Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01259/10.0BEBRG
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:02/26/2015
Tribunal:TAF de Braga
Relator:Fernanda Esteves
Descritores:NULIDADE DA SENTENÇA
RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA
CULPA PELO NÃO PAGAMENTO DOS IMPOSTOS
FUNDAMENTAÇÃO DO DESPACHO DE REVERSÃO
Sumário:1. A nulidade da sentença por omissão de pronúncia ocorre quando o tribunal não resolve questões que estava obrigado a apreciar.
2. A sentença só é nula por falta de fundamentação, nos termos previstos no artigo 615º, nº 1, alínea b), do CPC, quando há ausência total de fundamentos que suportem a decisão e não quando a fundamentação apresentada é sucinta.
3. No domínio da vigência da LGT, para afastar a responsabilidade subsidiária pelas dívidas de impostos cujo termo do prazo para pagamento ou entrega terminou durante o período da sua administração, é necessária a demonstração de que não é imputável aos gerentes ou administradores das sociedades a falta de pagamento ou de entrega do imposto [artigo 24º, nº 1, alínea b), da LGT].
4. A prova de que a falta de pagamento do imposto não lhe é imputável passa pela demonstração da falta de fundos da sociedade originária devedora para efectuar o pagamento e que tal falta se não deve a qualquer omissão ou comportamento censuráveis do gerente.
5. A fundamentação formal do despacho de reversão basta-se com a alegação dos pressupostos e com a referência à extensão temporal da responsabilidade subsidiária que está a ser efectivada (artigo 23º, nº 4 da LGT e acórdão do Pleno da Secção do Contencioso Tributário do STA de 16/10/2013, Processo 0458/13).*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:A...
Recorrido 1:Autoridade Tributária e Aduaneira
Decisão:Negado provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:


Acordam, em conferência, os Juízes da Secção do Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

1. Relatório

A..., residente na Rua…, Vizela, interpôs recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga que julgou improcedente a oposição à execução fiscal nº 4200200601013912 e apensos que contra si foi revertida e que corre termos no Serviço de Finanças de Vizela, inicialmente instaurada contra a sociedade “A… Confecções Unipessoal, Lda.”, por dívidas de IVA e IRC do ano de 2006.
A Recorrente terminou as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões:

1ª- Não obstante o incomensurável respeito que a mesma lhe merece, não pode a Recorrente conformar-se com a mui douta decisão proferida pelo Tribunal a quo de fls… dos autos à margem referenciados.

2ª- Por força do despacho de fls. … dos presentes autos, foi admitida a interposição do recurso apresentado pela Opoente, ora Recorrente, ao qual foi atribuído efeito meramente devolutivo;

3ª- Sucede, porém, que uma vez que a atribuição do dito efeito devolutivo vai permitir o prosseguimento dos autos executivos e a consequente a prática de atos de execução e de penhora que se podem revelar limitativos do direito de propriedade do recorrente e ofensivos dos princípios de natureza constitucional que se pretendem ver salvaguardados, ao presente recurso jurisdicional deve ser atribuído, ao abrigo disposto no nº 2, in fine, do artº 286º do CPPT, efeito suspensivo, na medida em que a atribuição de efeito meramente devolutivo não salvaguarda o efeito útil do presente recurso;

4ª- A mui douta sentença a quo, para além de padecer de nulidade decorrente de omissão de pronúncia e, ainda, e falta - decorrente de deficiência - de fundamentação, apreciou incorretamente a factualidade constante do conjunto dos articulados e a decorrida da prova testemunhal produzida e, bem assim, incorretamente aplicada as normas jurídicas que disciplinam à legitimidade substantiva dos executados e o despacho de reversão;

5ª- Sucede que o Ex.mo Tribunal a quo não se pronunciou de forma completa sobre a invocada exceção ilegitimidade substantiva;

6ª- Com efeito, não obstante as doutas e expensas considerações tecidas sobre o pressuposto da culpa da Recorrente na falta de pagamento nos tributos em discussão nos autos, a Recorrente invocou, de forma ampla, a exceção de ilegitimidade substantiva;

7ª- O que determina que o Ex.mo Tribunal Recorrido deveria ter feito - e não o fez! - uma apreciação sobre todos os requisitos legais dos quais depende in casu a responsabilidade subsidiária da Recorrente;

8ª- Sendo que, no respeitoso entendimento da Recorrente, a aludida falta de pronúncia acarreta, por força do disposto no nº 1 do artº 125º do CPPT, a nulidade da sentença;

9ª- Mais acresce que a douta decisão recorrida, por os seus fundamentos serem manifestamente insuficientes, também padece do vício de nulidade previsto no Nº 1 do art. 125º do CPPT e, ainda, na al. b) do Nº 1 do art. 615º do CPC, na redação atualmente em vigor, por violação do disposto no Nº 2 do artigo 123º do aludido CPPT;

10ª- Pois quanto à alegada desconsideração dos fundamentos apresentados no exercício do direito de audição, pese embora o Ex.mo Tribunal a quo tenha considerado que no despacho de reversão foram examinados e considerados a defesa exposta em sede de audição prévia, aquele aresto decisório limitou-se a remeter para aquele despacho de reversão sem, no entanto, indicar, em concreto, as passagens das quais resulta que a audição prévia apresentada pela Recorrente foi considerada pela Recorrida antes da decisão final da reversão;

11ª- Tudo o que no nosso respeitoso entendimento, por consubstanciar uma abordagem extremamente lacónica da questão apresentada, tal também configura uma nulidade prevista no Nº 1 do artº 125º do CPPT por deficiência da fundamentação;

12ª- Nulidades que expressamente se invocam para os legais efeitos delas decorrentes;

13ª- Acresce, ainda, que o Ex.mo Tribunal a quo, contrariamente ao que estava obrigado por tal ter sido invocado, não apreciado, no caso concreto, a verificação de todos os legais requisitos dos quais depende a efetivação da responsabilidade tributária subsidiária da Recorrente;

14ª- Com efeito, o regime da responsabilidade subsidiária dos gerentes de sociedade de responsabilidade limitada é fixado pela lei em vigor à data do nascimento das dívidas em execução;

15ª- Reportando-se os factos tributários em causa aos períodos tributários relativos aos anos de 2006 e 2007, o regime de responsabilidade tributária aplicável neste caso está consagrado nos artigos 23.º e 24.º, ambos da LGT;

16ª- Sendo que, para além do mais, por força do N.º 1 do artigo 24.º da LGT, a reversão em crise dependia também da alegação e prova pela Recorrida do exercício, de facto, das funções de gerência pela Recorrente, pois a responsabilidade subsidiária tributária não se basta com a mera gerência nominal ou de direito;

17ª- Na esteira do douto entendimento jurisprudencial plasmado no Acórdão do TCA do Norte proferido em 27/03/2014 proferido no processo Nº 00808/11.1BEPNF, também disponível para consulta em www.dgsi.pt, pode concluir-se que: “gerência de facto constitui requisito da responsabilidade subsidiária dos gerentes, não bastando, portanto, a mera titularidade do cargo, a gerência nominal ou de direito. Ora, é sobre a administração tributária, enquanto exequente e como titular do direito de reversão, que recai o ónus de alegar e provar os pressupostos que lhe permitem reverter a execução fiscal contra o gerente da devedora originária, designadamente os factos integradores do efectivo exercício da gerência de facto [de acordo com a regra geral de quem invoca um direito tem que provar os respectivos factos constitutivos - artigo 342º, nº 1, do CC e artigo 74º, nº 1, da LGT]. Com efeito, não há qualquer presunção legal que faça decorrer da qualidade de gerente de direito o efectivo exercício da função e que faça inverter o referido ónus que recai sobre a administração tributária [a inscrição no registo comercial da nomeação de alguém como gerente apenas resulta a presunção legal (cf. artigo 11º do Código do Registo Comercial) de que é gerente de direito, não de que exerce efectivas funções de gerência] e só quem goza de uma presunção legal, escusa de provar o facto a que ela conduz (artigo 350º, nº 1, do CC)”;

18ª- Todavia, o despacho de reversão somente fundou o exercício pela Recorrente da gerência de facto da executada originária numa alegada “presunção judicial de gerência de facto” retirada da mera gerência de direito com dispensa da prova do exercício de facto daquele cargo;

19ª- Quando, na verdade, era ainda necessário e essencial que o órgão de execução fiscal competente, in casu, o Serviço de Finanças, também tivesse fundamentado a reversão em causa nestes autos com base no exercício de facto da gerência pelos Opoentes, sustentando aquelas decisões em factos concretos e determináveis;

20ª- Não existem presunções, legais ou judiciais, que impõem que, verificada a gerência de direito, se infira exercício de facto daquele cargo e incumbindo à Recorrida o ónus da prova desse requisito legal” - cfr. Acórdão do TCA do Norte proferido em 13/03/2014 no âmbito do Proc. Nº 01517/07.1BEPRT.

21ª- Sem prescindir, acresce que a executada originária foi declarada insolvente por sentença transitada em julgado em 26 de Dezembro de 2008;

22ª- Com efeito, preceitua Nº 5 do artº 180º do CPPT que “Se a empresa, o falido ou os responsáveis subsidiários vierem a adquirir bens em qualquer altura, o processo de execução fiscal prossegue para cobrança do que se mostre em dívida à Fazenda Pública, sem prejuízo das obrigações contraídas por esta no âmbito do processo de recuperação, bem como sem prejuízo da prescrição”;

23ª- Pelo que se pode concluir que os requisitos legais dos quais depende a reversão das dívidas fiscais da devedora originária para a Recorrente também se encontram consagrados, para além dos artigos 23.º e 24.º da LGT, no citado Nº 5 do artigo 180.º do CPPT;

24ª- In casu, nem sequer foi alegado para efeitos de preparação do processo para efeitos de reversão ou ainda no despacho de reversão, a aquisição pela insolvente ou pela Recorrida de bens após a declaração da insolvência da devedora originária;

25ª- Deste modo, por tudo supra exposto, se pode concluir, por não se encontrarem demonstrados todos os pressupostos legais de que depende a efetivação da responsabilidade subsidiária prevista nos artigos 23.º e 24.º da LGT e, ainda, no artigo 153.º do CPPT e, ainda, pela violação do disposto no N.º 5 do artigo 180.º do CPPT, o Ex.mo Tribunal recorrido deveria ter julgado procedente a invocada exceção de ilegitimidade substantiva da Recorrente nestes autos executivos em crise.

26ª- No que concerne à culpa da Recorrente na insuficiência ou inexistência do património da devedora originária ou por falta de pagamento, houve erro notório na apreciação da prova produzida em julgamento, pois resultou inequívoco do depoimento da testemunha inquirida, R… que a falta de pagamento dos impostos em crise não derivou de um comportamento culposo, ou sequer negligente da Recorrente.

27ª- Pelo que se pode concluir que a douta decisão recorrida também padece do vício de erro notório de apreciação da prova testemunhal produzida nos autos, porquanto desta resulta, de forma evidente, que o Ex.mo Tribunal devia ter julgado como provada a matéria de facto elencada sob as alíneas a) a d) dos Factos não provados;

28ª- Salvo o devido respeito pelo entendimento plasmado na douta sentença recorrida, o despacho de reversão, contrariamente ao legalmente preceituado, não está devidamente fundamentado;

29ª- Por um lado, do despacho de reversão em crise apenas alega parte dos pressupostos legais dos quais dependia a - válida e legal – fundada responsabilidade subsidiária da Recorrente, sendo omisso quanto aos factos relativos à gerência de facto e à aquisição de bens previsto no artº 180º Nº 5 do CPPT;

30ª- Mais acresce que, fazendo tábua rásua do alegado em sede de audiência prévia, o despacho de reversão limitou-se a referir que quanto “ao ponto 2 (…) existem elementos nos autos que sustentam a potencial revertida (…) exerceu funções de gerência de facto e de direito (…) pelo que não haverá quaisquer novos elementos a ponderar na fundamentação da decisão, como determina o n.º 7 do art. 60.º da LGT”;

31ª- O que não pode deixar de configurar-se como uma situação de insuficiência de fundamentação, a qual a lei equipara à falta de fundamentação e que, por força dos disposto o nº 2 do artigo 125º e artigo 135º do CPA, origina a anulação de tal despacho;

32ª- Razões supra enunciadas pelas quais, ao julgar improcedente a oposição deduzida, a douta decisão, para além de outras que Vossas Excelências doutamente suprirão, não interpretou nem aplicou corretamente diversas normas legais, assim as violando, nomeadamente: os artigos 123º, 125º, 153º e 180º do CPPT; 615º do CPC; 23º, 24º, 60º e 74º da LGT; 88º do CIRE; 268º da CRP; 350º do Código Civil; 100º, 125º e 135ºdo CPA e, ainda, 11º do Cód. de Registo Comercial.

Termos em que, por tudo o exposto, pelo mérito dos autos e pelo que mui doutamente será suprido, deve o presente recurso ser julgado procedente e, por via dele, a douta sentença recorrida ser declarada nula por falta de pronúncia e, ou ser substituída por outra decisão que julgue a Oposição deduzida nestes autos totalmente procedente, por provada, nomeadamente pela verificação da invocada exceção de ilegitimidade substantiva da Recorrente ou da nulidade do despacho de reversão, tudo com as legais consequências.

CONFORME É DE JUSTIÇA.


Não foram apresentadas contra-alegações.

A Exma. Procuradora - Geral Adjunta junto deste Tribunal emitiu douto parecer no sentido de dever ser negado provimento ao recurso.

Colhidos os vistos legais, cumpre agora decidir, já que a tal nada obsta.

Objecto do recurso - Questões a apreciar e decidir:

As questões suscitadas pela Recorrente, e delimitadas pelas alegações de recurso e respectivas conclusões, são as seguintes: (i) saber se a sentença recorrida enferma de nulidade por omissão de pronúncia e falta de fundamentação; (ii) saber se a sentença recorrida errou no julgamento quanto à verificação dos pressupsotos para a efectivação da responsabilidade subsidiária da Oponente; (iii) do erro de julgamento de facto e de direito quanto ao requisito da culpa pela insuficiência do património societário para o pagamento da dívida exequenda; (iv) saber se a sentença recorrida errou ao concluir pela não verificação do vício de falta de fundamentação do despacho de reversão.

2. Fundamentação

2.1. Matéria de Facto

2.1.1. É a seguinte a matéria de facto dada como provada e como não provada na sentença recorrida e que damos por reproduzida ipsis verbis:
Factos Provados:

1) O Serviço de Finanças de Vizela instaurou em 8.08.2006 o processo de execução fiscal n.º 4200200601013912 em nome de “A… Confecções Unipessoal, Lda.”, NIPC 5…, por dívidas de IVA dos períodos de 0601 no montante de €1.778,54 – cfr. fls. 1 e 2 do processo de execução fiscal (PEF) junto aos autos.

2) Em 26.12.2008 o Tribunal Judicial de Guimarães proferiu sentença declarando a insolvência da empresa “A… Confecções Unipessoal, Lda.”, NIPC 5…– cfr. fls. 76 a 79 dos autos.

3) Em 8.09.2007 foi entregue pela empresa A… Confecções Unipessoal, Lda. à DGCI, via Internet, a declaração de Informação Empresarial simplificada, de onde consta do campo A0267 o valor de €59.981,42 - cfr. fls. 88 a 99 do PEF junto aos autos.

4) No âmbito do processo de execução fiscal descrito em 1) e processos apensos n.º 4200200601015710 por dívidas de IVA no montante de €4.091,96, n.º 4200200601021931, por dívidas de IVA no montante de €3.034,46, n.º 4200200701017764 por dívidas de IRC no montante de €2.113,92, foi proferido pelo Chefe do Serviço de Finanças de Vizela “Informação para efeitos de reversão de execução - cfr. fls. 26 e 27 do PEF junto aos autos.

5) Em sede de exercício de audição prévia a Oponente invocou a “nulidade da notificação”, assim como a “falta de verificação dos pressupostos legais para a reversão” - cfr. fls. 33 a 35 do PEF junto aos autos.

6) Em 8.04.2010 o Chefe do Serviço de Finanças de Vizela proferiu despacho com o seguinte teor: “ (…) Conforme certidão de matrícula da Conservatória de Registo Comercial de Vizela, foi declarada a insolvência e nomeação de administrador judicial em processo de insolvência com sentença transitada em julgado em 26-12- 2008 e cuja decisão judicial de encerramento do processo de insolvência data de 04- 06-2009.

Considerando que na certidão de registo de matrícula emitida pela Conservatória do Registo Comercial a gerência era exercida pela referida eventual responsável; Considerando que, e após consulta ao processo individual do IVA, se verifica a existência de uma declaração de início de actividade datada de 12-05-2003 e uma declaração de alterações de actividade datada de 30-03-2006 assinadas pela eventual responsável A...;

- permite-nos concluir que a gerência, quer de facto quer de direito, era exercida pela eventual revertida; Considerando que, conforme diligências efectuadas com recurso aos Sistemas Informáticos da DGCI, onde constam os bens ou rendimentos penhoráveis dos devedores, nomeadamente o Sistema Informático de Penhoras Automáticas (SIPA), constata-se a inexistência de bens da executada para o pagamento integral da dívida.

Verificando-se a inexistência de bens da devedora originária, ora executada, que respondam pelo pagamento da dívida, estão pois verificadas as condições previstas nos termos da aI. a) do n.º 2 do art.? 153.º e art.º 159.º do Código de Procedimento e Processo Tributário (CPPT) e n.º 2 do art. 23° da Lei Geral Tributária (LGT), para o chamamento à execução, dos responsáveis subsidiários, de acordo com a legislação em vigor no momento do exercício do seu cargo e no momento de constituição de responsabilidade, revertendo assim contra estes a execução.

Nos termos da aI. b) do n.º 1 do artigo 24° da LGT, os administradores, directores e gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração ou gestão em pessoas colectivas são subsidiariamente responsáveis em relação a estas e solidariamente entre si, pelas dívidas tributárias cujo facto constitutivo e/ou prazo legal de pagamento se tenha verificado no período de exercício do seu cargo.

Assim, considerando os momentos de constituição da responsabilidade subsidiária, ao conjugar estes com a legislação então vigente temos que é (são) subsidiariamente responsável(is) pelo pagamento da seguinte importância por dívidas de IVA e IRC:

o A... responde pelo pagamento de € 11.018,88 relativo ao seu período de gerência, sócia gerente da sociedade desde a sua constituição em 08-05-2003, conforme certidão de matrícula da Conservatória de Vizela.

Nos termos dos art.ºs 23º e 24º da Lei Geral Tributária, conjugado com a alínea a) do n.º 2 do art.º 153.° e art.º 159.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, com os fundamentos acima referidos, PROPONHO que se proceda à reversão da dívida contra a gerente A...."

Despachado esse sentido de decisão, deu-se cumprimento ao nº 4 do artigo 23° da Lei Geral Tributária (LGT), tendo o potencial revertido A... exercido o direito de audição prévia.

Considerando que se encontra registada a nomeação ou designação de gerência na competente Conservatória do Registo Comercial do contribuinte A..., o que constitui presunção legal de que essa situação jurídica existe, nos precisos termos em que aí é definida, de harmonia com o disposto no art. 11.º do Código do Registo Comercial, assim se presumindo a gerência de direito; Considerando que segundo informação prestada a este Serviço pelo Instituto de Gestão da Segurança Social - Delegação de Braga, através do Ofício com a referência NGA-UPA, de 10-03-2010, a eventual responsável A..., consta como membro de órgão estatutário (gerente) da firma executada, nos períodos de Maio de 2003 a Setembro de 2006;

Considerando que, e após consulta ao processo individual do IVA, se verifica a existência de uma declaração de início de actividade datada de 12-05-2003 e uma declaração de alterações de actividade datada de 30-03-2006 assinadas pela eventual responsável A...;

Relativamente à gerência de facto, e provada que está a gerência nominal ou de direito, presume-se o exercício daquela pela responsável subsidiária da sociedade executada, porque uma vez feita a prova de gerência de direito, e porque dela se infere, naturalmente o exercício de uma gerência real ou de facto, a Administração Fiscal passa a beneficiar da presunção judicial da gerência de facto, ficando assim também dispensada da sua prova para obter a reversão da execução fiscal contra o gerente nominal;

Ainda que assim não fosse, existem elementos nos autos que sustentam que o visado exerceu a gerência de facto da originária devedora.

Atendendo a que o termo do prazo legal de pagamento das dívidas tributárias cuja responsabilidade subsidiária está a ser exigida, e de cujo teor dos títulos executivos se junta fotocópia, e de seguida se esquematiza, (…) verificou-se no período de exercício do respectivo cargo de gerente, a que se refere a alínea b) do n.º 1 do artigo 24.° da LGT - Presunção legal de culpa, e provada que foi a gerência de direito e de facto do potencial revertido, a Administração Fiscal fica dispensada de provar essa culpa, pois como determina o n. ° 1 do art. 350ºdo Código Civil, quem tem a seu favor uma presunção legal escusa de provar o facto a que ela conduz, pelo que competirá ao gerente ilidir a referida presunção mediante prova em contrário, demonstrando, sem margem para dúvidas, que não ocorreu aquela presumida culpa.

Tendo sido notificada para exercer o direito de audição e, nos termos das respectivas disposições legais, ilidir a presunção legal de culpa que recaiu sobre ele, não alegou nada que pudesse mudar o sentido da decisão, pelo que não haverá quaisquer novos elementos a ponderar na fundamentação da decisão, como determina o n.º 7 do art. 60.º da LGT;

Assim, considerando os elementos atrás referidos, nos termos dos artigos 23° e 24° da Lei Geral Tributária, conjugados com a alínea a) do n.º 2 do artigo 1530 e artigo 159° de Procedimento e de Processo Tributário, REVERTO a presente execução contra A... pelo valor de € 11.018,88.

Proceda-se à citação do revertido, nos termos e condições definidas nos artigos 160°, 189° e 191° n.º 3 do Código de Procedimento e de Processo Tributário, para o pagamento da quantia exequenda de que era originária devedora A… CONFECÇÕES UNIPESSOAL LDA NIPC: 5…, dentro dos limites antes mencionados, no prazo de 30 dias, referido no art. 203° do mesmo Código, sem juros nem custas, nos termos do n.º 5 do art. 23° da Lei Geral Tributária. (…)”– cfr. fls. 42 a 44 dos autos.

7) A oponente recepcionou o ofício n.º 709, dando-lhe conta do descrito em 6), em 16.04.2010 – cfr. fls. 47 a 50 do PEF junto aos autos.

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Factos não provados

Considera-se que não ficaram provados os seguintes factos:

a) Os clientes da devedora originária não lhe pagaram os serviços prestados.

b) O maior credor da devedora originária penhorou todas as máquinas e outros equipamentos que constituíam o activo da empresa.

c) A devedora originária perdeu os seus principais clientes, por força da insolvência daqueles.

d) Na sequência do que se alude em c), a devedora originária não recebeu o IVA a que corresponde a quantia exequenda.

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Motivação da decisão de facto

O Tribunal considerou provada a matéria de facto relevante para a decisão da causa com base na análise crítica e conjugada dos documentos juntos aos autos, que não foram impugnados, assim como, na parte dos factos alegados pelas partes que não tendo sido impugnados [cfr. artigo 74º da Lei Geral Tributária (LGT)], também são corroborados pelos documentos juntos, conforme predispõe o artigo 76º n.º 1 da LGT e artigo 362º e seguintes do Código Civil, assim como no depoimento da testemunha inquirida.

Os factos não provados resultaram da ausência de prova apresentada para o efeito, quer pela falta de documentos que atestassem nesse sentido e/ou confirmação por parte da testemunha ouvida.

R…, desempregado, trabalhou na devedora originária de 2004 a 2006 fazendo de tudo um pouco, ajudando também na parte de escritório e foi indicado para responder aos factos constantes dos artigos 10º a 24º da petição inicial.

Ao que lhe foi perguntado respondeu com seriedade e credibilidade. Não obstante ter demonstrado deter alguns conhecimentos dos factos a que foi inquirido, não o fez com a precisão que se impunha, considerando o Tribunal que grande parte das suas afirmações resultaram de juízos opinativos.


2.2. O direito

2.2.1. Efeito do recurso
Decorre do despacho de admissão do recurso da sentença que se encontra a fls. 134 dos presentes autos que a esse recurso foi atribuído efeito meramente devolutivo.

Nas conclusões 1ª a 3ª das alegações de recurso, a Recorrente impugna o efeito do recurso e pede que lhe seja atribuído efeito suspensivo da decisão recorrida.

Ora, em processo tributário, a regra é a de que os recursos têm efeito meramente devolutivo, salvo se for prestada garantia ou o efeito devolutivo afectar o resultado útil do recurso (artigo 286º, nº2, do CPPT).

No caso, não há notícias nos autos de que tenha sido prestada garantia (nem a Recorrente o invoca), pelo que resta verificar se o efeito devolutivo afecta o efeito útil do recurso.

Enquadram-se nesta hipótese, de o efeito devolutivo afectar o efeito útil dos recursos, situações em que a execução imediata da decisão “possa provocar uma situação irreparável, o que acontecerá quando não se possa reconstituir a situação existente, no caso de provimento do recurso” - assim Jorge Lopes de Sousa, in CPPT anotado e comentado, Volume IV, 6ª edição, 2011, Áreas Editora, p. 509.

No caso, não se vislumbra que ocorra uma tal situação, sendo certo, aliás, que a Recorrente se limita a alegar, sem qualquer concretização, que “o prosseguimento dos autos executivos e a consequente prática de actos de execução e penhora se podem revelar limitativos do direito de propriedade da recorrente e ofensivos dos princípios de natureza constitucional que se pretendem ver salvaguardados”.

Como salienta Jorge Lopes de Sousa, na obra citada “o que está em causa, na atribuição de efeito devolutivo ou suspensivo e na apreciação do efeito útil do recurso, é a própria suspensão de efeitos da decisão recorrida e não do processo em que ela foi proferida. O efeito suspensivo do recurso também não implica suspensão do processo de execução fiscal que esteja pendente para cobrança da dívida cuja legalidade esteja a ser discutida no processo em que o recurso for interposto”, já que a suspensão da execução fiscal só tem lugar nos casos previstos na lei, concretamente no artigo 52º da LGT e 169º e 170º do CPPT. Quer isto dizer, pois, como salienta o mesmo autor, que pelo facto de ser atribuído efeito suspensivo a um recurso jurisdicional, por se entender que a atribuição de efeito devolutivo afecta o seu efeito útil, o processo de execução fiscal não fica suspenso, se não se verificarem os requisitos de que depende a sua suspensão”.

Em suma, a alegada limitação do direito de propriedade da Recorrente não justifica a aplicação da excepção à regra do efeito devolutivo dos recursos.

Nestes termos, improcede o pedido de alteração do efeito do recurso formulado pela Recorrente, mantendo-se o efeito meramente devolutivo fixado pelo despacho que o admitiu.

2.2.2. Quanto ao mérito

2.2.2.1. A primeira questão que importa apreciar, por contender com a sua validade formal, é a de saber se a sentença enferma de nulidade por omissão de pronúncia e por falta de fundamentação.

Como resulta do disposto no artigo 125º, nº 1 do CPPT [e outrossim no artigo 615º, nº1, alínea d) do CPC], constitui causa de nulidade da sentença a falta de pronúncia sobre questões que o juiz deva apreciar.

Esta nulidade está directamente relacionada com o dever que é imposto ao juiz pelo artigo 608º, nº 2 do CPC, em que se estabelece que o juiz deve resolver todas as questões suscitadas pelas partes, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, salvo se lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras.

É entendimento pacífico e reiterado da nossa jurisprudência de que só se verifica esta nulidade quando existe a violação dos deveres de pronúncia do tribunal sobre questões que deva apreciar; não devendo confundir-se, no entanto, questão a decidir com considerações, argumentos, motivos, razões ou juízos de valor produzidos pelas partes: a estes não tem o tribunal que dar resposta especificada ou individualizada, mas apenas aos que directamente contendam com a substanciação da causa de pedir e do pedido (entre muitos, acórdãos do STJ, de 19/2/2004 e de 31/3/2004, Processos 04B036 e 04B545, respectivamente).

Por outro lado, também é nula a sentença que não especifique os fundamentos de facto e de direito [artigos 125º, nº 1 do CPPT e 615º, nº1, alínea b) do CPC].

A Recorrente alega que a sentença é nula por omissão de pronúncia, por não ter apreciado todos os pressupostos dos quais depende a responsabilidade subsidiária, nomeadamente o exercício da gerência de facto pela Oponente e a falta de verificação dos pressupostos previstos no artigo 180º, nº 5 do CPPT.

Ora, os únicos fundamentos da oposição invocados na petição inicial foram: (i) a falta de ponderação do alegado em sede de audição prévia (artigos 1 a 7 da petição inicial); (ii) sob o título “da falta de verificação dos pressupostos legais para a reversão”, a falta de culpa na entrega das quantias exequendas (artigos 8 a 28 da petição inicial).

E foram precisamente estes os fundamentos que o tribunal recorrido apreciou e decidiu.

Com efeito, importa sublinhar que sob o título “da falta de verificação dos pressupostos legais para a reversão”, a Oponente limitou-se a questionar a sua legitimidade para a execução fiscal através da alegação de factos que tendiam a afastar a sua culpa pelo não pagamento das dívidas tributárias aqui em questão.

Ora, no direito tributário também tem aplicação, ao nível da alegação, o princípio do dispositivo (como decorre nomeadamente dos artigos 99º, nº 1 da LGT e 13º, nº 1 do CPPT), competindo à parte alegar os factos em que fundamenta a sua pretensão, sendo certo que a Oponente não só não alegou na petição inicial qualquer factualidade para além da relativa à ausência de culpa, como nem sequer invocou o não exercício da gerência de facto da sociedade executada ou a falta de verificação dos pressupostos no artigo 180º do CPPT (a que, aliás, nem sequer alude na petição inicial), o que só agora veio fazer em sede de recurso.

Deste modo, e ao contrário do que vem dito pela Recorrente, o tribunal recorrido apreciou todas as questões que lhe foram colocadas na petição inicial, sendo que também nenhuma das questões agora referidas pela Recorrente é de conhecimento oficioso.

Pretende ainda a Recorrente que a sentença recorrida também padece de falta (decorrente de deficiência) de fundamentação quanto à alegada desconsideração dos fundamentos apresentados no exercício do direito de audição.

Com o devido respeito, também não tem razão neste ponto.

A propósito desta questão, escreveu-se na sentença recorrida: Quanto à alegada desconsideração dos fundamentos apresentados no exercício do direito de audição por parte da Oponente permitimo-nos transcrever o expendido pelo Magistrado do Ministério Público por traduzir o pensamento deste Tribunal.

Com efeito, consideramos que o exercício legal do direito de audição não compele a autoridade competente a alterar o sentido da decisão nem, tão pouco, acarreta o dever jurídico de consignar uma exaustiva e pormenorizada explanação sobre o seu teor, incompatível, de resto, com a economia dos preceitos legais: a fundamentação será «sumária» e com uma «sucinta exposição», determinam eles”.

Ademais, sempre será de referenciar que do despacho de reversão decorre que a Administração Tributária analisou os argumentos apresentados, não tendo no entanto considerado que alterassem de alguma forma o projecto de reversão (cfr. ponto 6) do acervo probatório).
Pelo que, apenas podemos concluir pela improcedência da argumentação expendida, por não provada, no que a este fundamento concerne.”

Daqui resulta evidente que a sentença recorrida também fundamentou, ainda que sumariamente, a decisão nesta parte.

Ademais, a falta de fundamentação susceptível de integrar a nulidade prevista no actual artigo 615º, nº 1, alínea b), do CPC é apenas a que se reporta à falta absoluta de fundamentos (quer referentes aos factos quer ao direito), que não uma fundamentação escassa, deficiente - assim, Antunes Varela e outros, Manual de Processo Civil, p. 687, Fernando Amâncio Ferreira, Manual de Recursos em Processo Civil, p. 55.

Do que vimos de dizer se conclui que não só o tribunal recorrido se pronunciou expressamente sobre todas as questões suscitadas pela Recorrente na petição inicial, como o fez fundamentadamente, improcedendo, portanto, a invocada nulidade da sentença por omissão de pronúncia e por falta de fundamentação.
2.2.2.2 Nas conclusões 14ª a 24ª das alegações de recurso, sustenta a Recorrente que a administração tributária não demonstrou a verificação de todos pressupostos da responsabilidade subsidiária previstos nos artigos 23º e 24º da LGT, e ainda no artigo 153º do CPPT, e, por outro lado, violou o disposto no artigo 180º, nº 5 do CPPT (em virtude da insolvência da devedora originária).

Estas questões - não exercício da gerência de facto da devedora originária pela Oponente e insolvência daquela e a não verificação dos pressupostos previstos no artigo 180º, nº 5 do CPPT para a prossecução da execução - correspondem precisamente às questões relativamente às quais a Recorrente pretende ter ocorrido omissão de pronúncia e que analisamos no ponto anterior.

Ora, como aí dissemos, estas questões não foram suscitadas pela Oponente na petição inicial e, consequentemente, não foram (nem podiam ter sido, por não serem do conhecimento oficioso) apreciadas pelo tribunal recorrido.

Como assim, as questões que a Recorrente agora pretende ver apreciadas constituem, em rigor, questões novas.

Ora, como se extrai da norma do artigo 628º, nº 1 do CPC, os recursos jurisdicionais são um meio processual específico de impugnação de decisões judiciais e como tal, o tribunal de recurso está impedido de apreciar questões novas, com excepção daquelas que sejam de conhecimento oficioso ou suscitadas pela própria decisão recorrida sob pena de se produzirem decisões em primeiro grau de jurisdição sobre matérias não conhecidas pelas decisões recorridas assim, Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário, Anotado e Comentado, Volume II, 2007, p. 786.

Assim, o tribunal de recurso não pode conhecer de questão que não tenha sido oportunamente suscitada perante a 1.ª instância, que esta não tenha conhecido e que não seja do conhecimento oficioso, pois os recursos visam, em geral, e com excepção das questões de conhecimento oficioso, modificar as decisões recorridas e já não apreciar questões não decididas pelo tribunal a quo.

Não se compreende, aliás, que a Recorrente venha agora, em sede de recurso, invocar a falta da gerência de facto da sociedade executada, quando, implicitamente, a reconheceu na petição inicial a propósito da invocada ausência da culpa pelo não pagamento das dívidas tributárias [com efeito, alegou a Oponente na petição inicial nomeadamente que: “sendo certo que, não obstante, a Oponente ainda ter tentado proceder a uma reestruturação da empresa, através da procura de novos clientes e da negociação das dívidas vencidas, da contracção de empréstimos particulares e de redução de pessoal (artigo 12º); “Contudo, as medidas que foi possível empreender, não foram suficientes para a obtenção de novos clientes e novas encomendas e, assim, recuperar definitivamente a empresa”; (artigo 13º); “sendo que as que conseguiu angariar, invariavelmente impunham preços mais baixos” (artigo 14º)].

Improcedem, pois, as conclusões 14ª a 24ª das alegações de recurso.

2.2.2.3. Mas a Recorrente imputa também erro de julgamento de facto à sentença recorrida, por erro notório na apreciação da prova testemunhal produzida nos autos.

Alega a Recorrente que do depoimento da testemunha inquirida, R…, resultou inequívoco que a falta de pagamento dos impostos em crise não derivou de um comportamento culposo ou sequer negligente da Recorrente, devendo o tribunal recorrido ter dado como provado, com base nesse depoimento, a matéria de facto elencada sob as alíneas a) a d) dos factos não provados.

A alteração da decisão da matéria de facto por este Tribunal pressupõe que, para além da indicação dos concretos pontos de facto incorrectamente julgados, sejam indicados os concretos meios de prova constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada capazes de impor decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida (artigos 640º, nº 1 e 662º, ambos do CPC).

A Recorrente tinha, por isso, de indicar os meios de prova que permitiriam dar os referidos factos como provados e tendo sido produzida prova testemunhal, estava ainda obrigados a indicar os depoimentos, com referência ao assinalado na acta, que implicava que a decisão tivesse sido outra que não a que consta da sentença, sob pena de rejeição do recurso nessa parte, face ao estatuído no artigo 640º, nº 1 e 2 do CPC.

Tal ónus foi cumprido pela Recorrente, tendo esta indicado, além dos factos que deveriam ser considerados provados, as concretas passagens da gravação do depoimento em que, no seu entendimento, se funda o erro do Tribunal a quo na apreciação da prova (cf. alegações de recurso).

No caso, entendeu o Tribunal recorrido que o depoimento da (única) testemunha arrolada pela ora Recorrente não era suficiente para dar como provados os factos alegados na petição inicial. E fundamentou tal conclusão referindo, no essencial, que embora a testemunha tivesse demonstrado ter alguns conhecimentos dos factos, não o fez com a precisão que se impunha, sendo que grande parte das suas afirmações resultaram de juízos opinativos.

Importa, portanto, apurar se o tribunal incorreu em erro na apreciação e valoração da prova (testemunhal) produzida nos autos ao não ter dado como provada a factualidade referida nas alíneas a) a d) dos “factos não provados".

Procedemos à audição do registo magnético do depoimento da testemunha R….

Esta testemunha disse ter trabalhado na devedora originária entre 2004 e 2006 e fazer de tudo um pouco na mesma (v.g. levar e trazer mercadoria, ajudar no escritório); afirmou, de relevante, tratar-se de uma empresa com pequena dimensão (cerca de 8 trabalhadores), que trabalhava a feitio para outras empresas e que encerrou em virtude da falta de encomendas e apesar dos esforços feitos pela Oponente, nomeadamente esmagando preços para angariar clientes, e que privilegiava o pagamento aos fornecedores e aos trabalhadores em detrimento das Finanças.

Afirmou ainda que a devedora originária recebeu o pagamento pelos fornecimentos efectuados e que a Oponente não dissipou património da empresa.

Em concreto, sobre a matéria em causa nas referidas alíneas a) a d) dos factos não provados (e que a Recorrente pretende ter ficado provada com este depoimento) limitou-se a referir, de forma vaga, que as Finanças penhoraram as máquinas e equipamentos da empresa (sem, contudo, precisar em que data) e que a devedora originária recebeu os serviços prestados, incluindo o IVA.

Assim sendo, não só este depoimento foi pouco preciso, como bem disse a Meritíssima Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, como, na parte relativa aos pagamentos, foi até em sentido contrário ao pretendido pela Recorrente.

Deste modo, é de concluir que a prova testemunhal apresentada é manifestamente insuficiente para dar como provados os factos em causa, ou seja, a única prova disponível nos autos é insuficiente para justificar decisão de facto diversa da proferida pelo tribunal recorrido.

Em suma, o tribunal de 1ª instância não incorreu em qualquer erro na apreciação e valoração da prova produzida nos autos quando, nos termos que vimos de referir, não deu como provados os factos pretendidos pelo Recorrente, improcedendo, consequentemente, o alegado erro de julgamento de facto.

2.2.2.4. E perante a factualidade assente no probatório, a sentença recorrida concluiu que a Oponente não demonstrou nos autos a inexistência de culpa pelo não pagamento das dívidas exequendas.

A este propósito, escreveu-se na sentença recorrida: “No caso que aqui nos ocupa, a Oponente veio sustentar não ser responsável pela falta de pagamento dos créditos exequendos, especificando, como supra enunciado, os factos ocorridos.

Ora, apesar dos factos alegados, a Oponente não logrou fazer prova do invocado, quer por meio de prova documental e/ou prova testemunhal. Prova que lhe competia fazer por forma a proceder a sua pretensão.

A Oponente não logrou juntar aos autos qualquer documento comprovativo da falta de pagamento por parte dos seus clientes ou de qualquer diligência realizada nesse sentido, seja graciosa ou judicialmente e ainda do não recebimento do IVA pela prestação de serviços efectuada (cfr. pontos a) e d) da matéria de facto não assente). Acresce que, além de parca, a prova testemunhal apresentada não logrou confirmar o invocado pela Oponente, na medida em que somente se extrai daí que a devedora originária desde sempre se debateu com problemas por falta de encomendas e com a prática de preços baixos.

Ora, impunha-se que a Oponente demonstrasse documentalmente por meio dos seus registos contabilísticos o alegado.

A oponente também não apresentou nenhuma prova concreta das medidas tomadas no sentido de recuperar a executada, nem quanto a medidas destinadas a satisfazer os interesses dos credores da executada, nomeadamente com a apresentação à falência ou recurso a processo de recuperação de empresa. Acresce que, e, conforme vertido no probatório, ponto 3), da declaração de Informação Empresarial Simplificada (vulgo IES), decorre que a devedora originária tinha ao seu dispor no final do exercício de 2006, na conta caixa, €59.981,42.

Atendendo à quantia exequenda aqui em questão, €11.018,88, podemos concluir que a Oponente destinou tal montante a outros fins que não o pagamento de impostos.

A par, quanto às dívidas de IVA, sendo a sua base tributável limitada ao valor acrescentado em cada fase num determinado circuito económico, cada operador é devedor ao Estado pelo valor do imposto facturado aos clientes nas vendas e credor pelo total do imposto suportado nas compras efectuadas que confiram direito à dedução nesse mesmo período.

Assim, o sujeito passivo de IVA não deixa de ser um mero fiel depositário da prestação tributária que decorre da relação de confiança estabelecida entre o Estado e os agentes económicos, relação essa quebrada quando não se verifica a entrega do imposto liquidado.

Ademais e conforme jurisprudência firme e reiterada, não se encontra na disposição dos sujeitos passivos de imposto a possibilidade de optar entre a entrega do IVA ao Estado e o pagamento dos demais débitos incorridos pelo exercício da actividade da empresa.

Isto posto, conclui-se que o pagamento do IVA em causa nos presentes autos não estava na disponibilidade da devedora originária, nem lhe cabia a opção de não o entregar.

Tornava-se necessário que provasse que a falta de cumprimento da obrigação de pagamento da dívida exequenda foi de todo alheia à sua vontade, demonstrando que tomou todas as diligências que um gerente prudente e responsável teria tomado nas mesmas circunstâncias para cumprir tais obrigações

Não resulta comprovado que a Oponente tenha agido diligentemente, por forma a evitar, em tempo útil, que o património da sociedade se tornasse insuficiente para o respectivo pagamento das dívidas fiscais, como, por exemplo, a reconversão da empresa para outro ramo de actividade, ou mesmo o seu terminus, apresentando a empresa a falência previamente ao acumular de mais dívidas.

Concludentemente, não logrando carrear para os autos a prova atinente à tese que sustentou - inexistência de culpa - a questão decidenda terá de ser contra si decidida, tal como decorrem das regras do ónus da prova determinado pelo artigo 342° do Código Civil e artigo 74° da LGT, em consonância com o dever que sobre si impendia decorrente da alínea b) do n.º 1 do artigo 24º da LGT.

Assim, a actuação da Oponente é passível de censura, porquanto nas circunstâncias em concreto, podia e devia ter agido de modo diverso, actuando como um gestor prudente e competente, como um “bonus pater familias”, improcedendo o que vem alegado.”

Concordamos inteiramente com o assim decidido.

Na verdade, para ilidir a presunção de culpa pela falta de cumprimento das obrigações tributárias, a Recorrente estava obrigada a alegar e, subsequentemente, provar, que não existiu qualquer relação causal entre a sua actuação enquanto gerente da executada originária e a falta de pagamento do imposto, sabido que aos gerentes é exigível uma postura responsável e ponderada, que corresponda a uma actuação que, de acordo com o exigível a um administrador criterioso colocado em idêntica situação e dentro da inerente discricionariedade que é própria do exercício de tais funções, se mostre, em princípio, como adequada ao alcance dos objectivos para que a sociedade se constituiu - cf., acórdão do TCAN de 23/11/2011, Processo 0972/09.0.

Impunha-se, pois, que a Oponente tivesse feito prova de que a falta de pagamento dos tributos não lhe foi imputável e isso passava pela demonstração da falta de fundos da sociedade originária devedora para efectuar o pagamento das dívidas exequendas e de que tal falta se não deveu a qualquer omissão ou comportamento censuráveis do gestor.

No caso, manifestamente, essa prova não foi feita. Com efeito, instruído o processo e realizada a inquirição da testemunha arrolada (única prova disponível nos autos) nenhum dos factos alegados na petição inicial no sentido de afastar a culpa da Oponente resultou provado. Na factualidade assente não consta qualquer facto no sentido de afastar a culpa da Oponente pela não entrega das quantias referentes ao IVA e IRC aqui em causa. Ademais, em sede de julgamento sobre a matéria de facto, os factos dados como não provados foram precisamente os factos alegados pela Recorrente com vista a afastar a sua culpa, sem que esse julgamento tenha sido alterado por este Tribunal.

Improcede, pois, também este fundamento do recurso.

2.2.2.5. Nas conclusões 28ª a 31ª das alegações de recurso, imputando simultaneamente erro de julgamento e nulidade por insuficiente fundamentação à sentença recorrida, insiste a Recorrente que o despacho de reversão não está devidamente fundamentado.

Com o devido respeito, não tem razão.

A decisão que determina a reversão, após audição do responsável subsidiário, ainda que proferido no processo de execução fiscal que tem natureza judicial (artigo 103º, nº 1 da LGT), é um acto administrativo (tributário), pelo que tem de ser fundamentado (artigo 268º, nº 3 da Constituição da República Portuguesa, artigo 23º, nº 4 e artigo 77º, nº 1, ambos da Lei Geral Tributária).

Na fundamentação do despacho de reversão hão-de constar as normas legais que determinam a imputação da responsabilidade subsidiária ao revertido, por forma a permitir-lhe o eventual exercício esclarecido do direito de defesa (artigo 77º, nº1 da LGT), bem como “a declaração fundamentada dos seus pressupostos e extensão, a incluir na citação” (artigo 23º, nº 4 da LGT).

A insuficiência da fundamentação é equiparada à sua falta, tendo as mesmas consequências: anulação do acto (artigos 125º, nº 2, e 135º, do CPA).

O Supremo Tribunal Administrativo tem vindo a entender que a fundamentação formal do despacho de reversão basta-se com a alegação dos pressupostos e com a referência à extensão temporal da responsabilidade subsidiária que está a ser efectivada (cf., por todos, acórdão do Pleno da Secção Tributária de 16/10/2013, recurso n.º 0458/13).

Estando em causa a reversão de uma execução contra um gerente de uma sociedade, além da inexistência ou insuficiência dos bens do devedor originário, é pressuposto da responsabilidade subsidiária do responsável subsidiário, o exercício de facto da gerência da devedora originária (artigo 24º da LGT), pelo que é necessário que do despacho de reversão conste, no mínimo, a alegação de que o pretenso responsável exerceu efectivamente o cargo de gerência.

Embora o argumento de que o despacho de reversão é omisso quanto aos factos relativos à gerência de facto e as aquisições de bens prevista no artigo 180º, nº 5 do CPPT esteja a ser invocado ex novo em sede de recurso e que, por isso mesmo, não foi sequer abordado pelo tribunal recorrido, sempre se diga que não colhe.

Na verdade, analisado o despacho de reversão, transcrito no ponto 6) do probatório, constata-se que no mesmo foi invocada a inexistência de bens da devedora originária, bem como o exercício da gerência de facto pela Oponente no período em que terminou o prazo de pagamento das dívidas tributárias aqui em causa (tendo inclusive sido invocados factos susceptíveis de integrar o exercício da gerência de facto - assinatura pela Oponente de declaração do início de actividade e de alteração de actividade) e ainda a presunção de culpa decorrente da alínea b) do nº 1 do artigo 24º da LGT.

Por outro lado, quanto ao exercício do direito de audição, a administração tributária pronunciou-se no sentido de que não havia quaisquer elementos novos a ponderar na fundamentação da decisão, como determina o nº 7 do artigo 60º da LGT, uma vez que não foram trazidos quaisquer elementos pela Oponente com vista a ilidir a presunção de culpa que recaiu sobre ela, nada alegando que pudesse mudar o sentido da decisão.

Assim, a administração tributária, ainda que sumariamente, não deixou de se reportar ao direito de audição exercido pela Oponente, se bem que no sentido de esta não ter aduzido quaisquer factos novos e que impusessem decisão diversa.

Nem, de resto, a Recorrente indica quais eram os factos novos que alegou no direito de audição e que deviam ser tidos em consideração, e não foram, pela administração tributária.

Pelo que vimos de dizer se conclui que, ao considerou estar devidamente fundamentado o despacho de reversão, a sentença recorrida não é merecedora de qualquer censura.

Improcede, assim, também este fundamento e com ele todas as conclusões de recurso.

3. Decisão

Termos em que, acordam os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte em negar provimento ao recurso.

Custas pela Recorrente, sem prejuízo do apoio judiciário de que goza.

Porto, 26 de Fevereiro de 2015

Ass. Fernanda Esteves

Ass. Ana Patrocínio

Ass. Ana Paula Santos