Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00708/11.5BEPNF
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:10/31/2019
Tribunal:TAF de Penafiel
Relator:Rogério Paulo da Costa Martins
Descritores:PROGRESSÃO SALARIAL: ORÇAMENTO DE ESTADO PARA 2011; LEI APLICÁVEL.
Sumário:O funcionário que concluiu o mestrado no decurso de 2010, completou o tempo de permanência no 4.º escalão também com efeitos a 2010, e nesse ano se verificaram as demais condições legais, a observação de aulas e a existência de vaga, para lhe ser conferido o direito à progressão ao 5.º escalão, deve ser-lhe reconhecido esse direito, não lhe sendo aplicável, por força da data da decisão que foi tomada sobre o seu requerimento, a artigo 24.º, n.º s 1 e 2, da Lei n.º 55-A/2010, de 31/12 (Lei do Orçamento do Estado para 2011), a vedar essa progressão salarial.*
* Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:Ministério da Educação
Recorrido 1:E.M.O.S.A.
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Especial
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Não emitiu parecer.
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Decisão Texto Integral:EM NOME DO POVO

Acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:

Ministério da Educação veio interpor o presente RECURSO JURISDICIONAL da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel, de 09.05.2013, que julgou totalmente procedente, por totalmente provada, a acção administrativa especial que E.M.O.S.A. intentou contra o Recorrente destinada a impugnar a decisão de 25.05.2011 da Subdirectora do Agrupamento de Escolas de E..., que indeferiu o seu requerimento para a progressão ao 5º escalão de vencimentos do pessoal docente e a condenar o Réu na prática do acto devido conducente à sua progressão ao 5º escalão da Carreira docente, e, consequentemente, condenou o Réu a reconhecer à Autora o direito de progredir para o 5º escalão da carreira docente e a praticar todos os actos conducentes à efectivação do mesmo.

Invocou, para tanto, em síntese, que a sentença recorrida é nula por omissão de pronúncia, por não ter conhecido a excepção da inimpugnabilidade do acto impugnado, alegada pelo Réu, ora Recorrente, por se tratar de acto meramente confirmativo de decisão anterior; que a bonificação do artigo 54º do Estatuto da Carreira Docente decorrente da aquisição do grau de mestre tem de ser requerida e objecto de autorização por quem tem competência para tal que deve verificar a conformidade legal do pedido, nomeadamente se o grau académico está directamente relacionado com a área científica que leciona ou com ciências da educação, que o momento relevante para consideração do grau de mestre é o da data de entrada do requerimento de bonificação; que o artigo 9º nº 1, do Decreto-Lei nº 75/2010, de 23.06, estabelece que “as condições exigidas para a progressão aos 3º, 5º e 7º escalões no nº 3 do artigo 37º do Estatuto da Carreira Docente aplicam-se aos docentes que completem os requisitos gerais para progressão a partir do início do ano escolar de 2010-2011; que a Autora só preencheu os requisitos em 27.12.2010, altura em que requereu tal benefício; que a progressão requerida estava dependente de vaga e que, nos termos do artigo 24º, nº1, da Lei nº 55-A/2010, de 31.12, que aprovou o orçamento do Estado para 2011, estava vedada a prática de quaisquer actos que consubstanciassem valorizações remuneratórias, abrangendo tal proibição, as valorizações e outros acréscimos remuneratórios, designadamente de alterações de posicionamento remuneratório.

A Recorrida contra-alegou, pugnando pela manutenção do decidido e fundamentando que reuniu os requisitos legalmente exigíveis pelo Estatuto da Carreira Docente para lograr a progressão ao escalão seguinte; que requereu expressamente a sua progressão também em 2010; que não existe qualquer omissão de pronúncia, mesmo que existisse, o acto impugnado não é meramente confirmativo de decisão anterior, já que esta consiste numa mera informação interna prestada por um órgão (DREN) que nem sequer versa sobre o procedimento da Recorrida, não tendo sequer qualquer competência na matéria, a qual é do Agrupamento e que a Recorrida completou todos os requisitos legalmente exigíveis e requereu expressamente a sua progressão na carreira durante o ano civil de 2010, antes da entrada em vigor da dita proibição orçamental, pelo que a mesma não tem aqui qualquer aplicabilidade.

O Ministério Público neste Tribunal não emitiu parecer.

A Mmª Juiz a quo pronunciou-se no sentido de a sentença não enfermar de qualquer omissão de pronúncia.
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Cumpre decidir já que nada a tal obsta.
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I - São estas as conclusões das alegações que definem o objecto do presente recurso jurisdicional:

1- O acto impugnado não era susceptível de ser impugnado, pois, mais não era que um acto meramente confirmativo de decisão anterior e a decisão recorrida não se pronunciou sobre esta questão, sendo, por isso, nula.

2- A Autora, através de requerimento, datado de 27.12.2010, solicitou à Directora do Agrupamento de Escolas de E... a bonificação prevista no artigo 54º do Estatuto da Carreira Docente, e obteve a decisão que consta do ofício da Direcção Regional de Educação do Norte de 18.01.2011, onde a Directora da Escola aderiu à fundamentação ali vertida, referindo “Proceder de acordo com a informação …”.

3- O despacho impugnado, que constitui o ofício de 25.05.2011, não é mais do que um acto confirmativo emanado da mesma entidade e dirigido ao mesmo destinatário e que repete, perante os mesmos pressupostos de facto e de direito, o conteúdo e a fundamentação do acto anterior, sem nada acrescentar ou retirar ao conteúdo deste.

4- A bonificação do artigo 54º do Estatuto da Carreira Docente é uma progressão acelerada decorrente da aquisição do grau académico de mestre e, portanto, tem de ser requerida, e naturalmente objecto de autorização por quem tem competência para tal, que verifique a conformidade legal do pedido, nomeadamente, se o grau académico está directamente relacionado com a área científica que leciona ou com ciências da educação.

5- A conclusão do mestrado ocorreu em 17.12.2010 e a Autora requereu em 27.12.2010 a bonificação ao abrigo do artigo 54º do Estatuto da Carreira Docente.

6- O artigo 9º, nº 1, do Decreto-Lei nº 75/2010 estabelece que “as condições exigidas para a progressão aos 3º, 5º e 7º escalões no nº 3 do artigo 37º do Estatuto da Carreira Docente aplicam-se aos docentes que completem os requisitos gerais para progressão a partir do início do ano escolar de 2010-2011.

7- A Autora só preenche os requisitos depois de completar o grau de mestre sendo para o efeito, relevante, o momento em que requerer, ou seja, 27.12.2010.

8- De acordo com o artigo 37º, nº 2, alínea a), a progressão ao 5º escalão estava dependente de vaga.

9- Por outro lado, nos termos do artigo 24º, nº 2, da Lei nº 55-A/2010, de 31.12, que aprovou o Orçamento de Estado para 2011, estava vedada a prática de quaisquer actos que consubstanciassem valorizações remuneratórias, abrangendo tal proibição, as valorizações e outros acréscimos remuneratórios, designadamente de alterações de posicionamento remuneratório.
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II –Matéria de facto.

A decisão recorrida deu como provados os seguintes factos, sem reparos nesta parte:
1.º - A Autora concluiu em 17.12.2010 o grau de Mestre em “Ciências da Educação - Desenvolvimento Curricular” na Universidade do Minho (cf. documento 2 do processo administrativo).

2.º - Em 27.12.2010, a Autora requereu ao Réu a bonificação do tempo de serviço, ao abrigo do artigo 54.º do Estatuto da Carreira Docente (cf. documento 1 do processo administrativo).

3.º - Em 18.01.2011, a DREN elaborou o ofício n.º S/1108/2011, que informa a Directora do Agrupamento de Escolas de E... do seguinte (por excerto):

«…em virtude de a docente ter adquirido o grau de mestre…e apresentado o requerimento, em 27-12-2010, o módulo de tempo de permanência no 4.º escalão reduz um ano, pelo que, ficou cumprido antes de 01-09-2010, não ficando a docente abrangida pelo disposto no n.º 1 do art. 9.º do D.L. n.º 75/2010, de 23/06, isto é, não sujeita a aulas assistidas, nem a obtenção de vaga.
Acresce informar que…a partir de 1 de Janeiro de 2011, é vedada a prática de quaisquer actos que consubstanciem valorizações remuneratórias.»
- (cf. documento 3 do processo administrativo).

4.º - Pelo ofício de 24.01.2011, da Subdirectora do Agrupamento de Escolas de E... para o Director Geral do Gabinete de Gestão Financeira do Réu, foi requerido o seguinte (por excerto):

«…porque a docente cumpriu o módulo de tempo de serviço antes de 01.09.2010 ao adquirir o grau de mestre…em 17.12.2010, mas tendo em conta o art.º 24.º da Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro, que veda a prática de quaisquer actos que consubstanciem valorizações remuneratórias, vimos solicitar autorização para procedermos ao pagamento e progressão ao 5.º escalão do docente em apreço, por se tratar de uma situação em especial (…)»
- (cf. documento 4 do processo administrativo).

5.º - Por ofício do Gabinete de Gestão Financeira do Réu endereçado ao Director do Agrupamento de Escolas de E... foi comunicado o seguinte (por excerto):

«(…)
O n.º 1 do art.º 24.º da Lei n.º 55-A/2010, de 31/12…estabelece que está vedada a prática de quaisquer actos que consubstanciem valorizações remuneratórias, do pessoal identificado no n.º 9 do art.º 19.º da referida Lei.
2. No sentido de esclarecer o alcance da referida disposição legal, foi solicitado parecer à Direcção-Geral da Administração e do Emprego Público.
3. Assim, e até à emissão do referido parecer, não é possível a realização de qualquer pagamento relativo a direitos cujo reconhecimento se deu em 2011, ainda que os requisitos necessários ao seu reconhecimento tenham ocorrido em data anterior a 01/01/2011.
(…)»
- (cf. documento 5 do processo administrativo);.

6.º - Em 18.05.2011, face ao conhecimento que teve da informação supra, a Autora apresentou ao Director do Agrupamento de Escolas de E... um requerimento, solicitando a progressão ao 5.º escalão da carreira docente (cf. documento 8 do processo administrativo).

7.º - Pelo ofício de 25.05.2011, a Subdirectora do Agrupamento de Escolas de E... informa a Autora de «…que a sua pretensão foi indeferida.» - (cf. documento 9 do processo administrativo).
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III - Enquadramento jurídico.

1. Nulidade da sentença por omissão de pronúncia.

Determina a alínea d) do n.º1, do artigo 615º, do Código de Processo Civil (de 2013), aplicável por força do disposto no artigo 1º, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos de 2002, que a sentença é nula quando “O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento”.

Este preceito deve ser compaginado com a primeira parte do n.º2, do artigo 608º, do mesmo diploma: “O juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras”.

Conforme é entendimento pacífico na nossa jurisprudência e na doutrina, só se verifica nulidade da sentença por omissão de pronúncia, a que aludem os citados preceitos, quando o juiz se absteve de conhecer de questão suscitada pelas partes e de que devesse conhecer (cfr. Alberto Reis, Código de Processo Civil anotado, volume V, Coimbra 1984 (reimpressão), p.140; e acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 11.9.2007, recurso 059/07, de 10.09.2008, recurso 0812/07, de 28.01.2009, recurso 0667/08, e de 28.10.2009, recurso 098/09).

O erro de direito não se integra no conceito de falta de fundamentação ou omissão de pronúncia.

O erro no enquadramento jurídico leva à revogação da sentença e não à declaração de nulidade, nos termos da invocada norma da alínea b), do n.º1, do artigo 615º do actual Código de Processo Civil.

A nulidade só ocorre quando a sentença ou acórdão não aprecie questões suscitadas e não argumentos apresentados no âmbito de cada questão, face ao disposto nos artigos 697º e 608º do actual Código de Processo Civil

Efectivamente, o tribunal não tem de se pronunciar sobre todas as considerações, razões ou argumentos apresentados pelas partes, mas apenas fundamentar suficientemente em termos de facto e de direito a solução do litígio.

Questões para este efeito são todas as pretensões processuais formuladas pelas partes, que requerem a decisão do juiz, bem como os pressupostos processuais de ordem geral e os específicos de qualquer acto especial, quando realmente debatidos entre as partes (Antunes Varela, Revista de Legislação e Jurisprudência, Ano 122º, página 112), não podendo confundir-se as questões que os litigantes submetem à apreciação e decisão do tribunal com as razões, argumentos e pressupostos em que fundam a respectiva posição na questão (Alberto dos Reis, obra citada, 143, e Rodrigues Bastos, Notas ao Código de Processo Civil, volume III, 1972, página 228).

No mesmo sentido se orientou a jurisprudência conhecida, em particular os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 09.10.2003, processo n.º 03B1816, e de 12.05.2005, processo n.º 05B840; os acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 21.02.2002, processo n.º 034852 (Pleno), de 02.06.2004, processo n.º 046570, e de 10.03.2005, processo n.º 046862.

Refere a Recorrente que a decisão recorrida padece de nulidade por não se ter pronunciado sobre a excepção dilatória da inimpugnabilidade da decisão impugnada.

Vejamos:

A Mmª Juiz a quo sustenta que a nulidade não se verifica, pois que a excepção da inimpugnabilidade do acto impugnado não tinha que ser decidida na sentença mas no despacho saneador.

Ora, este é tabelar, tendo o seguinte conteúdo:

“O Tribunal é competente em razão da matéria, hierarquia e nacionalidade.
O processo encontra-se isento de nulidades que o invalidem na totalidade.
As partes são dotadas de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e mostram-se regularmente representadas.
Não existem excepções ou questões prévias de que cumpra conhecer e que obstem ao conhecimento do objecto do processo e ao seu prosseguimento.”

A inimpugnabilidade do acto administrativo impugnado é uma excepção dilatória prevista no artigo 89º, nº 1, alínea c) do Código de Processo nos Tribunais Administrativos.

Excepção que, no caso, não foi suscitada no articulado próprio, a contestação e que, por isso, não poderia ter sido suscitada posteriormente, concretamente em sede de recurso jurisdicional, sob pena de se esvaziar de conteúdo útil o disposto no n.º2 do artigo 88º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, que dispõe expressa e inequivocamente que a matéria de excepção como esta em concreto não pode ser suscitada nem decidida depois do despacho saneador.

E, no caso concreto, se no saneador, tabelar, se afirmou a inexistência de matéria de excepção terá de se concluir que o Tribunal se pronunciou pela inexistência, também desta excepção.

O Tribunal não tem de se pronunciar negativamente, por ser materialmente impossível, sobre todas as excepções possíveis que não foram suscitadas.

Não se verifica, pois, a apontada nulidade.

Nem do despacho saneador nem da sentença.

2. Da caducidade do direito de agir.

A Recorrente alega esta caducidade partindo do princípio de que a informação constante do 3º facto dado como provado é o acto administrativo impugnável.

Mas não o é.

É uma mera informação interna, prestada por um órgão, a Direcção Regional de Educação do Norte, que não é dirigida à Autora, não contém qualquer referência ao procedimento administrativo em apreço ou à situação concreta da docente e menos ainda é uma decisão de requerimento da Autora.

Trata-se de um mero acto interno sem qualquer eficácia externa.

Pelo que é notório que não se verifica a caducidade prevista no artigo 58º, nº 2, alínea b), do Código de Processo nos Tribunais Administrativos de 2002.

3. Do mérito do acórdão recorrido.

Dispõe o artigo 54º, n.º1, do Estatuto da Carreira Docente, sob a epígrafe “Aquisição de outras habilitações”:

1 - A aquisição por docentes profissionalizados, integrados na carreira, do grau académico de mestre em domínio directamente relacionado com a área científica que leccionem ou em Ciências da Educação, confere direito à redução de um ano no tempo de serviço legalmente exigido para a progressão ao escalão seguinte, desde que, em qualquer caso, na avaliação do desempenho docente lhes tenha sido sempre atribuída menção qualitativa igual ou superior a Bom.”

Por seu turno determina o artigo 9º, nº 1, do Decreto-Lei nº 75/2010, de 23.06, sob a epígrafe “Normas transitórias de progressão na carreira”:

“As condições exigidas para progressão aos 3.º, 5.º e 7.º escalões no n.º 3 do artigo 37.º do Estatuto da Carreira Docente aplicam-se aos docentes que completem os requisitos gerais para progressão a partir do início do ano escolar de 2010-2011.”

A Autora completou o módulo de tempo de serviço necessário à progressão antes de 01.09.2010, ou seja, antes do início do ano escolar 2010-2011, não ficando assim abrangida pelas condições previstas nas alíneas a) e b) do nº 3 do artigo 37º do Estatuto da Carreira Docente, na versão que lhe foi conferida pelo Decreto-Lei nº 75/2010, de 23.06, por efeito da disposição transitória contida na referida norma do artigo 9º, nº 1, do Decreto-Lei atrás citado:

Com efeito, dispõe o artigo 37º deste Estatuto:

“(…)
3 - A progressão aos 3.º, 5.º e 7.º escalões depende, além dos requisitos previstos no número anterior, do seguinte:
a) Observação de aulas, no caso da progressão aos 3.º e 5.º escalões;
b) Obtenção de vaga, no caso da progressão aos 5.º e 7.º escalões.”

Assim, a progressão da Autora não fica dependente da observação de aulas nem da existência de vaga, como pretende a Recorrente.

Quanto ao artigo 24º, nºs 1 e 2, da Lei nº 55-A/2010, de 31.12, o acórdão recorrido evidencia com clareza o mérito da pretensão da Recorrente, que o Recorrido não chega a conseguir impugnar:

“É certo que o artigo 24.º, n.º 1, da Lei n.º 55-A/2010, de 31/12, que aprovou o Orçamento do Estado para 2011, estabelece no seu n.º 1 que “É vedada a prática de quaisquer actos que consubstanciem valorizações remuneratórias (…)” e que o seu n.º 2 disse que tal proibição “abrange as valorizações e outros acréscimos remuneratórios, designadamente os resultantes dos seguintes actos:
a) Alterações de posicionamento remuneratório, progressões, promoções, nomeações ou graduações em categoria ou posto superiores aos detidos (…)”. Dos preceitos legais acabados de mencionar resulta um princípio geral destinado a proibir as valorizações remuneratórias dos servidores do Estado para o exercício orçamental de 2011, atentos os objectivos de controlo da despesa pública e de redução do déficit do sector público que já então norteavam o poder executivo.
Todavia, pergunta-se. Quis a lei estender aquela proibição ao caso vertente, isto é, também às situações em que o trabalhador tenha preenchido todos os requisitos para alterar a sua posição remuneratória num momento anterior à sua entrada em vigor? Considera-se que não, atendendo-se aos seguintes fundamentos.
Como já vimos, a A., segundo entendeu o próprio R. e em consequência de ter concluído o seu mestrado ainda no decurso de 2010, completou o tempo de permanência no 4.º escalão também com efeitos a 2010 e a tempo de não lhe serem aplicadas as condições já atrás mencionadas (a observação de aulas e a existência de vaga), só não lhe sendo conferido o direito à progressão ao 5.º escalão por ter entendido o Impetrado que a tal vedava a nova lei do Orçamento do Estado para o exercício de 2011.
Sobre a situação presente, entende-se que a Administração deve agir célere e diligentemente no sentido de concretizar um direito conquistado pelo trabalhador à custa do seu esforço e empenho ao nível da formação, num afloramento do princípio da eficiência (celeridade), patente no artigo 10.º do CPA.
Aceitar que o artigo 24.º, n.º s 1 e 2, da Lei n.º 55-A/2010, de 31/12, se aplica a situações como a da A., era o mesmo que deixar os trabalhadores à mercê de actuações desiguais ou, quiçá, arbitrárias da Administração, pois tudo dependeria da “sorte” ou do “azar” do servidor público avaliado pertencer a um organismo mais ou menos diligente, dotado de um departamento de recursos humanos bem ou mal apetrechado, com muito ou pouco serviço, mais lentos ou mais rápidos no expediente.
Não pode ser este o resultado querido pelo legislador, pois, se o foi, criar-se-ia aqui uma clara violação ao princípio da igualdade no tratamento dos trabalhadores que exercem funções públicas, porquanto, não é igual a situação do trabalhador que completou o tempo de serviço antes do início da vigência da lei, da situação doutro trabalhador que apenas a perfez já no decurso do ano de 2011, este sim, claramente proibido de ser valorizado em termos remuneratórios pelo comando legal aqui em causa. O entendimento acima exposto entronca no teor da recomendação da Provedoria de Justiça, proferida no processo n.º R-4015/11 (A4), a que este Tribunal adere por o reputar de adequado e justo face aos princípios aqui invocados, ainda que as situações particulares sejam diversas, pese embora esteja em causa a mesma problemática, isto é, a aplicação do artigo 24.º, n.º s 1 e 2, da Lei n.º 55-A/2010, de 31/12, a valorizações remuneratórias de docentes (recomendação disponível em consulta no sítio da internet da “Provedoria de Justiça”, ínsita no teor do ofício da Provedoria para a Directora-Geral da Administração e do Emprego Público, de 02/11/2011, ofício n.º 014890).
Secundando a Provedoria de Justiça, a concretização da alteração remuneratória da A. não se concretizou em 2010 “por facto não imputável ao trabalhador avaliado”, mas cuja “situação já se encontraria resolvida à data em que essas normas entraram em vigor”.

Conforme a doutrina de Mário de Almeida, vertida na dita recomendação, é ainda referido o seguinte: “…exigência de interesse público uma vez que se trata de dar corpo à reintegração da legalidade (anterior). De outro modo, estar-se-ia, na verdade, a branquear a ilegalidade e, desse modo, a dar às situações que foram objecto de uma conduta ilegal da Administração um tratamento injustificadamente discriminatório em relação àquele que porventura tenha sido dado a outras do mesmo tipo que não tenham sido objecto de uma tal conduta - o que, a nosso ver, seria atentatório do princípio da igualdade, no sentido clássico de igualdade na aplicação da lei…”.

Em suma, é de reconhecer à Autora o direito a progredir para o 5.º escalão da carreira docente e de condenar o Réu à prática dos actos conducentes à efectivação do mesmo.

Impõe-se, por isso, o não provimento do recurso e a manutenção da decisão recorrida.
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IV - Pelo exposto, os juízes da Secção Administrativa do Tribunal Central Administrativo Norte, acordam em NEGAR PROVIMENTO ao presente recurso jurisdicional pelo que mantêm a decisão recorrida.
Custas pelo Recorrente.
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Porto, 31.10.2019

Rogério Martins
Luís Garcia
Conceição Silvestre