Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01466/10.6BEBRG
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:01/24/2017
Tribunal:TAF de Braga
Relator:Vital Lopes
Descritores:IMPUGNAÇÃO
JUNÇÃO DE DOCUMENTOS COM AS ALEGAÇÕES
CORREÇÕES À MATÉRIA TRIBUTÁVEL
Sumário:1. Em sede de recurso, é legítimo às partes juntar documentos com as alegações quando a sua apresentação não tenha sido possível até esse momento (superveniência objectiva ou subjectiva), quando se destinem a provar factos posteriores ou quando a sua apresentação apenas se tenha tornado necessária por virtude de ocorrência posterior ao julgamento em 1.ª instância;
2. É de recusar a junção de documentos para provar factos que já antes da decisão a parte interessada sabia estarem sujeitos a prova, não podendo servir de pretexto à sua junção em fase de recurso a mera circunstância de a sentença não ter valorado a prova dos autos no sentido que esperava, pretendendo que o tribunal ad quem forme diversa convicção sobre os factos com base (ou também com base), na prova requerida.
3. O interesse das testemunhas na causa não configura inabilidade para depor, mas apenas um elemento susceptível de, juntamente com todos os outros colhidos no seu interrogatório principal, ter influência na valoração dos seus depoimentos.
4. As correcções à matéria tributável devem fazer-se com base na contabilidade salvo nas situações de impossibilidade comprovada, nos termos da lei;
5. Em caso de determinação da matéria tributável por métodos indirectos, compete à administração tributária o ónus da prova da verificação dos pressupostos da sua aplicação, cabendo ao sujeito passivo o ónus da prova do excesso na respectiva quantificação (artigo 74.º, n.º 3 da LGT).
6. Persistindo a situação de "non liquet" quanto ao excesso na quantificação a que chegou a Administração tributária, a dúvida terá de ser decidida em desfavor da recorrente, que não logrou provar a existência de tal excesso, nem se afigura evidente para este Tribunal que o alegado excesso na quantificação resulte das regras da experiência comum ou que seja manifesto, notório ou ostensivo.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:J..., Lda.
Recorrido 1:Fazenda Pública
Decisão:Negado provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:ACORDAM EM CONFERÊNCIA NA SECÇÃO DO CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO NORTE

1 – RELATÓRIO

J…, Lda., recorre da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga na parte em que julgou improcedente a impugnação judicial apresentada das liquidações adicionais de IRC, dos exercícios de 2006, 2007 e 2008, no montante global de 238.227,64€.

O recurso foi admitido com subida imediata nos próprios autos e efeito devolutivo (fls.511).

Na sequência do despacho de admissão, a Recorrente apresentou alegações e formulou as seguintes «V – CONCLUSÕES:
i. O objecto do presente recurso encontra-se resumido nos pontos 12 a 25 das presentes alegações e que aqui se resumem:
a. vício de omissão de pronúncia, como adiante melhor se verá, o que determina a sua nulidade;
b. erro na subsunção dos factos ao direito, mesmo que se considerasse inalterada a decisão factual que a sentença integra – e que, como se verá, não pode manter-se –;
c. erro de julgamento da matéria de facto, por erro na apreciação da prova produzida, e omissão de pronúncia quanto à decisão factual por insuficiente;
d. além de se verificar na sentença proferida vício de fundamentação, nomeadamente por contradição entre os fundamentos e a decisão.
e. E, assim sendo, como é, a decisão a proferir no âmbito de presente recurso não pode ser outra que não a de julgar pela sua procedência, declarando-se nula a sentença proferida, e/ou promovendo a sua anulação, com revogação e substituição por outra decisão que julgue procedente a impugnação e anule as liquidações impugnadas.

ii. A decisão final proferida na sentença apoia-se, desde logo, na decisão factual que a mesma integra - nomeadamente na decisão de dar como provado o que vem vertido nos pontos 1. a 21. dos factos dados como provados.

iii. Para fundamentar aquela decisão tem efectiva relevância, não a decisão de dar como provados os factos vertidos nos pontos 1. a 21. dos factos provados mas, sobretudo, a decisão de dar como não provados os factos que foram sumariados nos pontos a) a e) dos factos não provados.

iv. É que, o Tribunal a quo não julga provada a verificação do que a Administração Tributária e Aduaneira (AT) invocou para fundamentar as correcções efectuadas em sede de IRC à Recorrente – cfr. decisão quanto aos factos provados –, como o Tribunal a quo não julga ter resultado provado o que a AT invoca para fundamentar a decisão de não proceder à revisão da matéria tributável fixada por métodos indirectos no âmbito do procedimento de revisão – cfr. decisão quanto aos factos provados.

v. Nos pontos 14. a 18. dos factos julgados provados, o Tribunal a quo julga apenas provado que a AT, para fundamentar as correcções efectuadas, invocou o que ali deixou transcrito.

vi. Aquilo que efectivamente serviu de base para o Tribunal a quo proferir a sentença posta em crise, nos termos em que esta foi proferida, foi a decisão de:

- ter julgado provado, “em bloco”, que o relatório inspectivo tem o teor que AT nele inscreveu;
- ter julgado não provado, “em bloco”, o que foi invocado pela Recorrente - quer em sede de procedimento inspectivo, quer de procedimento de revisão, e, posteriormente, no âmbito da presente impugnação.
vii. Por uma formulação genérica e “sacramental”, o Tribunal a quo afirma ter analisado criticamente todos os elementos probatórios para julgar como provados os factos que a esse título elencou nos pontos 1. a 21. daquela decisão, referindo, genericamente, ter considerado todos os elementos documentais e depoimentos das testemunhas, e remetendo, também genericamente, para o seu conjunto, sem nunca se referir ao que concretamente resulta daqueles documentos e depoimentos.

viii. Tal procedimento, em si mesmo, não é digno de censura. Todavia, para além disso, constata-se que, na sentença proferida, não é possível reconstituir o percurso cognoscitivo efectuado em tal análise crítica, porquanto não é possível vislumbrar de que modo a análise que refere ter levado a cabo permitiu ao Tribunal a quo dar como provados cada um dos factos que assim julgou.

ix. É que, na decisão recorrida, o Tribunal a quo não se refere, concretamente, a análise de qualquer documento que se encontra junto aos autos, nem divulga de que modo cada um deles foi valorado no processo de decisão e porquê, como não refere, sequer, quais os factos alegados que entendeu validamente impugnados, mas que, ainda assim, julgou provados tendo em consideração as regras do ónus de prova que invoca, e de que modo.

x. Por outro lado, o Tribunal a quo também não explica na sentença em causa de que modo valorou cada um dos depoimentos prestados pelas testemunhas inquiridas, por referência ao teor concreto do depoimento, para concluir por provados os factos em causa, não referindo, sequer, se considerou todos os depoimentos prestados, em toda a sua extensão, ou se considerou uns e outros apenas em parte, e que medida, indicando concretamente em que parte foram considerados/desconsiderados e porquê.

xi. A obrigação da fundamentação das decisões, mormente das decisões judiciais, visa exactamente dar a conhecer aos seus destinatários quais foram as razões que levaram o decisor a proferir decisão no sentido em que esta foi emanada, de modo a que o destinatário, podendo eventualmente não concordar com a decisão proferida, compreenda quais foram as concretas razões e o percurso cognitivo que levou a que a decisão proferida fosse aquela e não outra. Como é por demais sabido, só conhecendo a fundamentação da decisão poderá o seu destinatário sindicar a apreciação feita pelo Tribunal dos elementos probatórios em causa e reagir contra tal decisão.

xii. Assim sendo, como é, fundamentando a decisão de dar como provados os factos assim julgados pelo Tribunal a quo, fica a Recorrente impedida de conhecer quais as concretas razões que levaram a dar como provados aqueles factos e não outros, ou de não ter julgado tais factos como não provados, porquanto não lhe foi dado a conhecer quais foram os concretos elementos probatórios, documentais e testemunhais, ou qual foi a análise que destes foi feita, nomeadamente pela confrontação de uns e outros, que permitiu ao Tribunal concluir por julgar provados os factos vertidos nos pontos 1. a 21. dos factos provados, o que constitui vício de fundamentação, por falta absoluta de fundamentação, ou, pelo menos, por fundamentação insuficiente, o que constitui vício da decisão proferida que a impede de se manter na ordem jurídica (cfr. art. 125.º do CPPT e 615.º n.º 1 b) do CPC).

SEM PRESCINDIR

xiii. O Tribunal a quo limitou-se a dar como provado, no ponto 16., 17., e 18. da matéria de facto, que o relatório de inspecção tributária (RIT) formulou as conclusões transcritas e que tinha os anexos ali referidos – isto é, que o RIT tinha o teor que tem.

xiv. Essa matéria de facto é insuficiente para proferir uma decisão de mérito sobre a impugnação judicial, uma vez que não se discute que, efectivamente, a AT tenha formulado essas conclusões, o que constitui vício de fundamentação por oposição entre os fundamentos e a decisão, e consequente nulidade, ou, pelo menos, por fundamentação insuficiente o que equivale a falta de fundamentação com idênticas consequências.

SEM PRESCINDIR
xv. Por outro lado, ainda que se entendesse que o Tribunal a quo deu, outrossim, como provados os todos os pressupostos e conclusões do RIT, na íntegra – o que não se concede e apenas se admite como hipótese de raciocínio – tal sempre configuraria nulidade da sentença – por não especificação dos fundamentos de facto para a decisão, não podendo o Tribunal limitar-se a proferir uma decisão jurídica de fundo com base na adesão, em bloco, à factualidade constante um relatório inspectivo, mas, ao invés, deve fazer uma apreciação crítica da matéria de facto, por remissão para os elementos probatórios – documentais, testemunhais, ou outros – em que fundou a sua decisão.

xvi. É certo que, como referido, na sentença recorrida o Tribunal a quo recorre a uma formulação genérica, habitualmente utilizada, para referir que “considerou provada a matéria de facto relevante para a decisão da causa com base na análise crítica e conjugada dos documentos juntos aos autos”, no entanto, o Tribunal a quo não remete, na decisão, para os documentos ou depoimentos que, em concreto, a suportam.

xvii. Salvo o devido respeito, o “conteúdo mínimo” fundamentador não foi observado na douta Sentença sob apreciação¸ pelo que, tal como dispõe o artigo 125.º, n.º 1, do CPPT, se verifica uma das causas de nulidade da decisão judicial reside na “não especificação dos fundamentos de facto e de direito” da decisão.

xviii. Logo, nos moldes em que foi dada a sentença recorrida, afigura-se que a mesma é perfeitamente hermética e insindicável, pelo que o procedimento adoptado pelo Tribunal a quo acarreta a nulidade da sentença – nos termos dos sobreditos preceitos legais.

xix. Efectivamente, "Da conjugação dos artigos 653º, nº2 e 3, e 712º, nº3, do Código de Processo Civil, conclui-se que a fundamentação das respostas aos quesitos provados deve fazer-se por indicação dos fundamentos que foram decisivos para a convicção do juiz. O que compreende não só os meios concretos de prova, mas também as razões ou motivos por que eles relevaram ou obtiveram credibilidade no espírito do julgador. Não satisfaz esta exigência a mera referência genérica aos meios de prova produzidos, sem referência concreta a cada um deles, de forma a garantir a identificação deles com a fonte de cada resposta". (Ac. STJ 11.03.83 e, no mesmo sentido, Ac. TCAS, de 30.04.2008, proc. 03202/07).

Sempre SEM PRESCINDIR
ii. Do erro na decisão quanto aos factos dados como não provados, violação das regras do ónus de prova (art. 74.º da LGT) e vício da fundamentação daquela decisão – anulabilidades e nulidade
xx. Como resuma da sentença recorrida, o Tribunal a quo julgou não provados os seguintes factos:

«a) Que a aplicação informática pode, por si, praticar saltos de numeração – cfr. depoimento de António....
b) Que os saltos na numeração ocorrem quando se verifica uma transferência completa de mesa em conjugação com a opção “Não registar processos vazios” activa.
c) Que os saltos na numeração ocorrem quando se verifica um pagamento avançado com divisão múltipla de conta – cfr. depoimento de António....
d) Que os saltos na numeração ocorrem quando está activa a opção “aloca dinamicamente”.
e) Que a falta de linhas pode dever-se ao facto do registo ter sido anulado ou o pedido ter sido transferido para outra mesa – cfr. depoimento de António....» (sic sentença recorrida).
xxi. Como se vê, para fundamentar aquela decisão, o Tribunal a quo invoca, desde logo, quanto aos factos referidos em a), c) e e), o depoimento prestado pela própria testemunha ouvida, António....

xxii. A fundamentação apresentada pelo Tribunal a quo para legitimar a decisão de julgar não provados os factos que assim decidiu, pelo que nada refere quanto ao concreto conteúdo do depoimento de cada uma das testemunhas e, mesmo relativamente aqueles depoimentos que reputa de sérios e credíveis, não retira deles qualquer facto provado sem explicar porquê por referência ao concreto depoimento.

xxiii. O que o Tribunal a quo faz apenas uma apreciação quanto à seriedade e credibilidade que diz ter dado cada um dos depoimentos, referindo relativamente às primeiras 3 testemunhas que as mesmas depuseram de forma séria e credível, referindo ainda, quanto ao depoimento de António Joaquim de Ramos Oliveira, que relativamente a “alguma questões” - que não especificou quais fossem ou a que factos se refeririam - deu respostas genéricas e não reportadas concretamente à Recorrente, e quanto à testemunha A..., refere o Tribunal a quo que por vezes não respondeu com o rigor e concretização necessários, e que quanto a algumas questões titubeou na resposta, reconhecendo ainda assim a credibilidade e seriedade do depoimento prestado, sem nunca esclarecer o Tribunal a quo, afinal a que respostas ou factos concretos a resposta dada careceria de mais concretização e rigor e porquê.

xxiv. Uma decisão nestes termos é, salvo o devido respeito, perfeitamente hermética e insindicável, pelo que padece vício de fundamentação que acarreta a sua nulidade.

xxv. Já quanto ao depoimento de J…, o Tribunal a quo começa por referir que este teria interesse directo na decisão da causa, quando o depoente em causa, a ter interesse na causa, seria sempre um interesse indirecto, na medida em que era gerente à data dos factos em causa nos autos e nessa medida poderia, em abstracto, ser responsabilizado subsidiariamente no pressuposto de se verificarem cumulativamente cada um dos requisitos legalmente estabelecidos na lei para esse efeito, sendo certo que, da decisão da causa, não resulta directamente para aquela testemunha qualquer consequência, e muito menos de forma automática.

xxvi. Por outro lado, neste ponto, o Tribunal a quo invoca as pessoas que, nos termos da lei, estão impedidas de depor como testemunhas, sem esclarecer se, afinal, entendia estar verificado algum impedimento ao depoimento daquela testemunha – o que não parece ter sucedido, na medida em que a inquirição foi efectuada, mas, todavia, o Tribunal a quo invoca que tal impedimento legal se encontraria estabelecido com base num juízo do legislador de falta de isenção do depoimento de quem pode depor como parte.

xxvii. É certo que o depoente foi efectivamente gerente da Recorrente no período temporal em causa, mas à data da inquirição já não agia em representação daquela, sendo certo que, ainda que assim fosse, a possibilidade de representar outra pessoa jurídica não exclui, por si só, a isenção do depoimento que possa prestar sobre factos pessoais ou de que tenha conhecimento directo.

xxviii. Só a análise concreta do depoimento prestado permitirá ao julgador aferir da isenção e credibilidade de determinado depoimento, pelo que, sem a fundamentação dos motivos pelos quais se julgou pela inexistência de credibilidade da testemunha – por referência ao teor do seu depoimento - tais argumentos, apresentados pelo Tribunal a quo para a completa desconsideração do depoimento prestado por J…, não podem colher.

xxix. Para retirar a credibilidade ao depoimento testemunhal não basta concluir que “a testemunha não logrou testemunhar de forma isenta”, sendo imperativo concretizar, fundamentadamente, as efectivas razões que levaram a julgador a concluir nesse sentido – nomeadamente, pela convocação de questões ou factos contraditórios ou incoerentes com os resultantes de outros meios de prova, ou pela identificação das questões ou factos a que a testemunha não respondeu ou demonstrou desconhecer, por contraponto com a identificação dos motivos pelos quais, em condições normais, se entendida que tais questões ou factos deveriam ser do seu domínio, etc.

xxx. Nada disto foi feito, in casu, tornando a decisão perfeitamente hermética e insindicável, padecendo assim de vício de fundamentação que acarreta a sua nulidade.

Sempre SEM PRESCINDIR
xxxi. Ao contrário do referido pelo Tribunal a quo, o legislador não estabeleceu a limitação de depor como testemunha de quem seja parte por considerar que carecem, por natureza, de isenção para depor, mas, antes, face à regra processual que estabelece que as partes podem ser ouvidas por meio de depoimento de parte, destinado apenas a obter a confissão, pelo que estava em causa, portanto, uma impossibilidade legal de depor como testemunha na medida em que o objecto daquele meio de prova não se coadunava com objecto do meio de prova por confissão.

xxxii. Estando em causa o depoimento de pessoa singular que tinha a possibilidade de vincular a pessoa colectiva de que fosse representante, a nossa jurisprudência mais esclarecida já defendia que havia que distinguir o depoimento do legal representante nessa qualidade, que não era possível por meio de depoimento testemunhal, do depoimento de quem fosse legal representante mas que, na qualidade de pessoa jurídica autónoma, era passível de ser prestado na qualidade de testemunha quanto a factos pessoais deste (cfr. Ac. TCAS de 09.02.2010, proc. 03502/09).

xxxiii. Por outro lado, contra a ponderação feita pelo Tribunal a quo militam as actuais regras processuais – aliás vigentes há muito em outros ordenamentos jurídicos congéneres – que, como é sabido, possibilitam expressamente o depoimento das próprias partes, a requerimento próprio, a matéria mais extensa do que a mera confissão,

xxxiv. Interpretar aquelas normas de modo diverso sempre constituiria violação ao princípio de igualdade das partes, e princípio de igualdade de direitos processuais, nomeadamente quanto aos meios de prova de que estão ao dispor destas (art. 4.º do CPC ex vi art. 2.º do CPPT).

xxxv. De outro modo não se compreenderia a possibilidade, por exemplo, de a AT poder ser ouvida nos processos em que esteja em causa a sua actuação em sede inspectiva, nomeadamente pela inquirição dos Técnicos de Inspecção Tributária no âmbito dos processos em que se discutissem as correcções por estes efectuadas, sem se entender que, por natureza, também não estaria em posição de oferecer depoimento isento e sério, e isto pelo simples facto de que o resultado da acção acarretaria o esvaziamento das consequências do trabalho por estes pessoalmente desenvolvido em sede inspectiva – aliás com consequências financeiras directas na AT e consequências financeiras directas do próprio inspector - com efeito, nos termos do artigo 24.º n.º 3 do D.L. 107/97 de 08.05, que criou o fundo de estabilização tributária, é afecto ao referido fundo um montante até 5% dos impostos arrecadados, montante esse que, nos termos do n.º 2 do mesmo artigo é afecto, nomeadamente, ao pagamento de suplementos aos próprios inspectores tributários.

xxxvi. Não bastasse, sempre haverá que ter em consideração que o Tribunal a quo, apesar das afirmações quanto à habilidade ou não para depor, e a falta de isenção potencial ou expectável de quem é parte em qualquer processo atento o interesse na decisão, conclui, referindo-se expressamente ao depoente, que «no que respeita ao depoimento prestado por J…, a falta de isenção foi percepcionada e manifesta», porque «depôs de forma empolgada e emotiva, denotando-se muita ansiedade e inquietude», e «Muitas das vezes não respondeu simplesmente ao que lhe era perguntado, falando incessantemente.».

xxxvii. Ou seja, o Tribunal a quo apenas alude à FORMA de depor da testemunha em causa, sem jamais se referir ao CONTEÚDO do depoimento, o que, salvo o devido respeito, não basta a forma como se depõe, sob pena de uma mentida dita com convicção passar a ser uma verdade.

xxxviii. Isto é, a forma do depoimento não pode ser isoladamente considerada em relação ao seu conteúdo, e, muito menos, pode o temperamento, a forma de estar, a personalidade, ou o estado de espírito das testemunhas, ser sobrestado, de forma absoluta, relativamente aos factos expostos.

xxxix. Outrossim, deve o Tribunal de primeira instância, no seu labor em sede instrutória, divisar quais os factos que considera poderem ser retirados dos depoimentos das testemunhas por referência à razão de ciência das mesmas e face às regras da experiência comum.

xl. Nada disto foi efectuado pelo Tribunal a quo, na medida em que não é mencionada uma única reposta, um único facto, uma única contradição ou incoerência, uma única omissão de um facto que a testemunha devesse conhecer, etc.

xli. A decisão sobre a matéria de facto não pode consistir na referência de que foi ouvida a testemunha X, e na conclusão de que o Tribunal não conferiu credibilidade ao seu depoimento, e isto sob pena de estarmos perante uma decisão puramente arbitrária, sem qualquer conteúdo factual que possa ser sindicado pelo destinatário da decisão judicial – como acontece no caso em apreço.

xlii. Basta ouvir o depoimento da testemunha em causa para se compreender que é justificável a emoção do depoimento e a ansiedade que os factos em causa nos autos provocam ao depoente – como adiante se verá - e, de todo o modo, é sabido que, para o “cidadão comum”, o simples acto de depor perante um Tribunal coloca qualquer testemunha em estado de ansiedade - sobretudo quando é chamada a depor sobre factos de que tem conhecimento directo, e quando confrontada com avultadas correcções, como aquela que está em causa nos autos, que a mesma reputa de injustas e indevidas.

xliii. Salvo o devido respeito, reconhecendo a singularidade dos seres humanos e o facto de que as pessoas têm personalidades, estados de espírito e temperamentos diferentes, é função do Tribunal, nestes casos, orientar os trabalhos de modo a que a testemunha fale pausada e ordenadamente, e se é assim no processo contencioso em geral, deve ser assim, por razões acrescidas, no contencioso tributário – em que incumbe ao juiz diligenciar oficiosamente pela procura da verdade material (art. 13.º CPPT).

xliv. Aliás, tendo em consideração o que está em causa nos autos, e o conteúdo do próprio depoimento sob análise, estranho era que o depoimento não fosse emotivo, e que se não denotasse ansiedade no depoente, e basta ouvir o depoimento em causa para perceber, como a própria testemunha esclareceu o Tribunal, que o procedimento inspectivo subjacente às liquidações impugnadas, culminaram no desemprego da testemunha em causa, no desmoronar da empresa, e na total desorganização da sua vida profissional e pessoal.

xlv. Numa situação como a descrita, o que haveria de resultar estranho ao Tribunal, avaliado segundo as regras de experiência comum, era alguém que, chamado a depor aos factos em causa nos autos, na concreta situação do depoente, não o fizesse de forma emotiva e em estado de ansiedade, pelo que é, aliás, contraditório que o Tribunal a quo o invoque para pretender fundamentar – invalidamente, como se viu – a desconsideração de tal depoimento – o que constitui vício de fundamentação, por oposição entre os fundamentos e a decisão, e consequente nulidade desta, ou, pelo menos, erro de julgamento e consequente anulabilidade.

xlvi. Para proferir decisão sobre a matéria de facto, o Tribunal a quo não chegou a escrutinar, sequer, o efectivo conteúdo do depoimento prestado por aquela testemunha, nada referindo quanto ao que por aquele foi afirmado, e em que medida o depoimento foi consentâneo ou contraditório com a posição defendida pelas partes, do mesmo modo que não analisou aquele depoimento no confronto com os restantes elementos probatórios constantes dos autos, o que constitui igualmente vício de fundamentação a implicar a nulidade da decisão.

xlvii. O Tribunal a quo também se absteve desse necessário labor relativamente ao depoimento das restantes testemunhas ouvidas, em que, igualmente, não analisou aquilo que, em concreto, foi por aqueles afirmado, e em que medida esse depoimento foi contraditório ou consentâneo com a posição defendida pelas partes, e face aos restantes elementos probatórios constantes dos autos, pelo que o Tribunal a quo não analisou em que medida os depoimentos prestados pelas testemunhas se conjugam (ou não) com os restantes elementos probatórios constantes nos autos ou com a apreciação dos factos alegados segundo as regras legalmente estabelecidas quanto ao ónus de prova.

xlviii. Como é entendimento da nossa melhor doutrina, " A fundamentação da apreciação da prova deve ser realizada separadamente para cada facto. A apreciação de cada meio de prova pressupõe conhecer o seu conteúdo (por exemplo, um depoimento da testemunha), determinar a sua relevância (que não é nenhuma quando, por exemplo, a testemunha afirmou desconhecer o facto) e proceder à sua valoração (por exemplo, através da credibilidade da testemunha ou do relatório pericial).» (Miguel Teixeira de Sousa, Estudos sobre o Novo Processo Civil, Lex, 2ª edição, Lisboa 1997, pag.348).

Assim sendo:
xlix. Fundamentando o Tribunal a quo a decisão de desconsiderar completamente o depoimento prestado pela testemunha J…, e a de considerar sérios e credíveis os restantes depoimentos prestados, sem expor o seu conteúdo e sem fazer uma concreta análise daqueles depoimentos, e, bem assim, sem esclarecer, afinal, em que é que tais depoimentos, que foram considerados pelo Tribunal a quo, se conjugam com a decisão de dar como não provados os factos vertidos pelo Tribunal nos pontos a) a e) dos factos não provados, sem nada dizer quanto ao modo como o conteúdo dos depoimentos se conjuga, ou não, com os restantes elementos probatórios contantes dos autos e regras do ónus de prova, incorreu em vício de contradição entre os fundamentos e a decisão, quanto à consideração ou não dos depoimentos, e em vício de falta absoluta de fundamentação quanto à decisão de dar como não provados os factos que assim foram julgados, ou pelo menos, vício de fundamentação insuficiente, a implicar a nulidade da sentença posta em crise (art. 125.º do CPPT e 615.º n.º 1 b) do CPC).

l. Uma decisão nos moldes em que foi dada a sentença recorrida, retira ao Tribunal de recurso (e à Recorrente) a possibilidade de reconstituir o itinerário cognoscitivo seguido para arribar à conclusão formulada, porquanto «o tribunal deve indicar os fundamentos suficientes para que, através das regras da ciência, da lógica e da experiência, se possa controlar a razoabilidade daquela convicção sobre o julgamento do facto provado ou não provado. A exigência da motivação da decisão não se destina a obter e exteriorização das razões psicológicas da convicção do juiz, mas a permitir que o juiz convença os terceiros da correcção da sua decisão. Através da fundamentação, o juiz passa de convencido a convincente (…). Procedendo desta forma, será respeitada a norma do art.º 653º e, em simultâneo, com mais facilidade as partes poderão ser convencidas da razoabilidade da decisão" (Miguel Teixeira de Sousa, op. cit.).

li. É que a fundamentação exerce, por um lado, uma função endoprocessual de "impor ao juiz um momento de verificação e controlo crítico da lógica de decisão, permitir às partes o recurso da decisão com perfeito conhecimento da situação e ainda colocar o tribunal de recurso em posição de exprimir, em termos mais seguros, um juízo concordante ou divergente", e por outro lado, uma função extraprocessual "que procura, acima de tudo, tornar possível o controlo externo e geral sobre a fundamentação factual, lógica e jurídica da decisão - que procura, dir-se-á por outras palavras, garantir a "transparência" do processo e da decisão" (Ac. TC nº. 55/85 publicado no BMJ 360 (Suplemento) pág. 195).

Sempre SEM PRESCINDIR
lii. Ainda que assim não se entendesse – o que não se admite – sempre haveria de concluir-se que o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento quanto à decisão de dar como não provados os factos vertidos nos pontos a) a e) daquela decisão, bem como incorreu em vício de contradição entre os fundamentos e a decisão (art. 125.º do CPPT e 615.º n.º 1 c) do CPC - nulidade), e isto quer se considere apenas os depoimentos que o Tribunal a quo entendeu terem sido prestados de forma séria e credível, quer se considere igualmente – como não pode deixar de se considerar – o depoimento de J…, que o Tribunal a quo, sem qualquer motivação de facto, entendeu simplesmente desconsiderar.

liii. Está em causa nos factos julgados pelo Tribunal a quo como não provados:
1. Na alínea a) o que foi alegado em 69. e 171.da petição e 7. m. das alegações apresentadas ao abrigo do disposto no art. 120.º do CPPT;
2. Na alínea b) o que foi alegado em 70. i. e 171. da petição e 7. n. i. das alegações apresentadas ao abrigo do disposto no art. 120.º do CPPT;
3. Na alínea c) o que foi alegado em 70. ii. e 171. da petição e. 7. n. ii. das alegações apresentadas ao abrigo do disposto no art. 120.º do CPPT;
4. Na alínea d) o que foi alegado em 70. iii. e 171. da petição 7. n. iv. das alegações apresentadas ao abrigo do disposto no art. 120.º do CPPT;
5. Na alínea e) o que foi alegado em 74. e 171. da petição e em parte do ponto 7. q. das alegações apresentadas ao abrigo do disposto no art. 120.º do CPPT.

liv. Àquela matéria, prestaram depoimento as seguintes testemunhas:
1. António… (toda a matéria em causa);
2. A… (70. i. a iii.);
3. J… (69. e 70. i. a iii.).

lv. É remetendo para o depoimento da testemunha António... que o Tribunal a quo afirma que tais factos resultaram não provados, e, como se viu, posteriormente, afirma genericamente que considerou que o depoimento desta testemunha, e da testemunha A..., foram prestados de forma séria e credível.

lvi. Afirma, no entanto, o Tribunal a quo que António... «tendo no entanto por vezes respondido genericamente, isto é, perante situações hipotéticas que lhe foram sendo colocadas, respondeu o que eventualmente ocorreria, não demonstrando de alguma forma o ocorrido na Impugnante» (sublinhado e destaque nossos).

lvii. Assim, a sentença recorrida não explicita quais as “respostas genéricas” a que se reporta, nem expõe a importância principal ou instrumental dos factos subjacentes para a decisão formulada, sendo certo que o depoimento daquela testemunha não pode ser considerado isoladamente, sem o necessário confronto com os restantes elementos probatórios constantes dos autos - nomeadamente os restantes depoimentos das testemunhas inquiridas, a começar logo pelo depoimento das testemunhas que o próprio Tribunal a quo considerou terem sido prestados de modo igualmente sério e credível.

lviii. Como já supra se deixou exposto, o Tribunal a quo não procedeu a essa análise da globalidade dos elementos probatórios constantes dos autos, nomeadamente confortando uns e outros depoimentos, e se o tivesse feito, como se impunha, não poderia ter considerado aqueles factos como não provados.

lix. Do confronto do depoimento da testemunha António... com o depoimento da testemunha A..., resulta que, a utilização do sistema informático de facturação da Recorrente, no caso concreto, ocorria de tal modo que levava necessariamente aos apontados erros do sistema que a AT qualifica como manipulação, e que a Recorrente provou terem origem em facto diverso,

lx. Não pode deixar de concluir-se que a testemunha António... explicou o que acontecia quando determinada opção era usada no sistemas informático da Recorrente - afirmando que daí resultavam linhas nulas, a zero, em branco, saltos de numeração, como a AT reconhece expressamente no RIT.

lxi. O Tribunal a quo impõe à Recorrente, portanto, o cumprimento de um ónus probatório mais exigente que o ónus probatório da AT: esta afirma a existência de saltos de numeração e, depois, formula a conclusão que tais saltos se devem a uma manipulação do sistema, baseando o acto tributário nessa conclusão; a Recorrente, sem colocar em causa a existência desses saltos de numeração, veio justificar a existência dos mesmos – mormente: que a aplicação informática pode, por si, praticar saltos de numeração; que os saltos na numeração ocorrem quando se verifica uma transferência completa de mesa em conjugação com a opção “Não registar processos vazios” activa; que os saltos na numeração ocorrem quando se verifica um pagamento avançado com divisão múltipla de conta; que os saltos na numeração ocorrem quando está activa a opção “aloca dinamicamente”; que a falta de linhas pode dever-se ao facto do registo ter sido anulado ou o pedido ter sido transferido para outra mesa.

lxii. Ora, o Tribunal a quo pretende concluir que, embora evidenciada a existência de saltos de numeração, e embora informaticamente justificada a sua ocorrência, o técnico informático arrolado não demonstrou que os saltos de numeração em causa tiveram aquela origem efectiva - isto é, na opinião do Tribunal a quo, em lugar de ser a AT a demonstrar a verificação dos pressupostos legitimantes da sua actuação – mormente que os saltos de numeração em causa tiveram origem efectiva na manipulação do sistema - é o Contribuinte que tem de demonstrar que aqueles pressupostos não se verificam – o constitui uma ilegal inversão do ónus da prova, em clara violação dos princípios que enformam o procedimento tributário e, sobretudo, das mais básicas garantias da Recorrente, na qualidade de Contribuinte, pelo que a sentença recorrida sempre incorrerá em violação da lei, por errada aplicação do art. 74.º da LGT, a implicar a sua anulabilidade.

lxiii. Na verdade, salvo o devido respeito, o Tribunal a quo impõe à Recorrente a prova de facto negativo – uma verdadeira diabólica probatio.

lxiv. Certo é que, como se disse, o depoimento da testemunha António... tinha necessariamente de ser concatenado com os demais meios de prova – nomeadamente a inquirição da testemunha A..., na medida em que, tal como não se pode exigir ao primeiro que saiba o que acontece no estabelecimento comercial da Recorrente, nos mesmos termos dos seus funcionários, empregados de mesa, não se pode exigir ao segundo, como empregado de mesa, que explique o funcionamento do sistema informático utilizado pela Recorrente e o resultado, em termos de registo, da utilização de determinadas funcionalidades desse mesmo sistema.

lxv. Tendo em consideração o depoimento prestado quanto a esta matéria pela testemunha António Ramos de Oliveira, na diligência de inquirição de 15-05-2012, nomeadamente o que se deixou transcrito no ponto 165. das presentes alegações, para onde se remete por razões de economia processual, e que aqui se dá por integralmente transcrito, e a sua concatenação com o depoimento prestado pela testemunha A..., também quanto à matéria em causa, naquela mesma diligência, nomeadamente o que se deixou transcrito nos pontos 166., 167., 168. e 169. das presentes alegações, para onde se remete por razões de economia processual e que aqui se dão por integralmente transcritos, e mais ainda com o depoimento prestado pela testemunha J…, à matéria em causa, na diligência de inquirição ocorrida em 20-03-2013, designadamente o que se deixou transcrito no ponto 170. supra e que aqui se dá por integralmente transcrito, a decisão de dar como não provados os factos elencados como não provados de a. a e. da sentença proferida não pode manter-se, impondo-se a sua alteração.

lxvi. Da análise dos elementos probatórios constantes dos autos, nomeadamente do depoimento das referidas testemunhas, que aliás são coerentes entre si, resulta inelutavelmente coisa diversa daquilo que o Tribunal a quo julgou quanto aos factos provados e não provados, e é o próprio Tribunal a quo a afirmar que dois daqueles três depoimentos resultaram para o Tribunal como tendo sido prestados de forma séria e credível.

lxvii. Efectivamente, daqueles depoimentos resulta claro que o sistema informático, nos termos em que foi concretamente utilizado pela Recorrente por intermédio dos seus funcionários, determina o aparecimento de registos a zero, nulos, vazios ou salto de numeração – expressões a que é dado igual sentido pelos SIT.

lxviii. Assim, resulta claro que o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento da matéria de facto.

SEM PRESCINDIR
lxix. O Tribunal a quo, quando decide desconsiderar o depoimento da testemunha J... por alegadamente não ter prestado um testemunho isento, quando o que resulta do seu depoimento vai exactamente ao encontro do que foi testemunhado pelas restantes testemunhas ouvidas, nomeadamente os depoimentos considerados sérios e credíveis pelo mesmo Tribunal a quo, incorre também em vício de fundamentação, por contradição entre os fundamentos e a decisão - nomeadamente por fundamentar a decisão de julgar aqueles factos como não provados remetendo para depoimentos de testemunhas (que considerou sérios e credíveis) e dos quais resulta o oposto da decisão proferida pelo Tribunal.

lxx. Tampouco se pode entender, como fez o Tribunal a quo, quanto ao depoimento da testemunha António..., como “técnico informático junto da Impugnante”, quando a propósito desse depoimento:

«Que quanto aos registos de vendas a dinheiro, facturas e recibos há uma sequência, sem faltas, não tendo que ser sequenciais o registo dos documentos.
No que respeita à divisão de conta, afirmou que o sistema cria um novo processo, deixando o anterior a zero, se a conta for dividida por três ficarão 3 registos a zeros.
Ora o Tribunal não percepcionou deste relato que este salto corresponderia à falta de registo do sistema informático e consequência falha de sequência, mas tão só ao registo a zeros no anterior registo.» (sublinhado e destaque nossos).
«Quanto às transferências de mesa afirmou que eram criados dois processos, sendo as mesas alocadas dinamicamente pelo programa.
Ademais, declarou que quando se verificavam estas ficam registadas e se transferido fica o salto, assim como na anulação de linhas que afirmou desconhecer, tendo contudo afirmado que, anuladas e/ou transferidas ficam registadas.
Assim, dos esclarecimentos prestados pela testemunha podemos concluir que as justificações apresentadas não lograram explicar os saltos numéricos, assim como as linhas em falta.» (sublinhado e destaque nossos).

lxxi. É que o trecho vindo de citar, salvo o devido respeito, é ilustrativo do erro de julgamento da matéria de facto, pois como logo se compreende do RIT e como esclarecido no depoimento daquela testemunha, o “salto de linha” ou “linha inexistente” corresponde exactamente a “linha a zeros”, ou “nula”, isto é, corresponde a uma linha de registo que, tendo sido criada, não deu lugar a factura ou venda a dinheiro ou registo interno que justifique a sua existência.

lxxii. Todavia, basta compulsar o RIT para verificar que as correcções determinadas pela AT pressupõem que todas as linhas criadas pelo sistema informático têm de dar lugar NECESSARIAMENTE a uma de três coisas diferentes,:
1. Uma factura;
2. Uma venda a dinheiro;
3. Um registo interno que justifique a inexistência da correspondente factura ou venda a dinheiro;

sendo que neste último caso se inserem, nomeadamente, as anulações que, levando ao surgimento de uma linha de processo nula, a zeros, vazia ou salto de linha – o que corresponde a uma linha de processo de que não resultou a factura ou venda a dinheiro – se encontra registada por registo interno do próprio programa, no caso, registo de anulação que justifica aquela linha nula, vazia, a zelo ou salto.

lxxiii. Ora, o que resultou dos elementos probatórios levados pela Recorrente aos autos é que existem outras circunstâncias que determinam o surgimento daquelas linhas nulas, vazias, a zeros ou referidas como saltos, e que, ao invés do pretendido pela AT, não implicam o correspondente surgimento de registo interno que o justifique.

lxxiv. Ao invés do decidido pelo Tribunal a quo, era à AT que incumbia demonstrar inequivocamente que os saltos de numeração correspondem a uma efectiva manipulação do sistema – porquanto é esse o pressuposto alegadamente legitimador da sua actuação – pelo que a sentença recorrida sempre violaria o disposto no art. 74.º da LGT, o que constitui vício que determina a sua anulabilidade.

Sempre SEM PRESCINDIR
lxxv. O que resulta da concatenação dos depoimentos prestados pelas testemunhas referidas e que supra se deixaram transcritos é que, por exemplo:

- quando há uma transferência completa de mesa em conjugação com a opção “Não registar processos vazios” activa;
- quando há um pagamento avançado com divisão múltipla de conta;
- quando está activa a opção “Aloca mesas dinamicamente”;
surgem linhas de processo nulos, vazios, a zeros, ou saltos de linhas, que não ficam justificados por qualquer registo interno, como ocorre quando há uma anulação.

lxxvi. O Tribunal a quo não podia ter decidido como decidiu quanto aos factos não provados, impondo-se a alteração da decisão quanto à matéria de facto, passando a ser dado como provado o seguinte:

“22. Que a aplicação informática pode, por si, praticar saltos de numeração
23. Que os saltos na numeração ocorrem quando se verifica uma transferência completa de mesa em conjugação com a opção “Não registar processos vazios” activa.
24. Que os saltos na numeração ocorrem quando se verifica um pagamento avançado com divisão múltipla de conta.
25. Que os saltos na numeração ocorrem quando está activa a opção “aloca dinamicamente”.
26. Que a falta de linhas pode dever-se ao facto do registo ter sido anulado ou o pedido ter sido transferido para outra mesa.”
[o que se impõe pelo analise crítica dos elementos probatórios contantes dos autos, nomeadamente do depoimento prestado pelas testemunhas, António... (gravado na cassete 1, lado A, das 10 rotações 1865 rotações, da inquirição de 15-05-2012), A... (gravado na cassete 1, lado A, das 1866 rotações às 1428 rotações do lado B, da inquirição de 15-05-2012) e J... (gravado na cassete n.º 1, lado A, das 1924 rotações até às 2376 rotações do lado B, da inquirição ocorrida em 20-03-2013), no confronto entre si e no confronto do o RIT].
Sempre SEM PRESCINDIR

iii. Vício de insuficiência da decisão quanto aos factos dados como provados e não provados – erro de julgamento e nulidade por omissão de pronúncia
lxxvii. Da análise da decisão factual constante da sentença, e do confronto com a petição de impugnação e alegações apresentadas ao abrigo do disposto no art. 120.º do CPPT, resulta, desde logo, que o Tribunal a quo não aprecia parte significativa dos factos invocados pela Recorrente, seja dando-os como provados, seja dando-os como não provados, nem nunca se refere à eventual irrelevância daqueles – que não são, como é bom de ver, e resultará apodíctico do que adiante se verá. É o caso do que foi alegado pela Recorrente nos pontos 36., 37., 40. e 44. a 50., 55. a 68., 71. a 79., 82, 83., 89., 167. a 172., 186. a 190., 193., 194. da sua petição e pontos 6., 7. a. a l., n. iii., e o. a qq., e 8. das alegações apresentadas ao abrigo do disposto no artt. 120.º do CPPT, e que não consta quer dos factos provados, quer dos não provados.

lxxviii. A matéria vinda de identificar pode dividir-se nos seguintes termos:
1- Factos que tendo sido considerados levariam necessariamente à conclusão de que não houve omissão de registo de custos na contabilidade da Recorrente – Pontos 36., 37., 40. e 44. a 50. da petição e 6. a. a i. das alegações apresentadas nos termos do disposto no art. 120.º do CPPT;
2- Factos referentes ao funcionamento do sistema informático que era também utilizado pela Recorrente e elementos considerados pelos SIT para as correcções determinadas, bem como o modo concreto como era utilizado aquele sistema informático pela Recorrente nomeadamente por intermédio dos seus funcionários - Pontos 55. a 68., 71. a 73., 74. a 79., 82., 83., 89., 167. a 172, e 186. a 190. da petição e 7. a. a c., f. a l., n. iii., o. a w., z. a dd., ff. a hh., kk., e qq. das alegações apresentadas ao abrigo do art. 120.º do CPPT;
3- Factos referentes aos dados recolhidos pela AT que levam necessariamente à conclusão de que é impossível que sejam rigorosos os registos referentes ao período de um mês e meio de facturação (01-04-2006 a 14-05-2006) que esta afirma serem os dados de efectiva facturação da Recorrente, bem como referentes à desconsideração pela AT de parte desse registos quando daí consta valor de facturação inferior à declarada pela Recorrente – Pontos 81., 105., 106. e 127. da petição e 7. d., e., x., y., ee., ii.e jj. das alegações apresentadas ao abrigo do art. 120.º do CPPT;
4- Factos, além dos supra referidos, que sendo considerados levariam necessariamente também à conclusão de que houve excesso de quantificação:

4.a. Da existência de outras mesas “virtuais” que eram utilizadas como o era a mesa 50, desconsiderada pelos SIT para a determinação da quantificação, e que deviam ter sido igualmente tratadas pela AT – Pontos 193. e 194. da petição e 7. ll.. a oo. das alegações apresentadas ao abrigo do art. 120.º do CPPT;
4.b. Perdas, quebras e autoconsumos que não foram consideradas na quantificação – Pontos 207. a 232., 235. e 244. da petição e 8. a. a m. das alegações apresentadas ao abrigo do disposto no art. 120.º do CPPT;
4.c. Da efectiva capacidade de trabalho da Recorrente tendo em consideração o sector de actividade em que se insere e a sua efectiva dimensão – Pontos 197. e 235. da petição e ponto 7. pp. das alegações previstas no art. 120.º do CPPT.
1- Factos que, tendo sido considerados, levariam necessariamente à conclusão de que não houve omissão de registo de custos na contabilidade da Recorrente – Pontos 36., 37., 40. e 44. a 50. da petição e pontos 6. a. a i. das alegações apresentadas ao abrigo do art. 120.º do CPPT
lxxix. Nos referidos pontos 36., 37., 40. e 44. a 50. da petição e pontos 6. a. a i. das alegações apresentadas ao abrigo do art. 120.º do CPPT a Recorrente alegou aquilo que se deixou transcrito no ponto 196. das presentes alegações, para onde se remete e que aqui se dá por integralmente transcrito.

lxxx. Relativamente àquela matéria factual alegada na petição, afirmou o Tribunal a quo na sentença proferida - não obstante não lhe fazer menção na decisão factual que a integra – o que se deixou transcrito no ponto 197. das presentes alegações, para onde se remete e que aqui se dá por integralmente transcrito.

lxxxi. Sem prejuízo do Tribunal a quo se pronunciar quanto a tal matéria nos termos vindos de citar, certo é que nada se encontra relevado na sentença no âmbito da decisão factual, pelo que se verifica, desde logo, vício de falta de fundamentação, e consequente nulidade, na medida em que tal omissão constitui omissão dos fundamentos de facto necessários à decisão (art. 125.º do CPPT e 615.º n.º 1 b) do CPC), ou, pelo menos, erro de julgamento da matéria de facto.

lxxxii. Por outro lado, tem necessariamente o Tribunal de se pronunciar quanto a tais factos julgando-os provados ou não provados, impõe-se essa decisão.

lxxxiii. Contrariamente ao que afirma o Tribunal a quo, não há qualquer contradição entre o conteúdo do depoimento prestado pela testemunha A... e o que foi alegado pela Recorrente.

lxxxiv. Salvo o devido respeito, contraditória é a afirmação do Tribunal a quo segundo a qual «Se por um lado as afirmações de A... lograram convencer o Tribunal de que efectivamente em algumas situações, quando aquele se deslocou ao fornecedor, a ficha já se encontrava aberta, por outro lado não considera o Tribunal que esse facto justifique por si a emissão das facturas em questão nos presentes autos, isto é, que tal ocorrência traduza a utilização indevida por um terceiro do nº de cliente da Impugnante.».

lxxxv. Resulta das regras da experiência comum que se a conta de cliente da própria Recorrente se encontrava aberta antes sequer de ali entrar um seu funcionário para fazer compras, só pode de tal factualidade decorrer que um terceiro se encontrava nesse mesmo momento, dentro daquele estabelecimento, a executar compras utilizando exactamente o número de cliente (ou seja, a conta) da Recorrente .

lxxxvi. Assim, verifica-se contradição entre os fundamentos e a decisão, com a consequente nulidade desta, nos termos previstos no art. 125.º do CPPT e 615.º n.º 1 c) do CPC, como se verifica omissão de pronúncia uma vez que na decisão factual nada consta quanto àquela matéria, com a consequente nulidade da decisão, nos termos do disposto no art. 125.º do CPPT e 615.º n.º 1 d) do CPC, e igualmente vício de falta de fundamentação, e consequente nulidade, na medida em que tal omissão constitui omissão dos fundamentos de facto necessários à decisão (art. 125.º do CPPT e 615.º n.º 1 b) do CPC), ou, pelo menos, erro de julgamento da matéria de facto – a impor a anulação da sentença.

lxxxvii. Tendo necessariamente o Tribunal de se pronunciar quanto a tais factos - julgando-os provados ou não provados - impõe-se o exercício dos poderes de cassação por parte do Tribunal ad quem, julgando-os como provados, não só pelo que já se deixou abundantemente exposto, mas ainda por ser isso que resulta da prova constante dos autos, e salvo o devido respeito, não se vê como pôde o Tribunal a quo convencer-se da referida premissa sem que daí retire a conclusão - qual seja a de que quem acedeu àquele estabelecimento usando para o efeito a conta da cliente da Recorrente efectuou as compras em causa usando aquele número.

lxxxviii. Nem teria explicação plausível coisa diversa: Está em causa um estabelecimento grossista, que não vende a consumidores finais, e se não fosse necessário ao terceiro usar o número de cliente da Recorrente para fazer as aquisições, não lhe seria igualmente necessário a utilização daquele número de cliente para aceder ao estabelecimento em causa.

Sempre SEM PRESCINDIR
lxxxix. Considerando o depoimento da testemunha que declarou aquela testemunha A... a propósito daquela matéria, nomeadamente o que se deixou transcrito no ponto 215. das presentes alegações para onde se remete e que aqui se dá por integralmente transcrito, bem como o depoimento da testemunha António, que também respondeu a questões relacionadas com aquela matéria, nomeadamente o que se deixou transcrito no ponto 216. das presentes alegações, para onde se remete e que aqui se dá por integralmente transcrito, e, mais ainda o conteúdo do depoimento da testemunha J... no que a esta matéria respeita, nomeadamente o que se transcreveu no ponto 217. das presentes alegações, que aqui se dá por integralmente transcrito, o Tribunal a quo tinha necessariamente de pronunciar-se quanto à matéria de facto alegada nos pontos 36., 37., 40. e 44. a 50. da petição e pontos 6. a. a i. das alegações previstas no art. 120.º do CPPT, impondo-se proceder ao seu aditamento à decisão factual, e impondo-se igualmente que esta seja julgada como provada, nos seguintes termos:

“27. Os documentos mencionados no RIT, alegadamente correspondentes aos documentos de aquisição emitidos em nome da Recorrente, não foram juntos ao mesmo, tendo a Recorrente ficado impedida de os analisar e/ou procurar saber quem tinham sido os seus verdadeiros adquirentes;
28. As matérias-primas em causa não foram adquiridas pela Recorrente;
29. Posteriormente à notificação do RIT, o Técnico Oficial de Contas que assina a contabilidade da Recorrente entrou em contacto com os responsáveis pelo “Cash & Carry”, expondo-lhes a situação relatada no RIT quanto à emissão de documentos de venda de produtos emitidos à Recorrente de que esta desconhecia a existência;
30. Foi-lhe então dito, pela responsável de loja, que não era a primeira vez que tal acontecia, e que se devia ao facto de os funcionários registarem vendas sem se certificarem da identificação do comprador, e até de aquisições dos próprios funcionários do “Cash & Carry” registadas em nome de clientes daquele estabelecimento;
31. Mais foi esclarecido que esse procedimento era adoptado uma vez que, conhecido o código de determinado comprador, quaisquer outras pessoas (geralmente consumidores finais e não sujeitos passivos) podiam efectuar compras em seu nome, bastando para o efeito, aquando da entrada naquele estabelecimento comercial, mencionar um código de cliente de que tivessem conhecimento, considerando que os funcionários do “Cash & Carry” normalmente não se certificavam da identidade dos clientes exigindo a exibição do cartão de identificação;
32. Chegou a acontecer a funcionários da Recorrente (nomeadamente à testemunha ouvida A...) em deslocações que fizeram ao “Cash & Carry”, que aquando da entrada naquele estabelecimento, se depararam com a situação de já se encontrar aberta a ficha de cliente da Recorrente, o que resultava do facto de outras pessoas que se encontravam naquele momento dentro do mesmo estabelecimento terem indicado à entrada o número de cliente da Recorrente para, dessa forma, poderem efectuar compras no estabelecimento;
33. O tipo de artigos a que se referem as matérias-primas alegadamente adquiridas pela Recorrente, e não registadas na contabilidade desta, correspondem a matérias-primas para a elaboração de produtos que não são comercializados pela Recorrente, como é exemplo a comercialização de “caipirinha”;
34. O fornecedor da Recorrente “Cash & Carry” era um fornecedor utilizado pela Recorrente, apenas esporadicamente, para pequenas compras, sendo aí adquiridas apenas os produtos em quebra relativamente aos fornecedores regulares da Recorrente de cada tipo de produtos, e sendo apenas adquiridos ali apenas quantidades maginais de matérias-primas que estivessem em falta até aos fornecimentos regulares;
35. O procedimento habitual da Recorrente era o de um seu funcionário, aquando da falta de algum produto durante a semana, se deslocar ao “Cash and Carry”, normalmente aos sábados de manhã, e uma vez por dia.”
[o que se impõe pelo análise crítica dos elementos probatórios contantes dos autos, nomeadamente do PA, no que respeita à notificação do RIT efectuada à Recorrente, e depoimento prestado pelas testemunhas A... (gravado na cassete 1, lado A, das 1866 rotações às 1428 rotações do lado B, da inquirição de 15-05-2012), António (gravado na cassete 1, lado A, das 10 rotações até às 1923 rotações, da inquirição de 20-03-2013) e J... (gravado na cassete n.º 1, lado A, das 1924 rotações até às 2376 rotações do lado B, da inquirição ocorrida em 20-03-2013), no confronto entre si e no confronto do o RIT].
Sempre SEM PRESCINDIR
2- Factos referentes ao funcionamento do sistema informático utilizado pela Recorrente e elementos considerados pelos SIT para as correcções, bem como o modo concreto como aquele sistema informático era utilizado pela Recorrente, nomeadamente por intermédio dos seus funcionários – Pontos 55. a 68., 71. a 73., 74. a 79., 82., 83., 89., 167. a 172, e 186. a 190. da petição e 7. a. a c., f. a l., n. iii., o. a w., z. a dd., ff. a hh., kk. e qq. das alegações apresentadas ao abrigo do art. 120.º do CPPT

xc. Nos pontos 55. a 68., 71. a 73., 74. a 79., 82., 83., 89., 167. a 172, e 186. a 190. da petição e 7. a. a c., f. a l., n. iii., o. a w., z. a dd., ff. a hh., kk. e qq. das alegações apresentadas ao abrigo do art. 120.º do CPPT alegou a Recorrente aquilo que se transcreveu no ponto 219. supra das presentes alegações para onde se remete e que aqui se dá por transcrito.

xci. Quanto à sobredita matéria factual, refere apenas o Tribunal a quo, na decisão recorrida aquilo que se transcreveu para o ponto 220., 222., 225. e 228. supra das presentes alegações para onde se remete e que aqui se dá por integralmente transcrito.

xcii. Ou seja, o Tribunal a quo reproduz as conclusões da AT, sem remeter para qualquer elemento probatório constante dos autos, nem avançar com qualquer fundamentação de facto.

xciii. Antes de mais, como resulta do exposto no capítulo antecedente, conclusões lxxviii. a cii. supra, a Recorrente não invocou que a justificação da existência de saltos de numeração residia apenas na mudança de mesa. Outrossim, como consta dos autos, e como referido pelas testemunhas arroladas, a Recorrente invocou:

- Que a aplicação informática pode, por si, praticar saltos de numeração.
- Que os saltos na numeração ocorrem quando se verifica uma transferência completa de mesa em conjugação com a opção “Não registar processos vazios” activa.
- Que os saltos na numeração ocorrem quando se verifica um pagamento avançado com divisão múltipla de conta.
- Que os saltos na numeração ocorrem quando está activa a opção “aloca dinamicamente”.
- Que a falta de linhas pode dever-se ao facto do registo ter sido anulado ou o pedido ter sido transferido para outra mesa –
xciv. Foi precisamente pelo facto de os SIT não terem considerado, como deveriam, todas as situações que conduzem à existência de saltos de numeração que a Recorrente se viu na contingência de invocar tal factualidade, e é isso que resulta expressamente invocado na petição inicial:

«168. (….) como abundantemente exposto no capítulo antecedente – para onde se remete - existem vários motivos técnicos para justificar as falhas de numeração de registos,
169. motivos técnicos esses que nem foram analisados pela AF (excepção feita apenas à transferência de mesa), nem foram por esta infirmados.» (sic).
xcv. Salvo o devido respeito, basta uma leitura atenta da petição inicial para concluir em sentido diametralmente oposto ao que é afirmado pelo Tribunal a quo quando na passagem transcrita no ponto 228. das presentes alegações que a Recorrente não teria impugnado, contrariando, o que refere:
«61. Desde logo, desconhece a Impugnante de que modo ou através de que processo informático foi construída, pela AF, a tabela que junta como Anexo 1,
62. sendo que os elementos que serviram para a sua elaboração nem sequer se encontravam na posse da Impugnante, nem foram retirados da sua contabilidade ou, sequer, da entidade encarregue de executar a mesma,
63. desconhecendo os motivos que terão gerado a desconformidade de registos apontada no RIT – os quais, decerto, não lhe podem ser imputados.» (sic).
xcvi. Estão em causa factos invocados pelos SIT, no âmbito do procedimento inspectivo, para fundamentar a aplicação de métodos indirectos de determinação da matéria tributável da Recorrente, pelo que, como é bom de ver, é à AT que cabe a prova de tais factos – que constituem pressupostos legais da sua actuação, não carecendo de impugnação especificada da Recorrente – e, com o devido respeito, o que não tem explicação, face a tudo quanto resultou provado nos autos e, sobretudo, face à falta de fundamentação da decisão em causa, é que o Tribunal a quo mantenha a convicção da AT de que o “ficheiro intacto” corresponde ao apuro real da Recorrente, tanto mais que, como se viu, e os próprios SIT reconhecem no relatório, o sistema informático gera falhas de numeração (ou processos vazios, nulos, saltos de numeração, como se lhes quiser chamar).

xcvii. Ainda que se entendesse que todos os registos do sistema informático dessem lugar a um registo interno que permitisse confirmar a sua origem, como acontece com a anulação - em que é criado um ficheiro interno com a referência a essa anulação, e que os SIT tratam igualmente como salto de numeração (ou ficheiro nulo, vazio ou a zeros), entender que aquele ficheiro que a AT refere estar intacto e corresponder à real facturação da Recorrente, corresponde a entender que durante um mês e meio seguido de actividade da Recorrente não tinha havido um único erro de registo por parte dos seus funcionários; não ter havido uma única anulação; não ter havido uma única transferência de mesa ou uma única divisão de contas.

xcviii. Ora, por exemplo, como resulta provado nos autos e resulta das regras da experiência comum, é muito usual a divisão de contas em almoços e jantares conjuntos, pelo que não é plausível, e não pode validamente ser deduzido pelo Tribunal face aos elementos provatórios constantes nos autos, que durante aquele hiato temporal não se tenha verificado qualquer uma daquelas circunstâncias uma só.

xcix. De resto, como consta dos autos, a própria AT reconhece que são «frequentes neste ramo a existência erros na imputação dos serviços às mesas, ou a imputação de artigos não pedidos» (sic, p. 8 do Anexo 3), e, de igual modo, a AT refere que:

«Foram detectados 3476 registos de cabeçalhos com os correspondentes registos de detalhe todos anulados.
Outros 3087 registos de cabeçalho, não tinham qualquer correspondência no ficheiro de detalhe.
Qualquer destas situações podem corresponder a mudança de mesa, mas como 6307 destes registos foram processados entre 15/05/2006 e 03/09/2006, período em que o sujeito passivo emitiu 3878 facturas válidas, não é crível que se devam todas a esse motivo.”» (sic pág. 18 do RIT) (sublinhado e destaque nossos).
c. São os próprios SIT a reconhecer que as mudanças de mesa dão lugar a registos de sistema que são confundíveis com o que os mesmos SIT dizem ser “falhas” de registo – embora não considerem propositadamente qualquer um dos demais casos em que o sistema informático gera esses registos vazios – e, na sequência da explicação adiantada pela Recorrente, ainda em sede inspectiva, de que outros procedimentos levavam igualmente ao que a AT referia como sendo “falhas” nos registos informático, nomeadamente os já supra expostos (transferências de mesas, pagamentos avançados de conta, erro nos registos de produtos em determinada mesa pelos funcionários, acessos à conta da mesas sem ordem de emissão de documento de pagamento, no sentido de confirmar os registos feitos, etc.), afirma-se no RIT:

«Efectivamente é do nosso conhecimento a existência neste tipo de negócio de situações idênticas às descritas pelo sujeito passivo.» (sic pág. 19 e 20 do RIT),
e, mais adiante no RIT, afirmam também os próprios SIT:
«Uma vez que algumas daquelas falhas resultaram de mudança efectiva de mesa, calculou-se a percentagem habitual de transferência a partir do nº de documentos de venda emitidos identificados pelo Núcleo de Apoio Informático como tendo resultado de outras mesas (…)»,
pelo que a própria AT reconhece que há outras causas para as “falhas” de registo que dizem ter detectado, mas apenas tiveram em consideração as mudanças de mesas e, ainda assim, em termos impróprios - como demonstrado nos autos e adiante melhor se verá.
Sempre SEM PRESCINDIR
ci. Sem prejuízo de o Tribunal a quo se referir pontualmente, na parte dispositiva da sentença, a um ou outro facto alegados pela Recorrente e acima transcritos, certo é que nada se encontra relevado, no que lhe diz respeito, no âmbito da decisão factual, além de que mesmo as referências pontualmente feitas pelo Tribunal a quo não tratam toda a matéria em causa, nem a tratam de modo consonante com os elementos constantes dos autos ou em confronto com os demais meios de prova.

cii. Verifica-se, pois, omissão de pronúncia quanto à decisão referente à matéria de facto julgada provada ou não provada, com a consequente nulidade da decisão, nos termos do disposto no art. 125.º do CPPT e 615.º n.º 1 d) do CPC, e igualmente vício de falta de fundamentação, e consequente nulidade, na medida em que tal omissão constitui omissão dos fundamentos de facto necessários à decisão (art. 125.º do CPPT e 615.º n.º 1 b) do CPC), ou, pelo menos, erro de julgamento da matéria de facto – a impor a anulação da sentença.

ciii. Tendo necessariamente o Tribunal de se pronunciar quanto a tais factos - julgando-os provados ou não provados - impõe-se o exercício dos poderes de cassação por parte do Tribunal ad quem, julgando-os como provados, não só pelo que já se deixou abundantemente exposto no presente capítulo, conclusões cxvi. a cxxvi., mas ainda por ser isso que resulta da prova constante dos autos, designadamente o RIT e o depoimento das testemunhas António..., A... e J... ouvidas à matéria alegada dos pontos nos pontos 55. a 68., 71. a 73., 74. a 79., 82., 83., 89., 167. a 172, e 186. a 190. da petição e 7. a. a c., f. a l., n. iii., o. a w., z. a dd., ff. a hh., kk., e qq. das alegações apresentadas ao abrigo do art. 120.º do CPPT.

civ. Considerando aqueles depoimentos, nomeadamente (i) o que se deixou transcrito nos pontos 165. e 253. supra das presentes alegações, para onde se remete e que aqui se dá por integralmente transcrito, quanto ao depoimento prestado pela testemunha António Joaquim Ramos Oliveira, (ii) o que se deixou transcrito nos pontos 166. a 169. e 254. supra das presentes alegações, para onde se remete e que aqui se dá por integralmente transcrito, quanto ao depoimento prestado pela testemunha A..., e (iii) o que se deixou transcrito nos pontos 170. e 257. supra das presentes alegações, para onde se remete e que aqui se dá por integralmente transcrito, quanto ao depoimento prestado pela testemunha J..., conjugados com o próprio RIT, conclui-se que o Tribunal a quo tinha necessariamente de pronunciar-se quanto à matéria de facto alegada nos pontos 55. a 68., 71. a 73., 74. a 79., 82., 83., 89., 167. a 172, e 186. a 190. da petição e 7. a. a c., f. a l., n. iii., o. a w., z. a dd., ff. a hh., kk., e

qq. das alegações apresentadas ao abrigo do art. 120.º do CPPT, devendo proceder-se ao aditamento da mesma à decisão factual, e que esta seja julgada como provada, nos seguintes termos:

“36. Os elementos correspondentes aos ficheiros informáticos referidos pela AT no RIT, apreendidos pela Polícia Judiciária no âmbito da operação “Self-Service”, integravam ficheiros informáticos alegadamente referentes a variados contribuintes;
37. Nem a Recorrente nem qualquer um dos seus gerentes, colaboradores ou fornecedores (incluindo a N...) foi indiciado por qualquer prática criminal no âmbito da referida operação;
38. Tal como resulta do ponto 2.1. do Anexo 3, os elementos que foram encontrados pela Polícia Judiciária, supostamente referentes à Recorrentes, são registos referente a período que vai de 01-01-2006 a 31-12-2008 – ou seja, três anos.
39. A tabela I junto ao RIT, foi elaborada pela AT e os elementos que serviram de base à sua elaboração não se encontravam na posse da Recorrente, nem foram retirados da sua contabilidade ou, sequer, da entidade encarregue de executar a mesma;
40. Os ficheiros informáticos em causa foram criados por sistema informático de facturação, designado “WinRest”, que utiliza internamente a numeração de processos para identificar um dado registo de operação ocorrida, seja abertura de mesa, registo de pedido, anulação de pedido, transferência de mesa, venda, etc.;
41. Esses processos informáticos são internos ou externos;
42. Os processos externos deveriam ser ficheiros numerados sequencialmente;
43. Os ficheiros processos não têm de ser sequenciais;
44. O facto de não existir sequência nos registos não implica necessariamente quaisquer omissões de vendas;
45. A AT, no RIT e decisão do procedimento de revisão, apenas leva em linha de conta que cada registo poderá, posteriormente, converter-se numa venda a dinheiro, factura, facturação externa (registado na aplicação e facturado por aplicações externas ao ”WinRest”, quando, além disso, cada registo pode, ainda, converter-se num documento vazio ou nulo;
46. Os saltos na numeração podem ter lugar por qualquer um dos factos supra referidos e, bem assim, quando é feito o pagamento de uma conta selecionando a opção “pagamento parcial”, e isto mesmo que o pagamento acabe por ser feito pelo valor total e não apenas nos casos em haja, concretamente, mais de um pagamento;
47. Tecnicamente, não é possível distinguir qual o tipo de operação ou operações geradoras de “saltos” nos processos, quer nas situações apontadas na alínea anterior, quer noutras situações susceptíveis de gerar erros de numeração, como sejam erros provocados pela actualização periódica de software, ou abertura errada de mesa, por exemplo;
48. A própria AT acaba por referir essas falhas na página 8 (ponto 2.1.3.1) da informação que constitui o anexo 3 ao RIT, ainda que não o tenha considerado nas correcções efectuadas;
49. Uma vez que a falta de linhas ou “salto de linhas” nos processos pode dever-se a variados factos [nomeadamente (i) a um determinado registo ter sido anulado, (ii) ou de ter sido transferido para outra mesa, (iii) ter havido um “pagamento parcial”, (iv) ter havido a utilização da opção “aloca mesas dinamicamente”, etc.], a anulação do registo passa a constar das “anulações” registadas no sistema informático, e, a “transferência de mesa” passa a constar nos registos de “transferências de mesa” quando não esteja seleccionada a opção a “não registar processos vazios”, elaborados também pelo sistema informático;
50. Já as restantes razões referidas supra, que dão lugar ao erro no número de processos ou, como refere a AT no RIT, a “saltos nos processos”, não dão lugar a qualquer outro registo na aplicação informática pelo que não é possível determinar qual a sua origem;
51. Mesmo o “salto de linhas” nos processos, resultante da transferência de uma mesa, quando esteja seleccionada a opção “não registar processos vazios”, não fica registado no sistema informático aquela operação na lista de “transferências de mesa”, não sendo assim possível perceber, da análise da informação constante do sistema informático em causa, qual a razão subjacente àquele “salto de linha” nos processos;
52. Quer durante o procedimento de inspecção, quer no âmbito do procedimento de revisão, a Recorrente e o seu representante explicaram tecnicamente aos serviços de inspecção, e ao representante da AT na comissão de revisão, quais as razões que levam ao surgimento de erros na numeração de processos;
53. A AT, no RIT e decisão do procedimento de revisão, apenas considerou o numero global das linhas em falta, sem que tivesse tido em consideração o registo constante do próprio sistema informático referente ao número de linhas em falta com justificação registada, designadamente, como dizendo respeito a “anulações” e/ou a “transferências de mesa” (do que é exemplo, no anexo 2 do RIT, no dia 01.04.2010 o primeiro registo tem o número 202337 e o último tem o número 202424, e a AT limita-se a concluir que há registos em falta pela diferença, sem aferir, minimamente, qual o número de registos existentes de permeio);
54. Como se refere supra, podem existir DOIS processos: um vazio (ou salto de processo) e outro registado – aos quais corresponde apenas UMA venda;
Ainda hoje, o sistema informático de facturação “WinRest”, mesmo estando certificado pela AT, continua a ter o mesmo funcionamento - que leva ao surgimento de saltos nos números dos processos nas circunstâncias descritas na alínea n. supra;
55. Era diária a verificação das circunstâncias descritas na alínea n. supra que determinam a verificação de salto de numeração de processos no sistema informático de facturação em causa;
56. O mais normal no desenvolvimento da actividade da Recorrente era que os clientes, em especial nos almoços, solicitassem a divisão das contas;
57. À data a que se reportam os factos em causa na presente impugnação, o sistema de facturação utilizado pela Recorrente não permitia a divisão do pagamento de cada produto, não sendo possível a divisão do valor de uma garrafa de vinho, de uma garrafa de água, de uma dose de comida etc., etc., etc.;
58. O procedimento normal dos funcionários da Recorrente para registar no sistema informático desta o pagamento de contas era a selecção da opção “pagamento avançado”, “divisão de conta” e que dá lugar, como consta supra, leva à verificação de um salto na numeração de processos - sem que surja qualquer registo que permita saber posteriormente qual a razão da sua verificação;
59. A própria AT reconhece que são «frequentes neste ramo a existência erros na imputação dos serviços às mesas, ou a imputação de artigos não pedidos» (sic, p. 8 do Anexo 3);
60. Os registos de “transferência de mesa”, foram analisadas pela AT na determinação da matéria colectável por métodos indirectos, mas não foram considerados ou sequer mencionados pela AT nas correcções aritméticas como justificando as falhas de numeração em causa;
61. Mesmo nas correcções efectuadas pela AT por aplicação de métodos indirectos não foram tidas em conta nenhuma das razões que levam ao salto do número de processos referidas nas alienas n. e o. supra à excepção da “transferência de mesas”;
62. A AT, nas correcções que efectuou à matéria colectável da Recorrente por aplicação de métodos indirectos não aferiu quantos saltos na numeração de processos existem, limitando-se a estabelecer a diferença entre o primeiro e o último número;
63. Uma vez que, como resultou provado, à data a que se reportam os factos em causa, o sistema de facturação utilizado pela Recorrente não permitia a divisão do pagamento de cada produto, a solução utilizada pelos funcionários da Recorrente passava por transferir os registos para uma mesa virtual (como acontecia com a mesa 50), sendo que (i) não eram feitos registos directamente nessas mesas virtuais e (ii) a mesa dos clientes nunca era anulada – pelo que as mesas virtuais apenas tinham registos referentes a outras mesas;
[o que se impõe pelo análise crítica dos elementos probatórios contantes dos autos, nomeadamente do PA, no que respeita ao RIT, e depoimento prestado pelas testemunhas António... (gravado na cassete n.º 1, lado A, das 10 rotações às rotações 1865, da inquirição de 15-05-2012), A... (gravado na cassete 1, lado A, das 1866 rotações às 1428 rotações do lado B, da inquirição de 15-05-2012) e J... (gravado na cassete n.º 1, lado A, das 1924 rotações até às 2376 rotações do lado B, da inquirição ocorrida em 20-03-2013), no confronto entre si e no confronto do o RIT].
Sempre SEM PRESCINDIR

3- Factos referentes aos dados recolhidos pela AT que levam necessariamente à conclusão de que é impossível que sejam rigorosos os registos referentes ao período de um mês e meio de facturação (01-04-2006 a 14-05-2006) que esta afirma serem os dados de efectiva facturação da Recorrente, bem como referentes à desconsideração pela AT de parte desses registos quando daí constam também valor de facturação inferiores à declarada pela Recorrente – Pontos 81., 105., 106. e 127. da petição e 7. d., e., x., y., ee., ii.e jj. das alegações apresentadas ao abrigo do art. 120.º do CPPT
cv. Nos pontos 81., 105., 106. e 127. da petição e 7. d., e., x., y., ee., ii.e jj. das alegações apresentadas ao abrigo do art. 120.º do CPPT, a Recorrente alegou aquilo que se deixou transcrito no ponto 259. das presentes alegações para onde se remete e aqui dá por transcrito.

cvi. Os referidos factos, além de terem sido suficientemente alegados pela Recorrente, resultam directamente do RIT e seus anexos, como se vê da análise do seu anexo 3, nomeadamente página 19 deste: «Foram também encontrados registos com valor declarado superior ao valor real (…)» (sic anexo 3 referido no RIT).

cvii. Ao contrário do que se afirma na sentença recorrida, não tem explicação, face a tudo quanto resultou provado nos autos, que o Tribunal a quo mantenha a convicção dos SIT de que o “ficheiro intacto” referente a mês e meio, integrado nos ficheiros referentes a três anos, seja tido como real, e, mais ainda, que daqueles ficheiros os SIT utilizem apenas a informação de onde resulta uma diferença positiva e já não aqueles em que a diferença é negativa.

cviii. A AT reconhece no RIT, que o próprio sistema informático provoca falhas de numeração (ou processos vazios, nulos, saltos de numeração, como se lhe quiser chamar), logo, reitera-se, ainda que se entendesse que todos os registos do sistema informático dão lugar a um registo interno que permite confirmar a sua origem, como acontece com a anulação, em que é criado um ficheiro interno com a referência a essa anulação, e que os SIT tratam igualmente como salto de numeração (ou ficheiro nulo, vazio ou a zeros), entender que aquele ficheiro, que a AT diz estar intacto, corresponde à real facturação da Recorrente, implica entender que durante um mês e meio seguido de actividade da Recorrente, não tinha havido um único erro de registo por parte dos seus funcionários, por não ter havido uma única anulação, ou não ter havido, durante aquele espaço de tempo, uma única transferência de mesa, um único pagamento com divisão múltipla de conta ou com pagamento parcial, etc., etc..

cix. Não é plausível, e não pode validamente ser deduzido pelo Tribunal a quo face aos elementos probatórios constantes nos autos, pelo que o que vem de se expor nas conclusões supra, conjugado com o que já se deixou supra transcrito dos depoimentos das testemunhas António…, Amândio… e J… nos pontos 165. a 170., 253., 254. e 257. supra – que aqui se dá por integralmente transcrito –, resulta claro que não podia o Tribunal a quo ter deixado de considerar a matéria de facto sob análise, pontos 81., 105., 106. e 127. da petição e 7. d., e., x., y., ee., ii.e jj. das alegações apresentadas ao abrigo do art. 120.º do CPPT, na decisão proferida, devendo proceder-se ao aditamento da mesma à decisão factual, e esta ser julgada como provada, nos seguintes termos:

“64. Nesses três anos, a AT afirma que descortinou registos de facturação de um mês e meio que, na sua opinião, correspondem aos reais apuros diários da Recorrente (!);
65. Tais registos não correspondem aos registos diários reais da Recorrente;
66. Nos registos, referentes ao período de um mês e meio (01-04-2006 a 14-05-2006), dentro dos ficheiros referidos pela Polícia Judiciária, que integram registos de 3 anos, que a AT considerou serem verdadeiros, não há falhas na sequência de registos;
67. O facto referido na alínea anterior só é possível no caso de, durante esse mês e meio a Recorrente não ter feito uma única transferência de mesa, o sistema não ter ligada a função “alocou dinamicamente” de única mesa uma única vez, e não ter sido praticada uma única divisão múltipla de conta durante esse período;
68. Tais ficheiros informáticos, encontrados pela Polícia Judiciária contendo registos referentes também ao período de um mês e meio considerado pela AT, em nenhuma circunstância poderiam corresponder aos reais registos da Recorrente;
69. Dos ficheiros informáticos utilizados pela AT para fundamentar as correcções efectuadas à matéria tributável da Recorrente, resulta a existência de registos em que se verificava, quer diferenças positivas, quer diferenças negativas, isto é, verificava-se a existência também de “registos com um valor declarado superior ao valor real” (cfr. p. 19 do Anexo 3 ao RIT);
70. A AT apenas teve em consideração para as correcções efectuadas os dados de que resultavam diferenças negativas, desconsiderando os registos de que resultavam diferenças positivas;
[o que se impõe pelo análise crítica dos elementos probatórios contantes dos autos, nomeadamente do PA, no que respeita ao RIT e seus anexos, notificação da decisão final do procedimento de revisão, e depoimento das testemunhas António... (gravado na cassete n.º 1, lado A, das 10 rotações às rotações 1865, da inquirição de 15-05-2012), A... (gravado na cassete 1, lado A, das 1866 rotações às 1428 rotações do lado B, da inquirição de 15-05-2012) e J... (gravado na cassete n.º 1, lado A, das 1924 rotações até às 2376 rotações do lado B, da inquirição ocorrida em 20-03-2013)].
SEM PRESCINDIR
cx. Uma vez que na sentença recorrida nada se diz a propósito daqueles factos alegados pela Recorrente - nomeadamente, nada se encontra relevado, no que lhe diz respeito, no âmbito da decisão factual - verifica-se omissão de pronúncia quanto à decisão referente à matéria de facto julgada provada ou não provada, com a consequente nulidade da decisão, nos termos do disposto no art. 615.º n.º 1 d) do CPC, e igualmente vício de falta de fundamentação, e consequente nulidade, na medida em que tal omissão constitui omissão dos fundamentos de facto necessários à decisão (art. 125.º do CPPT e 615.º n.º 1 b) do CPC), ou, pelo menos, erro de julgamento da matéria de facto - a impor a sua anulação.

cxi. Tendo necessariamente o Tribunal a quo de se pronunciar quanto a tais factos - julgando-os provados ou não provados, impõe-se o exercício dos poderes de cassação do Tribunal ad quem para prolacção de decisão onde estes sejam julgados como provados.

Sempre SEM PRESCINDIR
4- Outros factos, além dos supra referidos, que, sendo considerados pelo Tribunal a quo, levariam necessariamente à conclusão de que houve excesso de quantificação
4.a. Da existência de outras mesas “virtuais” que eram utilizadas, como a mesa 50, desconsiderada pelos SIT para a determinação da quantificação, e que deviam ter sido igualmente tratadas pelos SIT – Pontos 193. e 194. da petição e 7. ll. a oo. das alegações apresentadas ao abrigo do art. 120.º do CPPT

cxii. Nos pontos 193. e 194. da petição e 7. ll. a oo. das alegações apresentadas ao abrigo do art. 120.º do CPPT a Recorrente alegou aquilo que se deixou transcrito no ponto 273. Das presentes alegações.

cxiii. A propósito daquela matéria as únicas referências que se encontram na sentença recorrida são aquelas que se deixaram transcritas no ponto 274. supra das presentes alegações e nada mais consta a este propósito na sentença – quando, como resulta dos autos, tal matéria é da maior importância, e nada consta no que lhe respeita na decisão factual.

cxiv. Verifica-se, pois, omissão de pronúncia quanto à decisão referente à matéria de facto julgada provada ou não provada, com a consequente nulidade da decisão, nos termos do disposto no art. 125.º do CPPT e 615.º n.º 1 d) do CPC, e igualmente vício de falta de fundamentação, e consequente nulidade, na medida em que tal omissão constitui omissão dos fundamentos de facto necessários à decisão (art. 125.º do CPPT e 615.º n.º 1 b) do CPC).

cxv. Tendo o Tribunal a quo de se pronunciar quanto a tais factos julgando-os provados ou não provados, impõe-se o exercício dos poderes de cassação do Tribunal ad quem para prolacção que julgue tais factos como provados, conjugando para o efeito os elementos probatórios constantes dos autos.

cxvi. Analisando, de forma concatenada, o depoimento prestado pelas testemunhas ouvidas àquela matéria, designadamente, disse a testemunha António..., em especial as passagens do seu depoimento que se deixaram transcritas no ponto 280. supra para onde se remete e que aqui se dá por integralmente transcrito, o depoimento prestado pela testemunha A... em especial as passagens daquele depoimento que se deixaram transcritas no ponto 281., supra, para onde se remete e que aqui se dá por integralmente transcrito, considerando-se desde logo que é o próprio Tribunal a quo a reconhecer que aqueles depoimentos foram prestados de forma séria e credível, e, bem assim, o depoimento prestado pela testemunha J..., em especial as passagens transcritas no ponto 283. supra, que aqui se dá por integralmente transcrito, resulta claro que não podia o Tribunal a quo ter deixado de considerar a matéria de facto sob análise, pontos 193. e 194. da petição e 7. ll.. a oo. das alegações apresentadas ao abrigo do art. 120.º do CPPT, na decisão proferida, devendo proceder-se ao aditamento da mesma à decisão factual, e que esta seja julgada como provada, nos seguintes termos:

“71. A própria AT tinha conhecimento de que as mesas virtuais apenas continham registos de outras mesas – os quais nunca são anulados e, portanto, estão registados no sistema – o que resulta do próprio segundo o qual: «De referir que, como a mesa 50 integra outras mesas, apresenta alguns registos de valor total elevado o que influencia um valor médio superior ao normal pelo que para o seu cálculo foram retirados os documentos de venda associados a esta mesa virtual.» (sic pág. 34 do RIT);
72. A mesa 50 não era a única mesa utilizada para efeito de divisão de contas de clientes;
73. Além da mesa 50, eram utilizadas com a mesma funcionalidade os números de mesas mais altas, normalmente surgidas nos cantos do ecrã do computador utilizado no estabelecimento da Recorrente, designadamente as mesas com os números 40, 41, 42;
74. Nas correcções efectuadas pela AT com recurso a métodos indirectos apenas foram expurgados os dados da mesa 50 e já não os dados respeitantes às restantes mesas virtuais que tinham a mesma funcionalidade da mesa 50;
[o que se impõe pelo análise crítica dos elementos probatórios contantes dos autos, nomeadamente do PA, no que respeita ao RIT, e depoimento prestado pelas testemunhas António... (gravado na cassete n.º 1, lado A, das 10 rotações às 1865 rotações, referente à diligência de inquirição de testemunhas ocorrida em 15-05-2012), A... (gravado na cassete 1, lado A, das 1866 rotações às 1428 rotações do lado B, da inquirição de 15-05-2012) e J... (gravado na cassete n.º 1, lado A, das 1924 rotações até às 2376 rotações do lado B, da inquirição ocorrida em 20-03-2013), no confronto entre si e no confronto com o RIT]..
Sempre SEM PRESCINDIR
4- b. Perdas, quebras e autoconsumos que não foram consideradas na quantificação – Pontos 207. a 232., e 244. da petição e 8. a. a m. das alegações apresentadas ao abrigo do disposto no art. 120.º do CPPT
cxvii. Nos pontos 207. a 232., e 244. da petição e 8. a. a m. das alegações apresentadas ao abrigo do disposto no art. 120.º do CPPT, a Recorrente alegou aquilo que se deixou transcrito no ponto 285. Supra das presentes alegações, que se dá por transcrito; Na sentença proferida, e no que se refere à matéria factual alegada e vinda de referir, apenas se pode ler na parte dispositiva da sentença recorrida aquilo que se transcreveu no ponto 286. e 287. das presentes alegações, que se dá por transcrito.

cxviii. Não obstante o Tribunal a quo se pronunciar quanto a parte daquela matéria na parte dispositiva da sentença, e nos termos em que o faz, certo é que nada consta da decisão factual, pelo que se verifica-se, desde logo, omissão de pronúncia quanto à decisão referente à matéria de facto julgada provada ou não provada, com a consequente nulidade da decisão, nos termos do disposto no art. 125.º do CPPT e 615.º n.º 1 d) do CPC, e igualmente vício de falta de fundamentação, e consequente nulidade, na medida em que tal omissão constitui omissão dos fundamentos de facto necessários à decisão (art. 125.º do CPPT e 615.º n.º 1 b) do CPC), ou, pelo menos, erro de julgamento da matéria de facto – a impor a anulação da decisão recorrida.

cxix. Acresce que, tendo necessariamente o Tribunal a quo de se pronunciar quanto a tais factos julgando-os provados ou não provados, impõe-se a decisão de estes serem julgados provados, considerando os elementos probatórios constantes dos autos, nomeadamente os depoimentos prestados pelas testemunha ouvidas Àquela matéria, a saber, A..., António e J....

cxx. Considerando o depoimento prestado por aquelas testemunhas, quanto à testemunha A... em especial o que se deixou transcrito nos pontos 294., 295. e 296. supra das presentes alegações, que aqui se dá por integralmente transcrito, quanto à testemunha António em especial o que se deixou transcrito no ponto 297. supra e que aqui se dá por integralmente transcrito, considerando até que é o próprio Tribunal a quo a reconhecer seriedade e isenção a tais depoimentos, e, bem assim, quanto ao depoimento da testemunha J... em especial o que se deixou transcrito no ponto 299. supra, que aqui se dá por integralmente transcrito, resulta claro que não podia o Tribunal a quo ter deixado de considerar a matéria de facto sob análise, pontos 207. a 232., e 244. da petição e 8. a. a m. das alegações apresentadas ao abrigo do disposto no art. 120.º do CPPT, na decisão proferida, devendo proceder-se ao aditamento da mesma à decisão factual, e que esta seja julgada como provada, nos seguintes termos:

“75. No sector da restauração em que se inseria a actividade da Recorrente, as quebras (os roubos, ofertas e auto-consumos não registados de existências, as perdas de existências, etc.) e os desperdícios (incorrecta ou deficiente manipulação dos produtos, gestão inadequada de compras versus vendas – ou seja, produtos perecíveis, aproveitamento de produtos mais caros para produzir artigos mais económicos - sobredosagens, etc.) têm uma relevância que não é despicienda para a determinação da rentabilidade da actividade concretamente desenvolvida;
76. Por exemplo, no “fino” é geralmente considerado o volume de 20cl, quando o copo utilizado no serviço implica o consumo de 27,5cl. O copo de “fino” tem a capacidade máxima de 32cl dado que o volume da espuma significa apenas 1/3 de líquido;
77. Com a substituição do barril de cerveja é necessário proceder ao seu “sangramento” para conferir pressão, ou muitas vezes o barril de cerveja, fruto do equipamento, não permite saída do grifo com qualidade – o que tudo significa perda de produto – o que ocorre com maior frequência no Verão tendo em conta as temperaturas mais elevadas;
78. No desenvolvimento do negócio da Recorrente não é possível evitar sobredosagens, auto-consumos não registados, vendas erradas, ofertas indevidas, quebras não declaradas, etc, etc.;
79. Não é possível calcular com rigor a dosagem do café de modo a determinar quantas doses se retira de determinada quantidade, uma vez que a mesma varia de marca para marca e do tipo de moagem;
80. A Recorrente tinha cerca de 12/13 pessoas a trabalhar no seu estabelecimento na data a que se reportam os factos, sendo que estes tomavam, em média, dois a três cafés por dia;
81. É frequente, na actividade da Recorrente, que se entornem cafés, a verificação de desperdícios por troca de cafés com descafeinados, cafés que saem com borra, cafés que chegam à mesa frios pelo tempo que estiveram no balcão à espera de serem serviços pelos funcionários de sala, bem como quebras, como sejam a oferta de cafés não registadas, etc.;
82. A Recorrente tomou conhecimento de que alguns dos seus funcionários decidiam oferecer bebidas espirituosas e outras a amigos e conhecidos, registando o consumo como “café”;
83. O licor Frangélico, referido a páginas 32 do RIT, na sua esmagadora maioria, não é vendido, mas adquirido para ser oferecido em pequenos copos aos clientes no fim da refeição;
84. A Recorrente, no seu estabelecimento, vendia em conjunto, pacote “dois em um” (“M+café”), gelados gelado “magnum moments” conjuntamente com cafetaria, o que só em 2008 engloba 533 cafés e gelados;
85. Nenhum dos factos elencados de a. a j. supra foram considerados pela AT nas correcções que efectuou à matéria colectável da Recorrente por aplicação de métodos indirectos;
87. A margem bruta da Recorrente rondava os 49%/50%;
[o que se impõe pelo análise crítica dos elementos probatórios contantes dos autos, nomeadamente do PA, no que respeita ao RIT, e depoimento prestado pelas testemunhas A... (gravado na cassete 1, lado A, das 1866 rotações às 1428 rotações do lado B, da inquirição de 15-05-2012), António (gravado na cassete 1, lado A, das 10 rotações até às 1923 rotações, da inquirição de 20-03-2013) e J... (gravado na cassete n.º 1, lado A, das 1924 rotações até às 2376 rotações do lado B, da inquirição ocorrida em 20-03-2013), no confronto entre si e no confronto do o RIT].
Sempre SEM PRESCINDIR
cxxi. Como resulta dos autos, a Recorrente invocou que, para a determinação da matéria colectável por métodos indirectos, os SIT não tiveram em consideração as quebras de existências, os desperdícios e auto - consumos, nem tampouco os rácios relevantes para o sector, e, a este respeito, como se viu, refere o Tribunal a quo:

«Quanto às perdas e desperdícios entende o tribunal que tais factores somente teriam que ter sido considerados se os SIT tivessem utilizado um qualquer outro critério que não o dos documento e linhas eliminados.» (sic pág. 39 da sentença recorrida).
cxxii. Com o devido respeito, o Tribunal a quo formula um juízo conclusivo, sem qualquer fundamentação factual ou jurídica bastante, uma vez que no sector da restauração em que se inseria a actividade da Recorrente, as quebras (os roubos, ofertas e auto-consumos não registados de existências, as perdas de existências, etc.) e os desperdícios (incorrecta ou deficiente manipulação dos produtos, gestão inadequada de compras versus vendas – ou seja, produtos perecíveis, aproveitamento de produtos mais caros para produzir artigos mais económicos - sobredosagens, etc.) têm uma relevância fulcral para a determinação da rentabilidade da actividade desenvolvida.

cxxiii. Porque está em causa a determinação da matéria tributável por métodos indirectos, a consideração daqueles factores, porque incluídos no elenco estabelecido no artigo 90.º da LGT, é de fundamental relevância.

Ainda SEM PRESCINDIR
cxxiv. A Recorrente invocou dados oficiais de entidades públicas e sectoriais:

- De acordo com a ARESP, existe um referencial de cerca 5% para as QUEBRAS no sector.
- O Instituto Nacional de Estatística (INE) informa: MARGEM BRUTA DO SECTOR para Micro Empresas (até 9 funcionários) é de apenas 45% - constituindo precisamente o cenário mais próximo da realidade da Recorrente, que tem 11 funcionários.
(artigos 212. e 244. da petição inicial)
cxxv. Ora, para além desses dados terem sido confirmados pela testemunha António, face ao princípio do inquisitório que se impõe ao juiz no processo tributário, nos termos do artigo 13.º do CPPT, facilmente poderiam ser constatados os dados estatísticos supra referidos, que são de domínio público – mormente por referência aos respectivos sites institucionais (acessíveis em www.aresp.pt e www.ine.pt).

cxxvi. A Recorrente invocou igualmente:

- no “fino” é geralmente considerado o volume de 20cl, quando o copo utilizado no serviço implica o consumo de 27,5cl.
- É que o copo de “fino” tem a capacidade máxima de 32cl dado que o volume da espuma significa apenas 1/3 de líquido.
- Em relação ao desvio padrão considerado para as Bebidas, baseando-nos nos standards da indústria Hoteleira chegamos a um desvio padrão na ordem dos 10%.
(artigos 216., 217. e 220. da petição inicial)
cxxvii. A este respeito, refere-se na decisão recorrida:

«julga o Tribunal que tais ocorrências não servem o propósito prosseguido, na medida em que não é verosímil que haja uma perda na ordem dos 58,4%».
cxxviii. Ora, antes de mais, não se vislumbra de que modo o Tribunal a quo chegou à percentagem de perda de 58,4%, face à sua patente falta de fundamentação e consequente nulidade – sendo que a Recorrente invocou aquelas perdas e desperdícios em sede do procedimento de determinação da matéria tributável e a própria AT não avançou qualquer argumento para a sua não consideração.

cxxix. Do mesmo modo, o Tribunal a quo recusa a aceitação daquelas perdas e desperdícios por remissão para uma percentagem cuja determinação não fundamenta e que não resulta de qualquer elemento constante nos autos.

cxxx. Como ressuma da prova testemunhal, a Recorrente demonstrou a existência de excesso de quantificação da matéria tributável e, salvo o devido respeito, o Tribunal a quo parece entender que apenas relevaria a demonstração de que TODA a matéria tributável estava erradamente determinada quando, nos termos da lei, pode ser demonstrado um excesso PARCIAL.

cxxxi. Como resulta da prova testemunhal, todas as quebras, desperdícios e factores supra referidos são inerentes à própria actividade da Recorrente e, portanto, deviam ter sido considerados pela AT para determinação da sua matéria colectável, e isto, independentemente do processo seguido administrativamente para se presumir essa matéria colectável – porquanto a lei não efectua, neste ponto, qualquer restrição.

cxxxii. Não tendo sido quantificada qualquer margem para os naturais desperdícios, perdas, quebras, tal implica a existência de uma falha grave na cadeia lógico-dedutiva da AT – que inquina a validade do resultado apurado, pois só com base em factos indiciários, comprovadamente apropriados ao caso concreto e por meio de uma cadeia sem falhas, é possível chegar a um resultado aceitável na presunção formulada - que sempre constitui a determinação do valor tributável por meio de métodos indiciários.

cxxxiii. Aliás, nem mesmo o facto de na contabilidade da Recorrente não constarem aqueles desperdícios, perdas e quebras, impediria a sua ponderação no apuramento da matéria tributável por métodos indiciários, bem pelo contrário, porque, não se baseando tal apuramento directamente na contabilidade, devia a AT atender às especificidades próprias da actividade da Recorrente, num esforço de aproximação à sua realidade, por forma a que, pelo menos tendencialmente, se alcançasse o seu rendimento real e efectivo.

cxxxiv. Mais: o Tribunal a quo não considera qualquer elemento relativo à demonstração do excesso de quantificação da matéria tributável, por referência à venda de cerveja, café, licor Frangélico, ou gelados, com o pretexto de que a Recorrente não demonstrou o excesso de quantificação relativamente aos demais artigos, o que constitui decisão que cai novamente no erro de pretender imputar à Recorrente a demonstração de um excesso de determinação da totalidade da matéria tributável, e, sobretudo, no erro de concluir que a demonstração do excesso parcial é irrelevante – o que não é legalmente admissível.

cxxxv. De resto, mesmo após a prova dos factos alegados a esse respeito, o Tribunal a quo omite a selecção da matéria de facto respectiva e o seu devido julgamento, o que constitui ilegalidade e, como se viu, omissão de pronúncia e vício de fundamentação, e consequente nulidade da decisão – ou, pelo menos, erro de julgamento, a implicar a sua anulabilidade.

Sempre SEM PRESCINDIR:
4- c. Da efectiva capacidade de trabalho da Recorrente tendo em consideração o sector de actividade em que se insere e a sua efectiva dimensão – Ponto 196, 197., 234 e 235. da petição e ponto 7. pp. das alegações previstas no art. 120.º do CPPT.
cxxxvi. Nos pontos 196, 197., 234 e 235. da petição e ponto 7. pp. das alegações previstas no art. 120.º do CPPT a Recorrente alegou o que se deixou transcrito no ponto 324. Das presentes alegações para onde se remete por razões de economia processual.

cxxxvii. Na sentença posta em crise, nada consta quanto àquela matéria factual, nomeadamente, nada se encontra, no que lhe diz respeito, no âmbito da decisão factual, sendo certo que o próprio Tribunal a quo estava vinculado ao princípio do inquisitório, procurando a descoberta doa verdade material, conhecendo dos factos alegados e, bem assim, a considerar todos os factos resultantes da instrução com interesse para a decisão da causa (art. 99.º da LGT e 13.º do CPPT), pelo que se verifica omissão de pronúncia quanto à decisão referente à matéria de facto julgada provada ou não provada, com a consequente nulidade da decisão, nos termos do disposto no art. 125.º do CPPT e 615.º n.º 1 d) do CPC e igualmente vício de falta de fundamentação, e consequente nulidade, na medida em que tal omissão constitui omissão dos fundamentos de facto necessários à decisão (art. 125.º do CPPT e 615.º n.º 1 b) do CPC), e, bem assim, violação do princípio do inquisitório que como ilegalidade que é determina a anulabilidade da sentença recorrida.

cxxxviii. Tendo necessariamente o Tribunal de se pronunciar quanto a tais factos julgando-os provados ou não provados, impõe-se a decisão de estes serem julgados provados, nomeadamente considerando o depoimento das testemunhas ouvidas quanto àquela matéria, A..., António e J....

cxxxix. Considerando os elementos probatórios constantes dos autos, nomeadamente o depoimento prestado pela testemunha A..., em especial o que se deixou transcrito no ponto 331. supra, que aqui se dá por integralmente transcrito, o depoimento da testemunha António, em especial o que se deixou transcrito no ponto 333. supra, que aqui se dá por integralmente transcrito, e da testemunha J..., em especial o que se transcreveu no ponto 335. e 336. supra que aqui se dá por integralmente transcrito, tomando ademais em linha de conta que é o próprio Tribunal a quo a reconhecer seriedade e isenção aos dois depoimentos referidos, resulta claro que não podia o Tribunal a quo ter deixado de considerar a matéria de facto sob análise, pontos 196., 197., 234. e 235. da petição e ponto 7. pp. das alegações previstas no art. 120.º do CPPT, na decisão proferida, devendo proceder-se ao aditamento da mesma à decisão factual, e que esta seja julgada como provada, nos seguintes termos:

“88. O estabelecimento da Recorrente tinha cerca de 30 mesas, cerca de 120 lugares sentados, cerca de 10/11 funcionários e cerca de 12/13 pessoas a trabalhar no seu estabelecimento;” [o que se impõe pelo análise crítica dos elementos probatórios contantes dos autos, nomeadamente do PA, no que respeita ao RIT, e depoimento prestado pelas testemunhas A... (gravado na cassete 1, lado A, das 1866 rotações às 1428 rotações do lado B, da inquirição de 15-05-2012), António (gravado na cassete 1, lado A, das 10 rotações até às 1923 rotações, da inquirição de 20-03-2013) e J... (gravado na cassete n.º 1, lado A, das 1924 rotações até às 2376 rotações do lado B, da inquirição ocorrida em 20-03-2013), no confronto entre si e no confronto do o RIT].
Sempre SEM PRESCINDIR
IV – Do erro na subsunção dos factos ao direito
i. Mesmo que se considerasse inalterada a decisão factual que a sentença integra – anulabilidade e nulidade por contradição entre os fundamentos e a decisão e vício de fundamentação
cxl. A Fazenda não contestou, e não impugnou os factos alegados pela Recorrente ou documentos juntos por esta aos autos, não requereu quaisquer diligências probatórias, nomeadamente não tendo requerido qualquer perícia a qualquer elementos constante do processo.

cxli. Nos termos legais, o ónus de prova quanto aos factos que legitimavam a aplicação de métodos indirectos é da AT, e o ónus de prova dos factos que demonstrem o excesso de quantificação cabia à Recorrente (art. 74.º n.º 3 LGT).

cxlii. Ora, como se deixou abundantemente exposto, o Tribunal a quo simplesmente omitiu o conhecimento e o julgamento de uma vastidão de factos que foram testemunhalmente provados nos autos, sendo que tais factos, se devidamente julgados, influenciavam para menos a quantificação efectuada pela AT e, portanto, cumpriam o ónus probatório da Recorrente, e no que tange à demonstração dos pressupostos factuais de actuação da AT, o Tribunal a quo não teve o mesmo grau de exigência e, omitindo o julgamento de relevantes aspectos da causa, sufraga, sem base em qualquer elemento probatório, a presunção formada pela AT.

cxliii. Dito de outro modo: a AT presume que um ficheiro informático, pelo facto de não conter saltos de numeração, corresponde ao real apuro da Recorrente e, apenas com base nisso, determina uma correcção por métodos indirectos, e o Tribunal a quo valida essa presunção desconsiderando – porque não aprecia expressamente, nem selecciona – a vasta matéria de facto provada testemunhalmente de onde resulta demonstrado o inverso.

cxliv. Ora, tendo em consideração que é à AT que cabe o ónus de prova de que não era possível obter a quantificação da matéria colectável da Recorrente directamente da sua contabilidade, cabe-lhe provar a verificação dos pressupostos que legitimam a sua actuação - No caso, a AT afirma que houve manipulação do sistema informático de facturação, mas não provou o que quer que seja quanto aos factos que legitimavam a sua actuação.

cxlv. Bem inversamente ao que o Tribunal a quo afirma na sentença recorrida, não era à Recorrente que cabia a prova de factos opostos aos que foram invocados pela AT no que se refere aos pressupostos de aplicação de métodos indirectos, isto é, não cabia à Recorrente demonstrar que o ficheiro invocado pela AT não corresponde ao seu real apuro.

cxlvi. Além disso, mesmo que provados tais factos – que não provou – à AT incumbia ainda demonstrar que estes impediriam a quantificação directa da matéria tributável da Recorrente, o que a AT igualmente não provou.

cxlvii. Acresce que, como se viu supra, a Recorrente alegou factos contrários àqueles e apresentou contra-prova quanto àqueles factos meramente alegados pela AT, pelo que não podia sequer o Tribunal a quo simplesmente desconsiderar o que foi alegado pela Recorrente, pelo não conhecimento e julgamento, e simplesmente dispensar a AT de provar os factos que a esta incumbia fazer prova.

cxlviii. A Recorrente provou que os factos que a AT invoca como premissa para a conclusão de ter havido manipulação do programa decorrem de outras causas além da pretensa manipulação – impugnando a afirmação da AT de ter manipulado aquele sistema-, uma vez que provou, nomeadamente por prova testemunhal, que aquilo que a AT vê como “evidência” de manipulação corresponde a erro, salto de numeração, ou processo em branco – como se lhe quiser chamar – ocorre pelo normal funcionamento do próprio programa informático, pelo que não pode entender-se que a AT logrou provar que tenha havido manipulação do programa informático e, por isso, não provou os factos que legitimariam a aplicação de métodos indirectos.

cxlix. Mais, ainda que assim não se entendesse, sempre teria de concluir-se que a AT é que não provou, como lhe cabia, a verificação dos factos que invocou como pressuposto à aplicação de métodos indirectos de quantificação e que, no entender da AT impediam a quantificação directa da matéria tributável da Recorrente – tanto mais que do próprio RIT resultam elementos que permitem concluir que há outras causas que podem determinar os apontados “saltos de linha” que não podem subsumir-se a qualquer manipulação como a AT pretende.

cl. Ora, assim sendo, como é, incorreu o Tribunal a quo em vício de aplicação da lei, nomeadamente das regras quanto ao ónus de prova, previstas no art. 74.º da LGT, a implicar a revogação da sentença proferida.

cli. É que, se o Tribunal a quo (em violação das regras de repartição do ónus da prova) embora reconhecendo como possível a existência de saltos de numeração, conclui que a Recorrente não provou que os saltos de numeração não tiveram origem efectiva nas situações invocadas (diabolica probatio), por que motivo conclui que os mesmos saltos de numeração tiveram origem efectiva na “manipulação” invocada pela AT?

clii. De igual modo, a AT não demonstrou de que modo foi construída a tabela constante do Anexo 1 ao RIT – o que também a Recorrente desconhece - e, como se viu, a AT não o demonstra na inspecção, como não demonstrou no procedimento de revisão, nem sequer o fez na fase de instrução dos presentes autos, de forma minimamente razoável, coerente e completa, os motivos que a conduziram a considerar que tais registos correspondem aos registos reais da Recorrente, e que os registos por esta fornecidos são errados.

cliii. Tendo em consideração o que se deixou alegado nos pontos 369. a 459. supra das presentas alegações, que aqui se dão por integralmente reproduzidos, e cada um dos vícios que ali se deixaram apontados ao procedimento que levou às liquidações impugnadas na sentença recorrida, o Tribunal a quo, ao não reconhecer os apontados vícios, incorreu em erro de julgamento da matéria de direito, por errada interpretação e aplicação do disposto nos artigos 74.º n.º 3 da LGT, dos artigos 77.º da LGT, 20.° e 268.° 3 e 4 da Constituição da República Portuguesa (CRP), do art. 58.º da LGT e 6.º do RCPIT, dos artigos 266.º, n.º 1 e 2 da C.R.P. e 5.º e 55.º da LGT, e e dos artigos 89.º, e 90.º do CPPT.

cliv. Bem assim, incorreu em erro de julgamento ao não reconhecer que a AT não procurou a verdade material quanto aos factos em causa, violando o princípio do inquisitório, vício em que incorreu igualmente o próprio Tribunal a quo ao não dar também cumprimento àquele princípio a que igualmente está vinculado, procurando a verdade material dos factos em causa nos auto, designadamente no que respeita às razões subjacentes aos apontados erros nos ficheiros informáticos referidos nos autos, e, bem assim, a toda a factualidade invocada e de que resulta o excesso de quantificação da matéria tributável fixada à Recorrente, o que constitui violação ao disposto nos artigos 99.º da LGT e 13.º do CPPT, além de constituir errada interpretação do art. 58.º da LGT.

clv. «Se o contribuinte demonstra que no raciocínio lógico-dedutivo que a AT levou a cabo para chegar à conclusão sobre a omissão de proveitos não foram tidas em conta determinadas circunstâncias ocorridas no processo produtivo (como a inutilização de parte do tecido considerado em falta, furtos, quebras e perdas efectivamente ocorridas) - e que nem foi quantificada qualquer margem para os naturais desperdícios, tal implica a existência de uma falha na cadeia lógico-dedutiva, a inquinar a validade do resultado apurado, pois que só com base em factos indiciários comprovadamente apropriados ao caso concreto e por meio de uma cadeia sem falhas, é possível chegar a um resultado válido no silogismo, que é sempre a determinação do valor tributável por meio de métodos indiciário.» (sic, Ac. TCAN, de 25.01.2007, dado no proc. n.º 01888/04, destaque nosso).

clvi. Ao assim não entender incorreu o Tribunal a quo em erro de julgamento da matéria de direito, por errada interpretação e aplicação do disposto nos artigos 58.º. 74.º n.º 3, 89.º, e 90.º do LGT – a impor a revogação da sentença recorrida.

clvii. Quando muito, de todos os factos trazidos ao processo pela Recorrente – e resultantes de abundante instrução, em sede de inquirição das testemunhas arroladas – resulta uma fundada dúvida quanto à efectiva origem dos saltos de numeração em que a AT baseia a liquidação impugnada.

clviii. Ora, «Sempre que da prova produzida resulte a fundada dúvida sobre a existência e quantificação do facto tributário, deve o acto impugnado ser anulado.» (art. 100.º n.º 1 do CPPT).

Nestes termos e nos melhores de direito, deve conceder-se provimento ao presente recurso, declarando-se nula a sentença recorrida, ou alterando-se e aditando-se a decisão quanto à matéria de facto dada como provada e não provada, com consequência na anulação da sentença recorrida e sua substituição por uma decisão que julgue pela integral procedência da impugnação, o que se deverá fazer por obediência à Lei e por imperativo de
J U S T I Ç A!»

A Recorrida Fazenda Pública não contra-alegou.

A Exma. Sra. Procuradora-Geral Adjunta neste Tribunal emitiu mui douto parecer no sentido de que não se verificam as invocadas nulidades da sentença por contradição dos fundamentos com a decisão e por omissão de pronúncia, nem a sentença incorreu nos invocados erros de julgamento de facto e de direito, tendo feito correcta valoração da prova e acertada interpretação dos factos e aplicação do direito, com apoio na doutrina e na jurisprudência, não violando qualquer norma legal, razão por que deverá ser mantida na ordem jurídica (fls.946 e ss.).

Colhidos os vistos legais e nada mais obstando, cumpre decidir.

Porém, antes de entrar propriamente na apreciação do objecto do recurso, cumpre decidir da requerida junção, pela Recorrente, de documento após as alegações de recurso.

Estatui o art.º651.º, do CPC:
«1 - As partes apenas podem juntar documentos às alegações nas situações excecionais a que se refere o artigo 425.º ou no caso de a junção se ter tornado necessária em virtude do julgamento proferido na 1.ª instância.
2 - As partes podem juntar pareceres de jurisconsultos até ao início do prazo para a elaboração do projeto de acórdão».

Dispõe aquele art.º425.º: «Depois do encerramento da discussão só são admitidos, no caso de recurso, os documentos cuja apresentação não tenha sido possível até àquele momento».

Por outro lado, dispõe o art.º423.º, do CPC:
«1 - Os documentos destinados a fazer prova dos fundamentos da ação ou da defesa devem ser apresentados com o articulado em que se aleguem os factos correspondentes.
2 - Se não forem juntos com o articulado respetivo, os documentos podem ser apresentados até 20 dias antes da data em que se realize a audiência final, mas a parte é condenada em multa, exceto se provar que os não pôde oferecer com o articulado.
3 - Após o limite temporal previsto no número anterior, só são admitidos os documentos cuja apresentação não tenha sido possível até àquele momento, bem como aqueles cuja apresentação se tenha tornado necessária em virtude de ocorrência posterior».

Em processo judicial tributário, a apresentação de alegações do art.º120.º do CPPT, constitui o encerramento da discussão da causa na 1.ª instância, sendo o termo final do prazo para apresentação de documentos na 1.ª instância – vd. Jorge Lopes de Sousa, ob. cit., pág.527.

Da articulação lógica entre o artigo 651º, nº 1 do CPC e os artigos 423.º e 425.º do mesmo Código, resulta que é legítimo às partes juntar documentos com as alegações quando (i) a sua apresentação não tenha sido possível até esse momento (superveniência objectiva: quando o documento é historicamente posterior ao encerramento da discussão em 1.ª instância; ou superveniência subjectiva, quando sendo anterior, a parte faça prova de que o documento em si ou a situação documentada só posteriormente chegaram ao seu conhecimento e por razões atendíveis, só sendo atendíveis razões das quais resulte a impossibilidade daquela pessoa, num quadro de normal diligência referida aos seus interesses, ter tido conhecimento anterior da situação ou ter tido anteriormente conhecimento da existência do documento – vd. Ac. Rel. Coimbra, de 18/11/2014, tirado no proc.º628/13.9TBGRD.C1), (ii) quando se destinem a provar factos posteriores ou, (iii) quando a sua apresentação apenas se tenha tornado necessária por virtude de ocorrência posterior ao julgamento em 1.ª instância.

Regressando aos autos, constata-se que o documento cuja junção é requerida (consta a fls.983 e ss.), se trata das conclusões de uma consulta feita pela Recorrente ao Grupo PIE em 21/04/2015, relativamente ao funcionamento do programa informático com a designação “WinRest”, no que respeita à versão em utilização nos anos de 2006 a 2008.

Trata-se claramente de um documento destinado a provar factos (falhas do programa informático em uso no estabelecimento de restauração da impugnante e suas possíveis causas) que já antes da decisão de 1.ª instância a parte sabia estarem sujeitos a prova porque os alegara (vd. artigos 64 e ss. da douta p.i.), não podendo servir de pretexto à sua junção neste momento a mera circunstância de a sentença não ter valorado a prova dos autos no sentido que esperava, pretendendo que o tribunal ad quem forme diversa convicção sobre os factos com base (ou também com base), na prova requerida.

Revestindo a junção de documentos na fase de recurso carácter excepcional, só deve ser admitida nos casos especiais previstos na lei, o que não acontece no caso presente, não se admitindo, por conseguinte, a junção do documento de fls.983/996, que consequentemente não poderá integrar o material probatório dos autos, nem nele alicerçar-se a convicção deste tribunal.

2 – DO OBJECTO DO RECURSO

Delimitado o objecto do recurso pelas conclusões das alegações apresentadas pela Recorrente (artigos 684.º, n.º3 e 685.º-A, n.º1, do CPC/61; 635.º, n.º4 e 639.º, n.º1, do actual CPC), são estas as questões que importa resolver: (i) nulidade da sentença a) por falta de especificação dos fundamentos de facto para a decisão; b) por oposição dos fundamentos com a decisão; c) por omissão de pronúncia; (ii) se o gerente da sociedade impugnante pode depor como testemunha num processo em que a sociedade é parte; (iii) erro de julgamento na selecção dos factos levados ao probatório, bem como erro de julgamento quanto aos factos julgados provados e não provados; (iv) erro de julgamento da sentença quanto à apreciação que fez do invocado erro nos pressupostos de aplicação dos métodos indirectos e excesso de quantificação, bem como preterição do princípio do inquisitório e da verdade material.

3 – DA MATÉRIA DE FACTO

Deixou-se consignado na sentença recorrida em sede factual:

«Com relevância para a decisão a proferir nos presentes autos, consideram-se provados os seguintes factos:
1. G…, S.A emitiu a factura n.º 369722, no montante de €36,75, tendo sido pago por meio de VISA/MC – cfr. fls. 107 dos autos.
2. V… & CA., Lda., emitiu em 10.01.2010 talão de venda no montante de €50,00 – cfr. fls. 108 dos autos.
3. O…– Bares e Discotecas, Lda. emitiu em 26.08.08 “vendas a dinheiro” no montante de €72,00 – cfr. fls. 110 dos autos.
4. … Revendedor de Combustíveis e Lubrificantes, Lda. emitiu em 29.08.2008 “venda a dinheiro” no montante de €81,70 – cfr. fls. 111 dos autos.
5. J… pagou em 18.10.2008 o montante de €74,52 no Posto Abastecimento A 23 Abrantes – cfr. fls. 112 dos autos.
6. Em 10.11.2006 a Impugnante transferiu o montante de €750,00 para Restaurante …, Lda. – cfr. fls. 116 dos autos.
7. Em 20.11.2006 a Impugnante transferiu o montante de €1.500,00 para Restaurante …, Lda. – cfr. fls. 117 dos autos.
8. Em 12.12.2006 foi movimentada a conta n.º PT 0035 0236004117830 a débito e creditada a conta n.º PT 0035 0236010527330 do montante de €700,00 – cfr. fls. 118 dos autos.
9. J… pagou em 22.09.2008 o montante de €48,85 a S… Rest. Oriental, Lda. – cfr. fls. 113 dos autos.
10. A Impugnante emitiu em 5.05.2006 o cheque n.º 3478672255 no montante de €273,44 à ordem de António…– cfr. fls. 114 dos autos.
11. Em 6.11.2006 foi movimentada a conta n.º PT 0035 0236004117830 a débito e creditada a conta n.º PT 0035 0236010527330 do montante de €700,00 – cfr. fls. 115 dos autos.
12. Em 16.02.2007 foi depositado na conta n.º PT 0035 0236010527330 o montante de €1.300,00 – cfr. fls. 119 dos autos.
13. Em 29.07.2008 a BMW emitiu a factura n.º VVF08V+0091 no montante de €1.000,00 - cfr. fls. 120 dos autos.
14. Em 3.11.2009 foi elaborada informação por parte do Núcleo de Apoio Informático da Direcção de Finanças do Porto atinente à análise dos dados fornecidos pela Impugnante em 15.05.2009 e dos dados remetidos pela Direcção de Serviços de Planeamento e Coordenação da Inspecção Tributária – cfr. fls. 273 a 298 dos autos que aqui se dá por integralmente reproduzido.
15. No cumprimento da Ordem de Serviço n.º OI200901700, os Serviços da Inspecção Tributária da Direcção de Finanças do Porto desencadearam procedimento inspectivo à aqui Impugnante, com âmbito parcial, em sede de IVA e IRC, visando os exercícios de 2006, 2007 e 2008, tendo efectuado correcções meramente aritméticas à matéria tributável no âmbito de IRC no montante total de €87.458,85 do exercício de 2006, €14.428,38 do exercício de 2007 e de - €3.430,66 do exercício de 2008, assim como correcções com recurso a métodos indirectos no valor de €254.257,35 do exercício de 2006, €249.640,32 do exercício de 2007, €177.812,50 do exercício de 2008 – cfr. relatório de inspecção tributária, a fls. 13 do processo administrativo (PA) junto aos autos.
16. As correcções à matéria colectável a que se alude em 15. fundamentaram-se, designadamente, no seguinte: “ (…)
111.4 - DIVERGÊNCIAS APURADAS ENTRE OS FECHOS DO DIA E O VALOR DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS CONTABILIZADO
De seguida apresenta-se as divergências detectadas entre os somatórios mensais dos fechos do dia extraídos do sistema informático de facturação utilizado pelo sujeito passivo e os mapas que serviram de suporte dos registos contabilísticos das prestações de Serviço em 2006, 2007 e 2008.
De referir que para os meses Janeiro a Março de 2006, Julho a Dezembro de 2006, Janeiro a Março de 2007, Maio e Junho de 2007 não se encontravam arquivados na contabilidade tendo sido necessário solicitar a sua exibição. Tendo em conta que o sócio gerente já não tinha na sua posse esses fechos do dia, o que contraria o disposto no nº 5 do art° 46° do Código do IVA procedeu este já no decurso desta acção inspectiva a nova impressão a partir do sistema informático instalado no estabelecimento comercial.
Apenas nos meses de Abril a Junho de 2006, Janeiro de 2007 e Junho a Setembro de 2008 de Dezembro daquele mesmo ano é que os registos contabilísticos se encontram suportados por relatório com o apuramento das vendas por taxas de IVA, nos restantes os registos estão suportados por um "Diário de Caixa" sem indicação do valor de IVA liquidado ou por tabela: elaboradas em EXCEL. (…)
A diferença relativa a Novembro de 2006 diz respeito ao apuro do dia 20 que não aparecia no respectivo mapa "Diário de Caixa", que indica numa sequência diária os valores apurados. Note-se que este mapa que suporta o registo contabilístico das prestações de serviço daquele mês foi extraído do sistema informático em 1 0-08-2007 ás 12:34:42, ou seja, quase um ano após o mês a que se refere, ao contrário, por exemplo, do que se passa nos meses de Janeiro ê Setembro de 2006 em que a listagem de totais diários aparece com data de impressão dos primeiros dias do mês imediato.
O Diário de Caixa referente a Dezembro, que serve de suporte ao registo contabilístico das respectivas prestações de serviço tem também inscrito como data de extracção do sistema informático, 10-08-2007,0 mesmo acontecendo com os Diários de Caixa que servem se suporte é contabilização das prestações de serviço de Janeiro, Fevereiro, Março, Maio e Junho de 2007 ainda que com horas diferentes.
O registo contabilístico das prestações de serviço dos meses de Abril e Julho de 2007 e Outubro de 2008 estão suportados por tabela de Excel onde são indicados os valores globais mensais por taxas de IVA, com e sem IV A.
111.5 - PRESTAÇÕES DE Serviço OMITIDAS
Em 2009/01/02, deu entrada nesta Direcção de Finanças, ofício enviado pela Direcção de Serviços de Planeamento e Coordenação da Inspecção Tributária remetendo 2 DVD's que continham informação fiscalmente relevante relativa a vários sujeitos passivos, incluindo o sujeito passivo inspeccionado. Esta informação, originariamente proveniente de um conjunto de DVD's e CD's entregues pela Polícia Judiciária à inspectora da Direcção de Finanças de Lisboa, Drª Ana Isabel Mascarenhas, havia sido recolhida de computadores apreendidos por aquela entidade nas instalações da empresa N... INFORMATICA LDA, NIPC 5…, no âmbito da operação "SELFSERVICE".
- Após a análise dessa informação pelo Núcleo de Apoio Informático desta Direcção de Finanças foram detectadas várias irregularidades nos dados informáticos de facturação do sujeito passivo J…, Lda. indiciadoras de práticas de viciação dos registos de facturação com o objectivo de omissão de prestações de serviço efectuadas.
Em resultado dessa conclusão foi efectuada proposta de fiscalização, em sede de IRC e de IVA, do sujeito passivo em causa, pare os exercícios de 2006, 2007 e 2008.
De salientar que, naquele mesmo CD foram detectados ficheiros com registos de facturação de sujeito passivo referentes ao período de 2006/04101 a 2006/05/14, que se apurou corresponderem aos seus reais apuros diários. Com os dados em causa foi elaborado o mapa resumo que se apresenta em anexo (Anexo 1). Como se pode ver, estes ficheiros, ao contrário dos ficheiros que serviram de base aos valores declarados pelo sujeito passivo à Administração Fiscal para o mesmo período (e que permitiram elaborar o mapa resumo que se apresenta no Anexo 2 deste relatório), encontram-se íntegros e sem quaisquer falhas na sequência numérica dos respectivos registos.
Note-se, no entanto, que aqueles registos suportam um total global de facturação de 171.956,00€ (lVA incluído) enquanto que o valor declarado pelo sujeito passivo para aquele mesmo período é de apenas 77.373,68€ (IVA Incluído).
Estaremos, portanto, perante uma omissão de prestação de serviços de cerca 55% do total, o que determinará a necessária correcção técnica do valor declarado de prestações de serviço, havendo lugar necessariamente à liquidação adicional do IVA em falta, como se apresenta de seguida: (…)
IV - MOTIVO E EXPOSIÇÃO DOS FACTOS QUE IMPLICAM O RECURSO A MÉTODOS INDIRECTOS
De acordo com o art.º 75º da Lei Geral Tributária, presumem-se verdadeiras e de boa fé as declarações dos contribuintes apresentadas nos termos previstos na lei, bem como os dados e apuramentos inscritos na sua contabilidade, quando esta estiver organizada de acordo com é legislação comercial e fiscal.
No decurso da presente acção inspectiva foram apurados diversos factos e indícios que levaram à conclusão de que a escrituração, demonstrações financeiras e os valores declarados à Administração Tributária relativos à sociedade J…, Lda, não reflectem as operações efectivamente realizadas, o que coloca em causa a presunção atrás referida. (…)
IV.1 - IRREGULARIDADES DETECTADAS NOS REGISTOS INFORMÁTICOS DA FACTURAÇÃO
(…) Essas irregularidades foram evidenciadas numa informação emitida em 2009/03/19, da qual se transcreve as partes mais relevantes:
"2 Omissões Verificadas
2. 1 Documentos eliminados
Da análise dos ficheiros de cabeçalhos, concluímos que o sujeito passivo terá eliminado uma grande quantidade de documentos, pois da numeração sequencial faltam 19.917 documentos. Como os documentos constantes dos ficheiros são de 24371, o sujeito passivo terá eliminado 44,97% dos documentos 2.2. Linhas eliminadas
Também detectamos a existência de linhas eliminadas em documentos em que nos é possível determinar essas anomalias.
Assim de uma amostra de 9980 documentos é possível determinar que foram eliminadas 154 linhas, quando esses documentos deveriam ter 111967 linhas, ou seja, podemos afirmar que foram eliminadas 13,8% das linhas da amostra, (...)
2.3. Outras falhas
Foram detectados 3476 registos no ficheiro de cabeçalho com os correspondentes registos de detalhe todos anulados.
Outros 3087 registos de cabeçalho, não tinham qualquer correspondência no ficheiro de detalhe. Qualquer destas situações podem corresponder a mudanças de mesa, mas como 6307 deste registos foram processados entre 15/05/2006 e 03/09/2006, período em que o sujeito passivo apenas emitiu 3878 facturas válidas, não é crível que se devam todas a esse motivo. "
Em 2009/05/15, ao abrigo do Despacho 01200904422, foi efectuada nova recolha de dados da facturação a partir de cópia de segurança disponibilizada pelo sujeito passivo, tendo sido entregue a este um CD-ROM com cópia dos dados recolhidos.
No seguimento da análise dos novos dados o Núcleo de Apoio Informático constatou mais um vez a existência de irregularidades nos registos informáticos de facturação do sujeito passivo nomeadamente, a existência de uma quantidade anormalmente alta de registos sem valor e de várias falhas na sequência numérica do ID dos documentos. O estudo detalhado dos dados recolhidos encontra-se explicado por aquele Núcleo na informação de que se junta cópia (ver Anexo 3).
(…)
Refere o sujeito passivo, em resposta escrita à notificação efectuada, que: (…)
Salienta o sujeito passivo, que "8. como é bom de ver a grande maioria destes acessos à mesa não podem gerar um documento de facturação (talão/factura/venda a dinheiro)."
Efectivamente é do nosso conhecimento a existência neste tipo de negócio de situações idêntica às descritas pelo sujeito passivo. No entanto, certamente que não serão em maior nº que aquela em que o cliente entra no restaurante, senta-se na sua mesa faz os seus pedidos e no final desta transacção económica paga o serviço que lhe foi prestado, sem que ocorra qualquer mudança de mesa.
Sendo assim, não é compreensível que em cerca de 344 dias do total de 812 analisados 50% de registos efectuados estejam em falta nos ficheiros de facturação, pelo que haverá outra razão para aquelas falhas de registos. nomeadamente a sua eliminação ou alteração intencional o que é confirmado pelos ficheiros com os dados originais de facturação relativos a 2006 (dados recolhidos pela Polícia Judiciária).
De seguida, e a título de exemplo, apresenta-se, por ordem decrescente de percentagem de omissões, alguns desses dias: (…)
Atente-se no dia 2006/07/30, em que o 1° registo tem o nº 212234 e o último o nº 212400, pelo que o nº de registos que deveriam estar presentes seria de 167, no entanto, temos como emitidos apenas 31 documentos de venda. Não será plausível considerar que os 136 registos em falta correspondam a mesas que foram transferidas para outras e que por isso desapareceram o respectivos registos pois, como foram emitidos 31 documentos nesse dia, em média cada um desses documentos teria que ter resultado de 4,4 trocas de mesa sucessivas. Portanto, uma possibilidade inverosímil.
(…)
Uma vez que algumas daquelas falhas resultaram de mudanças efectivas de mesa, calculou-se a percentagem habitual dessas transferências a partir do nº de documentos de venda emitidos identificados pelo Núcleo de Apoio Informático como tendo resultado de outras mesas (ver 2ª parte do ponto 2.1.6 da sua informação, em anexo) isto é, 3011 documentos num total de 4755 o que determina uma taxa de transferências de cerca de 6,33%, a qual aplicada às falhas totais apuradas determinou que o nº de documentos em falta decorrentes da manipulação dos dados será de 14978 em 2006, 11613 em 2007 e 5034 em 2008.
De salientar que, não está aqui considerado o período de 01/04/2006 a 14/05/2006 pois, como para esse período foram detectados dados originais que nos permitiram apurar com exactidão as omissões praticadas, não será objecto de quantificação das respectivas omissões de prestação de serviços por recursos a métodos indirectos.
O Núcleo de Apoio Informático identificou, ainda, a existência de documentos de venda nos quais terão sido eliminadas as primeiras linhas do seu detalhe. Como se pode verificar pela leitura da parte do ponto 2.1.6 da sua informação, a percentagem de documentos de venda sem linhas de detalhe anuladas em que se detecta terem sido eliminadas as primeiras linhas do detalhe passou de 2% ou 3,5% em 2006 para os 35%% em 2007 e 23,2% em 2008, o que evidencia que a partir de Outubro de 2007 o método de manipulação dos dados da facturação para omissão de proveitos terá mudado passando a efectuar-se ao nível da eliminação aleatória das linhas dos documentos de venda emitidos.
De referir que, apenas é possível detectar as primeiras linhas que foram eliminadas; não sem possível detectar as linhas intermédias dos documentos que também o foram. No entanto, é certo que sendo a eliminação aleatória, então, tomando o exemplo de Outubro de 2007, se fora eliminadas 33% das primeiras linhas dos documentos emitidos, também terão sido eliminadas 33% das segundas linhas, 33% das terceiras linhas e assim sucessivamente. Portanto, 33 corresponderá à percentagem de omissão de prestação de serviços naquele período. (…)
De referir que, nesta análise foram excluídos o universo de documentos de venda emitidos relativamente à mesa 50.(…)
IV.3 - DIVERGÊNCIAS OBTIDAS NO CONTROLO QUANTITATIVO DOS ARTIGOS
Foi efectuada a análise quantitativa a alguns artigos vendidos através da comparação entre os seus consumos, obtidos com base nas compras realizadas (Anexo 4) e nas existências constantes dos inventários (Anexo 5 e 6), e as respectivas vendas resultantes dos registo informáticos (Anexo 7).
De referir que, para essa análise, efectuada ao ano de 2008, foram seleccionados artigos cuja unidade de venda é igual à unidade de compra, como é o caso dos vinhos, águas e refrigerantes vendidos em lata ou garrafa, dos gelados, e artigos em que o n° de componentes incorporados é reduzido, sendo facilmente controlável as entradas e saídas do componente principal, como é o caso da cerveja de pressão, da snappy de pressão ou o café.
De seguida, apresenta-se o quadro resumo da análise efectuada, onde são indicadas várias divergências positivas que, pela sua grandeza, dificilmente se poderão explicar por quebras e consumo interno dos funcionários, sendo indiciadoras de omissão de Prestações de Serviços. (…)
Uma vez que, o sujeito passivo dispõe de uma oferta alargada de whiskies, licores, vinhos de porto, espumantes e vinhos, não é descabida a hipótese de, no momento do registo informático da venda, existirem trocas involuntárias por parte dos funcionários relativamente ás referências dos whiskies, das marcas de vinhos, ou mesmo do tipo de vinho (Branco ou Tinto) ou da capacidade da garrafa (Garrafa ou ½ Garrafa) duma mesma marca de vinho, pelo que, no sentido de diminuir os efeitos destas situações nas nossas conclusões, a nossa análise a estes dois tipos de artigos (bebidas brancas e espirituosas e vinhos e espumantes) foi efectuada em quantidades totais da unidade de medida. Ou seja, relativamente às bebidas brancas e espirituosas foi determinado o nº litros total consumido e comparado com o nº de litros totais vendidos registados.
Relativamente aos vinhos e espumantes foi efectuada a comparação entre o nº total de garrafas consumidas e o nº total de garrafas vendidas registadas.
Assim, do quadro apresentado se retira, por exemplo, que:
• o sujeito passivo consumiu 381,10 litros de whiskies, licores, brandies e outras bebidas brancas enquanto as vendas registadas são de apenas 69,30 litros, o que determina uma omissão de 81,82%;
• relativamente ao café Confezzioni Extra Strong , consumiu o equivalente a 34650 doses enquanto os seus registos informáticos têm presente a venda de 22885 doses, donde resulta uma omissão de 33,95%;
• o sujeito passivo consumiu 8787 unidades de gelados individuais tendo o registo informático de 3741 unidades vendidas, o que determina uma omissão de 57,43%;
• o sujeito passivo consumiu 4500 litros de cerveja em barril enquanto que o registo de vendas de cerveja à pressão se situa nos 1872,10 litros, donde resulta uma omissão de 58,40%;
• o sujeito passivo consumiu 5880 garrafas de Ice Tea Lipton e 7608 garrafas de Pepsi tendo registado vendas de 2680 e 3255 garrafas, respectivamente. Sendo assim, a omissão neste tipo de artigos será de 54,42% no caso do Ice Tea Lipton e de 57,22% no caso da Pepsi.
• relativamente à água sem gás, para a qual não se fez distinção entre as garrafas de Litro e as de 1,5 litro, apurou-se um consumo de 18372 garrafas no total, consumo esse que confrontado com o registo de 7303 garrafas vendidas determina uma omissão de 60,25% neste produto.
Note-se que estes são alguns exemplos das omissões identificadas, sendo certo que outros exemplos poderiam ser dados já que essas divergências positivas, indiciadoras da omissão das prestações de serviços, se verificaram, regra geral, para todos os artigos seleccionados para integrar amostra.
De salientar que, a situação aqui apresentada para os refrigerantes em garrafa e as bebida brancas e espirituosos será mais grave na realidade já que não estamos a entrar em linha de conta com os documentos evidenciados no ponto 111.2 deste relatório, relativos a compras das matérias-primas efectuadas ao R... Cash and Carry, SA, não contabilizadas pelo sujeito passivo, e de que fazem parte compras daquele tipo de artigos.
IV.4 - OUTRAS SITUAÇÕES
IV.4.1 - INVENTÁRIOS DE EXISTÊNCIAS
De seguida, apresenta-se uma breve análise das Existências Finais de matérias primas e subsidiárias, declaradas pelo sujeito passivo relativamente aos anos de 2005, 2006, 2007 e 2008 (…)
De salientar, o facto das existências finais, em 2006, representarem cerca de 45,50% das compras do referido ano, o que determina uma duração média de existências de quase 6 meses ao contrário do que é normal no sector em que o sujeito passivo se insere e que se caracterize pelo facto de grande parte das suas matérias-primas serem perecíveis e terem um prazo de validade reduzido e pelo facto de disporem de uma reduzida capacidade de armazenagem, não sendo o sujeito passivo inspeccionado uma excepção. Portanto, entende-se que, em média, o sector apresente uma duração média de existências de matérias-primas na ordem dos dois meses.
Entre 2006 e 2007, a duração média de existências de matérias-primas reduziu significativamente para os 3,36 meses, ainda assim, acima do rácio evidenciado pela média do sector.
Uma análise mais pormenorizada dos artigos em stock nos anos em estudo veio evidenciar várias anomalias.
Por exemplo, no final de 2006, o sujeito passivo tinha armazenadas 9497 garrafas de vinho e espumantes e 1248 garrafas de bebidas brancas e espirituosos. Para se ter uma melhor ideia da dimensão desse número, convém salientar que, em Dezembro de 2006, foram adquiridas 32 garrafas do que poderá ser considerado de bebidas brancas e espirituosos. 18 dessas garrafas eram de Licor Frangélico. Tendo em conta que, de acordo com os registos informáticos, naquele mesmo mês não foram vendidas quaisquer doses de licor Frangélico, temos que no início de Dezembro o sujeito passivo teria as 63 garrafas existentes a 2006/12/31 menos as 18 garrafas adquiridas durante o mês de Dezembro, ou seja, 45 garrafas. De referir, que a quantidade máxima mensal de licor Frangélico registada como vendida é de 2 doses (cerca de 0,2 litros), sendo que e quantidade total vendida registada em 2006 é de 4 doses. Portanto, se o sujeito passivo efectivamente tivesse 45 garrafas em stock, tendo em conta a habitual quantidade mensal vendida deste tipo de artigo, não teria necessidade de comprar mais 18 novas garrafas.
Note-se que entre 2006 e 2007, o sujeito passivo passou de 63 garrafas para 38 garrafas daquele licor no stock final, no entanto, ao longo de 2007 terá vendido apenas 8 doses (cerca de 0,8 litros isto é, mais ou menos uma garrafa de licor Frangélico), o que não justifica de todo essa diminuição.
É igualmente incompreensível que o sujeito passivo tivesse em stock, no final de 2006, 2926 unidades de gelados individuais (isto é, os que não são vendidos à fatia ou em bola), sobretudo se tivermos em conta o espaço de armazenagem que ocupa essa quantidade de gelados e o n° de arcas frigoríficas presentes no estabelecimento. Veja-se o caso do gelado Magnum Moments, com 5 caixas no stock final daquele ano, o que equivale a 600 unidades. Confronte-se esta quantidade com o nº de unidades vendidas daquele artigo registadas no ano inteiro de 2006, isto é, 185 gelados, correspondendo a uma venda média mensal de 15,4 gelados. No final de 2007, o sujeito passivo tinha em stock 1200 unidades de magnum moments (mais 600 unidades que no ano anterior), tendo vendido apenas 108 gelados ao longo de todo o ano de 2007. Em resumo, no final de 2006 tinha 600 unidades de gelado Magnum Moments, vendeu ao longo do ano de 2007 108 unidades, e no final desse ano tem 1200 unidades. O que significa que teria adquirido nesse mesmo ano mais 708 unidades, quando o normal é que não venda mais de 200 unidades num ano. Note-se que alguns dos gelados em stock em 2007/12/31 estavam já em stock em 2006/01/01, isto é, mais de dois anos o que é de todo incompatível com o prazo de validade deste tipo de artigo.
Por todos estes aspectos se conclui que os inventários de existências estão adulterados, não correspondendo à realidade.
No entanto, esta conclusão não põe em causa as divergências positivas apuradas no ponto anterior já que, admitindo a situação normal do sector de variação de stocks tendencialmente nula, se compararmos as compras directamente com as vendas, temos ainda assim, importante: divergências positivas para a generalidade dos artigos seleccionados
No sentido de se procurar aferir o verdadeiro valor normal de existências em armazém, foi solicitada a emissão de Despacho Externo para proceder à sua inventariação à data, no entanto no dia escolhido para proceder a essa diligência, dia 2009/10/19, fomos informados pelo sócio gerente Sr. J… já nas instalações, que as existências presentes pertenciam a outra empresa, já que desde o dia anterior a empresa inspeccionada teria deixado de explorar aquele estabelecimento comercial, tendo procedido à venda das suas existências finais e do seu imobilizado à nova concessionária, a empresa JO…, LDA, NIPC 5…constituída em 2009/10/13 e que tem por sócios os mesmos da empresa inspeccionada.
De salientar que, as existências finais foram vendidas ao preço de custo, tendo como valor total 26.852,37€, o que é consideravelmente inferior aos valores declarados pelo sujeito passivo, no final de 2006, 2007 e 2008. Por exemplo, dessas existências finais faziam parte cerca de 21 garrafas de aguardentes, Whiskies, vinhos do porto e licores sendo que relativamente a cada marca/tipo de whisky estaria uma ou duas garrafas, portanto, uma situação diferente, contudo crível, daquela que se verificava nos inventários de 2006 e 2007, em que a maior parte dos tipo de bebidas brancas e espirituosas tinham mais de 20 garrafas. Alguns desses exemplos, é o Whisky Old Parr12, o licor Frangélico, o whisky Tartan Prince, Vinho do Porto Calem Velhotes etc ...
De salientar que, o empolamento do valor global dos stocks finais é um expediente vulgarmente utilizado pelos sujeitos passivos para, numa situação de omissões de proveitos, compor a margem bruta e os resultados.
IV.4.2 - SALDO DA CONTA CAIXA
Como se apresenta no quadro seguinte, ao contrário do que se passa com o saldo das contas de Depósitos à Ordem que se mostram coerentes com os saldos bancários das respectivas contas os saldos da conta Caixa evidenciados pelo sujeito passivo em cada um dos anos analisado são, muito elevados, revelando falta de correspondência com a realidade económica e financeira da empresa e consequentemente a falta de credibilidade dos elementos contabilísticos do sujeito passivo.
(…)
Atendendo ao exposto neste ponto IV concluímos pela omissão de proveitos em 2006, 2007 e 2008. No entanto, a insuficiência de elementos disponíveis na contabilidade (prevista na alínea a) do art° 88° da LGT), bem como, a recusa por parte do sujeito passivo na apresentação dos ficheiros de facturação que cumpram os requisitos previstos no art° 5 do Decreto-Lei 198/90 de 19 de Junho (coma redacção dada pela Lei 60-A/2005,de 30 de Dezembro) e a viciação dos seus ficheiros de facturação (ambas previstas na alínea b) do art° 88° da LGT) não nos permite a comprovação e quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à correcta determinação da matéria tributável de IVA e IRC do sujeito passivo inspeccionado, Sendo assim, nos termos da alínea b) do nº 1 do art.ºs 87° e do art.º 90° da LGT, art.ºs 52° e 54° do Código do IRC e art.º 90° do Código do IVA recorrer-se-à a métodos indirectos.
V - CRITÉRIOS DE CÁLCULO DOS VALORES CORRIGIDOS COM RECURSO A
MÉTODOS INDIRECTOS
V.1 - VENDAS/PRESTAÇÕES DE SERVIÇO OMITIDAS
De forma a podermos calcular o valor das prestações de serviço omitidas iremos proceder à estimação do valor global dos talões considerados em falta bem como, à estimação do valor das linhas de detalhe do documento que foram eliminadas.
V.1.1 - Estimação do valor global dos talões considerados em falta:
A cada um dos talões em falta iremos aplicar o valor mínimo do valor médio calculado para o Universo de documentos de venda emitidos. De referir que, como a mesa 50 integra outras mesas, apresenta alguns registos de valor total elevado o que influencia um valor médio superior ao normal pelo que para o seu cálculo foram retirados os documentos de venda associados a esta mesa virtual.
Atendendo a que a mesa 50 é uma mesa virtual, ela resulta da transferência de outras mesas reais pelo que, parte dos documentos considerados em falta terão sido facturados na mesa 50. Sendo assim, procedeu-se em cada período à dedução do valor declarado de prestações de serviço da mesa 50 ao valor determinado por aplicação do valor mínimo do Valor Médio ao nº estimado de talões em falta. (…)
V.1.2 – Estimação do valor global das linhas do documento que foram eliminadas:
A percentagem de prestação de serviços que terão sido omitidas pelo método da eliminação aleatória, determinada na parte final do ponto IV.1 deste relatório, foi aplicada ao valor global da prestações de serviços declaradas (com exclusão dos valores declarados relativamente à mesa virtual 50) tendo-se chegado aos seguintes valores de prestações de serviços omitidas por aquele método de manipulação de dados: (…)” - cfr. de inspecção tributária, a fls. 10 a 54 do PA junto aos autos que aqui se dá por integralmente reproduzido.
17. Faz parte integrante do relatório elaborado pelos SIT em 25.11.2009, o anexo I constituída por tabela elaborada em excel – cfr. fls. 68 do PA junto aos autos e que aqui se dá por integralmente reproduzido.
18. Faz parte integrante do relatório elaborado pelos SIT em 25.11.2009, o anexo II respeitante a facturas e notas de crédito emitidas por “R... Cash & Carry” no período que intermediou 29.05.2006 e 24.12.2008 – cfr. fls. 177 a 259 do PA junto aos autos e que aqui se dá por integralmente reproduzido.
19. Em 30.12.2009 a Impugnante intentou pedido de revisão da matéria tributável junto da Direcção de Finanças do Porto – cfr. fls. 55 a 60 do PA junto aos autos.
20. Na falta de acordo entre o perito da Impugnante e o perito designado pela Administração Tributária, foram apresentados os pareceres de ambos, tendo sido elaborada em 26.02.2010 decisão de indeferimento por parte do decisor do procedimento de revisão – cfr. fls. 61 a 72 do PA junto aos autos.
21. Na sequência da decisão proferida e descrita em 20. foram emitidas as liquidações adicionais de IRC n.º 2010 8310001471, respeitante ao exercício de 2006 no montante de €111.588,86, n.º 2010 8310001531 do exercício de 2007 no montante de €76.734,30 e n.º 2010 8310001584 no montante de €46.876,20 – cfr. fls. 98 a 100 dos autos.
**
Factos não provados
Não resultou provado dos autos:
a) Que a aplicação informática pode, por si, praticar saltos na numeração – cfr. depoimento de António....
b) Que os saltos na numeração ocorrem quando se verifica uma transferência completa de mesa em conjugação com a opção “Não registar processos vazios” activa.
c) Que os saltos na numeração ocorrem quando se verifica um pagamento avançado com divisão múltipla de conta - cfr. depoimento de António....
d) Que os saltos na numeração ocorrem quando está activa a opção “Aloca mesas dinamicamente”.
e) Que a falta de linhas pode dever-se ao facto do registo ter sido anulado ou o pedido ter sido transferido para outra mesa - cfr. depoimento de António....
**
Motivação da decisão de facto
O Tribunal considerou provada a matéria de facto relevante para a decisão da causa com base na análise crítica e conjugada dos documentos juntos aos autos, que não foram impugnados, assim como, na parte dos factos alegados pelas partes que não tendo sido impugnados [cfr. artigo 74º da Lei Geral Tributária (LGT)], também são corroborados pelos documentos juntos, conforme predispõe o artigo 76º n.º 1 da LGT e artigo 362º e seguintes do Código Civil.
Quanto à prova testemunhal produzida em sede da diligência de inquirição de testemunhas levada a cabo, a formação da convicção do Tribunal acerca de cada facto baseou-se essencialmente numa apreciação livre (cfr. artigo 396º do Código Civil e artigo 607º n.º 5 do CPC), recorrendo, ainda o Tribunal, às regras da experiência comum.
Com efeito, foi a análise crítica e conjugada de todos meios de prova, que, à luz da experiência, sedimentaram a convicção do Tribunal.
Quanto aos factos alegados e não provados, o Tribunal relevou o depoimento prestado pelas testemunhas arroladas.
António..., técnico informático, exerce funções na empresa N…, Informática Lda. desde 1999/2000, empresa prestadora de serviços técnicos à Impugnante.
As suas funções junto da Impugnante cingem-se à reparação de avarias nos computadores e respectivo sistema informático.
Depôs aos factos presentes nos pontos 64º a 80º, 81º a 85º, 167º a 171º, 176º, 186º a 190º, 193º e 194º da petição inicial.
A testemunha depôs de forma séria e credível, tendo no entanto por vezes respondido genericamente, isto é, perante situações hipotéticas que se lhe foram sendo colocadas, respondeu o que eventualmente ocorreria, não demonstrando de alguma forma o ocorrido na Impugnante.
A..., gerente de hotelaria na Jovial e Dinâmico, Lda., foi funcionário da Impugnante de 2006 a 2009 como empregado de mesa e chefe de sala. Respondeu aos factos presentes nos pontos 36º, 37º, 40º, 44º a 54º, 70º, 81º a 83º, 186º a 190º, 193º, 194º, 207º a 232º e 244º da petição inicial.
Apesar das funções por este exercidas junto da Impugnante e ter respondido na generalidade de forma credível e séria, por vezes não testemunhou com o rigor e concretização que se impunha, chegando mesmo a titubear nas resposta a algumas questões.
António, técnico oficial de contas de profissão, foi TOC da Impugnante desde o início da actividade, tendo acompanhado o procedimento inspectivo realizado à Impugnante.
Respondeu aos factos presentes nos pontos 36º, 37º, 44º a 54º, 89º, 105º, 106º, 127º, 207 a 227º e 244º da petição inicial de forma séria e credível.
J..., desempregado, foi sócio e gerente da Impugnante na data dos factos em questão nos presentes autos.
Tem interesse directo na decisão que vier a ser proferida.
Respondeu aos factos ínsitos nos artigos 36º, 37º, 44º a 54º, 55º a 85º, 89º, 105º, 106º, 127º, 167º a 170º, 176º, 186º a 190º, 193º, 194º, 207º a 232º e 244º da petição inicial.
Nos termos do configurado pelo artigo 617º do CPC “estão impedidos de depor como testemunhas os que na causa possam depor como partes”
Neste sentido e conforme discorreu o STJ em Aresto de “5.5.1992:BMJ, 417.º- 626 “é inábil para depor como testemunha o sócio gerente, representante legal e o voluntário de uma sociedade comercial, em acção em que esta é parte”.
Com efeito, tais disposições resultam da falta de isenção que é expectável por quem é parte em qualquer acção judicial, atento o interesse na decisão do pleito.
Ora, no que respeita ao depoimento prestado por J..., a falta de isenção foi percepcionada e manifesta. Isto porque, a testemunha depôs de forma empolgada e emotiva, denotando-se muita ansiedade e inquietude.
Muitas das vezes não respondeu simplesmente ao que lhe era perguntado, falando incessantemente.
Impunha-se que a testemunha depusesse com o afastamento necessário a quem não é afectado pela decisão que viesse a ser proferida.
Como tal, considera o Tribunal que a testemunha não logrou testemunhar de forma isenta não podendo as suas declarações relevar para a decisão da causa».

4 – APRECIAÇÃO JURÍDICA

As causas de nulidade da sentença são taxativas. Nesse sentido, é firme a jurisprudência dos tribunais superiores - Ac. STJ, de 09/04/1992, BMJ, 416.º-558; Ac. STJ, de 23/03/2006, proc.º05B4325.dgsi.Net; Ac. STJ de 26/09/2012, proc.º 14127/08.7TDPRT.P1.S1; Ac. do STA, de 17/09/2015, proc.º0637/15.

Nos termos do n.º1 do art.º615.º do CPC, «É nula a sentença quando:
a) Não contenha a assinatura do juiz;
b) Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão;
c) Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível;
d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento;
e) O juiz condene em quantidade superior ou em objecto diverso do pedido».

Em processo judicial tributário, as nulidades da sentença são idênticas às previstas em processo civil, com o alcance que decorre da particularidade de o julgamento da matéria de facto se conter na sentença final (art.º123.º, n.º2, do CPPT), estatuindo o n.º1 do art.º125.º do CPPT que «Constituem causas de nulidade da sentença a falta de assinatura do juiz, a não especificação dos fundamentos de facto e de direito da decisão, a oposição dos fundamentos com a decisão, a falta de pronúncia sobre questões que o juiz deva apreciar ou a pronúncia sobre questões que não deva conhecer».

Os vícios determinantes da nulidade da sentença correspondem a casos de irregularidades que afectam formalmente a sentença e provocam dúvidas sobre a sua autenticidade, como é a falta de assinatura do juiz, ou ininteligibilidade do discurso decisório por ausência total de explicação da razão por que decide de determinada maneira (falta de fundamentação), quer porque essa explicação conduz, logicamente, a resultado oposto do adoptado (contradição entre os fundamentos e a decisão), ou o uso ilegítimo do poder jurisdicional em virtude de pretender conhecer questões de que não podia conhecer (excesso de pronúncia) ou não tratar de questões de que deveria conhecer (omissão de pronúncia).

São, sempre, vícios que encerram um desvalor que excede o erro de julgamento e que, por isso, inutilizam o julgado na parte afectada.

Nos termos do citado n.º1 do art.º125.º do CPPT, a sentença é nula, além do mais, quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão e quando os fundamentos estejam em oposição com a decisão.

Como refere José António Valente Torrão, “Código de Procedimento e de Processo Tributário – Anotado e Comentado”, Almedina, 2005, a págs.552, «A nulidade…da falta de especificação dos fundamentos de facto e de direito, reporta-se aos casos em que, sendo essencial à decisão a discriminação dos factos provados e não provados, a sentença os não discrimine, bem como aos casos em que sejam dados como provados factos sem a necessária justificação, isto é, sem o exame crítico das provas.
Com efeito, a exigência do exame crítico das provas resulta até do princípio da livre apreciação da prova consagrado no art.º655.º, n.º1 do CPC. Se é deixado ao juiz a faculdade de apreciar livremente a prova, exige-se-lhe, todavia, que fundamente as razões pelas quais decidiu naquele sentido e não noutro, a fim de os interessados poderem optar entre a conformação com a decisão ou o recurso judicial da mesma».

Aponta a Recorrente à sentença nulidade por falta absoluta de fundamentação quanto aos factos provados e dados como não provados, nomeadamente, por falta de apreciação crítica da prova.

Não vemos que a sentença tenha incorrido em tal vício. Com efeito, quanto aos factos provados é sempre indicada a fonte da prova, o particular documento que sustenta o facto (pontos 1 a 15 e 18 a 21); no ponto 16, é transcrita, por extracto, a factualidade vertida no relatório de inspecção tributária entendida como relevante para apreciação das questões controvertidas; no ponto 17, deixou-se consignado: «Faz parte integrante do relatório elaborado pelos SIT em 25.11.2009, o anexo I constituída por tabela elaborada em excel – cfr. fls. 68 do PA junto aos autos e que aqui se dá por integralmente reproduzido» - anexo esse a que o próprio relatório, na parte transcrita na sentença, faz alusão em termos que permitem apreender o seu conteúdo (cf. ponto 16, pág.456 dos autos).

Quanto aos factos alegados dados como «não provados», é indicada a testemunha António... como aquela a cujo depoimento o tribunal conferiu credibilidade para julgar os pontos de facto em causa, explicando-se depois na «motivação da decisão», as razões por que a convicção se formou com base no depoimento daquela testemunha e naquele sentido e não noutro.

Como se vê, a sentença não deixou de discriminar os factos provados e não provados que entendeu pertinentes à matéria controvertida, observando o disposto no art.º123.º, n.º2 do CPPT e 607.º, n.º3 e 4 do CPC, nem de indicar a fonte da prova ou os motivos por que atribuiu credibilidade ao depoimento de umas testemunhas e não ao de outras e por que decidiu num sentido e não noutro.

Como refere Jorge Lopes de Sousa, “Código de Procedimento e de Processo Tributário – Anotado”, Vislis, 4.ª ed. (2003), a pág.561, o exame crítico das provas a que se refere o n.º3 do art.º659.º do CPC (corresponde ao actual 607.º, n.º4), «…consubstancia-se no esclarecimento dos elementos probatórios que levaram o tribunal a decidir a matéria de facto como decidiu e não de outra forma e, no caso de elementos que apontem em sentidos divergentes, as razões por que foi dada prevalência a uns sobre os outros».

Ora, a Recorrente não indica que existam nos autos elementos de prova reportados ao mesmo facto, dado como provado ou «não provado», que apontem em sentido divergente, impondo-se à sentença esclarecer as razões por que deu prevalência a uns em detrimento de outros na formação da sua convicção.

Concluímos, pois, que não se verifica no caso em apreço, nulidade da sentença por falta de especificação dos fundamentos de facto.

Quanto à invocada nulidade da sentença por oposição dos fundamentos com a decisão, ela «…apenas ocorre quando os fundamentos invocados na decisão deveriam conduzir, num processo lógico, à solução oposta da que foi adoptada na decisão.
Não ocorre esta nulidade quando a contradição for não entre os fundamentos e a decisão mas entre os fundamentos de facto da decisão, quando se tenham dado como assentes factos incompatíveis» - vd. Jorge Lopes de Sousa, ob. cit., a pág.564.

Também a jurisprudência tem entendido que só releva para efeitos desta nulidade a contradição entre a decisão e os respectivos fundamentos e não eventuais contradições entre fundamentos de uma mesma decisão, por um lado, ou contradição entre decisões, fundamentadas ou não, por outro (vd. Ac. do STA de 06/02/07, recurso n.º 322/06).

E como salienta A. Ferreira, “Manual de Recursos em Processo Civil”, 9ª edição, a pág.56, a contradição entre os fundamentos e a decisão prevista na alínea c) do nº 1 do art.º668º [corresponde ao actual art.º615.º], verifica-se quando «a construção da sentença é viciosa, uma vez que os fundamentos referidos pelo Juiz conduziriam necessariamente a uma decisão de sentido oposto ou, pelo menos, de sentido diferente» (sublinhado nosso).

A decisão do tribunal a quo de desconsiderar o depoimento de uma testemunha e de considerar credível o depoimento de outras sem esclarecer em que medida os depoimentos por si considerados «se conjugam com a decisão de dar como não provados os factos vertidos nos pontos a) a e) dos factos não provados» (vd. Conclusão xlix), não constitui vício da sentença que a lei fulmine de nulidade nos termos da alínea c) do n.º1 do art.º615.º do CPC (oposição entre os fundamentos e a decisão), uma vez que o que está verdadeiramente em causa é a apreciação crítica da prova, cuja omissão, a verificar-se, inquinaria a sentença de nulidade por falta de fundamentação, subsumível na alínea b) do n.º1 do art.º615.º do CPC.

No entanto e como já vimos, tal vício, também invocado pela Recorrente, não ocorre na sentença, porquanto a Recorrente não alega que hajam documentos e/ou depoimentos contraditórios sobre os mesmos factos julgados «provados» ou «não provados», a impor ao tribunal a explicação ou esclarecimento das razões por que deu prevalência a umas fontes de prova em detrimento de outras na formação da sua convicção.

Se bem interpretamos a posição da Recorrente, nos vários segmentos das conclusões do recurso em que invoca nulidade da sentença por falta de fundamentação e oposição dos fundamentos com a decisão, é que não concorda com a matéria de facto fixada pelo tribunal a quo, pretendendo que os depoimentos testemunhais sejam valorados, ou valorados diferentemente do que o foram pelo tribunal recorrido.

No entanto e, como vimos, a Mma. juíz a quo enunciou quais os meios de prova (depoimentos testemunhais e documentos) que concorreram para a formação da sua convicção e as razões por que a sua convicção acerca dos factos controvertidos se formou em determinado sentido e não noutro.

Assim, o caminho processual certo para discordar da matéria de facto fixada em 1.ª instância, não é o da arguição de nulidade da sentença, seja por falta de fundamentação, seja por contradição dos fundamentos com a decisão (art.º615.º, n.º1, alíneas b) e c), do CPC), mas sim a impugnação da matéria de facto nos termos previstos no art.º640.º do CPC, possibilitando ao tribunal ad quem a alteração da matéria de facto fixada, no respeito pelo princípio da livre apreciação da prova atribuído ao tribunal de 1.ª instância, nos casos de manifesto erro na apreciação da prova e patente desconformidade entre os elementos probatórios disponíveis e a decisão de facto do tribunal recorrido, ou, quando tenha afrontado ou ignorado as mais elementares regras da experiência e feito apreciação arbitrária das provas, ou, se se mostra inadmissível e sem critério racional a atribuição de credibilidade a uns depoimentos e a não atribuição de credibilidade a outros, face às regras da experiência comum.

Improcede a arguida nulidade da sentença por contradição dos fundamentos com a decisão.

Passando à também invocada nulidade da sentença por omissão de pronúncia, prevista na alínea d) do n.º1 do art.º615.º, do CPC, vejamos.

Ocorre nulidade da sentença por omissão de pronúncia quando o juiz não toma posição sobre questão colocada pelas partes, não emite decisão no sentido de não poder dela tomar conhecimento, nem indica razões para justificar essa abstenção de conhecimento, e da sentença também não resulta, de forma expressa ou implícita, que esse conhecimento tenha ficado prejudicado em face da solução dada ao litígio, não se verificando, porém, tal nulidade, se o juiz evoca razões para justificar a abstenção de conhecimento de questão que lhe foi colocada – vd. Ac. do STA, de 07/11/2012, tirado no proc.º01109/12 e, no mesmo sentido, Jorge Lopes de Sousa, ob. cit., págs.565/566.

Esta nulidade está directamente relacionada com o preceituado no n.º2 do art.º608.º do CPC, segundo a qual, «O juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras; não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras».

Como se assinala no Ac. do STJ, de 29/11/2005, tirado no proc.º 05S2137, «As questões não se confundem com os argumentos, as razões e motivações produzidas pelas partes para fazer valer as suas pretensões. Questões, para efeito do disposto no n.º 2 do art.º 660.º do CPC [corresponde ao actual 608.º], não são aqueles argumentos e razões, mas sim e apenas as questões de fundo, isto é, as que integram matéria decisória, os pontos de facto ou de direito relevantes no quadro do litígio, ou seja, os concernentes ao pedido, à causa de pedir e às excepções».

No caso em apreço, conclui a Recorrente (Conclusões cxxix a cxxxv), invocou excesso de quantificação da matéria tributável, nomeadamente por desconsideração de perdas e desperdícios ocorridos no exercício da sua actividade de restauração, matéria sobre que produziu prova, que o tribunal a quo não apreciou nem valorou, nem seleccionou para o probatório.

Ora, como se alcança do seu ponto 2.3 (fls.487), a sentença não deixou de dar pronúncia expressa sobre o invocado excesso de quantificação da matéria tributável assente na desconsideração de quebras e na aplicação de rácios sectoriais (que é a questão processual), mas para concluir que «tais factores somente teriam de ser considerados se os SIT tivessem utilizado um qualquer outro critério que não o dos documentos e linhas eliminados». Concordantemente, não avaliou as provas que poderiam ter sido apreciadas a tal respeito.

Como assinala Jorge Lopes de Sousa, ob. cit., a pág.566, «Relativamente à matéria de facto, o juiz não tem o dever de pronúncia sobre toda a matéria alegada, tendo antes o dever de seleccionar apenas a que interessa para a decisão e referir se a considera provada ou não provada».

Se o tribunal a quo, no pressuposto entendimento da sua irrelevância para a apreciação da causa, não seleccionou para o probatório matéria factual que a Recorrente entende dever dele constar, esse entendimento do tribunal recorrido poderá constituir eventual erro de julgamento, a sindicar nessa sede, mas não inquina a sentença de nulidade por omissão de pronúncia.

Improcede também a arguida nulidade da sentença por omissão de pronúncia.

Invoca depois a Recorrente erro de julgamento de facto. A seu ver, os pontos de facto julgados «não provados» deveriam ser considerados provados.

E assim não sucedeu, desde logo, alega, porque não foi apreciado o conteúdo do depoimento de J....

Antes de mais convém assinalar que da «motivação de facto» da sentença, não resulta que tenha julgado inábil para depor a testemunha J....

É verdade que a sentença refere jurisprudência do STJ na qual se doutrina que “é inábil para depor como testemunha o sócio gerente, representante legal e o voluntário de uma sociedade comercial, em acção em que esta seja parte”.

No entanto, como se sabe, embora a sentença não o tenha deixado vincado, no tocante ao momento relevante para aferir da inabilidade ou não para se depor como testemunha, a jurisprudência é unânime no sentido de que o impedimento previsto no art.º496ºdo CPC [«Estão impedidos de depor como testemunhas os que na causa possam depor como partes»] se reporta ao momento da inquirição de quem vai depor.

No caso vertente, no momento em que começou a depor, a testemunha não se identificou como sócio gerente da sociedade impugnante, identificou-se como desempregado, tendo sido sócio e gerente da sociedade impugnante.

Ora, nestas circunstâncias, bem andou a sentença em admitir a testemunha a depor, pois como refere Alberto dos Reis, “ CPC Anotado”, IV Vol., pág. 348, o princípio geral deve ser o de que todas as pessoas devem ser admitidas a depor a fim de, com o seu depoimento, auxiliarem na descoberta da verdade.

No entanto, uma pessoa pode não ser inábil para depor como testemunha e ter interesse directo na causa e esse é um elemento a que o juiz atenderá naturalmente para avaliar a força probatória do seu depoimento.

No caso dos autos, a sentença não atribuiu credibilidade ao depoimento de J... no entendimento expresso de que não depôs de forma isenta, nem com o afastamento necessário a quem não é afectado pela decisão que viesse a ser proferida, não respondendo o mais das vezes ao que era perguntado, falando incessantemente.

Todavia, para concluir pela falta de credibilidade do depoimento da testemunha, o tribunal tinha de entrar na apreciação do seu conteúdo, da sua materialidade como sinaliza a Recorrente. De facto, um depoimento contraditório com todos os demais pode não merecer ao tribunal credibilidade, atendendo ao interesse da testemunha no desfecho do processo ou ao estado de exaltação em que se encontrava no momento em que o prestou e que só a imediação na produção da prova permite percepcionar, mas um depoimento concordante ou que com razoável consistência comprove, corrobore ou enfatize a versão das demais testemunhas, às quais o tribunal atribuiu credibilidade, ainda que prestado em estado de exaltação, à face das regras da experiencia comum, carece de explicação para ser desconsiderado em bloco.

Significa isso que o tribunal a quo não podia julgar irrelevante o depoimento de J... unicamente assente na circunstância de a testemunha ter interesse directo na causa e ter sido prestado em estado de exaltação, prescindindo da análise do conteúdo desse depoimento, impondo-se agora ao tribunal ad quem valorar essa fonte de prova testemunhal na apreciação do apontado erro de julgamento quanto aos pontos de facto dados como «não provados» na sentença.

Pretende a Recorrente que deveriam integrar a matéria provada, os seguintes factos, que a sentença considerou «não provados» (Conclusão lxxvi):

«a) Que a aplicação informática pode, por si, praticar saltos de numeração;
b) Que os saltos na numeração ocorrem quando se verifica uma transferência completa de mesa em conjugação com a opção “Não registar processos vazios” activa.
c) Que os saltos na numeração ocorrem quando se verifica um pagamento avançado com divisão múltipla de conta;
d) Que os saltos na numeração ocorrem quando está activa a opção “aloca dinamicamente”;
e) Que a falta de linhas pode dever-se ao facto do registo ter sido anulado ou o pedido ter sido transferido para outra mesa».

A análise conjugada de toda a prova, com destaque para a testemunhal nos segmentos assinalados pela Recorrente, permite extrair a seguinte factualidade:
1. Na aplicação informática em uso no estabelecimento da impugnante nos anos de 2006 a 2008 podiam ocorrer saltos de numeração se a opção “Não registar processos vazios” estivesse activa;
2. Podiam originar saltos de numeração as seguintes ocorrências: transferência completa de mesa; quando accionada a funcionalidade “aloca mesa dinamicamente”; havendo divisão múltipla de conta;
3. O motivo que originou o salto de numeração não é identificável se a opção “Não registar processos vazios” estiver activa;
4. Estando inactiva a opção “Não registar processos vazios”, não ocorrem saltos de numeração na aplicação, o processo anulado fica a zero mas não desaparece do sistema.

Sobre a matéria em causa revelou-se fulcral o depoimento seguro de António..., técnico informático da “N… informática, Lda.”, empresa revendedora da aplicação informática em uso no estabelecimento da impugnante. Do seu depoimento, resulta evidenciado que no caso de transferência de mesa, a mesa de destino dá origem a um novo processo, ficando a zero o processo da abertura da mesa; que pode ocorrer salto no processo se activada a funcionalidade “Aloca mesa dinamicamente”; na divisão de conta, o processo da mesa de origem fica a zero. Se a opção “Não registar processo vazio” estiver activada o sistema não regista processos a zero, originando saltos de numeração. Menos assertivo se revelou o depoimento de A..., então empregado de mesa e chefe de sala do estabelecimento da impugnante, mas permitiu compreender que se um cliente pedia uma bebida ao balcão e esperava, se registava a venda numa mesa, a 49 ou a 50 e depois transferia-se para a mesa onde o cliente se ia sentar. J..., no seu depoimento, nada acrescentou de novo e a propósito, apenas que em mês e meio era impossível não haver na aplicação falhas na numeração.

Outrossim, pretende a Recorrente que não foram seleccionados para o probatório factos, alegados e provados, que necessariamente levariam à conclusão de que não houve omissão de compras à contabilidade, como não foram levados ao probatórios factos, também alegados e provados, que permitiriam concluir pelo excesso de quantificação.
No que respeita ao primeiro ponto, resulta do depoimento de A… que ele ou o J… é que iam ao “R... Cash & Carry, S.A.”, um estabelecimento grossista onde para comprar é necessário ter número de cliente, buscar coisas, normalmente coisas pequenas e que já sucedera lá entrar e deparar com a ficha de cliente aberta, sendo ele o primeiro que lá ia nesse dia. Como então se processavam as coisas no “R...”? Respondeu, fechava a ficha e abria novamente. Mais disse que no estabelecimento da impugnante não vendiam nem cachaça nem limas. O seu depoimento é corroborado pelo de J…. A…, técnico oficial de contas da impugnante, diz que frequentava o estabelecimento da impugnante e confirma que nele não serviam caipirinhas e que o “R...” já não tinha registos que permitissem identificar quem utilizou a ficha de ciente da impugnante para fazer as compras registadas em seu nome.

Dos depoimentos prestados pode extrair-se a seguinte factualidade:
1. O R... Cash & Carry é um estabelecimento grossista onde para comprar é necessário ter ficha de cliente.
2. Nas deslocações ao “R... Cash & Carry” sucedeu por vezes ao funcionário da impugnante deparar-se com a ficha de cliente aberta, sendo ele o primeiro a lá se deslocar naquele dia para fazer compras destinadas à impugnante».

Quanto ao segundo ponto, o depoimento das testemunhas é concordante no sentido de que na actividade da impugnante ocorrem desperdícios, «artigos perecíveis que não sendo consumidos terão que ser destruídos», autoconsumos, «a impugnante teria uns 13 a 15 trabalhadores», ofertas «oferta de um licor no final da refeição» (que as testemunhas referem ser o Frangélico) e quebras (cf. depoimento de António Amaro Areias).

Reapreciada a prova dos autos, impõe-se a alteração da decisão de facto, quer quanto à matéria provada, quer «não provada».

Assim, com pertinência para a matéria controvertida dos autos, aditam-se ao probatório os seguintes factos:

22. Na aplicação informática em uso no estabelecimento da impugnante nos anos de 2006 a 2008 podiam ocorrer saltos de numeração se a opção “Não registar processos vazios” estivesse activa;
23. Podiam originar saltos de numeração as seguintes ocorrências: transferência completa de mesa; quando accionada a funcionalidade “aloca mesa dinamicamente”; havendo divisão múltipla de conta;
24. O motivo que originou o salto de numeração não é identificável se a opção “Não registar processos vazios” estiver activa;
25. Estando inactiva a opção “Não registar processos vazios”, não ocorrem saltos de numeração na aplicação, o processo anulado fica a zero mas não desaparece do sistema.
26. O R... Cash & Carry é um estabelecimento grossista onde para comprar é necessário ter ficha de cliente.
27. Nas deslocações ao “R... Cash & Carry” sucedeu por vezes ao funcionário da impugnante deparar-se com a ficha de cliente aberta, sendo ele o primeiro a lá se deslocar naquele dia para fazer compras destinadas à impugnante.
28. Na actividade da impugnante ocorrem desperdícios, autoconsumos e quebras e é comum ofertar a clientes um licor no fim da refeição.

Suprimem-se os pontos a) a e) dos factos «não provados».

Estabilizado o probatório, avancemos para as demais questões do recurso.

Como flui do probatório e decorre dos autos, a impugnante foi sujeita a uma acção inspectiva, de âmbito parcial, abrangendo o IVA e o IRC e visando os exercícios de 2006, 2007 e 2008, de que resultaram correcções à matéria tributável, quer meramente aritméticas, quer com recurso a métodos indirectos.

Entende a Recorrente que a factualidade descrita pela Administração tributária não justifica o descrédito da sua declaração e contabilidade, nem suporta as correcções levadas a efeito, quer as meramente aritméticas, quer com recurso a métodos indirectos, o que ficou evidenciado com a prova produzida nos autos, quer a documental, quer a testemunhal, que a sentença não apreciou, nem valorou devidamente e, em todo o caso, sempre dessa prova resulta manifesto o excesso de quantificação da matéria tributável por métodos indirectos.

Nos termos do disposto no n.º1 do art.º75.º da Lei Geral Tributária, «Presumem-se verdadeiras e de boa fé as declarações dos contribuintes apresentadas nos termos previstos na lei, bem como os dados e apuramentos inscritos na sua contabilidade ou escrita, quando estas estiverem organizadas de acordo com a legislação comercial e fiscal».

De acordo com o seu n.º2, cessa a presunção de veracidade, nomeadamente e entre o mais, nos termos da sua alínea a), quando «As declarações, contabilidade ou escrita revelarem omissões, erros, inexactidões ou indícios fundados de que não reflectem ou impeçam o conhecimento da matéria tributável real do sujeito passivo».

Verificando-se tal situação, cujos pressupostos compete à AT demonstrar nos termos gerais de direito face à presunção legal de veracidade dos dados declarativos e de contabilidade (art.º74., n.º1 da LGT e 350.º, n.º1 do Código Civil), fica a AT legitimada a corrigir os elementos declarativos e de contabilidade ou escrita do sujeito passivo.

Assente que se verificam, na declaração e contabilidade, omissões, erros, inexactidões ou indícios fundados de que não reflectem ou impeçam o conhecimento da matéria tributável real do sujeito passivo, a este, posto desprovido do escudo protector da presunção legal, não resta senão demonstrar que a Administração actuou em desconformidade com a lei, reintegrando a verdade da sua declaração e dos seus elementos contabilísticos que a suportam, destarte posta em crise, face àqueles “fundados indícios” [vd. art.º74.º, n.º1 da LGT e 341.º e 342.º, n.º1 do Código Civil e Ac. do STA (Pleno do CT), de 07/05/2003, tirado no proc.º01026/02].

Questão diversa, prende-se com a escolha do método correctivo. Nos termos do disposto no n.º1 do art.º81.º da LGT, «A matéria tributável é avaliada ou calculada directamente segundo os critérios próprios de cada tributo, só podendo a administração tributária proceder a avaliação indirecta nos casos e condições expressamente previstos na lei», dispondo o n.º1 do art.º85.º da mesma lei, que «A avaliação indirecta é subsidiária da avaliação directa».

«A tributação por métodos indirectos não só não constitui o meio normal, como a possibilidade do seu uso está restringida aos casos em que a lei expressamente a admite, verificados que estejam determinados pressupostos» – vd. Ac. do STA, de 19/03/2009, tirado no proc.º0890/08.

As correcções devem, por conseguinte e face ao carácter subsidiário da avaliação indirecta, ter lugar com base na contabilidade, salvo quando não seja possível a comprovação e a quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à determinação da matéria colectável (art.º87.º, alínea b) da LGT).

E como decorre do art.º88.º da LGT, expressamente aplicável ao IRC por força do art.º52.º do respectivo Código tributário, essa impossibilidade de determinação directa e exacta da matéria tributável para efeitos de aplicação de métodos indirectos, referida na alínea b) do art.º87.º, pode resultar das seguintes anomalias e incorrecções, quando inviabilizem o apuramento da matéria tributável:
«a) Inexistência ou insuficiência de elementos de contabilidade ou declaração, falta ou atraso de escrituração dos livros e registos ou irregularidades na sua organização ou execução quando não supridas no prazo legal, mesmo quando a ausência desses elementos se deva a razões acidentais;

b) Recusa de exibição da contabilidade e demais documentos legalmente exigidos, bem como a sua ocultação, destruição, inutilização, falsificação ou viciação;

c) Existência de diversas contabilidades ou grupos de livros com o propósito de simulação da realidade perante a administração tributária e erros e inexactidões na contabilidade das operações não supridos no prazo legal.

d) Existência de manifesta discrepância entre o valor declarado e o valor de mercado de bens ou serviços, bem como de factos concretamente identificados através dos quais seja patenteada uma capacidade contributiva significativamente maior do que a declarada».

O ocorrendo uma das situações enunciadas, a AT fica legitimada a recorrer à avaliação indirecta na determinação da matéria tributável, cabendo então ao sujeito passivo demonstrar que a escolha desse método de avaliação não se justifica e que a AT errou no juízo normativo extraído dos factos que coligiu, podendo a matéria colectável do imposto ser determinada por via directa, com base na contabilidade.

Ou, não pondo em causa o método correctivo, pode o sujeito passivo por em causa a escolha do método de quantificação, demonstrando que no seu caso tal conduziu a um manifesto e patente erro ou excesso de quantificação (art.º74.º, n.º3 da LGT).

Como pertinentemente se deixou consignado no Ac. do STA, de 17/03/2010, proferido no proc.º01211/09, aliás em linha com jurisprudência há muito consolidada daquele alto tribunal, «Em caso de determinação da matéria tributável por métodos indirectos, compete à administração tributária o ónus da prova da verificação dos pressupostos da sua aplicação, cabendo ao sujeito passivo o ónus da prova do excesso na respectiva quantificação (artigo 74.º, n.º 3 da LGT).
Persistindo a situação de "non liquet" quanto ao excesso na quantificação a que chegou a Administração tributária, a dúvida terá de ser decidida em desfavor da recorrente, que não logrou provar a existência de tal excesso, nem se afigura evidente para este Tribunal que o alegado excesso na quantificação resulte das regras da experiência comum ou que seja manifesto, notório ou ostensivo».

Regressando aos autos, como decorre do RIT transcrito no ponto 16 da sentença, as correcções à matéria tributável resultaram da constatação, pela inspecção tributária, da existência, destacadamente, das seguintes situações:
i) Divergência entre o valor de facturação apurado com base nos ficheiros com registo de facturação apreendidos pela Polícia Judiciária e facultado à Inspecção Tributária (171.956,00€, IVA incluído) e o valor declarado pelo sujeito passivo com referência ao período de 01/04/2006 a 14/05/2006 (77.373,68€, IVA incluído);
ii) Irregularidades detectadas nos registos informáticos de facturação, referindo a AT falhas na numeração sequencial dos documentos, com eliminação de linhas no programa informático de facturação;
iii) Divergências obtidas no controlo quantitativo dos artigos, referindo a AT que «Foi efectuada a análise quantitativa a alguns artigos vendidos através da comparação entre os seus consumos, obtidos com base nas compras realizadas (Anexo 4) e nas existências constantes dos inventários (Anexo 5 e 6), e as respectivas vendas resultantes dos registo informáticos (Anexo 7)», tendo apurado, nomeadamente e entre o mais, que: «…o sujeito passivo consumiu 381,10 litros de whiskies, licores, brandies e outras bebidas brancas enquanto as vendas registadas são de apenas 69,30 litros, o que determina uma omissão de 81,82%; relativamente ao café Confezzioni Extra Strong, consumiu o equivalente a 34650 doses enquanto os seus registos informáticos têm presente a venda de 22885 doses, donde resulta uma omissão de 33,95%; o sujeito passivo consumiu 8787 unidades de gelados individuais tendo o registo informático de 3741 unidades vendidas, o que determina uma omissão de 57,43%; o sujeito passivo consumiu 4500 litros de cerveja em barril enquanto que o registo de vendas de cerveja à pressão se situa nos 1872,10 litros, donde resulta uma omissão de 58,40%; o sujeito passivo consumiu 5880 garrafas de Ice Tea Lipton e 7608 garrafas de Pepsi tendo registado vendas de 2680 e 3255 garrafas, respectivamente. Sendo assim, a omissão neste tipo de artigos será de 54,42% no caso do Ice Tea Lipton e de 57,22% no caso da Pepsi; relativamente à água sem gás, para a qual não se fez distinção entre as garrafas de Litro e as de 1,5 litro, apurou-se um consumo de 18372 garrafas no total, consumo esse que confrontado com o registo de 7303 garrafas vendidas determina uma omissão de 60,25% neste produto».
iv) Inventário de existências empolado para justificar a omissão de vendas, exemplificando a AT com o “Licor Frangélico” e o ”Magnum Moments”;
v) Saldos de caixa elevados, não reflectindo a realidade económica e financeira da empresa.

Da prova produzida pela impugnante nada resultou de convincente que comprometa ou sequer ponha em dúvida os pressupostos factuais em que assentaram as correcções levadas a efeito.

Na verdade, a impugnante limita-se a demonstrar que no sistema informático de facturação que utiliza podem ocorrer saltos de linha sem que tal corresponda necessariamente a omissão de vendas ou de facturação. No entanto, como resultou inequívoco do depoimento das testemunhas por si arroladas e, nomeadamente, do depoimento de António..., que revende e instala a aplicação informática em Portugal e que se revelou especialmente conhecedor do funcionamento e funcionalidades da aplicação, os saltos de linha só são susceptíveis de ocorrer quando está activa a função “Não registar processos vazios”. Não estando activa essa função, não ocorrem na aplicação saltos de numeração, “fica registado no processo a anulação, a transferência fica no processo”, como diz, acrescentando que estando activa a função “Não registar processos vazios” não dá para distinguir a natureza das razões que estarão na origem dos saltos de numeração (mudança de mesa, divisão múltipla de conta, aloca mesas dinamicamente); não estando activa a função “Não registar processos vazios”, ocorrendo uma dessas situações, a aplicação coloca o processo anulado a zero, mas não causa saltos de numeração; se há transferência de mesa, a mesa de origem fica a zero e à mesa de destino passa a corresponder um novo processo. Perguntado porque estaria a função “Não registar processos vazios” activada? Respondeu que não sabe.

E nenhuma das outras testemunhas que prestaram depoimento esclareceu por que estaria activada na aplicação de facturação instalada no estabelecimento da impugnante a função “Não registar processos vazios”.

Como está bem de ver, não pode a impugnante pretender reintegrar a credibilidade e verosimilhança da sua declaração e contabilidade unicamente demonstrando que a aplicação pode, em abstracto, gerar erros (saltos de numeração) sem que tal corresponda a omissão de facturação, quando tinha optado por activar a função “Não registar processos vazios”, bem sabendo que estando activada essa função não é possível escrutinar a origem concreta dos saltos de numeração, para mais no contexto que a AT refere da existência de uma quantidade anormalmente alta de registos sem valor e de várias falhas na sequência numérica do ID dos documentos, destacando ser estranho que «…em cerca de 344 dias do total de 812 analisados, 50% dos registos efectuados estejam em falta nos ficheiros de facturação, pelo que haverá outra razão pra aquelas falhas de registo…», e «Atente-se no dia 2006/07/30, em que o 1.º registo tem o n.º212234 e o último o n.º212400, pelo que o n.º de registos que deferiam estar presentes seria de 167, no entanto, temos como emitidos apenas 31 documentos de venda».

Ora, num juízo de normalidade, que outro o tribunal não pode fazer, há que conceder que resulta estranho que a aplicação informática possa gerar saltos de linha em tão grande número e percentagem, como se fosse normal num estabelecimento de restauração os clientes mudarem constantemente de mesa, dividirem a conta, pedirem primeiro ao balcão e depois sentarem-se (opção aloca mesa dinamicamente), situações que podem em abstracto estar na origem dos saltos de numeração.

Mas ponto é que a impugnante não conseguiu fazer prova da concreta situação que está na origem dos saltos de numeração identificados pela AT na aplicação e, sobretudo, que era aquilo que decisivamente importava em termos probatórios, demonstrar que os saltos de linha identificados pela AT não correspondiam a qualquer viciação ou omissão de facturação mas sim a outro tipo de evento que não dava origem a facturação.

A este respeito, cumpre salientar que a impugnante não cumpriu as obrigações contabilísticas impostas pelo art.º115.º, n.ºs 1, 3 e 6, do Código do IRC e não apresentou ficheiros de facturação que cumpram os requisitos impostos pelo n.º2 do art.º5.º do DL n.º198/90, de 19 de Junho, possibilitando à AT o controlo dos factos tributários [«Os sujeitos passivos do IVA que processem facturas ou outros documentos fiscalmente relevantes através de sistemas informáticos devem assegurar a respectiva integridade operacional, a integridade da informação arquivada electronicamente e a disponibilidade da documentação técnica relevante»].

E como dispõem os n.ºs 3 e 4 daquele preceito,
«3 - A integridade operacional do sistema deve, no mínimo, garantir:
a) A fiabilidade dos processos de recolha, tratamento e emissão de informação, através de:
i) Controlo do acesso às funções do sistema mediante adequada gestão de autorizações;
ii) Existência de funções de controlo de integridade, exactidão e fiabilidade da informação criada, recebida, processada ou emitida;
iii) Existência de funções de controlo para detecção de alterações directas ou anónimas à informação gerida ou utilizada no sistema;
iv) Preservação de toda a informação necessária à reconstituição e verificação da correcção do processamento de operações fiscalmente relevantes, total ou parcialmente suportadas pelo sistema;
b) A inexistência de funções ou programas, de qualquer proveniência, instalados no local ou remotamente com acesso ao sistema, que permitam alterar directamente a informação, fora dos procedimentos de controlo documentados para o sistema, sem gerar qualquer evidência rastreável agregada à informação original.

4 - Para efeitos do n.º 2, consideram-se condições de garantia da integridade da informação arquivada electronicamente para efeitos fiscais as seguintes:
a) O armazenamento seguro da informação durante o período legalmente estabelecido, através de:
i) Preservação da informação em condições de acessibilidade e legibilidade que permitam a sua utilização sem restrições, a todo o tempo;
ii) Existência de controlo de integridade da informação arquivada, impedindo a respectiva alteração, destruição ou inutilização;
iii) Abrangência da informação arquivada que seja necessária à completa e exaustiva reconstituição e verificação da fundamentação de todas as operações fiscalmente relevantes;
b) A acessibilidade e legibilidade pela administração tributária da informação arquivada, através da disponibilidade de:
i) Funções ou programas para acesso controlado à informação arquivada, independentemente dos sistemas informáticos e respectivas versões em uso no momento do arquivo;
ii) Funções ou programas permitindo a exportação de cópias exactas da informação arquivada para suportes ou equipamentos correntes no mercado;
iii) Documentação, apresentada sob forma legível, que permita a interpretação da informação arquivada».

Note-se, por outro lado, que a AT se não ficou pela constatação dos saltos de numeração na aplicação para por em causa a veracidade da declaração e contabilidade da impugnante, tendo ainda recolhido outros indicadores que, consistentemente, apontam para a omissão de vendas à contabilidade como as divergências encontradas no controlo quantitativo dos artigos e nos saldos elevados da conta Caixa, sobre que a impugnante nenhuma comprovada explicação avançou.

No que em particular respeita à adulteração dos inventários de existências, pretende a impugnante que ofertava o licor “Frangélico” a clientes no final da refeição mas o certo é que o sistema de facturação, apesar de comportar a opção “oferta” (vd. depoimento de J...), nada nela foi registada. E nessa medida, embora tenha resultado convincente o depoimento das testemunhas no sentido de que no final da refeição era ofertado o licor a clientes, fica por saber se a quantidade ofertada justifica as divergências apuradas no inventário deste artigo, porque está bem de ver que nem a todos os clientes a bebida seria ofertada, ou porque não gostavam, ou porque não estavam em idade de beber, etc..

Alega ainda a impugnante que vendia “Magnum Moments” conjuntamente com café, dois em um, mas valem aqui os considerandos do ponto anterior a propósito da falta de registo do artigo ofertado na correspondente opção de oferta e em todo o caso, note-se, estes são só dois dos exemplos encontrados pela AT para ilustrar as anomalias encontrada no stock de artigos inventariados.

Assim, não tendo a impugnante demonstrado que os factos descritos pela AT a partir dos quais concluiu pelo descrédito e falta de veracidade dos elementos declarativos e de contabilidade da impugnante, encontram outra justificação que não passa pela omissão de vendas à contabilidade ou sequer logrado lançar a dúvida sobre tais factos tributários, outro caminho não resta ao tribunal, senão o de validar a actuação correctiva da AT, como fizera a sentença recorrida.

Questão diversa da veracidade da declaração e contabilidade, prende-se com a escolha do método correctivo, devendo a correcção fazer-se com base na contabilidade ou, revelando-se tal inviável nos casos previstos na lei, por avaliação indirecta.

Como vimos, no caso em apreço, a AT constatada a falta de veracidade da declaração e contabilidade da impugnante, recorreu ao método de quantificação indirecta da matéria tributável, salvo quanto ao período inspeccionado compreendido entre 01/04/2006 e 14/05/2006. Este período de cerca de mês e meio foi objecto de avaliação directa, com base nos dados recolhidos do ficheiro de facturação da impugnante, apreendido pela Policia Judiciária na acção de busca à empresa fornecedora do programa, onde na altura se encontraria para manutenção, revisão e actualização do “software” (vd. RIT e depoimento do TOC, António) e que a AT considerou corresponderem a dados reais.

Refere a AT: «Como se pode ver, estes ficheiros, ao contrário dos ficheiros que serviram de base aos valores declarados pelo sujeito passivo à Administração Fiscal para o mesmo período (e que permitiram elaborar o mapa resumo que se apresenta no Anexo 2 deste relatório), encontram-se íntegros e sem quaisquer falhas na sequência numérica dos respectivos registos».

Pretende a impugnante que tais dados não são fidedignos, referindo J... no seu depoimento que um mês e meio sem falhas era impossível no seu estabelecimento ou em qualquer outro, pois as situações passíveis de gerar na aplicação saltos de numeração sempre ocorreriam.

Sucede que a AT, como vimos, refere que o ficheiro não apresenta falhas na sequência numérica dos respectivos registos, não diz que não hajam ficheiros a zero no período considerado, sendo certo que não estando activada a opção “Não registar processos vazios”, as situações as passíveis de originar saltos de numeração com aquela opção activa, originam um primeiro processo a zero e um segundo (ou outro) com a sua venda a dinheiro. Portanto, o argumento não colhe.

E sendo o método directo de avaliação aquele pelo qual o legislador manifesta clara preferência (art.º81.º, n.º1 e 85.º, n.º1, da LGT), impunha-se à AT dele lançar mão podendo o apuramento dos valores reais da matéria tributável fazer-se com base nos registos informáticos de facturação reportado àquele período temporal.

Como vimos acima, são excepcionais e obedecem a tipificação legal os casos em que é lícito à AT fixar a matéria tributável dos contribuintes por “avaliação indirecta”, afastando-se dos valores declarados, porque inexistentes ou fundamentadamente desmerecedores de confiança, recorrendo a outros elementos que permitem a determinação do valor tributável.
É o que sucede, designadamente, no caso previsto nos artigos 87.°, n.°1, alínea b) e 88.° alíneas a) e b) da LGT, justificantes dos actos praticados pela AT e objecto de impugnação nos presentes autos.

Tendo a avaliação indirecta carácter excepcional (cf. o n.º1 do artigo 81.º da LGT) e subsidiário em relação à avaliação directa (cf. o artigo 85.°, n.°1 da LGT), cabe à AT a demonstração da verificação dos pressupostos do recurso à avaliação indirecta da matéria tributável, cabendo ao sujeito passivo o ónus da prova do excesso na respectiva quantificação (artigo 74°, n.°3 da LGT).

No caso dos autos, os factos constantes do probatório fixado na sentença recorrida, designadamente os referidos no relatório de inspecção tributária aí parcialmente reproduzidos (vd. ponto 16 do probatório), concretamente e especificamente identificados, legitimam o recurso à avaliação indirecta da matéria tributável do sujeito passivo, como bem decidiu a sentença recorrida, pois os ficheiros de facturação não apresentam a fiabilidade necessária para neles se basear o apuramento da matéria tributável. Aliás, como está bem de ver, se os factos recolhidos pela AT indiciam a existência de operações à margem da contabilidade, a reconstituição da realidade tributária do sujeito passivo não pode fazer-se com base nessa mesma contabilidade.

Em face deste circunstancialismo, e atento ao disposto nos artigos 87°. n.º1 alínea b) e 88.° alíneas a) e b) da LGT, entende-se que era legítimo à ÀT o recurso a métodos indirectos de determinação da matéria tributável, designadamente para os aludidos anos e períodos de 2006, 2007 e 2008, cuja liquidação adicional está em causa nos presentes autos, encontrando-se formal e substancialmente fundamentado no relatório da inspecção o recurso a tais métodos de determinação da matéria tributável, como se alcança do seu ponto IV (transcrito na sentença), passando a recair sobre a impugnante o ónus da prova do excesso na respectiva quantificação, nos termos do art.º74.°, n.°3 da LGT.

Relativamente ao método adoptado pela AT para a determinação da matéria tributável, lembremos o que se deixou consignado no RIT e está transcrito na sentença recorrida:
«V - CRITÉRIOS DE CÁLCULO DOS VALORES CORRIGIDOS COM RECURSO A
MÉTODOS INDIRECTOS
V.1 - VENDAS/PRESTAÇÕES DE SERVIÇO OMITIDAS
De forma a podermos calcular o valor das prestações de serviço omitidas iremos proceder à estimação do valor global dos talões considerados em falta bem como, à estimação do valor das linhas de detalhe do documento que foram eliminadas.
V.1.1 - Estimação do valor global dos talões considerados em falta:
A cada um dos talões em falta iremos aplicar o valor mínimo do valor médio calculado para o Universo de documentos de venda emitidos. De referir que, como a mesa 50 integra outras mesas, apresenta alguns registos de valor total elevado o que influencia um valor médio superior ao normal pelo que para o seu cálculo foram retirados os documentos de venda associados a esta mesa virtual.
Atendendo a que a mesa 50 é uma mesa virtual, ela resulta da transferência de outras mesas reais pelo que, parte dos documentos considerados em falta terão sido facturados na mesa 50. Sendo assim, procedeu-se em cada período à dedução do valor declarado de prestações de serviço da mesa 50 ao valor determinado por aplicação do valor mínimo do Valor Médio ao nº estimado de talões em falta. (…)
V.1.2 – Estimação do valor global das linhas do documento que foram eliminadas:
A percentagem de prestação de serviços que terão sido omitidas pelo método da eliminação aleatória, determinada na parte final do ponto IV.1 deste relatório, foi aplicada ao valor global da prestações de serviços declaradas (com exclusão dos valores declarados relativamente à mesa virtual 50) tendo-se chegado aos seguintes valores de prestações de serviços omitidas por aquele método de manipulação de dados: (…)” - cfr. de inspecção tributária, a fls. 10 a 54 do PA junto aos autos que aqui se dá por integralmente reproduzido»..

Como lapidarmente se deixou consignado no Ac. do TCA Sul, de 18/10/2011, tirado no proc.º04335/10, «Sendo característico das situações apontadas por lei como de impossibilidade de avaliação directa da matéria tributável o aparecimento de dúvidas sobre a quantificação real, inerentes e consequentes da utilização de métodos indirectos, que, actuando indicadores, sempre e só podem alcançar um valor aproximado do que provavelmente a matéria tributável efectiva terá tido, só é viável e legalmente sustentável uma decisão no sentido da anulação do acto tributário impugnado, por alegado erro em sede de quantificação da matéria tributável, caso o impugnante, sem reticências ou necessários reparos, demonstre, comprove, a ocorrência de “erro ou manifesto excesso na matéria tributável quantificada”.
Assim, não aproveita ao impugnante uma actuação processual e, sobretudo, probatória, direccionada e orientada pelo, simplista e preguiçoso, objectivo de suscitar dúvida, ainda que fundada, sobre a quantificação do facto tributário. É imprescindível um desempenho pautado pela concreta e circunstanciada alegação de factos que, uma vez provados, sejam idóneos a comprovar, a demonstrar, com uma certeza adequada e passível de ampla aceitação, a aduzida errónea ou excessiva quantificação da matéria tributável».

Volvendo aos autos, antes de mais e a propósito, se diga que o n.°1, do art.º 90.° da LGT, não tem carácter taxativo e o método escolhido pela AT mostra-se racional e fundamentado em factos concretamente apurados assim como procurou ter em conta os dados conhecidos relativos à actividade da contribuinte nos anos inspeccionados.

Por outro lado, a impugnante não demonstrou quaisquer factos adequados a comprovar o alegado erro ou excesso de quantificação.

É certo que na sua actividade ocorrem desperdícios (artigos perecíveis), autoconsumos e quebras (perda de produto, caso da cerveja), como consistentemente referem as testemunhas, mas como a sentença recorrida assinala, tais perdas e quebras não são ponderáveis com o critério de quantificação elegido pela AT, sendo certo que a Recorrente também não esclarece porque o considera diferentemente.

Outrossim, pretenderia a impugnante que a AT entrasse em linha de conta na quantificação com os rácios do sector, nomeadamente, com a margem bruta de ganho da impugnante superior à sectorial. Mas esse é um indicador falacioso, que nada revela quanto ao volume dos fluxos reais subtraídos à contabilidade, sendo evidente que omitindo vendas o sujeito passivo congruentemente omitirá compras, de modo a manter a sua margem bruta concordante com a sectorial.

Por último, a capacidade do estabelecimento não é elemento que à AT caiba necessariamente averiguar na quantificação, sob pena de preterição do inquisitório e da verdade material. É a impugnante quem tem de demonstrar o evidente desacerto, no seu caso, da quantificação praticada e, nomeadamente, que o seu estabelecimento não tem capacidade (número de mesas), nem rotação diária nas mesas minimamente compatível com o volume presumido de facturação.

A circunstância de haverem outras mesas virtuais, que não a mesa 50, a única que a AT considerou na quantificação da matéria tributável, não permite afirmar estar-se perante um patente e grosseiro erro de quantificação, tanto mais que as testemunhas referem vagamente a existência de outras mesas virtuais, sem nunca referir exactamente quantas e se mais de uma era utilizada em cada dia, de modo a operacionalizar no sistema as divisões de conta de clientes.

Não logrando a impugnante provar a existência do excesso, nem se afigurando evidente para o tribunal que o alegado excesso na quantificação resulte das regras da experiência comum ou que seja manifesto, notório ou ostensivo, é de manter o “quantum” tributável fixado pela AT, improcedendo o recurso também por este último fundamento.

5 - DECISÃO

Por todo o exposto, acordam em conferência os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.
Custas a cargo da Recorrente.
Porto, 24 de Janeiro de 2017.
Ass. Vital Lopes
Ass. Cristina da Nova
Ass. Pedro Vergueiro