Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:02440/17.7BEPRT
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:10/31/2019
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Maria Fernanda Antunes Aparício Duarte Brandão
Descritores:ACÇÃO ADMINISTRATIVA, FUNDO DE GARANTIA SALARIAL, PROCESSO DE INSOLVÊNCIA, PEDIDO DE NOMEAÇÃO DE PATRONO
Sumário:I-Ao abrigo do disposto no artigo 33º/4 da Lei de Acesso ao Direito e aos Tribunais (LADT), a acção considera-se proposta na data em que foi apresentado o pedido de nomeação de patrono;

I.1-logo, a data de instauração da acção para declaração da insolvência da ex-Entidade Empregadora do Recorrente tem de fixar-se no dia 10 de julho de 2015 e não no dia 10 de fevereiro de 2016;

I.2-o período de referência - fundado no nº 4 do artigo 2º do NRFGS - deverá (por aplicação conjugada com o artigo 33º/4 da LADT) fixar-se entre 10 de janeiro de 2015 e 10 de julho de 2015, o período no qual se integra o dia 04 de março de 2015, o qual, porque determinante do terminus da relação laboral em que era parte o Recorrente, releva para o vencimento dos créditos reclamados;

I.3-a solução plasmada no nº 4 do aludido artigo 33º da Lei 34/2004 radica na necessidade de ao interessado ser nomeado um patrono que lhe proponha a acção; daí que a lei ficcione o pedido de nomeação prévia como constituindo a entrada da petição inicial;

I.4-isso significa que, solicitada a nomeação de patrono no quadro da protecção jurídica antes do decurso do prazo de caducidade do direito de acção queda irrelevante o prazo que decorra entre aquele momento e o da sua propositura pelo patrono que venha a ser nomeado;

I.5-o nº 4 do artigo 33º da LADT encontra-se previsto como salvaguarda constitucional do direito à defesa, pelo que, para os devidos e legais efeitos, a acção de insolvência deverá considerar-se apresentada no dia 10/7/2015;

I.6-motivo pelo qual o período de referência tem de ser fixado entre 10/01/2015 e 10/7/2015 e, em decorrência reconhecer-se que neste período se venceram os créditos reivindicados pelo Autor, emergentes da violação do contrato de trabalho. *
* Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:J. A. G. . S.
Recorrido 1:Fundo de Garantia Salarial
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Comum
Decisão:Conceder provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido do provimento do recurso.
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:
RELATÓRIO
J. A. G. . S., residente na Rua (…) Porto, instaurou acção administrativa contra o Fundo de Garantia Salarial, com sede na (…) Lisboa, pedindo a nulidade/anulação do despacho do Sr. Presidente do Conselho de Gestão do Réu, de 4 de julho de 2017, pelo qual foi indeferido o seu requerimento para pagamento de créditos emergentes de contrato de trabalho, formulado em 12 de janeiro de 2017, e a condenação do Réu a proferir decisão de deferimento do pedido e a pagar-lhe os créditos reclamados, nos valores previstos na lei, acrescidos de juros moratórios contados da data do pedido até efectivo pagamento.
Por sentença proferida pelo TAF do Porto foi julgada improcedente a acção e absolvido o Réu dos pedidos.
Desta vem interposto recurso.
Alegando, Aquele formulou as seguintes conclusões:
– I –
A. Pelo Tribunal a quo foi proferida Sentença (em 11 de março de 2019) que, não obstante julgar «o requerimento do A. (…) tempestivo» (em consonância com o por si alegado), julgou «a presente ação improcedente», advogando – de forma inovadora e, diga-se, surpreendente – que «o Autor não tem direito ao pagamento dos créditos laborais requeridos ao abrigo do artigo 2.o do NRFGS», porquanto «os créditos laborais do Autor se venceram em 4/3/2015, logo antes do período de referência» (fixado, com base no nunca invocado artigo 2.º, n.º 4 do NRFGS, «entre 10/8/2015 e 10/2/2016»).
B. Com o devido respeito, ante a Sentença sindicada, vê-se o Recorrente diante decisão que, a ser mantida, molesta, uma vez mais, os seus direitos e garantias mais básicas (de que depende a sua subsistência), cumulando-se a um conjunto de decisões que, apesar de proferidas, sempre se demonstraram inconsequentes:
a. Viu-se o Recorrente “apanhado em falta” por decisão (inovadora e surpreendente) que, embora juridicamente possível, não se encontrava prevista (ou sequer alegada) e que nem por si (ou pelo Recorrido) havia sido configurada;
b. A interpretação do n.º 4 do artigo 2.º do NRFGS – no sentido que fundou a douta Sentença recorrida – sempre deverá declarar-se inconstitucional e dissonante dos ditames do direito laboral da União Europeia, desde logo, por haver desconsiderado – in totum – o «requerimento de proteção jurídica datado de 10-07-2015», que determinou a «nomeação e pagamento de patrono» e, em resultado, a propositura da ação de insolvência da ex-Entidade Empregadora do Recorrente.
– II –
C. O Recorrente – em consonância com o melhor alegado supra, nos artigos 10. a 51. – adotou, de forma sucessiva, todos os meios processuais adequados e legítimos para o reconhecimento das suas pretensões,
D. sempre atuando de boa-fé, confiando e consultando (apesar dos seus parcos conhecimentos) inúmeras instituições públicas que, perante cada circunstância, o foram aconselhando a atuar num determinado sentido:
a. Num primeiro momento – aconselhado pelo Ministério Público junto do Juízo do Trabalho do Porto –, a promover ação laboral (e não insolvência, para a qual o próprio Ministério Público – se o julgasse adequado e devido – teria legitimidade ativa, em conformidade com o previsto nos artigos 20.º, n.º 1, al. b) e 3.º, n.º 1 do CIRE), que correu termos sob o n.º 12152/15.0T8PRT.
b. Num segundo momento – aconselhado, uma vez mais, pelo Ministério Público junto do Juízo do Trabalho do Porto e, bem assim, pelas funcionárias do Centro Distrital do Porto do Instituto da Segurança Social, I.P. –, a promover ação de insolvência, que correu termos sob o n.º 1176/16.0T8VNG.
– III.I. –
E. O único fundamento invocado pelo Recorrido – seja no despacho proferido pelo Sr. Presidente do respetivo Conselho de Gestão, seja na Contestação remetida aos presentes autos – assentou na alegação de que «o requerimento [do Recorrente] não foi apresentado no prazo de 1 ano a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho, nos termos do n.º 8 do art. 2.º do Dec.–Lei n.º 59/2015, de 21 de abril».
F. Contudo, a tal fundamento – improcedente, como dito – somou-se um outro, invocado (de forma inovadora, surpreendente e sem que o Recorrente haja tido oportunidade de sobre ele se pronunciar) pelo Tribunal a quo: «não resta senão concluir que o Autor não tem direito ao pagamento dos créditos laborais requeridos ao abrigo do artigo 2.o do NRFGS, impondo-se a improcedência do pedido condenatório formulado na presente ação», porquanto «os créditos laborais do Autor se venceram em 4/3/2015, logo antes do período de referência» – fixado, com base no n.º 4 daquele artigo 2.º, «entre 10/8/2015 e 10/2/2016».
Ora, sempre com o devido respeito,
G. O n.º 3 do artigo 3.º do CPC (ex vi artigo 1.º, CPTA) é plenamente aplicável em processo judicial administrativo, tendo como finalidade declarada evitar – proibindo-as – as denominadas decisões-surpresa.
H. Em resultado, caso não haja sido dada a possibilidade – como não foi – ao Recorrente de se pronunciar sobre matéria decisiva para a decisão recorrida, a Sentença incorrerá em nulidade – como incorreu –, por violação do princípio do contraditório e do artigo 3.º do CPC, ex vi artigo 1.º do CPTA,
a qual desde já se requer seja declarada, com as devidas e legais consequências.
– III.II. –
I. Fixando-nos nos termos da Sentença recorrida, «para perscrutar se o vencimento dos créditos ocorreu, ou não, dentro de algum dos períodos de referência legal, importa determinar dois momentos temporais, a saber: a data do vencimento dos créditos laborais e a data da instauração da ação de insolvência»:
a. «Quanto ao primeiro momento temporal, relativamente à data do vencimento dos créditos laborais reclamados, créditos melhor descritos no facto provado n.o 6, uma vez que o contrato de trabalho cessou em 4/3/2015, deve ser esta data a que releva para o vencimento dos créditos laborais».
b. «No que tange ao segundo momento temporal, a ação para a declaração da insolvência da sociedade deu entrada em 10/2/2016»», não obstante o Recorrente ter apresentado, junto do Centro Distrital do Porto do Instituto da Segurança Social, «Requerimento de Proteção Jurídica datado de 10-07-2015», deferido na modalidade de «dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo» e de «nomeação e pagamento da compensação de patrono» (cf. documento 3, junto com a PI).
J. Assim sendo – e uma vez que ao abrigo do disposto no artigo 33.º, n.º 4 da LADT, «a acção considera-se proposta na data em que for apresentado o pedido de nomeação de patrono» – a data de instauração da ação para declaração da insolvência da ex- -Entidade Empregadora do Recorrente deve fixar-se no dia 10 de julho de 2015 (e não no dia 10 de fevereiro de 2016) – isto é, cento e vinte e oito dias depois de ter sido despedido o Recorrente e 4,2 meses após os créditos laborais de que é titular se terem vencido.
K. Contrariamente ao alegado na Sentença proferida pelo Tribunal a quo, o período de referência – fundado no n.º 4 do artigo 2.º do NRFGS – deverá (por aplicação conjugada com o artigo 33.º, n.º 4 da LADT) fixar-se entre 10 de janeiro de 2015 e 10 de julho de 2015,
L. período no qual, como é bom de ver, se integra o dia 04 de março de 2015 – o qual, porque determinante do terminus da relação laboral em que era parte o Recorrente, «releva para o vencimento dos créditos laborais».

Diga-se, a propósito,

M. O artigo 20.º da CRP dispõe que «a todos é assegurado o acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos, não podendo a justiça ser denegada por insuficiência de meio económico»; o n.º 4 do artigo 33.º da LADT encontra-se previsto, por sua vez, como salvaguarda do direito constitucional do direito à defesa, pelo que – para os devidos e legais efeitos – a ação de insolvência, que correu termos sob o processo n.º 1176/16.0T8VNG, na 2.ª Secção do Comércio da Instância Central de Vila Nova de Gaia da Comarca do Porto, sempre deverá considerar-se proposta no dia 10 de julho de 2015, motivo pelo qual deverá julgar-se a presente ação procedente, fixar-se o período de referência – baseado no n.º 4 do artigo 2.º do NRFGS – entre 10 de janeiro de 2015 e 10 de julho de 2015 e, em decorrência, reconhecer-se que neste período se venceram, em favor do Recorrente, créditos laborais no valor global de €22.181,63 - a cujo pagamento, por parte da Recorrida, tem aquele direito.
N. O ora alegado – respeitante à apresentação (e deferimento) do «requerimento de Proteção Jurídica datado de 10-07-2015» – resultava já provado do documento emitido pelo Recorrido e junto com a Petição Inicial apresentada pelo Recorrente, o qual não antes invocou a aplicação conjugada do NRFGS e da LADT por para tanto não ter sido, como se impunha, notificado (seja pelo Fundo de Garantia Salarial – aqui Recorrido –, seja pelo Tribunal a quo – gerador, como se disse, de uma verdadeira decisão-surpresa).

Nestes termos e nos mais e melhores de Direito – que suprirão – deverá o presente recurso ser provido e, em resultado, ser a Sentença do Tribunal a quo declarada nula, porquanto atentatória do princípio do contraditório e do artigo 3.º, n.º 3 do CPC (ex vi art. 1.º, CPTA).
Ademais e ao abrigo do disposto no artigo 149.º/1 do CPTA,
Sempre deverá a Sentença do Tribunal a quo ser – por aplicação conjugada do artigo 2.º, n.º 8 do NRFGS e do artigo 33.º, n.º 4 da LADT – integralmente revogada, condenando-se o Recorrido no pagamento dos valores peticionados no requerimento para pagamento de créditos emergentes do contrato de trabalho, apresentado pelo Recorrente e datado de 23 de dezembro de 2016.
Assim fazendo Justiça!

REQUERIMENTO DE PROVA:
A | Ao abrigo do disposto no artigo 149.º, n.º 4 do CPTA, e se julgado necessário (apesar do alegado supra, nos artigos 62. e 75., e da indicação constante no documento 3, junto com a PI), requer-se seja o Instituto da Segurança Social, I.P. notificado para – com referência ao Processo de Proteção Jurídica com a referência 138603/2015 – remeter aos presentes autos cópia do requerimento (datado de 10 de julho de 2015) que lhe deu origem e do respetivo comprovativo de entrega, por parte do Recorrente.
O Réu juntou contra-alegações, concluindo:
A. O requerimento do A foi apresentado ao FGS em 12.01.2017, altura em que se encontrava em vigor o novo diploma legal regulador do FGS, DL 59/2015, de 21.04 que entrou em vigor no dia 04.05.2015.
B. Assim, o referido requerimento do A foi apreciado à luz deste diploma legal.
C. Este diploma previa um prazo de 1 ano a contar da cessação do contrato de trabalho para que seja apresentado junto dos serviços da Segurança Social o requerimento para pagamento de créditos emergentes pela cessação do contrato de trabalho.
D. De resto, já o anterior regime legal, previsto na Lei 35/2004, de 29/07, estabelecia no seu art.° 319.° 3, um prazo para a apresentação do requerimento para pagamento de créditos emergentes pela cessação do contrato de trabalho, que era de 3 meses antes do termo do prazo de prescrição, ou seja 1 ano a contar da cessação do contrato de trabalho.
E. Deste modo se verifica que sempre existiu um prazo para apresentação dos requerimentos ao FGS, sendo que o actual regime prevê um prazo de caducidade findo o qual cessa o direito de os ex-trabalhadores das EE insolventes requererem o pagamento dos créditos ao FGS.
F. Não tendo aqui aplicação o art.° 297.° do CC, uma vez que à luz dos dois diplomas já se encontra terminado o prazo para apresentação do requerimento ao FGS.
G. Sendo aplicável o novo regime, temos de considerar como estando ultrapassado o prazo para a apresentação dos requerimentos ao FGS, à luz do diploma DL 59/2015, de 21.04 que entrou em vigor no dia 04.05.2015,

Termos em que, e com o suprimento, deve ser feita justiça, mantendo-se a decisão de indeferimento proferida pelo Presidente do Conselho de Gestão do Fundo de Garantia Salarial.
O MP, notificado nos termos e para os efeitos do artº 146º/1 do CPTA, emitiu parecer no sentido do provimento do recurso.
Cumpre apreciar e decidir.
FUNDAMENTOS
DE FACTO

Na decisão foi fixada a seguinte factualidade:
1. Por ofício de 27/02/2015 L. P. – Unipessoal, Lda. procedeu ao despedimento do Autor, cessando o contrato de trabalho em 04/03/2015 – cf. fls. 66 e 67 do suporte físico do processo e fls. 6 e 8 do processo administrativo.
2. Em 12/01/2017 o Autor apresentou ao Réu o requerimento para pagamento de créditos emergentes do contrato de trabalho que consta de fls. 5 do processo administrativo, requerendo o pagamento do montante global de 22.181,63€ - cf. fls. 5 do processo administrativo.
3. Por ofício de 4/7/2017 foi o Autor notificado pelo Instituto de Segurança Social para pronúncia em sede de direito de audiência prévia – cf. fls. 25 do suporte físico do processo.
4. Em 24/07/2017 o Autor apresentou a pronúncia em sede de audiência prévia constante de fls. 12 a 21 do processo administrativo, pugnando pelo deferimento do seu requerimento - cf. fls. 12 a 21 do processo administrativo e fls. 25 verso do suporte físico do processo.
5. Por despacho de 4/7/2017 do Presidente do Conselho de Gestão do Fundo de Garantia Salarial, notificado ao Autor por ofício de 25/7/2017, foi indeferido o requerimento do Autor por não ter sido apresentado no prazo de 1 ano a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho, nos termos do n.º 8 do artigo 2.º do Anexo ao Decreto-Lei n.º 59/2015, de 21 de Abril – cf. fls. 35 a 38 do processo administrativo.
6. Em 14/08/2017 o Autor apresentou reclamação do despacho de indeferimento, anexando cópia da sentença proferida no processo n.º 12152/15.0T8PRT, que correu termos no Tribunal Judicial da Comarca do Porto, Juízo do Trabalho do Porto, Juiz 1, que condenou a L. P. – Unipessoal, Lda. a pagar-lhe a quantia global de 21.606,25 €, a título de créditos salariais e de compensação, acrescidos de juros de mora vencidos e vincendos, resultante dos seguintes créditos:
- 657,64€ de retribuição e subsídio de refeição, pelo trabalho prestado em fevereiro de 2015;
- 3.270 € de subsídios de férias e de Natal dos anos de 2010, 2011 e 2012;
- 1.090€ correspondentes a metade dos subsídios de férias e de Natal dos anos de 2013 e 2014;
- 1.067,29€ de retribuição e subsídio de férias (deduzido de meio duodécimo pago em janeiro de 2015) vencidas em 01/01/2015;
- 250,54€ de retribuições de férias, subsídios de férias e de Natal, proporcionais ao trabalho prestado em 2015 (61 dias), deduzidos de meio duodécimo do subsídio de Natal, pago em janeiro de 2015;
- 13.350,21€ de compensação pelo despedimento por extinção do posto de trabalho;
- 1.308€ de retribuição devida pela inobservância do prazo de pré-aviso - cf. fls. 24 a 33 do processo administrativo.
7. O processo referido no n.º anterior foi interposto em 14/05/2015, tendo a Ré (L. P. – Unipessoal, Lda.) sido citada em 27/05/2015 e a decisão transitado em julgado em 21/09/2015 – cf. fls. 54 e 55 do suporte físico do processo.
8. Em 10/02/2016, o Autor intentou ação destinada à declaração de insolvência da L.P- Unipessoal, Lda., que tramitou sob o n.º 1176/16.0T8VNG no Tribunal Judicial da Comarca do Porto, Juízo de Comércio de Vila Nova de Gaia, Juiz 3, a qual foi declarada em 30/05/2016, transitando em julgado a 22/06/2016, tendo sido reconhecido ao Autor um crédito no valor de 22.181,63€, conforme lista definitiva apresentada pela Sra. Administradora de insolvência em 22/12/2016, tendo sido proferida sentença de graduação de créditos no dia 20/02/2017 e notificada à Insolvente em 23/02/2017 – cf. fls. 70 a 77 do suporte físico do processo.
9. Em 23/12/2016, a Sra. Administradora de insolvência enviou ao A. requerimento do pagamento de créditos emergentes do contrato de trabalho assinado e carimbado – cf. fls. 3 e 5 verso do processo administrativo.
10. O despacho de indeferimento referido em 5) foi mantido por despacho de 15/09/2017 do Presidente do Conselho de Gestão do Fundo de Garantia Salarial, com os fundamentos constantes de fls. 45 e 46 do processo administrativo que se dão aqui por integralmente reproduzidos, decisão notificada ao Autor por ofício de 6/10/2017 - cf. fls. 44 a 47 do processo administrativo e fls. 48 do suporte físico do processo.
X
DE DIREITO
Atente-se no discurso fundamentador da sentença:
Como adiantamos, a questão a decidir nos presentes autos é a de saber se o Autor tem direito ao pagamento por parte do Réu do montante de créditos emergentes do contrato de trabalho solicitado e, nessa medida, se o Réu deve ser condenado à prática do ato de deferimento do pedido apresentado pelo Autor em 12 de janeiro de 2017.
Como decorre da factualidade dada como provada, o indeferimento do requerimento do A. para pagamento de créditos emergentes do contrato de trabalho teve como fundamento a circunstância de o requerimento não ter sido apresentado no prazo de 1 ano a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho, nos termos do n.º 8 do artigo 2.º do Dec.-Lei n.º 59/2015, de 21 de Abril.
Vejamos.
Nos termos do artigo 3.º, n.º 3, al. a) do Decreto-Lei n.º 59/2015 que aprovou em anexo o Novo Regime do Fundo de Garantia Salarial “ficam sujeitos ao novo regime do Fundo de Garantia Salarial, aprovado em anexo ao presente decreto-lei, os requerimentos apresentados após a sua entrada em vigor”.
O artigo 2.º do Novo Regime do Fundo de Garantia Salarial (doravante NRFGS), que define os créditos abrangidos, estabelece no n.º 8 que “O Fundo só assegura o pagamento dos créditos quando o pagamento lhe seja requerido até um ano a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho.”
Este prazo é um prazo de caducidade, fixando a lei o momento a partir do qual o requerente pode pedir ao Fundo o pagamento dos créditos laborais em dívida.
Adicionalmente, nos termos do artigo 1.º, n.º 1 do anexo ao Decreto-Lei n.º 59/2015, de 21 de abril “[o] Fundo de Garantia Salarial (…)assegura o pagamento ao trabalhador de créditos emergentes do contrato de trabalho ou da sua violação ou cessação, desde que seja:
a) Proferida sentença de declaração de insolvência do empregador;
b) Proferido despacho do juiz que designa o administrador judicial provisório, em caso de processo especial de revitalização;
c) Proferido despacho de aceitação do requerimento proferido pelo IAPMEI - Agência para a Competitividade e Inovação, I. P. (IAPMEI, I. P.), no âmbito do procedimento extrajudicial de recuperação de empresas.”, sendo, nos termos do artigo 5.º, n.º 2 do mesmo diploma, o requerimento deve ser instruído, consoante as situações, com os seguintes documentos:
“a) Declaração ou cópia autenticada de documento comprovativo dos créditos reclamados pelo trabalhador, emitida pelo administrador de insolvência ou pelo administrador judicial provisório;
b) Declaração comprovativa da natureza e do montante dos créditos em dívida declarados no requerimento pelo trabalhador, quando o mesmo não seja parte constituída, emitida pelo empregador;
c) Declaração de igual teor, emitida pelo serviço com competência inspetiva do ministério responsável pela área do emprego, quando não seja possível obtenção dos documentos previstos nas alíneas anteriores.”.
Vejamos.
Não obstante o requerimento do A. ter sido apresentado após 4/5/2015, data de entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 59/2015, o seu contrato de trabalho cessou em momento anterior à entrada em vigor do Novo Regime do Fundo de Garantia Salarial e quando ainda estava em vigor a anterior legislação regulamentadora do Fundo de Garantia Salarial que estabelecia também requisitos temporais para apresentação do requerimento junto do Fundo de Garantia Salarial. Com efeito, dispunha anteriormente artigo 319.º da Lei n.º 35/2004, de 29/07, no seu n.º 3, que o Fundo de Garantia Salarial só assegurava o pagamento dos créditos que lhe fossem reclamados até 3 meses da respetiva prescrição.
Estamos, assim, perante uma situação de conflito de leis no tempo, no que se reporta a matéria de prazos. Pelo que, não obstante fiquem sujeitos ao novo regime do Fundo de Garantia Salarial os requerimentos apresentados após a sua entrada em vigor (artigo 3.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 59/2015, de 21 de abril), não pode tal facto sobrepor-se às regras de aplicação da lei no tempo previstas no Código Civil em matéria de prazos.
Ora, dispõe o artigo 297.º, n.º 1 do Código Civil que a “a lei que estabelecer, para qualquer efeito, um prazo mais curto do que o fixado na lei anterior é também aplicável aos prazos que já estiverem em curso, mas o prazo só se conta a partir da entrada em vigor da nova lei, a não ser que, segundo a lei antiga, falte menos tempo para o prazo se completar”.
Considerando o anterior prazo de caducidade do direito a requerer ao Fundo de Garantia Salarial os créditos emergentes do contrato de trabalho, recorde-se que a prescrição que importa apreciar está prevista no artigo 337.º nº 1 do anexo da Lei n.º 7/2009, de 12.02, que aprovou a revisão do Código do Trabalho que dispõe: “O crédito do empregador ou de trabalhador emergente de contrato de trabalho, da sua violação ou cessação prescreve decorrido um ano a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho.”
O contrato de trabalho do Autor cessou em 4/3/2015 pelo que prescreveria em 5/3/2016.
Mas a prescrição interrompe-se pela citação ou notificação judicial de qualquer ato que exprima, direta ou indiretamente, a intenção de exercer o direito (artigo 323º, nº 1, do Código Civil). A interrupção inutiliza para a prescrição todo o tempo decorrido anteriormente, começando a correr novo prazo a partir do ato interruptivo, sem prejuízo do disposto nos nºs 1 (o novo prazo de prescrição não começa a correr enquanto não passar em julgado a decisão que puser termo ao processo) e 3 do artigo seguinte (artigo 326º nº 1 do Código Civil). A nova prescrição está sujeita ao prazo de prescrição primitiva, salvo o disposto no artigo 311º, nos termos do disposto no artigo 326º, nº 2, ambos do Código Civil. Estabelece o artigo 311º, nº 1, do Código Civil que o direito para cuja prescrição, bem que só presuntiva, a lei estabelecer um prazo mais curto do que o prazo ordinário fica sujeito a este último, se sobrevier sentença passada em julgado que o reconheça, ou outro título executivo.
Assim, aquando da entrada em vigor da lei nova em 4/5/2015, o prazo estava em curso e faltavam cerca de 7 meses para o prazo se completar. No entanto, resulta da factualidade dada como provada que em 14/5/2015 o A. instaurou ação que correu termos no Tribunal Judicial da Comarca do Porto, Juízo do Trabalho do Porto, Juiz 1e à qual foi atribuído o n.º de processo 12152/15.0T8PRT, contra a L.P- – Unipessoal, Lda. requerendo a condenação desta ao pagamento de créditos laborais, sendo que a L.P- foi citada em 27/5/2015 e a decisão transitada em julgado em 21/09/2015. Pelo que, o prazo em curso seria interrompido em 27/5/2015, começando novamente a contar após o trânsito em julgado ocorrido em 21/09/2015, contando-se a partir de tal data um prazo de 20 anos (artigo 311.º, n.º 1 do Código Civil), pelo que in casu o prazo da lei antiga apenas prescreveria em 2035, sendo assim de aplicar o prazo da lei nova, contado a partir da sua entrada em vigor nos termos do artigo 297.º, n.º 1 do Código Civil.
Assim, o prazo de caducidade iniciar-se-ia em 4 de Maio de 2015 e caducaria em 4 de Maio de 2016.
Pelo acórdão do Tribunal Constitucional n.º 328/2018 de 27 de junho de 2018, proferido no processo n.º 555/2017, disponível em http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/, foi julgada inconstitucional a norma contida no artigo 2.º, n.º 8, do Decreto-Lei n.º 59/2015, de 21 de abril, na interpretação segundo a qual o prazo de um ano para requerer o pagamento dos créditos laborais, certificados com a declaração de insolvência, cominado naquele preceito legal é de caducidade e insuscetível de qualquer interrupção ou suspensão.
Em tal acórdão se afirma nomeadamente que “na falta de uma opção legislativa expressa, caberá aos tribunais comuns a solução das questões que o presente julgamento deixa em aberto (designadamente, se deve tratar-se de interrupção ou suspensão do prazo, se o efeito interruptivo ou suspensivo em relação a todos os credores pode depender do pedido de declaração e insolvência de um só credor ou de um credor de certa categoria ou até quando se deve verificar a suspensão ou interrupção).”.
Entendemos que a instauração do processo de insolvência e seu decurso, bem como a obtenção de declaração ou cópia autenticada de documento comprovativo dos créditos reclamados pelo trabalhador emitida pelo administrador de insolvência ou pelo administrador judicial provisório, se devem ter por impeditivos do começo do prazo de caducidade para requerimento de créditos laborais ao Fundo de Garantia de Salarial, porquanto se trata, como vimos, de requisitos e documentos necessários ao referido pedido (artigos 1.º, n.º 1, al. a) e 5.º, n.º 2, al. a) do NRFGS supra citados, e a sua falta impede o exercício do direito correspondente.
Nos termos do artigo 329.º do Código Civil, o prazo de caducidade só começa a correr no momento em que o direito puder legalmente ser exercido. Entendemos que a aplicação da solução resultante do artigo 329.º do Código Civil é a que mais se compatibiliza com a proteção dos direitos dos trabalhadores prevista a nível constitucional e da União Europeia, pelo que a aplicaremos in casu, dado que a interpretação do artigo 2.º, n.º 8, sem qualquer interrupção ou suspensão é uma interpretação materialmente inconstitucional (cf. acórdão do Tribunal Constitucional supra citado).
Ora, apenas em 23 de dezembro de 2016, com a receção do requerimento do pagamento de créditos emergentes do contrato de trabalho assinado e carimbado pela Administradora de Insolvência (cf. facto provado n.º 9), estava o A. em condições de exercer o seu direito junto do Fundo de Garantia Salarial, pelo que o prazo de caducidade de 1 ano aplicável se deve começar a contar a partir de tal momento.
Assim, o prazo para reclamação começaria a contar em 24/12/2016 e caducaria em 24/12/2017, pelo que o requerimento do A., tendo sido apresentado em 12/01/2017 (cf. facto provado n.º 2), é tempestivo.
Vejamos agora se o A. tem direito aos créditos reclamados.
O NRFGS prevê a possibilidade de o pagamento de créditos laborais ser efetuado pelo Fundo de Garantia Salarial, em sub-rogação do empregador (v.g. nos casos de insolvência deste), estabelecendo, porém, limites - temporais e quantitativos - a esse pagamento.
No caso concreto, resulta evidente, do probatório assente, que na situação do Autor estão verificados os pressupostos vertidos no artigo 1.º, n.º 1, al. a) do NRFGS, dado que o Autor tem a seu favor determinados créditos emergentes de um contrato de trabalho que cessou e a entidade empregadora foi declarada insolvente, em processo judicial instaurado para o efeito.
No entanto, o Fundo (apenas) assegura “(…) o pagamento dos créditos previstos no n.º 1 que se tenham vencido nos seis meses anteriores à propositura da ação de insolvência ou à apresentação do requerimento no processo especial de revitalização ou do requerimento de utilização do procedimento extrajudicial de recuperação de empresas” (artigo 2.º, n.º 4, do NRFGS), sendo que “Caso não existam créditos vencidos no período de referência mencionado no número anterior ou o seu montante seja inferior ao limite máximo definido no n.º 1 do artigo seguinte o Fundo assegura o pagamento, até este limite, de créditos vencidos após o referido período de referência” (artigo 2.º, n.º 5, do NRFGS).
De acordo com estes preceitos legais, para perscrutar se o vencimento dos créditos ocorreu, ou não, dentro de algum dos períodos de referência legal, importa determinar dois momentos temporais, a saber: a data do vencimento dos créditos laborais e a data da instauração da ação de insolvência.
Quanto ao primeiro momento temporal, relativamente à data do vencimento dos créditos laborais reclamados, créditos melhor descritos no facto provado n.º 6, uma vez que o contrato de trabalho cessou em 4/3/2015, deve ser esta data a que releva para o vencimento dos créditos laborais, tanto mais que, atendendo, designadamente, ao disposto no artigo 337.º, n.º 1, do Código do Trabalho, a data da cessação contratual consubstancia o momento da concentração e do início da exigibilidade dos créditos laborais e, portanto, o “momento em que a obrigação deve ser cumprida” –cf. Galvão Teles, in Direito das Obrigações, 5.ª edição, página 217.
No que tange ao segundo momento temporal, a ação para a declaração da insolvência da sociedade deu entrada em 10/2/2016.
Assim, o período de referência situa-se entre 10/8/2015 e 10/2/2016, impondo-se, assim, concluir que, in casu, não existem créditos laborais vencidos no período de referência mencionado, ou créditos laborais vencidos posteriormente, já que os créditos laborais do Autor se venceram em 4/3/2015, logo antes do período de referência, pelo que o A. não tem direito ao pagamento dos créditos laborais requeridos ao abrigo do artigo 2.º do NRFGS.
Assim, não resta senão concluir que o Autor não tem direito ao pagamento dos créditos laborais requeridos ao abrigo do artigo 2.º do NRFGS, impondo-se a improcedência do pedido condenatório formulado na presente ação.
Improcedendo o pedido condenatório, não serão apreciados os vícios do ato alegados pelo Autor, uma vez que a sua eventual procedência não conduziria à satisfação da pretensão material do mesmo (cf. artigo 66.º, n.º 2, do CPTA).
X
Apesar das diversas falhas assacadas a esta decisão, o seu conhecimento é absolutamente desnecessário, porquanto salta à evidência que a razão está do lado do Apelante.
A questão nuclear do caso concreto consiste em saber se o Autor e ora Recorrente tem, ou não, direito a que o FGS lhe pague os créditos laborais devidos pela insolvente “L.P- Unipesssoal Lda.” face ao disposto no artº 2º/4 do DL 59/2015, de 21/04, ou seja, se os créditos reclamados se venceram, ou não, nos seis meses anteriores à instauração do processo de insolvência.
Da transcrição que fizemos da sentença recorrida ressalta que foi julgada improcedente a excepção de caducidade deduzida pelo Réu, único fundamento da sua contestação; ainda assim, o Tribunal a quo decidiu julgar a acção improcedente por entender que, tendo o processo de insolvência sido instaurado a 10/02/2016 e os créditos se terem vencido a 04/03/2015, o FGS não estava obrigado ao seu pagamento, por se terem vencido anteriormente ao período de referência - 10/08/2015 a 10/2/2016, com fundamento no disposto no artº 2º/4 do DL 59/2015, de 21 de abril.
A este respeito pronunciou-se a Senhora PGA: Muito embora se entenda que nada obsta a que o juiz decida com base num fundamento que as partes nunca invocaram, atento o disposto nos nºs 2 e 3 do artº 5º do CPC e nº 3 do artº 89º do CPTA, o certo é que também lhe competia atender aos factos existentes nos autos que se mostrassem relevantes para determinar qual o período de referência a que se refere o nº 4 do artº 2º do DL 59/2015 e decidir em conformidade sobre os direitos do Autor, o que não sucedeu no caso em apreço.
Tem toda a pertinência esta observação.
Com efeito, muito embora o processo de insolvência só tenha sido instaurado em 10/02/2016, certo é que foram juntos aos autos documentos comprovativos de que, em 10/07/2015, o Autor requereu apoio judiciário, com nomeação de patrono, para intentar a acção de insolvência necessária para pagamento dos seus créditos através do FGS, facto relevante face ao disposto no artº 33º da Lei do Apoio Judiciário, que reza assim:
Artigo 33.º
Prazo de propositura da acção
- O patrono nomeado para a propositura da acção deve intentá-la nos 30 dias seguintes à notificação da nomeação, apresentando justificação à Ordem dos Advogados ou à Câmara dos Solicitadores se não instaurar a acção naquele prazo.
2 - O patrono nomeado pode requerer à Ordem dos Advogados ou à Câmara dos Solicitadores a prorrogação do prazo previsto no número anterior, fundamentando o pedido.
3 - Quando não for apresentada justificação, ou esta não for considerada satisfatória, a Ordem dos Advogados ou a Câmara dos Solicitadores deve proceder à apreciação de eventual responsabilidade disciplinar, sendo nomeado novo patrono ao requerente.
4 - A acção considera-se proposta na data em que for apresentado o pedido de nomeação de patrono. (sublinhado nosso).
Ora, por aplicação do nº 4 deste preceito, o processo de insolvência deve ter-se por instaurado a 10/07/2015, sendo que o período de referência a que alude o o artº 2º/4 do DL 59/2015 se situa entre 10/01/2015 e 10/07/2015, o que equivale a dizer, de forma cristalina, que os créditos do Autor, vencidos em 04/03/2015, cabem dentro do lapso temporal relevante.
Em suma:
-fixando-nos nos termos da sentença, para perscrutar se o vencimento dos créditos ocorreu, ou não, dentro de algum dos períodos de referência legal, importa determinar dois momentos temporais, a saber: a data do vencimento dos créditos laborais e a data da instauração da ação de insolvência;
quanto ao primeiro momento temporal, relativamente à data do vencimento dos créditos laborais reclamados, créditos melhor descritos no facto provado nº 6, uma vez que o contrato de trabalho cessou em 4/3/2015, deve ser esta data a que releva para o vencimento dos créditos laborais; no que tange ao segundo momento, a ação para a declaração da insolvência da sociedade deu entrada em 10/2/2016;
-notório é que o aqui Recorrente apresentou, junto do Centro Distrital do Porto do Instituto da Segurança Social, requerimento de protecção Jurídica datado de 10/07/2015, deferido na modalidade de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo e de nomeação e pagamento da compensação de patrono - (documento 3, junto com a PI);
-assim sendo, ao abrigo do disposto no artigo 33º/4 da Lei de Acesso ao Direito e aos Tribunais (LADT), a acção considera-se proposta na data em que foi apresentado o pedido de nomeação de patrono;
-logo, a data de instauração da acção para declaração da insolvência da ex-Entidade Empregadora do Recorrente tem de fixar-se no dia 10 de julho de 2015 e não no dia 10 de fevereiro de 2016, conforme sentenciado;
-contrariamente a este entendimento, o período de referência - fundado no nº 4 do artigo 2º do NRFGS - deverá (por aplicação conjugada com o artigo 33º/4 da LADT) fixar-se entre 10 de janeiro de 2015 e 10 de julho de 2015, o período no qual se integra o dia 04 de março de 2015, o qual, porque determinante do terminus da relação laboral em que era parte o Recorrente, releva para o vencimento dos créditos reclamados;
-nos termos do estatuído no artigo 11º/1 do CPTA, nos tribunais administrativos é obrigatória a constituição de mandatário;
-a solução plasmada no nº 4 do aludido artigo 33º da Lei 34/2004 radica na necessidade de ao interessado ser nomeado um patrono que lhe proponha a acção; daí que a lei ficcione o pedido de nomeação prévia como constituindo a entrada da petição inicial;
-por força do normativo em presença, no caso de o titular do direito substantivo pedir nomeação de patrono (como pediu) no quadro do apoio judiciário, a acção considera-se instaurada na data em que foi apresentado o referido pedido; isso significa que, solicitada a nomeação de patrono no quadro da protecção jurídica antes do decurso do prazo de caducidade do direito de acção queda irrelevante o prazo que decorra entre aquele momento e o da sua propositura pelo patrono que venha a ser nomeado;
-na verdade, só a partir do momento em que seja nomeado, se encontra o Patrono em condições de praticar os actos processuais - in casu, a propositura da acção de insolvência -;
-o artigo 20º da CRP dispõe que “a todos é assegurado o acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos, não podendo a justiça ser denegada por insuficiência de meio económico”;
-o nº 4 do artigo 33º da LADT encontra-se previsto como salvaguarda do direito constitucional do direito à defesa, pelo que, para os devidos e legais efeitos, a acção de insolvência deverá considerar-se apresentada no dia 10/7/2015;
-motivo pelo qual o período de referência - baseado no artigo 2º/4 do NRFGS - tem de ser fixado entre 10/1/2015 e 10/7/2015 e, em decorrência reconhecer-se que neste período se venceram os créditos reivindicados pelo Autor, emergentes da violação do contrato de trabalho.
Procedem as conclusões deste com o consequente destronar da ordem jurídica da sentença.
DECISÃO
Termos em que se concede provimento ao recurso revoga-se a sentença e julga-se procedente a acção.
Custas pelo Réu/Recorrido.
Notifique e DN.
Porto, 31/10/2019


Fernanda Brandão
Frederico Branco
Nuno Coutinho