Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00903/13.2BEAVR
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:02/15/2019
Tribunal:TAF de Aveiro
Relator:Frederico Macedo Branco
Descritores:REPOSICIONAMENTO REMUNERATÓRIO; PRESCRIÇÃO; APRECIAÇÃO EXPRESSA DAS EXCEÇÕES
Sumário:
1 – O despacho saneador que aprecia a exceção de caducidade do direito de ação, julgando-a improcedente, não cabe na previsão do art. 644º, nº 1, al. b) do CPC, devendo, como tal, ter-se como um despacho interlocutório a ser impugnado no recurso que for interposto da decisão final, atento o disposto no art. 142º, nº 5 do CPTA.
2 – Por maioria de razão, se no Despacho Saneador o tribunal não chegou sequer a decidir expressamente as exceções suscitadas, faz todo o sentido a aplicabilidade do art. 142º, nº 5 do CPTA que prevê que as decisões proferidas em despachos interlocutórios devem ser impugnadas no recurso que se interpuser da decisão final, exceto nos casos em que o CPC prevê a subida imediata.
3 - O despacho saneador que apreciou “tacitamente” as exceções suscitadas, ignorando pronuncia expressa face às mesmas, não cabe na previsão do art. 644º, nº 1, al. b) do CPC, devendo, como tal, ter-se como um despacho interlocutório a ser impugnado no recurso que for interposto da decisão final.
4 - A afirmação genérica da validade e regularidade da lide não traduz a apreciação das exceções concretamente suscitadas, pelo que é nulo, por omissão de pronúncia, o despacho saneador tabelar que não apreciou em concreto as exceções suscitadas na contestação.
5 – As exceções tendo sido suscitadas com contornos precisos pelo Réu na sua contestação, determina que a pronúncia tabelar não constitui uma resposta do Tribunal a essas questões, mas apenas a afirmação genérica da validade e regularidade da lide.
Correspondentemente, a afirmação genérica da validade e regularidade da lide não traduz a apreciação concreta das questões que devessem ser apreciadas em sede de despacho saneador, sendo certo que o saneador tabelar não tem a virtualidade de equivaler a um Despacho que aprecie em concreto as questões suscitadas pelas partes. *
*Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:Município de SMF
Recorrido 1:Sindicato Nacional dos Trabalhadores da Administração Local – STAL
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Especial para Impugnação de Acto Administrativo (CPTA) - Recurso Jurisdicional
Decisão:
Conceder provimento ao recurso
Revogar a decisão recorrida
Ordenar a baixa dos autos
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Não emitiu parecer
1
Decisão Texto Integral:Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:

I Relatório
O Município de SMF, no âmbito da Ação Administrativa Especial intentada pelo Sindicato Nacional dos Trabalhadores da Administração Local – STAL em representação do seu Associado FAMR, tendente, em síntese, à impugnação do Despacho do Vereador do Pelouro de Administração, Finanças e Desenvolvimento Económico de 19/06/2013 que tornou definitiva, pretérita decisão que havia indeferido requerimento do seu representado no sentido de ser reposicionado na estrutura remuneratória na categoria de assistente operacional, inconformado com a Sentença proferida no TAF de Aveiro que em 28 de março de 2018 julgou procedente a Ação e anulou o ato objeto de impugnação, veio, em 8 de maio de 2018, interpor recurso jurisdicional da referida Sentença.
Formula o aqui Recorrente/Município nas suas alegações de recurso, as seguintes conclusões:
i. O STAL em representação do seu associado FAMR propôs uma ação administrativa especial com o Município de SMF, impugnando o ato administrativo de indeferimento do requerimento do associado onde peticionava o reposicionamento na estrutura remuneratória da categoria de assistente operacional mediante a colocação na posição remuneratória entre a 2.ª e 3.ª - níveis 2 e 3, a que corresponde a retribuição de 566,41€ e a reparação do percurso remuneratório com efeito a 2 de janeiro de 1999;
ii. O Município de SMF veio contestar a ação, invocando uma exceção perentória por estar prescrito o peticionado pelo associado do A. pedindo ainda a improcedência da ação pelo facto do Município ter cumprido a legislação aplicável na matéria;
iii. Por sentença proferida pelo douto Tribunal a quo foi considerada procedente a ação e anulado o ato impugnado;
iv. O Tribunal a quo, na sentença proferida, considerou precludida a possibilidade, nesta fase, de conhecer as suscitadas exceções de caducidade do direito de ação e de prescrição do direito alegados;
v. Vem agora o R. invocar a prescrição;
vi. Por considerar que o associado do A. havia de ter reclamado à data, nos prazos legalmente estabelecidos;
vii. Tendo, com o decorrer dos anos, sem qualquer manifestação, demonstrado que o escalão e índice remuneratório em que se encontrava estavam em conformidade;
viii. Assim e como já decorreu mais de um ano desde o reposicionamento em causa ou desde a não progressão, estes atos sanarem-se pelo decurso do tempo, ou seja, convalidaram-se.
ix. Quanto ao alegado pelo A. relativamente ao facto de agora se tratar de uma questão contratual, por força da relação de emprego público de nomeação dos funcionários Públicos da Administração Pública se ter transformada em contrato de trabalho, em 2008, importa salientar que à data dos factos ainda estávamos perante uma relação de emprego público de nomeação.
x. Não sendo aplicáveis as regras contratuais aludidas.
xi. Tendo o direito a que o autor se arroga prescrito.
xii. No que concerne o reposicionamento, o Município pautou a sua atividade cumprido os princípios da legalidade e da boa-fé, pelo que atuou com convicção do cumprimento dos dispositivos legais aplicáveis nesta matéria.
xiii. Tendo sido feita uma aplicação equitativa da legislação, dado que o associado do A. beneficiou da redução de tempo constante do preceito legal do n.º 9 do artigo 21.º do referido diploma, tendo sido reposicionado para o escalão 2 - índice 135, nos termos estabelecidos no Decreto-Lei 404-A/98, de 18/12;
xiv. Face a todo o exposto, não foi desrespeitada a Lei.
Nestes termos, e nos melhores de direito que V. Exa.s, requer-se a V. Exas. que seja concedido provimento ao recurso, e em consequência:
a) Declarar prescrito o direito a que o autor se arroga, Em alternativa e caso assim não se entenda, Considerar o ato administrativo como válido. Absolvendo-se o Reu da instância.”
*
O aqui Recorrido/Sindicato veio apresentar as suas contra-alegações de Recurso em 25 de junho de 2018, concluindo do seguinte modo:
I) Para além da douta argumentação aduzida no douto aresto recorrido, designadamente no que e refere à interpretação e aplicação das normas do CPTA referentes ao saneador importa demonstrar que a defesa por exceção jamais procederia;
II) O Réu, ora Recorrente, não identificou o ato, não aludiu aos respetivos autores, não o localizou no tempo, não juntou qualquer lastro documental do mesmo, nem comprovativo de que tenha sido notificado ao sócio do aqui Recorrido do ato administrativo antecedente que, não tendo sido impugnado consolidou-se na ordem jurídica;
III) Não logrou provar que o ato, não impugnado, responsável pelo posicionamento remuneratório contestado, tenha sido notificado ao sócio do Recorrido e, tão pouco, que desse ato constasse como foram aplicadas as normas transitórias em causa, designadamente as do artigo 21º, nº 9, do DL nº 404-A/98, de 18/12;
IV) Quando a notificação de tal ato correspondia a uma injunção legal, que sobre os órgãos e entidades competentes do Recorrente impendia, desde logo para garantia de um direito fundamental consagrado no artigo 268º, nº 3, da Constituição da República Portuguesa, não tendo, assim, sido cumprido o ónus que lhe cabia de acordo com as normas de direito probatório dos artigos 341º e ss do Código Civil;
V) De todo o modo, tal ato, cuja prova da respetiva notificação está ainda por fazer, seria nulo por ofensa do núcleo essencial de um direito fundamental, porquanto violaria o direito à remuneração que estabelecida ex vi das normas legais vigentes, que estatuíam regras, e forma geral e abstrata, de relevância de tempo de serviço de todos os trabalhadores nomeados definitivamente;
VI) Ao aplicar incorretamente a lei, no caso, ignorando uma regra transitória de relevância do tempo de serviço aplicável de forma geral e abstrata a todos os funcionários com a categoria e antiguidade do sócio do Recorrido, colocou o trabalhador representado nestes autos, numa remuneração inferior àqueles apesar da igualdade que a lei quer reconhecer a todos, sendo o ato em causa nulo, de acordo com o disposto no artigo 133º do Código do Procedimento Administrativo vigente;
VII) Por outro lado, dividindo-se os atos administrativos quanto aos seus efeitos, em atos de execução instantânea e atos de execução continuada porquanto, em relação aos primeiros o cumprimento esgota-se num só momento, ao passo que, relativamente aos segundos, a execução perdura no tempo, diferentes são, desde logo, os regimes de revogação;
VIII) Ora, a pretensão pelo sócio do Recorrido dirigida ao Sr. Presidente da Câmara Municipal de SMF, que não foi indeferida pela motivação que constitui a matéria da defesa por exceção, mas por uma interpretação diferente da lei, corresponderia, então, a um pedido de revogação de um ato que pela sua execução reiterada no tempo pode ser revogado;
IX) Se era admissível a revogação de atos válidos constitutivos de direitos ou interesses protegidos na parte em que fossem desfavoráveis aos destinatários, como estipula o artigo 140º, nº 2, alínea a), do Código do Procedimento Administrativo, por maioria de razão a revogação do ato fundamentador da defesa por exceção poderia, se inválido, ser revogado;
X) O mesmo legislador responsável pelo regime que o Recorrente na sua contestação invocou, determinou que a relação jurídica de emprego público de nomeação dos funcionários da Administração Pública se transformasse em contrato de trabalho em funções públicas, como aconteceu com o sócio, do Recorrido ex vi as normas dos artigos 88º, nº 4, 100º, 104º da Lei nº12-A/2008, de 27/2, Lei dos Vínculos, Carreiras e Remunerações, LVCR e 7º do DL nº 121/2008, de 11/7, tudo se passando como se o contrato de trabalho em funções públicas, já existisse desde a constituição da nomeação ou tomada de posse;
XI) A relação jurídica de emprego do sócio do Recorrido passou, assim, a estar sujeita ao Regime do Contrato de Trabalho em Funções Públicas, RCTFP, aprovado pela Lei nº 59/2008, de 11/9, conforme o estatuído no artigo 81º, nº 1, alínea d), da LVCR;
XII) Do que se tratava era de uma questão contratual, designadamente remuneratória, e o crédito que ela representa para o sócio do Recorrido, está longe de qualquer prescrição de acordo com o disposto no artigo 245º, nº 1, do dito RCTFP;
XIII) O mesmo legislador transformou a relação jurídica de nomeação em contrato de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado, passando a relação jurídica a estar sujeita às regras do contrato de trabalho em funções públicas e, segundo estas, todos os créditos emergentes do contrato de trabalho, sem exceção, não apenas os decorrentes de 1/1/2009 em diante, mas desde a aceitação da nomeação, só prescrevem um ano a partir do dia seguinte ao da cessação do contrato;
XIV) Os factos demonstram que, por incorreta interpretação e aplicação da lei, o sócio do Recorrido tem vindo a ser sucessiva e reiteradamente lesado na retribuição que legalmente deve constituir a contrapartida pelo trabalho que presta, de acordo com o comando da alínea a) do nº 1 do artigo 59º, da Constituição da República Portuguesa;
XV) A antiguidade no índice de origem do sócio do Recorrido, que era o 125, da anterior categoria de operário não qualificado, relevava para efeitos de progressão no novo escalão, da categoria de operário semiqualificado, por força do nº 3 do artº 23º, do DL nº 404-A/98, do qual constava o seguinte: «…Nos casos em que da aplicação da regra constante do n.º 6 do artigo 20.º resulte um impulso salarial igual ou inferior a 10 pontos, releva para efeitos de progressão o tempo de permanência no índice de origem…» (destaque do Recorrido);
XVI) Consequentemente, no dia 2/1/1999, o sócio do Recorrente reuniu os 4 anos necessários à mudança para o escalão 2 índice 135, da nova categoria de operário semiqualificado;
XVII) Não se confinando tal relevância à data de produção de efeitos da transição, isto é, 1/1/1998, porque, gramaticalmente, outra interpretação não tem cabimento, dado a lei enunciar textualmente «o tempo de permanência no índice de origem»;
XVIII) Sendo um operário não qualificado no momento da transição, era-lhe ainda aplicável o disposto no artº 21º, nº 9, do DL nº 404-A/1999, onde se que aos «atuais operários semiqualificados posicionados nos escalões 2.º a 8.º, bem como aos atuais operários não qualificados posicionados nos escalões 2.º a 7.º (…) é reduzido em dois anos o tempo de serviço necessário para progressão ao escalão imediato, na primeira progressão que ocorrer após 1 de Janeiro de 1998…»;
XIX) Igualmente nada há que permita confinar esta redução no tempo de serviço a 1/1/1998, por uma questão de teleologia e de coerência sistemática com a gramática e o espírito das normas conjugadas dos artigos 20º nº 6 e 23º, nº 3, do DL nº 404-A/98;
XX) Daqui decorria que o sócio do Recorrido atingiria o escalão 3 da categoria de operário semiqualificado ainda mais cedo, porquanto tudo se passaria, legalmente, como se a primeira progressão ocorresse não com quatro anos de antiguidade mas, sim, com dois;
XXI) Considerando-se a primeira progressão aquela que teve logo lugar no dia 2/1/1999, por aplicação conjugada das regras dos artºs 20º, nº 6 e 23º, nº 3, então tudo se passaria como se a passagem ao escalão 2 da nova categoria de operário semiqualificado tivesse ocorrido em 2/1/1997, e, consequentemente, a subida ao escalão 3, índice 155, tinha lugar em 2/1/2001, e ao escalão 4, índice 165, em 2/1/2005;
XXII) Mesmo que, por hipótese, se considerasse que o nº 9 do artº 21º do DL nº 404-A/98, se reportava à primeira progressão a ter lugar após 2/1/1999, o resultado não seria muito diferente, na medida em que, então, a subida ao escalão 3, índice 155, da categoria de operário semiqualificado, tinha lugar dois anos depois, isto é em 2/1/2001, subindo igualmente ao escalão 4, índice 165, em 2/1/2005;
XXIII) Quanto à alegada retroação, a 1/1/1998, do posicionamento no 2º escalão da estrutura salarial da nova categoria de operário semiqualificado, cumpre dizer que tal não obnubila a violação da lei;
XXIV) A lei dispunha, de forma genérica, que nas transições em que não ocorresse um impulso salarial superior a 10 pontos, o tempo de permanência no índice de origem relevava para a progressão na nova carreira/estrutura salarial, como decorria do artº 23º, nº 3, do DL nº 404-A/98, de 18/12, pelo que por força da aplicação deste preceito, mesmo abstraindo-nos da aplicação do regime especial do nº 9 do artº 21º, do citado diploma, no dia 2/1/1999, o sócio do Recorrido subia ao escalão 2 da nova carreira/estrutura retributiva, pois ia buscar tempo a 2/1/1995;
XXV) Isto quer dizer que, pela interpretação e aplicação que os serviços fizeram da lei, o sócio do Recorrido só beneficiou de 1 ano quando, a intenção do legislador para os trabalhadores abrangidos pelo regime especial do nº 9 do artº 21º, do DL nº 404-A/98, era de conceder o benefício de 2 anos não de apenas 1.
XXVI) Não se logrando o benefício integral desse regime especial o espírito da lei foi desrespeitado;
XXXVII) Considerando-se, como legalmente se deveria ter considerado, que o sócio do Recorrido estava no escalão 4, índice 165, da categoria de operário semiqualificado desde 2/1/2005, estava hoje posicionado, sim, na posição remuneratória entre a 2ª e 3ª, níveis 2 e 3, da categoria de assistente operacional, a que correspondia a remuneração de 566,41€, resultante da conjugação do disposto nos artºs 104º da LVCR, 7º do DL nº 121/2008, DR nº 14/2008 e Portaria nº 1553-C/2008.
Termos em que deverá ser recusado provimento ao presente recurso confirmando-se o douto aresto recorrido, cumprindo-se desta forma a lei e fazendo-se JUSTIÇA”.
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O Recurso Jurisdicional apresentado veio a ser admitido por Despacho de 28 de novembro de 2018.
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O Ministério Público junto deste Tribunal, tendo sido notificado em 18 de dezembro de 2018, nada veio dizer requerer ou promover.
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Prescindindo-se dos vistos legais, mas com envio prévio do projeto de Acórdão aos juízes Desembargadores Adjuntos, foi o processo submetido à conferência para julgamento.
II - Questões a apreciar
Importa apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, sendo que o objeto do Recurso se acha balizado pelas conclusões expressas nas respetivas alegações, nos termos dos Artº 5º, 608º, nº 2, 635º, nº 3 e 4, todos do CPC, ex vi Artº 140º CPTA, importando desde logo verificar, nomeadamente, a ora suscitada prescrição, mais devendo, se for caso disso, ser verificado se o município procedeu adequadamente ao controvertido reposicionamento do trabalhador aqui representado.
III – Fundamentação de Facto
O Tribunal a quo, considerou a seguinte factualidade, entendendo-se a mesma como adequada e suficiente:
1. FAMR inicia funções em regime eventual no Município de SMF, em 12 de fevereiro de 1986, cessando-as a 1 de janeiro de 1991;
(Facto Provado por documento, a fls 408 do PA)
2. FAMR inicia funções no Município de SMF, a 2 de janeiro de 1991, como cantoneiro das vias municipal [operário não qualificado];
(Facto Provado por documento, a fls 408 e 350 e segs do PA)
3. FAMR por força da aplicação do Decreto-Lei n.º 404-A/98, de 18 de dezembro e 412-A/98, de 30 de dezembro pelo Município de SMF, transita para operário semiqualificado;
(Facto Provado por documento, a fls 408 do PA)
4. Consta no Processo Individual de FAMR, em especial que:
Cantoneiro das Vias Municipais ---1/115 [2 Janeiro 1991]--- 2/125 [fevereiro 1995] --- 1/125 [transição categoria para operário semiqualificado - janeiro 1998]--- 2/135 [janeiro 1998]; Progressão em fevereiro de 2002 – 3/148 [155]
(Facto Provado por documento, a fls 392, 394, 396 do PA)
5. A 1 de janeiro de 2009 FAMR transita para a carreira de assistente operacional, por força da Lei n.º 12-A/2008, de 27 de fevereiro;
(Facto Provado por documento, a fls 408 do PA)
6. A 10 de agosto de 2010 é enviado ofício timbrado da Câmara Municipal de SMF, dirigido a FAMR, onde consta em particular:
"… Transição para as novas carreiras/categorias. Posicionamento remuneratório. […] Os pontos foram atribuídos considerando as avaliações obtidas desde a sua última mudança de vencimento […]:
 2004 e 2005: por não se aplicar na altura às autarquias locais o SIADAP é atribuída a todos os trabalhadores a avaliação de Bom – 1 ponto;
 2006, 2007 e 2008: Excelente – 3 pontos; Muito Bom – 2 pontos; Bom – 1 ponto. Caso não tenha sido alvo de avaliação, por causa que não lhe seja imputável, é-lhe atribuído 1 ponto
(Facto Provado por documento, a fls 278 e segs do PA)
7. A 7 de janeiro de 2013 FAMR dirige ao Presidente da Câmara Municipal der SMF requerimento, peticionando, designadamente:
(Dá-se por reproduzido documento fac-similado constante da decisão de 1ª Instância – Artº 663º nº 6 CPC)
(Facto Provado por documento, a fls 62 e segs dos autos – paginação eletrónica)
8. Em 22 de março de 2013 a Câmara Municipal de SMF responde ao trabalhador FAMR, por intermédio do mandatário do autor, afirmando. Em especial, que:
(Dá-se por reproduzido documento fac-similado constante da decisão de 1ª Instância – Artº 663º nº 6 CPC)
(Facto Provado por documento, a fls 62 e segs dos autos – paginação eletrónica)
9. Em 9 de abril de 2013 FAMR dirige requerimento ao Vereador do Pelouro da Administração, Finanças e Desenvolvimento Económico da Câmara Municipal de SMF, onde consta em particular:
(Dá-se por reproduzido documento fac-similado constante da decisão de 1ª Instância – Artº 663º nº 6 CPC)
(Facto Provado por documento, a fls 62 e segs dos autos – paginação eletrónica)
10. Em 14 de junho de 2013 é proferido despacho do Vereador do Pelouro de Administração, Finanças e Desenvolvimento Económico onde se decide que os argumentos da exposição do trabalhador FR não vieram alterar os pressupostos de facto e direito em que assentou a decisão;
(Facto Provado por documento, a fls 1 e segs dos autos – paginação eletrónica)
11. Em 19 de junho de 2013 é registado documento timbrado de "Município de SMF", dirigida ao mandatário do autor, em representação do trabalhador FMR, onde consta:
(Dá-se por reproduzido documento fac-similado constante da decisão de 1ª Instância – Artº 663º nº 6 CPC)
(Facto Provado por documento, a fls 1 e segs dos autos – paginação eletrónica)”.
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IV – Do Direito
No que ao direito concerne, e no que aqui releva, discorreu-se em 1ª Instância:
(...) Sucede que, não obstante ter sido expressamente suscitada a caducidade do direito de ação e a prescrição do direito do autor, a verdade é que, por despacho judicial de 11 de abril de 2016, é decidido que:
"… O Tribunal é competente em razão da nacionalidade, da matéria e da hierarquia. O processo é o próprio e não enferma de nulidades que invalidem todo o processado. As partes são dotadas de personalidade e capacidade judiciária, bem como de legitimidade e encontram-se devidamente representadas.
Compulsados os autos verifica-se que o processo contém já os elementos documentais necessários, sem necessidade de maiores indagações para conhecer dos pedidos formulados, não se afigurando necessário proceder a quaisquer diligências de prova, por não existir matéria de facto controvertida que importe à decisão da causa (nomeadamente, com referência à matéria da prescrição invocada pelo Réu, na sua contestação), atenta a sua espécie e objecto, as concretas causas de invalidade invocadas, e a argumentação aduzida pelo Autor – artigo 87.º n.º 1 alínea c) e artigo 90.º n.º 1 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos. Não é porém possível conhecer desde já do mérito da causa, por não ter sido requerido pelo Autor, sem oposição do Réu, a dispensa de alegações finais – artigo 87.º n.º 1 alínea b) do Código de Processo nos Tribunais Administrativos. Assim, e ao abrigo do disposto no n.º 4 do artigo 91.º do mesmo Código, notifique o Autor para, querendo, no prazo de 20 dias, apresentar alegações escritas. Decorrido o referido prazo, notifique o Réu para, querendo, em igual prazo de 20 dias, apresentar alegações…".
Resulta, por sua vez, do artigo 87.º do mesmo diploma que findos “… os articulados, o processo é concluso ao juiz ou relator, que profere despacho saneador quando deva: a) Conhecer obrigatoriamente, ouvido o autor no prazo de 10 dias, de todas as questões que obstem ao conhecimento do objeto do processo; b) Conhecer total ou parcialmente do mérito da causa, sempre que, tendo o autor requerido, sem oposição dos demandados, a dispensa de alegações finais, o estado do processo permita, sem necessidade de mais indagações, a apreciação dos pedidos ou de algum dos pedidos deduzidos, ou, ouvido o autor no prazo de 10 dias, de alguma exceção perentória; c) Determinar a abertura de um período de produção de prova quando tenha sido alegada matéria de facto ainda controvertida e o processo haja de prosseguir ...” (n.º 1) sendo que as “… questões prévias referidas na alínea a) do número anterior que não tenham sido apreciadas no despacho saneador não podem ser suscitadas nem decididas em momento posterior do processo e as que sejam decididas no despacho saneador não podem vir a ser reapreciadas…” (n.º 2).
Portanto, a hermenêutica do n.º 2, do artigo 87º, do Código do Processo dos Tribunais Administrativos, na redação aqui aplicável, visa que, após a prolação do despacho saneador, se deixe de julgar do fundo da causa, com o fundamento na existência de uma na existência de exceção dilatória.
Por isso ali se determina que "… as questões prévias referidas na alínea a) do número anterior que não tenham sido apreciadas no despacho saneador não podem ser suscitadas nem decididas em momento posterior do processo e as que sejam decididas no despacho saneador não podem vir a ser reapreciadas…", pelo que, não tendo havido recurso do despacho saneador relativamente às exceções suscitadas, não pode o Tribunal reapreciar as exceções alegadas em momento posterior às alegações. É que, ao contrário do que sucedia no direito anterior, agora quando se decide no sentido da inexistência de questões que obstem ao conhecimento do objeto do processo, o despacho saneador faz caso julgado formal, como bem explicita MÁRIO ESTEVES DE OLIVEIRA in “CPTA e ETAF - Anotados”, I VOL I, 2004, pág. 514 e seg.
Digamos que aqui se configura uma situação de caso julgado tácito, reafirmando-se o princípio da promoção do acesso à justiça e, assim, evitar que seja relegado para final o conhecimento de questões que conduzam a prolação de decisões de forma e que no processado se possam suscitar a todo o tempo questões meramente formais.
Portanto, quando decide no sentido da inexistência de questões que obstem ao conhecimento do objeto do processo, o despacho saneador faz caso julgado formal, reconhecendo-se, assim, à chamada certificação tabelar positiva ou seja, à proposição conclusiva de que «o tribunal é competente, a ação é tempestiva, as partes legítimas, o meio processual idóneo», com que os tribunais costumam resumir o seu juízo a propósito da verificação dos pressupostos de processuais o carácter de irrevogabilidade.
Por isso está precludida a possibilidade, nesta fase, de o Tribunal conhecer as suscitadas exceções de caducidade do direito de ação e de prescrição do direito do autor alegadas.”
Vejamos:
Da Prescrição
No que aqui releva, vem o Recorrente/Município suscitar que “o Tribunal a quo, na sentença proferida, considerou precludida a possibilidade, nesta fase, de conhecer as suscitadas exceções de caducidade do direito de ação e de prescrição do direito alegados;
Vem agora o R. invocar a prescrição (...) por considerar que o associado do A. havia de ter reclamado à data, nos prazos legalmente estabelecidos;
Tendo, com o decorrer dos anos, sem qualquer manifestação, demonstrado que o escalão e índice remuneratório em que se encontrava estavam em conformidade;
Assim e como já decorreu mais de um ano desde o reposicionamento em causa ou desde a não progressão, estes atos sanarem-se pelo decurso do tempo, ou seja, convalidaram-se.”
Em bom rigor não há qualquer decisão expressa do tribunal a quo relativamente às invocadas exceções, mas um mero despacho de natureza predominantemente tabelar que se limita a afirmar que "… O Tribunal é competente em razão da nacionalidade, da matéria e da hierarquia. O processo é o próprio e não enferma de nulidades que invalidem todo o processado. As partes são dotadas de personalidade e capacidade judiciária, bem como de legitimidade e encontram-se devidamente representadas.”
O Tribunal a quo chega a afirmar sintomaticamente, relativamente à questão em análise “que aqui se configura uma situação de caso julgado tácito”.
Em qualquer caso, como se sumariou no Acórdão do STA nº 0269/16 de 30.06.2016 “o despacho saneador que aprecia a exceção de caducidade do direito de ação, julgando-a improcedente (...), não cabe na previsão do art. 644º, nº 1, al. b) do CPC, devendo, como tal, ter-se como um despacho interlocutório a ser impugnado no recurso que for interposto da decisão final, atento o disposto no art. 142º, nº 5 do CPTA.
Acresce que na decisão aqui controvertida, o tribunal a quo não chegou sequer a decidir expressamente as exceções suscitadas, pelo que acrescidamente faz todo o sentido a aplicabilidade do art. 142º, nº 5 do CPTA que prevê que as decisões proferidas em despachos interlocutórios devem ser impugnadas no recurso que se interpuser da decisão final, exceto nos casos em que o CPC prevê a subida imediata.
Por sua vez, o art. 644º, nº 1, alínea b) do CPC prevê que haja Recurso do despacho saneador que, sem pôr termo ao processo, decida do mérito da causa ou absolva da instância o réu ou algum dos réus quanto a algum ou alguns dos pedidos”.
Ora, o despacho saneador que apreciou “tacitamente” as exceções suscitadas, ignorando pronuncia expressa face às mesmas, não cabe na previsão daquele art. 644º, nº 1, al. b) do CPC, devendo, como tal, ter-se como um despacho interlocutório a ser impugnado no recurso que for interposto da decisão final.
Por maioria de razão, alude-se ainda ao sumariado no Acórdão deste TCAN nº 00127/12.6BEPRT, de 07.10.2016, onde se refere e no que aqui releva, que “A afirmação genérica da validade e regularidade da lide não traduz a apreciação das exceções concretamente suscitadas, de erro na forma de processo e caducidade do direito de ação, pelo que é nulo, por omissão de pronúncia, o despacho saneador tabelar que não apreciou em concreto aquelas exceções suscitadas na contestação.”
Efetivamente, uma vez que as suscitadas exceções de caducidade do direito de ação e de prescrição do direito alegado tinham sido suscitadas com contornos precisos pelo Réu na sua contestação, a pronúncia tabelar não constitui uma resposta do Tribunal a essas questões, mas apenas a afirmação genérica da validade e regularidade da lide.
Ora a afirmação genérica da validade e regularidade da lide não traduz a apreciação concreta das questões que devessem ser apreciadas em sede de despacho saneador, sendo certo que o saneador tabelar não tem a virtualidade de equivaler a um Despacho que aprecie em concreto as questões suscitadas pelas partes.
Assim, verifica-se pelo que precedente e sumariamente se expendeu, que nada obstaria a que as suscitadas exceções devessem ter sido apreciadas em sede de Recurso a final, por um lado, por o tribunal não se ter expressamente pronunciado face às mesmas, e pelo facto de estarmos em presença de um mero despacho interlocutório suscetível de Recurso a final.
Aqui chegados, tendo o Recorrente recorrido do despacho saneador no recurso que interpôs da decisão final, o tribunal a quo ao entender que o mesmo transitara em julgado, incorreu em erro de julgamento.
Em face das conclusões a que se chegou, mostra-se prejudicada a análise material da Sentença Recorrida.
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Pelo exposto, os juízes da Secção Administrativa do Tribunal Central Administrativo Norte, acordam em conceder Provimento ao recurso, revogando a decisão recorrida, mais se determinando a baixa dos autos à 1ª instância para análise das exceções suscitadas pelo Recorrente, se a tal nada mais obstar
Custas pelo Recorrido, sem prejuízo da isenção de que goze.
Porto, 15 de fevereiro de 2019
Ass. Frederico de Frias Macedo Branco
Ass. Nuno Coutinho
Ass. Ricardo de Oliveira e Sousa