Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte | |
Processo: | 00245/10.5BEVIS |
Secção: | 2ª Secção - Contencioso Tributário |
Data do Acordão: | 02/26/2015 |
Tribunal: | TAF de Viseu |
Relator: | Paula Moura Teixeira |
Descritores: | OPOSIÇÃO EXECUÇÃO FISCAL GERÊNCIA DE FACTO; ÓNUS DA PROVA; INSUFICIÊNCIA DO PATRIMÓNIO; PRINCÍPIO DA DESCOBERTA DA VERDADE MATERIAL. |
Sumário: | I. Os recursos servem para submeter ao tribunal de recurso a reapreciação das decisões dos tribunais recorridos e não para que aqueles se pronunciem sobre questões novas do objeto do processo, salvo se o conhecimento pelo tribunal de recurso for imposto por lei ou se estiver em causa matéria de conhecimento oficioso, nos termos dos artigos 676º nº 1, 680º nº 1 e 685º, todos do CPC, o que não acontece no presente caso. II. No contencioso tributário vigora o princípio do inquisitório (e da investigação), segundo o qual o tribunal deve realizar ou ordenar oficiosamente todas as diligências que se lhe afigurem úteis para conhecer a verdade relativamente aos factos alegados ou de que oficiosamente pode conhecer [artigo 99º da Lei Geral Tributária e artigo 13º do Código de Procedimento e de Processo Tributário]. III. Não tendo a Recorrente formulado qualquer juízo crítico sobre o decidido pelo tribunal recorrido a propósito da culpa na insuficiência do património da sociedade executada, motivo pelo qual a sentença recorrida será mantida nos seus precisos termos.* * Sumário elaborado pelo Relator. |
Recorrente: | J... |
Recorrido 1: | IGFSS |
Decisão: | Negado provimento ao recurso |
Aditamento: |
Parecer Ministério Publico: |
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Decisão Texto Integral: | Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:
1. RELATÓRIO O Ministério Público junto deste Tribunal teve vista nos autos emitiu parecer no sentido de dever ser negado provimento ao recurso e mantida a sentença recorrida. Colhidos os vistos dos Exmºs Juízes Desembargadores Adjuntos, foi o processo submetido à Conferência para julgamento. 2. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR E DECIDIR Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, nos termos dos artigos 660.º, n.º 2, 684.º, nº s 3 e 4, atuais art.ºs 608.º, nº 2, 635.º, nº 4 todos do CPC “ex vi” artigo 2º, alínea e) e artigo 281.º do CPPT) são: (i) o de saber se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento quando concluiu que a administração tributária fez prova de que o oponente exerceu a gerência de facto da devedora originária; (ii) saber se o tribunal a quo deveria ter conhecido da falta de prova da gerência de facto por parte do oponente dado estar adstrito ao princípio da descoberta da verdade material; (iii) da culpa na insuficiência do património da devedora originária. 3. JULGAMENTO DE FACTO Neste domínio, consta da decisão recorrida o seguinte: II.2.1 Vêm colocadas no presente recurso as questões de saber se a sentença recorrida julgou erradamente ao concluir que a administração tributária fez prova de que o oponente, aqui recorrente, exerceu a gerência de facto da sociedade executada: se o Tribunal deveria ter conhecido da falta de prova da gerência de facto por parte do oponente dado estar adstrito ao princípio da descoberta da verdade material; se o Tribunal incorreu em erro de julgamento ao decidir pela culpa do recorrente na insuficiência do património da devedora originária. Diga-se, desde já que na sentença recorrida foi julgada improcedente a oposição, dado o oponente ter assumido que foi gerente de direito e de facto e não ter logrado ilidir a presunção de culpa prevista no artigo 24º, nº1, alínea b) da LGT. O recorrente discorda do assim decidido, sustentando que a administração tributária não cumpriu o ónus de prova que lhe incumbia, não tendo alegado e muito menos provado a gerência de facto do revertido. Em situação idêntica à destes autos, com excepção da prescrição da dívida, e onde, aliás, figuravam as mesmas partes, pronunciou-se já esta Secção do TCAN, no acórdão proferido no dia 25 de Janeiro de 2013, no processo n.º 248/10.0BEVIS, cuja fundamentação sufragamos sem qualquer reserva de convicção. Tendo em conta a fundamentação jurídica invocada, à qual nada se nos oferece acrescentar, limitar-nos-emos a acompanhar e reproduzir, com as necessárias adaptações, o que aí ficou dito, tendo em vista um interpretação e aplicação uniformes do direito (art.º 8.º, n.º 3, do C.Civil). “Vejamos. Na oposição deduzida à execução fiscal e sobre a qual o tribunal recorrido se pronunciou, o fundamento da ilegitimidade invocado pelo recorrente assentou exclusivamente na falta de culpa pela insuficiência do património da devedora originária, afirmando que sempre exerceu uma gerência de bónus pater famílias, que não teve qualquer responsabilidade pela dissipação patrimonial, não dissipou ou malbaratou, culposamente, o património da devedora originária. Na verdade, apesar de a reversão da execução se ter também fundamentado no exercício da gerência por parte do oponente (cf. despacho de reversão junto aos autos), certo é que nunca o oponente pôs em causa até ao presente recurso que era gerente de facto e de direito da devedora originária. Não tendo nunca o recorrente questionado o exercício da gerência de facto da devedora originária [aliás, a invocação do não exercício da gerência de facto pelo oponente como fundamento da sua ilegitimidade seria até contraditória com a factualidade alegada quanto à ausência de culpa pela insuficiência do património da sociedade executada], essa questão não foi conhecida pelo tribunal recorrido que, a esse propósito, consignou expressamente na sentença recorrida que “No caso dos autos, resulta assumido pelo Oponente que foi gerente de facto e de direito”. Ou seja, nunca até ao presente recurso, o oponente havia invocado o não exercício da gerência de facto da devedora originária, pelo que a questão ora suscitada é uma questão nova. Ora, os recursos servem para submeter ao tribunal de recurso a reapreciação das decisões dos tribunais recorridos e não para que aqueles se pronunciem sobre questões novas do objecto do processo, salvo se o conhecimento pelo tribunal de recurso for imposto por lei ou se estiver em causa matéria de conhecimento oficioso, nos termos dos artigos 676º nº 1, 680º nº 1 e 685º, todos do CPC, o que não acontece no presente caso. Temos, pois, de concluir não podermos conhecer da questão que o recorrente agora pretende ver apreciada [do não exercício da gerência de facto da devedora originária pelo recorrente], que deve ser considerada em sede do presente recurso como questão nova e, por isso, fora do âmbito da possibilidade de apreciação deste tribunal. Com efeito, não pode o tribunal de recurso conhecer de questão que não tenha sido conhecida pelo tribunal de 1ª instância e que não seja do conhecimento oficioso, já que, e conforme resulta do artigo 676º, nº 1 do CPC, os recursos são um meio processual específico de impugnação de decisões judiciais e visam, em geral, e com excepção das questões de conhecimento oficioso, modificar as decisões recorridas e não a produção de decisões, em primeiro grau de jurisdição, sobre matérias não conhecidas por elas - cf. Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário, Anotado e Comentado, Volume IV, 2011, pág. 446. 2.2.2. Aliás, certamente por ter consciência de que tal questão não fora por si alegada, é que o recorrente, invocando o princípio da descoberta verdade material, sustenta que a mesma deveria ter sido conhecida pelo tribunal a quo, independentemente da sua alegação pelas partes [cf. conclusões 19 a 22 das alegações de recurso] Numeração que se mantêm nas alegações do presente recurso.
É certo que no contencioso tributário vigora o princípio do inquisitório (e da investigação), segundo o qual o tribunal deve realizar ou ordenar oficiosamente todas as diligências que se lhe afigurem úteis para conhecer a verdade relativamente aos factos alegados ou de que oficiosamente pode conhecer [artigo 99º da Lei Geral Tributária e artigo 13º do Código de Procedimento e de Processo Tributário]. Todavia, o princípio do inquisitório tem de ser conjugado com o princípio do pedido e com o ónus de alegação dos factos, condições de eficácia do processo. Ou seja, a descoberta da verdade material tem de ser conjugada com os princípios da eficiência e da racionalidade do processo tributário. “O referido dever de investigação, através das diligências ordenadas pelo juiz apenas pode abranger, pois, em virtude da letra da norma, os factos alegados pelos participantes processuais ou que, nos termos de lei expressa, sejam do conhecimento oficioso do juiz, como a prescrição, os factos notórios e os factos conhecidos em virtude das suas funções de julgador” (António Lima Guerreiro, LGT anotada, pág. 413/414). E a oposição fiscal está sujeita, salvo algumas excepções, ao princípio do dispositivo de alegação das causas de pedir e do pedido, constituindo causa de pedir o facto ou factos concretos que servem ao efeito jurídico pretendido e que, no caso da oposição, são os factos subsumíveis a qualquer das alíneas do artigo 204º, nº 1 do CPPT. Ora, é na petição que o contribuinte deve expor as razões de facto e de direito que fundamentam o pedido deduzido no processo, ou seja, é na petição que devem ser alegados os factos integrantes da causa de pedir e delineado o pedido que daquele decorre, salvo no caso das excepções previstas nos artigos 272º, 273º e 506º, todos do CPC [aplicáveis ex vi artigo 2º, alínea e) do CPPT]. Por conseguinte, salvo nas situações previstas nos normativos referidos e das questões de conhecimento oficioso, o tribunal só pode conhecer das causas de pedir invocadas na petição inicial. No caso dos autos, na petição inicial foi invocada a ilegitimidade do recorrente mas com fundamento na falta de culpa pela insuficiência do património da sociedade executada e não com fundamento no não exercício da gerência de facto. E foi o fundamento invocado na petição inicial que o tribunal de 1ª instância conheceu e decidiu, não tendo conhecido, nem podido conhecer da causa de pedir que o oponente só agora alegou em sede de recurso. Portanto, o Tribunal de 1.ª instância não conheceu, nem podia conhecer da causa de pedir que o oponente só agora alegou em sede de recurso. Ora, não é pelo facto de o recorrente ter invocado a sua ilegitimidade para a execução que o tribunal pode conhecer dessa causa de pedir com base noutros fundamentos que não os que foram invocados na petição inicial, já que se o fizesse estaria a conhecer de uma causa de pedir que não é do conhecimento oficioso e que não foi oportunamente colocada ao tribunal, violando, assim, o princípio do dispositivo quanto às causas de pedir. Ademais, o oponente não pode usar as alegações de recurso para alterar a causa de pedir nem para pedir a apreciação de causa de pedir que, não tendo sido suscitada na petição inicial, nem conhecida na sentença (nem sendo do conhecimento oficioso), é de considerar como questão nova. Improcede, assim, também este fundamento do recurso.
2.2.3. E quanto à culpa na insuficiência do património da devedora originária, nenhuma censura merece o decidido pelo tribunal de 1ª instância. No caso dos autos, não vem questionado que o prazo legal de pagamento das dívidas exequendas terminou no período do exercício pelo recorrente da gerência da devedora originária, pelo que sendo a situação enquadrável na alínea b) do nº 1 do artigo 24º da LGT para que o oponente/recorrente afastasse a sua responsabilidade subsidiária teria que demonstrar que a falta de entrega da prestação tributária [contribuições à segurança social] não lhe era imputável, o que não logrou fazer. Acresce referir que o recorrente se limita a afirmar nas conclusões 12ª a 16ª Numeração que se mantêm nas alegações do presente recurso
De tudo o que antecede resulta que improcedem, na íntegra, as conclusões do presente recurso jurisdicional. (…)”
Nesta conformidade e subscrevendo a jurisprudência do referido acórdão sem reservas, o presente recurso terá de improceder E assim formulamos as seguintes conclusões: 5. DECISÃO Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal, em negar provimento ao recurso jurisdicional interposto pelo Recorrente, mantendo-se a decisão judicial recorrida.
Porto, 26 de fevereiro de 2015 |