Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:02782/15.6BEBRG
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:05/20/2016
Tribunal:TAF de Braga
Relator:Hélder Vieira
Descritores:PROCESSO CAUTELAR; SUSPENSÃO DA EFICÁCIA DE ACTO
CREDITAÇÃO DE EQUIVALÊNCIAS; FUMUS BONI IURIS
Sumário:Sendo de conhecimento cumulativo os requisitos de que depende a adopção de medidas cautelares ao abrigo do regime jurídico ínsito no artigo 120º do CPTA/2002, a falta do preenchimento do fumus boni iuris prejudica o conhecimento dos demais requisitos e determina o indeferimento da providência cautelar requerida.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:PASA
Recorrido 1:Universidade do Minho
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Procedimento Cautelar Suspensão Eficácia (CPTA) - Recurso Jurisdicional
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido do não provimento do recurso.
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:

I – RELATÓRIO

Recorrente: PASA

Recorrido: Universidade do Minho

Vem interposto recurso da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga que julgou improcedente o supra identificado processo cautelar, no qual era pedido, designadamente, a suspensão da eficácia do acto que indeferiu liminarmente o pedido de creditação e equivalências formulado pelo Requerente e a condenação da Entidade Requerida a creditar a formação e experiências prévias de modo a ser-lhe reconhecido o grau de licenciatura em Direito.

O objecto do recurso é delimitado pelas seguintes conclusões da respectiva alegação(1):

“Os factos tidos em conta na sentença são manifestamente insuficientes para a decisão da causa.

Deveriam ter sido seleccionados os factos invocados pelo Recorrente na sua petição inicial nos artigos 52, 53, 54, 55, 56, 57, 58, 59, 60, 61, 62, 63, 64, 65, 66, 67, 68, 69, 71, 72, 74, 75, 76, 82, 83, 84, 85 e 86.

Estes factos não foram incluídos nos factos provados mas também não foram considerados não provados.

A sentença é quanto a eles completamente omissa, sendo certo que estes deveriam ter sido considerados como PROVADOS.

A douta sentença recorrida não se pronunciou sobre toda a factualidade alegada e, tão pouco, especificou a factualidade dada como não provada, não permitindo ao Recorrente, e tendo em conta a prova apresentada entender a falta ou a razão da sua não apreciação e da sua não descrição.

Os artigos da petição inicial supra identificados contêm matéria relevante para a decisão a proferir, pelo que a sentença recorrida enferma de falta de fundamentação de facto.

Tendo em conta o exposto, verifica-se que subsiste uma nulidade da sentença, nos termos do artigo 615º, nº1, al. d) do CPC.

A douta sentença é omissa quanto à prova testemunhal apresentada, o que levou a que ocorresse um erro notório na apreciação da prova, tanto mais que a prova apresentada seria essencial para a boa decisão da causa.

Como resulta do artigo 120º, nº1, al. c) do CPTA, para que se conceda a providência cautelar há que se demonstrar os requisitos típicos da tutela cautelar, a saber: o periculum in mora, que o Código articula com o critério do fumus boni iuris.

10ª No que ao critério do periculum in mora diz respeito, a comprovação de prejuízo de difícil reparação resultaria já da apreciação da matéria de facto constante nos artigos supra identificados, sendo certo que a sentença recorrida é omissa quanto a estes, bem como quanto à prova apresentada.

11ª Tendo em conta o conteúdo dos artigos 52, 53, 54, 55, 56, 57, 58, 59, 60, 61, 62, 63, 64, 65, 66, 67, 68, 69, 71, 72, 74, 75 e 76 dúvidas não restam de que há um fundado receio da produção de prejuízos de difícil reparação caso a providência cautelar não proceda, mesmo que o ora Recorrente tenha ganho no processo principal.

12ª Ficou provado, mormente pela prova testemunhal apresentada, que o Recorrente encontra-se actualmente, e face ao indeferimento do pedido de creditação que se discute na acção principal, impossibilitado de procurar emprego em áreas em que exijam a licenciatura e/ou mestrado em Direito, tendo ficado igualmente provadas as dificuldades económicas que o Recorrente tem vindo a atravessar e que têm colocado em risco a sua subsistência.

13ª A atribuição cautelar da creditação permite-lhe, no entretanto, e tendo em conta as delongas que o processo principal em si mesmo acarreta, procurar emprego na área de Direito, enquanto jurista, bem como inscrever-se em Mestrado e, assim, aumentar a probabilidade de encontrar emprego que lhe permita fazer face às despesas por forma a ultrapassar as dificuldades que vem a atravessar.

14ª Atento o conteúdo da douta sentença recorrida a Meritíssima Juiz do Tribunal 'a quo' vem evidenciar o prejuízo de difícil reparação que advém da falta de creditação, não obstante, concluir em sentido oposto.

15ª Quanto ao requisito do fumus boni iuris, para além da existência de um direito ou interesse do particular a merecer tutela, existe também a séria probabilidade da ilegalidade da actuação administrativa lesiva do mesmo.

16ª A prova do provável êxito da pretensão formulada no processo principal é feita com a análise do acervo documental junto com a petição inicial, bem como do extraído da matéria constante dos artigos 2 a 49 da petição inicial, a qual foi devidamente provada com os documentos juntos.

17ª Da própria sentença resulta que "o acto que indeferiu a pretensão administrativa do Requerente exibe uma fundamentação insuficiente”, o que inquina o acto de ilegalidade.

18ª Não é pelo facto de existirem momentos de discricionariedade administrativa que a acção será automaticamente improcedente, ou que a probabilidade da sua procedência será bastante diminuta já que tal entendimento consubstanciaria uma violação do princípio da tutela jurisdicional efectiva constitucionalmente consagrado.

19ª Tendo em conta o exposto, há uma real possibilidade da acção principal ser julgada procedente, o que leva a que se encontre preenchido o requisito do fumus boni iuris.

20ª A ponderação entre o interesse público e privado, constante do nº2 do artigo 120º do CPTA, não consta da sentença, o que sempre seria essencial para a fundamentação da procedência ou não da providência cautelar.

21ª A apreciação deste requisito consta explicitamente da matéria dos artigos 82 a 87 da petição inicial, os quais se reiteram.

22ª Assim sendo, também este requisito do nº2 do artigo 120º do CPTA se encontra preenchido.

Nestes termos, e nos mais de direito que V. Exas. suprirão, dando provimento ao presente recurso, com todas as consequências legais, farão como de costume inteira e sã JUSTIÇA!”.

O Recorrido contra-alegou, em termos que se dão por reproduzidos, e, tendo elaborado conclusões, aqui se vertem:

a) O objecto do recurso a que ora se responde é a douta sentença proferida nos autos do presente processo cautelar, dada a discordância do Recorrente por se ter considerado que os respectivos requisitos cumulativos previstos no artigo 120.º do CPTA não se encontram in casu preenchidos. Contudo, não assiste qualquer razão ao Recorrente.

Senão vejamos:

b) Atendendo à posição assumida pelas partes nos seus articulados, aos esclarecimentos prestados, à prova documental produzida e ainda ao facto de o decretamento da providência depender do preenchimento cumulativo dos seus respectivos pressupostos considerou o Tribunal a quo que os autos já estavam devidamente dotados de todos os elementos de prova necessários à boa decisão cautelar, decidindo-se dispensar qualquer outra diligência de prova.

Ora,

b.1) para além de o objecto do recurso não se consubstanciar no indeferimento da prova testemunhal [mas, tão só, no não preenchimento dos requisitos da presente providência], tendo, quanto a este indeferimento, se formado caso julgado e sendo definitivo e inatacável, o que só de per si impõe a não procedência do recurso a que ora se responde,

b.2) não assiste qualquer razão à alegada insuficiência da matéria de facto – que a assente nem sequer foi atacada a não ser por via da insuficiência supra referida e não fundamentada – porquanto aquela por demais justifica a solução de direito aplicada e a correcta interpretação e aplicação do disposto no artigo 120.º do CPTA.

Pelo que, por esta ordem de razões, individualmente ou em conjunto, deve o presente recurso improceder, mantendo-se a decisão proferido pelo Tribunal a quo.

c) No que à putativa nulidade da decisão diz respeito, importa salientar que

c.1) o Tribunal a quo, ao contrário do alegado pelo Recorrente, justificou devidamente os factos dado como indiciariamente provados, nomeadamente, reitere-se, no acervo documental junto aos autos [e não só à fé que merecem mas também por não terem sido impugnados] e na posição assumida pelas partes em todos os seus articulados, devendo este Venerando Tribunal a quem, com o devido respeito, considerar tal justificação e fundamentação suficiente e respeitado o n.º 4 do artigo 607.º do CPC – neste sentido, vd. acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 29.09.2014 [processo n.º 2494/14.8TBVNGP1] – e, em consequência, manter a douta decisão em crise,

c.2) sendo certo que a alegada omissão desta formalidade [inscrita no n.º 4 do artigo 607.º do CPC] sempre consubstanciaria numa nulidade processual e não numa nulidade de sentença [como parece enquadrar o Recorrente], uma vez que as nulidades da sentença, taxativamente previstas no art. 615.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, não compreendem a decisão sobre a matéria de facto (acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 29.10.2015, processo n.º 161/09.3TCSNT.L1-2).

d) Quanto ao alegado erro notório de prova, o mesmo soçobra na incorrecta convicção do Recorrente na produção da prova testemunhal, pelo que, sublinhe-se novamente, toda a matéria de facto assente foi bem seleccionada e bem fundamentada pelo Tribunal a quo, não se verificando, portanto, nem a apontada nulidade, nem a apontada insuficiência, nem o apontado erro na sua apreciação.

Pelo que, também por esta ordem de razões, mantendo-se a douta sentença em causa, deve mui respeitosamente o presente recurso improceder.

e) No que alegado erro de julgamento concerne, nomeadamente na apreciação do preenchimento dos requisitos previstos no artigo 120.º do CPTA, afigura-se que não assiste razão ao Recorrente, não merecendo qualquer censura o doutamente decidido.

e.1) É que, o Recorrente conforma-se com o segmento decisório da sentença que julga não se afigurar como evidente a procedência da pretensão a formular no processo principal: “Salta à vista que o caso vertente não passa pelo crivo da evidência” (fls. 8 da douta sentença);

e.2) E convirá referir que, contrariamente ao que parece pressupor o Recorrente, o teor do acto por si pretendido, isto é, o reconhecimento de uma creditação e experiências prévias, não é vinculado: esta operação supõe, desde logo, uma actividade de avaliação e ponderação de curriculum e conteúdos programáticos que apenas pode ser levado a cabo pelo órgão competente da Universidade, gozando de amplo poder discricionário, sob pena de violação do princípio da autonomia universitária (previsto no artigo 72.º da CRP) e do princípio da separação dos poderes (previsto no artigo 2.º da CRP e n.º 1 do artigo 3.º do CPTA), que veda aos Tribunais a possibilidade de violarem os limites da actuação administrativa, o que só de per si afasta a viabilidade da pretensão do Recorrente [que, note-se, pretende impor à UMinho que lhe reconheça (ainda que provisoriamente) o grau de licenciatura e aceite a sua inscrição (ainda que provisória) no segundo ciclo de estudos (mestrado)].

e.3) Sendo certo que, relativamente ao pressuposto periculum in mora, o Recorrente não logra afastar – por verdadeira impossibilidade legal – o limite consagrado na alínea e) do n.º 1 do artigo 45.º do Regulamento Académico da Universidade do Minho: é que mesmo que se operasse a creditação total das UC's, nunca ao Recorrente seria reconhecida a almejada licenciatura e, consequentemente, nunca se poderia inscrever no segundo ciclo de estudos (mestrado), pois que este limite legal de reconhecimento de UC's é o próprio fundamento da não verificação do requisito em apreço: não há perigo de situação de facto consumada que imponha a procedência da providência cautelar, uma vez que o Recorrente pode frequentar a licenciatura nos anos seguintes e apresentar-se a exames sempre que o entender, sem prejuízo de lhe ser reconhecida a equivalência a determinadas UC's.

f) Assim, afigura-se, de forma clara, que a douta sentença fez uma correcta interpretação e aplicação do previsto no artigo 120.º do CPTA,

pelo que, não dando provimento ao recurso em causa e mantendo a douta decisão em crise, far-se-á a habitual JUSTIÇA!”.

O Ministério Público, notificado ao abrigo do disposto no artº 146º, nº 1, do CPTA, pronunciou-se fundamentadamente, em termos que se dão por reproduzidos, pelo não provimento do recurso.

As questões suscitadas(2) e a decidir(3), se a tal nada obstar, resumem-se em determinar se a decisão recorrida padece da arguida nulidade “nos termos do artigo 615º, nº 1, al. d), do C.P.C.” e de erro na apreciação da matéria de Direito que lhe vem imputado.

Cumpre decidir.

II – FUNDAMENTAÇÃO

II.1 – OS FACTOS ASSENTES NA DECISÃO RECORRIDA

A matéria de facto fixada, como indiciariamente provada, pela instância a quo é a seguinte:

A) O Requerente tem cédula profissional de Solicitador – cf. documento de fls. 58 e 59 dos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.

B) O Requerente tem cédula profissional de Solicitador de Execução – cf. Documento de fls. 57 e ss. dos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.

C) O Requerente inscreveu-se no 1.º ano do curso de Direito da Universidade do Minho no ano lectivo de 2014/2015 – por acordo

D) Em 24/3/2015, o Requerente dirigiu à Universidade do Minho requerimento com vista à creditação de formação e experiência prévias, ao abrigo do disposto no artigo 14.º do Regulamento Académico da Universidade do Minho – cf. Documento de fls. 13 dos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.

E) Tendo instruído o requerimento com certidão de conteúdos programáticos e cargas horárias das unidades curriculares efectuadas no âmbito do Curso de Formação para Solicitadores de 1997/99, leccionado sob a égide da Câmara dos Solicitadores – Conselho Regional do Norte – cf. documento de fls. 14 a 55 dos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.

F) Nessa mesma data – 24/3/2015 –, o ora Requerente, na qualidade de aluno do curso de Direito, requereu ao Exmo. Senhor Reitor da Universidade do Minho conforme segue: “se digne ordenar a equivalência a todas as unidades curriculares que se junta em anexo” – cf. documento de fls. 56 dos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.

G) Em 30/4/2015, o Requerente tomou conhecimento de que o requerimento foi, em 1/4/2015, “indeferido [pelo Presidente do Conselho Pedagógico], uma vez que os planos curriculares das UC´s realizadas no âmbito da Formação efectuadas são insuficientes para creditar as mesmas às UC´s leccionadas pela Escola de Direito da Universidade do Minho” – por confissão e cf. documento de fls. 66 dos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.

H) Em 6/7/2015, o Requerente dirigiu à Universidade do Minho um pedido de reapreciação do pedido de equivalência – cf. documento de fls. 67 e ss. dos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.

I) Por ofício expedido em 13/7/2015, a Entidade Demandada levou ao conhecimento do Requerente o seguinte:

Sua comunicação de nossa referência data

SA.519/15 13 Julho'15

mensagem

Na sequência da reclamação apresentada por V. Exa. nestes Serviços no passado dia 06 de julho, cumpre-me informar que, conforme verificado nos registos respetivos, no dia 15 de abril de 2015 foi notificado por estes Serviços, através da Secretaria Eletrónica do Portal Académico (http://alunos_uminho.pt/), do parecer emitido pelo Conselho Pedagógico da Escola de Direito relativamente ao pedido de creditação de formação prévia apresentado a 24 de março. Refira-se que o parecer em causa foi recebido nos Serviços Académicos no dia 14 de abril.

No que concerne ao pedido de reapreciação apresentado por V. Exa a 16 de junho, cumpre-me informar que, tal corno notificação que lhe foi remetida por estes Serviços a 29 de junho, igualmente através da Secretaria Eletrónica, o mesmo foi indeferido por aplicação do disposto na al. a) do n.º 7 do artigo 14° do referido Despacho RT, o qual estabelece que "em caso de recurso ou de pedido de reapreciação [...] os requerimentos não fundamentados ou entregues fora do prazo de 5 dias após a receção da notificação da decisão são liminarmente indeferidos pelo diretor dos SAUM".

- cf. documento de fls. 73 dos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.

J) Em 2015, Requerente ficou aprovado na Formação Inicial do Geopredial, decorrida em Barcelos, em 2014, com a duração de 62 horas – cf. documento de fls. 71 dos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.

K) Em Setembro de 2015, deu entrada em juízo a petição inicial relativa ao processo principal – acção administrativa especial de condenação à prática de acto devido – que corre termos sob o n.º 2782/15.6 BEBRG-A, na qual se formulou o pedido que se transcreve: “deve a presente acção ser julgada procedente por provada e, em consequência, a entidade demandada condenada à prática de acto devido consubstanciado no reconhecimento da creditação da formação e experiências prévias de modo a ser reconhecido a o A. o grau de licenciatura em Direito (de tal sorte que seja permitida a sua inscrição no 1.º ano do Ciclo de estudos conducentes ao grau de mestre).” – cf. documento de fls. 1 e ss. do processo n.º 2782/15.6 BEBRG-A, do qual depende a presente acção cautelar.

*

A convicção deste Tribunal quanto aos factos provados alicerçou-se nos documentos para os quais remete o probatório, atenta não só a fé que merecem, mas também por não terem sido impugnados, bem como no acordo das partes atenta a posição assumida nos respectivos articulados.”.

Não se mostram identificados factos cuja não prova haja relevado para a decisão da causa.

II.2 – DO MÉRITO DO RECURSO

Vertidos os termos da causa e a posição das partes, passamos a apreciar cada uma das questões a decidir, já acima elencadas.

II.2.1. Da alegada nulidade “nos termos do artigo 615º, nº 1, al. d), do C.P.C.”, por falta de fundamentação de facto.

Conclusões 1ª a 7ª da alegação de recurso.

Entende o Recorrente que a sentença recorrida é nula porque não especifica os fundamentos de facto que o Recorrente entende contidos nos “artigos 52, 53, 54, 55, 56, 57, 58, 59, 60, 61, 62, 63, 64, 65, 66, 67, 68, 69, 71, 72, 74, 75, 76, 82, 83, 84, 85 e 86”, todos do requerimento inicial, na consideração de que “Estes factos não foram incluídos nos factos provados mas também não foram considerados não provados.

Mas não tem razão, por várias razões, senão vejamos:

Em primeiro lugar, do que vem articulado nos identificados artigos do requerimento inicial, com excepção do alegado no artigo 55º (irrelevante para o conhecimento do mérito da causa, cujo periculum in mora, por essa via, não foi posto em crise), nenhum outro facto ali se mostra alegado. Mostram-se ali exaradas conjecturas, juízos de prognose, conclusões, mas não factos concretos (ocorrências concretas da vida real; comportamentos humanos, por acção ou omissão), sendo que quanto aos factos abstractos para fins de prova têm interesse como fundamento material de regras da experiência, em função dos quais se valoram factos ou elementos normativos de factos e que não são matéria de facto ou objecto directo de prova, como ensina Cavaleiro de Ferreira, in Curso de Processo Penal, 1956, II, pag. 286.

Em segundo lugar, a nulidade invocada ocorre, no que aos fundamentos de facto tange, apenas quando a sentença não especifique os fundamentos de facto que justificam a decisão.

O Recorrente não alega, nem se vislumbra, qualquer aspecto da decisão que não esteja suportada ou justificada (bem ou mal, o que contenderia já com o mérito da decisão) pelos factos assentes.

Ademais, a sentença pronunciou-se no sentido de que “a boa decisão cautelar dispensa o Tribunal de realizar qualquer outra diligência de prova”, considerando, de seguida que “com interesse para a decisão do processo cautelar, consideram-se indiciariamente provados os factos que seguem” e já acima elencados, cabendo ao Recorrente demonstrar a medida concreta da insuficiência dos factos tidos em conta na sentença, que alega, o que apenas abstracta e formalmente invoca.

Todavia, como bem nota o Ministério Público no seu Parecer, “o Recorrente não logrou densificar como e em que medida o aditamento, ao probatório, desses alegados factos assumiria forçosamente repercussão na decisão final, ou seja, se determinaria a procedência da pretensão cautelar, facto que, de resto, não se vislumbra”.

Em terceiro lugar, verifica-se que a sentença recorrida não identifica factos cuja não prova haja relevado para a decisão da causa, nem o Recorrente alega que a não prova de algum facto haja relevado para esse efeito, pelo que a sua não prova é igualmente irrelevante para a decisão e daí a irrelevância do seu enunciado enquanto factos não provados na decisão cautelar.

Por fim, a matéria alegada naqueles artigos denota situar-se no contexto do pressuposto do fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses em causa [alínea c) do nº 1 do artigo 120º do CPTA/2002 ao caso aplicável] e bem assim para a ponderação de interesses a que alude o nº 2 daquele artigo 120º.

Ora, não só aquele pressuposto foi apreciado, bem ou mal, o que contende já com o seu mérito, como a ponderação de interesses não se impõe que seja realizada, uma vez que, sendo cumulativos os pressupostos de que depende a adopção da providência cautelar, esta claudicou pelo não preenchimento do pressuposto do fumus boni iuris.

Improcedem os fundamentos da alegação nesta matéria.

II.2.2. — Do erro na apreciação do pressuposto do fumus boni iuris.

Em face do carácter cumulativo da verificação dos pressupostos de que, no âmbito do disposto no artigo 120º do CPTA, depende a adopção de providências cautelares, e porque esta questão não depende da apreciação das restantes questões suscitadas pelo Recorrente, nem da atinente matéria, impõe-se o conhecimento, antes do mais, do erro na apreciação do pressuposto do fumus boni iuris (conclusões 15ª a 19ª).

Vejamos, em primeiro lugar, o segmento da decisão recorrida que apreciou tal pressuposto:

Tal como mencionado, o interessado convocou, na acção principal, um instrumento que lhe permite obter uma sentença do Tribunal sobre o mérito da sua pretensão, não tendo de se importar com o acto de indeferimento, tácito ou mesmo expresso, cuja eliminação resultará, directamente, da pronúncia condenatória.

Esta sentença que o interessado pretende obter no processo principal (e paralelamente o efeito provisório que almeja com o processo cautelar) configura uma verdadeira injunção à Administração e suscita um problema delicado que é o dos limites da intervenção do poder judicial na área da actividade administrativa.

É certo que a lei de processo resolveu esse problema articulando de uma forma equilibrada os parâmetros constitucionais da tutela jurisdicional efectiva com a autonomia da função administrativa.

Mas também é certo que se o acto não for vinculado – tal como ocorre no caso vertente – o Tribunal não poderá determinar – definitiva e/ou provisoriamente – o conteúdo do acto a praticar, apenas poderá explicitar as vinculações a observar pela Administração na emissão do acto devido.

Por um lado, afigura-se bem sustentada a tese do Requerente segundo a qual o acto que indeferiu a pretensão administrativa do Requerente exibe uma fundamentação insuficiente.

Com efeito, a afirmação: “os planos curriculares das UC´s realizadas no âmbito da Formação efectuada são insuficientes para creditar as mesmas às UC´s leccionadas pela Escola de Direito da Universidade do Minho”, constitui uma mera conclusão, não apresentando sequer uma sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito da decisão. Qualquer destinatário fica sem saber qual o quadro legal aplicado, os critérios convocados, se foi creditada a formação prévia, em caso afirmativo, como é que se estabeleceu a equivalência entre as cadeiras frequentadas no curso (grau) obtido com as que compõem o curso cujo respetivo diploma (grau) é pretendido, quais as UC´s que mereceram equivalência e quais as UC´s que não mereceram equivalência, quando é sabido que o direito à fundamentação tem consagração constitucional e assume uma natureza análoga aos direitos, liberdades e garantias consagrados no Título II da parte 1ª da CRP - artigo 268.º da CRP. O interessado - mau grado a natureza técnica e científica que tal decisão possa envolver – tem sempre direito a obter uma decisão judicial sobre a actuação da Administração naqueles momentos que podem e devem ser sindicados pelo Tribunal.

Sucede, porém, que o Requerente não logrou provar, ainda que sumariamente, do provável êxito da pretensão formulada no processo principal atento, desde logo, o limite estabelecido na alínea e) do n.º 1 do artigo 45.º do Regulamento Académico da Universidade do Minho.

Ou seja, ainda que o pedido de creditação lograsse êxito, nunca lhe seria reconhecido na acção principal o grau de licenciatura em Direito, face ao limite estabelecido na referida alínea e) do n.º 1 do artigo 45.º do Regulamento Académico da Universidade do Minho.

Assim, atendendo a que a creditação propriamente dita só pode ser efectuada pelo Órgão competente no seio da Entidade Demandada, em virtude dos amplos momentos de discricionariedade ou de livre apreciação administrativa que o acto que se pretende obter comporta, e – bem assim – que, ainda que se operasse a creditação total das UC´s , o Requerente não obteria – sem mais – o grau de licenciatura em Direito, face ao limite legalmente estabelecido no Regulamento Académico da Universidade do Minho [artigo 45.º, n.º 1, alínea e)], forçoso será concluir pela falta de preenchimento do pressuposto “fumus boni iuris”, a ditar o naufrágio da providência requerida.” (afigura-se mencionado em erro o artigo 45º, pois a norma invocada encontra-se, sim, no artigo 14º do referido Regulamento).

A estes fundamentos opõe o Recorrente as seguintes conclusões:

“Quanto ao requisito do fumus boni iuris, para além da existência de um direito ou interesse do particular a merecer tutela, existe também a séria probabilidade da ilegalidade da actuação administrativa lesiva do mesmo.

A prova do provável êxito da pretensão formulada no processo principal é feita com a análise do acervo documental junto com a petição inicial, bem como do extraído da matéria constante dos artigos 2 a 49 da petição inicial, a qual foi devidamente provada com os documentos juntos.

Da própria sentença resulta que "o acto que indeferiu a pretensão administrativa do Requerente exibe uma fundamentação insuficiente”, o que inquina o acto de ilegalidade.

Não é pelo facto de existirem momentos de discricionariedade administrativa que a acção será automaticamente improcedente, ou que a probabilidade da sua procedência será bastante diminuta já que tal entendimento consubstanciaria uma violação do princípio da tutela jurisdicional efectiva constitucionalmente consagrado.

Tendo em conta o exposto, há uma real possibilidade da acção principal ser julgada procedente, o que leva a que se encontre preenchido o requisito do fumus boni iuris.”.

É de notar, desde logo, que os fundamentos pelos quais soçobrou a requerida providência acautelar não foram atacados pelo Recorrente, a saber, “… a creditação propriamente dita só pode ser efectuada pelo Órgão competente no seio da Entidade Demandada, em virtude dos amplos momentos de discricionariedade ou de livre apreciação administrativa que o acto que se pretende obter comporta, e – bem assim – que, ainda que se operasse a creditação total das UC´s, o Requerente não obteria – sem mais – o grau de licenciatura em Direito, face ao limite legalmente estabelecido no Regulamento Académico da Universidade do Minho [artigo 45.º, n.º 1, alínea e)]…”.

Assim, tendo sido demonstrado na sentença recorrida, com fundamentos que não foram impugnados, que a pretensão formulada no processo principal virá a ser julgada improcedente, pois a tanto obsta o regime jurídico aplicável, legal e regulamentar, não se pode ter por verificado o requisito de que seja provável que a pretensão formulada ou a formular nesse processo venha a ser julgada procedente, o qual também não decorre do facto de se ter considerado que o acto de indeferimento da pretensão administrativa do Requerente exibe uma fundamentação insuficiente, mero vício de forma, pois a tanto obsta a consideração de que “ainda que se operasse a creditação total das UC´s, o Requerente não obteria – sem mais – o grau de licenciatura em Direito, face ao limite legalmente estabelecido no Regulamento Académico da Universidade do Minho [artigo 45.º, n.º 1, alínea e)]”.

Dispõe o artigo 45º do Decreto-Lei n.º 74/2006, de 24 de Março, alterado e republicado pelo Decreto-Lei n.º 115/2013, de 7 de Agosto:


Artigo 45.º

Creditação


1 - Tendo em vista o prosseguimento de estudos para a obtenção de grau académico ou diploma, os estabelecimentos de ensino superior:

a) Creditam a formação realizada no âmbito de outros ciclos de estudos superiores conferentes de grau em estabelecimentos de ensino superior nacionais ou estrangeiros, quer a obtida no quadro da organização decorrente do Processo de Bolonha, quer a obtida anteriormente;

b) Creditam a formação realizada no âmbito dos cursos de especialização tecnológica até ao limite de um terço do total dos créditos do ciclo de estudos;

c) Creditam as unidades curriculares realizadas com aproveitamento, nos termos do artigo 46.º-A, até ao limite de 50% do total dos créditos do ciclo de estudos;

d) Podem atribuir créditos pela formação realizada no âmbito de cursos não conferentes de grau académico em estabelecimentos de ensino superior nacionais ou estrangeiros, até ao limite de 50% do total dos créditos do ciclo de estudos;

e) Podem atribuir créditos por outra formação não abrangida pelas alíneas anteriores, até ao limite de um terço do total dos créditos do ciclo de estudos;

f) Podem atribuir créditos pela experiência profissional devidamente comprovada, até ao limite de um terço do total dos créditos do ciclo de estudos.

2 - O conjunto dos créditos atribuídos ao abrigo das alíneas b), d), e) e f) do número anterior não pode exceder dois terços do total dos créditos do ciclo de estudos.

3 - A atribuição de créditos ao abrigo da alínea f) do n.º 1 pode ser total ou parcialmente condicionada à realização de procedimentos de avaliação de conhecimentos específicos.

De notar que o legislador impõe, em cada caso, excepto no da alínea a) do nº 1, que não é o caso dos autos, limites na atribuição dos créditos, de vão de um terço a 50% do total dos créditos do ciclo de estudos.

O Recorrente, no seu requerimento inicial alega — e mostra-se vertido no acervo probatório em D) a F) — que dirigiu à Universidade do Minho um requerimento de creditação de formação e experiências prévias, ao abrigo do Despacho RT-41/2014, de 4 de Agosto, artigo 14º.

Dispõe a invocada norma regulamentar no seu nº 1, sob a epígrafe Reconhecimento da formação e experiência prévias (com nossa relevância gráfica):

1. Nos termos da lei, tendo em vista o prosseguimento de estudos para a obtenção de grau académico ou diploma, a UMinho:

a) Credita nos seus ciclos de estudos a formação realizada no âmbito de ciclos de estudos de outras instituições de ensino superior nacionais ou da própria UMinho;

b) Credita nos seus ciclos de estudos a formação realizada no âmbito de ciclos de estudos superiores em estabelecimentos de ensino estrangeiros, ponderados os elementos relativos à instituição e curso ou formação de origem;

c) Credita as UC realizadas com aproveitamento, nos termos do artigo 21.º, até 50% do total dos créditos (ECTS) do ciclo de estudos;

d) Credita nos seus ciclos de estudos a formação realizada no âmbito dos cursos de especialização tecnológica nos termos fixados pelo respetivo diploma;

e) Pode creditar outra formação académica não abrangida pelas alíneas anteriores, até ao limite de um terço do total dos créditos (ECTS) do ciclo de estudos;

f) Pode creditar experiência profissional devidamente comprovada, até ao limite de um terço dos créditos (ECTS) correspondentes ao ciclo de estudos; esta creditação pode ser total ou parcialmente condicionada à realização de provas de conhecimentos.

Ora, na acção principal — veja-se o facto assente em K) —, que corre termos sob o n.º 2782/15.6 BEBRG-A, o ora Recorrente formulou o pedido que se transcreve (com nossa ênfase gráfica): “deve a presente acção ser julgada procedente por provada e, em consequência, a entidade demandada condenada à prática de acto devido consubstanciado no reconhecimento da creditação da formação e experiências prévias de modo a ser reconhecido a o A. o grau de licenciatura em Direito (de tal sorte que seja permitida a sua inscrição no 1.º ano do Ciclo de estudos conducentes ao grau de mestre)..

Como é bem de ver, este pedido, votado ao fracasso pelos supra apontados motivos, determina que se julgue não verificado o requisito de que seja provável que essa pretensão venha a ser julgada procedente, ínsito na alínea c) do nº 1 do artigo 120º do CPTA/2002.

Improcedem totalmente os fundamentos do recurso nesta matéria.

Sendo de conhecimento cumulativo os requisitos de que depende a adopção de medidas cautelares ao abrigo do regime do artigo 120º do CPTA/2002 — cfr., entre muitos outros, acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 12-01-2012, processo nº 0857/11 —, fica prejudicado o conhecimento de tudo o mais.

III.DECISÃO

Termos em que os juízes da Secção do Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte acordam em negar provimento ao recurso.

Custas pelo Recorrente, por lhes ter dado causa.

Notifique e D.N..

Porto, 20 de Maio de 2016
Ass.: Helder Vieira
Ass.: Alexandra Alendouro
Ass.: João Beato
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(1) Nos termos dos artºs 144.º, n.º 2, e 146.º, n.º 4, do CPTA, 660.º, n.º 2, 664.º, 684.º, n.ºs 3 e 4, e 685.º-A, n.º 1, todos do CPC, na redacção decorrente do DL n.º 303/07, de 24.08 — cfr. arts. 05.º e 07.º, n.ºs 1 e 2 da Lei n.º 41/2013 —, actuais artºs 5.º, 608.º, n.º 2, 635.º, n.ºs 4 e 5, 639.º e 640º do CPC/2013 ex vi artºs 1.º e 140.º do CPTA.
(2) Tal como delimitadas pela alegação de recurso e respectivas conclusões, nas quais deve ser indicado o fundamento específico da recorribilidade — artigos 608º, nº 2, e 635º, nºs 3 e 4, 637º, nº 2, 639º e 640º, todos do Código de Processo Civil ex vi artº 140º do CPTA.
(3) Para tanto, e em sede de recurso de apelação, o tribunal ad quem não se limita a cassar a decisão judicial recorrida porquanto, “ainda que declare nula a sentença, o tribunal de recurso não deixa de decidir o objecto da causa, conhecendo do facto e do direito”, reunidos que se mostrem os necessários pressupostos e condições legalmente exigidas — art. 149.º do CPTA.