Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01163/04 - VISEU
Secção:2ª secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:06/25/2009
Relator:Moisés Rodrigues
Descritores:ACTO CONFIRMATIVO – RECURSO CONTENCIOSO – IMPOSTO AUTOMÓVEL
Sumário:I - O acto administrativo confirmativo de outro anterior só é irrecorrível contenciosamente se entre os dois actos existir total identidade de sujeitos, de objecto, de conteúdo, de pressupostos ou circunstâncias de decisão, de fundamentação e de eficácia.
II - O acto confirmativo nada inova na ordem jurídica, não tem qualquer poder genético, nada acrescenta ou tira ao acto confirmado; este é que define a situação jurídica do administrado.
III – É meramente confirmativo de outro, o acto que, em vista da mesma situação fáctica e regime jurídico e com idêntica fundamentação, mantém acto anterior de arquivamento de pedido de revisão do acto de liquidação de imposto automóvel.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os Juízes que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

I
Manuel (adiante Recorrente), NIF , não se conformando com a sentença proferida no Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu, que julgou improcedente o presente recurso contencioso por si deduzido contra o despacho de 13/12/2002, proferido pelo Director da Alfândega de Aveiro, que lhe indeferiu o pedido de revisão do acto de liquidação do Imposto Automóvel (IA) relativo às DVL nº 98/120931 e nº 98/111153, veio dela recorrer, concluindo, em sede de alegações:
1. Quanto à confirmatividade e irrecorribilidade do acto sindicado, resulta do n.° 2 do art. 56.° da LGT que só não existe o dever de decidir por parte da AT quando o órgão competente tenha praticado há menos de dois anos um acto administrativo sobre o mesmo pedido formulado pelo mesmo particular e com os mesmos fundamentos.
2. In casu, o acto recorrido não é confirmativo do anterior porque, embora sejam os mesmos os sujeitos (tanto o órgão competente para a decisão, como o requerente), se possa admitir que o pedido é o mesmo e que a decisão (nela incluindo a respectiva fundamentação) do sr. Director da Alfândega também é a mesma, todavia são diferentes os fundamentos do 1.° e do 2.° pedido de revisão do acto de liquidação do IA.
3. Não se verifica um dos requisitos essenciais ao carácter confirmativo do 2.° despacho de indeferimento do pedido de revisão do acto de liquidação do IA e à sua consequente irrecorribilidade: que esse despacho tenha incidido sobre pedidos apresentados em menos de 2 anos e com os mesmos fundamentos. Os fundamentos do 2.° pedido de revisão diferem substancialmente dos do 1.° pedido de revisão do acto de liquidação do IA.
4. Não sendo os fundamentos dos dois pedidos os mesmos - matéria, aliás de conhecimento oficioso - não é legítimo concluir que o 2.° despacho de indeferimento é confirmativo do 1.°.
5. A matéria de facto dada como provada é insuficiente para bem decidir se o 2.° despacho de indeferimento do pedido de revisão do acto de liquidação do IA é ou não meramente confirmativo do 1.°, tendo que se atender aos fundamentos próprios de cada um desses pedidos de revisão - aliás, documentados nos autos -, sendo certo que eles são substancialmente diferentes.
6. O 2.° pedido de revisão foi tempestivamente apresentado, tendo em conta que actual art. 101.° da RA contém um quadro factual e uma solução jurídica inovadores em relação ao art. 101.° do DL 244/87. Dele resulta que só é de aplicar o DC em detrimento do direito nacional quando o mesmo facto tributário der origem à liquidação de "direitos de importação" (no sentido fixado no art. 4.° n.° 10 do CAC) e, simultaneamente, (pois que o art. 101.° da RA utiliza a conjunção "e" e não "ou") "outros impostos" (comunitários ou nacionais).
6. Nem sempre um facto tributário dá origem à liquidação de "direitos de importação" e de "outros impostos". Nesses casos, em que de um facto tributário só resulte serem devidos "direitos de importação" ou só resulte serem devidos "outros impostos", é inaplicável o art. 101.° da RA e, por consequência, também é inaplicável o prazo de 3 anos previsto no art. 236.° do CAC, sendo, antes, aplicável o prazo de caducidade de 5 ou de 4 anos, conforme o acto tributário seja anterior ou posterior a 01.01.1998, por força do art. 94.° n.° 2 al. b) do CPT ou do art. 78.° n.° 1 da LGT, tendo em conta os n.°s 5 e 6 do art. 5.° do DL n.° 398/98.
7. É inaplicável, por força do art. 101.° da RA o prazo de 3 anos previsto no art. 236.° do CAC, pois que nenhuma destas normas é aplicável ao caso dos autos, já que não estamos perante um facto tributário do qual resulte simultaneamente a liquidação de "direitos de importação" (no sentido do n.° 10 do art. 4.° do CAC) e a liquidação de "outros impostos" (nacionais ou comunitários).
8. O prazo de caducidade aplicável é de cinco ou de quatro anos, conforme o acto tributário é anterior ou posterior a 01.01.1998, ex-vi dos n.°s 5 e 6 do art. 5° do DL n.° 398/98, a contar do termo do prazo do pagamento voluntário, nos termos das disposições combinadas dos arts. 94.° n.° l al. b) do CPT, 56 °, 78.° n.° 1 e 96 ° n.° 1 da LGT e 60 ° do CPPP; e não o prazo de três anos, previsto no art. 236.° do CAC, pois que é inaplicável o art. 101.° da RA que legitimaria o seu chamamento.
9. Foram violadas, por erro de interpretação ou de aplicação, o disposto, entre outros, nos arts. 266.° n.° 2 da CRP, 9.° do CPA, 55° n.° l e 56.° n.° 2, 78 ° n.° l e 96.° n.° l da LGT, 94.° n.° l al. b) do CPT, 60.° do CPPP e 668° n.° 1 als. b e d do CPC.
Termos em que, e nos douto suprimento, deve ser revogada a douta sentença recorrida e, em consequência, julgar-se procedente a pretensão da recorrente, com as legais consequências.

Não foram produzidas contra-alegações.

O Procurador-Geral-Adjunto neste Tribunal emitiu parecer, a fls. 195 a 197, no sentido de se negar provimento ao recurso.

Colhidos os vistos legais, importa apreciar e decidir.

II
É a seguinte a factualidade declarada provada na 1ª instância, que aqui se reproduz ipsis verbis:
A) Em Dezembro de 1998, comprou na Alemanha por PTE 3.257.255$00, o automóvel ligeiro de passageiros, usado, de marca Mercedes-Benz, modelo C 220D de 2.155 cc., a gasóleo, posto em circulação em 1996.10.10, e procedeu à sua importação, tendo a Alfândega liquidado o IA que fixou em PTE 1.335.427$00, € 6.661,08 (RLQ. 98/0233321);
B) E em 1998.12.23 foi emitida a declaração de veiculo ligeiro (DVL) n.° 98/0112931, relativa a este veículo (a fls. 60 dos autos);
C) Em Dezembro de 1998, comprou na Alemanha, por PTE 3.342.349$00, o automóvel ligeiro de passageiros, usado, de marca Mercedes-Benz, modelo E 290 TD, de 2.874 cc., a gasóleo, posto em circulação em 1996.10.11, e procedeu à sua importação, tendo a Alfândega liquidado o IA que fixou em PTE 2.366.180$00 (RLQ. 98/0230446);
D) E em 1998.12.21 foi emitida a declaração de veículo ligeiro (DVL) n.° 98/0111153, relativa a este veículo (a fls. 75 dos autos);
E) Em 2001.04.18, o recorrente pediu a revisão do acto tributário de liquidação de Imposto Automóvel relativo DVL n° 98/112931 (a fls. 38 e 39 dos autos);
F) Do cabeçalho deste pedido transcreve-se: ...vem requerer a revisão do acto tributário de liquidação do imposto automóvel (IA) verificado pela DVL ..., nos termos dos artigos 3°, 5/1, 56° e 78° da Lei Geral tributária e 4°, 6° e 60° do Código de Procedimento e Processo Tributário...;
G) Em 2001.05.29, na informação elaborada pelo Núcleo de Procedimentos Aduaneiros e Fiscais, o Director da Alfândega de Aveiro exarou o seguinte despacho:
Concordo. Determino o arquivamento do pedido de revisão nos termos do parecer emitido. Dê-se conhecimento ao interessado (a fls. 37dos autos);
H) Este despacho foi notificado em 2001.06.19 (certidão de notificação a fls. 36 dos autos);
I) Do parecer emitido naquela informação transcreve-se: considerando que os pedidos de revisão dos actos de liquidação, por iniciativa do sujeito passivo, têm de ser apresentados no prazo de 90 dias, a contar do termo do prazo para pagamento voluntário (cfr. n.° 1 do artigo 78.° da LGT e os artigos 70.° e 102.° do CPPT) e que, se tiver sido ultrapassado esse prazo, não existe dever de decisão, face ao disposto na alínea b) do n.° 2 do artigo 56.° da LGT, afigura-se-nos que o presente pedido de revisão deverá ser arquivado com esse fundamento de direito, uma vez o prazo para pagamento voluntário do IA liquidado na DVL n° 98/112931, expirou em 1999.03.06 e o pedido de revisão do acto de liquidação foi apresentado em 2001.04.18;
J) Em 2001.05.09, o recorrente pediu a revisão do acto tributário de liquidação de Imposto Automóvel relativo DVL n° 98/0230446 (a fls. 44 a 45 dos autos);
K) Do cabeçalho deste pedido transcreve-se: ...vem requerer a revisão do acto tributário de liquidação do imposto automóvel (IA) verificado pela DVL ..., nos termos dos artigos 3°, 5/1, 56° e 78° da Lei Geral tributária e 4°, 6° e 60° do Código de Procedimento e Processo Tributário...;
L) Em 2001.05.29, na informação elaborada pelo Núcleo de Procedimentos Aduaneiros e Fiscais, o Director da Alfândega de Aveiro exarou o seguinte despacho:
Concordo. Determino o arquivamento do pedido de revisão nos termos do parecer emitido. Dê-se conhecimento ao interessado (a fls. 43 dos autos);
M) Este despacho foi notificado em 2001.07.04 (certidão de notificação a fls. 42 dos autos);
N) Do parecer emitido naquela informação transcreve-se: considerando que os pedidos de revisão dos actos de liquidação, por iniciativa do sujeito passivo, têm de ser apresentados no prazo de 90 dias, a contar do termo do prazo para pagamento voluntário (cfr. n.° 1 do artigo 78.° da LGT e os artigos 70.° e 102.° do CPPT) e que, se tiver sido ultrapassado esse prazo, não existe dever de decisão, face ao disposto na alínea b) do n.° 2 do artigo 56.° da LGT, afigura-se-nos que o presente pedido de revisão deverá ser arquivado com esse fundamento de direito, uma vez o prazo para pagamento voluntário do IA liquidado na DVL n° 98/111153, expirou em 1999.03.04 e o pedido de revisão do acto de liquidação foi apresentado em 2001.05.09;
O) Em 2002.12.03 o Recorrente repetiu o pedido de revisão do acto (a fls. 51 dos autos);
P) Do cabeçalho deste pedido transcreve-se: ...requerer a revisão do acto tributário de liquidação do imposto automóvel (IA) verificado pela DVL ..., nos termos dos artigos 56° e 78/1 da LGT e 60° do CPPT...;
Q) Em 2002.12.13, na informação elaborada pelo Núcleo de Procedimentos Aduaneiros e Fiscais, o Director da Alfândega de Aveiro exarou o seguinte despacho:
Concordo. Determino o arquivamento do pedido de revisão nos termos do parecer emitido. Dê-se conhecimento ao interessado (a fls. 50 dos autos);
R) Este despacho foi notificado em 2003.03.13 (certidão de notificação a fls. 49 dos autos);
S) Do parecer emitido naquela informação extracta-se: considerando que os pedidos de revisão dos actos de liquidação, por iniciativa do sujeito passivo, têm de ser apresentados no prazo de 90 dias, a contar do termo do prazo para pagamento voluntário (cfr. n.° 1 do artigo 78.° da LGT e os artigos 70.° e 102.° do CPPT) e que, se tiver sido ultrapassado esse prazo, não existe dever de decisão, face ao disposto na alínea b) do n.° 2 do artigo 56.° da LGT, afigura-se-nos que o presente pedido de revisão deverá ser arquivado com esse fundamento de direito, uma vez que foi apresentado em 2002.12.03 e o prazo para pagamento voluntário do IA liquidado na DVL n° 98/12293.1 expirou em 1999.02.06 e na DVL n° 98/11115.3 expirou em 1999.02.04;
T) Em 2003.05.13, a petição inicial deu entrada no Tribunal Tributário de 1.a Instância de Aveiro.

b) Factos não provados
Dos factos constantes da impugnação, nenhuns mais têm interesse para a boa decisão da causa.

IV - Motivação da decisão de facto
A decisão da matéria de facto, consonante ao que acima ficou exposto, efectuou-se com base nos documentos e informações constantes do processo.
*
Ao abrigo dos poderes que nos são concedidos pelo art. 712.º, n.º 1, alínea a), do Código de Processo Civil (CPC), adita-se ao probatório a seguinte materialidade fáctica:
U) A fundamentação constante dos pedidos de revisão dos actos tributários a que se alude nas alíneas E) e J) que antecedem, foi a seguinte:
Na data em que importou as viaturas ... [a data mencionada varia, conforme a data de importação de cada uma delas], o montante residual do imposto incorporado nos veículos semelhantes importados em.... [data da sua entrada em circulação, no país de origem], «no estado de novos, era de valor incerto e inferior ao que resulta da aplicação da percentagem de redução aplicável prevista no DL n.° 40/93, sendo ainda certo que, no imposto liquidado, não foi tomado em consideração o valor de mercado do veículo em causa e a sua desvalorização real, mas apenas a sua idade e cilindrada.
Em 22.02.2001, foi proferido pelo TJCE um acórdão, no proc. C-393/98, (Ministério Público e A Gomes Valente c. a Fazenda Pública) em que foi declarado que o sistema actual do IA, aplicado à importação da CE de viaturas usadas, como a referida, não está em conformidade com as disposições do Direito Comunitário, designadamente o actual art. 90 do Tratado de Roma (TR).
Ao fundamentar o acto tributário na legislação de proveniência nacional, o Decreto-Lei n.° 40/93, de 18 de Fevereiro, com as alterações ulteriores aos seus artigos 1, 3 e 5 -, o sr. Director desta Alfândega violou o § 2 do art. 90 do TR, de aplicabilidade e efeito directo, que determina a inaplicabilidade da citada disposição legislativa nacional contrária em que se baseou a decisão atacada.
A revisão pela administração tributária pode ser provocada por um requerimento formulado pelo interessado, mesmo após o termo do prazo dos actos tributários (art. 56 e 78 da LGT)» - cfr. fls. 38, 39 e 44, 45;
V) A fundamentação constante do pedido de revisão dos actos tributários a que se alude na alínea O) que antecede, foi a seguinte:
Na data em que importou as viaturas ... [a data varia conforme a data de importação], o montante residual do imposto incorporado nos veículos semelhantes importados em.... [data da entrada em circulação, no país de origem], no estado de novos, era de valor incerto e inferior ao que resulta da aplicação da percentagem de redução aplicável prevista no DL n.° 40/93, sendo anda certo que, no imposto liquidado, não foi tomado em consideração o valor de mercado do veículo em causa e a sua desvalorização real, mas apenas a sua idade e cilindrada.
Como passou a ser decidido pelo STA 4, à luz dos considerandos do TJCE na decisão do caso A Gomes Valente 5 porque “os critérios e as tabelas do referido normativo não são susceptíveis de garantir que o montante do imposto não excede, ainda que apenas em certos casos, o montante do imposto residual incorporado no valor dos veículos similares já matriculados no território nacional, a norma em causa viola o direito comunitário, como, aliás, o reconhece o TJCE. E não vale dizer que a pronúncia do TJCE não versa sobre a questão suscitada nesta impugnação, dado que a similitude entre este caso e o caso versado no processo que foi submetido à apreciação do TJCE é evidente, como reconhece o STA, e a doutrina deste tem de projectar-se sobre todos os casos idênticos”.
O acto de liquidação do IA praticado pelo sr. Director da Alfândega, baseado no DL n.° 40/93, de 18 de Fevereiro, violou o art. 90 do Tratado de Roma. A revisão pode ser da iniciativa da entidade que praticou o acto tributário ou do seu superior hierárquico (art. 93.° do CPT). Porém, nada impede que os interessados requeiram à AT a revisão dos actos tributários, uma vez que tudo o que pode ser eito oficiosamente pode ser feito a pedido dos interessados.
Na sequência de um pedido de revisão formulado por um interessado, num caso de revisão oficiosa, a AT terá de pronunciar-se sobre o pedido, por força do preceituado no art 55.° n.01 da LGT. No caso de se verificarem, como se verificam, os pressupostos da revisão, a AT terá de proceder à mesma, por imposição dos princípios da justiça, da boa-fé e do respeito dos direitos e interesses legítimos dos cidadãos, que devem nortear a sua actividade (art. 55° da LGT). Com efeito, este dever de rever os actos injustos é um corolário do dever de actuação segundo o princípio da justiça, constitucionalmente consagrado (art. 266.° n.0 2 da CRP), pelo que não é constitucionalmente admissível o estabelecimento, pela lei ordinária, de casos de dispensa de observância de tal directriz de actuação».6 cfr. fls. 51 e 52 dos autos.
4 Vd, entre outras, as decisões da 2.ª secção do STA de 26.04.2001, proc. n.0 22.365; de 04.07.2001, proc. n.° 22.770 e de 24.10.2001, proc. n.° 22.364.
5 Ac. de 22.02.2001, proc. n.° C-393/98.
6 Vd. Diogo Leite de Campos e outros, Lei Geral Tributária, Comentada e Anotada, 1999, 2.ª reimpressão, em anotação ao artigo 78°.

III
Logra prioridade, por gerador de eventual nulidade da sentença, o conhecimento da alegada violação do disposto no artigo 668º, nº 1, als. b) e d), do CPC, que o Recorrente apenas referencia na sua conclusão 9., mas que deixou referido no corpo das alegações , do seguinte modo:
«Ao desconsiderar, silenciando-os, os diferentes fundamentos dos pedidos de revisão, a sentença recorrida incorreu em erro na apreciação da matéria de facto e de direito e em omissão de pronúncia (als. b e d do nº 1 do art. 668º do CPC).»
Ora, o eventual erro na apreciação da matéria de facto e de direito conduz-nos a um erro de julgamento, que não à nulidade prevista na alínea b) citada, a qual torna nula a sentença quando a mesma “não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão”, o que não é manifestamente o caso.
No que concerne à invocada omissão de pronúncia consabido é que a mesma se traduz em ao tribunal não lhe incumbir apreciar todos os fundamentos ou razões em que as partes se apoiam para sustentar a sua pretensão, importando, sim, que o tribunal decida a questão. E o tribunal decidiu a questão – apurar se o pedido de revisão dos actos tributários efectuado em 2º lugar pelo Recorrente é ou não é de um acto confirmativo de anterior e, se a resposta for positiva, consolidou-se na ordem jurídica aquele 1º acto, tornando-se irrecorrível o 2º acto -, tanto assim que o Recorrente mostra a sua divergência com o presente recurso.
Por conseguinte, improcedem as alegadas violações ao preceito em causa.
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As questões que cumpre apreciar e decidir, tal como delimitadas pelas conclusões das alegações do Recorrente, são:
a) saber se o acto recorrido, despacho de 13/12/2002, proferido pelo Director da Alfândega de Aveiro, que indeferiu o pedido de revisão do acto de liquidação do Imposto Automóvel (IA) relativo às DVL nº 98/120931 e nº 98/111153 é ou não é confirmativo de um outro anteriormente exarado pela mesma entidade, face aos fundamentos em que as respectivas pretensões estão estribadas e, sendo-o, não é recorrível uma vez que do outro despacho não foi interposto recurso no prazo legal – conclusões 1. a 5.;
b) saber se é tempestiva a apresentação do 2º pedido de revisão, à face do disposto nos artigos 236º, nº 2, Código Aduaneiro Comunitário (CAC) e 78º, nº 1, da Lei Geral Tributária (LGT) – conclusões 6. a 8.
Vejamos.
*
Começando pela segunda questão, decidiu-se na sentença recorrida:
«A questão seguinte deste recurso, é, agora, a de saber se o Recorrente interveio junto da Administração em prazo, solicitando a revisão da decisão respectiva, por estar desconforme com a directiva comunitária aplicável, em seu entender.
Defende o Digno Procurador da República que não, por terem decorrido mais de três anos: o recorrente, em boa verdade, solicitou a Administração em 2002.12.03 e as DVL's são de 1998.12.21 e 1998.12.23, respectivamente, por conseguinte passados mais de três anos, consoante se vê da matéria assente.
Contudo, a tese do Ministério Público, remetendo para os três anos fixados no artigo 221/3 do CAC, não parece colher, porque este prazo diz respeito à comunicação do montante dos direitos ao devedor; é pois, um prazo de caducidade da iniciativa de cobrança. Ora, o que aqui se passa diz respeito, muito pelo contrário, ao prazo em que a Administração Aduaneira pode revogar um acto ilegal, acto esse que já foi de cobrança e, assim, pressupostamente eficaz, como não é qualquer acto praticado para além de qualquer prazo de caducidade.
Deste modo, o prazo que nos importa para julgamento da causa, é o prazo, atenta a época da solicitação do contribuinte à Administração Aduaneira, de quatro anos previsto no artigo 78.° da LGT, que reduziu o já existente prazo de cinco anos consignado no artigo 94. b) do CPT.
E nem se confunda, enfim, a aplicabilidade do artigo 236/2 CAC, que apenas pode ser lido no sentido de prolongar o prazo da iniciativa do sujeito passivo de 90 dias para três anos.
Deste modo, aceitando-se a jurisprudência acerca do assunto, o acto recorrido seria efectivamente recorrível, porque muito embora se dirigisse contra o indeferimento de uma mera solicitação, não deixava, na sua negatividade, de afectar interesses legalmente protegidos do sujeito passivo, e justamente protegidos através da norma, acima citada, que permite à Administração a revisão oficiosa.»
Atento o teor da decisão, que é favorável ao aqui Recorrente e, não tendo sido posta em causa nas contra-alegações, que inexistem, a mesma mostra-se abrangida pelo trânsito em julgado da sentença recorrida, no que a esta questão respeita.
*
Enfrentemos, assim, a primeira questão atrás enunciada, ou seja, saber se o acto recorrido, despacho de 13/12/2002, proferido pelo Director da Alfândega de Aveiro, que indeferiu o pedido de revisão do acto de liquidação do Imposto Automóvel (IA) relativo às DVL nº 98/120931 e nº 98/111153 é ou não é confirmativo dos anteriormente exarados pela mesma entidade, em 29/05/2001, face aos fundamentos em que as respectivas pretensões estão estribadas e, sendo-o, não é recorrível uma vez que do outro despacho não foi interposto recurso no prazo legal.
Como bem se refere no acórdão do STA, proferido no Rcurso nº 018102, em 26/06/1996 ( Consultável na íntegra em http://www.dre.pt/pdfgratisac/1996/32320.pdf ), «Como diz Vasco Pereira da Silva (Em Busca do Acto Administrativo Perdido”, 1996, págs. 735.), ”... só quando se tratar de um acto meramente confirmativo, que nada acrescente ao acto administrativo anterior, é que o recurso de anulação deve ser afastado, mas não assim quando, sob a aparência de um acto confirmativo, existir algo de novo, susceptível de provocar uma autónoma lesão dos direitos dos particulares. Como escreve Ramón Parada, ”o acto confirmativo não deve conter nenhuma novidade — ”nihil novum” — relativamente ao anterior, de que constitui uma reprodução ou a sua confirmação formal”. Se entre dois actos não existir uma total identidade — de sujeitos, de objecto, de conteúdo, de pressupostos ou circunstâncias da decisão, de fundamentação, de eficácia — não há qualquer fundamento jurídico para afastar a recorribilidade do segundo acto que, enquanto acto lesivo de direitos dos particulares é susceptível de recurso contencioso (art. 268º, n.º 4 da Constituição).
No acto administrativo que nada inove em relação ao anterior, que corresponda a uma confirmação total do acto anterior, não poderá falar-se legitimamente na existência de uma autónoma lesão dos direitos ou interesses legalmente protegidos dos particulares em virtude dessa lesão ser feita pelo primeiro acto.
Esta é, de resto, a posição jurisprudencial deste Alto Tribunal desde há muito tempo, para quem, para um acto administrativo ser meramente confirmativo de outro anterior, será necessário que, além de decidir no mesmo sentido, seja idêntico o circunstancialismo fáctico e jurídico em que assentam e a sua fundamentação (cfr., entre muitos, os Acs. de 90.03.20, in B.M.J. 395-624; de 92.02.05, in, Ap. D.Rep. de 93.12.30, págs. 130; de 93.02.10, in, Rec. 13 697; 93.04.21, in Rec. 5556).»
No caso em apreço, o Recorrente, para defender que o acto recorrido não é confirmativo, entende que são diferentes os fundamentos do 1º e do 2º pedido, já que “o 2º pedido apresentado na Alfândega já depois do STA ter proferido os seus três primeiros acórdãos sobre a matéria, em que rompia com a sua tradicional jurisprudência e, aderindo às considerações do TJCE no caso A. Gomes Valente, iniciava uma nova jurisprudência, passando a julgar o IA contrário ao DC – já não se fundamenta em considerações do TJCE, mas na nova jurisprudência do STA, sustentada em três acórdãos que aí são citados e transcritos para além de se basear em considerações jurídicas doutrinárias”.
Continua: “No 2º pedido de revisão, a referência ao acórdão do TJCE é feita pelo STA, na sua própria fundamentação. É o STA que sustenta a sua posição com as considerações do TJCE.” (…) Assim, os seus fundamentos são substancialmente diferentes, pelo que o 2º despacho de indeferimento não é confirmativo do 1º, à luz da doutrina do direito administrativo geral”.
Na sentença recorrida, julgou-se improcedente o presente recurso contencioso, tendo-se exarado:
«Esta decisão de indeferimento e pelos mesmos motivos da segunda, torna esta última, por conseguinte, um acto confirmativo: não há qualidade distinta das competências a que foram ordenados os dois actos, que não são substancialmente diferentes, nem autónomos, um em relação ao outro.
(…)
Eis pois: o acto recorrido, sendo meramente confirmativo, está ferido pelo decurso do tempo, sob o ponto de vista da sua recorribilidade: passaram, antes de mais, há muito tempo, os dois meses que a lei assina ao contribuinte para a discordância que teria de manifestar em face do primeiro despacho: consolidou-se na Ordem Jurídica.»
Ponderando, diremos que, no que à fundamentação diz respeito, já que o Recorrente admite existir identidade quanto aos demais elementos caracterizadores, a do 2º pedido é idêntica à do 1º pedido de revisão, já que ambas radicam na jurisprudência do TJCE.
A referência que o Recorrente faz, no seu 2º pedido de revisão, à jurisprudência do STA, torna-se manifestamente irrelevante para o efeito que ora estamos a considerar: por um lado, à data em que efectuou o 1º pedido de revisão (18/04/2001), já esse era o entendimento do STA sobre a questão, como se pode verificar pela leitura dos acórdãos de 04/04/2001, proferidos nos Processos nº 22 367 e 22 397 e de 26/04/2001, proferido no Processo nº 22 711 ( Consultáveis na íntegra em http://www.dre.pt/pdfgratisac/2001/32320.pdf ); por outro lado, o STA limita-se, nestes acórdãos e nos subsequentes, a subscrever a posição jurídica definida no acórdão do TJCE.
Como bem refere o magistrado do M. Público, “tendo o recorrente indicado como fundamento do seu 1º pedido de revisão a jurisprudência do TJCE definida no caso “A. Gomes Valente”, a mera referência à jurisprudência do STA feita no segundo pedido de revisão não consubstancia qualquer novidade de fundo relativamente à respectiva fundamentação de direito.”
Concluímos, pois, que o acto recorrido, por meramente confirmativo, nada inova na Ordem Jurídica, sendo irrecorrível, como bem se decidiu, já que do acto confirmado não foi interposto recurso no prazo legal.

IV
Termos em que se nega provimento, com a presente fundamentação, ao recurso jurisdicional.
Custas pelo Recorrente, fixando nesta instância a taxa de justiça em 4 (quatro) UC.
Notifique e registe.
Porto, 25 de Junho de 2009
Ass) Moisés Moura Rodrigues
Ass) José Maria Fonseca Carvalho
Ass) Aníbal Augusto Ruivo Ferraz