprudência consolidada nos tribunais superiores (STA e T.C.A.), em consonância, aliás, também com os princípios consignados em 1. a 2. da que viria a ser a informação nº1717/08.
6º. A excepção, consignada em 3. da dita informação, não constituiu um poder discricionário da administração, mas vinculado e legal, pelo que não faz sentido falar em violação do principio da igualdade, quando se tratou, in casu, uma situação igual de forma igual à de tantos outros contribuintes.
7º. Também não foi, in casu, afrontado o principio da justiça material, na medida a que o alegado direito a benefícios fiscais sempre dependeria da comprovação, de forma legalmente válida, dos pressupostos do direito a esses benefícios, ónus da contribuinte e que, porém, não se mostra satisfeito.
8º. Assim, por inadequada valoração da factualidade relevante, dada como assente, e na indevida subsunção, aos princípios da igualdade e da justiça, terá sido feito errado julgamento.
9º. Termos em que, concedido provimento ao recurso, deve a douta sentença recorrida ser revogada e a impugnação ser julgada improcedente.
Os recorridos apresentaram contra-alegações em defesa da manutenção da decisão em crise – cfr. fls. 92 e ss..
O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido da procedência do recurso.
Foram colhidos os vistos dos Exmos. Juízes Adjuntos, pelo que importa apreciar e decidir.
Questões a decidir:
As questões sob recurso e que importam decidir, suscitadas e delimitadas pelas alegações de recurso e respectivas conclusões, são as seguintes:
- Saber se relativamente à liquidação do IRS do ano de 2003 e para efeitos do beneficio fiscal previsto no art. 16º do EBF, podia ou não a Administração Fiscal (AF) deixar de considerar o atestado apresentado pela recorrente emitido na vigência do diploma anteriormente em vigor (DL n.º 341/93, de 30 de Setembro), face à informação vinculativa n.º 1717/08 da Direcção-Geral de Impostos.
II - Fundamentação
1. De facto
1.1 Matéria de facto dada como provada na 1ª instância
1. Em 2004-04-30 os impugnantes apresentaram a declaração de rendimentos Mod.3 de IRS, tendo sido emitida em 2004-09-06 a liquidação com o n.º 5113844570, resultando da mesma imposto no valor de €2.164,67.
2. Pelo ofício n.º 9671 de 2007-06-11 da Direcção de Finanças de Viana do
Castelo, foi o impugnante notificado (Registo RM 0588 3845 5 PT, de 2007-06-13) para fazer prova documental da situação relativa à deficiência de L…, indicada nas declarações de rendimentos apresentadas.
3. Para prova da referida deficiência, os impugnantes apenas dispunham de um atestado de incapacidade emitido em data anterior à da entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 202/96, de 23 de Outubro.
4. Através do ofício n.º 15152 de 2007-09-11 da DF de Viana do Castelo - Divisão de Tributação e Cobrança, foram os ora reclamantes, notificados para querendo exercerem o direito de audição, previsto no artigo 60.° da LGT, relativamente ao projecto de Decisão sobre alteração aos rendimentos dos anos 2003, 2004 e 2005.
5. Em 2007-09-20, os reclamantes exerceram o direito de audição.
6. Em 2007-11-13, através do ofício n.º 18044 da DF de Viana do Castelo - Divisão de Tributação e Cobrança, foi o contribuinte notificado de conformidade com o artigo 66.° do CIRS, da conversão em definitivo do projecto de decisão, no sentido da alteração dos rendimentos, não sendo de considerar os benefícios fiscais na nova liquidação a efectuar.
7. Em 2007-11-20, foi emitida pela Administração Tributária a liquidação oficiosa
20075004595894, referente ao ano 2003, sendo emitida em 2007-11-26, o documento de compensação 20077157777, no valor de €3.573,13, com data limite de pagamento de 2008-01-02.
8. Em 2008-01-02, os reclamantes regularizam voluntariamente a situação efectuando o pagamento do valor anteriormente.
9. Em 2008-02-14, os reclamantes apresentam reclamação graciosa instaurada sob o n.° 234820070400082.0, solicitando a revisão da liquidação do ano 2003.
10. A referida reclamação foi decidida por despacho de 12-08-2008, notificada aos impugnantes por carta registada com A/R enviada em 14-08-2008.
11. A impugnação deu entrada no Serviço de Finanças a 03-09-2008.
12. Em 12-12-2008 foi estatuída nos termos legais pela Administração Tributária, uma informação vinculativa sobre o assunto “Comprovação da deficiência fiscalmente relevante. Validade dos atestados de incapacidade emitidos em data anterior à da entrada em vigor do Decreto-Lei n.° 202/96, de 23 de Outubro”, com o seguinte teor:
“1. A prova da deficiência para fins fiscais tem de ser efectuada de acordo com os critérios técnico-legais que vigoram no último dia do período de tributação, pelo que os atestados de incapacidade emitidos anteriormente à entrada em vigor do Decreto-Lei n. 202/96, de 23 de Outubro, não são válidos para comprovar a deficiência fiscalmente relevante, relativamente ao ano fiscal de 1996 e posteriores.
2. Não se pode aceitar como princípio a validade automática dos documentos que certificam deficiências quando as regras ao abrigo das quais foram emitidos foram substituídas por outras que são susceptíveis de interferir com a medida da invalidez permanente, afixar através do acto de avaliação.
3. Porém, face à alegada impossibilidade de os sujeitos passivos obterem em 2008 uma declaração de incapacidade ao abrigo do Decreto-Lei n.° 202/96, de 23 de Outubro, uma vez que em Janeiro entrou em vigor uma nova Tabela de Incapacidades, aprovada pelo Decreto-Lei n. 0352/2007, de 23 de Outubro, deverá a Administração Tributária, a título excepcional, aceitar os atestados de incapacidade emitidos ao abrigo da legislação vigente à data da verificação da deficiência, para comprovação das situações relativas aos anos de 2004 a 2007, no âmbito das notificações efectuadas aos sujeitos passivos no decurso de 2008.”
Matéria de facto não provada:
Inexiste
Fundamentação da matéria de facto provada e não provada:
A matéria de facto dada como provada, genericamente aceite ou não contestada pelas partes, assente na prova documental disponível.
Inexiste outra matéria dada como não provada, por nada ter sido alegado com interesse para a decisão da causa, para além do que ficou dado como provado e não provado.
2. De Direito
Para fundamentar a procedência da impugnação judicial considerou o M.º Juiz do Tribunal “a quo”, em síntese, que:
O que se passa é que um contribuinte, portador de deficiência física susceptível de lhe conferir beneficio fiscal, comprovada por atestado de incapacidade emitido em data anterior à da entrada em vigor do Decreto-Lei n.° 202/96, de 23 de Outubro, não diligenciou, posteriormente à entrada em vigor deste diploma, pela obtenção de novo atestado, continuando, todavia a fazer constar da sua declaração de rendimentos a deficiência em causa, deduzindo o competente benefício fiscal.
A Administração Tributária, em processo inspectivo, não aceita o referido atestado de incapacidade emitidos em data anterior à da entrada em vigor do Decreto-Lei n.° 202/96, de 23 de Outubro, e desconsidera o beneficio fiscal, pretendido pelo contribuinte.
A este respeito, sobre a “Validade dos atestados de incapacidade emitidos em data anterior à da entrada em vigor do Decreto-Lei n.° 202/96, de 23 de Outubro”, conforme resulta do probatório, a Administração Tributária emitiu informação vinculativa a determinar que “deverá a Administração Tributária, a título excepcional, aceitar os atestados de incapacidade emitidos ao abrigo da legislação vigente à data da verificação da deficiência, para comprovação das situações relativas aos anos de 2004 a 2007, no âmbito das notificações efectuadas aos sujeitos passivos no decurso de 2008.”.
Esta informação vincula a própria Administração Tributária perante todos os contribuintes, nos termos dos artigos 55° e 57° do CPPT e 68° da LGT.
Ora, no caso sub-judice, sendo a questão substancialmente a mesma, nota-se (como bem refere o Representante da Fazenda Pública), está em causa uma situação relativa ao ano de 2003 e um procedimento inspectivo ocorrido em 2007, ou seja, tudo anteriormente ao período abrangido pela referida informação vinculativa.
Será esse motivo para que, o entendimento da referida informação vinculativa não se aplique ao caso dos autos?
Entende-se que não. Efectivamente, a situação em causa nos autos é em tudo idêntica àquela sobre que incide a determinação da informação em causa, que à Administração Tributária cumpre observar. O facto de estarem em causa factos anteriores ao período abrangido por aquela informação, não tem subjacente qualquer distinção valorativa atendível. Antes, o lapso temporal referido nessa informação, tem antes, a ver com a circunstância do ano em que foi proferida, abrangendo, os anos abrangidos pelo prazo de caducidade do direito à liquidação contado desse ano.
Todavia, a diferenciação de tratamento para situações anteriores à abrangida pela informação vinculativa, seria, sempre, injustificadamente discriminatória, e, por isso, contrária aos princípios da igualdade e da justiça material, consagrados no art.° 5°/2 da LGT.
Daí que, considerando a Administração Tributária que os atestados de incapacidade emitidos em data anterior à da entrada em vigor do Decreto-Lei n.° 202/96, de 23 de Outubro, são idóneos para documentar deficiência fiscalmente relevante para efeitos de atribuição de benefícios fiscais, para os anos de 2004 a 2007, necessariamente (por identidade, senão maioria, de razão) que há-de considerar os mesmos idóneos para prova de deficiência fiscalmente relevante para efeitos de atribuição de benefícios fiscais, para o ano de 2003, sob pena de cair no arbítrio e violação dos referidos princípios.
(…) decide-se julgar procedente a presente impugnação. “
A recorrente, Fazenda Pública, de acordo com as conclusões do recurso e que delimitam o seu objecto, vem articular que estando em causa a comprovação do grau de deficiência de que a oponente mulher se diz portador, à administração tributária andou bem ao desconsiderar o atestado médico por aquela apresentada e emitido em data anterior à entrada em vigor do DL n.º 202/96, de 23 de Outubro, nos termos que decorrem da doutrina fixada em informação vinculativa pela administração tributária.
Vejamos:
Na referida informação vinculativa emitida pela administração tributária foi fixado o entendimento seguinte: “face à alegada impossibilidade de os sujeitos passivos obterem em 2008 uma declaração de incapacidade ao abrigo do Decreto-Lei n.º 202/96, de 23 de Outubro, uma vez que em Janeiro entrou em vigor uma nova Tabela de Incapacidades, aprovada pelo Decreto -Lei n.º 352/2007, de 23 de Outubro, deverá a Administração Tributária, a título excepcional, aceitar os atestados de incapacidade emitidos ao obrigo da legislação vigente à data da verificação da deficiência, para comprovação das situações relativas aos anos de 2004 a 2007, no âmbito das notificações efectuadas aos sujeitos passivos no decurso de 2008”.
Tendo a administração tributária notificado o impugnante marido para apresentar documento comprovativo da deficiência da mulher de que declararam ser portadora ainda no decurso do ano de 2007 a questão que se coloca é, pois, a de saber se será isso suficiente para afastar a aplicação daquela doutrina plasmada na dita informação vinculativa com a consequente desconsideração do atestado medido apresentado pelo impugnante mulher.
Recentemente, este Tribunal Central Administrativo Norte pronunciou-se por via do Acórdão de 12 de Outubro de 2011, proferido no processo 258/10BEBRG. Aderindo à tese emanada daquele, em termos que merecem a nossa inteira adesão, em situação inteiramente idêntica (mesmos impugnantes com reporte ao ano de 2004), foi proferido acórdão por este Tribunal Central Administrativo no processo 01817/09.6BEBRG.
Iremos, pois, limitar-nos a transcrever a fundamentação constante do acórdão de 20 de Dezembro de 2011 proc. 01817/09, sendo que onde se lê ano 2004 deverá ler-se por referência aos nossos autos ano de 2003:
“Como resulta do ponto I e II do presente Acórdão, a questão que urge resolver é, tão-só, a de saber se tendo sido emitida a informação vinculativa nos termos em que o foi, a Administração Fiscal estava obrigada a considerar bastante, para efeitos de comprovação de beneficio fiscal relativo ao ano de 2004, o atestado emitido - e comprovativo da incapacidade em causa – em Agosto de 1996, isto é, antes da entrada em vigor do DL n.º 202/96, de 23 de Outubro.
O Tribunal a quo, entendeu que sim, considerando que, qualquer outra interpretação, mormente a restrição daquela aceitação sujeita a uma dupla condição – ter apenas sido notificado o contribuinte em 2008 e este ter alegado a impossibilidade de obter documento nos termos legalmente exigíveis [que a administração sabia que em 2008 era já objectivamente impossível de obter] era violadora dos princípios da igualdade e da justiça material plasmados no art.º 5º/2 da LGT, razão que determinou o procedimento da impugnação . (…)”.
Para assim concluir, o Meritíssimo Juíz verteu na sentença em recurso o seguinte raciocínio factico-juridico: « (…) Todavia, a diferenciação de tratamento para situações anteriores à abrangida pela informação vinculativa, seria, sempre, injustificadamente discriminatória, e, por isso, contrária aos princípios da igualdade e da justiça material, consagrados no art.° 5°/2 da LGT.
Daí que, considerando a Administração Tributária que os atestados de incapacidade emitidos em data anterior à da entrada em vigor do Decreto-Lei n.° 202/96, de 23 de Outubro, são idóneos para documentar deficiência fiscalmente relevante para efeitos de atribuição de benefícios fiscais, para os anos de 2004 a 2007, necessariamente (por identidade, senão maioria, de razão) que há-de considerar os mesmos idóneos para prova de deficiência fiscalmente relevante para efeitos de atribuição de benefícios fiscais, para o ano de 2003, sob pena de cair no arbítrio e violação dos referidos princípios.
(…) decide-se julgar procedente a presente impugnação. “
Não podemos deixar de concordar com o assim explanado.
Efectivamente, prosseguindo na transcrição do citado acórdão, “(…) e contrariamente ao que parece resultar das doutas alegações da Recorrente, no caso concreto nem sequer está em causa, ou pelo menos não a título principal, saber se um diploma legal, in casu, o D.L. n.º 202/1996, de 23 de Setembro constitui ou não o preenchimento legal de um vazio legislativo, veio dispor apenas para os casos pendentes de avaliação e futuros ou, sequer, se a exigência de um novo atestado, em conformidade com as novas regras estabelecidas relativamente a cada ano fiscal a todos os contribuintes (os já há muito avaliados, os pendentes dessa avaliação à data da entrada em vigor do diploma e os que posteriormente se submeteram a essa avaliação) traduz uma aplicação retroactiva de um diploma ou violação de direitos adquiridos. Matéria que, a bem da verdade, também se diga, e contrariamente também ao que vem aduzido, não é, nem nunca foi, matéria pacifica na jurisprudência do nosso Tribunal Superior, como o revela o Acórdão do Pleno do STA de 27 de Novembro de 2002 (processo n.º 026787 e os vários arestos a que aí é feita referência e, ainda mais claramente, como resulta dos vários votos de vencido exarados naqueles].
No caso concreto, o que está em causa é saber se, tendo a Administração emitido informação vinculativa sobre «Validade dos atestados de incapacidade emitidos em data anterior à da entrada em vigor do Decreto-Lei n.° 202/96, de 23 de Outubro”, nos termos em que o fez, poderia desconsiderar tal atestado da contribuinte em causa, apenas por esta nunca ter invocado uma impossibilidade de obtenção de atestado ou por a ter notificado para o efeito a 24 de Setembro de 2007 quando, o ano fiscal em causa era, precisamente, o ano de 2004, isto é, um dos anos em que, por força da referida informação vinculativa, a administração fiscal se auto-obrigava a considerar para efeitos daquele beneficio, um atestado emitido nos termos da legislação entretanto revogada.
E, a resposta a esta questão só pode ser, tal como o foi para o Tribunal a quo, inequivocamente negativa.
Tal não significa que este Tribunal não haja compreendido ou apreendido as circunstâncias especificas ou do caso concreto e que conduziram à emissão da referida informação vinculativa e que resultaram do facto de a Administração ter constatado que, nos casos de acções inspectivas realizadas em sede de IRS relativo aos anos 2004 a 2007, iniciadas ou em que o administrado é notificado só em 2008 para comprovar documentalmente o direito ao beneficio fiscal tal se mostrar já objectivamente impossível mercê da entrada em vigor da nova Tabela Nacional de Incapacidades (aprovada pelo DL n.º 352/2007, de 23 de Outubro e vigente desde 21 de Janeiro), impossibilidade essa que normalmente lhe era invocada.
Circunstâncias essas que, efectivamente, no caso concreto se não verificam, já que a Reclamante foi notificada para tal em Setembro de 2007.
Porém, como bem mencionado foi pela Meritíssima Juíza a quo, a exclusão da aplicação desse regime excepcional de um contribuinte assente no facto de ter sido antes de 2008 notificado para fazer essa prova ou de não ter alegado a impossibilidade de obter esse documento conduziria inaceitavelmente à aplicação de dois regimes totalmente distintos para situações materialmente iguais e com consequências graves já que a parte dos contribuintes objecto de acção inspectiva relativamente ao ano de IRS de 2004, que tivessem declarado serem titular de beneficio fiscal por serem portador de incapacidade igual ou superior a 60%, a Administração aceita o atestado apresentado ou a apresentar emitido em data anterior a Outubro de 1996; aos demais, colocados exactamente na mesma circunstância (inspecção), a Administração não aceita os referidos atestados como bastantes e procede a nova liquidação ficando a sorte dos mesmos dependente do momento em que a própria administração entendeu fazer essa inspecção, emitir um oficio ou do contribuinte ser mais ou menos expedito a receber (ou não receber) essa mesma carta ou a invocar que já não podia obter esse atestado. Ou seja, não pode ser tudo deixado ao arbítrio da oportunidade da actuação inspectiva e de circunstâncias voláteis e irrelevantes do ponto de vista de uma justa e igual justiça tributária.
Temos, pois, por seguro que, a interpretação da informação vinculativa defendida pela Administração Fiscal e que esteve na génese da decisão formulada e subsequente liquidação viola, inequivocamente, os princípio da igualdade e da justiça material com que a actuação da Administração não pode deixar de conformar-se.
Em suma: ao aceitar que parte dos contribuintes que declararam no seu IRS relativo aos anos de 2004 a 2007 ter uma incapacidade igual ou superior a 60% para efeitos de beneficiarem de isenção fiscal nos temos do art. 16º, comprovem ser merecedores dessa isenção com a simples apresentação de atestado emitido à luz do regime anterior ao Dec. Lei n.º 202/96, de 23 de Outubro, a Administração não pode, sob pena de violação dos princípios mencionados, deixar de aceitar como bastante para todos os demais, relativamente à comprovação de beneficiário dessa isenção para esses mesmos anos, um atestado emitido ao abrigo desse mesmo diploma legal ou, se preferirmos, ao aceitar como bastante em termos de comprovação de incapacidade e para efeitos do art. 16º, um atestado emitido ao abrigo da legislação entretanto revogada, não pode a administração exigir aos demais e relativamente aos mesmos anos, atestados emitidos ao abrigo da nova legislação sob pena de violação dos princípios de igualdade e justiça material cuja observância constitucional e legalmente lhe está imposta. (sublinhado nosso)
E, sendo assim, forçoso é afirmar que a sentença sob recurso não merece a censura que lhe vem assacada, antes tendo efectuado a devida apreciação de direito pelo que, a decisão recorrida que qualificou como ilegal aquela conduta e a posterior liquidação feita pela Administração Fiscal que não teve em consideração o grau de deficiência constante do referido atestado, deve ser confirmada.”.
Improcedem, deste modo, as alegações da recorrente, estando o seu recurso votado ao insucesso, cumpre confirmar a sentença recorrida.
III. DECISÃO
Termos em que, acordam os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte em negar provimento ao recurso.
Custas pela recorrente.
Porto, 15 de Fevereiro de 2012
Ass. Irene Isabel Gomes das Neves
Ass. Jorge Miguel Barroso de Aragão Seia
Ass. Paula Fernanda Cadilhe Ribeiro