Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:03627/11.1BEPRT
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:05/03/2019
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Helena Canelas
Descritores:PRESTAÇÕES POR DESEMPREGO; REGIME APLICÁVEL
Sumário:
I – A lei estabelece como relevante para a determinação do quadro normativo aplicável o momento da apresentação do requerimento de atribuição das prestações de desemprego, nos termos do disposto no artigo 82º nº 1 do DL. n.º 220/2006. O que se compreende já que é com a apresentação de tal requerimento pelo interessado que se inicia o respetivo procedimento administrativo (cfr. artigos 54º e 74º ss. do CPA antigo – DL 442/91 e artigos 53º 102º ss. do CPA novo – DL. nº 4/2015).
II – Pelo que o pedido de atribuição das prestações de desemprego deve ser apreciado de acordo com a lei em vigor no momento em que foi apresentado pelo interessado o respetivo requerimento, e não de acordo com a lei em vigor no momento em que ocorreu a situação de desemprego involuntário. *
* Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:MMCO
Recorrido 1:INSTITUTO DE SEGURANÇA SOCIAL, IP
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Especial para Impugnação de Acto Administrativo (CPTA) - Recurso Jurisdicional
Decisão:
Negar provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido de dever ser negado provimento ao recurso
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:

I. RELATÓRIO
MMCO (devidamente identificada nos autos) instaurou no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto ação administrativa especial contra o INSTITUTO DE SEGURANÇA SOCIAL, IP na qual peticionou a anulação da decisão que lhe foi notificada por ofício do Centro Distrital do Porto, datado de 08/09/2011, através do qual lhe foi deferido o Subsídio de Desemprego Parcial no montante diário de € 23,00 (montante diário do subsídio de desemprego parcial calculado com base no valor de € 37,83 correspondente ao valor diário do subsídio de desemprego a que tinha direito), pelo período de 190 dias, por aplicação do regime introduzido pelo DL nº 72/2010, de 18/06, que alterou o DL nº 220/2006, de 03/11, pugnando que lhe era aplicável a redação que estava em vigor à data em que ficou desempregada (28/02/2009) e não a que estava em vigor quando apresentou requerimento no Centro de Emprego de Matosinhos em 10/11/2010, e que assim o subsídio de desemprego lhe deveria ter sido atribuído por 900 dias e sem cujo montante diário fosse reduzido para 23€.
Por acórdão de 02/07/2015 daquele Tribunal foi a ação julgada improcedente.
Inconformada a autora dele interpôs o presente recurso de apelação, formulando as seguintes conclusões nos seguintes termos:
1. O acto administrativo aqui impugnado é a Decisão do Senhor Director de Segurança Social, notificada em 08.09.2011, que atribuiu à recorrente: (1) um Subsídio de Desemprego Parcial (2) no montante diário de € 23,00 e (3) pelo período de 190 dias., no total de € 4.370,00 (23,00 x 190).
2. Sendo de € 37,83 o montante diário do subsídio de desemprego a que tinha direito.
3. Entende a recorrente que a recorrida lhe deveria ter atribuído: (1) um Subsídio de Desemprego Integral (2) no montante diário de € 37,83 e (3) pelo período de 900 dias, num total € 34.047,00 (37,83 x 900).
4. A diferença de cálculos radica da aplicação ao caso de diferentes versões da lei, no caso o DL 220/2006, de 3/Nov.
5. Sendo entendimento da recorrente que a decisão recorrida está viciada por manifesta violação da lei, no caso os arts. 27.º (na sua redacção original), 37.º/1/d/ii), 77.º/2 e 82.º/1, todos do DL 220/2006 de 3/Nov., razão por que pede que aquele acto seja declarado anulado.
6. Cumulativa, e consequentemente, pede ainda a recorrente a condenação da recorrida a pagar-lhe a quantia de € 29.677,00, como adicional ao valor por este pago com base naquela decisão, acrescida dos respectivos juros moratórios à taxa legal desde a data em que devia ter sido paga e até efectivo embolso.
7. Determina o art. 82.º/1 do DL 220/2006 de 3/Nov. que “Os requerimentos de atribuição das prestações de desemprego são apreciados de acordo com a lei em vigor no momento da sua apresentação”.
8. Tendo o desemprego involuntário da recorrente ocorrido em 1 de Março de 2009 e tendo-se ela apresentado logo de seguida no competente Centro de Emprego de Matosinhos, onde solicitou a atribuição das respectivas prestações de desemprego, a lei então em vigor era o DL 220/2006 de 3/Nov., na sua versão original.
9. Por assim ser, o seu pedido de atribuição das prestações de desemprego deveria ter sido apreciado de acordo com esta lei, na sua versão original, tal como então em vigor.
10. Assim, contando a recorrente 50 anos de idade à data do seu desemprego e um registo (ou equivalência) de remunerações superior a 72 meses, o subsídio de desemprego dever-lhe-ia ter sido atribuído por um período de 900 dias (seu art. 37.º/1/d)/ii);
11. Sendo o valor diário do subsídio de desemprego a que tinha direito (seu art. 28.º), tal como lhe foi comunicado pelo Sr. Director de Segurança Social, de € 37,83, a recorrente deveria ter recebido a título de subsídio de desemprego o valor global de € 34.047,00 (€ 37,83 x 900 dias = € 34.047,00);
12. Não tendo a recorrente celebrado entretanto qualquer contrato de trabalho, não haveria lugar à aplicação de um subsídio de desemprego apenas parcial (seu art. 27.º);
13. Tendo a recorrente tido necessidade de recorrer à ACT (que sucedeu à Inspecção Geral do Trabalho) e ao Tribunal de Trabalho para emissão da Declaração de Situação de Desemprego, o prazo para requerer as prestações (90 dias) é suspenso pelo tempo que medeia entre o pedido do beneficiário e a emissão da declaração por aquela autoridade (seu art. 77.º/2).
14. O acto aqui impugnado limita-se a apreciar e a decidir o pedido da recorrente com base nas alterações introduzidas naquela lei pelos DL 68/2009 de 20/Mar. e DL 72/2010, de 18/Jun., logo posteriores à data do desemprego e apresentação do pedido inicial da recorrente das respectivas prestações sociais, isto apesar de se manter inalterada a redacção do nº 1 do seu art. 82.º, que determina a lei ao caso aplicável.
15. Ao considerar um período de apenas 190 dias para a atribuição do subsídio de desemprego, baseou esta decisão na actual redacção do seu art. 72.º/2, tal como introduzida pelo citado DL 68/2009, mas aqui não aplicável.
16. Ao considerar a atribuição de um subsídio de desemprego apenas parcial, baseou-se ainda a decisão recorrida na actual redacção do art. 27.º/1 do mesmo DL 220/2006, tal como mais tarde aí introduzida pelo DL 72/2010, de 18/Jun. e aqui também não aplicável.
17. Isto por considerar que a recorrente apenas requereu as suas prestações de desemprego na data em que posteriormente o formalizou com a entrega da declaração da sua situação de desemprego (10.11.2010) e que só então logrou obter da ACT, fazendo assim tábua rasa de tudo quanto antes teve de promover, e à Segurança Social comunicou, nomeadamente o processo judicial para reconhecimento como laboral da relação que lhe foi terminada.
18. Mesmo que o art. 72.º/2 do citado DL 220/2006 na sua actual redacção fosse aplicável ao caso, que o não é, não assistia ao Sr. Director de Segurança Social o direito de reduzir o período de concessão das prestações de desemprego, fazendo uma interpretação puramente literal da lei e esquecendo tudo o que se passara entre a data do desemprego e a obtenção, via Tribunal e ACT, da prova da situação de desemprego.
19. Sendo certo que este novo dispositivo que agora limita o período das prestações por demora na sua solicitação, pressupõe naturalmente que o interessado tem condições para o requerer de imediato, à data do desemprego, e que o atraso no seu requerimento formal provém apenas de acto exclusivo e culposo seu, o que aqui não se verificou.
20. Doutro modo estaria a recorrente, para além das muitas despesas e incómodos que sofreu já com todos os descritos procedimentos, a ser ainda injustamente penalizada por uma falta que de modo algum lhe é imputável, mas tão só ao facto de ter havido recusa da sua empregadora em emitir a Declaração da Situação de Desemprego e, assim, ter tido de recorrer à ACT e ao Tribunal de Trabalho para a obter, o que além do mais faz suspender o prazo para as requerer (DL 220/2006, art. 77º/2).
21. Por isto que também a Sentença recorrida não pode fundamentar a sua decisão com base na data em que o requerimento das prestações de desemprego foi formalizado (10.11.2010), alegando que não releva para este efeito a data da inicial apresentação da recorrida para as solicitar (início de Março de 2009), como também reza o referido art. 82.º/1 do mesmo DL 220/2006.
22. Como também não colhe o argumento da Sentença recorrida de que a recorrente se poderia ter-se salvaguardado no permitido pelo n.º 2 do artigo 9.º. segundo o qual: Para efeitos da alínea a) do número anterior, presume-se haver desemprego involuntário desde que o fundamento invocado pelo empregador não constitua justa causa de despedimento por facto imputável ao trabalhador ou, constituindo, o trabalhador faça prova de interposição de acção judicial contra o empregador.”
23. Porquanto este dispositivo legal apenas se insere nas situações em a relação contratual já está reconhecida como laboral e, mesmo neste âmbito, apenas aplicável ao caso de acção judicial para impugnação de justa causa de despedimento por facto imputável ao trabalhador.
24. Sendo que no caso aqui em apreço, o que esteve em causa na via judicial era antes, como diz a própria Sentença, o reconhecimento da existência da relação como laboral, e não a apreciação de uma qualquer justa causa de despedimento, a qual pressupõe o reconhecimento da existência dessa relação laboral, razão por que a recorrente dele não se pôde recorrer.
25. Além de que a situação dos autos - emissão da Declaração de Situação de Desemprego pela ACT (anterior Inspecção Geral do Trabalho) – é especificamente tratada no n.º 2 do art.º 77.º do mesmo DL 220/2006, que, ao invés do decidido, determina a suspensão do prazo para requerer as prestações até à emissão dessa Declaração pela ACT (anterior Inspecção Geral do Trabalho), normativo este que se mantém em vigor.
26. Tece ainda a Sentença algumas considerações sobre o registo de remunerações da recorrente junto do recorrido, alegando que aquela só teria direito a 720 dias de subsídio de desemprego, e não aos 900 dias por si reclamados (DL 220/2006, art. 37º nº1 alínea d) subalíneas i) e ii) consoante o beneficiário conte menos ou mais de 72 meses de registo de remunerações).
27. Sendo certo que, mesmo que só tivesse os tais 48 meses, logo menos de 72, tal não inviabilizava a totalidade do pedido pedido da recorrente com base nos 900 dias, mas tão só a redução do mesmo para o valor equivalente aos 720 dias (€ 37,83 x 720 dias = 27.237,60).
Termina pugnando dever ser concedido provimento ao presente recurso, revogando-se a decisão recorrida, com condenação do réu nos termos peticionados.
*
O recorrido contra-alegou pugnando pela improcedência do recurso, com manutenção da decisão recorrida, formulando a final o seguinte quadro conclusivo:
1.ª O presente recurso jurisdicional foi interposto do douto acórdão de fls., que julgou improcedente a ação administrativa especial interposta pela Recorrente e, em consequência, absolveu o Recorrido dos pedidos formulados;
2.ª Pedidos que se reconduzem à anulação do despacho de deferimento do requerimento de prestações de desemprego, proferido pela Diretora de Núcleo de Prestações de Desemprego do Centro Distrital do Porto, que lhe foi notificado por ofício datado de 08/09/2011, assinado pelo Diretor de Segurança Social e, cumulativamente, a condenação do Recorrido no pagamento da quantia global de € 29.677,00 correspondente à diferença entre o subsídio de desemprego a que, no seu entender, teria direito no valor global de € 34.047,00 e o que, efetivamente lhe foi atribuído e pago, no valor global de € 4.370,00, acrescido de juros moratórios à taxa legal desde a data em que deveria ter sido pago e até efetivo reembolso;
3.ª A questão controvertida nos presentes autos diz respeito ao enquadramento legal ao abrigo do qual o ato administrativo impugnado foi praticado, estando em causa, designadamente, o período de concessão e a modalidade de prestação atribuída à Recorrente;
4.ª O ato administrativo impugnado não padece do vício de violação de lei que lhe é imputado, tendo sido praticado em conformidade com o contexto legal e factual à data verificado pelo Recorrido e, agora, confirmado pelo douto acórdão;
5.ª Atenta a factualidade dada como assente, verifica-se que a Recorrente requereu a atribuição do subsídio de desemprego em 10/11/2010 por ter visto cessar, em 28/02/2009, a relação jurídica laboral constituída com a entidade empregadora PF – Equipamentos Técnicos e Ferragens, Lda. sendo que à data do desemprego – 01/03/2009 – contava com 50 anos de idade;
6.ª À apreciação e decisão do requerimento de prestações de desemprego são aplicáveis, no entender do Recorrido, as disposições do regime jurídico de proteção na eventualidade de desemprego, constantes do Decreto – Lei n.º 220/2006, de 3 de novembro, com as alterações introduzidas posteriormente pelo Decreto-Lei n.º 68/2009, de 20 de março, pela Lei n.º 5/2010, de 5 de maio e pelo Decreto-Lei n.º 72/2010, de 18 de junho (tendo este último diploma iniciado a sua vigência em 01/07/2010);
7.ª Dispõe o artigo 82.º, n.º 1 do citado diploma, na sua versão inicial (e também na versão republicada pelo Decreto – Lei n.º 72/2010, de 18 de junho), em sede de disposições transitórias, que “Os requerimentos de atribuição das prestações de desemprego são apreciados de acordo com a lei em vigor no momento da sua apresentação” e, não, de acordo com a lei em vigor à data da verificação da eventualidade, pelo que o requerimento apresentado em 10/11/2010 foi apreciado e decidido à luz do Decreto-Lei n.º 220/2006, de 3 de novembro, com as alterações legislativas introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 68/2009, de 20 de março, pela Lei n.º 5/2010, de 5 de maio e pelo Decreto-Lei n.º 72/2010, de 18 de junho;
8.ª O Recorrido procedeu à verificação dos requisitos legalmente exigidos para o reconhecimento do direito às prestações de desemprego em consonância com o disposto no n.º1 do artigo 8.º segundo o qual “A titularidade do direito ao subsídio de desemprego (…) é reconhecida aos beneficiários cujo contrato de trabalho tenha cessado nos termos do artigo 9.º, reúnam as respetivas condições de atribuição à data do desemprego e residam em território nacional”, reportando-se, por sua vez, o n.º 1 do artigo 18.º às condições gerais a reunir para o efeito;
9.ª O Recorrido verificou que a Recorrente, na data em que requereu as prestações, fez prova da relação jurídica laboral, da involuntariedade da situação de desemprego em que incorreu e do prazo de garantia necessário;
10.ª Apresentava um registo de 48 meses de remunerações.
11.ª De acordo com os critérios fixados pelo legislador no artigo 37.º do citado diploma, com a redação conferida pelo Decreto-Lei n.º 68/2009, de 20 de março, o período de concessão das prestações a que os beneficiários com idade superior a 45 anos e com registo de remunerações num período igual ou inferior a 72 meses têm direito é de 720 dias por aplicação do consignado no ponto i) da alínea d) do n.º 1 daquele normativo;
12.ª Determina o n.º 1 do artigo 72.º do citado Decreto-Lei que “A atribuição das prestações de desemprego deve ser requerida no prazo de 90 dias consecutivos a contar da data do desemprego e ser precedida de inscrição para emprego no centro de emprego” e o n.º 2 que “A entrega do requerimento ou das provas previstas nos n.ºs 1 e 2 do artigo 78.º após o decurso do prazo previsto no número anterior nos casos em que a mesma seja efetuada durante o período legal de concessão das prestações de desemprego determina a redução no período de concessão das prestações pelo período de tempo respeitante ao atraso verificado”;
13ª Da matéria de facto assente resulta comprovado que a data de apresentação do requerimento de prestações de desemprego corresponde a 10/11/2010;
14.ª Pelo que a Recorrente requereu, tardiamente, a concessão das referidas prestações, dando azo à aplicação da redução legalmente prevista no n.º 2 do artigo 72.º acima citado. Por conseguinte, viu reduzido o período de concessão de 720 para os 190 dias efetivamente concedidos;
15.ª A fim de obstar à aplicação daquela cominação poderia a interessada, em obediência ao disposto no artigo 9.º, n.º 1, alínea a) e n.º 2, alínea a) requerer, no prazo de 90 dias a contar da data do desemprego, a atribuição do subsídio fazendo acompanhar o requerimento de prova da propositura da competente ação judicial contra a sua entidade empregadora e beneficiar, assim, da presunção legal ali prevista pelo legislador quanto à verificação do requisito relativo à involuntariedade do desemprego, o que não sucedeu;
16.ª Pese embora tenha recorrido à intervenção supletiva ACT em consonância com o disposto o artigo 75.º e, posteriormente, à via judicial para ver reconhecida a relação jurídica laboral constituída e a sua cessação, ficou a aguardar pela prolação de sentença para, então, instruir o seu pedido e apresentá-lo junto da entidade legalmente competente;
17.ª É certo que, nos termos do disposto no n.º 2 do artigo 77.º o prazo para requerer a prestações de desemprego previsto pelo artigo 72.º é suspenso pelo “tempo que medeia entre o pedido do beneficiário e a emissão da declaração” pela ACT mas, para que tal suspensão possa operar é necessário que, dela, seja dado conhecimento efetivo à entidade relativamente a qual se pretende fazer valer o direito à suspensão, facto que no caso em apreço não sucedeu;
18.ª Sendo que o que comunicou por escrito ao Recorrido, cuja cópia juntou como documento n.º 4, respeitou à denúncia efetuada contra a sua entidade empregadora com vista à instauração de um processo contraordenacional e, não, com respeito à situação de desemprego em concreto;
19.ª À Recorrente foi atribuído subsídio de desemprego parcial por se ter demonstrado que a mesma apresentou rendimentos de trabalho independente declarados à Administração Tributária e Aduaneira como rendimentos da categoria B, designadamente, por prestações de serviços efetuadas, nos anos de 2008, 2009 e 2010, mantendo, aquela, a qualificação de trabalhadora independente no período compreendido entre 01/01/1985 e 25/06/2012;
20.ª De acordo com a lei aplicável à situação sub judice foi atribuído subsídio de desemprego parcial por exercer a Recorrente atividade profissional por conta própria e estar enquadrada perante a Segurança Social no regime aplicável aos trabalhadores independentes conforme decorre explicitamente do n.º 1 do artigo 27.º, na redação conferida pelo Decreto-Lei n.º 72/2010, de 18 de junho;
21.ª De onde se conclui que o ato administrativo impugnado não padece do vício de violação de lei que lhe imputado porquanto à Recorrente foi reconhecido o direito às prestações de desemprego, na modalidade legalmente prevista para a sua condição e pelo período de concessão previsto com a cominação da redução imperativamente aplicável por força do disposto no n.º 2 do artigo 72.º;
22.ª Consequentemente, improcede totalmente o peticionado pela Recorrente, quer no tocante ao período de concessão das prestações, quer no tocante à modalidade atribuída e paga, assim como improcede, inevitavelmente, o peticionado quanto à diferença de valores por si calculada no montante global de € 29.677,00;
23.ª O ato recorrido foi praticado em conformidade com os factos documentados no processo e o direito aplicável ao caso, constituindo uma manifestação clara do respeito pelo princípio da legalidade, princípio ao qual está o Recorrido constitucionalmente vinculado. Nessa medida, não goza o Recorrido da discricionariedade que é pedida pela Recorrente;
24.ª Está o Recorrido obrigado a cumprir a lei vigente aplicável à data em que o pedido de atribuição de prestações de desemprego foi efetuado, não dispondo de qualquer margem de apreciação para aplicar redações anteriores do diploma;
25.ª Por conseguinte, acompanha o Recorrido a douta decisão proferida pelo Tribunal a quo pois é manifesto que a mesma espelha a mais rigorosa subsunção dos factos provados ao direito aplicável ao caso.
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Remetidos os autos a este Tribunal, em recurso, neste notificada, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 146º e 147º do CPTA, a Digna Magistrada do Ministério Público emitiu Parecer no sentido de dever ser negado provimento ao recurso.
Sendo que dele notificadas as partes nenhuma se apresentou a responder.
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Após redistribuição (cfr. Despacho nº 1/2019 de 04/01/2019 do Exmo. Senhor Juiz Desembargador Presidente deste TCA Norte) foram os autos submetidos à Conferência para julgamento, com dispensa de vistos.
II. DA DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO/das questões a decidir
O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, nos termos dos artigos 144º nº 2 e 146º nº 4 do CPTA e dos artigos 5º, 608º nº 2, 635º nºs 4 e 5 e 639º do CPC novo (Lei n.º 41/2013) ex vi dos artigos 1º e 140º do CPTA.
No caso, em face dos termos em que foram enunciadas pelo recorrente as conclusões de recurso, a questão essencial a decidir é a de saber se o Tribunal a quo ao julgar improcedente a ação, mantendo o ato impugnado com fundamento na não verificação do imputado vício de violação de lei, incorreu em erro de julgamento.
III. FUNDAMENTAÇÃO
A – De facto
O Tribunal a quo deu como provada a seguinte factualidade, assim vertida ipsis verbis no acórdão recorrido:
1. A autora desde 2001 desempenhava funções a “recibos verdes”, para a sociedade PF – Equipamentos Técnicos e Ferragens Ld.ª.
2. Em 28 de Fevereiro de 2009 a PF – Equipamentos Técnicos e Ferragens Ld.ª informou a autora que não necessitaria mais dos seus serviços;
3. A autora, nascida em 17.01.1959, contava assim 50 anos de idade à data;
4. A autora intentou a respectiva acção no tribunal de trabalho e foi proferida sentença.
5. A fim de requerer subsídio de desemprego, a autora solicitou verbalmente “Declaração de Situação de Desemprego” à PF, o que lhe foi recusado com o argumento que, tendo a A. sido remunerada por “recibo verde”, a relação que mantivera não era laboral, razão por que a A. se socorreu do serviço de um advogado que, em seu nome, a pediu por escrito, logo no seguinte dia 11 de Março de 2009 – cfr. doc. nº 2 junto com a p.i. e cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido;
6. Assim, a autora, em 23 de Abril de 2009, solicitou a intervenção da Autoridade para as Condições de Trabalho (ACT), tendo ainda dirigido na mesma data idêntica comunicação ao Centro Regional de Segurança Social do Porto – cfr. docs. nº 3 e 4, juntos com a p.i. e cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido;
7. Com data de 2009/08/13, foi a autora informada pela ACT que, para provar a existência da relação laboral, deveria recorrer ao Tribunal do Trabalho – cfr. doc. nº 5 junto com a p.i. e cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido;
8. O que a autora fez, obtendo Sentença que lhe reconheceu como laboral a referida relação que mantivera com a sua empregadora – cfr. doc. nº 6 junto com a p.i. e cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido;
9. Enviada cópia da sentença ao Centro Distrital de Segurança Social do Porto, foi a autora por este informada de que «a mesma foi remetida para os Serviços de Fiscalização de Lisboa, a fim de ser anexada ao respectivo processo, para os efeitos tidos por convenientes» – cfr. doc. nº 7 junto com a p.i. e cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido;
10. A autora enviou cópia da mesma Sentença à ACT, a quem igualmente enviou cópia da referida informação da Segurança Social – cfr. docs nº 8 e 9 juntos com a p.i. e cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido;
11. A Segurança Social (Departamento de Fiscalização) informou a autora, com data de 27.07.2010, de que a Sentença “(…) irá dar origem ao registo oficioso das declarações de remunerações pelos valores nela indicados, de Março de 2005 a Janeiro de 2009 (…)” – cfr. doc. nº 10 junto com a p.i. e cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido;
12. Com data de 20.09.2010, a autora recebeu da ACT a “Declaração de Situação de Desemprego”, por esta Autoridade emitida, para entrega no Centro de Emprego de Matosinhos, o que ocorreu em 10.11.2010 – cfr. docs nº11 e 12 juntos com a p.i. e cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido;
13. A autora apresentou rendimentos de trabalho independente, declarados à Administração Tributária e Aduaneira como rendimentos da categoria B, designadamente, por prestações de serviços efetuadas, nos anos de 2008, 2009 e 2010 (cfr. docs. a fls. 3 a 12 do p.a., cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido).
14. Segundo informação registada no SISS, a autora manteve a qualificação de trabalhadora independente no período compreendido entre 01.01.1985 e 25.06.2012 (cfr. doc. nº 3, junto aos autos com a contestação e cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido).
15. Com data de 08.09.2011, foi a autora notificada da Decisão do Senhor Director de Segurança Social, segundo a qual:
(1) Lhe fora atribuído o Subsídio de Desemprego Parcial no montante diário de € 23,00;
(2) Que este lhe era concedido pelo período de 190 dias;
(3) Que aquele montante diário do subsídio de desemprego parcial fora calculado com base no valor de € 37,83 correspondente ao valor diário do subsídio de desemprego a que tinha direito - cfr. doc. nº 13 junto com a p.i. e cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido;
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B – De direito
1. Da decisão recorrida
O Tribunal a quo, julgou a ação improcedente, ter considerado ter a entidade demandada feito correta aplicação da lei.
Decisão que tendo por base a matéria de facto que foi dada como provada, que não vem impugnada no recurso, assentou na seguinte fundamentação, que se passa a transcrever:
«(…)
O regime jurídico aplicável à situação em apreço encontra-se previsto no Decreto-Lei n.º 220/2006, de 3 de Novembro, diploma que foi, posteriormente, alterado pelo Decreto-Lei n.º 68/2009, de 20 de Março, pela Lei n.º 5/2010, de 5 de maio, pelo Decreto-Lei n.º 72/2010, de 18 de Junho, pelo Decreto-Lei n.º 64/2012, de 15 de Março, pela Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro e, mais recentemente, pelo Decreto – Lei n.º 13/2013, de 25 de Janeiro.
Este diploma, nos termos do seu artº 1º, nº 1, define o “(…) o quadro legal da reparação da eventualidade de desemprego dos trabalhadores por conta de outrem (…)”
Sobre a lei que se aplica aos requerimentos formulados, dispõe o artigo 82.º, n.º 1, que:
“Os requerimentos de atribuição das prestações de desemprego são apreciados de acordo com a lei em vigor no momento da sua apresentação
(negrito e itálico é sempre de nossa autoria)
Ou seja, à autora aplicar-se-á a redacção em vigor em 10.11.2010 [na redacção entretanto introduzida pelo Decreto-Lei n.º 68/2009, de 20 de Março, pela Lei n.º 5/2010, de 5 de maio e pelo Decreto-Lei n.º 72/2010, de 18 de Junho (tendo este último diploma iniciado a sua vigência em 01.07.2010)].
Conforme veremos infra, este entendimento, por si só, irá condicionar todo o enquadramento a dar à argumentação da autora, com a consequente improcedência da acção e manutenção do acto em crise.
Embora tal seja de certo modo irrelevante para a apreciação da argumentação da autora (o registo ser de 60 em vez de 48 não é determinante, à luz do disposto no artº 37º do DL nº 220/2006, conforme veremos infra) , comecemos pela contabilização do registo de remunerações.
Neste ponto, conforme sublinhado o réu, na sequência da apresentação da sentença proferida pelo Tribunal do Trabalho de Matosinhos, os serviços do réu procederam ao registo oficioso das declarações de remunerações da A., pelos valores indicados na respectiva sentença, para o período compreendido entre Março de 2005 e Janeiro de 2009.
Conforme se explicava no ofício então dirigido à autora, referido em 11. Dos factos provados, acima, o registo das contribuições consideradas prescritas dependia de autorização e do necessário requerimento elaborado para o efeito.
Veja-se, a respeito da prescrição das da obrigação de pagamento das contribuições/quotizações, diz o artº 60º da Lei n.º 4/2007, de 16 de Janeiro, que aprovou as bases gerais do sistema de segurança social, com a epígrafe “Restituição e cobrança coerciva das contribuições ou prestações”, o seguinte:
“(…)
3 — A obrigação do pagamento das quotizações e das contribuições prescreve no prazo de cinco anos a contar da data em que aquela obrigação deveria ter sido cumprida.
(…)”
Daí ter sido contabilizado um registo de remunerações de 48 meses e não dos 60 meses reclamados pela autora.
Da leitura da petição inicial apresentada, resulta que a autora discorda fundamentalmente da contabilização do período de concessão de subsídio (190 dias), em vez dos 720 dias (ou 900 dias, consoante a redacção que se entenda aplicável, nos termos alinhavados acima), uma vez que é a própria lei, na redacção do DL nº 72/2010, no seu artº 37º, que nos diz que:
“1 — O período de concessão do subsídio de desemprego e do subsídio social de desemprego inicial é estabelecido em função da idade do beneficiário e, quer para determinação do período de concessão quer dos acréscimos, do número de meses com registo de remunerações no período imediatamente anterior à data do desemprego, nos seguintes termos:
(…)
d) Beneficiários com idade superior a 45 anos:
i) Com registo de remunerações num período igual ou inferior a 72 meses, 720 dias;
(…)”
No entanto, como salienta a autora no artigo 32º da sua petição inicial, os serviços do réu tiveram em consideração o disposto no nº 2 do artº 72º do DL nº 200/2006, na redacção que lhe foi dada pelo DL nº 72/2010.
Diz este preceito que:
“1 — A atribuição das prestações de desemprego deve ser requerida no prazo de 90 dias consecutivos a contar da data do desemprego e ser precedida de inscrição para emprego no centro de emprego.
2 — A entrega do requerimento ou das provas previstas nos n.ºs 1 e 2 do artigo 78.º após o decurso do prazo previsto no número anterior nos casos em que a mesma seja efectuada durante o período legal de concessão das prestações de desemprego determina a redução no período de concessão das prestações pelo período de tempo respeitante ao atraso verificado.
3 — O requerimento, de modelo próprio, é apresentado no centro de emprego da área da residência do beneficiário ou online no sítio da Internet da segurança social.
(…)”
Mais uma vez, a autora foi prejudicada pela dilação temporal decorrida entre a data do desemprego (28.02.2009) e a data em que formalizou o seu requerimento junto do Centro de Emprego de Matosinhos, em 10.11.2010.
Mas escalpelizemos melhor o raciocínio seguido pelos serviços do réu, de forma a podermos enfaticamente concluir pela ausência de qualquer erro nos pressupostos subjacentes, nesta parte, ao acto em crise.
Ora bem:
Segundo o artº 2º do DL nº 220/2006, “(…) é considerado desemprego toda a situação decorrente da perda involuntária de emprego do beneficiário com capacidade e disponibilidade para o trabalho, inscrito para emprego no centro de emprego”.
Por sua vez, dispõe o n.º 1 do artigo 8.º que “A titularidade do direito ao subsídio de desemprego e subsídio social de desemprego é reconhecida aos beneficiários cujo contrato tenha cessado nos termos do artigo 9.º, reúnam as respectivas condições de atribuição à data do desemprego e residam em território nacional”.
Será “involuntário”, nos termos da alínea a) do nº 1 do artº 9º, o desemprego que resulte de uma das situações taxativamente elencadas no n.º 1 do artigo 9.º, designadamente, quando tal situação decorra da iniciativa do empregador.
Neste caso, à data do desemprego, a autora não obteve a declaração de situação de desemprego e recorreu à via judicial para poder obter o documento que instrui o respectivo pedido.
É para as situações como a da autora, em que se afigura necessário recorrer aquela via para ver reconhecida a existência de uma relação laboral e, consequentemente, reconhecidos todos os inerentes direitos que assistem ao trabalhador, que o legislador salvaguardou o direito ao subsídio de desemprego, nos termos do n.º 2 do artigo 9.º, segundo o qual:
“Para efeitos da alínea a) do número anterior, presume -se haver desemprego involuntário desde que o fundamento invocado pelo empregador não constitua justa causa de despedimento por facto imputável ao trabalhador ou, constituindo, o trabalhador faça prova de interposição de acção judicial contra o empregador
Cabia, portanto, à autora ter interposto a competente acção judicial e, aquando da apresentação do pedido de atribuição de prestações de desemprego, juntar o documento comprovativo da interposição da acção junto do Tribunal do Trabalho de Matosinhos.
Efectivamente, do disposto no n.º 2 do artigo 9.º não resulta que o trabalhador tenha de apresentar uma sentença transitada em julgado para requerer a atribuição do subsídio. Ao invés, o diploma refere claramente que lhe basta, pois, fazer prova da interposição da acção judicial contra o empregador.
Embora, nos termos acima, o artº 72º, nº 2 do DL nº 220/2006 (redacção de 2010), diga que a atribuição das prestações de desemprego deve ser requerida no prazo de 90 dias consecutivos a contar da data do desemprego e ser precedida de inscrição para emprego no centro de emprego” [considerando-se como data do desemprego, conforme preceitua o artigo 21.º, n.º 1, “(…) o dia imediatamente subsequente àquele em que se verificou a cessação do contrato de trabalho” ], este prazo, suspender-se-á, conforme determina o n.º 2 do artigo 77.º, pelo tempo que medeia entre o pedido do beneficiário e a emissão da declaração pela Inspeção-Geral do Trabalho (hoje ACT).
Portanto:
A autora deveria ter, naquele prazo de 90 dias, imposto pelo n.º 1 do artigo 72.º, requerido a atribuição do subsídio de desemprego, bastando-lhe, para tal, apresentar prova da interposição da acção judicial contra o empregador, o que acautelaria o seu direito às prestações pelo período de concessão a que teria direito uma vez que seria do conhecimento oficioso do réu a interposição da referida acção judicial. Uma vez apresentado o pedido, instruído com a dita prova, suspender-se-ia o prazo conforme prescreve o n.º 2 do artigo 77.º.
Nos termos acima adiantados, a autora, ao ter aguardado pela prolação da sentença, sujeitou-se à cominação prevista no n.º 2 do artigo 72.º o qual impõe a redução no período de concessão das prestações pelo tempo respeitante ao atraso verificado, tendo-lhe sido subtraídos os dias em falta ao período de concessão de 720 dias a que teria direito (já vimos que seriam apenas 720 dias, atendendo à aplicação ao caso da redacção prevista no DL 72/2010).
Está assim explicado o porquê da contabilização em 190 dias em vez dos 720 legalmente previstos.
Mais questiona a autora o valor do subsídio atribuído por entender que lhe deveria ter sido deferido o subsídio de desemprego e não, como sucedeu, o subsídio de desemprego parcial.
Note-se que a autora, na sua petição inicial, limita-se a referir que não será de lhe aplicar as regras referentes ao SDP (artº 27º, acima transcrito), apenas porque não se lhe aplica a redacção do DL nº 72/2010, fruto de a sua situação de desemprego remontar a 2009 (argumento acima considerado improcedente).
Ainda assim, procurar-se-á estabelecer a ratio por trás da contabilização do montante do subsídio atribuído em 23€.
É que a autora, como ela mesmo admite na respectiva p.i., apresentou rendimentos de trabalho independente, que foram à data declarados à Administração Tributária e Aduaneira como rendimentos da categoria B, designadamente, por prestações de serviços efectuadas, nos anos de 2008, 2009 e 2010.
Igualmente, segundo informação registada no SISS, a autora manteve a qualificação de trabalhadora independente no período compreendido entre 01.01.1985 e 25.06.2012.
Isto posto, inevitavelmente, a existência de rendimentos provenientes do trabalho independente condicionou a análise do pedido de atribuição de subsídio de desemprego, tendo este sido apreciado e decidido à luz das disposições legais aplicáveis ao subsídio de desemprego parcial.
Sobre o Subsídio de Desemprego Parcial (SDP), vejamos o que nos diz o artigo 27.º do DL n .º220/2006, de 3 de Novembro:
“1- Sem prejuízo do disposto no n.° 4 do artigo 60.° o direito ao subsídio de desemprego parcial é reconhecido a quem seja requerente ou titular de subsídio de desemprego e exerça, ou venha a exercer, uma actividade profissional por conta de outrem a tempo parcial, com um período normal de trabalho semanal inferior ao praticado a tempo completo em situação comparável ou uma actividade profissional independente nos termos previstos no presente diploma, desde que o valor do rendimento relevante do trabalho independente ou da retribuição do trabalho por conta de outrem a tempo parcial seja inferior ao montante do subsídio de desemprego.”.
Mais se diz, no artigo 33.° do Decreto-Lei n.º 220/2006, de 3 de Novembro que:
“O montante do subsídio de desemprego parcial corresponde à diferença entre o montante do subsídio de desemprego acrescido de 35 % do seu valor e a retribuição do trabalho por conta de outrem.
(…)”.
Nesse pressuposto, foi proferida a decisão ora impugnada, nos termos da qual foi atribuído à autora o subsídio de desemprego parcial, no montante diário de € 23,00, em vez dos 37,83€ (valor de remuneração registado oficiosamente).
Faz todo sentido que alguém que exerce uma actividade independente e reúne as condições necessárias para atribuição do subsídio de desemprego tenha direito ao subsídio de desemprego parcial.
Perante a “eventualidade” que constitui a situação de desemprego, a prestação de desemprego visa substituir o rendimento do trabalho que se perdeu, de acordo com o disposto no artigo 6.º do citado diploma legal, no qual se diz o seguinte:
“As prestações de desemprego têm como objectivo:
a) Compensar os beneficiários da falta de retribuição resultante da situação de desemprego ou de redução determinada pela aceitação de trabalho a tempo parcial;
(…).”.
A protecção social através do SDP é assegurada nas situações em que o trabalhador, requerente ou titular de prestações de desemprego exerça uma actividade profissional por conta de outrem a tempo parcial, conforme disposto no n.º 3 do artigo 7.º e artigo 27.º do diploma acima referido.
Por isso, sem mais considerações, julga-se improcedente a argumentação da Autora e consequentemente a presente acção, mantendo-se o acto impugnado
3. Da análise e apreciação do recurso
3.1 A autora, aqui recorrente, pretendendo a anulação da decisão que lhe foi notificada por ofício do Centro Distrital do Porto, datado de 08/09/2011, através do qual lhe foi deferido o Subsídio de Desemprego Parcial no montante diário de € 23,00 (montante diário do subsídio de desemprego parcial calculado com base no valor de € 37,83 correspondente ao valor diário do subsídio de desemprego a que tinha direito), pelo período de 190 dias, pretendendo, em síntese, que tal subsídio apenas lhe foi atribuído por 190 dias em vez dos 900 a que teria direito, por força da aplicação indevida do regime introduzido pelo DL. nº 72/2010, de 18 de Junho, que alterou o DL nº 220/2006, de 3 de novembro, e bem assim quanto ao montante diário, defendendo que não deveria ter sido contabilizado como subsídio de desemprego parcial e, portanto, reduzido para 23€, como sucedeu, propugnando que lhe deveria ter sido aplicada a redação que estava em vigor à data em que ficou desempregada (28/02/2009) e não a que estava e vigor quando em 10/11/2010 apresentou requerimento no Centro de Emprego de Matosinhos, e que assim, por tais motivos, o ato impugnado na ação padece de erro nos seus pressupostos.
3.2 Enfrentando os fundamentos da ação o acórdão recorrido começou por explicitar que o regime previsto no DL. n.º 220/2006, de 3 de Novembro, de proteção social da eventualidade de desemprego dos trabalhadores por conta de outrem, convocado na situação dos autos, foi alterado pelo DL. n.º 68/2009, de 20 de Março, pela Lei n.º 5/2010, de 5 de maio, pelo DL. n.º 72/2010, de 18 de Junho, pelo DL. n.º 64/2012, de 15 de Março, pela Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro e, posteriormente ainda pelo DL. n.º 13/2013, de 25 de Janeiro.
E apoiando-se no disposto no artigo 82º nº 1 do DL. n.º 220/2006 (cuja redação permaneceu inalterada), nos termos do qual “…os requerimentos de atribuição das prestações de desemprego são apreciados de acordo com a lei em vigor no momento da sua apresentação”, o acórdão recorrido considerou que à autora era de aplicar, contrariamente ao por ela defendido, a redação em vigor em 10/11/2010, data em que formalizou o seu requerimento junto do Centro de Emprego de Matosinhos. Tendo, assim, aplicado o regime constante do DL. n.º 220/2006, na versão decorrente das alterações introduzidas pelo DL n.º 68/2009, de 20 de Março, pela Lei n.º 5/2010, de 5 de maio e pelo DL. n.º 72/2010, de 18 de Junho. O que conduziu a julgar improcedente a ação, mantendo o ato impugnado.
3.3 A recorrente renova, em sede do presente recurso, a invocação da ilegalidade da decisão que recaiu sobre o seu pedido de subsídio de desemprego, por lhe ter sido aplicada a versão do DL. n.º 220/2006 resultante das alterações que lhe foram introduzidas por aqueles diplomas, por ser posterior à data do desemprego e à apresentação do pedido inicial, em início de Março de 2009, propugnando não poder ser mantido o acórdão recorrido (vide, designadamente, conclusões 14ª, 15ª, 16ª, 17ª e 21ª das alegações de recurso).
3.4 Independentemente da argumentação jurídica da recorrente, mormente no que tange à circunstância de, após a situação de desemprego, ter que ter recorrido ao Tribunal de Trabalho e à Autoridade das Condições de Trabalho, para obter o reconhecimento judicial da existência de relação de trabalho por conta de outrem e respetivas remunerações e a declaração da situação de desemprego involuntário, o entrave para o sucesso da sua pretensão está em que da factualidade apurada nos autos, tal como levada ao probatório, e que a recorrente não impugna, não decorre que a autora tenha apresentado no início de Março de 2009, como refere, o requerimento de subsídio de desemprego.
Aliás, compulsada a Petição Inicial, constata-se que o que ali alegou, a tal respeito, foi que «logo no início de Março/2009, ao pretender requerer a atribuição do correspondente subsídio de desemprego, tal não lhe foi aceite pelo Centro de Emprego da sua área de residência, com a explicação de que o requerimento teria de ser instruído com a competente “Declaração de Situação de Desemprego”, preenchida e assinada pela sua entidade empregadora, por força do art. 73º/1 do citado Dec-Lei 220/2006, Declaração que à A. não havia sido facultada» (vide artigo 6º da PI).
A autora não chegou, assim, a submeter naquela ocasião, requerimento com vista à obtenção do pretendido subsídio de desemprego. O que só veio a fazer em 10/11/2010.
3.5 A lei estabelece como relevante para a determinação do quadro normativo aplicável o momento da apresentação do requerimento de atribuição das prestações de desemprego, nos termos do disposto no artigo 82º nº 1 do DL. n.º 220/2006.
O que se compreende, já que é com a apresentação de tal requerimento pelo interessado que se inicia o respetivo procedimento administrativo (cfr. artigos 54º e 74º ss. do CPA antigo – DL 442/91 e artigos 53º 102º ss. do CPA novo – DL. nº 4/2015).
Pelo que o pedido de atribuição das prestações de desemprego deve ser apreciado de acordo com a lei em vigor no momento em que foi apresentado pelo interessado o respetivo requerimento, e não de acordo com a lei em vigor no momento em que ocorreu a situação de desemprego involuntário.
3.6 Nos termos do disposto no artigo 72º do DL. n.º 220/2006, o pedido de atribuição das prestações de desemprego, deve ser apresentado em requerimento de modelo próprio no centro de emprego da área da residência do beneficiário (ou online no sítio da Internet da segurança social), no prazo de 90 dias consecutivos a contar da data do desemprego, devendo ser precedido de inscrição para emprego no centro de emprego. Requerimento que deve ser instruído, nos termos do artigo 73º do DL. n.º 220/2006, com informação do empregador comprovativa da situação de desemprego e da data a que se reporta a última remuneração, declaração que incumbe ao empregador emitir e entregar ao trabalhador no prazo de cinco dias úteis da data em que o trabalhador a solicite (cfr. artigo 43º).
3.7 Em caso de impossibilidade ou de recusa por parte do empregador em entregar ao trabalhador tal declaração, a sua emissão compete à Inspecção-Geral do Trabalho, que, a requerimento do interessado e na sequência de averiguações efectuadas junto do empregador, a deve elaborar no prazo máximo de 30 dias a partir do pedido (cfr. artigo 75º). Em tal caso, o prazo de 90 dias (previsto no artigo 72º) para o interessado requerer as prestações de desemprego é suspenso pelo tempo que medeia entre o pedido do beneficiário e a emissão da declaração pela Inspecção-Geral do Trabalho (cfr. artigo 77º nº 2).
Mas estas vicissitudes não operam a modificação do momento que a lei erigiu como relevante para efeitos do quadro normativo temporalmente aplicável, que haverá de ser sempre o momento da apresentação do requerimento de atribuição do subsídio de desemprego, nos termos do artigo 82º nº 1 do DL. n.º 220/2006.
Tem que ter-se, pois, por correto o julgamento feito nesse sentido pelo Tribunal a quo.
3.8 E tendo o ato impugnado aplicado, na decisão do pedido de atribuição de subsídio de desemprego apresentado pela autora em 10/11/2010, os normativos constantes do DL. n.º 220/2006 na versão em vigor àquela data, o que fez corretamente, tinha que improceder a pretensão da autora, como foi decidido pelo acórdão recorrido. O que é de manter.
3.9 Aqui chegados, e sem necessidade de mais considerações, tem que concluir-se, pelos fundamentos sobreditos, pela improcedência do presente recurso.
O que se decide.
***
IV. DECISÃO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo deste Tribunal em negar provimento ao recurso, confirmando-se, pelos fundamentos supra, o julgamento de improcedência da ação feito no acórdão recorrido.
Custas pela recorrente - artigo 527º nºs 1 e 2 do CPC novo (aprovado pela Lei nº 41/2013) e artigos 7º e 12º nº 2 do RCP (artigo 8º da Lei nº 7/2012, de 13 de fevereiro) e 189º nº 2 do CPTA.
Notifique.
D.N.
Porto, 3 de maio de 2019
Ass. Helena Canelas
Ass. Isabel Costa
Ass. João Beato