Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00217/14.0BEAVR
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:10/15/2015
Tribunal:TAF de Aveiro
Relator:Mário Rebelo
Descritores:NULIDADE DA SENTENÇA
INCONSTITUCIONALIDADE DO DESPACHO DE REVERSÃO
Sumário:1. A nulidade da sentença por falta de especificação dos fundamentos de facto abrange tanto a falta de discriminação dos factos provados e não provados, exigida pelo artigo 123º, nº 2 do CPPT, como a falta do exame crítico das provas previsto no artigo 659º/3 CPC (correspondente ao art. 607º, nº 4 do NCPC).
2. A fundamentação de facto exigida pelo CPPT reporta-se não só à indicação dos factos provados, mas também dos não provados.
3. No entanto, a discriminação dos factos não provados como a dos factos provados, só será necessária relativamente a factos que possam relevar para a apreciação da causa, segundo as várias soluções plausíveis de direito (art. 508º-A, n.º 1, alínea e) e 511 e 659 do CPC)
4. A fundamentação de facto da sentença não deve limitar-se à mera indicação dos meios de prova em que assentou o juízo probatório sobre cada facto, devendo revelar o itinerário cognoscitivo e valorativo seguido pelo juiz ao decidir como decidiu sobre todos os pontos da matéria de facto de modo a conhecer as razões por que se decidiu no sentido decidido e não noutro.
5. Embora o facto não conste (formalmente) da matéria de facto provada, ele foi considerado provado pela MMª juiz «a quo» na fundamentação da sentença, que o apreciou e dele retirou as respectivas consequências jurídicas.
6. Não foi utilizada a melhor técnica jurídica, mas uma vez que o facto foi assumido como provado e dele extraídas as consequências jurídicas, não podemos concluir estar perante uma nulidade por falta de especificação concreta de fundamento de facto.
7. Não são inconstitucionais, por violação do princípio da necessidade na restrição de um direito análogo a um direito fundamental, as normas legais que permitem a reversão da execução contra o devedor subsidiário, antes de excutido o património insuficiente do devedor originário.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:J...
Recorrido 1:Autoridade Tributária e Aduaneira
Decisão:Negado provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

J..., deduziu oposição contra a reversão da execução determinada por despacho do órgão de execução fiscal de Feira -2 que a MMª juiz do TAF de Aveiro julgou totalmente improcedente.

O Recorrente não se conformou com a decisão e dela interpôs o presente recurso.
Concluiu as alegações com as seguintes conclusões:

I – Nulidades da sentença, previstas no art. 125º nº 1 do CPPT e 615º nº 1 alíneas b) e c) do CPC, aplicável por força do disposto no art. 2.º, alínea e), do CPPT, pela falta de especificação concreta de fundamento de facto, bem como pela ambiguidade e obscuridade na indicação dos factos dados como provados e dos fundamentos da decisão

1ª – Não constando do elenco dos factos provados ou não provados, nem sendo claro se na sentença recorrida, se o facto principal referido no art. “5” da p.i., que é estrutural a toda a defesa do Oponente/Recorrente, o da pendência da impugnação judicial da liquidação que originou a dívida revertida, foi dado ou não como provado, e nessa circunstância considerado como pressuposto de facto e de direito.
E, aparentemente, por causa dessa omissão, não tendo sido analisado criticamente esse facto e essa prova, o que resulta em desfavor da defesa do Oponente/Recorrente, tal como adiante mais desenvolvidamente irá procurar demonstrar, quando se abordar a nulidade seguinte, relativa à omissão de pronúncia.
Ora, face a esta omissão de especificação, conjugada com uma obscura e insuficiente fundamentação, violadora do disposto no art. 205º nº 1 da CRP, bem como do art. 123º nº 2 do CPPT e 607º nº 4 do CPC, aplicável por força do disposto no art. 2.º, alínea e), do CPPT, não é possível ao Oponente/Recorrente aperceber-se e fiscalizar a actividade intelectual desenvolvida que conduziu à sentença produzida, bem como dela cabalmente recorrer, pelo que a mesma é nula, nos termos do art. 125º nº 1 do CPPT e 615º nº 1 alíneas b) e c) do CPC.

2ª – Acresce ainda, que quando na sentença recorrida se refere, transcrevendo...

“Assim, considera que a dívida não é certa, líquida e exigível, pelo que é inexequível por não ser ainda exigível e, além de mais, a devedora originária possui consideráveis bens móveis e imóveis e imóveis na sua propriedade o que não sustenta, no seu entender, a insuficiência de bens penhoráveis da devedora principal.”
Esta fundamentação revela-se ambígua e obscura, já que, de facto o Oponente/Recorrente, não disse na sua p.i. o que aqui se refere, nesta e noutras partes da sentença recorrida, mas sim que a dívida, no que se refere directamente ao Oponente/Recorrente, e não no que se reportaria à devedora principal, pelo facto da liquidação estar impugnada, por força desta incerteza do título invocado, conjugado com o facto da devedora principal possuir bens, jamais poderá fundadamente sustentar uma reversão contra os responsáveis subsidiários.
Deste modo, dado que esta questão também é estrutural a toda a defesa do Oponente/Recorrente, e, aparentemente, por causa deste erro nos pressupostos de facto e de direito, que emana da obscura e insuficiente fundamentação aqui referida, violadora do disposto no art. 205º nº 1 da CRP, bem como do art. 123º nº 2 do CPPT e 607º nº 4 do CPC, aplicável por força do disposto no art. 2.º, alínea e), do CPPT, não é possível ao Oponente/Recorrente aperceber-se e fiscalizar a actividade intelectual desenvolvida que conduziu à sentença produzida, bem como dela cabalmente recorrer, pelo que a mesma é nula, nos termos do art. 125º nº 1 do CPPT e 615º nº 1 alínea c) do CPC.


II – Nulidade da sentença, prevista nos artigos 125º do CPPT, 608º nº 2 e art. 615º nº 1 alínea d) do CPC, por omissão de pronúncia sobre questão que o tribunal se devia pronunciar


3ª–No presente recurso, ressalta uma questão, que pela sua natureza é prévia, por integrar e condicionar quase todas as conclusões invocadas pelo Oponente/Recorrente, tal como adiante vai especificar, que é a da ponderação e julgamento da relevância do facto, de contra a dívida em causa, de IRC, do ano de 2006, no montante de 1.163.142,42 €, ter sido apresentada impugnação judicial (Proc. 293/12.0BEAVR), o qual continua a correr os seus trâmites no TAF do Porto.

4ª – E em face desta pendência, quais os efeitos da inexistência do trânsito em julgado dessa decisão, no que respeita à idoneidade da fundamentação do despacho de reversão, que se sustentou no disposto nos artigos 23º nº 2, e 24º nº 1, alínea b), da LGT, que no entender do Oponente/Recorrente, tem como corolário lógico o facto de não estarem reunidos pressupostos de facto e de direito, idóneos e susceptíveis de se subsumirem nas normas em que se fundamentou a reversão.
Questão prévia, e pressuposto de facto, que pela sua incontornável relevância, foi expressamente referida na p.i., assim como exaustivamente abordada nas alegações apresentadas nos termos do art. 120º do CPPT, as quais, injusta e desafortunadamente, não mereceram sequer uma referência na sentença recorrida.

5ª – E ainda, concretamente, foi referido da 40ª à 43ª conclusões dessas alegações, a violação de normas e princípios constitucionais, por incompatibilidade com o princípio da necessidade na restrição de um direito análogo a um direito fundamental (arts. 17º, 18º, n.º 2, e 62º, n.º 1, da CRP).

6ª – Ora, ao longo de toda a sentença recorrida, este facto e questão prévia, o da ponderação da relevância do facto da pendência da impugnação judicial, e dos seus efeitos, na idoneidade da fundamentação legal das normas invocadas no despacho de reversão, apenas é referido na sentença recorrida, no já antes transcrito no ponto “4 – OS FACTOS E O DIREITO”, a fls. 18 da sentença recorrida, diz-se o que passa a transcrever...
“Resuma do que vem dito que a dedução do recurso hierárquico, sem que tenha sido prestada garantia que obste a que prossiga a execução, nos termos do disposto no art. 52º da LGT, 169º e 199º do CPPT, nunca poderá conferir o caracter de inexigibilidade à dívida em execução, com este fundamento, pelo que não é enquadrável na alínea i) do art. 204º do CPPT a alegação da existência de pedido formulado, quer junto da administração tributária (reclamação), quer junto do tribunal (impugnação) relativos a matérias que podem alterar a liquidação que esteve na origem da dívida exequenda...”

Ora, nesta parte transcrita da sentença recorrida, são feitas considerações e conclusões, que por sinal não foram suscitadas pelo Oponente/Recorrente, nem integram a sua causa de pedir, nos termos em que aqui foram julgadas.

7ª – Por outro lado, face às normas violadas do despacho de reversão, no que toca às questões que foram suscitadas e submetidas a julgamento pelo Oponente/Recorrente, tendo em conta este pressuposto da pendência dessa impugnação judicial da liquidação que originou a dívida, as mesmas podem sintetizar-se nas questões que de seguida se vão doutra forma tentar sinteticamente referir:

1º-Face ao disposto na 1ª parte do nº 2 do art. 23º da LGT, que preceitua:
A reversão contra o responsável subsidiário depende da fundada insuficiência de bens penhoráveis do devedor principal...
Norma esta que tal como decorre do seu texto … fundada insuficiência, impõe um elevado grau de certeza, probabilidade e até excepcionalidade na sua aplicação, na eventual apreciação da insuficiência de bens penhoráveis do devedor principal. Será que uma dívida cuja legalidade da sua liquidação ainda não está assente, tanto podendo manter-se, como reduzir-se ou desaparecer completamente da ordem jurídica, pode considerar-se idónea para preencher os requisitos de uma fundada insuficiência de bens penhoráveis do devedor principal?

Ora, a sentença recorrida não se pronunciou sobre esta questão prévia em concreto suscitada na p.i. e nas alegações do art. 120º do CPPT, submetida a julgamento.


8ª –2º - Face ao disposto na alínea b) do nº 1 do art. 24º, que preceitua:
1. Os ...gerentes... que exerçam...funções de...gestão em pessoas colectivas...são subsidiariamente responsáveis em relação a estas.......
...............................
b) Pelas dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no período do exercício do seu cargo, quando não provem que não lhes foi imputável a falta de pagamento.
Norma esta que tal como decorre do seu texto … são subsidiariamente responsáveis ...Pelas dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no período do exercício do seu cargo, quando não provem que não lhes foi imputável a falta de pagamento.
Impõe desde logo que o pagamento dessa dívida seja exigível no prazo legal de pagamento à devedora principal. Ora como por efeito da impugnação deduzida, mesmo sem a prestação de garantia, o pagamento dessa dívida deixou de ser exigível pela Fazenda Pública à devedora principal.
Como o demonstra aliás o facto de tendo a Fazenda Pública bens penhorados como garantia, não os poder vender para arrecadar o produto da venda para solver esta dívida.
E como o demonstra ainda a previsão legal do disposto no nº 8 do art. 189º do CPPT, de nos 15 dias seguintes à notificação da decisão final da impugnação judicial em curso, poder a devedora originária requerer o pagamento em prestações ou solicitar a dação em pagamento.
E se assim é, será pura especulação, numa altura em que os pressupostos de facto enformantes de uma eventual subsunção ao disposto da alínea b) do nº 1 do art. 24º da LGT ainda não ocorreram e se verificaram (designadamente: a falta de pagamento, a falta de bens para responder por esse pagamento e a eventual culpa objectiva ou subjectiva do responsável subsidiário), que, ao abrigo desta norma se responsabilize antecipadamente o Oponente/Recorrente por um comportamento ilícito e culposo relativamente a uma obrigação final de pagamento que ainda não se verificou na ordem jurídica, por existir uma condição para a sua plena e imediata exigibilidade, que se mantém suspensa.

Ora, a sentença recorrida não se pronunciou sobre esta questão prévia em concreto suscitada na p.i. e nas alegações do art. 120º do CPPT, submetida a julgamento.

9ª –3º -Acresce ainda, que conjugando o disposto na 1ª parte do nº 2 do art. 23º da LGT, que preceitua:
A reversão contra o responsável subsidiário depende da fundada insuficiência de bens penhoráveis do devedor principal...
Norma esta que tal como decorre do seu texto … fundada insuficiência, impõe um elevado grau de certeza, probabilidade e até excepcionalidade na sua aplicação, na eventual apreciação da insuficiência de bens penhoráveis do devedor principal.

Com o disposto no nº 2 do art. 18º da CRP, que preceitua:
2. A lei só pode restringir os direitos, liberdades e garantias nos casos expressamente previstos na Constituição, devendo as restrições limitar-se ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos.

E o nº 1 do art. 62º da CRP:
1. A todos é garantido o direito à propriedade privada...
Ora, face uma dívida cuja legalidade da sua liquidação ainda não está assente, tanto podendo manter-se, como reduzir-se ou desaparecer completamente da ordem jurídica, esta, nesta e por esta condição, pode considerar-se idónea para preencher os requisitos de uma fundada insuficiência de bens penhoráveis do devedor principal, tendo em conta que com a reversão efectuada assente neste volátil pressuposto, submete logo o alegado responsável subsidiário à condição de “devedor ao Estado”, com todas as consequência que daí o Fisco pode retirar (entre outras a perda de benefícios fiscais, cfr. art. 13º EBF), e ainda a aventada possibilidade (erradamente referida no acórdão tal como adiante se abordará), de ver os seus bens e rendimentos penhorados por via desta não estabilizada dívida.
Nesta e por esta condição, esta interpretação do disposto no art. 23º da LGT, não será violadora das antes referidas normas e princípios constitucionais, por incompatibilidade com o princípio da necessidade na restrição de um direito análogo a um direito fundamental, o direito à propriedade privada (arts. 17º, 18º, n.º 2, e 62º, n.º 1, da CRP), uma vez que ela se mostrava desnecessária e desproporcionada para satisfação do interesse da administração tributária em assegurar a possibilidade de cobrança coerciva desta dívida tributária?

Ora, a sentença recorrida não se pronunciou sobre esta questão prévia em concreto suscitada na p.i. e nas alegações do art. 120º do CPPT, submetida a julgamento.


10ª – Pelo que aomissão de pronúncia na sentença recorrida, sobre a questão prévia, e pressuposto de facto, que foi expressamente referida, pela sua incontornável relevância, na p.i. e nas alegações apresentadas nos termos do art. 120º do CPPT, configura uma violação do dever de se pronunciar, previsto no art. 123º nº 2 do CPPT, e no art. 608º nº 2 do CPC, com a consequente nulidade da sentença, prevista no art. 125º nº 1 do CPPT e 615º nº 1 alínea d) do CPC, aplicável por força do disposto no art. 2.º, alínea e), do CPPT.

III – Especificação dos concretos pontos de facto que o Recorrente considera incorrectamente julgados, por erro de julgamento, por errada interpretação e aplicação da lei e dos princípios jurídicos do direito tributário, bem como inapropriada valoração das provas em que se funda a injusta sentença recorrida

III.1 – Quanto ao primeiro ponto, de facto e de direito, em que o Recorrente considera, que foi, respectivamente, injusta e erradamente julgado por erro na valorização dos factos

11ª –O Oponente/Recorrente suscitou na p.i. da sua causa de pedir, a ilegalidade do despacho de reversão, efectuado ao abrigo do disposto nos artigos 23º nº 2, e 24º nº 1, alínea b), da LGT, pelo facto de contra a liquidação da dívida de IRC, do ano de 2006, no montante de 1.163.142,42€, ter sido apresentada reclamação graciosa e recurso hierárquico, e posteriormente, apresentado no TAF de Aveiro, em 12/03/2012, impugnação judicial, cujo processo recebeu o nº 293/12.0BEAVR.
Pelo que, tal como referiu nos artigos “6” a “8” da oposição fiscal deduzida, nestas circunstâncias, e com este fundamento, ou seja, a incerteza da dívida invocada, tendo em conta a pendência da impugnação judicial da liquidação (Proc. nº 293/12.0BEAVR), incerteza esta vista quanto ao destino final da liquidação, apesar de ser susceptível de nos termos da lei, ser legalmente suficiente para a instauração do processo de execução fiscal contra a devedora originária, mas, mesmo assim, apenas até à obtenção de garantia. Por força desta incerteza do título invocado, jamais poderá sustentar uma eventual reversão contra os responsáveis subsidiários.

12ª – Esta ilegalidade e invalidade de que enferma o despacho de reversão invocada na oposição, mereceu o julgamento que de novo se recorda, no ponto “4 – OS FACTOS E O DIREITO”, a fls. 18 da sentença recorrida, que passa a transcrever...
“Resuma do que vem dito que a dedução do recurso hierárquico, sem que tenha sido prestada garantia que obste a que prossiga a execução, nos termos do disposto no art. 52º da LGT, 169º e 199º do CPPT, nunca poderá conferir o caracter de inexigibilidade à dívida em execução, com este fundamento, pelo que não é enquadrável na alínea i) do art. 204º do CPPT a alegação da existência de pedido formulado, quer junto da administração tributária (reclamação), quer junto do tribunal (impugnação) relativos a matérias que podem alterar a liquidação que esteve na origem da dívida exequenda...”

13ª – Ora, contrariamente ao que, em erro de julgamento, consta nesta primeira parte da decisão da sentença recorrida, o Oponente/Recorrente jamais referiu em qualquer ponto da sua posição e nas respectivas alegações, que neste processo contestava a legalidade da liquidação deste IRC à devedora principal.

14ª – Nem alegou que relativamente a esta liquidação de IRC, esta, nos termos da lei, não era legalmente idónea para sustentar a instauração do respectivo processo de execução fiscal contra a devedora originária.

15ª – Alegou, isso sim, o que é diferente, que pelo facto desta liquidação de IRC, que continua impugnada e sem decisão final, apesar de ser legal a instauração da respectiva execução contra a devedora originária, mas apenas até à obtenção de garantia, já que o pagamento dessa dívida tinha a sua exigibilidade à devedora originária suspensa, pelo que face à inexistência actual dessa exigibilidade de pagamento, conjugada com a incerteza sobre a manutenção dessa dívida no final do pleito em curso, jamais poderia sustentar uma eventual e fundamentada reversão contra os responsáveis subsidiários.


III.2 – Quanto ao segundo ponto, de facto e de direito, em que o Recorrente considera, que foi, respectivamente, injusta e erradamente julgado, face ao disposto no art. 23º nº 2 da LGT


16ª –Ora, com todo o respeito (que é muito!), ao decidir-se da forma como antes se transcreveu, incorreu-se ainda em outro errado e injusto julgamento, como se vai procurar demonstrar.

Para esse efeito, mais uma vez faz notar que o que está em causa na presente acção e recurso, e em que se funda a causa de pedir do Oponente/Recorrente, assenta nos seguintes pressupostos:

1º - Foi liquidado o IRC de 2006, no valor de 1.163.142,42 €, à devedora principal, liquidação essa que foi por esta impugnada, que continua sem trânsito em julgado;
2º - Por essa liquidação foi instaurado o respectivo processo de execução fiscal, possuindo a devedora originária bens apenas no montante de 400.000,00 €, assim como lhe foi recusada a dispensa de garantia para a suspensão do processo de execução fiscal;

3º - Tendo sido efectuada contra o Oponente/Recorrente a reversão da dívida, como responsável subsidiário, ao abrigo do disposto nos artigos 23º nº 2, e 24º nº 1, alínea b), da LGT, suscitou na p.i. a ilegalidade do despacho de reversão, pelo facto da dívida lhe ser inexigível, tendo em conta a pendência da impugnação judicial, por um lado, face ao disposto no art. 23º nº 2 da LGT, já que, objectivamente, não era idónea para se subsumir numa fundada insuficiência dos bens do devedor principal, e, por outro, cfr. art. 24º nº al. b), subjectivamente, jamais poderia ser revertida esta dívida contra o Oponente/Recorrente, com o alegado fundamento na falta da sua prova que não lhe foi imputável a falta de pagamento, quando tal pagamento nem sequer foi, ou já é exigível à devedora originária.

17ª – Pois se de facto com a liquidação pela Administração Tributária, deste IRC de 2006, no valor de 1.163.142,42 €, esta quantia tornou-se certa e líquida, e com a regular notificação à devedora originária, dando-lhe um prazo para pagamento voluntário, tornou-se-lhe, também exigível.
Mas essa exigibilidade de pagamento, pelo facto da devedora originária ter implementado através dos procedimentos e processos previstos na lei, a discussão da legalidade dessa liquidação, com a dúvida por essa via posteriormente criada, surgiu uma condição para essa exigibilidade.

18ª – Ou seja, essa exigibilidade mantém-se, mas não é uma exigibilidade plena, mas sim condicionada, pois fica sujeita a uma condição, condição essa que consiste no trânsito em julgado do pleito relativo à discussão da legalidade da dívida.
Nessa circunstância, a exigibilidadede pagamento cai, ficando condicionada e suspensa, transmutando-se apenas para uma exigibilidade de prestação de garantia.

19ª – E se a exigibilidade de pagamento imediato desapareceu, ficando suspensa até à decisão do pleito (o devedor nessas circunstâncias não fica obrigado a proceder ao seu pagamento, e só o faz se considerar que isso lhe é mais conveniente), passando apenas a subsistir uma exigibilidade de prestação de garantia, cuja falta de prestação, total ou parcial, não tem, nem pode ter, como consequência a repristinação da anterior exigibilidade de pagamento.

20ª – E só após o trânsito em julgado do processo de impugnação judicial em curso, caso se mantenha, total ou parcialmente, a liquidação impugnada, só nessa altura seria exigido em definitivo, coercivamente se necessário, o seu pagamento à devedora originária.

21ª –A qual perante o desfecho que se vier a verificar, caso se mantenha total ou parcialmente a liquidação impugnada, ainda terá a faculdade de nos 15 dias seguintes à notificação da decisão final da referida impugnação judicial, ao abrigo do disposto no nº 8 do art. 189º do CPPT, querendo, requerer o pagamento em prestações ou solicitar a dação em pagamento.

22ª – Acresce ainda, que para além de estar em causa a salvaguarda e a criação efectiva de condições de garantia da tutela plena e efectiva do “acesso à justiça tributária”, princípio constitucional previsto no art. 20º nº 1 da CRP e no art. 9º da LGT, deve também ter-se em conta, que os actos tributários apesar de definitivos para alguns efeitos, não se presumem verdadeiros.
23ª – Ora, se por um lado, para a criação efectiva de condições de garantia da tutela plena e efectiva do “acesso à justiça tributária”, previsto no art. 20º nº 1 da CRP e no art. 9º da LGT, na aplicação da lei, se deve ter em conta que os actos tributários apesar de definitivos, não se presumem verdadeiros e que o entendimento da Administração não prevalece, antes deve ceder, perante a posição dos particulares, até que haja uma decisão judicial que declare a legalidade da actuação daquela.

24ª – E por outro, a apreciação da legalidade do acto tributário em causa, continua pendente de uma decisão judicial (inicialmente administrativa), essa exigibilidade de pagamento não existe, caiu, ficando por esse facto condicionada e suspensa até ao trânsito em julgado da decisão do pleito relativo à discussão da legalidade da dívida, transmutando-se apenas para uma exigibilidade de prestação de garantia.

25ª – Deve concluir-se que o processo de execução fiscal não deve ficar suspenso no que respeita aos procedimentos destinados à obtenção de garantia idónea para fundamentar a sua completa suspensão, mas ficam suspensos os procedimentos destinados à cobrança coerciva da respectiva dívida, pelo facto da mesma ter perdido a sua presunção de legalidade.

26ª – Recorda-se que o pressuposto de facto invocado pela Administração Tributária, subsume-se, tal como consta no despacho de reversão, na alínea b) do nº 1 do art. 24º da LGT, ou seja... quando não provem que não lhes foi imputável a falta de pagamento.

Ou seja, o pressuposto de facto que poderia chamar o Oponente à execução, cinge-se apenas a uma falta de pagamento, que ainda não é exigível à devedora principal, e muito menos ao Oponente, pelo que o seu chamamento à execução não preenche nenhum destes dois pressupostos de facto legalmente indispensáveis.

27ª – Assim sendo, devendo o processo de execução fiscal estar suspenso no que respeita a diligências com vista à sua cobrança coerciva, já que não estando para já a devedora originária obrigada ao pagamento imediato e actual dessa dívida, mas só depois do decurso do prazo de 15 dias após a decisão final da impugnação judicial, ao abrigo do disposto no nº 8 do art. 189º (que pela sua vigência, a contrario também por esta via, comprova reforçadamente o erro da interpretação e aplicação da lei efectuada pela AT e na sentença recorrida), por esta interpretação e aplicação do disposto no artigos 23º e 24º da LGT, normas que fundamentaram a reversão efectuada, se constata do erro e da injustiça de julgamento, que consta no ponto “4 – OS FACTOS E O DIREITO”, a fls. 18 da sentença recorrida, que se passa a transcrever...
“Resuma do que vem dito que a dedução do recurso hierárquico, sem que tenha sido prestada garantia que obste a que prossiga a execução, nos termos do disposto no art. 52º da LGT, 169º e 199º do CPPT, nunca poderá conferir o caracter de inexigibilidade à dívida em execução, com este fundamento, pelo que não é enquadrável na alínea i) do art. 204º do CPPT a alegação da existência de pedido formulado, quer junto da administração tributária (reclamação), quer junto do tribunal (impugnação) relativos a matérias que podem alterar a liquidação que esteve na origem da dívida exequenda...”

III.3 – Quanto ao terceiro ponto, de facto e de direito, em que o Recorrente considera, que foi, respectivamente, injusta e erradamente julgado, face ao disposto no art. 24º nº 1 alínea b) da LGT

28ª – Os factos antes chamados à alegação, também evidenciam a ilegalidade e invalidade do despacho de reversão, mantida na sentença recorrida, quando se fundamentou no disposto na alínea b) do nº 1 do art. 24º da LGT, como norma substantiva e subjectiva para assacar ao Oponente/Recorrente uma responsabilidade subsidiária, relativamente à devedora originária e a esta dívida tributária, por alegadamente não ter provado, como lhe competia na distribuição do ónus da prova, que não lhe foi imputável a sua falta de pagamento.

29ª – Para demonstrar tal errado e injusto julgamento da sentença recorrida, o Oponente/Recorrente, começa por fazer notar que no disposto no art. 23º da LGT, o legislador estabeleceu um quadro factual objectivo, no qual prevê que verificada determinada factualidade, por reversão, efectiva-se a responsabilidade subsidiária.

30ª –Ora, se no ponto anterior, já se alegou no sentido de demonstrar que o quadro factual relativo à devedora originária, não é idóneo para permitir qualquer reversão, mesmo assim admitindo em tese que o mesmo se verificava na situação em apreço, logo permitia a reversão contra os responsáveis subsidiários. Assim hipotizando, depois disso ter-se-ia de averiguar neste caso, relativamente à devedora originária, quem seriam esses responsáveis subsidiários.

31ª – Ora, prevê e estatui o legislador, neste caso face à fundamentação invocada no despacho de reversão, o artigo 24º nº 1 alínea b), que essa responsabilidade subjectiva recai sobre os seus gerentes, que, transcrevendo... não provem que não lhes foi imputável a falta de pagamento.

32ª– Para além de outras razões que referiu e a que mais adiante se voltará, desde logo o Oponente/Recorrente não consegue descortinar como foi e será possível, que a priori e ao abrigo da alínea b) do nº 1 do art. 24º da LGT, lhe possa ter sido assacada pela Administração Tributária, e mantida na sentença recorrida, uma responsabilidade subsidiária pela falta de pagamento deste imposto liquidado à devedora originária, cujo pagamento, no imediato, ainda nem sequer é exigível à devedora originária, por existir uma condição para a sua plena e imediata exigibilidade, a qual se mantém suspensa.

33ª – Acresce ainda, que num juízo de normalidade assente nos princípios do procedimento tributário, plasmados no art. 266º da CRP e no art. 55º da LGT, talvez até de bom senso, seria lógico e expectável que na situação em apreço, a Administração Tributária primeiro aguardasse o desfecho judicial do pleito deduzido pela devedora originária contra a liquidação deste imposto. E só após essa prevista decisão judicial, caso se mantivesse a liquidação impugnada, total ou parcialmente, então nessa altura exigisse em definitivo, o seu pagamento à devedora originária.

34ª – A qual perante o desfecho e factualidade que nessa altura se vier a verificar, como antes se alegou, tem ainda ao seu dispor, a possibilidade de nos 15 dias seguintes à notificação da decisão final da impugnação em curso, ao abrigo do disposto no nº 8 do art. 189º do CPPT, requerer o pagamento em prestações ou solicitar a dação em pagamento.

35ª – Assim como, então nessa altura, caso viesse a ser necessário, com base no disposto na alínea b) do nº 1 do art. 24º da LGT, facultar aos eventuais responsáveis subsidiários, a oportunidade de provar a sua eventual falta de culpa no seu pagamento, total ou parcial, que ainda não se sabe, nem seguramente se pode presumir, se vai acontecer ou não.

36ª – Acresce ainda, note-se, a circunstância de ainda nem sequer se conseguir descortinar, se com o desfecho do pleito em curso, esta dívida de IRC vai subsistir ou não, na sua totalidade ou em parte. Daí que por maioria de razão, será ainda mais difícil, com algum fundamento sério, prognosticar-se se relativamente a algum valor que vier a subsistir, irá ou não ser pago, e quando, pela ou à custa, da devedora originária.

37ª – E se assim é, será pura especulação, numa altura em que os pressupostos de facto enformantes de uma eventual subsunção ao disposto da alínea b) do nº 1 do art. 24º da LGT ainda não ocorreram e se verificaram (designadamente: a falta de pagamento, a falta de bens para responder por esse pagamento e a eventual culpa objectiva ou subjectiva do responsável subsidiário), que Administração Tributária, ao abrigo desta norma, responsabilize antecipadamente o Oponente/Recorrente, por um comportamento ilícito e culposo relativamente a uma obrigação final de pagamento que ainda não se verificou na ordem jurídica, por existir uma condição para a sua plena e imediata exigibilidade, que se mantém suspensa.

38ª – Pelo que também neste ponto, a sentença recorrida enferma de erro de julgamento, por errada interpretação e aplicação da lei, concretamente o disposto na alínea b) do nº 1 do art. 24º da LGT, conjugada com a injusta valorização do facto da pendência da decisão judicial da impugnação da liquidação deste IRC.


III.4 – Quanto ao quarto ponto, de facto e de direito, em que o Recorrente considera, que foi, respectivamente, injusta e erradamente julgado, ainda face ao disposto no art. 24º nº 1 alínea b) da LGT e à sua ilegitimidade para a presente execução

39ª – Nesta parte da sentença recorrida, a fls. 24, no que respeita à legitimidade ou ilegitimidade do Oponente/Recorrente para a presente execução, fundada nesta norma substantiva prevista na alínea b) do nº 1 do art. 24º da LGT, esta questão mereceu o julgamento que se transcreve nesta parte da sentença recorrida...
...................................
A alínea b) do art. 24º, nº 1 da LGT é aplicável quando o prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no período de exercício do cargo, o que significa que está aqui abrangida a situação em que nesse período concorrem o facto constitutivo e a cobrança.
................................
Aqui chegados, impunha-se ao oponente provar que não teve culpa na falta de pagamento das dívidas tributárias, ora, quanto a esse aspecto, o oponente nada prova, sendo certo que este era um ónus que sobre si impendia.
Tal como não prova que não teve culpa na insuficiência do património da devedora originária...
........
Ora, não logrou o oponente ilidir a presunção de culpa que sobre si recaia resultante do art. 24º, nº 1 alínea b) da LGT”

40ª – Decisão esta que o Oponente/Recorrente considera que enferma de erro de julgamento, por errada interpretação e aplicação da lei, concretamente e por esta via o disposto na alínea b) do nº 1 do art. 24º da LGT, e injusta valorização dos factos, desde logo porque tal como antes referiu, o Oponente/Recorrente jamais poderia alegar ou provar relativamente a uma boa ou má conduta, culposa ou não culposa, relativos aos actos relacionados com a concretização de um eventual pagamento desta dívida, tendo em conta que essa liquidação, considerada ilegal pela devedora originária, necessariamente iria ser impugnada, pelo que por essa circunstância não lhe seria exigível o seu pagamento antes da decisão da impugnação dessa liquidação, dado que essa exigibilidade de pagamento ficaria, tal como continua, suspensa.

41ª –Ou seja, na sentença recorrida dá-se apenas como provado que o prazo para pagamento voluntário já ocorreu, em 08/02/2010, e depois, erradamente, avança-se logo para apurar e julgar a conduta do Oponente/Recorrente relativamente ao eventual pagamento dessa dívida, que considera obrigatório e sem outras considerações e condições, ou seja, concretamente, se provou ou não se foi por culpa sua que essa dívida foi ou não paga, ou se o património da devedora originária não foi dissipado, metendo com essa eventual conduta, a devedora originária numa impossibilidade patrimonial de cumprir com esse pagamento, dando-se tacitamente como assente que o deveria ser, o que é um manifesto erro de julgamento.

42ª – Já que antes disso, na sentença recorrida, dever-se-ia ponderar e julgar devidamente factos relevantes, concretamente a circunstância da dívida continuar impugnada pela devedora originária, e esta ter bens penhorados, para garantir também a dívida deste processo de execução fiscal, num valor “inferior a 400.000,00 €”, tal como consta dos factos provados.

43ª – Ora, se a liquidação desta dívida está impugnada, a sua cobrança e exigibilidade está suspensa, só prosseguindo o respectivo processo de execução fiscal para obtenção de garantia, tal como antes já amplamente se justificou através da Lei e da Doutrina. Aliás como se extrai até dos procedimentos do órgão de execução fiscal, pois se tal suspensão de exigibilidade de pagamento não estivesse plasmada na Lei, estando bens penhorados da devedora originária, também à ordem deste processo de execução fiscal, desde logo e em primeira mão, a Administração Fiscal poderia e deveria vendê-los para se cobrar dessa dívida.

44ª – E não o faz porque a dívida nestas circunstâncias não é exigível. E se essa responsabilidade de pagamento não pode, actualmente e nestas condições, ser exigida ao responsável e devedor originário, com que fundamento lógico ou legal, poderia ser exigida a um mero responsável subsidiário, atenta a natureza da responsabilidade deste? É evidente que nestas condições, por maioria de razão, não existe nenhum fundamento legal para tal exigência ao Oponente/Recorrente.

45ª –No caso em julgamento e agora em recurso, a realidade dos factos não aponta para nenhuma das situações previstas em qualquer das alíneas do nº 1 art. 24º da LGT, tal como procurou demonstrar e provar na p.i. e nas alegações que apresentou.

46ª – Nos factos dados como provados na alínea “o)”, tal como referiram as testemunhas, quando a Administração Tributária, em 30/12/2009, reuniu elementos e chegou à conclusão que a devedora originária deveria proceder ao pagamento do IRC, relativo a 2006, no surpreendente e irrealista montante de 1.163.142,42 €.Já desde o ano de 2009, que a devedora originária se encontrava em processo de desactivação, que as suas vendas referidas no art. “56” da p.i., que foram:
ProveitosResultados
2008.............6.171.508,49 € 146.455,83 €
2009............. 2.679.868,12 € 59.613,83 €
2010............. 1.329.518,59 € -125.415,77 €
2011............. 459.334,39 € -14.892,17 €
2012............. 98.894,80 € -48.746,18 €

47ª – Por outro lado, não tendo havido nota ou informação de que os activos da empresa em alguma circunstância tivessem sido diminuídos ou dissipados, e que os únicos bens que possuía, são os referidos na alínea “f)”, dos factos dados como provados, com um valor total inferior a 400.000,00 €, que foram penhorados também à ordem do processo de execução fiscal.

48ª – Daí que tendo sido em 08/02/2010, a data limite para o pagamento voluntário (alínea “b)”) dos factos provados), e nesse ano a devedora originária auferiu de proveitos (vendas) nesse ano, um total de 1.329.518,59 €, e era proprietária de bens (penhorados pela AT), num valor inferior a 400.000,00 €.

49ª – Num juízo de normalidade, necessariamente na sentença recorrida, deveria ter julgado sobre a incontornável questão, de como poderia a devedora originária pagar tal montante de IRC (se a tal estivesse obrigada, tenha-se em conta!), obviamente impossível de pagar nessa altura, ou susceptível de ser paga, nesse montante, seja pela devedora originária seja pelo Oponente/Recorrente. Ou poder o Oponente/Recorrente, um simples trabalhador, comprador e vendedor de sucata, pela sua participação na gerência, ser culposa e ilicitamente responsável pela falta de pagamento de tão vultuosa importância.

50ª – Ou como poderia cumprir o ónus que lhe é legalmente imposto, de fazer prova positiva da sua falta de culpa na falta de pagamento desse IRC, senão através, por um lado, da demonstrada desnecessidade que a devedora originária, na sua autónoma, legítima e legal vontade colectiva da sua gerência, de não proceder a esse pagamento na fase actual de pendência da impugnação judicial contra essa liquidação, como também se deduz da apresentação dessa impugnação.

51ª – Daí que a parte da sentença recorrida, a fls. 24, no que respeita à legitimidade ou ilegitimidade do Oponente/Recorrente para a presente execução, fundada nesta norma substantiva prevista na alínea b) do nº 1 do art. 24º da LGT, onde se julgou...
................................
Aqui chegados, impunha-se ao oponente provar que não teve culpa na falta de pagamento das dívidas tributárias, ora, quanto a esse aspecto, o oponente nada prova, sendo certo que este era um ónus que sobre si impendia.
Tal como não prova que não teve culpa na insuficiência do património da devedora originária...
........
Ora, não logrou o oponente ilidir a presunção de culpa que sobre si recaia resultante do art. 24º, nº 1 alínea b) da LGT”
Enferma de erro de julgamento, por errada interpretação e aplicação da lei, concretamente e por esta via o disposto na alínea b) do nº 1 do art. 24º da LGT, e injusta valorização dos factos, desde logo porque tal como antes referiu, o Oponente/Recorrente jamais poderia alegar ou provar relativamente a uma boa ou má conduta, culposa ou não culposa, relativos aos actos relacionados com a concretização de um eventual pagamento desta dívida, tendo em conta que essa liquidação, considerada ilegal pela devedora originária, necessariamente iria ser impugnada, pelo que por essa circunstância não lhe seria exigível o seu pagamento antes da decisão da impugnação dessa liquidação, dado que essa exigibilidade de pagamento ficaria, tal como continua, suspensa.


III.5 – Quanto ao quinto ponto, de facto e de direito, em que o Recorrente considera, que foi, respectivamente, injusta e erradamente julgado, ainda face ao disposto no art. 24º nº 1 alínea b) da LGT e à sua ilegitimidade para a presente execução, por errada interpretação da lei e injusta valorização dos factos dados como provados na sentença recorrida

52ª – Acresce ainda, que tendo sido em 08/02/2010, a data limite para o pagamento voluntário (alínea “b)”) dos factos provados), por força do disposto no art. 24º nº 1 alínea b) da LGT, logo incumbe ao Oponente/Recorrente o ónus da prova da eventual sua falta de culpa no não pagamento dessa dívida nessa data.

53ª – Ora, nos factos provados da sentença (alínea “q)”) consta que...
«O J… e A… faziam negócios, eram os que ajudavam a D. C… (cf. depoimento das testemunhas).—“

E nos factos provados da sentença (alínea “n)”) consta que...
«Depois da morte da D. C..., em Dezembro de 2007, quem ficou a mandar na “S…” foi a I… e o Américo que, posteriormente, em 2010, constituíram uma nova empresa denominada “M...” (cf. depoimento das testemunhas.”(Mistura Bronze e não M..., como em erro se referiu)

54ª – Conclui-se portanto, que a partir de Dezembro de 2007, os gerentes de facto da devedora originária passaram a ser estes irmãos do Oponente/Recorrente, logo, a contrario, o Oponente/Recorrente, mesmo se antes dessa data alguma vez o tivesse sido, seguramente pelo menos a partir de Dezembro de 2007, deixou de ser gerente de facto da devedora originária, tal como extrai e conclui deste facto dado como provado na sentença recorrida.

55ª – Pelo que, tendo sido a data limite para o pagamento voluntário desta dívida – 30/04/2010, que através destes factos se comprova que nessa altura, já há mais de dois anos que o Oponente/Recorrente não era gerente de facto da devedora originária. E tendo provado que não exercia funções de gestão da devedora originária na data do terminus do pagamento voluntário dessa dívida, se provou o maior também comprovou o menor que o integra, ou seja, a sua falta de culpa no exercício dessas funções, pois nem sequer as exercia.

56ª – Pelo que, também por esta via se comprova que a sentença recorrida enferma de erro de julgamento, por errada interpretação e aplicação da lei, concretamente o disposto na alínea b) do nº 1 do art. 24º da LGT, e injusta valorização dos factos dados como provados na sentença recorrida.


III.6 – Quanto ao sexto ponto, de facto e de direito, em que o Recorrente considera, que foi, respectivamente, injusta e erradamente julgado por violação do disposto no art. 18º nº 2 da CRP

57ª – Nos artigos “23” a “28” da p.i., o Oponente/Recorrente, procurou demonstrar, que para além das ilegalidades antes referidas nas presentes alegações de que enferma o despacho de reversão, além de invalidamente fundamentado, se revelava ainda particularmente injustificado, desproporcionado e injusto. Já que essa reversão assentava numa interpretação do disposto no art. 23º da LGT, que violava normas e princípios constitucionais, por incompatibilidade com o princípio da necessidade na restrição de um direito análogo a um direito fundamental (arts. 17º, 18º, n.º 2, e 62º, n.º 1, da CRP), uma vez que ela se mostrava desnecessária e desproporcionada para satisfação do interesse da administração tributária em assegurar a possibilidade futura de cobrança coerciva desta dívida tributária.

58ª – Na sentença recorrida, a esta inconstitucionalidade invocada pelo Oponente/Recorrente, mereceu o julgamento, a fls. 20, que se transcreve da sentença recorrida...
“Ante o que vem dito e tendo em conta o disposto nos artigos 17º, 18º, nº 2e 62º, nº 1, todos da Constituição da República Portuguesa, apenas podemos concluir que aqueles preceitos legais não se mostram violados.”

59ª – Decisão esta que o Oponente/Recorrente considera que enferma de erro de julgamento, por errada interpretação e aplicação da lei, concretamente o disposto no artigo 23º da LGT, bem como art. 18º nº 2 da CRP, e injusta valorização dos factos, também pelo que vai alegar. Já que o Oponente/Recorrente na sua p.i., não suscitou apenas a inconstitucionalidade da interpretação do disposto no nº 3 do art. 23º da LGT, sobre a compatibilização da reversão contra o responsável subsidiário com o benefício da execução prévia, mas sim sobre a leitura e interpretação conjunta dos nº 2 e 3 do art. 23º da LGT.

60ª – Suscitou, isso sim, tal como exaustivamente antes referiu, ainda a questão do facto incontornável também a ter em conta, de que, como não se presume sequer como verdadeiro este acto de liquidação de IRC de 2006, no valor de 1.163.142,42 €, antes que haja uma decisão judicial que declare a sua legalidade, não podendo sequer fazer-se um juízo de prognose sobre o seu desfecho, esse acto tributário, na sua fase actual, não tem condições de estabilidade e certeza, para poder ser idóneo para fundamentar a indispensável fundada insuficiência dos bens penhoráveis do devedor principal, prevista e exigida pelo legislador, no nº 2 do art. 23º da LGT.

61ª – Sendo por esta razão o despacho de reversão ilegal e inválido, que foi errada e injustamente julgado na sentença recorrida, pois está assente numa interpretação do disposto no art. 23º da LGT, violadora das normas e princípios constitucionais, por incompatibilidade com o princípio da necessidade na restrição de um direito análogo a um direito fundamental (arts. 17º, 18º, n.º 2, e 62º, n.º 1, da CRP), uma vez que ela se mostrava desnecessária e desproporcionada para satisfação do interesse da administração tributária em assegurar a possibilidade de cobrança coerciva desta dívida tributária.

Termos em que o Recorrente confia que a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, recorrida em apelação com os fundamentos alegados no presente recurso, será substituída por acórdão do Tribunal Central Administrativo do Norte – Secção de Contencioso Tributário, que declare nula a decisão que põe termo ao processo com total improcedência da Oposição Fiscal, nos termos do art. 665º do C.P.C.

Produzindo nova decisão judicial, dando procedência à Oposição Fiscal. Pelo que o Recorrente, por ilegal reversão, carece de legitimidade para a execução fiscal, nos termos o artigo 204º, nº 1, alíneas b) e i) do Código de Procedimento e de Processo Tributário, pela razão de não ser responsável pelo pagamento da dívida exequenda – devendo a oposição por si deduzida ser julgada procedente com este fundamento.



CONTRA ALEGAÇÕES.
Não houve.

PARECER DO MINISTÉRIO PÚBLICO.
A Exma. Sra. Procuradora – Geral Adjunta junto deste TCA emitiu esclarecido parecer concluindo pela improcedência do recurso e confirmação da sentença recorrida.

II QUESTÕES A APRECIAR.
O objecto do presente recurso, delimitado pelas conclusões formuladas (artigos 635º/3-4 e 639º/1-3, ambos do Código de Processo Civil, «ex vi» do artº 281º CPPT), salvo questões do conhecimento oficioso (artigo 608º/ 2, in fine), é o seguinte:
a) Nulidade da sentença por falta de especificação concreta de fundamento de facto; ambiguidade e obscuridade na indicação dos factos dados como provados e dos fundamentos da decisão e por omissão de pronúncia.
b) Erro de julgamento, de facto e de direito.

Colhidos os vistos dos Exmos. Juízes Desembargadores Adjuntos, vem o processo submetido à Conferência para julgamento.


III FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO.
A sentença fixou os seguintes factos provados:
a) Por dívidas relativas a IRC do ano de 2006, no montante de €1.163.142,42, da sociedade “S... COMÉRCIO DE SUCATAS, LDA.” foi instaurado em 02/03/2010, nos Serviços de Finanças da Feira 2, o processo executivo nº 3441201001003925 (cf. fls. 1, 74 e 84 dos autos). ---
b) Acerca da dívida supra referida foi emitida em 02/03/2010 a competente certidão de dívida donde resulta que o prazo limite de pagamento voluntário ocorreu em 08/02/2010 (cf. fls. 74 dos autos). ---
c) A primitiva devedora iniciou a sua actividade em 01/12/1990 e encontrava-se colectada pela actividade de “comércio por grosso de sucatas e de desperdícios metálicos” com o CAE 46771 e de acordo com o que consta do registo da Conservatória do Registo Comercial tinha como sócios gerentes A…, E…, J..., Américo…, M…, C… e L… (cf. fls. 69v 79 a 83 dos autos). ---
d) A primitiva devedora obrigava-se perante terceiros pela assinatura conjunta de dois gerentes “mas nunca a de J… em conjunto com a de S…, quando esta não atingir a maioridade. EM AMPLIAÇÂO DA ESFERA NORMAL DA COMPETENCIA: poderão comprar ou vender viaturas automóveis” (cf. 79 e 80 dos autos). ---
e) O processo de execução fiscal identificado em a) não se encontra suspenso (cf informação de fls. 84 dos autos). ---
f) Em 05/06/2013 foi elaborado o projecto de despacho de reversão com o seguinte teor:
- imagens omissas -
(Cf. fls. 62 a 65 dos autos). ---
g) Em sede do direito de audição prévia realizou-se a inquirição de duas testemunhas (Carlos… e Manuel…) indicadas pelo oponente as quais às instâncias do ilustre mandatário do oponente disseram:
- imagem omissas -
(cf. fls. 68 e 66v dos autos). ---
h) Em 26/11/2013 foi elaborado o despacho de reversão contra o, aqui, oponente com o seguinte teor:
- imagem omissas -
(cf. fls. 69 a 71v dos autos). ---
i) Com data de 05/12/2013, através de carta registada com aviso de recepção com a referência dos CTT RM 8770 9907 9 PT, foi o oponente citado do despacho de reversão com os seguintes fundamentos:

(Cf. fls. 72 a 73v dos autos).---
j) Inconformado com a reversão, o oponente apresentou em 08/01/2014, a presente oposição (cf. fls. 3 dos autos). ---
k) Até Dezembro de 2007, data da morte da D. C… mãe do oponente, quem dava ordens e realizava os negócios na “S...” era a D. C... (cf. depoimento das testemunhas). ---
l) O J… fazia as compras e vendia em Espanha (cf. Depoimento das testemunhas). ---
m) As filhas ajudavam a escolher e enfardar e a filha E… ajudava a D. C... no escritório (cf. depoimento das testemunhas). ---
n) Depois da morte da D. C..., em Dezembro de 2007, quem ficou a mandar na “S...” foi a I… e o Am…o que, posteriormente, em 2010, constituíram uma nova empresa denominada “M...” (cf. depoimento das testemunhas). ---
o) A “M...” passou a usar o equipamento que a “S...” tinha, nomeadamente, os camiões, e a funcionar nas mesmas instalações (cf. depoimento das testemunhas). ---
p) Os cheques da “S...” eram assinados pelos filhos da D. C..., qualquer um deles que assinava (cf. depoimento das testemunhas). ---
q) O J… e o A… faziam os negócios, eram os que ajudavam a D. C... (cf. depoimento das testemunhas). ---
r) A primitiva devedora apresentou um pedido de dispensa de garantia que veio a ser indeferido (cf. fls. 205/214 dos autos).---
s) Os autos de penhora dos bens móveis e imóveis da primitiva devedora e o teor da informação do Serviço de Finanças da Feira 2, datada de 14/12/2011 (cf. fls. 134 a 147 dos autos). –
t) O Oponente, J..., apôs a sua assinatura conjuntamente com outro gerente nomeado, na qualidade de representante da primitiva devedora nos cheques com os nas 8109616904, 6220402584, 4500000354, 1500000325, 1500000519, 2700000647 respectivamente, sacados sobre a conta 23993650001 do BANCO TOTTA & AÇORES pela devedora originária, em 16.05.2001, 12.10.2001, 12.07.2002, 15.10.2002, 30.11.2002, 03.01.2003 respectivamente, nos valores de €115.596$00, 549.990$00, €22.520,75, €8.483,15, €20.020,56 e €8.067,60 (cf. fls. 168/180, 183/185 e188/195 dos presentes autos).---
u) No âmbito de procedimento externo de inspecção, aos exercícios de 2005 e 2006, ordem de serviço OI200900389/390, à primitiva devedora, o agora oponente foi designado, conjuntamente com outros gerentes nomeados, representante no procedimento inspectivo do sujeito passivo "S... COMÉRCIO DE SUCATAS, LDA." ”Com vista a assegurar a coordenação dos contactos com a Administração Tributária e o cumprimento das obrigações legais, no âmbito e no período em que aquele decorresse, tudo nos termos do artigo 52° do Regime Complementar do RCPIT” (cf. fls. identificação e assinatura do agora oponente a folhas 200/201 dos autos).---
v) O oponente formalizou a saída da gerência da primitiva devedora em 29/03/2012 (cf. certidão permanente da CRC, código de acesso 3788-0268-0769).---

Factos não provados
Dos autos não resultam provados outros factos com interesse para decisão da causa. ---
As demais asserções da douta petição integram antes conclusões de facto e/ou de direito, meras considerações pessoais do oponente e inócuas para a boa decisão da causa.---
*** ***
O Tribunal firmou a sua convicção na consideração dos documentos juntos aos autos que não foram alvo de impugnação e dos depoimentos das testemunhas arroladas que foram funcionários da “S...” e trabalharam directamente com o oponente e depuseram com conhecimento directo dos factos. ---


IV FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO.
O Recorrente imputa à sentença vários vícios geradores da sua nulidade e vícios e erros de julgamento.
As nulidades (globalmente consideradas) da sentença invocadas pelo Recorrente, e pelas quais começaremos a nossa análise, são três:
c) Falta de especificação concreta de fundamento de facto;
d) Ambiguidade e obscuridade na indicação dos factos dados como provados e dos fundamentos da decisão
e) Por omissão de pronúncia.

Vejamos a primeira nulidade -falta de especificação concreta de fundamento de facto.

Nos termos do art. 668º/1b) do CPC (correspondente ao art. 615º/1,b) do CPC) a sentença é nula quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão. Este preceito deve ser articulado com o disposto no art. 125º do CPPT nos termos do qual constituem causas de nulidade da sentença a falta de assinatura do juiz, a não especificação dos fundamentos de facto e de direito da decisão, a oposição dos fundamentos com a decisão, a falta de pronúncia sobre questões que o juiz deva apreciar ou a pronúncia sobre questões que não deva conhecer.

A nulidade por falta de especificação dos fundamentos de facto abrange tanto a falta de discriminação dos factos provados e não provados, exigida pelo artigo 123º, nº 2 do CPPT, como a falta do exame crítico das provas previsto no artigo 659º/3 CPC (correspondente ao art. 607º, nº 4 do NCPC).

Seguindo a doutrina de Jorge Lopes de Sousa, (op. cit. pp. 358), a fundamentação de facto exigida pelo CPPT reporta-se não só à indicação dos factos provados, mas também dos não provados.

No entanto, a discriminação dos factos não provados como a dos factos provados, só será necessária relativamente a factos que possam relevar para a apreciação da causa, segundo as várias soluções plausíveis de direito (art. 508º-A, n.º 1, alínea e) e 511 e 659 do CPC)

A fundamentação de facto da sentença não deve limitar-se à mera indicação dos meios de prova em que assentou o juízo probatório sobre cada facto, devendo revelar o itinerário cognoscitivo e valorativo seguido pelo juiz ao decidir como decidiu sobre todos os pontos da matéria de facto de modo a conhecer as razões por que se decidiu no sentido decidido e não noutro (Jorge Lopes de Sousa, op. cit. pp. 321).

Ora como podemos ver da sentença, não só se fixou a matéria de facto, como se referiu também a matéria de facto não provada.

Prosseguindo.

O Recorrente considera verificada a nulidade - falta de especificação concreta de fundamento de facto - por não constar do elenco dos factos provados ou não provados nem sendo claro se na sentença recorrida, se o facto principal referido no art. “5” da p.i., que é estrutural a toda a defesa do Oponente/Recorrente, o da pendência da impugnação judicial da liquidação que originou a dívida revertida, foi dado ou não como provado, e nessa circunstância considerado como pressuposto de facto e de direito.

No artigo 5º da douta petição inicial o Oponente/Recorrente alegou que
5 – Com a decisão do recurso hierárquico, não se conformando com o seu indeferimento, nos termos da alínea e) do n° 1 do art° 102° do CPPT, apresentou impugnação judicial, em 12/03/2012, no TAF de Aveiro, cujo processo recebeu o n° 293/12.0BEAVR, processo este que continua a correr os seus termos, no TAF do Porto.

Este facto não integra o acervo da matéria de facto provada. Mas a MMª juiz «a quo» não ignorou a questão e abordou-a directa e especificamente na fundamentação de direito: «No que tange à alegada inexigibilidade da dívida diz o oponente que a dívida reporta-se a IRC do ano de 2006, cuja liquidação considerou ilegal dela tendo apresentado reclamação graciosa, interposto recurso hierárquico e, posteriormente, impugnação judicial que corre ainda os seus termos sob o nº 293/12.0BEAVR.---
Assim, considera que a dívida não é certa, líquida e exigível, pelo que é inexequível por não ser ainda exigível e, além do mais, a devedora originária possuiu consideráveis bens móveis e imóveis na sua propriedade o que não sustenta, no seu entender, a insuficiência de bens penhoráveis da devedora principal...».

Assim, embora o facto não conste (formalmente) da matéria de facto provada, ele foi considerado provado pela MMª juiz «a quo», que o apreciou e dele retirou as respectivas consequências jurídicas.
Não nos parece ter sido empregue a melhor técnica jurídica, mas uma vez que o facto foi assumido como provado e dele extraídas as consequências jurídicas, não podemos concluir estar perante uma nulidade por falta de especificação concreta de fundamento de facto.

Obscuridade, ambiguidade e insuficiência na fundamentação.
O Recorrente defende que a fundamentação é ambígua, obscura e insuficiente, apontando como exemplo desses vícios a passagem da sentença que refere “Assim, considera que a dívida não é certa, líquida e exigível, pelo que é inexequível por não ser ainda exigível e, além de mais, a devedora originária possui consideráveis bens móveis e imóveis e imóveis na sua propriedade o que não sustenta, no seu entender, a insuficiência de bens penhoráveis da devedora principal.”

E porque é que a sentença é ambígua, obscura e insuficiente?

Porque, diz o Recorrente, «… de facto o Oponente/Recorrente, não disse na sua p.i. o que aqui se refere, nesta e noutras partes da sentença recorrida, mas sim que a dívida, no que se refere directamente ao Oponente/Recorrente, e não no que se reportaria à devedora principal, pelo facto da liquidação estar impugnada, por força desta incerteza do título invocado, conjugado com o facto da devedora principal possuir bens, jamais poderá fundadamente sustentar uma reversão contra os responsáveis subsidiários».

Não disse o Recorrente na pi o que a MMª juiz referiu naquele segmento transcrito da sentença?

Então vejamos.
No artigo 6º da petição inicial diz o Oponente:
«Nesta circunstância, essa liquidação judicialmente impugnada jamais pode ser considerada uma quantia que no todo dos pressupostos, possa ser considerada como certa, líquida e exigível, pelo que é inexequível contra o Oponente, por a mesma não lhe ser ainda exigível».

E no art. 11º da petição inicial,
«Acresce que a devedora originária, é proprietária de bens móveis e imóveis, que foram dados como garantia deste e de outros processos de execução fiscal, todos eles legalmente suspensos».

E no art. 14º da mesma douta petição inicial:
«Assim sendo, conjugando estes dois pressupostos antes referidos – a incerteza da dívida e a existência de bens no património da devedora principal, jamais se poderá fundamentadamente sustentar a imputada insuficiência de bens penhoráveis da devedora principal(sublinhado no original)

Como vemos, a MMª juiz «a quo» não acrescentou nada ao que o Oponente alegou na petição inicial e foi inteiramente fiel ao seu raciocínio. Sendo este o fundamento da invocada nulidade, ela resulta, assim - numa análise benigna-, de um aparente esquecimento do que foi alegado na petição inicial.

Para além destas nulidades, o Recorrente considera também que a sentença enferma de nulidade por omissão de pronúncia que identifica em quatro omissões.
Vejamos, uma por uma, as alegadas omissões.

1º vício de omissão de pronúncia.
No primeiro vício, diz o Recorrente que não foi ponderada a relevância «…da pendência da impugnação judicial, e dos seus efeitos, na idoneidade da fundamentação legal das normas invocadas no despacho de reversão.

Isto apesar de reconhecer que a sentença diz, sobre o assunto, o seguinte:
“Resumo do que vem dito que a dedução do recurso hierárquico, sem que tenha sido prestada garantia que obste a que prossiga a execução, nos termos do disposto no art. 52º da LGT, 169º e 199º do CPPT, nunca poderá conferir o caracter de inexigibilidade à dívida em execução, com este fundamento, pelo que não é enquadrável na alínea i) do art. 204º do CPPT a alegação da existência de pedido formulado, quer junto da administração tributária (reclamação), quer junto do tribunal (impugnação) relativos a matérias que podem alterar a liquidação que esteve na origem da dívida exequenda...”
Mas segundo o Recorrente, esta parte da sentença tece «…considerações e conclusões, que por sinal não foram suscitadas pelo Oponente/recorrente, nem integram a sua causa de pedir, nos termos que aqui foram julgadas».

Daqui resulta claro que a MMª juiz «a quo» se pronunciou sobre a relevância da pendência da impugnação (sem garantia) na sorte da execução revertida.

Mas para além do texto transcrito pelo Recorrente, a MMª juiz referiu ainda a propósito da pendência da ação de impugnação contra a liquidação que serviu de base ao título executivo, e que corre termos no TAF de Aveiro com o n.º 293/12.BEAVR o seguinte:

«No que tange à alegada inexigibilidade da dívida diz o oponente que a dívida reporta-se a IRC do ano de 2006, cuja liquidação considerou ilegal dela tendo apresentado reclamação graciosa, interposto recurso hierárquico e, posteriormente, impugnação judicial que corre ainda os seus termos sob o nº 293/12.0BEAVR.
Assim, considera que a dívida não é certa, líquida e exigível, pelo que é inexequível por não ser ainda exigível e, além do mais, a devedora originária possuiu consideráveis bens móveis e imóveis na sua propriedade o que não sustenta, no seu entender, a insuficiência de bens penhoráveis da devedora principal.
Os fundamentos de oposição são os prescritos nas diversas alíneas do art. 204º n.º 1 do CPPT.---
Nos termos da sua al. i) do n.º 1, podem ser invocados: quaisquer fundamentos não referidos nas alíneas anteriores, a provar apenas por documento, desde que não envolvam apreciação da legalidade da liquidação da dívida exequenda, nem representem interferência em matéria de exclusiva competência da entidade que houver extraído o título.---
Resulta assim desta norma que pode fundamentar a oposição qualquer outro fundamento para além dos taxativamente enumerados nas demais alíneas do preceito desde que não envolva apreciação da legalidade da liquidação da dívida exequenda.---
Como se sabe, só podem dar azo a execução, isto é, a pagamento coercivo, as dívidas certas líquidas e exigíveis (art. 713º CPC).---
E, como referem os autores, a dívida diz-se exigível quando se verifique a falta de cumprimento voluntário da obrigação, falta que, evidentemente, só vem a verificar-se depois do respectivo vencimento 1.---
Ora, a falta de cumprimento decorre, nas obrigações sem prazo certo, da interpelação do devedor para o efeito (art. 805º n.º 1 CC) que, no caso se deveria efectuar por via de notificação, a qual funcionará como interpelação para pagamento.---
Por outro lado, para que o sujeito passivo entre em mora necessário se torna que a notificação tenha sido eficaz (no sentido de dela ter havido efectivo conhecimento) e regular
(no sentido de terem sido cumpridas todas as formalidades legalmente impostas para o efeito).---
Vejamos então:
1 cf. Lopes Cardoso, «Manual da Acção Executiva», ed. da Imprensa Nacional, 4ª ed., pág. 199 ss; no mesmo sentido, ainda, Anselmo de Castro, «A Acção Executiva Singular, Comum e Especial», Coimbra Editora, 1970, pág. 52 ss; Rodrigues Bastos, «Notas ao Código de Processo Civ il», v ol. IV, 1984, pág. 9.
Resulta da factualidade apurada que a primitiva devedora teve até 08/02/2010 (cf. certidão de dívida) para efectuar o pagamento voluntário da dívida sem que o tivesse feito.---
O oponente nada alegou sobre a notificação da liquidação, sendo forçoso considerar que a mesma foi regular e eficaz. ---
Assim, findo o prazo de pagamento voluntário da liquidação, que como vimos ocorreu em 08/02/2010, a dívida tornou-se certa, líquida e exigível.---
Diz o art. 88º, nº 1 do CPPT que “Findo o prazo de pagamento voluntário estabelecido nas leis tributárias, será extraída pelos serviços competentes certidão de dívida com base nos elementos que tiverem ao seu dispor”, acrescentando o nº 4 do mesmo preceito legal que “as certidões de dívida servirão de base à instauração do processo de execução fiscal a promover pelos órgãos periféricos locais…”.---
Este foi precisamente o caso dos autos, pois a Administração Tributária considerando que o processo não se mostrava suspenso por garantia validamente prestada avançou com a execução.»

Em face do texto transcrito, torna-se evidente que não pode o Recorrente, com propriedade, imputar à sentença o vício de nulidade por omissão de pronúncia relativo à não ponderação da relevância da pendência da impugnação judicial.

Não só esta ponderação foi feita na sentença, como o foi de forma consentânea com a lei (para além do art. 88/1 do CPPT que a MMª juiz «a quo» referiu acrescentamos também os artigos 52º/1 LGT e 169º/1 do CPPT) e alinhada com a jurisprudência sobre o assunto (cfr. ac n.º 01308/12 de 03-04-2013 Relator: FRANCISCO ROTHES Sumário: III - A pendência de impugnação judicial da liquidação que deu origem à dívida exequenda, desde que a dívida exequenda se encontre garantida ou o executado tenha sido dispensado da prestação da garantia, constitui causa suspensiva do processo executivo, dando origem à inexigibilidade da dívida até que a impugnação judicial esteja decidida. (Sublinhado nosso).

Por último, o despacho de reversão não tem que se referir à pendência da ação de impugnação. A tanto não obriga a lei; como resulta do disposto no art. 23º/4 da LGT, a reversão (...) é precedida de audição do responsável subsidiário nos termos da presente lei e da declaração fundamentada dos seus pressupostos e extensão, a incluir na citação.

A questão da pendência da ação de impugnação só seria relevante se tivesse sido prestada garantia, ou dela estivesse dispensada (art. 52º LGT), ou ainda que a penhora garantisse a dívida exequenda e acrescido (art. 169º/2 CPPT). Como nenhuma destas situações se verifica, a pendência da ação de impugnação não releva para a emissão do despacho de reversão.

2º vício de omissão de pronúncia.
Depois, acrescenta o Recorrente, há omissão de pronúncia porque a sentença não se pronunciou sobre os efeitos de uma liquidação «…que ainda não está assente, tanto podendo manter-se como reduzir-se ou desaparecer completamente da ordem jurídica, pode considerar-se idónea para preencher os requisitos de uma fundada insuficiência de bens penhoráveis do devedor principal?»

Após invocar a nulidade por omissão de pronúncia sobre os efeitos da pendência de uma ação de impugnação judicial, nulidade improcedente como explicitámos, o Recorrente «desvia» a questão para os reflexos dos potenciais efeitos da procedência da ação de impugnação no preenchimento do requisito da fundada insuficiência de bens penhoráveis do devedor principal.

Só que uma coisa é a fundada insuficiência de bens no património da devedora originária e devedores solidários, que autoriza o órgão de execução fiscal a reverter a execução contra o responsável subsidiário (art. 23º/2 LGT) e outra completamente distinta é a legalidade da reversão na pendência de uma ação de impugnação, não garantida, contra a liquidação que serve de base ao título executivo.

São duas realidades distintas.
A impugnação judicial da liquidação só tem efeito suspensivo da execução se for prestada garantia, ou dela dispensada.

Se com a ação de impugnação não foi prestada garantia, ou dispensada a sua prestação (art. 52º LGT) ou não foram penhorados bens necessários para assegurar o pagamento da dívida exequenda e acrescido (art. 199º/4 do CPPT) a pendência desta não tem qualquer efeito suspensivo na instauração da execução fiscal, quer seja contra o devedor originário, quer seja contra o devedor subsidiário.

Como a ação de impugnação, desacompanhada da garantia de pagamento da quantia exequenda nas circunstâncias que referimos, não tem efeito suspensivo da execução, esta poderá ser instaurada nos termos e prazos previstos no art. 188º do CPPT, em articulação com o art. 88º do mesmo diploma, e operada mesmo a modificação subjectiva da instância com a reversão contra o devedor subsidiário, nos termos legais. Como foi o caso dos autos.

Isto mesmo resulta, por outras palavras, da fundamentação empregue pela MMª juiz «a quo» na parte transcrita da sentença (na análise do vício anterior), pelo que só podemos concluir improceder também o vício arguido, nesta parte.

3º vício de omissão de pronúncia.
Sob a tutela do mesmo vício - omissão de pronúncia-, o Recorrente entende que a sentença não se pronunciou sobre a violação de normas e princípios constitucionais, por incompatibilidade com o princípio da necessidade na restrição de um direito análogo a um direito fundamental (arts. 17º, 18º n.º 2, e 62º n.º 1 da CRP) e bem assim sobre o elevado grau de certeza, probabilidade na eventual apreciação da insuficiência de bens penhoráveis do devedor principal– conclusões 5ª e 9ª- 3º.

Não é verdade que a MMª juiz tenha omitido pronúncia sobre esta questão, como podemos ver na seguinte transcrição da sentença: «Debrucemo-nos, agora, sobre a ilegalidade da reversão fundada na não subsunção do oponente ao disposto no art. 23º da LGT e inconstitucionalidade do despacho de reversão nos moldes em que vêm invocados (art. 17º, 18º, nº 2 e 62º, nº 1 da CRP).---
Diz o oponente que a reversão sobre os responsáveis subsidiários sem que se mostre excutido o património da primitiva devedora é ilegal.---
Mais refere que, a primitiva devedora é proprietária de bens móveis e imóveis o que faz com que a dívida ainda não seja certa, liquida e exigível. ---
No que tange ao facto de a dívida não ser certa, liquida e exigível, damos aqui por reproduzido o que acima já foi dito. ---
Relativamente à existência de bens móveis e imóveis da devedora originária, resulta da factualidade apurada que além dos bens que já se mostram penhorados, manifestamente insuficientes para garantir a dívida face ao montante em execução, inexistem outros bens, sendo certo que o oponente também não os indica. ---
Ora, a LGT consagra a possibilidade da reversão contra o responsável subsidiário nos casos de insuficiência do património do devedor originário, mesmo antes de verificada a excussão do património deste, pois, apesar de estabelecer como regra que «a reversão contra o responsável subsidiário depende da fundada insuficiência dos bens penhoráveis do devedor principal e dos responsáveis solidários, sem prejuízo do benefício da excussão» (cf. art. 23.º, n.º 2, da LGT), ela tem ínsito que se possa concluir pela «fundada insuficiência» e decidir a reversão antes da excussão do património do devedor originário, pois só assim se compreende que se ressalve que a reversão não prejudica o benefício da excussão. ---
Por conseguinte, à face da LGT, concluindo-se pela «fundada insuficiência» de bens penhoráveis do devedor originário pode ser decidida a reversão, embora a possibilidade de cobrança da dívida através dos bens do responsável subsidiário esteja dependente da prévia excussão dos bens do devedor originário. ---
O n.º 3 do mesmo artigo confirma a correcção desta interpretação ao admitir que «caso, no momento da reversão, não seja possível determinar a suficiência dos bens penhorados por não estar definida com precisão o montante a pagar pelo responsável subsidiário», situação em que «o processo de execução fiscal fica suspenso desde o termo do prazo de oposição até à completa excussão do património do executado». Isto é, o processo de execução fiscal fica suspenso, já com a reversão efectuada, em relação ao revertido, pois, obviamente, quanto ao devedor originário o processo prossegue para concretizar a excussão de que depende o prosseguimento contra o revertido (neste sentido, o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 28 de Setembro de 2006, proferido no processo n.º
488/06). ---
Na sequência do exposto, nada obstava à reversão antes de excutido o património da sociedade originária devedora, falecendo razão ao oponente….»

E concluiu

«Ante o que vem dito e tendo em conta o disposto nos artigos 17º, 18º, nº 2 e 62º, nº 1, todos da Constituição da República Portuguesa, apenas podemos concluir que aqueles preceitos legais não se mostram violados.»

Do texto transcrito resulta claramente que a MMª juiz «a quo» não deixou de se pronunciar sobre a questão constitucional que o Oponente anunciou no capítulo II da douta petição inicial e desenvolveu no capítulo VII (principalmente) das alegações facultativas, negando-lhe procedência.

Sabendo-se que a nulidade da sentença por omissão de pronúncia só se verifica quando ela é total, facilmente se conclui não ocorrer tal nulidade da sentença «sub judice» (cfr. Ac. do STA n.º 0167/15 de 18-03-2015 Relator: CASIMIRO GONÇALVES Sumário: I – A omissão de pronúncia existe quando o tribunal deixa, em absoluto, de apreciar e decidir as questões que lhe são colocadas e não quando deixa de apreciar argumentos, considerações, raciocínios, ou razões invocados pela parte em sustentação do seu ponto de vista quanto à apreciação e decisão dessas questões).

4º vício de omissão de pronúncia.
O Recorrente também qualifica como omissão de pronúncia o facto de a MMª juiz não se ter pronunciado sobre a inexigibilidade do pagamento à devedora principal (conclusão 8ª-2-1ª parte). E que por via dessa inexigibilidade não se pode responsabilizar antecipadamente o Oponente/Recorrente por um comportamento ilícito e culposo relativamente a uma obrigação final de pagamento que ainda não se verificou na ordem jurídica (conclusão 8º 2-2ª parte).

Também não é verdade que a MMª juiz não se tenha pronunciado sobre esta questão.
Basta lermos a parte transcrita na análise do primeiro vício de omissão de pronúncia que (principia com a frase No que tange à alegada inexigibilidade da dívida…), para se concluir que a MMª juiz se pronunciou efectivamente sobre a questão.

Para concluir a apreciação dos alegados vícios por omissão de pronúncia, devemos ter presente dois princípios de análise. O primeiro, como já referimos, é que a nulidade por omissão de pronúncia só ocorre quando é total (Ac. do STA n.º 0167/15 de 18-03-2015); o segundo, é que o juiz ao conhecer de uma questão não tem que analisar todas as razões ou argumentos que cada parte invoca para sustentar o seu ponto de vista. Como doutrinou o Ac. do STA n.º 0844/14 de 26-02-2015 (Relator: JOSÉ VELOSO) Sumário: II - Conhecer uma questão não significa debater todos os argumentos ou razões utilizados pelas partes para sustentar a sua posição. Se a metodologia de abordagem adoptada pelo tribunal para conhecer da questão não conduzir à necessidade de apreciação deste ou daquele argumento, ou razão, apresentado pelas partes, isso não porá em causa a suficiência da pronúncia.

Improcedendo os alegados vícios geradores de nulidade, vejamos agora os vários erros de julgamento, de facto e de direito, que o Recorrente imputa à sentença.

Os erros no julgamento da matéria de facto ocorrem quando se conclua, da confrontação entre os meios de prova produzidos e os factos dados por provados ou não provados, que o juízo feito está em desconformidade com a prova produzida, independentemente da convicção pessoal do juiz acerca de cada facto (ac. deste TCAN n.º 00390/05.9BEBRG de 30-10-2014 Relator: Cristina Flora).

O erro deve ser demonstrado pelo recorrente através do exercício de um duplo ónus: delimitar o âmbito do recurso indicando claramente os segmentos da decisão que considera padecerem desse erro; e fundamentar as razões da sua discordância, concretizando e apreciando criticamente os meios probatórios constantes dos autos ou da gravação que, no seu entender, impliquem uma decisão diversa.

É o que resulta do art.º640.º/1 do CPC: “Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas”.

Como refere Abrantes Geraldes a propósito desta norma (in “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, Almedina, 2014, 2ª edição, a págs.132) sempre que o recurso envolva a impugnação da decisão sobre a matéria de facto, «a) Em quaisquer circunstâncias, o recorrente deve indicar sempre os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados, com enunciação na motivação do recurso e síntese nas conclusões; b) Quando a impugnação se fundar em meios de prova constantes do processo ou que nele tenham sido registados, o recorrente deve especificar aqueles que, em seu entender, determinam uma decisão quanto a cada um dos factos; c) Relativamente a pontos da decisão da matéria de facto cuja impugnação se funde, no todo ou em parte, em provas gravadas, para além das especificação obrigatória dos meios de prova em que o recorrente se baseia, cumpre-lhe indicar com exactidão as passagens da gravação relevantes e proceder, se assim o entender, à transcrição dos excertos que considere oportunos (…); e) O recorrente deixará expressa a decisão que, em seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas, como corolário da motivação apresentada, tendo em conta a apreciação crítica dos meios de prova produzidos, exigência nova que vem na linha do reforço do ónus de alegação por forma a obviar à interposição de recursos de pendor genérico ou inconsequente, também sob pena de rejeição total ou parcial da impugnação da decisão da matéria de facto (…)».

Tendo em conta o exposto, o recurso não pode deixar de improceder na parte em que impugna a decisão da matéria de facto por manifesta falta de cumprimento do ónus previsto no art.º640.º do CPC. A recorrente não indica os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados, não menciona os meios probatórios que impunham decisão diferente da recorrida, nem adianta qual a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas (art.º 640/1,b) c) do CPC.

Posto isto, analisemos os (seis) alegados erros de julgamento de direito.

1º erro de julgamento.
Nas conclusões 11ª a 15ª o Recorrente defende a ilegalidade da reversão da execução contra o devedor subsidiário pelo facto de a liquidação ter sido impugnada. E que «…apesar de ser legal a instauração da respectiva execução contra a devedora originária, mas apenas até à obtenção de garantia, já que o pagamento dessa dívida tinha a sua exigibilidade à devedora originária suspensa, pelo que face à inexistência actual dessa exigibilidade de pagamento, conjugada com a incerteza sobre a manutenção dessa dívida no final do pleito em curso, jamais poderia sustentar uma eventual e fundamentada reversão contra os responsáveis subsidiários» (sublinhados no original)

Mas esse erro não se verifica.
E de resto a MMª juiz «a quo» bem referiu que, uma vez que o processo não se encontrava suspenso por força de garantia validamente prestada (no processo de impugnação), a AT avançou com a execução. «Avançou» com a execução contra a devedora originária e posteriormente reverteu contra o devedor subsidiário, verificada a fundada insuficiência dos bens penhoráveis do devedor principal (art. 23º/2 da LGT).

Na parte transcrita referente ao primeiro vício de nulidade por omissão de pronúncia consta a fundamentação da MMª juiz «a quo» relativa à inexigibilidade da dívida. Parece-nos que a questão foi bem decidida pela MMª juiz «a quo» pelo não se justifica qualquer consideração adicional.

2º erro de julgamento.
Nas conclusões 16º a 27 o Recorrente defende que a exigibilidade ao devedor subsidiário
de pagamento da dívida exequenda revertida cai, ficando condicionada e suspensa, transmutando-se apenas para uma exigibilidade de prestação de garantia. (…)
E só após o trânsito em julgado do processo de impugnação judicial em curso, caso se mantenha, total ou parcialmente, a liquidação impugnada, só nessa altura seria exigido em definitivo, coercivamente se necessário, o seu pagamento à devedora originária.(…)
Deve concluir-se que o processo de execução fiscal não deve ficar suspenso no que respeita aos procedimentos destinados à obtenção de garantia idónea para fundamentar a sua completa suspensão, mas ficam suspensos os procedimentos destinados à cobrança coerciva da respectiva dívida, pelo facto da mesma ter perdido a sua presunção de legalidade (…).
Ou seja, o pressuposto de facto que poderia chamar o Oponente à execução, cinge-se apenas a uma falta de pagamento, que ainda não é exigível à devedora principal, e muito menos ao Oponente, pelo que o seu chamamento à execução não preenche nenhum destes dois pressupostos de facto legalmente indispensáveis.

No fundo, o Recorrente retoma a tese de que a ação de impugnação suspende a execução. Para não atraiçoarmos o seu pensamento, vejamos a síntese da «construção» teórica que desenvolve «… essa exigibilidade de pagamento, pelo facto da devedora originária ter implementado através dos procedimentos e processos previstos na lei, a discussão da legalidade dessa liquidação, com a dúvida por essa via posteriormente criada, surgiu uma condição para essa exigibilidade. (…) Ou seja, essa exigibilidade mantém-se, mas não é uma exigibilidade plena, mas sim condicionada, pois fica sujeita a uma condição, condição essa que consiste no trânsito em julgado do pleito relativo à discussão da legalidade da dívida.»

Como já se deixou referido, para que a ação de impugnação da liquidação que serviu de base ao título executivo tenha efeito suspensivo da execução é necessário que a dívida se encontre garantida (por prestação de garantia ou penhora de bens suficientes para solver a dívida exequenda e acrescido) ou tenha sido dispensada a sua prestação.

Fora destas situações, a execução não se suspende, nem contra o devedor principal nem a sua instauração contra o devedor subsidiário.

O que acontece é que se o devedor principal tiver bens susceptíveis de venda, mas insuficientes para pagamento da dívida, o revertido goza do benefício da excussão nos termos do n.º 3 do art. 23º LGT.

Como expressamente diz a lei, se não estiver definido o montante a pagar pelo responsável subsidiário, o processo de execução fica suspenso desde o termo do prazo de oposição até completa excussão do património do executado.

Mas essa suspensão decorre não do processo de impugnação (sem prestação de garantia ou dispensa dela) mas sim da regra da excussão prévia do património do devedor originário.

3º erro de julgamento.
Sob o 3º erro de julgamento o Recorrente, nas conclusões 28 a 38, volta à tese de que se deveria aguardar pelo desfecho da ação de impugnação antes de reverter a execução contra o devedor subsidiário, acrescentando que «Para além de outras razões que referiu e a que mais adiante se voltará, desde logo o Oponente/Recorrente não consegue descortinar como foi e será possível, que a priori e ao abrigo da alínea b) do nº 1 do art. 24º da LGT, lhe possa ter sido assacada pela Administração Tributária, e mantida na sentença recorrida, uma responsabilidade subsidiária pela falta de pagamento deste imposto liquidado à devedora originária, cujo pagamento, no imediato, ainda nem sequer é exigível à devedora originária, por existir uma condição para a sua plena e imediata exigibilidade, a qual se mantém suspensa».

Como vemos, a última parte desta questão está abrangida na análise à questão precedente, pelo que para ela remetemos. A primeira -reversão contra o responsável subsidiário ao abrigo do disposto na alínea b) do n.º 1 do art. 24º LGT - será apreciada no «erro» seguinte, e também para ela remetemos.

4ª e 5º erros de julgamento.
Nas conclusões 39 a 51 o Recorrente, além de retomar a tese de que a dívida é inexigível, acrescenta que
«na sentença recorrida dá-se apenas como provado que o prazo para pagamento voluntário já ocorreu, em 08/02/2010, e depois, erradamente, avança-se logo para apurar e julgar a conduta do Oponente/Recorrente relativamente ao eventual pagamento dessa dívida, que considera obrigatório e sem outras considerações e condições, ou seja, concretamente, se provou ou não se foi por culpa sua que essa dívida foi ou não paga, ou se o património da devedora originária não foi dissipado, metendo com essa eventual conduta, a devedora originária numa impossibilidade patrimonial de cumprir com esse pagamento, dando-se tacitamente como assente que o deveria ser, o que é um manifesto erro de julgamento.

42ª – Já que antes disso, na sentença recorrida, dever-se-ia ponderar e julgar devidamente factos relevantes, concretamente a circunstância da dívida continuar impugnada pela devedora originária, e esta ter bens penhorados, para garantir também a dívida deste processo de execução fiscal, num valor “inferior a 400.000,00 €”, tal como consta dos factos provados.»

E depois que
a devedora originária se encontrava em processo de desactivação e que era-lhe impossível pagar o IRC liquidado, «ou poder o Oponente/recorrente, um simples trabalhador, comprador e vendedor de sucata, pela sua participação na gerência ser culposa e ilicitamente responsável pela falta de pagamento de vultuosa importância»

Nas conclusões 52º a 56º o Recorrente renova a alegação de que desde Dezembro de 2007 deixou de ser gerente de facto da devedora originária, na data limite de pagamento da dívida – 30/04/2010 – não era gerente de facto da devedora originária.

A MMª Juiz «a quo» debruçou-se sobre a questão (falta de gerência efectiva e culpa da diminuição do património da devedora originária) e fundamentou da seguinte maneira:

«Atentemos, agora, à alegada ilegalidade da reversão consubstanciada na ausência do exercício da gerência por parte do oponente e inexistência de culpa no não pagamento da dívida tributária e na insuficiência do património societário. ---
Alegou o oponente que até ao final do ano de 2007 nunca desenvolveu qualquer actividade consubstanciadora da prática de actos de gestão, pois a gerência estava confiada exclusivamente à sua mãe (C..., falecida em 30/12/2007) e na empresa apenas desenvolvia a actividade de compra e venda de sucata no mercado externo, principalmente em Espanha. ---
In casu, as dívidas exequendas reportam-se ao IRC do ano de 2006, e tiveram como data limite de pagamento voluntário a data de 08/02/2010.---
Vejamos o quadro legal aplicável à situação. ---
O art. 24º da LGT dispõe que:
“Os administradores, directores e gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração ou gestão em pessoas colectivas e entes fiscalmente equiparados são subsidiariamente responsáveis em relação a estas e solidariamente entre si:
a) Pelas dívidas tributárias cujo facto constitutivo se tenha verificado no período de exercício do seu cargo ou cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado depois deste, quando, em qualquer dos casos, tiver sido por culpa sua que o património da pessoa colectiva ou ente fiscalmente equiparado se tornou insuficiente para a sua satisfação.
b) Pelas dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no período do exercício do cargo, quando não provem que não lhes foi imputável a falta de pagamento”. ---
Ou seja, para que se verifique a responsabilidade a que alude aquele preceito legal tem a doutrina e a jurisprudência defendido que se torna necessário como pressuposto da responsabilidade, a existência de uma nomeação para qualquer um dos órgãos representativos da sociedade e o exercício efectivo desse cargo societário de representação da sociedade. ---
Como se conclui da inclusão naquela disposição das expressões «exerçam, ainda que somente de facto, funções» e «período de exercício do seu cargo», não basta para responsabilização das pessoas aí indicadas a mera titularidade de um cargo, sendo indispensável que tenham sido exercidas as respectivas funções, ponto este que é pacífico, a nível da jurisprudência deste Supremo Tribunal Administrativo (neste sentido cf. Ac. do STA nº 0709/08 de 11-03-2009). ---
O oponente viu a execução contra si revertida com fundamento no disposto no art. 24º, nº 1 alínea b) da LGT. ---
Ora, constata-se que da Certidão do Registo Comercial estão identificados como gerentes da primitiva devedora além de outros o, aqui, oponente. ---
2 Neste sentido cf. também Ac. do STA de 12/04/2012, processo nº 0257/12, in: www.dgsi.pt.

Concretamente, e em relação ao exercício efectivo da gerência resulta da factualidade apurada que o oponente por várias ocasiões e em distintos actos subscreveu em nome e em representação da primitiva devedora documentação vária e em representação da primitiva devedora comprava e vendia mercadoria no mercado externo, nomeadamente em Espanha.
Efectivamente, o oponente na qualidade de gerente da primitiva devedora, conjuntamente com outro, assinou cheques daquela sociedade nos anos de 2001 e 2002, vinculando-a perante terceiros. ---
Provou a AT que o oponente, contrariamente ao que alega na petição inicial, efectivamente praticou actos de representação continuada da primitiva devedora.---
Assim, concluímos que o oponente exerceu de facto a gerência da primitiva devedora ao longo dos anos. ---
Para se afirmar a responsabilidade subsidiária dos gerentes por dívidas tributárias exige-se a demonstração de que os mesmos exerceram a gerência de modo efectivo ou de facto.
Destarte, a assinatura de cheques necessários ao giro comercial da sociedade executada originária e em representação da primitiva devedora faz prova do exercício de facto de poderes de gerência da mesma3.---
A lei não define precisamente em que é que se consubstanciam os poderes de gerência, mas, em face do preceituado nos artºs. 259º e 260º, do Código das Sociedades Comerciais, parece dever entender-se que serão típicos actos de gerência aqueles que se consubstanciam na representação da sociedade perante terceiros e aqueles através dos quais a sociedade fique juridicamente vinculada e que estejam de acordo com o objecto social 4.---
O gerente/administrador goza de poderes representativos e de poderes administrativos face à sociedade. A distinção entre ambos radica no seguinte: se o acto em causa respeita às relações internas entre a sociedade e quem a administra, situamo-nos no campo dos poderes administrativos do gerente. Pelo contrário, se o acto respeita às relações da sociedade com terceiros, estamos no campo dos poderes representativos.
Por outras palavras, se o acto em causa tem apenas eficácia interna, estamos perante poderes de administração ou gestão. Se o acto tem eficácia sobre terceiros, verifica-se o exercício de poderes de representação.---
3 Neste sent ido cf.ac.T.C.A.Sul-2ª. Secção, 4/5/2004, proc.1179/03; Ac.T.C.A.Sul-2ª. Secção, 7/3/2006, proc.933/05.---
4 Neste sent ido cf. Ac.S.T.A.-2ª.Secção, 3/5/1989, rec.10492; Ac.T.C.A.Sul-2ª. Secção, 8/5/2012, proc.5392/12; Ac.T.C.A.Sul- 2ª .Secção, 31/10/2013, proc.6732/13; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, III volume, Áreas Editora, 6ª . edição, 2011, pág.465 e seg.. ---

Na alínea b), do nº.1, do artº.24º, da L. G. Tributária, consagra-se uma presunção de culpa, pelo que a Administração Fiscal está dispensada de a provar. Concluindo, se a gestão real ou de facto cessa antes de verificado o momento em que se esgota o prazo para pagamento do imposto, o ónus da prova recai sobre a Fazenda Pública, se a gestão coincide com ele, o ónus volta-se contra o gestor.---
Pese embora o oponente invoque que não exerceu a gerência da primitiva devedora até porque, segundo indica, apenas comprava e vendia sucata no mercado externo e quem geria de facto era a sua falecida mãe, o certo é que não é essa a prova que resulta dos autos, sendo certo que nenhuma prova carreia para os autos no sentido do que alega. ---
Concretizemos.
De facto, além do manancial de prova documental que resulta da factualidade apurada, também as testemunhas ouvidas depuseram sobre a “vida” da sociedade, primitiva devedora, descrevendo de que forma as tarefas se distribuíam entre mãe e filhos (todos eles gerentes), disseram de forma clara se fosse necessário assinar cheques qualquer um dos filhos o fazia e que o oponente comprava e vendia sucata, sobretudo em Espanha. ---
Resuma do que vem dito que cai por terra a alegada, mas não provada, falta de exercício da gerência de facto por parte do oponente, pois o que se prova é que o oponente foi gerente de facto e de direito vinculando a primitiva devedora perante terceiros. ---
Não olvidemos que a dívida foi revertida contra o oponente com fundamento no art. 24º, nº 1 alínea b) da LGT, ou seja, mostra-se responsabilizado pela “dívidas cujo prazo de pagamento ou entrega tenha terminado no período do exercício do seu cargo (…) ”, e que o período de pagamento voluntário da mesma ocorreu em 08/02/2010, ou seja, no período em que o oponente era, seguramente, gerente de facto e de direito, tanto mais que apenas o deixou de ser em 29/03/2012.
Assim, afigura-se-nos que os factos provados constituem sérios indícios no sentido do exercício efectivo da gerência por parte do oponente, indícios que o oponente nesta sede não contrariou.---
Neste pressuposto, resulta claramente da factualidade dada como assente que o oponente exerceu funções de gestão da primitiva devedora representando e vinculando-a perante terceiros.---
A alínea b) do art. 24º, nº 1 da LGT é aplicável quando o prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no período de exercício do cargo, o que significa que está aqui abrangida a situação em que nesse período concorrem o facto constitutivo e a cobrança.--
Destarte, o que resulta dos autos é que o oponente não conseguiu ilidir a presunção de gerência da primitiva que presidiu ao despacho de reversão.---
Aqui chegados, impunha-se ao oponente provar que não teve culpa na falta de pagamento das dívidas tributárias, ora, quanto a este aspecto, o oponente nada prova, sendo certo que este era um ónus que sobre si impendia. ---
Tal como não prova que não teve culpa na insuficiência do património da devedora originária, pois nenhuma prova logrou o oponente carrear para os autos, não alegou, sequer, quaisquer elementos dos quais se pudesse concluir que a sua conduta, como gerente, não merecia censura. É que a culpa, centrada na actuação do bónus pater familiae, resulta das opções assumidas enquanto gerente e da repercussão destas no pagamento ou não das dívidas tributárias. ---
Estava o oponente obrigado a diligenciar pelo bom cumprimento das obrigações societárias, mormente no que tange ao pagamento dos impostos. ---
Ora, não logrou o oponente ilidir a presunção de culpa que sobre si recaia resultante do art. 24º, nº 1 alínea b) da LGT. ---
Improcedem, assim, os fundamentos de ilegitimidade invocados pelo oponente.»

A apreciação empreendida pela MMª juiz «a quo» está correcta, alinhada com a jurisprudência dos tribunais superiores sobre a matéria (por todos, cfr ac. do TCAS n.º 03337/09 de 01-03-2011) pelo que a confirmamos integralmente.

6º erro de julgamento.
Nas conclusões 57º e segs.. o Recorrente defende que a interpretação conjunta dos n.º 2 e 3 do art. 23º LGT são inconstitucionais por violação do princípio da necessidade na restrição de um direito análogo a um direito fundamental «(arts. 17º, 18º, n.º 2, e 62º, n.º 1, da CRP), uma vez que ela se mostrava desnecessária e desproporcionada para satisfação do interesse da administração tributária em assegurar a possibilidade de cobrança coerciva desta dívida tributária».

Tese que alicerça no «…facto incontornável também a ter em conta, de que, como não se presume sequer como verdadeiro este acto de liquidação de IRC de 2006, no valor de 1.163.142,42 €, antes que haja uma decisão judicial que declare a sua legalidade, não podendo sequer fazer-se um juízo de prognose sobre o seu desfecho, esse acto tributário, na sua fase actual, não tem condições de estabilidade e certeza, para poder ser idóneo para fundamentar a indispensável fundada insuficiência dos bens penhoráveis do devedor principal, prevista e exigida pelo legislador, no nº 2 do art. 23º da LGT.»

Ultrapassando a questão do efeito (não) suspensivo da impugnação a que o Recorrente regressa com sistemática regularidade, não acompanhamos a tese de que a reversão da execução fundada na insuficiência de bens penhoráveis do devedor originário é incompatível com o princípio da necessidade na restrição de um direito análogo a um direito fundamental.
Bem sabemos que o Cons. Jorge Lopes de Sousa (que o Recorrente cita na petição inicial) considera ser de constitucionalidade duvidosa «…a possibilidade de reversão da execução fiscal antes da excussão do património do devedor originário, fora dos casos em que é possível saber antes da liquidação qual a medida exacta da insuficiência do património do devedor originário, por incompatibilidade com o princípio da necessidade na restrição de um direito análogo na restrição de um direito análogo a um direito fundamental (arts. 17.°, 18. n.° 2, e 62.°, n.º 1, da CRP), uma vez que ela se mostra desnecessária e desproporcionada para satisfação do interesse da administração tributária em assegurar a possibilidade de cobrança coerciva das dívidas tributárias». (Jorge Lopes de Sousa, CPPT anotado, III, Áreas Editora, 2011, pp. 66).

Salvo o devido respeito, permitimo-nos discordar do Recorrente e do Ilustre Conselheiro, por várias razões.

Em primeiro lugar, não houve qualquer agressão contra o património do responsável subsidiário. Este opõe-se à reversão da execução, e embora a execução possa prosseguir para penhora de bens, a verdade é que esta ainda não ocorreu. Portanto, não podemos falar em qualquer restrição, porque «restrição» alguma foi imposta.

Mesmo considerando o argumento de que «… tendo o responsável subsidiário a possibilidade de pagar a dívida exequenda, sem juros e custas, no prazo da oposição, e só havendo suspensão da execução após o termo do prazo da oposição (n.°s 2 e 3 do art. 23.°), ele será obrigado, para beneficiar de tal regime, a pagar uma quantia que ulteriormente se pode comprovar ser excessiva o que, além de ser injustificadamente gravoso para aquele responsável, não se compagina com a natureza indemnizatória, baseada em responsabilidade civil extracontratual, que a responsabilidade subsidiária tem no âmbito da LGT» (op. cit. pp. 66).

Mas nesta hipótese, o que poderia ser inconstitucional (não estamos a dizer que o seja) seria essa obrigação de pagamento para beneficiar do regime previsto no n.º 5 do art. 23º da LGT. Não a reversão da execução.

Em segundo lugar, se houver bens no património do devedor originário, o processo de execução fiscal revertido contra o devedor subsidiário suspende-se desde o prazo para deduzir oposição até à completa excussão do património do executado (art. 23º/3 LGT), sem qualquer tangibilidade ao património do devedor subsidiário.
Portanto, continua sem haver qualquer agressão patrimonial do devedor subsidiário.

Em terceiro lugar, o devedor subsidiário tem o direito de requerer a suspensão da execução contra si revertida mediante prestação de garantia ou pedido de dispensa da sua prestação, dependente de acção de impugnação que discuta a legalidade da liquidação (art. 169º/1 do CPPT e 52º/1 LGT), ou de oposição (art. 168º/10 do CPPT) que discuta a legalidade da reversão. Ou seja, o devedor subsidiário sempre poderá evitar a (eventual) agressão do seu património até à discussão da legalidade da liquidação, ou da reversão - se nisso tiver real interesse.

Em quarto e último lugar, o devedor subsidiário tem o direito de reagir contra a reversão da execução invocando, entre outras causas de pedir (cfr. art. 204º do CPPT) e provando que não é responsável pela dívida, ou não tem culpa na insuficiência do património societário para solver a dívida tributária, nos termos que o art. 24º/2 - als a) e b) da LGT) preveem, paralisando e eliminando os seus potenciais efeitos.

Portanto, parece-nos que a lei criou figuras processuais suficientemente garantísticas para evitar qualquer compressão do princípio da necessidade na restrição de um direito análogo a um direito fundamental. Figuras cujo cumprimento recai sobre a AT (suspensão do processo até à execução do património da devedora originária) e cujo direito de exercício se abre para o devedor subsidiário (oposição à execução, ou mesmo reclamação: art. 276 do CPPT)

Mas se descurar o exercício destes direitos e o seu património for (oportunamente) penhorado para garantia e pagamento da dívida exequenda, não nos deparamos com uma violação ao princípio da necessidade na restrição de um direito análogo a um direito fundamental, mas sim com o resultado de uma opção legal do chamado à reversão.


V DECISÃO.

Termos em que acordam, em conferência, os juízes da secção de contencioso Tributário deste TCAN em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.
Custas pelo Recorrente.
Porto, 15 de Outubro de 2015.
Ass. Mário Rebelo
Ass. Cristina Travassos Bento
Ass. Paula Maria Dias de Moura Teixeira