Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01254/05.1BEBRG
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:01/12/2012
Tribunal:TAF de Braga
Relator:Catarina Almeida e Sousa
Descritores:OPÇÃO PELO REGIME GERAL DE TRIBUTAÇÃO – IRC
REGIME SIMPLIFICADO
Sumário:I - A opção pela aplicação do regime geral de determinação do lucro tributável deve ser formalizada pelos sujeitos passivos, nomeadamente na declaração de início de actividade.
II - Essa opção é válida por um período de três exercícios, findo o qual caduca, excepto se o sujeito passivo manifestar a intenção de a renovar pela forma prevista na alínea b), do nº 7, do artigo 53º do CIRC – cfr. nº 8 do artigo 53º.
III - Aquela opção feita na declaração de início de actividade pela aplicação do regime geral releva, quer esse regime já resultasse obrigatório em face do volume total anual de proveitos estimado na declaração inicial, quer face ao volume de proveitos (inferior a € 149.639,37) posteriormente declarado relativamente a esse exercício.
IV - O regime simplificado só é aplicável quando os sujeitos passivos não optem pela aplicação do regime geral de determinação do lucro, previsto nos artigos 17º a 47º do Código do IRC.*
* Sumário elaborado pelo Relator
Recorrente:S..., Lda
Recorrido 1:Fazenda Pública
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os Juízes que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte
1- RELATÓRIO
S…, Lda, inconformada com a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, de 17 de Fevereiro de 2009, que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida contra o acto tributário de liquidação de IRC nº 2005 8310041087, relativo ao exercício de 2002, dela veio interpor o presente recurso jurisdicional, formulando as seguintes conclusões:
“I - A recorrente iniciou a sua actividade em 01/07/2001, com uma estimativa de volume de negócios de 17500 contos, referentes aos 6 meses decorrentes desde a data do início da actividade até ao final do ano em causa (2001), tendo sido feita a opção no quadro 19, pelo regime geral de determinação do lucro tributável, conforme consta da respectiva declaração do Início de Actividade que existe arquivada no Serviço de Finanças de Esposende.
II - Em Março de 2004 tomou a recorrente conhecimento de ter sido oficiosamente enquadrada no regime simplificado desde Janeiro de 2002, pelos Serviços da Administração Fiscal.
III - Nos termos da lei (artigo 53.° do Código do IRC), os sujeitos passivos residentes que exerçam, a título principal, uma actividade de natureza comercial, industrial ou agrícola, não isentos nem sujeitos a algum regime especial de tributação, com excepção dos que se encontrem sujeitos à revisão legal de contas, cujo volume de total de proveitos relativos ao exercício imediatamente anterior não seja superior a 149.639.37 Euros, ficarão sujeitos ao Regime Simplificado de Tributação, desde que não façam a opção pela determinação do lucro tributável de acordo com o regime geral.
IV - Mas feita esta opção, de acordo com o n.° 8 do artigo mencionado, é válida por um período de três exercícios, findo o qual terá de ser novamente exercida se o sujeito passivo, reunindo as condições legalmente exigíveis, não desejar ser tributado de acordo com as regras do Regime Simplificado.
V - Nos termos do n.° 2 do citado normativo legal, no exercício do início de actividade, o enquadramento no regime simplificado faz-se, verificados os demais pressupostos, em conformidade com o valor total anual de proveitos estimado, constante da declaração de início de actividade, caso não seja exercida a opção a que se refere o número anterior.
VI - Em consequência do volume de negócios por si previsto, a recorrente foi enquadrada no regime geral, por obrigação e independentemente da sua opção manifestada no assinalar nesse sentido no quadro 19 da declaração de início de actividade, epigrafado com “opção pelo regime de contabilidade organizada (IRS) ou pelo regime geral de determinação do lucro tributável (IRC)”.
VII - Mas naquela declaração, a recorrente assinalou a opção pelo regime geral de determinação do lucro tributável em IRC, assim como, no quadro 16, assinalou possuir contabilidade organizada, informatizada e centralizada na sede e identificou o TOC.
VIII - A questão essencial a decidir na impugnação deduzida, em face do alegado, sempre será a de saber se à Administração Fiscal seria admissível o enquadramento da recorrente no regime simplificado de tributação em sede de IRC, apesar da sua inequívoca opção pelo regime geral de tributação, efectuada na declaração de início de actividade oportunamente apresentada.
IX – A questão de saber se a Administração Fiscal teve uma actuação censurável relativamente à recorrente, como Contribuinte, sujeito na relação tributária que se estabelece com o Estado em virtude de uma actividade geradora de rendimentos objecto de tributação, situa-se num nível secundário, sendo certo que também pode e deve ser chamada à análise, atentos os princípios invocados na impugnação, decorrentes do artigo 109.°, nº. 5, do Código do IRC.
X - O regime simplificado só é aplicável quando os sujeitos passivos não optem pela aplicação do regime geral de determinação do lucro, previsto nos artigos 17.º a 46.º do Código do IRC.
XI - A opção pelo regime geral deve ser formalizada ou na declaração de início de actividade, ou na declaração de alterações referida nos artigos 110.º e 111.º do Código do IRC, até ao fim do 3.º mês do período de tributação do início da aplicação do regime – cfr. a alínea a) do n.º 7 do artigo 53.º do Código do IRC.
XII - Uma vez efectuada a opção pelo regime geral, a mesma é válida por um período de 3 exercícios, findo o qual caduca, excepto se for renovada através de uma declaração de alterações no prazo referido – cf. o n.º 8 do artigo 53.º do Código do IRC.
XIII – É, assim, ilegal o enquadramento efectuado pela Administração Fiscal da recorrente no regime simplificado de tributação, contrariando a sua opção expressamente manifestada naquela declaração de início de actividade.
Como tal, deverá a douta decisão recorrida ser revogada e substituída por outra que conceda provimento à impugnação, com as legais consequências, designadamente a revogação da decisão da Administração Fiscal de alterar o enquadramento da recorrente em sede de tributação de IRC no ano de 2002 e anulando-se a liquidação correctiva desse imposto, deste modo fazendo-se sã, serena e inteira
JUSTIÇA”.
Não foram produzidas contra-alegações.
Neste Tribunal Central Administrativo, o Exmo. Magistrado do Ministério Público pronunciou-se, desde logo, pela incompetência, em razão da hierarquia, do TCA para conhecer do presente recurso jurisdicional, defendendo ser competente para dele conhecer o Supremo Tribunal Administrativo (STA).
Com efeito, refere o EMMP que “A recorrente jamais questiona a factualidade tida por provada na sentença sob recurso, nomeadamente não aponta quaisquer factos ou circunstâncias que não hajam sido aí consideradas e valoradas, bem como não tece quaisquer considerandos sobre questões ou diligências de prova.”
Não obstante, sobre o mérito do recurso defende o EMMP que deve ser negado provimento ao mesmo.
As partes foram notificadas para se pronunciarem, querendo, sobre a invocada incompetência do TCAN.
Nada disseram.
Colhidos os vistos legais, importa apreciar e decidir.
2 - FUNDAMENTAÇÃO
2.1. De facto
É a seguinte a decisão sobre a matéria de facto constante da sentença recorrida:
1 - O sujeito passivo impugnante, na sua declaração de início de actividade apresentada em 2001.06.29, estimou um valor anual dos proveitos de € 174.579,26, (€87.289,63 relativo a seis meses x 2).
2 - Além disso, no campo 19 do mesmo documento declarou que, reunindo os pressupostos de inclusão no regime simplificado de tributação previsto no art. 53º do CIRC, optava pelo regime geral de determinação do lucro tributável.
3 - Ou seja, o sujeito passivo entendendo, erroneamente, que cumpria os requisitos previstos para a sua inclusão no regime simplificado, declarou optar pela aplicação daquele regime legal.
4 - Atento o exposto, foi o contribuinte impugnante automaticamente enquadrado pela Administração Fiscal no regime geral de tributação relativamente a esse exercício.
Matéria de facto não provada:
Inexiste.
Fundamentação da matéria de facto provada e não provada:
A matéria de facto dada como provada, genericamente aceite ou não contestada pelas partes, assenta na prova documental disponível.
Inexiste matéria dada como não provada, por nada mais ter sido alegado com interesse para a decisão da causa, para além do que ficou dado como provado”.
Previamente às questões que constituem o objecto do presente recurso jurisdicional, o qual se acha delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, importa apreciar a excepção suscitada pelo EMMP, a saber a incompetência em razão da hierarquia deste TCA.
Nos termos do artigo 280º, nº1 do CPPT, “Das decisões dos tribunais tributários de 1.ª instância cabe recurso, (…) para o Tribunal Central Administrativo, salvo quando a matéria for exclusivamente de direito, caso em que cabe recurso, (…), para a Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo”.
A violação desta regra de competência, em razão da hierarquia, determina, nos termos do artigo16º, nº1 do CPPT, a incompetência absoluta do tribunal, ao qual é, indevidamente, dirigido o recurso.
Como decorre do artigo 687º, nº4 do CPC (na redacção aqui aplicável), o despacho que admitiu o recurso não vincula o Tribunal Superior, pelo que nada obsta a que se aprecie e decida a questão prévia suscitada pelo EMMP junto deste Tribunal e, igualmente, de conhecimento oficioso, que se consubstancia na incompetência do TCA, em razão da hierarquia.
Nos termos do artigo 26º, al. b), do ETAF, atribui-se competência à Secção do Contencioso Tributário do STA para conhecer dos recursos interpostos das decisões dos Tribunais Tributários, com exclusivo fundamento em matéria de direito.
Por sua vez, o artigo 38º, al. a), do ETAF, atribui competência à Secção de Contencioso Tributário de cada Tribunal Central Administrativo para conhecer dos recursos de decisões dos Tribunais Tributários, ressalvando-se o disposto no citado artigo 26º, al. b), do mesmo diploma.
Quer isto dizer que para o conhecimento dos recursos jurisdicionais interpostos de decisões dos Tribunais Tributários de 1ª. Instância é competente o STA quando o recurso tiver por fundamento exclusivamente matéria de direito e, pelo contrário, é competente a secção de contencioso tributário de um dos Tribunais Centrais Administrativos se o fundamento não for exclusivamente de direito.
Na delimitação da competência do STA em relação à dos Tribunais Centrais Administrativos, a efectuar com base nos fundamentos do recurso, deve entender-se que o recurso não tem por fundamento exclusivamente matéria de direito sempre que nas conclusões das respectivas alegações, as quais fixam o objecto do recurso (cfr. artigo 684º, nº3, do CPC), o recorrente pede a alteração da matéria fáctica fixada na decisão recorrida ou invoca, como fundamento da sua pretensão, factos que não têm suporte na decisão recorrida, independentemente da atendibilidade ou relevo desses factos para o julgamento da causa.
“E conforme é jurisprudência pacífica do Supremo Tribunal Administrativo, há necessidade de dirimir questões de facto quer quando o recorrente invoca factos que não foram dados como provados ou que os factos levados ao probatório não estão provados, quer quando manifesta divergência quanto às ilações, conclusões ou juízos de facto que se devam retirar dos mesmos, quer quando suscita a suficiência ou insuficiência da prova produzida.
Em suma, as conclusões integrarão matéria de direito se discutirem a interpretação ou aplicação de certo preceito legal ou a solução de determinada questão jurídica. E integrarão matéria de facto se traduzirem discordância sobre factos materiais da vida real na sua perspectiva actual ou histórica uma vez que a sentença os não tenha considerado ou os tenha fixado em desacordo com a prova produzida ou com aquela que devia ter sido produzida, ou se traduzirem discordância com as ilações de facto retiradas pelo julgador da factualidade apurada.
Se o recorrente colocar qualquer questão de facto, o recurso já não terá por fundamento exclusivamente matéria de direito, ficando, desde logo, definida a competência do Tribunal Central Administrativo, independentemente da eventualidade de, por fim, este Tribunal vir a concluir que a discordância sobre a matéria fáctica ou os factos não provados alegados são irrelevantes para a decisão do recurso” – vide, acórdão do STA, de 26/10/11, proferido no processo 0649/11”.
Retomando o caso dos autos, em concreto a conclusão 2 das alegações de recurso, e apesar de a Recorrente não o referir de forma explícita, daí se extrai que a Recorrente se reporta a matéria de facto que não foi vertida para o probatório da sentença recorrida, em concreto o seu enquadramento oficioso no regime simplificado de tributação, com respeito ao exercício de 2002.
Portanto, em tal conclusão a Recorrente apela à consideração da matéria de facto, pelo que não se pode afirmar que cinge o seu recurso à mera interpretação de normas ou princípios jurídicos que tenham sido violados na sentença recorrida.
Em suma, os fundamentos do presente recurso não versam exclusivamente matéria de direito, pelo que a competência para o seu conhecimento pertence a este Tribunal, nos termos do disposto no artigo 38º, al. a), do ETAF, e não ao STA.
Tanto basta para julgar improcedente a excepção de incompetência absoluta deste Tribunal, em razão da hierarquia, suscitada pelo EMMP.
Fixada, assim, a competência deste TCA, importa equacionar as questões sob recurso, suscitadas e delimitadas pelas alegações e respectivas conclusões.
Assim sendo, as questões a decidir por este Tribunal são, em síntese, para além do questionado quanto (ao aditamento) à matéria de facto, a de saber se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento ao manter o acto tributário de liquidação de IRC do exercício de 2002, operado de acordo com as regras definidas para o regime simplificado de tributação.
Acolhendo, por um lado, a conclusão das alegações de recurso quanto à relevância de considerar no probatório a factualidade atinente ao enquadramento oficioso, da Recorrente, no regime simplificado de tributação, com respeito ao exercício de 2002 e, por outro, considerando a relevância de outro facto não constante do probatório fixado e resultante de documentos juntos aos autos (artigo 712º do CPC), aditam-se ao probatório os seguintes factos:
5 – Em face do valor total anual de proveitos efectivamente obtido pelo sujeito passivo, em 2001, ser de € 49.129,38, a Administração Tributária enquadrou o sujeito passivo, ora Recorrente, no regime simplificado de tributação para o exercício de 2002, tendo emitido, em 04/07/05, o acto tributário de liquidação de IRC nº 2005 8310041087, no montante de € 5.641.92 (cfr. fls. 6, 19 e 79 dos autos);
6 – Na declaração de início de actividade a que se reporta o ponto 1 supra, o declarante, ora Recorrente, assinalou, no campo 16, possuir contabilidade organizada, informatizada, centralizada na sua sede, tendo aí procedido à identificação fiscal do respectivo técnico oficial de contas (cfr. fls. 7 a 9 dos autos).
2.2. De direito
Estabilizada a matéria de facto, nos termos vistos, importa relembrar, no essencial, a posição da Recorrente.
Em síntese, defende a Recorrente que tendo, na declaração de início de actividade, apresentada em 2001, estimado um valor de proveitos equivalente a 17.500.000$00 (para o período compreendido entre 01/07/01 e 31/12/01) e tendo procedido, nessa mesma declaração, à opção pelo regime geral de tributação, tal opção há-de ser válida por três exercícios. Assim sendo, não podia, no exercício de 2002, a Administração Tributária, atenta a opção efectuada pelo regime geral, enquadrar a Recorrente no regime simplificado de tributação e liquidar IRC em conformidade com tal regime.
Com vista à apreciação da questão que vem colocada ao Tribunal, importa deixar uma nota das linhas gerais do Regime simplificado de determinação do lucro tributável, em sede de IRC, tendo presente o disposto no artigo 53º do CIRC, em vigor no exercício a que se reporta a liquidação objecto da sentença recorrida – 2002 O regime simplificado, em sede de IRC, foi entretanto revogado pelo artigo 92º, da Lei nº 3-B/2010, de 28/04 (O.E de 2010)..
Nos termos do artigo 53º do CIRC, era permitido aos sujeitos passivos optar pelo apuramento do lucro tributável de acordo com as regras definidas para o regime simplificado de tributação, regime este incluído na determinação do lucro tributável por métodos indirectos.
Tal regime era aplicável aos sujeitos passivos (de IRC) residentes que exercessem, a título principal, uma actividade de natureza comercial, industrial ou agrícola, não isentos nem sujeitos a algum regime especial de tributação, com excepção dos que se encontrassem sujeitos à revisão legal de contas, que apresentassem, no exercício anterior ao da aplicação do regime, um volume total anual de proveitos não superior a 30 000 000$00 (149 639,37 €) e que não optassem pelo regime geral de determinação do lucro tributável (cfr. nº1 do artigo 53º do CIRC).
No exercício do início da actividade, o enquadramento fazia-se, verificados os demais pressupostos, em conformidade com o valor total anual de proveitos estimado, constante da declaração de início de actividade (cfr. nº2 do artigo 53º do CIRC).
A opção pelo regime geral, a que se reportava o nº1 do preceito, deveria ser formalizada na declaração de início de actividade ou na declaração de alterações referida nos artigos 110º e 111º do CIRC, até ao fim do 3º mês do período de tributação do início da aplicação do regime (cfr. nº 7 do artigo 53º do CIRC).
Por sua vez, efectuada a opção pelo regime geral, a mesma era válida por um período de três exercícios, findo o qual caducava, excepto se o sujeito passivo manifestasse a intenção de a renovar através de uma declaração de alterações apresentada até ao fim do 3º mês do período de tributação do início da aplicação do regime (nº 8 do artigo 53º do CIRC).
Não sendo exercida a opção pela aplicação do regime geral e verificando-se os requisitos de enquadramento no regime simplificado, este regime era aplicado automaticamente por um período de 3 exercícios, sendo prorrogado por iguais períodos (cfr. nº 9 do artigo 53º).
Caso o sujeito passivo não pretendesse ver prorrogada a aplicação do regime simplificado, deveria comunicar a opção de transitar para o regime geral, mediante declaração de alterações, no prazo antes mencionado.
Ora, retomando o caso dos autos, temos que, no ano do início da actividade, 2001, o Recorrente, tendo estimado um valor de proveitos de 17.500.000$00 (para o período compreendido entre 01/07/01 e 31/12/01), fez a opção expressa pela tributação ao abrigo do regime geral, tendo inclusivamente assinalado possuir contabilidade organizada, informatizada e centralizada na sede e identificou o TOC. Neste exercício de 2001, a Recorrente ficou, pois, enquadrada no regime geral.
Sucede, porém, que pelo facto de efectivamente os proveitos declarados em 2001 não terem ultrapassado o valor de € 149.639,37, a Administração Tributária veio, para o exercício de 2002, a enquadrá-lo no regime simplificado, desconsiderando a opção efectuada na declaração de início de actividade.
Com efeito, refere a Fazenda Pública, na contestação apresentada, que: “Porém, em 2002, a Administração Tributária apurou pela análise da declaração anual de rendimentos – modelo 22, que nesse exercício de 2001, o valor total anual de proveitos efectivamente obtido pelo sujeito passivo foi de € 49.129,38 (…) ficando esse valor aquém do valor estimado para esse exercício e abaixo do limite legal estabelecido de € 149.639,37, facto que implicou a alteração de enquadramento do sujeito passivo para o regime simplificado de determinação do lucro tributável. Se a impugnante não pretendia ficar sujeita ao regime simplificado, deveria ter apresentado declaração de alteração para exercer a opção pelo regime geral, de harmonia com o disposto no nº 7 do artº 53º do CIRC”
Esta actuação da Administração Tributária corresponde a uma interpretação da lei que não é aceitável, carecendo do mínimo de apoio legal, tendo, aliás, sido repudiada pela jurisprudência em muitas situações semelhantes que foram sendo submetidas à apreciação dos tribunais superiores.
Com efeito, contrariamente ao que a Administração Tributária entendeu aqui, como em inúmeros outros casos idênticos a este, a opção feita pela Recorrente – opção pelo regime geral de tributação, formulada na declaração de início de actividade - é válida por um período de três exercícios, findo o qual caduca, excepto se o sujeito passivo manifestar a intenção de a renovar pela forma prevista na alínea b) do nº 7, do artigo 53º do CIRC – cfr. seu nº 8.
Nesta linha de entendimento, podem ver-se, entre outros, os acórdãos do STA proferidos em 21/05/2008, no Processo nº 010/08, 18/06/2008, no Processo 0205/08, de 26/11/2008, no Processo 0733/08, de 10/12/2008, no Processo 0874/08, de 14/07/01, no Processo 0268/10 e de 07/12/10, no Processo 0808/10. Ainda sufragando a mesma jurisprudência, os acórdãos do TCA Norte proferidos em 03/07/2008, no Processo nº 00095/05.0BEBRG, em 08/01/09 no Processo 00333/06.2 BEBRG e em 15/01/09, no Processo 01363/06.0 BEBRG.
Como se escreveu no acórdão do STA, proferido no Processo nº 0205/08, acima melhor identificado:
«No exercício do início da actividade, o enquadramento faz-se em conformidade com o volume de proveitos estimados para um ano de actividade.
O regime simplificado só é aplicável quando os sujeitos passivos não optem pela aplicação do regime geral de determinação do lucro, previsto nos artigos 17.º a 46.º do Código do IRC.
A opção pelo regime geral deve ser formalizada: na declaração de início de actividade; ou na declaração de alterações referida nos artigos 110.º e 111.º do Código do IRC, até ao fim do 3.º mês do período de tributação do início da aplicação do regime – cf. a alínea a) do n.º 7 do artigo 53.º do Código do IRC.
Uma vez efectuada a opção pelo regime geral, a mesma é válida por um período de 3 exercícios, findo o qual caduca, excepto se for renovada através de uma declaração de alterações no prazo referido – cf. o n.º 8 do artigo 53.º do Código do IRC.
Não sendo exercida a opção pela aplicação do regime geral e verificando-se os requisitos de enquadramento no regime simplificado, este regime é aplicado automaticamente por um período de 3 exercícios, sendo prorrogado por iguais períodos. Caso o sujeito passivo não pretenda ver prorrogada a aplicação do regime simplificado, deverá comunicar a opção de transitar para o regime geral, mediante declaração de alterações, no prazo mencionado.
O regime simplificado tem sempre como pressuposto uma opção do contribuinte que renuncia ao seu direito subjectivo de ser tributado com base na contabilidade. Temos deste modo uma daquelas situações em que a lei atribui relevância à vontade do contribuinte e em que este pode optar pelo regime que considera mais favorável – cf. Saldanha Sanches, Fiscalidade, Julho/Outubro de 2001.
No regime simplificado o contribuinte será tributado com base num lucro normal – que será o resultante da aplicação de indicadores de base técnica definidos para os diferentes sectores da actividade económica – cf. José Casalta Nabais, Direito Fiscal, 2.ª edição, Almedina, p. 551.
A tributação segundo o regime simplificado é facultativa, sendo colocada na disponibilidade do sujeito passivo a opção pelo regime geral de determinação do lucro tributável, de harmonia com o disposto no n.º 1 do artigo 53.º do Código do IRC. A opção feita na declaração de início de actividade pela aplicação do regime geral releva para os três exercícios seguintes (n.º 7 do referido artigo 53.º), ainda que esse regime já resultasse obrigatório em face do volume total anual de proveitos estimado na declaração inicial – cf. o acórdão desta Secção do Supremo Tribunal Administrativo, de 21-5-2008, proferido no recurso n.º 10/08.»
Como também se escreveu no acórdão do STA acima identificado, proferido no Processo nº 0733/08:
«Ressalta deste enquadramento normativo que a natureza facultativa da tributação segundo o regime simplificado (que se traduz em o rendimento que serve de base à tributação ser determinado através da aplicação de indicadores de base técnico-científica definidos para os diferentes sectores da actividade económicas, ou, na sua falta, através da aplicação de determinados coeficientes ao valor das mercadorias e de produtos e restantes proveitos, com um determinado montante mínimo) se define como uma garantia que é conferida ao sujeito passivo de poder ser tributado pelo rendimento real, dessa forma preservando a respectiva conformidade constitucional em face do disposto no artigo 104.º, n.º 2 da CRP que preceitua que “a tributação das empresas incide fundamentalmente sobre o seu rendimento real”.
Definindo-se como uma garantia que é conferida ao sujeito passivo de poder ser tributado pelo rendimento real, sendo certo que o regime simplificado não constitui o regime regra consagrado no artigo 104.º, n.º 2 da CRP, acompanha-se a sentença recorrida quando entende que não se vê razão para não ser atendida a opção pelo regime geral de tributação expressa pela recorrente (2. do probatório), tanto mais que assinalou na mesma declaração de início de actividade possuir contabilidade organizada (4. do probatório).
Nestas circunstâncias, muito embora o regime geral logo resultasse obrigatório em face do volume total anual de proveitos estimado na declaração inicial para o ano de 2002, a intenção manifestada pelo ora recorrido de opção por esse regime não poderia deixar de relevar para o caso de, como veio a acontecer, o valor declarado para esse ano (€16.945,76 - 6. do probatório) determinar a aplicação, em princípio, do regime simplificado a partir do exercício de 2003.
Relevando, como releva, essa opção inicial pelo regime geral de determinação do lucro tributável em IRC à luz da alínea a) do n.º 7 do artigo 53.º do CIRC, opção essa válida para os três exercícios seguintes (n. 8 do mesmo artigo), ao invés do que defende a recorrente Fazenda Nacional, a concretização da opção em causa não estava dependente de nova declaração até ao fim do mês de Março de 2003, nos termos da alínea b) do citado n.º 7 (neste mesmo sentido, vide acórdãos de 21/05/08 e 18/06/08, nos recursos n.ºs 10/08 e 205/08).»
Ora, no caso sub judice, e conforme resulta do probatório, a Recorrente apresentou a declaração de início de actividade em 29/06/01, onde inscreveu um total de proveitos estimados de 17.500.000$00, em 2001 (a partir de 01/07/01, ou seja, para seis meses do ano) e assinalou a opção pelo regime geral de determinação do lucro tributável.
Perante este comportamento declarativo, em que clara e expressamente se opta pelo regime geral de determinação do lucro tributável, não se pode deixar de considerar como válida e relevante essa escolha quanto ao exercício aqui em causa, 2002, pois que, como se viu, uma vez efectuada a opção pelo regime geral a mesma é válida por um período de três exercícios, e o regime simplificado só é aplicável quando os sujeitos passivos não optem pela aplicação do regime geral de determinação do lucro.
Assim, tem de se concluir que foi ilegal a actuação da Administração Tributária ao determinar da matéria tributável de IRC da Recorrente no exercício de 2002, segundo as regras do regime simplificado.
Razões pelas quais se impõe revogar a sentença recorrida.
3 - CONCLUSÃO
Termos em que, acordam os juízes da Secção do Contencioso Tributário do TCAN em conceder provimento ao recurso interposto pela impugnante e, em consequência:
- revogar a sentença recorrida;
- julgar procedente a impugnação;
- anular o acto de liquidação impugnado, por vício de violação de lei.
Custas pela FP, apenas em 1ª instância.
Porto, 12 de Janeiro de 2012
Ass. Catarina Almeida e Sousa
Ass. Nuno Bastos
Ass. Irene Neves