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Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01121/10.7BEBRG
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:04/21/2016
Tribunal:TAF de Braga
Relator:Rogério Paulo da Costa Martins
Descritores:PEDIDO DE LICENCIAMENTO; DEFERIMENTO TÁCITO;
ARTIGO 24º, Nº 1, ALª A), DO DECRETO-LEI Nº 555/99, DE 16.12
Sumário:Face ao disposto no artigo 24º, nº 1, alª a), do Decreto-Lei nº 555/99, de 16.12, é ilegal o eventual deferimento tácito de um pedido de licenciamento que viole plano municipal de ordenamento do território, servidão administrativa, restrição de utilidade pública ou quaisquer outras normas legais e regulamentares aplicáveis. *
* Sumário elaaborado pelo Relator.
Recorrente:Empresa de Águas do Gerês, S.A.
Recorrido 1:Município de Terras de Bouro; e PMRC.
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Execução de Sentença
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido de ser dado provimento ao recurso e, consequentemente, ser ordenada a baixa dos autos ao tribunal recorrido para continuação da execução, se nada mais obstar a tal.
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Decisão Texto Integral:EM NOME DO POVO

Acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:
Empresa das Águas do Gerês, S.A, veio interpor o presente RECURSO JURISDICIONAL do saneador-sentença proferido pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, de 07.12.2010, pelo qual foi julgada improcedente a presente execução intentada contra o Município de Terras de Bouro e em que foi indicado como contra-interessado PMRC, absolvendo o executado do pedido, por inexistência de título que fundamentasse a execução.

Invocou para tanto e, em síntese, que a decisão recorrida violou o disposto no artigo 43º nº 1 da Lei nº 107/2001, de 08.09, e nos artigos 18º nº 2, 24º, nº 1, alª a) e 68º, alª c), do Decreto-Lei nº 555/99, de 16/12, na redacção aplicável à altura dos factos e bem ainda o estatuído nos artigos 58º, 59º e 60º do Regulamento Geral das Edificações Urbanas citados na secção II das presentes alegações, e bem ainda o nº 3 do artigo 22º, secção I do capítulo III do Regulamento do Plano Director Municipal de Terras de Bouro, tendo também feito uma errada interpretação do âmbito de aplicação do artigo 114º, nº 2, do Regime Jurídico da Urbanização e da Edificação que não comporta o entendimento de que a entidade administrativa está obrigada a emitir actos confirmativos de indeferimentos anteriores sob pena destes se convolarem tacitamente em deferimentos.

O recorrido PMRC contra-alegou, pugnando pela manutenção do saneador-sentença recorrido.

O recorrido Município de Terras de Bouro não contra-alegou.

O Ministério Público neste Tribunal emitiu parecer no sentido de ser dado provimento ao recurso e, consequentemente, ser ordenada a baixa dos autos ao tribunal recorrido para continuação da execução, se nada mais obstar a tal.

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Cumpre, pois, decidir já que nada a tal obsta.
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I - São estas as conclusões das alegações que definem o objecto do presente recurso jurisdicional:

1ª - Resulta do processo administrativo apenso que a construção clandestina levada a cabo pelo contra-interessado nunca veio a ser licenciada.

2ª - E nem o podia ser, pois a construção efectuada não cumpre as normas regulamentares invocadas na secção 2ª das presentes alegações e que aqui se dão por reproduzidas, nem obteve parecer favorável junto do IPPAR.

3ª - Efectivamente, tal como foi alegado pela autora na petição inicial (vd. documento nº 2) e resulta do ofício do IPPAR de 12.06.2006 junto ao processo administrativo, o Hotel Águas do Gerês, explorado pela autora, constitui um imóvel em vias de classificação pelo IPPAR conforme despacho de abertura de 07.07.2004 do Presidente do IPPAR, estando o edifício onde o contra-interessado levou a cabo as obras de construção em betão armado, abrangido por uma servidão administrativa de ordem cultural.

4ª - Conforme se estipula no artigo 43º nº 1 da Lei nº 107/2001 de 08 de Setembro (Estabelece as bases da política e do regime de protecção e valorização do património cultural), é obrigatório e vinculativo o parecer do IPPAR relativamente a obras de construção em zona de protecção de imóvel em vias de classificação como de interesse municipal.

5ª - Pelo que a obra não era susceptível de legalização, face ao disposto nos artigos 18º, nº 2, e 24º, nº 1, alª a), do Decreto-Lei nº 555/99, de 16.12, na redacção aplicável à altura dos factos, e atenta a nulidade prevista no artigo 68º alª c) do referido Decreto-Lei nº 555/99.

6ª - Assim, e ao invés do alegado pelo contra-interessado na contestação, entendimento que a sentença recorrida sufragou, não ocorreu o deferimento tácito do licenciamento, uma vez que, tal como consta do respectivo processo administrativo, a Câmara Municipal proferiu dois actos administrativos:

a) Um, onde considerou que a edificação não era susceptível de legalização “por não respeitar os afastamentos legalmente impostos aos prédios vizinhos”, pelas razões que se enunciaram desenvolvidamente na secção 2 das presentes alegações;

b) Outro, onde ordenou a demolição da construção.

Estes dois actos administrativos foram comunicados ao contra-interessado.

7ª - Ora, precisamente pelo facto de o projecto de licenciamento de obras particulares do contra-interessado não ser susceptível de legalização, e devido ao contra-interessado ter efectuado a construção clandestinamente, ou seja, sem sequer ter promovido qualquer projecto de licenciamento, é que a ré emitiu o acto exequendo, de demolição do ilegalmente edificado, acto cuja execução foi requerida.

8ª - O aludido acto administrativo da Câmara Municipal notificado pelo ofício de 25 de Junho de 2008, refere expressamente que a construção da edificação efectuada pelo contra-interessado é insusceptível de legalização, motivo pelo qual notificou o contra-interessado para proceder à respectiva demolição, repondo o terreno no seu estado anterior – vd. processo administrativo.

9ª - Ao contrário do entendimento da douta sentença recorrida, a Câmara Municipal não tinha o dever de apreciar a reclamação e de voltar a indeferir o que já tinha sido indeferido.

10ª - E isto tanto mais quanto é certo que a Câmara Municipal tinha ido muito para além do indeferimento, pois tinha inclusivamente proferido um acto administrativo onde considerava que a obra era “insusceptível de legalização”.

11ª - O acto administrativo onde se declara a obra não passível de ser legalizada consubstancia o indeferimento do licenciamento.

12ª - Uma vez que a Câmara já tinha proferido esse acto administrativo e se, conforme se vê do processo administrativo, o contra-interessado nenhum outro elemento juntou quer com a reclamação, quer depois dela, passível de alterar o acto administrativo, o deferimento tácito da reclamação e do licenciamento da obra nunca poderia ocorrer, como a decisão recorrida entendeu.

13ª - Não pode ser objecto de uma aprovação tácita uma obra ilegal e que já anteriormente foi expressamente indeferida e onde, para além das inúmeras ilegalidades apontadas na secção 2ª das presentes alegações, faltava o parecer do IPPAR.

14ª - Pelo exposto, nunca por nunca a reclamação do acto que ordenou a demolição e comunicou o não licenciamento da obra por a mesma não ser legalizável, podia ter sido tacitamente deferida.

15ª - A Câmara Municipal não tinha qualquer dever de estar a confirmar, através de um novo acto administrativo, o indeferimento do licenciamento quando declarou que a obra era impossível de legalizar: uma obra ilegal, que viola várias normas regulamentares, não pode “transmutar-se” numa obra lícita só porque o seu autor insiste em reputar como legal aquilo que a entidade administrativa que tem o poder/dever de licenciar já decidiu “não ser passível de se tornar legal”.

16ª Decidindo, como decidiu a sentença recorrida violou o disposto no artigo 43º, nº 1, da Lei nº 107/2001, de 08.09, e nos artigos 18º, nº 2, 24º, nº 1, alª a), e 68º, alª c), do Decreto-Lei nº 555/99, de 16.12, na redacção aplicável à altura dos factos e bem ainda o estatuído nos artigos 58º, 59º e 60º do Regulamento Geral das Edificações Urbanas citados na secção II das presentes alegações, e bem ainda o nº 3 do artigo 22º, secção I do capítulo III do Regulamento do Plano Director Municipal de Terras de Bouro, tendo também feito uma errada interpretação do âmbito de aplicação do artigo 114º, nº 2, do Regime Jurídico da Urbanização e Edificação que não comporta o entendimento de que a entidade administrativa está obrigada a emitir actos confirmativos de indeferimentos anteriores sob pena destes se convolarem tacitamente em deferimentos.
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II – Matéria de facto.

Ficaram provados os seguintes factos, sem reparos nesta parte:

1. No âmbito do processo administrativo de licenciamento do Município de Terras de Bouro, nº 185/2005, relativo à obra de alteração e remodelação da “Gelataria G...”, foi o contra-interessado notificado, em 26.06.2008 de um despacho, de 25.06.2008, do Vice-Presidente da Câmara Municipal de Terras de Bouro, com o seguinte teor:

“Assunto: Obras Clandestinas – Proc. 185/2005

Procedeu V. Exa. à construção de uma edificação, de um piso, adossado ao alçado principal de uma unidade hoteleira designada por Pensão G..., estruturado em betão armado, capeada a placagem de granito, com vãos preenchidos em caixilharia metálica e vidro duplo e área de implantação da ordem dos oitenta metros quadrados, sem que para tal tivesse obtido o necessário licenciamento municipal.

Considerando que os trabalhos executados são insusceptíveis de legalização, fica Vª Exª notificado para proceder à sua demolição, no prazo de 60 dias a contar da notificação do presente despacho, repondo o terreno no seu estado anterior, nos termos do art. 106º do DL nº 555/99, de 16 de Dezembro, alterado pela Lei nº 60/2007, de 04 de Setembro.

O não acatamento voluntário deste despacho, implicará a execução coerciva da demolição pelo Município, directamente ou com recurso a empreitada de terceiros, tomando para o efeito posse administrativa do imóvel, com imputação das despesas a V. Exa., as quais serão cobradas judicialmente, se necessário, com base no nº 4 do supra citado normativo (fls 280 do p.a.).

2. Notificado do despacho acabado de referir, o contra-interessado apresentou reclamação dirigida ao Presidente da Câmara Municipal de Terras de Bouro que consta de fls. 282 a 294 do processo administrativo e que aqui se considera integralmente reproduzida.

3. Sobre esta reclamação não recaiu qualquer decisão.


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III - Enquadramento jurídico.

Dispunha o art. 157º nº 3 do CPTA/2002, aplicável por força do disposto no art. 15º nº 2 do Decreto-Lei nº 214-G/2015, de 2 de Outubro: “Quando haja acto administrativo inimpugnável de que resulte um direito para um particular e a que a Administração não dê a devida execução…pode o interessado lançar mão das vias previstas no presente título para obter a correspondente execução judicial.”

É requisito essencial da execução judicial de um acto administrativo que o mesmo exista e seja inimpugnável.

O acto que a recorrente alega ser inimpugnável é o despacho do Vice-Presidente da Câmara Municipal de Terras de Bouro que notificou o Contra-Interessado para proceder à demolição da obra referida no primeiro facto dado como provado, por ter considerado tratar-se de obra insusceptível de legalização, nesse acto não se alegando as razões dessa insusceptibilidade de legalização.

O contra-interessado apresentou reclamação desse mesmo acto dirigida ao Presidente da Câmara Municipal de Terras de Bouro, com data de entrada na Câmara Municipal de Terras de Bouro no dia 07.08.2008, que nunca foi decidida.

Preceitua o artigo 114º nº 2 do Regime Jurídico da Urbanização e Edificação, aprovado pelo Decreto-Lei nº 555/99, de 04/09:

A impugnação administrativa de quaisquer actos praticados ou pareceres emitidos nos termos do presente diploma deve ser decidida no prazo de trinta dias, findo o qual se considera deferida.

Não tendo havido decisão até à presente data da referida reclamação coloca-se a questão de saber se pode considerar-se ao abrigo da referida disposição legal tacitamente deferida a referida reclamação, onde se pede que seja reconhecido que a obra em causa se encontra tacitamente licenciada.

Defende a recorrente e o Ministério Público que tal obra é insusceptível de legalização, pelo que não pode considerar-se tacitamente licenciada.

Já referimos que o acto administrativo praticado em 25.06.2008 declarou tal obra insusceptível de legalização, mas não fundamenta tal conclusão.

O contra-interessado, na reclamação de tal acto, entrada em 07.08.2008 na Câmara Municipal de Terras de Bouro, pede o reconhecimento de que a obra se encontra tacitamente licenciada, devido ao facto de ter decorrido o prazo de 90 dias prescrito no art. 108º nº2 do Código de Procedimento Administrativo de 1991 para apreciar e decidir o procedimento de licenciamento da construção, pelo que, nos termos do n.º3, al. a) do mesmo artigo, a autorização para a obra é concedida “ex lege” tacitamente, sendo a ordem de demolição ilegal; devido ainda ao facto, sustenta, de tal ordem não ter sido antecedida de prévia audição do contra-interessado, em violação do disposto no artigo 106º nº 3 do Decreto-Lei nº 555/99, de 16.12, alterado pela Lei nº 60/2007, de 04.09, e nos artigos 8º e 100º nº 1 do Código de Procedimento Administrativo de 1991; também porque na fundamentação do acto administrativo em apreciação não foram especificadas as razões de facto e de direito da decisão, ou seja, as concorrentes para a sua formação e que, por isso, constituem a sua total motivação e justificação, violando-se o artigo 125º do referido Código de Procedimento Administrativo e o artigo 268º da Constituição da República Portuguesa e por último porque tal obra não viola qualquer norma do direito civil nem do direito do urbanismo.

Contra isto se insurge a recorrente invocando a violação do disposto no artigo 43º, nº 1, da Lei nº 107/2001, de 08.09 e nos artigos18º nº 2, 24º, nº 1, alª a), e 68º, alª c), do Decreto-Lei nº 555/99, de 16/12, na redacção aplicável à altura dos factos, o estatuído nos artigos 58º, 59º e 60º do Regulamento Geral das Edificações Urbanas citados na secção II das presentes alegações e ainda o nº 3, do artigo 22º, secção I do capítulo III do Regulamento do Plano Director Municipal de Terras de Bouro, tendo também feito uma errada interpretação do âmbito de aplicação do artigo 114º nº 2 do Regime Jurídico da Urbanização e Edificação que não comporta o entendimento de que a entidade administrativa está obrigada a emitir actos confirmativos de indeferimentos anteriores sob pena destes se convolarem tacitamente em deferimentos.

O artigo 43º, nº 1, da Lei nº 107/2001, de 08.09 determina que os bens imóveis classificados nos termos do art. 15º da mesma lei, ou em vias de classificação como tal, beneficiarão automaticamente de uma zona geral de protecção de 50 m, contados a partir dos seus limites externos, cujo regime é fixado por lei.

O artigo 15º, nº 2, do mesmo diploma legal estabelece que os imóveis podem ser classificados como de interesse nacional, público ou municipal.

O Balneário Termal e a Colunata Honório de Lima suportam uma classificação de âmbito nacional.

Foi impugnado pelo contra-interessado que os restantes edifícios, neles incluído o do Hotel da autora, estejam classificados ou em vias de classificação de interesse nacional, público ou municipal.

Certo que à data em que foi praticado o acto administrativo exequendo – 25.06.2008 -, já a lei não exigia a obtenção prévia para obter o licenciamento de obra particular do parecer do Instituto Português do Património Arquitectónico, exigido pelo artigo 18º nº 2 do Regime Jurídico da Urbanização e Edificação, na redacção anterior à revogação que dele foi feita pela Lei nº 60/2007, de 04.09, em vigor a partir de 04.03/2008 – artigo 7º desta lei.

Esta lei revogou tal exigência e era a aplicável à data em que foi ordenada a demolição ao contra-Interessado – 25.06.2008-, segundo o princípio tempus regit actum.

A lei, no artigo 24º, nº 1, alª a), do Decreto-Lei nº 555/99, de 16.12 impõe o indeferimento do pedido de licenciamento quando viole plano municipal de ordenamento do território, servidão administrativa, restrição de utilidade pública ou quaisquer outras normas legais e regulamentares aplicáveis.

Já vimos que o licenciamento tácito pode ou não violar o artigo 43º nº 1 da Lei nº 100/2001, de 08.09, mas já não o artigo 18º, nº 2, do Regime Jurídico da Urbanização e Edificação.

A recorrente alega ainda, invocando factos relevantes, que o licenciamento tácito viola os artigos 58º, 59º e 60º do Regulamento Geral das Edificações Urbanas e o nº 3 do artigo 22º, secção I do capítulo III do Regulamento do Plano Director Municipal de Terras de Bouro.

Tal alegação consta do artigo 7º da petição inicial executiva e que foi arguido de falso no artigo 111º da contestação apresentada a essa petição, pelo que só podemos concluir se se verificou ou não violação dessas disposições legais e regulamentar depois da produção da prova sobre os factos alegados nesse artigo 7º da mencionada petição inicial executiva.

Impõe-se, pois, anular o saneador-sentença recorrido, que deverá ser substituído por despacho que ordene a produção das diligências de prova sobre os factos alegados no artigo 7º da petição inicial e impugnados no artigo 111º da contestação, nos termos do artigo 177º, nº 4, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos de 2002, aplicável por força do artigo 15º nº 2 do Decreto-Lei nº 214-G/2015, do artigo 712º, nº 4, do Código de Processo Civil de 1995, aplicável por força do disposto no artigo 1º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos de 2002 e artigo 6º, nº 4, da Lei nº 41/2013, de 26.06, uma vez que a produção de prova sobre tais factos é indispensável para a boa decisão da causa.

Com efeito só depois da prova produzida sobre esses factos, poderemos concluir se estamos perante obra susceptível ou insusceptível de legalização, sendo certo que se for susceptível de legalização, por força do disposto no art. 114º, nº 2, do Decreto-Lei nº 555/99, de 04/09, se operou o deferimento tácito da pretensão deduzida na reclamação dirigida à Câmara Municipal de Terras de Bouro, caso contrário, concluindo-se que a obra é insusceptível de legalização, não tem aplicação o disposto no artigo 114º nº 2 do referido diploma, pelo que não havendo deferimento tácito, deverá a execução prosseguir para execução da demolição pedida na petição inicial executiva, constante de acto administrativo inimpugnável datado de 25.06.2008.

Neste último caso, podemos concluir pela inimpugnabilidade porque o mesmo foi notificado ao contra-interessado em 26.06.2008, que dele deduziu reclamação entrada na Câmara Municipal de Terras de Bouro em 07.08.2008.

Esta reclamação suspende o prazo de impugnação contenciosa do acto administrativo, que só retoma o seu curso com a notificação da decisão proferida sobre a reclamação efectuada ou com o decurso do respectivo prazo legal, tal como previsto no artigo 59º, nº 4, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos de 2002.

Esse prazo legal é de 30 dias, conforme previsto no artigo 165º do Código de Procedimento Administrativo de 1991, em vigor à data da dedução da reclamação, pelo que a 17.09.2008 terminou o prazo de suspensão do prazo de impugnação contenciosa, prazo de decisão contado nos termos do artigo 72º nº 1 alªs a), b) e c), do Código de Procedimento Administrativo de 1991, em vigor à data dos factos.

A 18.09.2008 iniciou-se a contagem do prazo para tal impugnação contenciosa, sendo o prazo mais longo de um ano – artigo 58º nº 2 alª a) do Código de Processo nos Tribunais Administrativos de 2002.

Não tendo esta sido deduzida, o acto tornou-se inimpugnável no dia 18.09.2009 (artigo 144º, nº 1, do Código de Processo Civil de 1995, aplicável porque em vigor na referida data), em virtude de todos os fundamentos alegados nessa reclamação, se procedentes, serem susceptíveis de conduzir à anulabilidade do acto e não à sua nulidade, pelo que não são impugnáveis a todo o tempo, como acontece com os actos nulos ou inexistentes – artigo 58º, nº 1, do Código de Processo nos Tribunais Administrativo – mas estão limitados ao referido prazo.

Pela indispensabilidade da produção das diligências instrutórias conforme supra exposto, merece provimento o presente recurso, devendo ser revogado o saneador-sentença recorrido e ordenada essa produção de prova.


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IV - Pelo exposto, os juízes da Secção Administrativa do Tribunal Central Administrativo Norte, acordam em CONCEDER PROVIMENTO ao presente recurso jurisdicional pelo que:

A) Revogam o saneador-sentença recorrido.

B) Determinam a baixa dos autos à primeira instância, para produção de diligências de prova incidentes sobre os factos alegados no artigo 7º da petição inicial, contestados no artigo 111º da contestação e consequente prossecução dos ulteriores termos dos autos nos termos do artigo 177º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos de 2002.

Custas pelo recorrido PMRC, que contra-alegou e decaiu na sua contra-alegação.


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Porto, 21 de Abril de 2016
Ass.: Rogério Martins
Ass.: Luís Garcia
Ass.: Esperança Mealha