Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:02012/10.7BEBRG
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:05/29/2020
Tribunal:TAF de Braga
Relator:Maria Fernanda Antunes Aparício Duarte Brandão
Descritores:ACÇÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL, DEMOLIÇÃO
Sumário:I-O Tribunal a quo decidiu de facto e de direito de forma acertada, com base nos pressupostos/elementos de facto de que dispunha e que existiam nos autos à data da elaboração da respetiva sentença e que determinaram a prática do acto sindicado, designadamente tendo em conta o parecer desfavorável da ERRAN que vinculou a decisão de demolição adoptada pelo Réu/Município. *
* Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:A.
Recorrido 1:Município de Viana do Castelo
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Especial
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido de o recurso não merecer provimento.
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:

RELATÓRIO
A., residente em Rue (…), França, instaurou acção administrativa especial contra o Município de (...), com sede na Rua (…), visando a declaração de nulidade ou anulação do despacho do Vereador do Planeamento e Gestão Urbanística, proferido no processo de obras n.º DJ/SPO n.º 468/85, que ordenou a demolição voluntária das obras sitas na Rua (...), (...), (…), e determinou a tomada de posse administrativa do imóvel e do despacho de 11.10.2010 que indeferiu liminarmente o pedido de licenciamento da obra.
Por decisão proferida pelo TAF de Braga foi julgada improcedente a acção.

Desta vem interposto recurso.
Alegando, o Autor formulou as seguintes conclusões:
1- No prédio do Recorrente existiam construções há varias dezenas de anos, construções anteriores à RAN.
2- O A. remodelou as construções existentes de forma a que o referido anexo passou a dispor de cozinha, duas casas de banho e dois quartos em estrutura pré-fabricada de madeira.
3- Da eira colocou uma cobertura de madeira revestida com telha cerâmica sustentada em pilares de granito.
4- Fez as referidas obras sem licença municipal, pela necessidade de um seu neto, que vive consigo, ter profundas limitações motoras pois faz-se transportar em cadeira de rodas.
5- a demolição de obras não licenciadas só deve ser ordenada como ultima e indeclinável medida sancionatória da ilegalidade cometida, por força dos princípios da necessidade, adequação e indispensabilidade ou menor ingerência possível, decorrentes do principio da proporcionalidade.
6- o exercício administrativo do poder de demolição está condicionado pelo necessário respeito do principio da proporcionalidade, constitucionalmente consagrado- art. 18º da Constituição da Republica Portuguesa
7- A possibilidade de obtenção de parecer favorável depende da verificação dos seguintes pressupostos (i) a realização de obras com finalidade exclusivamente agrícola, (ii) de habitação para fixação de regime de residência habitual dos agricultores em explorações agrícolas viáveis e desde que não existam alternativas validas de localização em solos não incluídos na RAN ou (iii) de habitação para utilização própria e exclusiva dos seus proprietários e respectivos agregados familiares, quando se encontrem em situação de extrema necessidade sem alternativa viável para a obtenção de habitação condigna.
8- As obras de remodelação levadas a cabo pelo A. eram necessárias porquanto o seu neto, que consigo reside, ter profundas limitações motoras.
9- No entanto, que o tribunal a quo não se pronunciou quanto a tais factos alegados pelo A., nem no seu despacho saneador, nem tao pouco na sua douta sentença.
10- Ora, tivesse o A. tido oportunidade de provar este facto, teria sido outro certamente o sentido da decisão do tribunal a quo, pois estavam assim reunidos os pressupostos para a obtenção de parecer favorável pela entidade regional da RAN, o que em ultima analise seria igualmente determinante para que o tribunal decidisse, ao invés do decido, pela obrigatoriedade de suspensão do procedimento administrativo até à decisão da entidade regional da RAN.
11- A omissão de pronúncia no caso em apreço constitui uma nulidade, nulidade essa que expressamente se invoca.
12- O tribunal a quo conclui, referindo: “Assim, nem à data da prática do acto de demolição, nem hoje, a obra do A. não é legalizável, pois que da conjugação dos artigos enunciados e especificamente do 34º do DL 196/89 ( e hoje do art. 38º do DL 73/2009) e do art. 68º al. a) do DL 555/99, resulta claramente a nulidade do acto administrativo de licenciamento de uma obra de construção que viole o regime jurídico da RAN.
13- No que respeita à decisão de não suspensão do procedimento administrativo até à decisão da entidade regional da RAN, alegou o A. no seu art. 20º da petição inicial:“ Ora, a decisão notificada ao A. de indeferimento liminar e de demolição das obras com tomada de posse administrativa em causa não pode subsistir porque as obras realizadas pela A. estão pendentes do pedido de legalização dessas obras não pode ser ordenada a demolição enquanto tal processo não estiver concluído, sendo que mesmo que tal processo não estivesse em curso sempre seria de todo evitada a demolição desde que as obras em causa fossem legalizáveis”, remetendo ainda o A. para o douto Acórdão do STA proferido no âmbito do processo 633/04, de 02/02/2005.
14- No invocado Acórdão pode ler-se:“ (…) a proibição de demolir obras clandestinas que possam ser legalizadas é corolário do princípio constitucional da necessidade, que obsta a que sejam impostas aos particulares restrições desnecessárias (um afloramento desse princípio encontra-se no n.º 2 do art. 18.º da C.R.P.). (…) deve entender-se que a opção camarária pela demolição não pode deixar de ser antecedida de um apreciação da viabilidade de legalização, no próprio momento em que se coloca a questão de decidir dar ou não a ordem de demolição. (Neste sentido, pode ver-se o acórdão deste Supremo Tribunal Administrativo de 19-5-98, proferido no recurso n.º 43433, publicado em Cadernos de Justiça Administrativa, n.º 19, página 39.)
15- Ora, atendendo ao exposto, e ao facto de que o A. apresentou pedido de legalização junto da RAN, não se compreende como pode o tribunal a quo decidir pela não suspensão do procedimento administrativo até à decisão da Entidade Regional da RAN e esgotadas todas as vias de legalização do procedimento.
16- É que a pretensão do A. veio de facto a merecer parecer FAVORÁVEL pela entidade Regional da RAN, sendo desafectada a área de 300 m2, e a CMVC veio a aprovar projecto, tudo conforme documentos que se juntam ao abrigo do disposto no art. 425º do CPC, ex vi art. 651º do CPC, cuja junção se requer, porquanto a sua apresentação não foi possível em momento anterior.
17- De facto, por comunicação de 15/02/2017, foi emitido parecer FAVORAVEL, no seguimento da reformulação do processo apresentado pelo A.
18- De facto, não se vislumbra como poderia o tribunal a quo decidir pela não legalização do edificado pelo A., julgando assim válido o despacho que ordenou a demolição e a consequente posse administrativa, sem que houvesse uma decisão definitiva da entidade regional da RAN.
19- Acresce que, ao decidir pela não suspensão do procedimento administrativo até à decisão da entidade regional da RAN, o tribunal a quo ofendeu expressamente os princípios consagrados na Constituição da Republica Portuguesa.
20- Importa ainda acrescentar, fazendo novamente referência ao já mencionado e citado Acórdão do STA proferido no Proc. 633/04: “ (…) não se pode considerar absurdo que tal juízo possa ser formulado sem o impulso processual do interessado, pois não é apenas o interesse dele que releva para decidir pela legalização, nem é mesmo o interesse primacial em grande parte dos casos, sendo antes o interesse público que poderá conduzir à decisão de não demolição. (Pense-se, por exemplo, nas situações de prédios clandestinos já habitados, em que a demolição pode acarretar consequências dramáticas para os moradores, normalmente pessoas de fraquíssimos recursos económicos.
Em situações deste tipo, independentemente da apresentação de projecto, poderá entender-se, com razoabilidade evidente, que se o prédio for susceptível de legalização, com consequente satisfação do interesse público urbanístico, será de evitar os dramas sociais inerentes à demolição.)
Termos em que, dando-se provimento ao presente recurso deve revogar-se a sentença recorrida e proferir-se acórdão de acordo com o exposto,
COM O QUE SE FARÁ
JUSTIÇA!

A Entidade demandada juntou contra-alegações, concluindo:
I. Salvo o devido respeito, a sentença recorrida não merece qualquer reparo, não padecendo de qualquer vício de omissão de pronúncia.

II. O motivo alegado pelo Recorrente para justificar a realização das obras ilegais, apesar de sério e grave, não justifica a sua conduta, não transforma as obras ilegais em legais, não isenta o Recorrente de dar entrada do competente processo na CMVC com vista à sua eventual legalização, não constitui fundamento válido para considerar desproporcional a medida de tutela da legalidade urbanística adoptada pelo R., nem tem a virtualidade de permitir ao Tribunal decidir em sentido contrário àquele em que decidiu.

III. Todos devem respeito à lei, sem excepção, não podendo o Recorrente beneficiar de tratamento jurídico distinto, porquanto legitimar a sua atitude seria injusto para todos quantos os que dão entrada em tempo na CMVC dos processos de licenciamento de obras, obtêm as licenças de construção/ utilização, pagam as taxas urbanísticas e suportam os custos com os projectos, tudo para poderem construir legalmente.

IV. O Tribunal tem apenas que apreciar e julgar a questão jurídica relativa à legalidade do acto administrativo de demolição das construções ilegais praticado pelo Recorrido, mas já não a questão pessoal relativa à motivação para a edificação das construções.

V. O facto em si é perfeitamente instrumental, acessório, inócuo e sem qualquer relevância ou interesse para a apreciação da legalidade do acto de demolição praticado pelo Recorrido e em causa nos autos, não tendo o Tribunal que se pronunciar sobre o mesmo;

VI. E, ainda que o Tribunal a quo se tivesse, porventura, pronunciado sobre as motivações do Recorrente para a realização das obras ilegais, ainda assim, tendo sido feita prova cabal quanto à ilegalidade e insusceptibilidade de legalização das mesmas, o Tribunal sempre teria que ter decidido pela legalidade do acto administrativo sindicado, ou seja, sempre teria que ter decidido no mesmo sentido em que o fez.

VII. O Recorrente não fez prova da data da edificação das construções nem da legalidade das mesmas, sendo que, quanto à remodelação das construções o Recorrente confessou no processo que são ilegais, justamente porque contendem com o regime da RAN, motivo pelo qual solicitou à ERRAN a desafectação do uso agrícola de uma faixa de 300 m2 para legalizar as obras realizadas, o que não lhe foi concedido.

VIII. O facto de as construções terem alegadamente várias dezenas de anos é inócuo para a decisão proferida nos autos, daí que o Tribunal nem sequer se tenha pronunciado sobre tal facto, tanto mais quanto não isenta o recorrente de ter que as legalizar e, em caso de impossibilidade de legalização, de proceder à respectiva demolição, porque as ilegalidades urbanísticas são imprescritíveis.

IX. O Recorrente realizou obras ilegais em solo que se localiza em RAN, sendo que, não tendo obtido a desafectação da RAN, necessária à legalização, mediante a emissão de um parecer prévio favorável da Entidade Regional da RAN, parecer que tem carácter vinculativo para a decisão final a proferir pelo Município, não restava ao recorrido outra alternativa que não fosse a de ordenar a demolição das obras ilegais, o que fez, efectivamente.

X. Este foi o pressuposto que norteou a prática do acto impugnado, e bem assim a sentença recorrida;

XI. Em finais de Dezembro de 2016, após reformulação do processo feita pelo recorrente, obteve este, finalmente, parecer favorável da ERRAN, o qual incidiu sobre as obras de ampliação da moradia unifamiliar existente e sobre a legalização de uma piscina no logradouro da mesma, sendo que, o anexo/eira de génese ilegal, objecto de pedido de licenciamento n.º 275/10, e objecto do acto ora em crise, foram, efectivamente, demolidos.

XII. O Recorrente só conseguiu obter o parecer favorável da ERRAN porque os anexos ilegais foram demolidos, e como tal, deixaram de fazer parte do pedido de desafectação de solo de uso agrícola numa área de 300 m2, ou seja, porque os pressupostos para a emissão do parecer se alteraram.

XIII. Caso contrário, se os pressupostos se tivessem mantido, o parecer continuaria a ser negativo, obviamente.

XIV. Face a um parecer vinculativo positivo da entidade externa com competência na matéria, o Recorrido teria que decidir no mesmo sentido, não podendo inviabilizar a legalização com base na ocupação ilegal de terrenos integrados na RAN, o que fez através de despacho do Sr. Vereador da Área de Gestão e Planeamento Urbanístico da CMVC de 22.03.2017, ora junto pelo recorrente.

XV. Este acto administrativo foi praticado pelo Recorrido em momento posterior ao da prolação da douta sentença, sendo que o parecer da ERRAN apenas deu entrada nos serviços do Recorrido em 21.02.2017, ou seja, 7 dias antes da data da respectiva prolação.

XVI. O Tribunal decidiu de facto e de direito de forma correcta, com base nos pressupostos/elementos de facto de que dispunha e que existiam nos autos à data da prolação da douta sentença e que determinaram a prática do acto sindicado, designadamente, tendo em conta o parecer desfavorável da ERRAN que vinculou a decisão de demolição adoptada pelo Município.

XVII. Todos os actos administrativos praticados entretanto pela ERRAN e pelo Município, com base em pressupostos completamente diferentes do acto sindicado, actos que o Tribunal desconhecia, inclusivamente, e que no caso do acto praticado pelo Recorrido, é até posterior à data da sentença, e como tal, superveniente, nada têm que ver com o acto cuja legalidade foi apreciada nos autos.

XVIII. O Tribunal não decidiu, pois, fazendo tábua rasa destes elementos, sendo que antes desconhecia, pura e simplesmente, os mesmos, pelo que não os poderia ter tido em conta na sentença que proferiu, sendo certo que os mesmos nada têm que ver com os pressupostos de facto em que assentou o acto impugnado e cuja legalidade foi o douto Tribunal a quo chamado a pronunciar-se.
PEDIDO:
TERMOS EM QUE DEVERÁ SER NEGADO PROVIMENTO AO RECURSO INTERPOSTO PELO RECORRENTE DA SENTENÇA PROFERIDA NOS AUTOS, COM AS LEGAIS CONSEQUÊNCIAS.

O MP, notificado ao abrigo do disposto no artigo 146º/1 do CPTA, emitiu parecer no sentido do não provimento do recurso.

Cumpre apreciar e decidir.

FUNDAMENTOS
DE FACTO

Na sentença foi fixada a seguinte factualidade:
1. Dão-se aqui por reproduzidas as plantas de ordenamento e condicionantes onde vem identificada a localização do prédio sito na Estrada Nacional – Lugar (...), freguesia de (...), do Município de (...). – cfr. docs. de fls. 130 e ss. e 183 e ss. dos autos.
2. No âmbito do processo n.º 468/34/85 o A., em requerimento apresentado em 20.6.1985, indicou como seu domicílio o Lugar (...), (...), (...). – cfr. doc. de fls. 1 do pa 468/85 apenso.
3. Em 26.4.2007 pelo fiscal municipal principal foi elaborada informação da qual consta,
“[…] verifiquei pessoalmente que o Sr. A., com residência habitual em Estrada Nacional – Lugar (...), freguesia de (...), do Municipio de (...), está a levar a efeito, sem licença municipal, as seguintes obras:
1. Edificação com a área de 88,00m2 (foto 1). A edificação, tudo semelhante a uma casa pré-fabricada em madeira, está a ser executada em estrutura de madeira, sobre uma laje de betão, com a cobertura em telha cerâmica de barro vermelho. A edificação é composta por uma cozinha, duas casas de banho e dois quartos;
2. Alpendre com a área de 50,00m2, sustentado por pilares de granito e com a cobertura executada em estrutura de madeira, revestida com telha cerâmica de barro vermelho (foto 2).
A propriedade, segundo o PDMVC, está inserida em áreas da Reserva Agrícola Nacional (RAN) e Reserva Ecológica Nacional (REN). […]”
- cfr. doc. de fls. 6 do pa 468/85.
4. Na sequência de despacho de 30.4.2007 a obra referida no ponto anterior foi embargada. – cfr. doc. de fls. 6 e 7 do pa 468/85.
5. Em 4.5.2007 foi elaborada informação da qual consta, além do mais,
“Em deslocação da fiscalização ao prédio sito na Estrada Nacional, lugar de (…), freguesia de (...), deste concelho, verificou-se que foram efectuadas as obras descritas na participação anexa, sem licença municipal, por isso que foi determinado o embargo, já concretizado na pessoa do responsável pela obra.
[…]
Dado que tais construções se localizam em área classificada como RAN e REN, as mesmas violam o disposto no DL n.º 196/89, com a redacção dada pelo DL n.º 274/92, e o DL n.º 93/90, com as alterações introduzidas pelo DL n.º 180/06, respectivamente, para além do DL n.º 380/99, pelo que, para além de ilegais, tais obras não reúnem condições para vir a ser legalizadas.
Assim, deve notificar-se para se pronunciar, no prazo de 15 dias, fixado pelo art. 106.º, n.º 3 do DL n.º 555/99, acerca da intenção da Camara Municipal ordenar a demolição das obras referidas, alertando-se de que em caso de silêncio ou indeferimento, será promovida a demolição prevista no n.º 1 do mesmo artigo e diploma, atento o caráter ilegal e ilegalizável das obras.
[…]”
- cfr. doc. de fls 12 do pa 468/85.
6. Em missiva de 22.11.2007 o A. indicou como endereço Rue (…), França. – cfr. doc. de fls. 23 do pa 468/2005.
7. Por oficio n.º 2257 remetido por correio sob registo em 11.12.2007 para o endereço do A. em Rue (…), França, foi o A. notificado do teor da informação de 4.5.2007 e para se pronunciar, no prazo de 15 dias, acerca da intenção da Camara Municipal ordenar a demolição das obras executadas sem licença municipal e identificadas na participação referida em 1. – cfr. docs. de fls. 26 e ss. do pa 468/85.
8. Em 12.3.2008 foi proferido despacho de “Concordo; Concedo o prazo de 30 dias para o requerente proceder à demolição”, sob informação de 11.3.2008 com o seguinte teor,
“Uma vez que o requerente não veio pronunciar-se, em termos de audiência prévia acerca da intenção da CM ordenar a demolição/reposição das obras efectuadas sem licença e que foram alvo de embargo, sendo que a referida situação se mantém, conclui-se não haver da parte do requerente disponibilidade para se conformar com a ordem jurídica.
Assim, deve aquele, ser agora notificado para proceder à demolição das referidas construções – 80,00 m2 e 50,00m2 – no prazo que lhe deve ser fixado, nos termos do disposto no art. 106.º, n.º 1 do DL 555/99, com a redacção dada pela Lei n.º 60/07, alertando-se de que, em caso de incumprimento, será a CM a levar a cabo tal acção, em nome e por conta do infractor, conforme previsto no n.º 4 do mesmo artigo e diploma”.
- cfr. doc. de fls. 32 do pa 468/85.
9. Por oficio n.º509 remetido por correio sob registo em 20.3.2008 para o endereço do A. em Rue (...), França, foi o A. notificado do despacho de 12.3.2008 e do teor da informação referida no ponto anterior e para, no prazo de 30 dias, proceder à demolição voluntária construções mencionadas na participação anexa, edificações de 80 m2 e 50m2, sitas no Lugar (...), freguesia de (...), nos termos do disposto no art. 106.º, n.º 1 do DL 555/99, e de que, em caso de incumprimento, será a Camara Municipal a proceder à demolição e reposição em sua substituição, cobrando-se as despesas a que houver lugar”. – cfr. doc. de fls. 33 e ss. do pa 468/85
10. Em 28.5.2008 foi emitida informação pela fiscalização da qual consta que “Até à data, a demolição ordenada a fls. 30 não foi iniciada”. – cfr. doc. de fls. 36 do pa 468/85.
11. Pelo despachos PR-4-A/2009 e PR-6-A/2009 o Presidente da Camara Municipal de (...), procedeu à delegação e competências no Vereador da Área Funcional de Planeamento e Gestão Urbanística, J., incluindo as competências em matéria de licenciamento e fiscalização previstas nas alíneas a), b), c) e d) do n.º 5 do art. 64.º da Lei n.º 169/99, de 18 de Setembro. – cfr. editais publicados e disponíveis em http://www.cm-viana-castelo.pt/pt/delegacao-de-competencias.
12. Em 26.10.2009 o Vereador da Área Funcional de Planeamento e Gestão Urbanística, J. proferiu o despacho PGU 2/2009 subdelegando as competências que lhe foram delegadas e subdelegadas em matéria de operações urbanísticas, previstas designadamente no Decreto-Lei n.º 555/99, na Arquiteta I., Diretora do Departamento Ordenamento do Território e Ambiente, com faculdade de subdelegar nos Chefes de Divisão, incluindo as de “aprovar ou reprovar projectos de urbanização, independentemente de estarem, ou não, inseridos em loteamentos urbanos”. – cfr. doc. de fls. 211 dos autos.
13. Em 26.10.2009 a Arquiteta I., Diretora do Departamento Ordenamento do Território e Ambiente, proferiu despacho subdelegando as competências que lhe foram delegadas pelo despacho PGU 2/2009 no Chefe de Divisão de Gestão Urbanística, incluindo as de “aprovar ou reprovar projectos de urbanização, independentemente de estarem, ou não, inseridos em loteamentos urbanos”. – cfr. doc. de fls. 212 dos autos.
14. Em 7.5.2010 foi proferido despacho de “Determino a posse administrativa pelo período de 5 dias, a partir do dia 27.6.2010 […]” – cfr. doc. de fls. 41 do pa 468/85.
15. Em 14 e 15.5.2010 foi o A. notificado, por cartas registadas com aviso de receção remetidas para os endereços Estrada Nacional, Lugar (...), (...) e Rue (...), (...), França de que por despacho de 7.5.2010 foi ordenada a execução coerciva da demolição das obras descritas na participação de 26.4.2007, executadas sem licença municipal no prédio sito na Estrada Municipal, Lugar (...), freguesia de (...) e da tomada de posse administrativa do imóvel por forma a permitir a execução coerciva da medida, com início às 10 horas do dia 21 de junho de 2010, segunda feira, com duração provável de 5 dias uteis, “sendo que, poderá V. Exa. proceder à demolição voluntariamente, bem como à eventual apresentação de qualquer documento relativo a esta medida de legalidade urbanística até ao dia 11 de Junho de 2010”.– cfr. docs. de fls. 46 e ss e 50 e ss. do pa 468/85.
16. Em 14.6.2010 a Arquiteta I., Diretora do Departamento Ordenamento do Território e Ambiente, proferiu despacho determinando que “nas ausências, faltas e impedimentos dos Chefes das Divisões de Gestão Urbanística e de Licenciamento de Obras, as respectivas competências próprias ou delegadas, sejam exercidas pelo titular que se encontra ao serviço, e só na ausência simultânea de ambos os chefes de Divisão me serão reportadas as correspondentes competências”.. – cfr. doc. de fls. 213dos autos.
17. Em 21.6.2010 foi tomada posse administrativa, reduzida a auto cujo teor aqui se dá por reproduzido, do prédio sito na Estrada Municipal, Lugar (...), freguesia de (...). – cfr. doc. de fls. 63 do pa 468/85.
18. Em 22.6.2010 o A. apresentou junto da CM (...) pedido de licenciamento, a que foi atribuído o numero de processo LEDI 275/2010, visando a legalização das edificações por si construídas e correspondentes à edificação com a área de 88 m2 traduzida em casa de madeira, composta por uma cozinha, duas casas de banho e dois quartos, e um alpendre com a área de 50m2. – cfr. docs. de fls. 1 e ss. do pa 275/2010.
19. Em 22.6.2010 o A. apresentou requerimento solicitando a suspensão da ordem de demolição até à apreciação do projeto de legalização apresentado. – cfr. doc. de fls. 71 do pa 468/85.
20. Na mesma data foi proferida informação pela Divisão de Gestão Urbanística da qual consta “Analisada a pretensão apresentada – legalização de anexos e piscina – verifica-se que as construções em causa se enquadram em área de RAN e de REN contrariando a legislação especifica aplicável o Regulamento do PDMVC (regime de exceção do seu artigo 15). Nesse sentido e conforme as notificações feitas no âmbito do processo de obras 468/85, o pedido apresentado é manifestamente contrário às normas legais ou regulamentares aplicáveis pelo que se propõe a rejeição liminar da pretensão nos termos do ponto 4 do artigo 11 do Dec-Lei 555/99 com as alterações introduzidas pela lei 60/2007”. –cfr. doc. de fls. 13 do pa 275/10.
21. Por despacho de 23.6.2010 a ordem de demolição foi suspensa. – cfr. doc. de fls. 78 do pa 468/85.
22. Em 25.6.2010 a Chefe de Divisão de Licenciamento de Obras proferiu despacho no processo LEDI 275/2010 de “Nos termos do n.º 4 do artigo 11.º do RJUE, rejeito liminarmente o pedido, com fundamento na informação da DGU”. – cfr. doc. de fls. 13a) do pa 275/10.
23. Por despacho de 30.7.2010, aposto sob informação cujo teor aqui se dá por reproduzido, foi determinada a posse administrativa pelo período de 5 dias, a partir de 11 de outubro de 2010. – cfr. doc. de fls. 79 do pa 468/85.
24. Em 16.8.2010 o A. apresentou junto da Comissão Regional da Reserva Agrícola a emissão de parecer para a utilização não agrícola do terreno localizado na Estrada Nacional, Lugar (...), (...), sendo a área a utilizar de 200m2 e destinada ao aumento da área de construção para legalização de alpendre e da edificação de madeira. – cfr. docs. de fls. 125 e ss. dos autos.
25. Em reunião de 3.9.2010 da Entidade Regional da Reserva Agrícola do Norte foi deliberado indeferir o pedido referido supra, constando, além do mais, que o terreno está integrado em mancha agrícola no limite de RAN e que se trata de solo A/B. – cfr. docs. de fls. 117-verso e ss. a 148-verso dos autos.
26. O A. foi notificado em 14.9.2010 da deliberação da Entidade Regional da Reserva Agrícola do Norte por oficio remetido por correio registada com aviso de receção. – cfr. doc. de fls. 109 dos autos.
27. Por ofício n.º 921 remetido por correio sob registo com aviso de receção para os endereços Estrada Nacional, Lugar (...), (...) e Rue (...), (...), foi o A. notificado de que a Camara Municipal irá proceder à demolição coerciva das obras ilegalizáveis executadas no dia 11 de outubro de 2010, tomando posse administrativa do prédio pelo período de 5 dias uteis e de que as despesas a que houver lugar são da conta do infractor e serão cobradas em processo de execução final. – cfr. doc. de fls. 82 do pa 468/85.
28. Em 7.10.2010 o A. apresentou requerimento, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, solicitando a suspensão da ordem de demolição coerciva pelo prazo para apreciação do processo de legalização da construção que corre sob o numero 275/10. - fls. 93 e ss. do pa 468/85.
29. Em 8.10.2010 foi proferido despacho determinando a suspensão da ordem de demolição coerciva. – cfr. doc. de fls. 100 do pa.
30. Em 29.10.2010 foi emitida informação, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, da qual consta, além do mais,
“1 . O indeferimento da pretensão formulada pelo Requerente.
2.Que sejam retomadas as diligências entretanto suspensas, nomeadamente a marcação de nova data para a tomada de posse administrativa e demolição coerciva, se o requerente o não fizer voluntariamente. […]”.
- cfr. doc. de fls. 98 e ss. do pa 468/85.
31. Sob a informação referida no ponto anterior, em 4.11.2010 foi proferido despacho pelo Vereador da Área Funcional do Planeamento e Gestão Urbanística do qual resulta “Proceda-se em conformidade, concedendo até ao dia 15 de Novembro para que a demolição ocorra voluntariamente; Em caso de incumprimento fica agendada demolição coerciva para o dia 22 de Novembro, com a respectiva posse administrativa pelo prazo necessário à demolição […]” – cfr. doc. de fls. 122 do pa apenso aos autos.
32. Por oficio de 11.10.2010 foi o A. notificado do despacho da Chefe de Divisão de Licenciamento de Obras de 25.6.2010 proferido no processo LEDI 275/2010. – cfr. doc. de fls. 47 do pa 275/2010.
33. Em 12.11.2010 o A. foi notificado por oficio n.º 1096 remetido por correio registado com aviso de receção para o endereço Rue (...), (...), do teor da informação de 29.10.2010 e de que por despacho de 4.11.2010 do Vereador da Área Funcional do Planeamento e Gestão Urbanística dispõe até ao dia 15 de Novembro de 2010 para terminar a demolição voluntária de todas as obras executadas sem licença municipal no prédio sito na Estrada Nacional, Lugar (...), freguesia de (...) e de que em caso de incumprimento, haverá lugar à demolição coerciva e da tomada de posse administrativa por forma a permitir a execução coerciva de tal medida, com início às 10 horas do dia 22 de Novembro de 2010 com a duração provável de 5 dias uteis”. – cfr. doc. de fls. 162 e ss. do pa.
O Tribunal consignou que a sua convicção relativamente à matéria de facto provada resultou dos elementos especificamente identificados em cada um dos pontos do probatório, resultando essencialmente da análise dos documentos juntos aos autos e aos processos administrativos apensos, tendo-se ainda aplicado o princípio cominatório semipleno pelo qual se deram como provados os factos admitidos por acordo pelas partes, assim como as regras gerais de distribuição do ónus da prova.

DE DIREITO
Está posta em causa a sentença que ostenta este discurso fundamentador:

Atente-se que, nos termos do disposto no art. 5.º, n.º 3 do CPC, o juiz não está sujeito às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito, daí que o juiz pode, perscrutada a causa de pedir, entender que os vícios imputados ao ato devem ser juridicamente qualificados de forma distinta da alegada pelas partes.
Assim, analisada a factualidade alegada nos autos, as questões que ao Tribunal cumpre apreciar são as de saber se:
1. O despacho de 12.3.2008 do Vereador da Área Funcional do Planeamento e Gestão urbanística que determinou a demolição voluntária das construções de 80 m2 e 50m2 edificadas sem licença e o despacho de 4.11.2010 do Vereador da Área Funcional do Planeamento e Gestão urbanística que determinou a tomada de posse do prédio sito na Estrada Municipal, Lugar (...), (...), com vista à execução coerciva das obras de demolição Não obstante o A. referir que o despacho que determina a demolição voluntária e a tomada de posse corresponderiam ao mesmo ato, verifica-se do p.a. que, na realidade, se tratam de atos administrativos distintos, sendo que é de 12.3.2008 o despacho que determinou a demolição voluntária e data de 4.11.2010 o despacho que ordena a tomada de posse. A confusão do A. deve-se à circunstância de no despacho (e no oficio de notificação) de 4.11.2010 ser concedido um (novo) prazo para terminar a demolição voluntária, sendo que em caso de incumprimento se determina a tomada de posse e a demolição coerciva. , padecem de vicio de violação de lei resultante,
a. Da falta de notificação da ordem de demolição;
b. De erro nos pressupostos face à possibilidade de legalização da obra;
2. O despacho de 25.6.2010 Pese embora o A. referir o despacho de 11.10.2010 verifica-se que a referida data corresponde à data do ofício pelo qual lhe foi notificado o despacho de rejeição liminar proferido em 25.6.2010 que rejeitou liminarmente o pedido de licenciamento das obras de edificação, proferido no processo LEDI 275/2010, padece de vício de violação de lei resultante
a. Da não suspensão do procedimento administrativo até à decisão da Entidade Regional da RAN;
b. Da incompetência e da falta de menção à subdelegação de competências;
c. Erro nos pressupostos face à possibilidade de legalização da obra.

IV. FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA

IV.1. DOS DESPACHOS DE 12.3.2008 DO VEREADOR DA ÁREA FUNCIONAL DO PLANEAMENTO E GESTÃO URBANÍSTICA QUE DETERMINOU A DEMOLIÇÃO VOLUNTÁRIA DAS CONSTRUÇÕES DE 80 M2 E 50M2 EDIFICADAS SEM LICENÇA E DE DESPACHO DE 4.11.2010 DO VEREADOR DA ÁREA FUNCIONAL DO PLANEAMENTO E GESTÃO URBANÍSTICA QUE DETERMINOU A TOMADA DE POSSE DO PRÉDIO SITO NA ESTRADA MUNICIPAL, LUGAR (...), (...), COM VISTA À EXECUÇÃO COERCIVA DAS OBRAS DE DEMOLIÇÃO

1.1. DA FALTA DE NOTIFICAÇÃO DA ORDEM DE DEMOLIÇÃO

Sustenta o A. que não lhe foi notificada a ordem de demolição o que, no seu entender, geraria a invalidade dos despachos que determinaram a demolição e a tomada de posse do prédio.
Do artigo 106.º do RJUE, na redação vigente em 2008, resulta que “1 - O presidente da câmara municipal pode igualmente, quando for caso disso, ordenar a demolição total ou parcial da obra ou a reposição do terreno nas condições em que se encontrava antes da data de início das obras ou trabalhos, fixando um prazo para o efeito.
2 - A demolição pode ser evitada se a obra for susceptível de ser licenciada ou objecto de comunicação prévia ou se for possível assegurar a sua conformidade com as disposições legais e regulamentares que lhe são aplicáveis mediante a realização de trabalhos de correcção ou de alteração.
3 - A ordem de demolição ou de reposição a que se refere o n.º 1 é antecedida de audição do interessado, que dispõe de 15 dias a contar da data da sua notificação para se pronunciar sobre o conteúdo da mesma.
4 - Decorrido o prazo referido no n.º 1 sem que a ordem de demolição da obra ou de reposição do terreno se mostre cumprida, o presidente da câmara municipal determina a demolição da obra ou a reposição do terreno por conta do infractor.”
O art. 107.º, por sua vez, na redação vigente em 2010, prescreve que,
1 - Sem prejuízo da responsabilidade criminal, em caso de incumprimento de qualquer das medidas de tutela da legalidade urbanística previstas nos artigos anteriores, o presidente da câmara pode determinar a posse administrativa do imóvel onde está a ser realizada a obra por forma a permitir a execução coerciva de tais medidas.
2 - O acto administrativo que tiver determinado a posse administrativa é notificado ao dono da obra e aos demais titulares de direitos reais sobre o imóvel por carta registada com aviso de recepção.
3 - A posse administrativa é realizada pelos funcionários municipais responsáveis pela fiscalização de obras, mediante a elaboração de um auto onde, para além de se identificar o acto referido no número anterior, é especificado o estado em que se encontra o terreno, a obra e as demais construções existentes no local, bem como os equipamentos que ali se encontrarem.
4 - Tratando-se da execução coerciva de uma ordem de embargo, os funcionários municipais responsáveis pela fiscalização de obras procedem à selagem do estaleiro da obra e dos respectivos equipamentos.
5 - Em casos devidamente justificados, o presidente da câmara pode autorizar a transferência ou a retirada dos equipamentos do local de realização da obra, por sua iniciativa ou a requerimento do dono da obra ou do seu empreiteiro.
6 - O dono da obra ou o seu empreiteiro devem ser notificados sempre que os equipamentos sejam depositados noutro local.
7 - A posse administrativa do terreno e dos equipamentos mantém-se pelo período necessário à execução coerciva da respectiva medida de tutela da legalidade urbanística, caducando no termo do prazo fixado para a mesma.
8 - Tratando-se de execução coerciva de uma ordem de demolição ou de trabalhos de correcção ou alteração de obras, estas devem ser executadas no mesmo prazo que havia sido concedido para o efeito ao seu destinatário, contando-se aquele prazo a partir da data de início da posse administrativa.
9 – (Revogado.)
Também no art. 66.º do CPA dispõe-se que devem “ser notificados aos interessados os atos administrativos que: a) Decidam sobre quaisquer pretensões por eles formuladas; b) Imponham deveres, sujeições ou sanções, ou causem prejuízos; c) Criem, extingam, aumentem ou diminuam direitos ou interesses legalmente protegidos, ou afetem as condições do seu exercício […]”.
Por último, decorre do art. 152.º do CPA que a “decisão de proceder à execução administrativa é sempre notificada ao seu destinatário antes de se iniciar a execução” (n.º 1) e que o “órgão administrativo pode fazer a notificação da execução conjuntamente com a notificação do ato definitivo e executório” (n.º 2).
A notificação do ato destina-se a levar o ato ao conhecimento do seu destinatário.
É, portanto, uma formalidade que constitui um requisito de eficácia do ato (artigo 268.º, n.º 3, 1.ª parte, da Constituição da República Portuguesa, e artigos 132.º e 66.º a 70.º do Código do Procedimento Administrativo), pelo que a sua falta tem apenas como consequência a ineficácia ou inoponibilidade do ato, em particular para efeitos de impugnação contenciosa.
Daí que a omissão de notificação do ato não integre vício desse ato, por lhe ser algo externo e posterior (neste sentido, por todos, o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 02.03.2005, processo n.º 0716/04).
Ou seja, a falta de notificação da ordem de demolição não acarreta a invalidade desta.
E, consequentemente, não afetando a validade da ordem de demolição, nenhuma invalidade (consequente) origina no despacho (posterior) que determina a tomada de posse administrativa.
De todo o modo, importa notar que, como consta do probatório, o A. foi notificado da ordem de demolição.
Com efeito, verifica-se do probatório que a ordem de demolição corresponde ao despacho de 12.3.2008 do Vereador da Área Funcional do Planeamento e Gestão Urbanística aposto sob informação de 11.3.2008 e que por oficio n.º 509 remetido por correio sob registo em 20.3.2008 para o endereço do A. em Rue (...), (...), França, o A. notificado do despacho que determinou a demolição e do conteúdo da informação de 11.3.2008 e, consequentemente, para, no prazo de 30 dias, proceder à demolição voluntária das construções de 80 m2 e 50m2, sitas no Lugar (...), freguesia de (...), ilegalmente edificadas.
Daí que, sem prejuízo de a falta de notificação não ser determinante da invalidade seja do despacho de 12.3.2008, seja do despacho de 4.11.2010, não ocorreu a alegada falta de notificação da ordem de demolição.

1.2. Do erro nos pressupostos face à possibilidade de legalização da obra

Vem sustentada a invalidade da ordem de demolição e do consequente despacho determinante da tomada de posse administrativa assente, no essencial, na falta de verificação dos pressupostos da ordem de demolição, por entender o A. ser possível a legalização do edificado.
Vejamos.
É entendimento pacífico na jurisprudência que, no domínio do urbanismo, a “demolição de obras não licenciadas só deve ser ordenada como última e indeclinável medida sancionatória da ilegalidade cometida, por força dos princípios da necessidade, adequação e indispensabilidade ou menor ingerência possível, decorrentes do princípio da proporcionalidade” (vd. entre muitos, o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 07.04.2011, processo n.º 0601/10 – Coimbra).
Tal entendimento mostra-se também plasmado no artigo 106.º do Regime Jurídico da Urbanização e Edificação que atribui ao Presidente da Câmara o poder de ordenar a demolição «quando for caso disso», prevendo igualmente (na redação vigente à data da prática do ato de demolição impugnado e sem que a sua redação atual apresente alterações de maior, exceto a substituição de autorização por comunicação prévia) que “A demolição pode ser evitada se a obra for suscetível de ser licenciada ou autorizada ou se for possível assegurar a sua conformidade com as disposições legais e regulamentares que lhe são aplicáveis, mediante a realização de trabalhos de correção ou de alteração”.
Ou seja, o exercício administrativo do poder de demolição está condicionado pelo necessário respeito do princípio da proporcionalidade, constitucionalmente consagrado - artigo 18º da Constituição da República Portuguesa -, que impõe que a demolição só se possa materializar após verificação prévia das possibilidades de conformação da obra não licenciada com os cânones da legalidade urbanística e apenas na hipótese de se concluir pela total inviabilidade da respetiva legalização, ou seja, que não é possível assegurar a sua conformidade com as disposições legais e regulamentares que lhe são aplicáveis, designadamente mediante a realização de trabalhos de correção ou de alteração – n.º 2 do referido artigo 106.º - lógica do menor sacrifício dos particulares, erigindo-se a demolição em ultima ratio.
Assim, como notam Fernanda Paula Oliveira et alia (in RJUE Comentado, 2012, 3.º edição, p. 663), “por homenagem ao princípio da proporcionalidade, só depois de concluída a apreciação sobre a viabilidade ou inviabilidade da pretensão de legalização é que poderá lançar-se mão do procedimento de demolição. Deve, assim, em qualquer caso, a ponderação sobre uma possível legalização ter lugar não apenas antes da execução do ato de demolição, como previamente à sua adoção […]”.
Sucede que, analisados os elementos constantes dos autos é possível concluir pela inviabilidade da legalização do edificado.
Como resulta do probatório o prédio sito na Estrada Nacional – Lugar (...), freguesia de (...), do Município de (...) mostra-se, na planta de ordenamento, classificado como solo rural e qualificado como espaço agrícola e, na planta de condicionantes, apresenta as restrições resultantes na parte norte de Reserva Ecológica Nacional e a sul de Reserva Agrícola Nacional, constatando-se que o alpendre (e a piscina) se encontra edificado na sua totalidade em área de RAN e a casa de madeira em área de RAN e numa pequena parte ocupa área de REN.
Mais se mostra provado que o A. obteve parecer negativo da Entidade Regional do Norte da RAN à desafetação da área de 200m2 onde foi edificado o alpendre e a casa de madeira.
Como resulta do disposto nos artigos 7.º, 8.º, n.º 1, al. a) e 13.º, n.º 1 do Regulamento do PDM de (...) (publicado no D.R, 2ª série nº 67, de 4 de Abril de 2008, e não sofrendo alterações nesta parte pelo Aviso n.º 1817/2014) o solo classificado como rural destina-se a ser usado em atividades agrícolas, pecuárias, florestais ou minerais e integra os espaços agrícolas, que se caraterizam pela sua aptidão agrícola atual ou potencial e destinam-se à prática de atividade agrícola.
Mais dispõe o art. 14.º, n.º 1 do RPDM que “nos espaços agrícolas inseridos na RAN deve ser observada a aplicação deste regime”.
E o art. 15.º prevê que,
“1. Os Espaços Agrícolas de Elevado Valor Paisagístico são non aedificandi, não sendo permitidas quaisquer construções, de carácter definitivo ou precário, incluindo estufas e painéis publicitários.
2. Exceptuam-se do número anterior:
a) A construção de estruturas de apoio à actividade agrícola e aquiculturas previstas em planos de âmbito sectorial;
b) A execução de obras de conservação, reconstrução e alteração de edifícios habitacionais existentes, admitindo-se ampliação até 20% da área bruta de construção existente;
c) […]
3. A construção nos restantes Espaços Agrícolas só é possível para os fins e nas condições a seguir descriminadas:
a) Os descritos no ponto anterior;
b) Não obstante o disposto na alínea anterior, é permitida a ampliação da área bruta de construção
existente até aos 200m2 de área bruta de construção;
c) […]
d) […]”
Estabelecia-se no Decreto-Lei n.º 196/89, de 14 de Junho, vigente à data da prática do ato de demolição,
Artigo 2.º
Definições
1 - Para efeitos do presente diploma, consideram-se:
a) Solos da classe A: os que têm uma capacidade de uso muito elevada, com poucas ou nenhumas limitações, sem riscos de erosão ou com riscos ligeiros, susceptíveis de utilização intensiva ou de outras utilizações;
b) Solos da classe B: os que têm uma capacidade de uso elevada, limitações moderadas, riscos de erosão moderados, susceptíveis de utilização agrícola moderamente intensiva e de outras utilizações;
[…]
Artigo 8.º
Princípio geral
1 - Sem prejuízo do disposto nos artigos seguintes, os solos da RAN devem ser exclusivamente afectos à agricultura, sendo proibidas todas as acções que diminuam ou destruam as suas potencialidades agrícolas, designadamente as seguintes:
a) Obras hidráulicas, vias de comunicação e acessos, construção de edifícios, aterros e escavações;
[…]
Artigo 9.º
Utilização de solos da RAN condicionados pela lei geral
1 - Carecem de prévio parecer favorável das comissões regionais da reserva agrícola todas as licenças, concessões, aprovações e autorizações administrativas relativas a utilizações não agrícolas de solos integrados na RAN.
2 - Os pareceres favoráveis das comissões regionais da reserva agrícola só podem ser concedidos quando estejam em causa:
a) Obras com finalidade exclusivamente agrícola, quando integradas e utilizadas em explorações agrícolas viáveis, desde que não existam alternativas de localização em solos não incluídos na RAN ou, quando os haja, a sua implantação nestes inviabilize técnica e economicamente a construção;
b) Habitações para fixação em regime de residência habitual dos agricultores em explorações agrícolas viáveis, desde que não existam alternativas válidas de localização em solos não incluídos na RAN;
c) Habitações para utilização própria e exclusiva dos seus proprietários e respectivos agregados familiares, quando se encontrem em situação de extrema necessidade sem alternativa viável para a obtenção de habitação condigna e daí não resultem inconvenientes para os interesses tutelados pelo presente diploma;
[…]
3 - Os pareceres favoráveis a que se referem os números anteriores só podem incidir sobre solos das classes A e B quando não existir alternativa idónea para a localização das obras e construções em causa em afloramentos de outra categoria.
[…]
Artigo 34.º
Nulidades
São nulos todos os actos administrativos praticados em violação do disposto no n.º 1 do artigo 9.º”
Também atualmente, e à data da tomada de posse, prevê o DL 73/2009 que,
Artigo 6.º
Classificação das terras
1 – […]
2 - De acordo com a classificação referida no número anterior, as terras classificam-se em:
a) Classe A1 - unidades de terra com aptidão elevada para o uso agrícola genérico;
b) Classe A2 - unidades de terra com aptidão moderada para o uso agrícola genérico;
[…]
Artigo 7.º
Classificação dos solos
1 - Nas áreas do País em que não tenha sido publicada a informação cartográfica e as notas explicativas, que materializam a classificação das terras da forma prevista no artigo anterior, e para efeitos de delimitação da RAN, os solos classificam-se segundo a sua capacidade de uso, de acordo com a metodologia definida pelo ex-Centro Nacional de Reconhecimento e Ordenamento Agrário (CNROA).
2 - Para efeitos do número anterior, os solos classificam-se em:
a) Classe A - os que têm uma capacidade de uso muito elevada, com poucas ou nenhumas limitações, sem riscos de erosão ou com riscos ligeiros, susceptíveis de utilização intensiva ou de outras utilizações;
b) Classe B - os que têm uma capacidade de uso elevada, limitações moderadas, riscos de erosão moderados, susceptíveis de utilização agrícola moderadamente intensiva e de outras utilizações;
[…]
Artigo 8.º
Áreas integradas na RAN
1 - Integram a RAN as unidades de terra que apresentam elevada ou moderada aptidão para a actividade agrícola, correspondendo às classes A1 e A2, previstas no artigo 6.º
2 - Na ausência da classificação prevista no artigo 6.º, integram a RAN:
a) As áreas com solos das classes de capacidade de uso A, B e Ch, previstas no n.º 2 do artigo 7.º;
[…]
Artigo 20.º
Afectação das áreas da RAN
1 - As áreas da RAN devem ser afectas à actividade agrícola e são áreas non aedificandi, numa óptica de uso sustentado e de gestão eficaz do espaço rural.
[…]
Artigo 21.º
Acções interditas
São interditas todas as acções que diminuam ou destruam as potencialidades para o exercício da actividade agrícola das terras e solos da RAN, tais como:
a) Operações de loteamento e obras de urbanização, construção ou ampliação, com excepção das utilizações previstas no artigo seguinte;
[…]
Artigo 22.º
Utilização de áreas da RAN para outros fins
1 - As utilizações não agrícolas de áreas integradas na RAN só podem verificar-se quando não exista alternativa viável fora das terras ou solos da RAN, no que respeita às componentes técnica, económica, ambiental e cultural, devendo localizar-se nas terras e solos classificadas como de menor aptidão, e quando estejam em causa:
a) Obras com finalidade agrícola, quando integradas na gestão das explorações ligadas à actividade agrícola, nomeadamente, obras de edificação, obras hidráulicas, vias de acesso, aterros e escavações, e edificações para armazenamento ou comercialização;
b) Construção ou ampliação de habitação para residência própria e permanente de agricultores em exploração agrícola;
c) Construção ou ampliação de habitação para residência própria e permanente dos proprietários e respectivos agregados familiares, com os limites de área e tipologia estabelecidos no regime da habitação a custos controlados em função da dimensão do agregado, quando se encontrem em situação de comprovada insuficiência económica e não sejam proprietários de qualquer outro edifício ou fracção para fins habitacionais, desde que daí não resultem inconvenientes para os interesses tutelados pelo presente decreto-lei;
[…]
2 - Apenas pode ser permitida uma única utilização não agrícola das áreas integradas na RAN, no que se refere às alíneas b) e c) do número anterior.
[…]
Artigo 23.º
Parecer prévio
1 - As utilizações não agrícolas de áreas integradas na RAN para as quais seja necessária concessão, aprovação, licença, autorização administrativa ou comunicação prévia estão sujeitas a parecer prévio vinculativo das respectivas entidades regionais da RAN, a emitir no prazo de 25 dias.
[…]
Artigo 38.º
Nulidades
São nulos todos os actos administrativos praticados em violação do disposto nos artigos 22.º a 24.º”
Também à data da prática do ato de demolição previa o DL 93/90 que,
Artigo 4.º
Regime
1 - Nas áreas incluídas na REN são proibidas as acções de iniciativa pública ou privada que se traduzam em operações de loteamento, obras de urbanização, construção e ou ampliação, obras hidráulicas, vias de comunicação, aterros, escavações e destruição do coberto vegetal.
2 - Exceptuam-se do disposto no número anterior as acções insusceptíveis de prejudicar o equilíbrio ecológico nas áreas integradas na REN identificadas no anexo IV ao presente diploma, e que dele faz parte integrante, nos termos previstos no anexo V ao presente diploma e que dele também faz parte integrante, e sujeitas às seguintes condições:
a) Autorização da comissão de coordenação e desenvolvimento regional competente, nos casos previstos no anexo IV;
[…]
Artigo 14.º
Embargos e demolições
1 - Ao Instituto da Conservação da Natureza, às CCDR, aos municípios e às demais entidades competentes por força da matéria ou área de jurisdição compete embargar e demolir as obras, bem como fazer cessar outras acções realizadas em violação ao disposto no presente decreto-lei.
2 - A entidade competente nos termos do número anterior intima o proprietário a demolir as obras feitas ou a repor o terreno no estado anterior à intervenção, fixando-lhe prazos de início e termo dos trabalhos para o efeito necessários.
3 - Decorridos os prazos referidos no número anterior sem que a intimação se mostre cumprida, procede-se à demolição ou reposição nos termos do n.º 1, por conta do proprietário, sendo as despesas cobradas coercivamente através do processo de execução fiscal, servindo de título executivo a certidão extraída de livros ou documentos de onde conste a importância e os demais requisitos exigidos no artigo 163.º do Código de Procedimento e Processo Tributário.
Artigo 15.º
Nulidade de actos administrativos
São nulos e de nenhum efeito os actos administrativos que violem os artigos 4.º e 17.º
E, atualmente, o DL 166/2008
Artigo 20.º
Regime
1 - Nas áreas incluídas na REN são interditos ou usos e as acções de iniciativa pública ou privada que se traduzam em:
a) […]
b) Obras de urbanização, construção e ampliação;
c) Vias de comunicação;
d) Escavações e aterros;
e) Destruição do revestimento vegetal, não incluindo as acções necessárias ao normal e regular desenvolvimento das operações culturais de aproveitamento agrícola do solo e das operações correntes de condução e exploração dos espaços florestais.
2 - Exceptuam-se do disposto no número anterior os usos e as acções que sejam compatíveis com os objectivos de protecção ecológica e ambiental e de prevenção e redução de riscos naturais de áreas integradas em REN.
3 - Consideram-se compatíveis com os objectivos mencionados no número anterior os usos e acções que, cumulativamente:
a) Não coloquem em causa as funções das respectivas áreas, nos termos do anexo i; e
b) Constem do anexo ii do presente decreto-lei, que dele faz parte integrante, nos termos dos artigos seguintes, como:
i) Isentos de qualquer tipo de procedimento; ou
ii) Sujeitos à realização de uma mera comunicação prévia; ou
iii) Sujeitos à obtenção de autorização.
[…]
Artigo 27.º
Invalidade dos actos e responsabilidade civil
1 - São nulos os actos administrativos praticados em violação do disposto no presente capítulo ou que permitam a realização de acções em desconformidade com os fins que determinaram a exclusão de áreas da REN.
[…]”
Dos normativos expostos e conjugados com a matéria factual apurada resulta, em síntese, que a utilização pelo A. do solo do seu prédio com a construção da casa de madeira e do alpendre, classificado como solo com aptidão elevada/moderada para o uso agrícola genérico, e integrado em RAN, dependeria da obtenção de parecer prévio favorável pela Entidade Regional da RAN.
Essa autorização não foi, contudo, concedida, sendo que o A. se conformou com o parecer negativo, não reagindo atempadamente contra o mesmo. E o certo é que, analisando as situações em que esse parecer favorável poderia ser concedido, nem o A. demonstrou o preenchimento dos seus requisitos, nem vislumbra sequer o Tribunal a possibilidade de o A. o vir a obter por não estar em causa seja (i) a realização de obras com finalidade exclusivamente agrícola, (ii) de habitação para fixação em regime de residência habitual dos agricultores em explorações agrícolas viáveis e desde que não existam alternativas válidas de localização em solos não incluídos na RAN ou (iii) de habitação para utilização própria e exclusiva dos seus proprietários e respetivos agregados familiares, quando se encontrem em situação de extrema necessidade sem alternativa viável para a obtenção de habitação condigna e daí não resultem inconvenientes para os interesses tutelados pelo presente diploma.
Assim, nem à data da prática do ato de demolição, nem hoje, a obra do A. não é legalizável, pois que da conjugação dos artigos enunciados e especificamente do 34.º do DL 196/89 (e hoje do art. 38.º do DL 73/2009), e do art. 68.º, al. a) do DL 555/99, resulta claramente a nulidade do ato administrativo de licenciamento de uma obra de construção que viole o regime jurídico da RAN.
E, igualmente, estando parte do terreno do A., onde este edificou parcialmente a casa de madeira, abrangido por Reserva Ecológica Nacional, a ação de construção por si realizada era, e é proibida, nos termos do art. 4.º, n.º 1 do DL 93/90 (e hoje 20.º, n.º 1, al. b) do DL 166/2008), não se verificando no caso dos autos o preenchimento dos pressupostos de que dependem as exceções a essa proibição. Sendo certo que nem o A. assim o demonstrou, nem tão pouco chegou a solicitar a autorização à entidade da REN.
Donde, também por aqui, e face ao disposto nos arts. 15.º do DL 93/90, (e hoje 27.º, n.º 1 do DL 166/98), e art. 68.º, al. a) do DL 555/99 o ato de licenciamento de obras de construção em violação do regime da REN seria nulo.
O exposto é suficiente para se concluir pela validade do despacho de 12.3.2008 do Vereador da Área Funcional do Planeamento e Gestão Urbanística que determinou a demolição voluntária das construções de 80 m2 e 50m2 é que, como decorre do art. 106.º, n.º 2 do RJUE a demolição só pode ser evitada se a obra for suscetível de legalização ou se for possível assegurar a sua conformidade com as disposições legais e regulamentares que lhe são aplicáveis mediante a realização de trabalhos de correção ou de alteração.
Não sendo possível a legalização, nem sendo a obra passível de correções de forma a assegurar a sua conformidade com as normas legais aplicáveis, já que a mesma se encontra na sua totalidade realizada em RAN e parcialmente em REN, naturalmente que se impunha ao Município de (...) a emissão do ato de demolição nos termos do art. 106.º, n.º 1 do RJUE.
E, consequentemente, face ao comportamento omissivo do A. que não procedeu à demolição do edificado, e sem prejuízo dos diversos prazos de que dispôs permaneceu em incumprimento da medida de tutela da legalidade urbanística, cabia ao Município nos termos do art. 106.º, n.º 4 do RJEU determinar a demolição da obra ou a reposição do terreno por conta do A., podendo para o efeito nos termos do art. 107.º, n.º 1 do RJUE determinar a posse administrativa do imóvel onde está a ser realizada a obra por forma a permitir a execução coerciva de tais medidas.
Donde, naturalmente, não sendo a obra passível de legalização, não padecem os atos impugnados, concretamente o despacho de 12.3.2008 do Vereador da Área Funcional do Planeamento e Gestão urbanística (ordem de demolição) e o despacho de 4.11.2010 do Vereador da Área Funcional do Planeamento e Gestão urbanística (despacho que determina a tomada de posse administrativa do prédio) do erro nos pressupostos que lhes vinha assacado.

IV.2. DO DESPACHO DE 25.6.2010 QUE REJEITOU LIMINARMENTE O PEDIDO DE LICENCIAMENTO DAS OBRAS DE EDIFICAÇÃO, PROFERIDO NO PROCESSO LEDI 275/2010

2.1. Da não suspensão do procedimento administrativo até à decisão da Entidade Regional da RAN
Sustenta o A. que o procedimento administrativo tendente ao licenciamento das obras cuja demolição havia sido ordenada, deveria ter sido suspenso na pendência do processo destinado à obtenção de parecer favorável para a utilização não agrícola dos solos inseridos em RAN pela Entidade Regional do Norte da Reserva Agrícola Nacional.
Dispõe o art. 31.º do CPA, sob a epígrafe “Questões prejudiciais”, que,
“1 - Se a decisão final depender da decisão de uma questão que seja da competência de outro órgão administrativo ou dos tribunais, deve o órgão competente para a decisão final suspender o procedimento administrativo até que o órgão ou o tribunal competente se pronunciem, salvo se da não resolução imediata do assunto resultarem graves prejuízos.
2 - A suspensão cessa:
a) Quando, dependendo a decisão da questão prejudicial da formulação de pedido pelo interessado, o mesmo não o apresentar perante o órgão administrativo ou o tribunal competente dentro dos 30 dias seguintes à notificação da suspensão, ou quando o processo instaurado para conhecimento da questão prejudicial estiver parado, por culpa do interessado, por mais de 30 dias;
b) Quando, por circunstâncias supervenientes, a falta de resolução imediata do assunto causar graves prejuízos.
3 - Se não for declarada a suspensão ou esta cessar, o órgão administrativo conhecerá das questões prejudiciais, mas a respectiva decisão não produzirá quaisquer efeitos fora do procedimento em que for proferida”
A respeito deste normativo escrevem Mário Esteves de Oliveira et alia (in CPA Comentado, 2.ª edição, Almedina, p. 198 e 199) que «Questões prejudiciais num procedimento administrativo são aquelas que, sendo das atribuições, competência ou jurisdição de outro órgão administrativo ou dum tribunal, condicionam, contudo, em termos de facto ou de direito, a decisão desse procedimento e, portanto, para que esta possa ser tomada, em função de todos os factos existentes e de todo o direito aplicável, é necessário primeiro responder às referidas questões prejudiciais.
Falamos “em termos de facto ou de direito” para tornar claro que, por exemplo, a comprovação autêntica ou judicial de factos pode ser uma questão prejudicial num procedimento administrativo. Em princípio não será assim, obviamente: a autoridade procedimental: a autoridade procedimental dever formar (sobre os factos nele aduzidos ou envolvidos) a sua própria e intima convicção e considerar a prova feita como adequada, ou não, aos fins do procedimento administrativo – o qual, aliás, se pode bastar com um juízo ou uma evidência menor do que a que seria necessária para uma sua comprovação judicial – tirando daí as respetivas consequências. [..]».
Assim, uma decisão de suspensão do procedimento tomada no quadro do regime previsto no art. 31.º do CPA não é imposta sem mais, dependendo a admissibilidade de suspensão do procedimento administrativo da verificação de duas condições: (a) depender a decisão final duma questão que fosse da competência de outro órgão administrativo ou dos tribunais e (b) não resultarem graves prejuízos quanto à não resolução imediata da questão.
Também no art. 11.º do RJUE se previa que,
“7 - Salvo no que respeita às consultas a que se refere o artigo 13.º, se a decisão final depender da decisão de uma questão que seja da competência de outro órgão administrativo ou dos tribunais, deve o presidente da câmara municipal suspender o procedimento até que o órgão ou o tribunal competente se pronunciem, notificando o requerente desse acto, sem prejuízo do disposto no n.º 2 do artigo 31.º do Código do Procedimento Administrativo.
8 - Sem prejuízo do disposto no número anterior, o interessado pode requerer a continuação do procedimento em alternativa à suspensão, ficando a decisão final condicionada, na sua execução, à decisão que vier a ser proferida pelo órgão administrativo ou tribunal competente.”
E o artigo 13.º,
“1 - A consulta às entidades que, nos termos da lei, devam emitir parecer, autorização ou aprovação sobre o pedido é promovida pelo gestor do procedimento e é efectuada em simultâneo, através do sistema informático previsto no artigo 8.º-A.
2 - Nos casos previstos no artigo seguinte, o gestor do procedimento comunica o pedido, com a identificação das entidades a consultar, à CCDR.
3 - As entidades exteriores ao município pronunciam-se exclusivamente no âmbito das suas atribuições e competências.
4 - As entidades consultadas devem pronunciar-se no prazo de 20 dias a contar da data de disponibilização do processo.
5 - Considera-se haver concordância daquelas entidades com a pretensão formulada se os respectivos pareceres, autorizações ou aprovações não forem recebidos dentro do prazo fixado no número anterior.
6 - Os pareceres das entidades exteriores ao município só têm carácter vinculativo quando tal resulte da lei, desde que se fundamentem em condicionamentos legais ou regulamentares e sejam recebidos dentro do prazo.
7 - São fixados em diploma próprio os projectos da engenharia de especialidades e as certificações técnicas que carecem de consulta, aprovação ou de parecer, interno ou externo, bem como os termos em que têm lugar.
[…]
Artigo 13.º-B
Consultas prévias
1 - O interessado na consulta a entidades externas pode solicitar previamente os pareceres, autorizações ou aprovações legalmente exigidos junto das entidades competentes, entregando-os com o requerimento inicial ou com a comunicação prévia, caso em que não há lugar a nova consulta desde que, até à data da apresentação de tal pedido ou comunicação na câmara municipal, não haja decorrido mais de um ano desde a emissão dos pareceres, autorizações ou aprovações emitidos ou desde que, caso tenha sido esgotado este prazo, não se tenham verificado alterações dos pressupostos de facto ou de direito em que os mesmos se basearam.
2 - Para os efeitos do número anterior, caso qualquer das entidades consultadas não se haja pronunciado dentro do prazo, o requerimento inicial ou a comunicação prévia podem ser instruídos com prova da solicitação das consultas e declaração do requerente ou comunicante de que os mesmos não foram emitidos dentro daquele prazo.
3 - Não tendo o interessado promovido todas as consultas necessárias, o gestor do procedimento promove as consultas a que haja lugar ou, quando aplicável, comunica o pedido à CCDR, no prazo de cinco dias a contar da data do requerimento ou da data da entrega dos elementos solicitados nos termos do n.º 3 do artigo 11.º
4 - No termo do prazo fixado para a promoção das consultas, o interessado pode solicitar a passagem de certidão dessa promoção, a qual será emitida pela câmara municipal ou pela CCDR no prazo de oito dias.
5 - Se a certidão for negativa, o interessado pode promover directamente as consultas que não hajam sido realizadas ou pedir ao tribunal administrativo que intime a câmara municipal ou a CCDR a fazê-lo, nos termos do artigo 112.º do presente diploma.”
Acresce que nos termos do art. 23.º, n.º 2 do DL 73/90, “o parecer para a utilização não agrícola de solos da RAN é requerido diretamente junto das entidades regionais da RAN, ou através da entidade competente para a concessão, autorização, licença, aprovação ou comunicação prévia”.
Da conjugação destes normativos resulta um dever de impulso do interessado, seja junto da RAN, seja através do Município, no sentido de obter o parecer prévio, ou, pelo menos, de indicar a necessidade de consulta a essa entidade, no caso de o interessado não ter promovido todas as consultas necessárias.
Ora, o A. no pedido de licenciamento não juntou qualquer parecer das entidades competentes, nem indicou a intenção de consulta a essa entidade.
Daí que, sendo a lei clara ao impedir a realização de operações urbanísticas de construção em solos inseridos em RAN e REN - e só excecionalmente, nos casos legalmente previstos nos artigos 22.º do DL 73/2009 e 20.º, n.º 2 e 3 do DL 166/2008, se permitir tal utilização conquanto obtido o parecer prévio favorável – se o requerente do licenciamento não o faz, isto é, se não demonstra que obteve o parecer favorável, que está em curso a sua pretensão ou que a pretende obter, então ao Município compete decidir com base nos elementos de que dispõe. E esses elementos são os de que a pretensão urbanística em análise se insere em área de REN e RAN e, como tal, a pretensão edificativa não tem viabilidade, devendo ser indeferida.
Acresce que o que se recolhe dos autos é que já havia sido proferida a decisão final no procedimento LEDI 275/2010 (apesar de esta não ter sido (ainda) notificada ao A.) em 26.5.2010 aquando da apresentação do pedido de parecer favorável à Entidade Regional do Norte da RAN em 16.8.2010.
E note-se que quando o A. dá conta da apresentação desse pedido junto do processo LEDI 275/2010 em 7.10.2010, peticionando a sua suspensão, já conhecia o sentido desfavorável desse parecer face à notificação do mesmo em 14.9.2010.
Ou seja, considerando que nos termos do art. 106.º do CPA o procedimento administrativo se extingue com a tomada de decisão final, ou seja que o processo de licenciamento LEDI 275/2010 terminou em 26.5.2010 - e não tendo o A. até momento anterior a essa data dado inicio ao procedimento junto da entidade regional norte da RAN ou comunicado a pendencia desse procedimento junto do processo LEDI 275/2010, nem ali requerido a consulta em falta - não poderia suspender-se um procedimento administrativo que já não estava em curso, que estava extinto.
E mais grave se mostra até que o A. reclame essa suspensão do procedimento de licenciamento, com fundamento num pedido seu apresentado no mesmo, quando no momento em que formulou esse pedido de suspensão já conhecia o sentido desfavorável do parecer do órgão administrativo competente.
Em suma, naturalmente, impõe-se concluir não haver razão para suspender o procedimento administrativo de licenciamento, nos termos do art. 31.º, n.º 1 do CPA e 17.º, n.º 1 do RJUE, já que antes da decisão final não se encontrava sequer em curso o procedimento administrativo que poderia constituir questão prejudicial.
Termos em que improcede quanto a este fundamento a pretensão do A.

2.2. Da incompetência e da falta de menção à subdelegação de competências

O A. alega que o despacho de rejeição liminar do pedido de licenciamento das obras de edificação, proferido no processo LEDI 275/2010, não foi praticado pelo Presidente da Camara Municipal ou pelo Vereador com competências delegadas, não havendo referência do funcionário a competências delegadas.
Dispõe o art. 35.º, n.º 1 do CPA (na redação anterior ao DL 47/2015) que, os órgãos administrativos normalmente competentes para decidir em determinada matéria podem, sempre que para tal estejam habilitados por lei, permitir, através de um ato de delegação de poderes, que outro órgão ou agente pratique atos administrativos sobre a mesma matéria.
O artigo 36.º prescreve que,
1 - Salvo disposição legal em contrário, o delegante pode autorizar o delegado a subdelegar.
2 - O subdelegado pode subdelegar as competências que lhe tenham sido subdelegadas, salvo disposição legal em contrário ou reserva expressa do delegante ou subdelegante.
Nos termos do art. 37.º são os seguintes os requisitos da delegação de poderes:
a. Existir lei que a permita;
b. Haver ato pelo qual o delegante autorize o exercício de poderes pelo delegado.
Por seu lado o ato de delegação deve obedecer aos seguintes requisitos:
a. Especificar os poderes delegados.
b. A delegação deve ser publicada no órgão próprio.
c. O órgão que pratica o ato deve expressamente mencionar que o pratica na qualidade de delegado.
Acresce que nos termos do artigo 38.º e 123.º nº 2 al. a) do CPA deve constar do ato a menção de delegação ou subdelegação de poderes quando exista.
Dispunha o art. 11.º do RJUE, na redação vigente à data da prática do despacho de 26.5.2010, que
“[…]
4 - No prazo de 10 dias a contar da apresentação do requerimento ou comunicação, o presidente da câmara municipal pode igualmente proferir despacho de rejeição liminar, oficiosamente ou por indicação do gestor do procedimento, quando da análise dos elementos instrutórios resultar que o pedido é manifestamente contrário às normas legais ou regulamentares aplicáveis.
[…]
10 - O presidente da câmara municipal pode delegar nos vereadores, com faculdade de subdelegação ou nos dirigentes dos serviços municipais, as competências referidas nos n.os 1 a 4 e no número seguinte.”
Nos termos destes normativos, ou seja existindo previsão legal para a delegação, por despacho n.º PR4-A/2009 do Presidente da CMVC delegou as suas competências em matéria de licenciamento no Vereador da Área Funcional de Planeamento e Gestão Urbanística.
Por seu lado, o Vereador da Área Funcional de Planeamento e Gestão Urbanística pelo despacho PGU 2/2009 subdelegou as competências que lhe foram delegadas e subdelegadas em matéria de operações urbanísticas, previstas designadamente no Decreto-Lei n.º 555/99, na Arquiteta I., Diretora do Departamento Ordenamento do Território e Ambiente, com faculdade de subdelegar nos Chefes de Divisão, incluindo as de “aprovar ou reprovar projectos de urbanização, independentemente de estarem, ou não, inseridos em loteamentos urbanos”.
Mais se verifica que a Arquiteta I., Diretora do Departamento Ordenamento do Território e Ambiente, proferiu despachos subdelegando as competências de “aprovar ou reprovar projetos de urbanização, independentemente de estarem, ou não, inseridos em loteamentos urbanos” Chefe de Divisão de Gestão Urbanística, e determinou que “nas ausências, faltas e impedimentos dos Chefes das Divisões de Gestão Urbanística e de Licenciamento de Obras, as respectivas competências próprias ou delegadas, sejam exercidas pelo titular que se encontra ao serviço, e só na ausência simultânea de ambos os chefes de Divisão me serão reportadas as correspondentes competências”.
Ora, considerando a existência dos atos de delegação e subdelegação da competência de reprovar projetos de urbanização na Chefe de Divisão de Licenciamento de Obras – no caso, na ausência do Chefe de Divisão de Gestão Urbanística -, bem se vê que o despacho da Chefe de Divisão de Licenciamento de Obras de 25.6.2010 proferido no processo LEDI 275/2010 foi proferido por quem, por via da delegação e subdelegação, tinha competência para o fazer.
Outra coisa, porém, é o facto de o órgão delegado ou subdelegado deixar de fazer menção de que atua por delegação ou subdelegação.
Não obstante o disposto no artigo 38º e 123.º do Código do Procedimento Administrativo (CPA), é, desde há muito, jurisprudência consolidada do Supremo Tribunal Administrativo, que a falta de menção do uso de delegação de poderes, degrada-se em formalidade não essencial (irrelevante) se não afetou nem prejudicou o direito ao respetivo recurso contencioso (v., entre outros, Ac. de 21.3. 85, rec. 17869, in Acórdãos Doutrinais 287, pág. 1176 e segs, Ac. de 23.10.97, rec. 38.607, Ac. de 24/04/2001, rec. 039895, Ac. de 30.1.2002, rec. 46135).
Esta jurisprudência é sufragada pela doutrina (p. ex., FREITAS DO AMARAL, colaboração de LINO TORGAL, em “Curso de Direito Administrativo”, Vol. II, Almedina, 2001, pág. 252 - “Por ocultarem elementos que dificultam a sua integral compreensão pelo destinatário ou destinatários, são irregulares os actos que, praticados ao abrigo de delegação ou subdelegação de poderes, não mencionem a existência dessas delegações ou subdelegações”; v, também, pág. 418; MÁRIO ESTEVES DE OLIVEIRA, JP GONÇALVES, JP AMORIM, ob. cit., pág. 583).
Ou seja, trata-se de uma irregularidade meramente formal que deverá considerar-se sanada se se demonstra ter sido atingida a finalidade que era visada pela exigência legal de tal menção.
No caso dos autos, o A. não ficou afetado no direito de impugnar, pois reagiu contenciosamente contra o despacho da Chefe de Divisão que considerou lesivo dos seus direitos. Nenhum prejuízo lhe adveio, assim, da omissão daquela referência, pelo que tal formalidade se degradou em não essencial, não determinando qualquer invalidade do ato.
Improcede assim quanto a este fundamento a presente ação.

2.3. Erro nos pressupostos face à possibilidade de legalização da obra

Sustenta o A. que o despacho de 25.6.2010 que rejeitou liminarmente o pedido de licenciamento das obras de edificação, proferido no processo LEDI 275/2010, padece de erro nos pressupostos por a obra ser legalizável.
Dispensamo-nos de repetir tudo quanto ficou dito no ponto 1.2. supra, em sede de apreciação do erro nos pressupostos de facto do ato de demolição, para cujos fundamentos remetemos e que aqui damos por reproduzidos.
Com efeito, considerando que o terreno onde foi edificada a casa de madeira e o alpendre, se insere em solo classificado como solo com aptidão elevada/moderada para o uso agrícola genérico, e integrado em RAN, não tendo sido obtido parecer favorável pela Entidade Regional da RAN, e, bem assim, que em parte o terreno é abrangido por Reserva Ecológica Nacional, a ação de construção é proibida, nos termos dos art. 14.º, n.º 1 do RPDM, 21.º, al. a), 22.º e 38.º DL 73/2009 e 4.º, n.º 1 do DL 93/90 (e hoje 20.º, n.º 1, al. b) do DL 166/2008 e art. 68.º, al. a) do DL 555/99, não se verificando no caso dos autos o preenchimento dos pressupostos de que dependem as exceções a essa proibição, nem tendo sido obtida a autorização das entidades da RAN e REN, naturalmente que a obra do A. é ilegalizável.
E não sendo passível de legalização, não restava à entidade demandada que não rejeitar liminarmente a aprovação do processo LEDI 275/2010 nos termos do n.º 4 do artigo 11.º do RJUE porque manifestamente contrário às normas legais aplicáveis.
Improcede, pois, também quanto a este fundamento a presente ação.
X

Constitui entendimento unívoco da doutrina e obteve consagração legal o de que o objecto do recurso jurisdicional se encontra delimitado pelas conclusões extraídas da motivação, por parte do recorrente, não podendo o tribunal ad quem conhecer de matéria que nelas não tiver sido versada, com ressalva óbvia, dos casos que imponham o seu conhecimento oficioso.
Assim, vejamos:
Alega o Recorrente que realizou obras no seu prédio (remodelação de um anexo, o qual passou a dispor de cozinha, duas casas de banho e dois quartos em estrutura pré-fabricada de madeira, e de uma eira, a qual foi dotada de uma cobertura em madeira, revestida com telha cerâmica e sustentada em pilares de granito), sem a devida licença municipal, pelo facto de o seu neto, que alegadamente vive com ele, ter profundas limitações motoras, fazendo-se transportar em cadeira de rodas, sendo que as obras eram necessárias para prover ao dia-a-dia do mesmo, facto sobre o qual o Tribunal a quo não se pronunciou.
Entende, pois, o Recorrente que a sentença recorrida padece do vício de omissão de pronúncia, sendo, por isso, nula, tanto mais quanto é certo que, caso o Recorrente tivesse tido a oportunidade de fazer prova de tal facto, a decisão teria sido em sentido oposto àquele em que foi proferida.
Não lhe assiste razão.
Segundo o artigo 615º do NCPC (artº 668º do CPC de 1961), sob a epígrafe “Causas de nulidade da sentença”,
1 - É nula a sentença quando:
a) Não contenha a assinatura do juiz;
b) Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão;
c) Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível;
d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento;
e) O juiz condene em quantidade superior ou em objeto diverso do pedido.
2 -…. .
3 -….. .
4 - As nulidades mencionadas nas alíneas b) a e) do n.º 1 só podem ser arguidas perante o tribunal que proferiu a sentença se esta não admitir recurso ordinário, podendo o recurso, no caso contrário, ter como fundamento qualquer dessas nulidades.
Nos termos das alíneas b)

Dos incontáveis arestos dos tribunais superiores que reiteram a mesma doutrina jurisprudencial nesta matéria, retemos o Acórdão do Pleno da Secção do CA do Supremo Tribunal Administrativo, de 15-11-2012, proc. 0450/09, que sumariou: “(…) II - A estrutura da sentença está concebida no artº 659º do CPC, devendo a mesma começar por identificar as partes, o objecto do litígio (fixando as questões que que ao tribunal cumpre solucionar), os fundamentos (de facto e de direito) e concluindo com a decisão. Delineada a estrutura deste acto jurisdicional (por excelência), o desvio ao figurino gizado pelo legislador ocasiona uma patologia na formação e estruturação da decisão susceptível de a inquinar de nulidade (artº 668º nº1 do CPC).

III - Um dos elementos estruturantes da sentença é a fundamentação. Esta tem duas funções: uma função endoprocessual e uma função extraprocessual. A função endoprocessual é aquela que desenvolve a motivação da sentença, entendido como requisito técnico da pronúncia jurisdicional, no interior do processo; a função extraprocessual da motivação está ligada com a natureza garantista da absoluta generalidade e na consequente impossibilidade de a entender como derrogável ad libitum pelo legislador ordinário (e muito menos como derrogável ad libitum pelo juiz ou pelas partes.

IV - A nulidade da sentença por falta de fundamentação só ocorre quando haja ausência absoluta de motivação, ou seja, total omissão dos fundamentos de facto ou de direito em que a decisão assenta. (…)”.

e c) só ocorre nulidade quando falte a fundamentação (de facto/de direito devidamente especificada) ou quando a fundamentação da decisão aponta num sentido e a decisão em si siga caminho oposto, isto é, as situações em que os fundamentos indicados pelo juiz deveriam conduzir logicamente a um resultado oposto ao que se contém na sentença ou agora, também quando a decisão seja ininteligível por alguma ambiguidade.
Esta nulidade (al. c)) pressupõe um vício real no raciocínio expresso na decisão, consubstanciado na circunstância de a fundamentação explicitada na mesma apontar num determinado sentido, e, por seu turno, a decisão que foi proferida seguir caminho oposto, ou, pelo menos, diferente, ou ainda não ser perceptível face à fundamentação invocada. Isto é, a fundamentação adoptada conduz logicamente a determinada conclusão e, a final, o juiz extrai outra, oposta ou divergente (de sentido contrário).
Não se confunde com o erro de julgamento, seja quanto à apreciação dos factos feita pelas instâncias, seja quanto às consequências jurídicas deles extraídas, por inadequada ter sido a sua subsunção à regra ou regras de direito pertinentes à situação concreta a julgar.
Trata-se, pois, de uma irregularidade lógico-formal e não lógico-jurídica.
Já a “omissão de pronúncia” está relacionada com o dever que o nº 1 do artº 95º do CPTA impõe ao juiz de decidir todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, não podendo ocupar-se senão das questões suscitadas, salvo quando a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras.
Nestes termos, a nulidade da decisão por “omissão de pronúncia” verificar-se-á quando exista uma omissão dos deveres de cognição do tribunal, o que sucederá quando o juiz não tenha resolvido todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação e cuja decisão não esteja prejudicada pela solução dada a outras.
Assim, a “omissão de pronúncia” existe (só existe) quando o tribunal deixa, em absoluto, de apreciar e decidir as questões que lhe são colocadas, e não quando deixa de apreciar argumentos, considerações, raciocínios, ou razões invocados pela parte em sustentação do seu ponto de vista quanto à apreciação e decisão dessas questões.
Logo, não se verifica tal nulidade quando todas as questões que as partes submeteram à apreciação jurisdicional foram objecto de decisão.
Voltando ao caso concreto, sustenta o Recorrente que a decisão proferida padece de nulidade por omissão de pronúncia dado o Tribunal não ter conhecido a necessidade das obras de remodelação face às limitações do seu neto como motivo para obtenção de parecer favorável pela RAN e a existência das construções há dezenas de anos pelo que não contendiam com a RAN.
Ao contrário do alegado o Tribunal conheceu de todas as questões que foram suscitadas nos autos entendendo, e bem, quanto ao referido, que se tratava de erro nos pressupostos face à possibilidade de legalização da obra.
Esta matéria foi, assim, abordada na decisão, entendendo, todavia, o Tribunal em sentido diverso do Autor.
Este confunde nulidade com erro de julgamento.
Com efeito, o motivo que o Recorrente alega para justificar a realização das obras ilegais não poderia ser acolhido pelo Município no momento em que praticou o acto impugnado, nem muito menos pelo Tribunal a quo na sua decisão, porquanto todos devem respeito à lei, por igual, ou seja, a lei é igual para todos e todos têm que a cumprir, sem excepção. Nesta conformidade, o Recorrente não poderia beneficiar de um tratamento jurídico diferente pelo facto de ter tido necessidade de realizar as obras pelo pretenso motivo que alegadamente o foi.
Mas mais, legitimar a atitude do Recorrente seria injusto para todos quantos os que dão entrada a tempo e horas nos serviços do Recorrido dos processos de licenciamento de obras, obtêm as necessárias licenças de construção e de utilização, pagam as taxas urbanísticas correspondentes, têm as despesas inerentes à apresentação dos projectos, ou seja, gastam tempo e dinheiro para poderem construir de forma legal. Como é óbvio, estes munícipes estariam a ser prejudicados em relação ao Recorrente e a outros que procedem de igual forma, os quais acabam por sair beneficiados com a situação, porquanto nem sempre as situações de ilegalidade urbanística são detetadas.
Com efeito, se os serviços de fiscalização do Recorrido não tivessem dado conta da ilegalidade urbanística em causa, a situação manter-se-ia assim, indefinidamente, porquanto o Recorrente nunca teria dado entrada do processo de legalização nos serviços do Recorrido com vista à reposição da legalidade urbanística violada.
Sendo assim, o motivo invocado pelo ora Recorrente, apesar de sério e grave, e mesmo que correspondente à verdade, não justifica o seu comportamento e não transforma as obras ilegais em legais, não isenta o Recorrente de dar entrada do competente processo na Câmara com vista à eventual legalização das mesmas, nem muito menos constitui fundamento válido para considerar desproporcional a medida de tutela da legalidade urbanística adoptada pelo Município, nem tem a virtualidade de permitir ao Tribunal decidir em sentido contrário àquele em que efectivamente decidiu - lê-se nas contra-alegações e aqui corrobora-se.
Na verdade, o Tribunal tem apenas que apreciar e julgar a questão jurídica relativa à legalidade do acto administrativo de demolição das construções ilegais praticado pelo ora Recorrido, mas já não a questão pessoal/humana relativa à motivação alegada para a edificação das construções ilegais.
Por outro lado, o facto em si é perfeitamente instrumental, acessório e sem qualquer relevância ou interesse para a questão legal em causa nos autos, daí que o Tribunal não tivesse que se pronunciar sobre o mesmo. Na verdade, o facto relevante é que o Recorrente realizou obras sem licença municipal, tal como o mesmo sempre reconheceu nos autos. O motivo pelo qual realizou as obras é inócuo para a apreciação da legalidade do acto de demolição praticado pelo Recorrido e em causa nestes autos. Na verdade, não é por tal facto que as obras ilegais poderiam ter sido realizadas, sendo que tal facto não isenta o Recorrente de ter que as legalizar.
Por outro lado, mesmo que o Tribunal se tivesse, porventura, pronunciado sobre as motivações do Recorrente para a realização das obras ilegais, o que é certo é que, ainda assim, tendo sido feita prova cabal quanto à ilegalidade e insusceptibilidade de legalização das mesmas, o Tribunal sempre teria que ter decidido pela legalidade do acto administrativo sindicado, ou seja, sempre teria que ter decidido no mesmo sentido em que o fez.
Sendo assim, a sentença recorrida não se encontra ferida de nulidade.
Alega depois o Recorrente que a sentença não teve em conta nem se pronunciou quanto ao facto de as construções ilegais terem sido edificadas há várias dezenas de anos e já existirem à data da criação da RAN, sendo que a remodelação das mesmas não contende com a RAN, o que inquina pretensamente a sentença recorrida do vício de omissão de pronúncia.
Também a este propósito não lhe assiste razão.
Antes de mais, o Recorrente não fez prova da data da edificação das construções, e bem assim, da legalidade das mesmas.
E, no que à remodelação das construções diz respeito, o Recorrente confessou em sede de p.i., e bem assim, em sede de alegações de recurso, que as obras de remodelação que realizou são ilegais, justamente porque contendem com o regime da RAN, motivo pelo qual o Recorrente solicitou à Entidade Regional da RAN a desafetação do uso agrícola de uma faixa de 300 m2 para legalizar as obras realizadas. Trata-se de facto confessado pelo Recorrente ao longo do processo, pelo que não vale agora alegar que a remodelação das construções não contende com a RAN.
Ademais, o facto de o Recorrente alegar que as construções que edificou têm várias dezenas de anos é perfeitamente inócuo, acessório e sem influência na decisão a proferir pelo Tribunal, daí que este nem sequer se tenha pronunciado sobre tal facto, como não tinha que o fazer, tanto mais quanto é certo que isso não isenta o Recorrente e ora Recorrente de ter de proceder à legalização das mesmas e, em caso de impossibilidade de legalização, de ter de proceder à respectiva demolição.
Não é pelo facto de as construções existirem há muito tempo que as mesmas se “transformam” em construções legais.
Na verdade, perante uma qualquer obra ilegal, deve o infractor ser notificado para legalizar a mesma, independentemente da respectiva antiguidade.
Com efeito, quando o Município deteta qualquer ilegalidade urbanística, quer ela exista há um mês, há 10, 20 ou 30 anos, está o mesmo obrigado a actuar no sentido de repor a legalidade urbanística violada, notificando o infractor para efeitos de legalização e ou notificando o mesmo para aplicação da medida de tutela da legalidade urbanística mais adequada ao caso concreto.
As ilegalidades urbanísticas são imprescritíveis porquanto o interesse público na reposição da legalidade urbanística tem de ser acautelado pelo Município em todas as situações.
Como tal, o decurso do tempo não transforma uma situação ilegal em legal, não permite convalidar a ilegalidade.
O poder de ordenar a demolição apresenta-se como vinculado logo que se mostre reconhecida a inidoneidade ou impossibilidade da operação de conformação do edificado com o quadro normativo tido por relevante e aplicável ao caso, poder esse que se configura ainda como imprescritível visto que o seu não exercício não cria ou confere direitos, nem pode conduzir à extinção dos respectivos poderes funcionais visto estarem em causa interesses públicos irrenunciáveis e indisponíveis - Ac. deste TCAN de 27.05.2010, P. 00240/08.4BEPNF.
A sentença recorrida não padece, pois, do apontado vício (de omissão de pronúncia).
Alega depois o Recorrente que a sentença, ao considerar as obras ilegalizáveis por se localizarem em RAN e por existir parecer vinculativo desfavorável da ERRAN à legalização, considerando, por isso, que se impunha ao Recorrido emitir o acto de demolição, tal como o fez, decidiu mal, porquanto não teve em conta que a Entidade Regional da RAN emitiu, efectivamente, parecer favorável à pretensão do Recorrente e o Recorrido “aprovou a construção”.
Ora, também não é assim.
Na verdade, o Recorrente realizou obras ilegais em solo que se localiza em RAN, sendo que, não tendo o Autor obtido a desafetação da RAN, necessária à legalização, mediante a emissão de um parecer prévio favorável da Entidade Regional da RAN, o Recorrido estava vinculado a ordenar a demolição das obras ilegais, o que, repete-se, fez.
Existindo um parecer desfavorável da entidade externa consultada, no caso a ERRAN, cuja pronúncia tem carácter vinculativo para a decisão final a proferir pelo Município, naturalmente que este não poderia ter viabilizado a legalização das obras.
Estes foram os pressupostos que nortearam a prática do acto impugnado, e bem assim, a sentença recorrida.
Todavia, depois da entrada em juízo dos presentes autos, o Recorrente tem vindo a dar entrada de diferentes pedidos de desafetação do uso do solo agrícola junto da ERRAN com vista a legalizar as construções e a obviar à demolição das mesmas, os quais têm vindo a ser sucessivamente indeferidos.
Não obstante, em finais de dezembro de 2016, após reformulação do processo feita pelo Recorrente, segundo aquilo que o mesmo alega nas suas alegações de recurso, obteve finalmente parecer favorável da ERRAN.
É preciso ter em conta que o Recorrente obteve este parecer favorável, o qual incide sobre as obras de ampliação da moradia unifamiliar existente e sobre a legalização de uma piscina no logradouro da mesma. Quanto ao anexo/eira de génese ilegal, objecto de pedido de licenciamento no âmbito do processo n.º 275/10, e objecto do acto de demolição ora em crise, foram os mesmos, efectivamente, demolidos.
Sendo assim, o Recorrente só conseguiu obter o parecer favorável daquela entidade porquanto os anexos/eira ilegais foram demolidos, e como tal, deixaram de fazer parte do pedido de desafetação de solo de uso agrícola numa área de 300 m2, ou seja, porque os pressupostos para a emissão do parecer se alteraram.
Como os pressupostos em que o parecer assentou se alteraram, o sentido do parecer vinculativo daquela entidade também se alterou.
Face a um parecer vinculativo positivo da entidade externa com competência na matéria, como é óbvio, o Recorrido teria que decidir no mesmo sentido, não podendo inviabilizar a legalização.
Sendo assim, em 22.03.2017 foi proferido despacho pelo Sr. Vereador da Área de Gestão e Planeamento Urbanístico da CMVC no sentido de deferir o projecto de arquitectura do pedido de licenciamento relativo à ampliação da moradia unifamiliar e à legalização da piscina, estando actualmente em curso o prazo para apresentação dos projectos de especialidades, tudo levando a crer que a legalização será mesmo exequível, a qual só é possível porquanto o A. obteve um parecer prévio vinculativo favorável da ERRAN, com base em pressupostos de facto diferentes dos iniciais, e que determinaram a prática do acto ora impugnado, parecer esse que é vinculativo para a decisão a proferir pelo Recorrido no processo de legalização - cfr. documento junto pelo Recorrente com as suas alegações de recurso.
Este acto administrativo foi praticado pelo Recorrido em momento posterior ao da prolação da sentença.
Aliás, o Autor e ora Recorrente apenas deu entrada do parecer favorável da ERRAN nos serviços do Município em 21.02.2017, ou seja, 7 dias antes da data da prolação da sentença recorrida (momento em que o Município tomou conhecimento da existência do mesmo) - cfr. documento ora junto.
Sendo assim, e ao contrário do que o Recorrente alega, o Tribunal decidiu correctamente com base nos pressupostos/elementos de facto de que dispunha e que existiam nos autos à data da prolação da sentença e que determinaram a prática do acto sindicado, designadamente, tendo em conta o parecer desfavorável da ERRAN que vinculou a decisão de demolição adoptada pelo Município.
Todos os actos administrativos praticados entretanto pela ERRAN e pelo Município, com base em pressupostos completamente diferentes daqueles em que se sustentou o acto sindicado, actos que o Tribunal desconhecia, inclusivamente, e que no caso do acto praticado pelo ora Recorrido, é até posterior à data da sentença, e como tal, superveniente, nada têm que ver com o acto cuja legalidade foi apreciada nos autos.
O Tribunal não decidiu, pois, fazendo tábua rasa destes elementos. O Tribunal pura e simplesmente desconhecia os mesmos, pelo que não os poderia ter tido em conta na sentença que proferiu, sendo certo que os mesmos nada têm que ver com os pressupostos de facto em que assentou o acto impugnado e cuja legalidade foi o Tribunal a quo chamado a pronunciar-se.
A sentença recorrida não merece, pois, reparo, porquanto do ponto de vista da dinâmica dos factos e do direito está correcta.
Em suma:
-o Recorrente realizou obras ilegais em solo que se localiza em RAN, sendo que, não tendo obtido a desafetação da RAN, necessária à legalização, mediante a emissão de um parecer prévio favorável da Entidade Regional da RAN, parecer que tem carácter vinculativo para a decisão final a proferir pelo Município, não restava a Este, ora Recorrido, outra alternativa que não fosse a de ordenar a demolição das obras ilegais;
- é certo que, em finais de dezembro de 2016, após reformulação do processo feita pelo Recorrente, obteve este, finalmente, parecer favorável da ERRAN, o qual incidiu sobre as obras de ampliação da moradia unifamiliar existente e sobre a legalização de uma piscina no logradouro da mesma, sendo que, o anexo/eira ilegal, objecto de pedido de licenciamento n° 275/10, e objecto do acto ora em crise, foram, efectivamente, demolidos;
- na sequência deste parecer positivo da entidade externa com competência na matéria, a Câmara Municipal de Viana viabilizou a legalização da obra;
- todavia, este acto de viabilização foi praticado pelo Recorrido em momento posterior ao da prolação da sentença, sendo que o parecer da ERRAN apenas deu entrada nos serviços do Recorrido em 21.02.2017, ou seja, 7 dias antes da data da respectiva prolação;
- deste modo, o Tribunal a quo decidiu de facto e de direito de forma acertada, com base nos pressupostos/elementos de facto de que dispunha e que existiam nos autos à data da elaboração da respetiva sentença e que determinaram a prática do acto sindicado, designadamente tendo em conta o parecer desfavorável da ERRAN que vinculou a decisão de demolição adoptada pelo Réu/Município.
Improcedem, assim, as conclusões da peça processual do Recorrente.
DECISÃO
Termos em que se nega provimento ao recurso.

Custas pelo Recorrente.
Notifique e DN.


Porto, 29/5/2020


Fernanda Brandão
Hélder Vieira
Helena Canelas