Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01241/05.0BEVIS
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:02/01/2019
Tribunal:TAF de Aveiro
Relator:Helena Canelas
Descritores:CASO JULGADO – OBJETO E LIMITES DA DECISÃO
Sumário:
I - Se o Tribunal de recurso reconheceu ocorrer erro de julgamento da matéria de facto e determinado concomitantemente a necessidade de se proceder a diligências instrutórias por se mostrar controvertido facto tido como essencial para a resolução do objeto do litígio, impondo a baixa do processo ao TAF para tais efeitos, aí prosseguindo os seus termos, a procedência daquele recurso, com revogação (anulação) da decisão da 1ª instância, implicava, assim, o apuramento daquele facto considerado controvertido, mas, obviamente, a causa não se encontrava decidida, pelo que se impunha ao TAF que proferisse nova decisão.
II – A circunstância de o TAF, na nova decisão, ter elencado a matéria de facto provada de modo distinto ao que constava da sua anterior decisão, que não havia sido objeto do recurso, não é bastante para se considerar ocorrer violação de caso julgado quanto ao julgamento da matéria de facto, já que para que a mesma ocorresse mister era que houvesse oposição entre o probatório das duas decisões.
III – Para efeitos do disposto naquele nº 2 do artigo 95º do CPTA (na versão original), o que releva é que o tribunal se tenha circunscrito à apreciação dos fundamentos de impugnação do ato (causas de invalidade) invocados pelo autor na ação, os quais configuram a causa de pedir (isto sem prejuízo da possibilidade de conhecimento oficioso de distintos fundamentos de invalidade não concretamente alegados, mas que possam ter ser constatados pelo juiz, assegurado que seja, neste caso, o necessário contraditório), tendo em conta, de todo o modo, que o tribunal não está absolutamente vinculado ao nomen juris atribuído ou usado pela parte, como aliás decorre do disposto no artigo 5º do CPC novo (aprovado pela Lei nº 41/2013), correspondente ao artigo 664º do CPC antigo.
IV – Os recursos jurisdicionais são meios judiciais de refutar o acerto da decisão judicial, tendo o recorrente de alegar e concluir os fundamentos porque considera a decisão recorrida sofre dos vícios que lhe imputa e que conduzem à sua anulação ou revogação; alegações em que a parte deverá expor as razões por que ataca a decisão recorrida e conclusões em que procederá à indicação resumida dos fundamentos por que pede a revogação, alteração ou a anulação da decisão recorrida (cfr. artigo 639º do CPC novo, correspondente ao anterior artigo 690º, ex vi dos artigos 1º e 140º do CPTA).
V – Não há que fazer aplicar o nº 4 do artigo 146º do CPTA no sentido do aperfeiçoamento das conclusões do recurso se o recorrente, por não ser o autor na ação, naturalmente não reafirmou os vícios imputados ao ato impugnado, hipótese que é a única prevista naquele normativo, e também não apresentou qualquer argumentação em defesa da inverificação das ilegalidades, mesmo que por repetição que fosse daquela que por si já havia sido aduzida em sede de ação. *
*Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:MUNICÍPIO DE SJM
Recorrido 1:PAPC
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Especial para Impugnação de Acto Administrativo (CPTA) - Recurso Jurisdicional
Decisão:
Negar provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido do presente recurso dever merecer provimento
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Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:

I. RELATÓRIO
PAPC (devidamente identificado nos autos), instaurou no Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu contra o réu MUNICÍPIO DE SJM Ação Administrativa Especial na qual peticionou a nulidade dos atos impugnados, identificados como (1) o ato proferido pela Câmara de SJM, no âmbito do processo disciplinar n.º 01/2004, de 26/04/2005, que lhe aplicou a pena disciplinar de aposentação compulsiva e (2) o ato proferido pelo Vice-Presidente daquela Câmara Municipal em 11/06/2003, através do qual a Entidade demandada lhe determinou que a partir de então deveria passar a exercer funções de ajudante de topógrafo.
Por acórdão de 31/07/2010 do coletivo de juízes do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro (para onde o processo foi remetido em 15/04/2009, em conformidade com a Deliberação tomada na sessão de 19 de Março de 2009, pelo Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais – cfr. fls. 293 SITAF) foi a ação julgada improcedente e o réu absolvido dos pedidos (cfr. fls. 322-SITAF).
Inconformado dele interpôs o autor recurso para este TCA Norte, ao qual foi concedido provimento por acórdão de 12/10/2012, revogando o acórdão recorrido e determinando a baixa dos autos à 1ª instância para que aí fosse apurado o facto que havia sido dado como provado no acórdão do TAF sob a alínea J) do probatório, mas que se achava controvertido: saber se o Autor foi (ou não) reintegrado na sua carreira técnica e respetiva categoria de aferidor de pesos e medidas.
Após suspensão da instância, determinada por despacho de 05/02/2013 da Mmª Juíza a quo (fls. 734 SITAF), até ao trânsito em julgado da sentença de 17 de Setembro de 2012 proferida nos autos de execução n.º 18-A/2002, que correu termos no Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, então pendente de recurso interposto para este TCA Norte, prosseguiram os autos, tendo a Mmª Juíza a quo considerado, por despacho de 11/07/2016 (fls. 1020 SITAF) que transitada em julgado a identificada sentença, o processo já continha os elementos documentais necessários, não sendo necessário proceder a quaisquer diligências de prova, pelo que determinou a notificação das partes para produzirem alegações escritas nos termos previstos no artigo 91º nº 4 do CPTA.
Foi então proferida a sentença de 24/01/2017 (fls. 1072 ss. SITAF), que julgando parcialmente procedente a ação absolveu o réu Município do pedido de anulação do ato de 11/06/2003, que determinou a recolocação do Autor, mantendo-o na ordem jurídica e anulou o ato que lhe aplicou a pena de aposentação compulsiva datado de 26/04/2005.
Inconformado o réu Município de SJM dela interpôs o presente recurso de apelação, formulando as seguintes conclusões nos seguintes termos:
1° O recurso de apelação em processo administrativo, funciona como um verdadeiro segundo grau de jurisdição, julgando de novo o mérito da causa, quer sobre a matéria de facto quer de direito, não só revogando a decisão recorrida, como substituindo a decisão recorrida por uma nova decisão que venha a dirimir ex novo o litígio, em substituição daquela que tinha sido substituída em primeira instância.
2° - É isso o que se pretende do tribunal ad quem, circunscrito obviamente à verificação jurisdicional da validade da deliberação da Câmara Municipal de SJM de 26 de abril de 2005 que, mediante prévio processo disciplinar em que foi arguido o aqui Autor/Apelado lhe aplicou a pena disciplinar de aposentação compulsiva, nos termos do art.° 3°, nº 4 alíneas g) e h) e 26°, n.1, h) do DL n.º 24/84 - Estatuto Disciplinar então vigente.
3° - É que o douto Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, de 12 de Outubro de 2012 que revogara o Acórdão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro de 31 de julho de 2010, a fls. 294-309 dos autos que tinha julgado em primeira instância, totalmente improcedente, esta mesma ação administrativa especial, ora de novo julgada, em primeira instância, pela douta sentença recorrida, determinara tão só a baixa dos autos ao Tribunal recorrido, para aí prosseguirem os seus termos com vista tão só, ao apuramento do facto aí dado como provado, designado por J) dos factos assentes no aí Acórdão recorrido e revogado a folhas 7 que continha a seguinte redação:
J) Após o trânsito em julgado da referida sentença foi o Autor reintegrado na sua carreira técnica e respetiva categoria de aferição de pesos e medidas, recebendo o vencimento correspondente <á sua categoria e escalão e subsídio de férias, em novembro de 2002, conforme doc. nº 2 anexo à Contestação...”
4° - Esse mesmo Acórdão, parcialmente revogatório do Tribunal ad quem, considerou e, como tal, sindicou os restantes factos aí dados por assentes - vide páginas 6 de 13 a 11 de 13, in fine, constituindo, nessa parte, caso julgado.
- Tal facto contido na alínea J) é classificado como "facto essencial controvertido" e nessa medida, o entendimento de que os autos deviam baixar à primeira instância, pois o Tribunal a quo, não deveria decidir logo do mérito, sem produção de prova suplementar, para além do simples comprovativo do processamento do vencimento de novembro de 2002.
- E aconselha mesmo o Tribunal a quo o modo como deve produzir prova ou não, à matéria constante da alínea J) do facto que aí deu como assente e que constituiu a ratio da revogação do douto Acórdão, dizendo-se que seria "Mais conveniente, aliás, por forma a evitar a repetição da prova ou a contradição dos seus resultados naquele processo de execução - onde se apura se o julgado anulatório foi cumprido, com a reintegração efetiva do Autor na sua categoria - seria suspender os termos do presente processo até que se decida de mérito o processo de execução, com trânsito em julgado".
- Foi o que o douto Tribunal a quo fez, suspendendo a instância, por despacho de 5 de fevereiro de 2013 (cfr., folhas 779) até que transitasse em julgado a sentença proferida nos autos de execução nº 18-A/2002 que corriam termos no TAF de Coimbra.
- Só vindo a transitar em julgado, após a prolação em 2 de julho de 2015 do recurso de Apelação para TCAN, entretanto interposto pelo Autor aí exequente e que julgou improcedente o pedido formulado, com os fundamentos, entre outros, transcritos em "24 dos factos provados" in douta sentença, ora objeto de Apelação (a folhas 23, 24 e 25 cfr., Acórdão a fls. 947 e seguintes).
- E aí se conclui:
(...) Em suma, o Recorrente foi efetivamente reintegrado nas funções e categoria que exercia antes do ato declarado nulo, não podendo o efeito repristinatório dessa declaração de nulidade servir de suporte para corrigir alegadas desconformidades já presentes na situação anterior do Exequente/recorrente à qual regressou por efeito da reintegração e que, sublinhe-se, o próprio nunca antes impugnou judicialmente pelo meio próprio" ipsis verbis".
10º - Conclusão essa que deveria substituir citada alínea j) dos factos dados como provados, o que conduziria, em tudo o mais, a que fosse prolatado uma nova sentença (não nos termos da recorrida que respeitasse o alcance do caso julgado, de facto et jure, com a consequente absolvição da instância da Entidade demandada, tal qual o douto Acórdão do Tribunal a quo, apenas parcialmente revogado de 31 de julho de 2010.
Sem prescindir, para a situação académica de assim não ser entendido por Vossas Excelências,
11º - Mas antes veio a douta sentença recorrida, ao acrescentar um conjunto de factos novos que passa a dar como provados (de N factos contidos no douto Acórdão de 31 de julho de 2010 aos atuais 24 factos dados como provados) prima faciae a violar por ofensa ao caso julgado, o próprio Acórdão revogatório deste mesmo Venerando Tribunal de 12 de outubro de 2012, nos termos do disposto no n.º 2, a) do art.° 629° do CPC, em remissão do artº 1º do CPTA.
12º - Porém, por despacho de folhas 107 e 108, assim como despacho a folhas 113 e 114 dos autos, o Meritíssimo juiz da causa, considerou ilegal a cumulação dos pedidos formulados e mesmo inviável a sua apreciação subsidiária, notificando o Autor para indicar qual o pedido que pretendia ser apreciado neste processo, conforme o então preceituado no n.º 5 do art.° 47° do CPTA.
13º - De modo algum o despacho de 22.03.2007 a que se reporta a douta sentença recorrida que afirma ser subsidiária a apreciação dos pedidos formulados pelo Autor em que a declara de nulidade do despacho de 01.06.2003 seria o pedido principal, é revogatório dos despachos de folhas 107 e 108, assim como despacho a folhas 113 e 114 dos autos.
14° - Parece-nos antes inquestionável que a parte inicial do douto despacho, da autoria da Meritíssima Juiz, Dr.ª Alexandra Alendouro, agora ilustre Desembargadora deste mesmo Venerando Tribunal a quem, a folhas 136 não é, de modo algum, revogatório dos doutos despachos precedentes de folhas 107 e 108 e 114, 115 dos autos, antes deverá ser interpretado como a a aceitação, como pedido único, por força da cominação do então artº 47º, nº 5 do CPTA, do pedido de declaração de nulidade do despacho de 11.06.2003.
15º - O que igualmente conduziria à absolvição da Entidade demandada do único pedido em apreciação nos autos, pelo mesmo ser considerado válido na ordem jurídica, tal qual decidiu e bem, a douta sentença recorrida.
Se igualmente assim não for entendido, o que só por mero patrocínio se concede,
16º - Porém, para o entendimento contrário que apreciou - quer no douto Acórdão revogado do Tribunal a quo, quer no ora dota sentença recorrida - os dois pedidos numa relação de subsidiariedade, em que o despacho do Vice Presidente de 11-06-2003 constitui, a Autoridade Demandada só lhe competirá pronunciar-se sobre a validade da deliberação de 26-04-2005.
17º - Deliberação essa, que só agora foi posta em crise pela douta sentença recorrida que não antes, no Acórdão do coletivo de Juízes do Tribunal a quo, de 31 de julho de 2010.
18º - Porém, a Meritíssima Juiz a quo, ao contrário do coletivo precedente, usou duma "interpretação criativa" do nº 2 do artº 95º do CPTA, fazendo uma interpretação extralieral, logo sem qualquer correspondência com as causas expressas de invalidade dos atos impugnados, tal qual os mesmos foram aduzidos (ou não) pelo Autor na P. i.
19º - Pelo que os vícios a eles assacados in douta sentença recorrida, concretamente no que nos interessa - os elencados nas alíneas a) a f) a páginas 4, como vícios que efetivamente o Autor, ao contrário do que é alegado, não imputa a esse mesmo ato impugnado, expressamente viola o nº 2 do artº 95º do CPTA.
20º - Sobre a validade da deliberação de 26.04.2005 a folhas 14 do douto Acórdão do Tribunal a quo de 31 de julho de 2010, a douta apelante louva-se em toda a fundamentação de facto aí contida.
21º - E em tudo mais que Vossas Excelências doutamente suprirão.
22º - Como deverão ser julgadas infundadas, as fundamentações de facto e de direito que entendem fazer proceder o alegado vício de violação da deliberação impugnada por alegada inexistência de violação do dever de assiduidade que, na sua perspetiva decorre do "Relatório Final" do Processo disciplinar - folhas 35 a 42 ab initio da douta sentença recorrida.
23º - Como igualmente deverão ser julgadas infundadas toda a argumentação de facto et de jure que a douta sentença aduz dobre o alegado vício de violação de lei, impedimento do relator a folhas 42 a 44 ab initio.
24º - Aliás, como é sabido, a suspeição pressupõe o conhecimento de um facto que possa colocar em causa a isenção do instrutor.
25º - Provado está nos autos que estando ou não a correr o inquérito, o instrutor não tinha conhecimento, como nunca teve ao longo do processo disciplinar (o processo foi instaurado e nomeado instrutor em 18 de maio de 2004 e só dois meses volvidos do seu curso é que o defensor do arguido invoca o justo impedimento) de qualquer processo-crime contra si instaurado pelo Autor, provavelmente, como agora se percebe, de inquinar deliberadamente, a esse pretexto, um processo disciplinar já pendente.
26º - E como igualmente se encontra provado, sem qualquer fundamento válido, a participação crime foi extensiva ao Presidente da Câmara, o Vice-Presidente, todos os funcionários do Departamento, onde se inclui o instrutor e a chefe de secção do pessoal, todos acusando genericamente de abuso de pode, sem a apresentação de quaisquer factos indiciadores a quem quer que seja, ninguém vindo sequer a ser constituído arguido, só podendo ter como objetivo, tornar inútil o processo, por não haver quem, com formação jurídica o instruísse, ou mesmo quem o viesse a decidir, quer pela suspeição que igualmente levantaria, por certo, ao próprio Presidente e mesmo o Vice presidente da Câmara.
27º - Seria absurdo, por contrário ao Direito e Justiça, que nas circunstâncias concretas do caso, maxime pelo instituto do abuso de direito, procedesse o vício de violação de lei, por impedimento do instrutor e que, desse modo e por essa razão, ficasse inquinada a validade da deliberação da Câmara de 26.04.2005.
Termina pugnando pela revogação da sentença recorrida com substituição por decisão que julgue válido o ato que nela foi considerado ilegal, improcedendo a ação na sua totalidade.
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O recorrido contra-alegou pugnando pela improcedência do recurso, com manutenção da decisão recorrida, formulando o seguinte quadro conclusivo:
1 - Ao tribunal " ad quem" e face a este recurso, apenas compete conhecer os vícios e erros de julgamento que possam ser verificados na sentença em recurso e não pronunciar-se sobre matérias que não foram objecto por parte do tribunal "a quo", Cfr. 144.°, 2 do CPTA.
2 - Do conteúdo desse acórdão do TCAN não se verifica qualquer caso julgado que não permitisse que o Tribunal recorrido se pronunciasse da forma como o fez, pois não existe o pressuposto da identidade de objecto, na medida em que não parece que tenha sido proferida decisão (nessa decisão anterior do TCAN) que tenha apreciado, conforme agora o foi feito na decisão recorrida, os concretos fundamentos de facto e de direito em que se baseia a pretensão anulatória do acto impugnado, colidentes com a sentença ora proferida.
3 - Nem a sentença de que agora recorreu se pronunciou também, pelo menos, sobre a parte dispositiva da decisão do TCAN que o recorrente invoca, que de qualquer dos modos, cumpre assim com o princípio da tutela jurisdicional efectiva, (art. 3.°, e o da livre apreciação do direito, etc., do CPTA.
4 - Para além do alcance disposto no artigo 5.° do CPTA ( Da adequação formal: 5.°, e 21.° do esse diploma), considera o recorrido que apenas a incompetência da jurisdição administrativa, em relação a algum dos pedidos cumulados, constitui ou constituiria obstáculo à cumulação (Mário Aroso de Almeida, nota ao art. 5.° do CPTA), pelo que, parece ao recorrido que neste processo e neste caso concreto, não estamos sequer no âmbito duma eventual cumulação de pedidos, pois por despacho proferido nos autos em 22/03/2007, (com a referência 004027598), a Meritíssima Juíza que o proferiu, decidiu, após o convite que fez ao A para se pronunciar quanto aos pedidos, (o que este fez dizendo que ... pretendia ver estabelecida uma relação de subsidiariedade nos pedidos, na medida em que o segundo pedido formulado só deverá ser apreciado para o caso hipotético de improceder o pedido formulado em primeiro lugar...) ,
5 - Decidiu da forma seguinte: ...defiro a ordem de pedidos formulados na presente acção.! - Veja-se assim esse despacho de 22/03/2007, (com, como se disse, a referência 004027598).
6 - O recorrente, após a notificação desse despacho, nada então veio dizer, conformando-se de forma inequívoca com o seu comando, ou pelo menos aceitando as consequências com o seu silêncio, o que na opinião do recorrente, determina ter-se conformado ele próprio com a lei processual administrativa.
7 - Considera o recorrido que a disposição do n.º 2 do art. 95.° do CPTA , foi consagrada nesse diploma porque, nas palavras de Mário Aroso: - …o n.º 2 pretende superar as limitações que, do ponto de vista da extensão do objecto do processo impugnatório e da autoridade do caso julgado das sentenças anulatórias de actos administrativos, decorriam, no sistema tradicional, do facto de o objecto do recurso contencioso se encontrar delimitado em função dos vícios do acto... (in Comentário ao CPTA, 2,ª edição, - 2007).
8 - Também sem que se possa compreender, ainda por cima alegando a sua referência como lapso da sentença recorrida, cita o recorrente a este propósito, o seu citado acórdão proferido no processo 0270/06.0BEPRT, na medida em que atenta leitura, do sumário e mesmo do todo do conteúdo do mencionado acórdão só a ele recorrente lhe pode ser desfavorável.
9 - A sentença recorrida considerou verificado o suscitado vício de impedimento do Instrutor feito pelo recorrente no processo disciplinar, incidente que foi suscitado nos autos disciplinares contra o recorrido, no dia 8 de Julho de 2004.
10 - Após isto a Entidade Demandada, em 13 de Julho seguinte indeferiu o suscitado impedimento mas fazendo-o em clara violação do disposto no n.º 2 do art. 52.° do estatuto disciplinar dos funcionários e agentes da Administração Central Regional e Local. (Arguida a suspeição será a mesma levada para decisão à entidade que tiver mandado instaurar o processo disciplinar, que a proferirá no prazo máximo de 48 horas, e em despacho fundamentado - art° 52°, n°3 do ED..
11 - Quanto a esta matéria o recorrente não pode deixar passar em branco a desagradável constatação de que o recorrente persistiu numa perseguição inaceitável do A e que é evidente ao ter que se constatar que o Sr. Instrutor no processo disciplinar, que culminou com uma segunda decisão do Município R e que deu origem a este processo jurisdicional, é embaraçosamente a mesma pessoa que subscreve o recurso objecto destas contra alegações, e já agora, persistindo lamentavelmente o Sr. Instrutor num processo imprudente e ilícito que já havia reiniciado, pois antes deste processo disciplinar (1/2004) foi um outro instaurado contra o recorrido pelo R (e declarado nulo por violação do direito ao contraditório no processo 181202 do TAF de Coimbra)
12 - Quer neste processo disciplinar (1/2004) quer no outro (1/200 o Instrutor é sempre o mesmo, é instrutor, é relator, é pelos vistos funcionário do Departamento Jurídico de produção de pareceres, etc., é sempre ele e com ele que o A lamentavelmente se confrontou restando-lhe na memória desses episódios a mesma marca de prepotência e mesmo de vingança que, como se disse, não se compreende.
13 - Omite e esconde o recorrente para justificar a continua densidade dos actos do Sr. Instrutor, que, bem ao contrário do que alega o recorrente no ponto 26 das suas conclusões, quanto aos motivos pelos quais o recorrido apresentou queixa crime contra o Instrutor, pessoal do Departamento Jurídico e as pessoas que aí refere, tal queixa, na verdade, deveu-se ao comportamento e reacção que ele, Sr. instrutor resolveu assumir e protagonizar à frente dum elenco camarário com departamento jurídico incluído pendurado nas costas dele, Instrutor, na medida em que, após o conhecimento da sentença anulatória do primeiro processo disciplinar (a que deu origem ao processo jurisdicional 18/2002 do TAF de Coimbra, que anulou anterior aposentação compulsiva do A pelo Município Recorrente por violação do contraditório...)
14 - Conforme sabe o recorrido, até porque não faltaria quem, nos quadros do Recorrente, como que motivado por um ódio contra o A que não se compreendia então e que agora se compreende menos, optou o Sr. Instrutor do recorrente por aplacar a sua vingança de tal forma que, entre tantas caneladas que o Sr. Instrutor deu nas pernas dos procedimentos administrativos de que tomou conta como se fosse o dono e senhor da lei, ele, o Sr. Instrutor/relator e etc..., sem qualquer sem molécula de licitude, ordenou mesmo a suspensão de pagamento do salário do A durante a investigação do inquérito disciplinar (no âmbito do processo disciplinar mencionado 1/2004), suspensão essa que nunca veio a ser revogada nem reparada ou substituída por outro acto até à presente data e que determinou que o A ficasse cerca de 6 ou 7 meses sem vencimento algum e sem meios de sobrevivência.
15 - Foi pois esse último acto e essa conduta do Sr. Instrutor e de todos quantas o A denunciou nessa queixa-crime o verdadeiro motivo e fundamento da queixa que apresentou no Ministério Público do Tribunal Judicial de SJM e não os motivos que agora o R invoca com a vitimização que, de forma falsa e inútil, transmite nesta Instância jurisdicional.
16 - No caso concreto, esta conduta do recorrente e do Sr. Instrutor do processo disciplinar instaurado contra o recorrido, já em 2004, no decurso desse processo disciplinar que o recorrente instaurou contra o recorrido, constituía pois pelo menos o séria comprovação duma incontornável violação do princípio geral da imparcialidade, sendo que esses factos, que determinaram a fácil constatação do impedimento do Instrutor, só por este é que não são visíveis, com as consequências que estão à vista - o impedimento ilegal do A do direito ao seu trabalho já lá vão 13 anos a esta parte.
17 - Ou seja, o recorrente, quer neste quer no anterior processo disciplinar que moveu contra o A fez pouco das regras que constam do mais elementar manual do processo disciplinar e do instituto do impedimento do instrutor tendo em vista o respeito pelo princípio da imparcialidade.
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Remetidos os autos a este Tribunal, em recurso, neste notificada, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 146º e 147º do CPTA, a Digna Magistrada do Ministério Público emitiu Parecer no sentido do presente recurso dever merecer provimento, sendo revogada a sentença recorrida, no que tange ao concreto segmento decisório impugnado pelo Recorrente Município de SJM e, como decorrência, julgando-se totalmente improcedente a ação, nos seguintes termos, que se passam a transcrever:
«I. PREÂMBULO
Foi o presente recurso jurisdicional interposto pela Entidade Demandada Município de SJM da sentença proferida pela M.ma Juíza de Direito do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, que julgou parcialmente procedente, por parcialmente provada, a presente ação administrativa especial e, em consequência, i) absolveu o referido Município do pedido de anulação do ato de 11/06/2003, que determinou a recolocação do Autor, mantendo o aludido ato na ordem jurídica; e, mais, ii) determinou a anulação do ato datado de 26/04/2005, que aplicou ao Autor PAPC a pena de aposentação compulsiva (cfr. fls. 1059 a 1106 e, ainda, fls. 1111 a 1135 do processo em suporte físico, doravante designado, abreviadamente, como p. f.)
Analisadas as conclusões das alegações do ora Recorrente, as quais – como é por demais consabido – delimitam o objeto do recurso jurisdicional, constata-se que veio insurgir-se contra a decisão recorrida, por, alegadamente, ter incorrido em erros de julgamento, quanto à interpretação e aplicação do direito, com o que se mostrariam violados, designadamente, o caso julgado previsto no artigo 619.º, n.º 1, do CPC e, ainda, o preceituado nos artigos 47.º, n.º 5 e 95.º, n.º 2, ambos do CPTA (v. as Conclusões alegatórias, ínsitas de fls. 1130 a 1135 do p. f.)
A título preliminar, avançamos, desde já, que, no nosso modesto parecer, a aliás douta decisão recorrida merece censura e daí que propendamos para a sua revogação e consequente procedência do presente recurso jurisdicional.
Vejamos, pois, muito concisamente, as razões do nosso dissentimento da decisão judicial sub judice.
II. DOS ERROS DE JULGAMENTO DE DIREITO
II. 1. Da análise das conclusões alegatórias, emerge que o Recorrente Município de SJM veio imputar à decisão judicial recorrida, para além do mais, a afronta ao caso julgado material, previsto no artigo 619.º, n.º 1, do CPC (cfr. as conclusões 1.ª a 11.ª, ínsitas de fls. 1130 a 1132 do p. f.)
A questão suscitada pelo Recorrente prende-se, pois, com o conceito e existência do caso julgado, pelo que se torna imperativo elucidar o que se entende por caso julgado e quando é que o mesmo ocorre.
Dispõe o n.º 1 do citado artigo 619.º, disposição aqui aplicável ex vi artigo 1.º do CPTA, que “Transitada em julgado a sentença ou o despacho saneador que decida do mérito da causa, a decisão sobre a relação material controvertida fica a ter força obrigatória dentro do processo e fora dele nos limites fixados pelos artigos 580.º e 581.º, sem prejuízo do disposto nos artigos 696.º a 702.º”.
Tal como enfatiza a doutrina, o caso julgado visa garantir, fundamentalmente, o valor da segurança jurídica (cfr. JORGE MIRANDA, in «Manual de Direito Constitucional», T. II, 3.ª ed., reimpressão, Coimbra, 1966, pág. 494), configurando-se como um valor constitucionalmente protegido, já que a proteção dessa segurança jurídica, relativamente a atos jurisdicionais, se funda no princípio do Estado de Direito (v. GOMES CANOTILHO, in «Direito Constitucional e Teoria da Constituição», Coimbra, 1998, pág. 257).
Por sua vez, ensinam ANTUNES VARELA, e outros, que “Ao lado, porém, da exceção de caso julgado, assente sobre a decisão de mérito proferida em processo anterior, há a exceção de caso julgado, baseada em decisão anterior proferida sobre a relação processual. // À primeira figura, prevista na alínea a) do artigo 496.º e no artigo 671.º, dá-se o nome de caso julgado material porque a decisão que lhe serve de base recai sobre a relação material ou substantiva litigada; à segunda, especialmente prevista em termos gerais no artigo 672.º, chama-se o caso julgado formal. (…) Tanto o caso julgado material como o caso julgado formal pressupõem o trânsito em julgado da decisão. O caso julgado material cobre a decisão proferida sobre o fundo ou mérito da causa, enquanto o caso julgado formal aproveita às decisões sobre questões de caráter processual” (in “Manual de Processo Civil”, 2.ª Edição, págs. 308 e 309; itálico no original).
Em adição, "O caso julgado material existe, quando a decisão sobre a relação material controvertida, transitou em julgado” (v. JORGE AUGUSTO PAIS DO AMARAL, Direito Processual Civil, pág.), ou “quando a definição dada à relação controvertida se (pode) impor a todos os Tribunais" (vide MANUEL ANDRADE, in «Noções Elementares de Processo Civil», Coimbra Editora, Limitada, 1993, pág. 305).
Portanto, o caso julgado formal só tem valor intraprocessual, ou seja, só é vinculativo no próprio processo em que a decisão foi proferida (cfr. art. 672.º, do CPC), enquanto o caso julgado material só se verifica com as decisões de mérito, que são, em princípio, as únicas suscetíveis de adquirir a eficácia de caso julgado material (cfr. Teixeira de Sousa, "O Objeto da sentença e o caso julgado material" BMJ, 325.º, 1983, pág. 148).
II. 2. Acresce que a jurisprudência perfilha três tendências sobre a abrangência do caso julgado.
Assim, existe uma tese lata que sufraga o entendimento de que o caso julgado abarca a causa de pedir e os pressupostos da sentença (cfr., v. g., o douto Acórdão do TRP, de 18/02/77, in CJ, 1978, 1.º, pág. 103), uma tese restritiva, que defende que o caso julgado, apenas abrange a parte decisória da "res judicata" (vide, por todos, o douto Acórdão do STJ, de 23/02/78, in BMJ, 274.º, pág. 191) e, por fim, uma tese mista, que entende que o caso julgado abrange tão-somente a decisão final, embora a motivação deva ser considerada, quando se torne necessário reconstruir e fixar o respetivo conteúdo (assim, v. o douto Acórdão do STJ, de 17/01/80, in BMJ, 293.º, pág. 235).
De todo o modo, independentemente da questão da bondade e correção jurídica das teses em confronto, não poderemos escamotear o facto de que todas elas têm um elemento em comum, a saber, a consideração da parte decisória como verdadeiramente fulcral para o apuramento da existência de caso julgado.
II. 3. Ora, revertendo ao caso em presença, em jeito de introdução, ressaltamos aqui que, no caso sub judice, a julgadora do TAF de Aveiro, no âmbito do “Relatório” da sentença em crise, veio exarar que “Na sequência de requerimento do Autor nesse sentido, considerou o Tribunal que os pedidos formulados se encontram em relação de subsidiariedade, considerando-se peticionada a título principal a declaração de nulidade do despacho de 11.06.2003 e que apenas subsidiariamente, em caso de improcedência de tal pedido, se considera peticionada a declaração da nulidade da deliberação de 26.04.2005, através da qual foi aplicada ao Autor a pena de aposentação compulsiva (cfr. despacho de 22.03.2007, a fls. 127 do processo físico)” (cfr. fls. 1063 in fine e 1064 do p. f.)
Acresce que, conforme emerge do anterior recurso jurisdicional interposto pelo A./Recorrido, do acórdão do Coletivo de Juízes do TAF de Aveiro proferido em 31/07/2010, o mesmo veio impugnar esse aresto no que tange, tão-somente, ao despacho administrativo de 11/06/2003, deixando, assim, incólume a decisão judicial que recaiu sobre a deliberação de 26/04/2005, através da qual foi aplicada ao referido Autor a pena de aposentação compulsiva.
Destarte, o douto Acórdão deste Venerando TCA Norte, proferido em 12/10/2012, concedeu provimento ao aludido recurso jurisdicional interposto pelo A. PAPC, então Recorrente, revogou o acórdão recorrido e determinou a baixa dos autos ao TAF de Aveiro para aí prosseguirem os seus termos, com vista ao apuramento do facto levado à alínea J do probatório (v. o douto acórdão constante de fls. 736 a 748, maxime, o respetivo segmento dispositivo, ínsito a fls. 748 in fine do p. f.)
Cumpria, pois, à julgadora do TAF a quo dar estrito cumprimento ao citado douto acórdão de 12/10/2012, deste Venerando TCA Norte, proferindo uma decisão de mérito sobre a estrita temática que fora objeto do anterior recurso, expressamente circunscrito pelo Autor ao ato impugnado de 11/06/2003, que determinou que o A. passasse a exercer as funções de ajudante de topógrafo.
Todavia, o tribunal a quo, pese embora a estrita delimitação do thema decidendum colocado à sua apreciação, elaborou uma nova decisão em que, para além da concreta factualidade em causa no mencionado recurso jurisdicional, aditou outros factos e proferiu efetivamente uma nova decisão de mérito, em que se pronunciou, de novo, sobre os vícios ou causas de invalidade da deliberação de 26/04/2005, que aplicou ao Autor a pena de aposentação compulsiva, de resto em sentido diverso e antagónico do plasmado no acórdão do Coletivo de Juízes do TAF de Aveiro, proferido em 31/07/2010.
O que significa que a sentença em crise pronunciou-se e decidiu sobre matéria que não fora impugnada no âmbito do anterior recurso jurisdicional e, por isso, não tinha sido conhecida e, consequentemente, censurada no mencionado douto aresto deste TCA Norte.
A ser assim, na esteira do entendimento sufragado pelo Recorrente, o Ministério Público considera que, ao assim decidir, a M.ma Juíza de Direito do TAF a quo violou os limites de cognição a que se encontrava adstrita, emitindo pronúncia e subsequente decisão sobre matérias que não tinham sido anteriormente sindicadas, no âmbito do anterior recurso jurisdicional e, daí, que se mostravam cobertas pela força do caso julgado material.
O que, seguramente, traduz o desrespeito do citado douto Acórdão deste TCA Norte, razão por que, na perspetiva do Ministério Público, o recurso jurisdicional deverá proceder, pelo menos, neste segmento recursivo.
II. 4. Ainda que assim não seja entendido por este Venerando Tribunal ad quem, consignamos que o tribunal a quo encontrava-se balizado, na sua atividade decisória, pelos limites traçados por este Venerando TCA Norte, no seu douto Acórdão tirado em 12/10/2012.
Destarte, à luz do que fora superiormente determinado, incumbia à M.ma Juíza de Direito a quo, na sentença recorrida, efetuar a subsunção dos factos, então apurados, ao direito aplicável, porquanto o objeto da sua apreciação e decisão fora já previamente definido pelo citado preclaro aresto deste TCA Norte.
O que vale por dizer que, efetivamente, ocorreu erro, por banda do tribunal a quo, na valoração e consequente seleção dos novos factos levados ao probatório, em que se estribou a sentença sob recurso e, por decorrência, no tratamento jurídico que nela foi efetuado.
Com efeito, compulsada a decisão aqui sob censura, antolha-se-nos que inexistem, de todo, os alegados vícios ou causas de invalidade detetadas no ato administrativo praticado pela ED Recorrente, em 26/04/2005.
Na verdade, aderimos inteiramente ao entendimento doutrinal veiculado no mencionado aresto do Coletivo do TAF de Aveiro, proferido em 31/07/2010, cuja fundamentação fáctica e jurídica, aduzida nesta específica vertente, acompanhamos na íntegra (cfr. fls. 292 a 310, designadamente, fls. 305 a 309 do p. f.)
E tanto basta para concluir pela total procedência do recurso jurisdicional, no segmento decisório ora posto em crise.»
Sendo que dele notificadas as partes apresentou-se a responder o recorrido, refutando o entendimento ali vertido e defendendo a manutenção da sentença recorrida.
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Com dispensa de vistos foram os autos submetidos à Conferência para julgamento.
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II. DA DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO/das questões a decidir
O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, nos termos dos artigos 144º nº 2 e 146º nº 4 do CPTA e dos artigos 5º, 608º nº 2, 635º nºs 4 e 5 e 639º do CPC novo (Lei n.º 41/2013) ex vi dos artigos 1º e 140º do CPTA.
No caso, em face dos termos em que foram enunciadas pelos recorrentes as conclusões de recurso, vêm colocadas a este Tribunal as seguintes questões essenciais:
- saber se a sentença recorrida não acatou o acórdão deste TCA Norte de 12/10/2012, violando o caso julgado já formado;
- saber se a sentença recorrida violou, na apreciação do pedido impugnatório dirigido ao ato de 26/04/2005, o disposto no artigo 95º nº 2 do CPTA;
- saber se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento ao considerar verificadas as causas de invalidade que fundaram a anulação do ato de 26/04/2005.
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III. FUNDAMENTAÇÃO
A – De facto
O Tribunal a quo deu como provada a seguinte factualidade, vertida na sentença recorrida nos seguintes termos, ipsis verbis:
1. Em 15.10.2001, a Entidade Demandada deliberou aplicar ao Autor sanção disciplinar de aposentação compulsiva, no âmbito do processo disciplinar que correu os seus termos sob o n.º 01/2000 (cfr. sentença junta à p.i., de fls. 30 e ss do processo físico).
2. Nesta data, o Autor era funcionário da Entidade Demandada e encontrava-se integrado na carreira técnica profissional, categoria de aferidor de pesos e de medidas (acordo).
3. O Autor impugnou judicialmente a deliberação referida em 1., tendo o processo seguido os seus termos sob o n.º 18/02 junto do Tribunal Administrativo de Círculo de Coimbra, que veio a proferir sentença, em 01.10.2002, declarando nula tal deliberação (cfr. sentença junta à p.i., a fls. 30 e ss do processo físico).
4. A partir de novembro de 2002, inclusive, o Autor passou a receber o vencimento pela categoria 1.ª classe, escalão 3, índice 230, conforme resulta do documento junto como n.º 2 à contestação, com o seguinte teor:

[imagem que aqui se dá por reproduzida]

(cfr. doc. junto à contestação, a fls. 72 do processo físico).
5. Em 13.06.2003, foi enviado ao Autor, mediante o ofício n.º 5947, cópia do despacho proferido pelo Vice-Presidente em 11.06.2003 e do parecer jurídico que o sustentou, bem como para se apresentar no Departamento Técnico a fim de receber instruções para o desempenho das funções que lhe foram determinadas (cfr. ofício a fls. 24 do processo físico).
6. Consta do referido despacho proferido pelo Vice-Presidente em 11.06.03 o seguinte:
«Em virtude dos serviços de metrologia se encontrarem desactivados e o funcionário PAPC, não possuir as qualificações profissionais actualmente exigíveis ao exercício das funções de "Técnico Profissional - Categoria de Aferidor de Pesos e Medidas" não é possível o funcionário exercer funções nesta área. Por tal motivo,
DETERMINO:
Que nos termos da informação jurídica que me foi prestada, face aos factos, que o funcionário seja recolocado no Departamento Técnico para exercer funções de apoio ao topógrafo e reprografia, mantendo-se na carreira onde actualmente se encontra de técnico profissional.
A aplicação desta medida de gestão, dada a situação actual do funcionário e dos serviços, visa proporcionar ao mesmo a possibilidade futura da sua reconversão profissional em carreira idêntica à que actualmente possui, após terem sido reunidos os pressupostos legais que permitam a aplicação deste mecanismo de gestão dos recursos humanos.»
(cfr. despacho a fls. 25 do processo físico).
7. O parecer jurídico que sustentou o referido despacho proferido pelo Vice-Presidente tem o seguinte teor:
«DE: CHEFE DE DIVISÃO JURÍDICA
PARA: EXMO. SENHOR PRESIDENTE DA CÂMARA MUNICIPAL
DATA: 05-06-03
Por solicitação verbal do Sr. Vice-Presidente Dr. RC após reunião com o Ilustre mandatário do funcionário PAPC com a categoria profissional de Aferidor, em ordem ao seu posicionamento em carreira adequada por força da desactivação dos serviços de metrologia a que estava afecto, cumpre-nos dizer o seguinte:
1. Será ponto assente, não só a falta de qualificação do Instituto Português de Qualidade dos Serviços de Metrologia, legalmente exigível para o seu funcionamento, como a vontade manifestada por Vª. Exª, em extinguir o lugar.
2. Assim, dada a impossibilidade material de o funcionário prosseguir na carreira de aferidor, haverá que recolocá-lo nos termos legais de acordo com o regime de reclassificação e reconversão profissionais consagrado no Decreto-Lei n.º 218/2000 que adapta à Administração Local o Decreto-Lei 497/99 de 19 de Novembro.
3. A figura aplicável, por subsumível à situação de facto do funcionário em causa, será a da sua reclassificação ou reconversão profissional que, nos termos dos n.ºs. 1 e 2 do art.°. 3º, do citado Diploma, consiste, respectivamente "na atribuição de categoria e carreira diferente daquela em que é titular, reunidos que estejam os requisitos legalmente exigidos para a nova carreira, ou seja, exercício das funções, habilitações literárias e ou profissionais" e a reconversão na "atribuição de categoria e carreira diferentes daquela que o funcionário é titular, desde que as funções sejam exercidas, sendo a falta das habilitações literárias ou qualificação profissional supridas pela aprovação em curso ou cursos de formação profissional"
4. De acordo com o art.°. 4º., do citado Diploma, a extinção de postos de trabalho é condição legal de aplicação da reclassificação ou reconversão profissionais.
5. O impulso procedimental, conforme consagra o art.°. 6º. para a reclassificação e reconversão profissionais depende, ou da iniciativa da administração ou de requerimento fundamentado do funcionário que obedeça aos requisitos legais e a solicite no âmbito dos poderes discricionários da Administração.
6. "In caso" a iniciativa será indubitavelmente do Sr. Presidente da Câmara, no uso das suas competências de gestão dos recursos humanos e de acordo com o que entender melhor para os serviços.
7. Daí, e em breve parênteses, nos parecer infundada a pretensão do ilustre mandatário do funcionário ao pretender "negociar", dentro do elenco das carreiras técnicas para a Administração Local enunciadas no anexo I do Decreto-Lei n.º 412-A/98 de 30 de Dezembro a recolocação do seu constituinte, preferencialmente nas carreiras técnicas de BAD, o que nos pareceu, não só legalmente discutível dada a especificidade deste tipo de carreiras, como manifestamente inadequado à situação concreta do funcionário que não possui quaisquer conhecimentos técnicos fundamentais para o exercício de tais funções.
8. No elenco das carreiras técnicas disponíveis no Quadro de Pessoal, resultou que, apenas a carreira técnica profissional da categoria de topógrafo, poderia vir a satisfazer, uma vez preenchidos os requisitos, não só as exigências dos serviços, como a integração do funcionário num tipo de funções próximas ou com alguma similitude com as que exerceu enquanto aferidor.
9. foi neste pressuposto que o funcionário passou a exercer funções de apoio ao topógrafo, numa situação provisória, aguardando, dada a complexidade da situação, parecer jurídico sustentado que, por despacho de Vª. Exa. o enquadrasse profissionalmente, por acto administrativo, no âmbito dos procedimentos duma reclassificação ou reconversão adequada. cfr n.º 5 do art.° 6º. do sempre citado Diploma. Sendo que o procedimento da reconversão nos parece o mais indicado, atendendo a que para a reclassificação, ao funcionário faltam requisitos imprescindíveis - habilitações literárias e profissionais - cujos requisitos, em caso algum poderão ser supríveis por qualquer outro mecanismo.
Folha 26 do Processo 1241/05.0BEVIS - data de registo: 28/09/2005
Ora,
Dispõe o n.º 2 do art.° 3º. daquele diploma legal, que a reconversão profissional poderá ser potencialmente aplicada, bastando para tal, como já referido, que venha a preencher os requisitos respeitantes ao exercício das funções, complementada com acções de formação específicas, que irão suprir o requisito das habilitações literárias ou profissionais exigíveis à carreira, nos termos de portaria que ainda não foi publicada, mas no entanto estabelecida no Decreto-Lei 412-A/98 de 30 de Dezembro.
Nestes termos:
Para se poder operar a reconversão profissional, deverá o funcionário exercer as funções inerentes à carreira de Técnico Profissional - categoria de topógrafo e aguardar a publicação da portaria que irá determinar as acções de formação que o funcionário deverá frequentar.
CONCLUSÕES:
Atendendo ao facto do funcionário não poder exercer as suas funções de aferidor de pesos e medidas, não só porque os serviços se encontram desactivados, como, por ele próprio não possuir as qualificações actualmente exigíveis ao exercício das mesmas, a sua situação profissional perante esta Câmara Municipal, mantendo a sua actual categoria de técnico profissional, apenas se poderá resolver pelo mecanismo acima descrito - reconversão profissional - logo que estejam preenchidos todos os requisitos exigíveis à carreira e categoria que se propõe, bastando para tal, que, de imediato, seja proferido despacho de Vª. Exª. de afectação aos serviços de topografia onde inicialmente irá exercer funções de apoio ao topógrafo, e, posteriormente, quando forem exercidas as funções próprias da nova categoria e estejam preenchidos os restantes requisitos exigíveis, poderá finalmente ocorrer a reconversão profissional para lugar vago do Quadro de Pessoal desta Câmara Municipal.»
(cfr. parecer jurídico a fls. 26 e ss do processo físico).
8. Em 01.07.2004, o Autor requereu junto do Tribunal Administrativo de Coimbra, a execução da sentença referida em 3, tendo o respetivo processo corrido contra a Entidade Demandada dos presentes autos, por apenso aos autos de recurso contencioso n.º 18/02, que aí correram termos sob o n.º 18/2002-A (cfr. p.i. a fls. do processo físico).
9. Em 06.02.2004, foram entregues a diversos funcionários da Entidade Demandada cartões para registo de assiduidade e foi proferido despacho do Vice-Presidente da Câmara Municipal da Entidade Demandada com o seguinte teor:
(…) Nos termos legais, «todo o funcionário/ contratado a termo certo, se obriga a registar a assiduidade pelos meios utilizados nos serviços para o efeito», sob pena de incorrer em faltas injustificadas e suas consequências previstas na Lei.” (cfr. documento de fls. 6 do p.a.).
10. Em 02.04.2004, foi proferido despacho do Presidente da Câmara da Entidade Demandada, com o seguinte teor:
Considerando que por despacho de 06 de Fevereiro de 2004, foi entregue ao funcionário PAPC novo cartão electrónico para registo de assiduidade, sendo alertado da obrigatoriedade de proceder à sua utilização, sob pena de incorrer em faltas injustificadas;
Considerando que o referido funcionário, apesar de devidamente notificado de todo o conteúdo desse mesmo despacho, de acordo com a informação da Repartição de pessoal, não procedeu ao registo da sua assiduidade a partir do dia 11 de Fevereiro do corrente ano sem qualquer justificação (…), considera-se a inexistência da picagem de ponto supra mencionada como faltas injustificadas.
Deverá ser concedido o prazo de dez dias úteis, para, querendo, se pronunciar por escrito, sobre as faltas, com as consequências disciplinares daí decorrentes. (…)
(cfr. despacho a fls. 8 do p.a.).
11. O despacho referido no ponto anterior foi notificado ao Autor por ofício n.º 3070, datado de 08.04.2004 (cfr. ofício a fls. 9 do p.a.).
12. Em 22.04.2004, o Autor veio pronunciar-se sobre tal despacho, alegando, entre outros, o seguinte:
(…) independentemente da alegada falta de registo da sua assiduidade, adianta-se que nunca o ora signatário faltou injustificadamente, nem antes, nem muito menos depois da prolação da sentença pelo Tribunal Administrativo de Círculo de Coimbra pelo qual foi decretada a total nulidade do processo disciplinar que lhe foi instaurado.
Este facto, ou seja, o de que nunca faltou ao serviço são do conhecimento de todos os seus colegas, designadamente os serviços encarregues da segurança, cujos registos poderão comprovar tais factos. (…)
(cfr. pronúncia a fls. 10 e ss do p.a.)
13. Foram juntos ao processo disciplinar n.º 01/2004, pelo respetivo instrutor, relatórios emitidos pelos serviços de segurança junto das portarias entre os dias 06.02.2004 e 29.04.2004 do qual consta o seguinte registo de entradas e/ou saídas do Autor, nos seguintes dias:
DataEntradaSaídaEntradaSaídaEntradaSaída
11.02.200411:1012:3514:3117:50
12.02.2004--14:2017:56
13.02.200411:1012:3514:2514:3015:2318:00
16.02.200410:3012:3614:2018:13
17.02.200410:4512:3514:2017:43
18.02.200410:4012:3614:2018:01
19.02.200410:4512:4014:4517:02
20.02.200410:5612:4014:5716:1016:1317:40
23.02.2004
25.02.200410:4012:4015:0418:15
26.02.200410:5012:3514:4217:58
27.02.200410:5412:3315:2718:01
01.03.200410:4812:3515:1517:41
02.03.200410:5512:3314:3017:45
03.03.200410:4412:4215:1019:20
04.03.200410:4512:3514:2517:40
05.03.200411:1312:4014:2017:40
08.03.200411:0012:3814:1518:10
09.03.200410:3012:4015:1016:18
10.03.2004---17:04
11.03.200411:2011:3014:1017:56
12.03.200411:0512:3514:1517:41
15.03.200410:4512:4014:2017:53
16.03.200410:5012:4814:2017:31
17.03.200411:0912:5014:2017:36
18.03.200410:3012:4014:2017:40
19.03.200411:0012:4314:5017:45
(cfr. registos de fls. 64 a 81 do p.a.).
14. Em 14.05.2004, foi exarado pelo Presidente da Câmara da Entidade Demandada despacho que considerou as ausências de picagem de ponto correspondentes aos dias 11, 12, 13, 16, 17, 18, 19, 20, 23, 25, 26 e 27 de fevereiro, 1, 2, 3, 4, 5, 8, 9, 10, 11, 12, 15, 16, 17, 18 e 19 de março como faltas injustificadas (cfr. despacho a fls. 82 do p.a.).
15. Em 18.05.2004, por deliberação unânime da Câmara Municipal, sobre proposta do Presidente desse órgão, a Entidade Demandada instaurou contra o Autor processo disciplinar por falta de assiduidade, que correu os seus termos sob o n.º 01/2004 (cfr. deliberação de fls. 1 do processo administrativo, adiante designado apenas por p.a.).
16. O Chefe de Divisão Jurídica, JMC, foi nomeado instrutor do processo disciplinar n.º 01/2004 (cfr. deliberação de fls. 1 do processo administrativo, adiante designado apenas por p.a.).
17. Em 08.07.2004, o defensor do Autor, arguido no processo disciplinar n.º 01/2004, invocou o justo impedimento do instrutor do processo (cfr. documento de fls. 101 do processo disciplinar).
18. Em 09.07.2004, o Autor juntou aos autos do processo disciplinar em causa nos autos uma cópia de requerimento que apresentou, em que requer a instauração de procedimento criminal contra o instrutor do processo, entre outros, junto dos serviços do Ministério Público do Tribunal Judicial de SJM (cfr. requerimento e denúncia a fls. 103 e ss do p.a.).
19. Em 13.07.2004, a Câmara Municipal da Entidade Demandada ratificou despacho de indeferimento do incidente de suspeição do Presidente do mesmo órgão, emitido com os fundamentos constantes do parecer jurídico de 09.07.2004, com o seguinte teor:
(…)
Não existe nenhum processo criminal pendente em tribunal contra o Sr. Instrutor, como quer fazer parecer o arguido. Do compulsar dos autos denota-se que nesta data o arguido juntou cópias com carimbo de entrada de um procedimento criminal, por abuso de poder, contra o Sr. Presidente da Câmara Municipal, o Sr. Vice-Presidente da Câmara Dr. RC, todos os funcionários do Departamento Jurídico, onde o instrutor deste processo está obviamente incluído, e o Chefe de Secção de Pessoal.
Contudo, até à presente data o instrutor não foi chamado junto aos Serviços do Ministério Público, nem tão pouco foi constituído arguido em processo penal, não estando por isso preenchido o requisito da alínea “c” do n.º 1 do artigo 52.º do citado diploma.
(…)
Assim, pelo que dos autos conta, por absoluta carência de fundamentação, deverá o incidente de suspeição do instrutor suscitado pelo ilustre defensor do arguido ser considerado improcedente.
(cfr. deliberação, despacho e parecer jurídico a fls. 118 e ss do p.a.).
20. Em 09.09.2004, foi proferido despacho de acusação pelo instrutor do processo disciplinar n.º 01/2004, enviado ao Autor através do ofício n.º 6620, da mesma data, que foi devolvido à Entidade Demandada, por não rececionada (cfr. despacho de acusação e ofício a fls. 176 e ss do p.a. e invólucro a fls. 184 do p.a.).
21. Em 17.09.2004, o Autor recusou-se a subscrever documento intitulado “Mandado de notificação”, através do qual lhe foi transmitida a emissão de despacho de acusação, bem como de que dispunha do prazo de 20 dias para apresentar a sua defesa escrita (cfr. mandados de notificação por assinar a fls. 185 e 186 e documento de fls. 191 do p.a.).
22. Em 27.04.2005, o Autor foi notificado, através do ofício n.º 2880, de que, por deliberação proferida pela Câmara Municipal da Entidade demandada em 26.04.2005, lhe foi aplicada a pena de Aposentação compulsiva, conforme proposta constante do Relatório Final do instrutor de 29.03.2005 (cfr. ofício a fls. 214 do p.a.).
23. Do Relatório Final do instrutor referido no ponto anterior consta, entre outros, o seguinte:
«O processo disciplinar por falta de assiduidade autuado pelo instrutor com o número 01/2004 contra o funcionário da Câmara Municipal da carreira técnica profissional categoria de aferidor de pesos e medidas, PAPC, foi mandado instaurar por deliberação de Câmara de 18 de Maio de 2004 sob proposta do Sr. Presidente. Decorre do despacho do Sr. Presidente da Câmara de 14 de Maio de 2004 que, no uso das competências que lhe são próprias determina que, as ausências de picagem de ponto por parte do referido funcionário, correspondentes aos dias 11, 12, 13, 16, 17, 18, 19, 20, 23, 25, 26, e 27 de Fevereiro e 1, 2, 3, 4, 5, 8, 9, 10, 11, 12, 15, 16, 17 e 18 de Março de 2004, fossem consideradas faltas injustificadas, em conformidade com parecer jurídico prestado e com as inerentes consequências legais.
Este despacho foi o culminar dum procedimento aberto com a informação da chefe de secção dos recursos humanos e formação profissional acompanhada duma folha de registo informático, demonstrativa da ausência de picagem do referido funcionário e referente a todo o mês de Fevereiro até 21 de Março de 2004, a fls. 2 e 3 dos autos e datada de 12 de Março do mesmo ano.
A informação prestada, pela chefe de secção que superintende na área do pessoal (de acordo, aliás, com os conteúdos funcionais dessa secção) ao Vice-Presidente da Câmara, Dr. RC, é o corolário das instruções contidas no seu despacho de 6 de Fevereiro de 2004, extensivo a todos os funcionários e contratados a termo do município a fls. 6 dos autos, onde se verbera: "...todo o funcionário e contratado a termo certo, se obriga a registar a assiduidade pelos meios utilizados nos serviços para o efeito" - in casu o novo cartão electrónico distribuído a todos os funcionários ou contratados.
Este despacho, conjuntamente com a entrega do novo cartão, foi dado conhecimento a todos os funcionários e contratados da Câmara, nas datas constantes e apostas pelos responsáveis dos diversos serviços que a todos distribuíram.
No que ao arguido respeita e pela rubrica do seu superior hierárquico, Director de Departamento Técnico, Eng° CF, este teve conhecimento do seu conteúdo em 11 de Fevereiro de 2004.
E o despacho do Sr. Vice-Presidente é bem claro ao obrigar o registo de assiduidade, através da picagem de registo diário, sob pena dos funcionários ou contratados a termo faltosos incorrerem em faltas injustificadas com as consequências previstas na lei.
Assim, todo o procedimento que culminou com o despacho definitivo do Sr. Presidente da Câmara de 14 de Maio de 2004 a fls 82 dos autos que atribuiu às ausências de picagem do arguido, desde 11 de Fevereiro a 19 de Março, ininterruptamente, a sanção correspondente a cada dia de ausência de picagem de falta(s) injustificada(s), encontra-se junto aos autos (fls 2 a 82).
É importante, no entanto, relevar o seguinte:
No decurso do procedimento que conduziu ao despacho do Sr. Presidente que lhe injustificou as mencionadas faltas ao serviço, o arguido, representado pelo seu defensor, reconheceu que não procedeu ao registo de assiduidade através do seu cartão electrónico, mas afirma que nunca faltou injustificadamente, logo diz ter cumprido com o seu dever de assiduidade, apresentando como prova o registo dos serviços encarregues da segurança. Embora esses registos manuais de entrada e saída levados a cabo pelos seguranças do edifício da Câmara Municipal não constituam meio legal do funcionário comprovar a sua assiduidade e pontualidade ao serviço, o instrutor, mesmo assim, ordenou a sua junção aos autos. (fls 18 a 81).
E conforme parecer jurídico de (fls 14 a 17) poderá ler-se a final:
"...aberto o procedimento para prova do alegado (resposta escrita em sede de audiência do interessado) junto se remete as fichas do relatório confidencial dos serviços de segurança junto das portarias, entrada principal e garagem, desde 06.02.04 até 28.04.04, onde se confirma à evidência que o funcionário nunca cumpriu com o seu horário de trabalho, entrando indiscriminadamente, sempre no meio ou finais da manhã, reentrando após o almoço igualmente fora de horas e saindo quando bem lhe apetece, não cumprindo deste modo com o horário rígido a que está obrigado e de acordo com o estatuído no art° 17º do já citado Decreto-lei nº 259/98"
Após comunicação ao arguido, nos termos do n° 3 do artº 45 do Decreto-lei 24/84 de 16 de Janeiro, no início da instrução do processo disciplinar este, a fls 92 e através do seu advogado vem com um requerimento em que arrola uma série de testemunhas, todos funcionários da Câmara, sem que concretamente tenha promovido junto do instrutor diligências de prova específicas, atento o objecto ou natureza da infracção que deu origem ao processo.
Conforme relevamos a fls 164, os factos que aduz nada têm de conexos com os que justificaram a abertura do processo disciplinar. Mesmo assim o instrutor procedeu à audição das testemunhas arroladas, sempre notificando o ilustre defensor do arguido para estar presente, fazendo inteiramente uso do contraditório.
Concluída a instrução foi deduzida a acusação a fls 176 a 179, nos termos e com os seguintes fundamentos:
"1° Sob proposta do Presidente da Câmara Municipal e mediante procedimento prévio que culminou com o despacho do Senhor Presidente da Câmara de 14 de Maio de 2004 que no uso das suas competências próprias, determinou injustificar como faltas ao serviço do funcionário PAPC, por ausência de picagem do ponto nos dias 11, 12, 13, 16, 17, 18, 19, 20, 23, 25, 26 e 27 de Fevereiro, 1, 2, 3, 4, 5, 8, 9, 10, 11, 12,15, 16, 17, 18 e 19 de Março, a Câmara Municipal, em reunião ordinária de 18 de Maio de 2004, deliberou por unanimidade e escrutínio secreto instaurar ao funcionário em causa por falta de assiduidade.
2º O arguido bem sabia que enquanto funcionário, estava e está sujeito a um horário de trabalho, na modalidade de horário rígido em regime geral de duração de trabalho, em que é exigido o cumprimento da duração semanal de trabalho 35 horas que se reporta a dois período diários, com horas de entrada e saída fixas a saber:
Período da manhã - das 9:00 horas às 12:30 horas
Período da tarde - das 14:00 horas às 17:30 horas
Conforme o estabelecido no artigo 17°. N°. 2 do Decreto-Lei no. 259/98 de 18 de Agosto, regime aplicável sub facto et jure ao arguido.
3º E o modo de verificação dos deveres de assiduidade e de pontualidade, consubstanciados no dever de todo o funcionário ou agente comparecer regularmente ao serviço às horas que lhe são designadas e ai permanecer continuamente, não podendo ausentar-se salvo nos termos e pelo tempo autorizado pelo respectivo superior hierárquico, sob pena de marcação de falta ao serviço é, por imposição legal, verificado por sistemas de registo automático, mecânico ou de outra natureza, conforme dispõe os nºs 2 e 3 do Decreto-lei n°. 259/98 de 18 de o Agosto.
4º Na Câmara Municipal de SJM onde o arguido é funcionário, os deveres de assiduidade e pontualidade são verificados por um sistema de registo automático, mediante a utilização de um cartão electrónico instalado à entrada da garagem do edifício da Câmara Municipal, local por onde todos os funcionários e agentes que aí exercem funções nos mais diversos serviços como é o caso do arguido, necessariamente passam.
5° Tanto mais que por determinação superior, concretamente por despacho do Senhor Vice-Presidente da Câmara Municipal datado de 06 de Fevereiro de 2004, a Repartição de Pessoal procedeu à entrega de novos cartões para registo de assiduidade a todos os funcionários, agentes e contratados a termo, com o objectivo de substituir os cartões em uso onde, de acordo com esse mesmo despacho a que todos foi dado conhecimento, expressamente se reitera a obrigação dos funcionários e contratados registarem a sua assiduidade através desse mesmo cartão - meio utilizado nos serviços para esse mesmo efeito - sob pena de incorrerem em faltas injustificadas, com as consequências previstas na lei.
6º O arguido bem sabia pois, que a única forma de comprovar a sua assiduidade e pontualidade diárias ao trabalho, sob pena de, cada dia que não procedesse ao registo de entradas e saídas através do seu cartão electrónico teria uma falta injustificada ao serviço, passaria por esse mesmo registo de entradas e saídas fazendo uso do respectivo cartão, mas mesmo assim, de modo consciente e livre, nunca dele fez uso desde que lhe foi entregue pelos serviços, não só desde 11 de Fevereiro de 2004 a 19 de Março de 2004, ininterruptamente, como ainda hoje o não faz, razão por que lhe têm sido nos períodos posteriores à abertura deste processo, sistematicamente injustificadas faltas ao serviço.
7º Dispõe o nº 1 do artigo 18° do Decreto-lei nº. 100/99 de 31 de Março que se considera falta a não comparência do funcionário ou agente durante a totalidade ou parte do período de trabalho a que está obrigado e no seu ponto 3 que as faltas contam-se por dias inteiros, salvo quando no presente diploma ou legislação específica resultar o contrário, o que não é o caso.
8º Nunca o arguido apresentou qualquer justificação dos dias em que deixou de proceder à picagem do ponto, ou seja, em que violou os seus deveres de assiduidade e pontualidade desde 11 de Fevereiro de 2004 a 19 de Março de 2004, ininterruptamente, não constituindo a simples presença no serviço, às horas e nos horários mais desencontrados e muito menos durante o regime normal de duração do seu trabalho de 35 horas semanais, o cumprimento desses mesmos deveres de assiduidade e pontualidade a que, enquanto funcionário, por lei está obrigado.
9º Os factos descritos constituem infracção disciplinar, por violação dos deveres de assiduidade e pontualidade, dada a sua não comparência regular, pontual e contínua ao serviço, previsto no artigo 3º. Nº. 4 alíneas g) e h) do Decreto-lei nº 24/84 de 16 de Janeiro, a qual corresponde a pena disciplinar de Aposentação Compulsiva e Demissão, prevista na alínea h) do nº 1 do artigo 26º. Do mesmo diploma - Estatuto Disciplinar dos Funcionários e Agentes da Folha 18 do Processo 1241/05.0BEVIS - data de registo: 28/09/2005 Administração (Central, Regional e Local) - por ter excedido em muito as cinco faltas seguidas ou dez interpoladas sem justificação, dentro do mesmo ano civil de 2004.
10º O arguido agiu livre e conscientemente, bem sabendo que a sua conduta reiterada de falta de assiduidade e pontualidade ao trabalho o fazia cair na alçada disciplinar."
(…)
Cumpre, pois, concluir.
Dando-se como integralmente provada a acusação, o arguido faltou injustificada e ininterruptamente ao trabalho desde o dia 11 de Fevereiro de 2004 a 19 de Março de 2004, bem sabendo que estava sujeito a um horário de trabalho na modalidade de trabalho rígido, nas circunstâncias e condicionalismos descritas nos artigos 1° a 10° da matéria acusatória.
O arguido agiu livre e conscientemente, bem sabendo que a sua conduta reiterada de falta de assiduidade e de pontualidade o fazia cair na alçada disciplinar.
Sendo o grau de ilicitude e culpa do arguido elevado, tanto mais que nos curtos períodos diários em que compareceu ao serviço, recusou-se a exercer as funções ou tarefas que lhe eram cometidas superiormente.
Pelo que propõe o Instrutor, tal qual a acusação, que em face destas conclusões a sua conduta é subsumível à pena disciplinar de aposentação compulsiva e demissão, p. e p. na alínea h) do n° 1 do artigo 26° do Decreto-Lei n° 24/84, de 16 de Janeiro, uma vez que as faltas ao serviço excedem em muito, os cinco dias seguidos ou interpolados, sem justificação dentro do mesmo ano cível, sendo que pela sua natureza e circunstâncias concretas em que ocorreram, inviabilizam a manutenção da relação funcional,
Propomos pois a aposentação compulsiva, verificados que sejam os condicionalismos exigidos pelo Estatuto da Aposentação, pela Divisão Administrativa.»
(cfr. relatório final e deliberação a fls. 205 e ss do p.a.).
24. Em 02.07.2015, no âmbito do processo referido em 8, foi proferido Acórdão pelo Tribunal Central Administrativo Norte que manteve a sentença que havia sido proferida em primeira instância pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, julgando improcedente o pedido formulado, com os seguintes fundamentos, entre outros:
“(…)
Por fim, importa salientar que a questão central, subjacente a todo o presente recurso, é a de saber se está executada a sentença do TAC de Coimbra que declarou nula a deliberação que aposentou compulsivamente o Recorrente e, bem assim, se o tribunal recorrido deu cumprimento ao acórdão deste TCAN, proferido nestes autos em 27.01.2012.
Em qualquer dos casos a resposta é afirmativa.
No acórdão do TCAN, de 27.01.2012. determinou-se o prosseguimento dos autos para serem realizadas as diligências necessárias, ao abrigo do artigo 177.º/4 do CPTA, para a fixação dos factos que na sentença aí recorrida, tinham sido considerados admitidos por acordo. E ao considerar indispensável a realização de diligências de prova quanto a tais factos, o citado acórdão considerou que isso impedia a “análise do mérito da causa” e ordenou o prosseguimento dos autos. Como já foi referido, o tribunal recorrido cumpriu assim o determinado, encetando as diligências instrutórias que considerou necessárias, nos termos do disposto no artigo 177.º/4 do CPTA.
Assim, o acórdão recorrido não incumpriu o acórdão deste TCAN, de 27.01.2012.
Além disso, não se vislumbra motivo para discordar da conclusão a que chegou o acórdão recorrido no sentido de que se mostrou provado que o Exequente/Recorrente quando foi readmitido ao serviço em novembro de 2002, em cumprimento do julgado anulatório aqui sob execução, foi colocado na mesma categoria profissional, retomou o gabinete que ocupava no mercado municipal e manteve a atividade que já exercia antes do ato declarado nulo. O problema é que, como também ficou provado, já antes desse ato declarado nulo, ou seja, desde 1993, que o Exequente/Recorrente vinha exercendo de facto uma atividade que não correspondia plenamente ao conteúdo funcional da sua categoria, pois limitava a prestação do seu trabalho ao apoio e esclarecimento dos munícipes que aí se dirigiam procurando os serviços próprios do controlo metrológico, encaminhando-os para os funcionários congéneres dos municípios vizinhos.
De onde se extrai que a sentença sob execução se mostra executada, na medida em que o Exequente/Recorrente foi colocado na mesma categoria que anteriormente detinha e foram-lhe atribuídas as funções que antes exercia, as quais, como referido, não correspondiam plenamente à categoria em causa. Mas no que aqui importa, mostra-se reintegrada a esfera jurídica do Exequente/Recorrente, na medida em que retomou a sua posição laboral anterior, não cabendo no estrito âmbito deste processo de execução de sentença discutir as razões do desajustamento entre a categoria as funções efetivamente exercidas. É que a declaração de nulidade do ato que aposentou compulsivamente o Recorrente apenas determina a reposição do status quo ante, mas não tem a virtualidade de resolver eventuais problemas ou desconformidades que pudessem existir previamente e que não têm qualquer relação com o ato declarado nulo n em com os fundamentos dessa nulidade e que, por isso, ultrapassam o efeito repristinatório da declaração de nulidade, o único que cabe efetivar em sede de execução de sentença.
Dito de outra forma, a eventual desconformidade entre a categoria do Recorrente e as funções que de facto vinha exercendo desde 1993 não é questão que possa ser apreciada no âmbito de um processo de execução que visa apenas verificar se foram efetivados os efeitos da declaração de nulidade do ato que afastou o Recorrente do serviço, o que implica a reposição do status quo antes, através da colocação do Recorrente na situação em que se encontrava não fora a prática do ato ilegal. E essa situação, no caso, era uma situação de exercício de facto de funções não inteiramente correspondentes à categoria que detinha.
Da mesma forma, não cabe no âmbito do presente processo de execução de sentença aferir da legalidade da posterior mudança de funções do Recorrente, determinada pelo citado despacho do Vice-Presidente da Câmara de 11.06.2003 que constitui um ato novo e, por isso mesmo, foi impugnado pelo Recorrente em ação autónoma (P. 1241/05.BEVIS).
Em suma, o Recorrente foi efetivamente reintegrado nas funções e categoria que exercia antes do ato declarado nulo, não podendo o efeito repristinatório dessa declaração de nulidade servir de suporte para corrigir alegadas desconformidades já presentes na situação anterior do Exequente/Recorrente à qual regressou por efeito da reintegração e que, sublinhe-se, o próprio nunca antes impugnou judicialmente pelo meio próprio.
(…)
(cfr. acórdão a fls. 947 e ss do processo físico).
A Mmª Juíza a quo consignou ainda o seguinte: «Nada mais foi provado com interesse para a decisão da causa e inexistem quaisquer factos não provados com tal relevo, atenta a causa de pedir
Tendo em sede da motivação do julgamento da matéria de facto vertido o seguinte: «Motivação da matéria de facto: A convicção do tribunal quanto à factualidade constante do elenco de factos provados resultou, em parte, do acordo das partes, em função da posição por estas assumida nos seus articulados, e, em parte, documentalmente provada, com base nos documentos indicados no elenco de factos, à frente dos factos correspondentes.»
*
B – De direito
1. Da sentença recorrida
Pela sentença recorrida, de 24/01/2017, a Mmª Juíza do Tribunal a quo conheceu e apreciou os pedidos impugnatórios dirigidos aos dois identificados atos impugnados pelo autor na ação – (1) o ato proferido pelo Vice-Presidente daquela Câmara Municipal em 11/06/2003, através do qual a Entidade demandada lhe determinou que a partir de então deveria passar a exercer funções de ajudante de topógrafo e (2) o ato proferido pela Câmara de SJM, no âmbito do processo disciplinar n.º 01/2004, de 26/04/2005, que lhe aplicou a pena disciplinar de aposentação compulsiva – para o que elencou os factos que considerou relevantes para tal, tendo julgado improcedente o pedido impugnatório dirigido ao primeiro daqueles atos (o de 11/06/2003) e procedente o pedido impugnatório dirigido ao segundo (o de 26/04/2005) que anulou.
2. Da tese do recorrente
Pugna o recorrente em primeira linha, em suma, que o Tribunal a quo ao proferir a sentença recorrida, nos termos em que o fez, não acatou o caso julgado já formado, na medida em que não se limitou a dar resposta ao facto que foi dado como controvertido pelo acórdão deste TCA Norte de 12/10/2012 (o que se encontrava vertido na alínea J) do probatório do acórdão do TAF de 31/07/2010), acrescendo factos novos relativamente àqueles que já haviam sido dados como provados, e por ter concomitantemente reapreciando não só o pedido impugnatório dirigido ao ato de 11/06/2003 (que determinou que o autor deveria passar a exercer funções de ajudante de topógrafo) mas também o pedido impugnatório dirigido ao ato de 26/04/2005 (que lhe aplicou a pena disciplinar de aposentação compulsiva). E em segunda linha pugna, no essencial, pela não verificação das causas de invalidade que a sentença recorrida considerou serem causa da anulação do ato de 26/04/2005.
3. Da análise e apreciação dos fundamentos do recurso
3.1 Vejamos primeiramente se assiste ou não razão ao recorrente quanto à invocação, que faz, de que a sentença recorrida não acatou o acórdão deste TCA Norte de 12/10/2012, com violação de caso julgado.
3.2.1 Para o efeito atentemos nos elementos decorrentes dos autos, com relevância para a apreciação da presente questão, que são os seguintes:
1) O autor instaurou em 27/09/2005 no Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu a presente Ação Administrativa Especial na qual impugnou dois atos que assim identificou pela seguinte ordem: (1) o ato proferido pela Câmara de SJM, no âmbito do processo disciplinar n.º 01/2004, de 26/04/2005, que lhe aplicou a pena disciplinar de aposentação compulsiva; (2) o ato proferido pelo Vice-Presidente daquela Câmara Municipal em 11/06/2003, através do qual a Entidade demandada lhe determinou que a partir de então deveria passar a exercer funções de ajudante de topógrafo. – (cfr. fls. 1 ss. do suporte físico do processo e fls. 1 do SITAF)
2) Na contestação o réu Município suscitou a questão prévia da ilegal cumulação dos pedidos impugnatórios formulados (vide artigo 1º a 20º daquele seu articulado). - (cfr. fls. 53 ss. do suporte físico do processo e fls. … do SITAF)
3) Em face da questão assim suscitada, o então Mmº Juiz titular do processo determinou, por despacho de 05/01/2006, a notificação do autor, para tomar posição quanto a ela, querendo, nos termos do disposto nos artigos 47º nº 5 e 87º nº 1 alínea a) do CPTA. - (cfr. fls. 96 do suporte físico do processo e fls. … do SITAF)
4) Notificado, o autor veio, por requerimento de 17/01/2006, dizer ter incorrido em lapso de escrita quando disse cumuladamente, porque pretendia dizer subsidiariamente, afirmando que pretendia ver estabelecida uma relação de subsidiariedade nos pedidos. - (cfr. fls. 100 ss. do suporte físico do processo e fls. … do SITAF)
5) Por despacho de 29/03/2006 o Mmº Juiz a quo consignou, entre o demais «…que a existir possibilidade de formulação e apreciação subsidiária dos pedidos, de acordo com o disposto no art. 469º do CPC, a única hipótese admissível seria a inversa. Isto é, o Tribunal apreciaria primeiramente a validade da deliberação que determinou a alteração das funções exercidas desde Junho de 2003, e só no caso de improcedência apreciaria então a regularidade da deliberação punitiva aplicada em Abril de 2005 que determinou a sua aposentação compulsiva (…)», concluindo do seguinte modo: «Assim, considerando ilegal a cumulação dos pedidos formulados e inviável a sua apreciação subsidiária de acordo com a ordem indicada pelo autor, deve o mesmo, no prazo de 10 dias, indicar qual o pedido que pretende ver apreciado neste processo, sob cominação de não o fazendo, ser determinada a absolvição da instância quanto aos dois pedidos». - (cfr. fls. 107-108 do suporte físico do processo e fls. … do SITAF)
6) Notificado o autor veio, por requerimento de 21/04/2006, indicar que os pedidos formulados na petição inicial fossem apreciados «…numa relação de subsidiariedade, mas inversa à ordem em que tais pedidos foram feitos», no sentido de não sendo julgado procedente o pedido pelo qual o autor peticiona a declaração de nulidade do despacho de 01/06/2003, fosse apreciado, na eventualidade da sua improcedência o outro pedido impugnatório dirigido ao despacho de 26/04/2005 - (cfr. fls. 112-113 do suporte físico do processo e fls. … do SITAF)
7) Sobre aquele requerimento recaiu o seguinte despacho de 22/03/2007 da Mmª Juíza a quo, então titular do processo: «Requerimento do autor de fls. 114: Defiro a ordem de apreciação dos pedidos formulados na presente ação». - (cfr. fls. 127-128 do suporte físico do processo e fls. … do SITAF)
8) Despacho que foi notificado a ambas as partes por ofícios datados de 27/03/2007 - (cfr. fls. 130-131 do suporte físico do processo e fls. … do SITAF)
9) Por despacho de 18/07/2007 da Mmª Juíza a quo então titular do processo foi considerado que os factos relevantes para a decisão da causa eram objeto de prova documental que já se encontrava nos autos, e determinada a notificação das partes para apresentarem, querendo, alegações escritas, nos termos do disposto no artigo 91º nº 4 do CPTA. - (cfr. fls. 133 ss. do suporte físico do processo e fls. … do SITAF)
10) Autor e Réu apresentaram alegações escritas – (contantes, respetivamente, de fls. 155 ss. e a fls. 186 ss. do suporte físico do processo e fls. … e fls… do SITAF)
11) Por acórdão de 31/07/2010 do coletivo de juízes do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro (para onde o processo foi remetido em 15/04/2009, em conformidade com a Deliberação tomada na sessão de 19 de Março de 2009, pelo Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais – cfr. fls. 273 do suporte físico do processo e fls. 293 SITAF) foi a ação julgada totalmente improcedente e o réu absolvido dos pedidos impugnatórios dirigidos a ambos os atos - (cfr. fls. 292 ss. do suporte físico do processo e fls. 322-SITAF).
12) O autor interpôs recurso de apelação daquele acórdão para este TCA Norte - (cfr. fls. 406 ss. do suporte físico do processo fls. 685 ss. SITAF).
13) Naquele recurso o autor formulou as seguintes conclusões nos seguintes termos:
«CONCLUSÕES
1 - O Tribunal, com o devido respeito deu essa matéria como provada a matéria da alínea j) dos factos provados, mas considera o recorrente que tal matéria mantém-se como controversa e não poderia ser assim ser considerada como tal, antes pelo contrário.
2-Muito directamente errou ao considerar que a Entidade Demandada reintegrou o recorrente porque lhe pagou o que devia, e assim ser inequívoco que a sentença proferida pelo TAC de Coimbra se mostra cumprida, o que conduz à conclusão de que o facto constante da alínea dos factos provados não deveria ter sido dado como tal.
3-O Apelante pretende pois impugnar a matéria de facto dada como provada, nos termos do disposto no art. 690-A do C.P.C., aduzindo para esse efeito o seguinte:
Independentemente da invocada impugnação, nos termos do disposto no art. 712.º do C.P.C, a decisão do Tribunal de 1.ª Inst., sobre a matéria de facto, pode ser alterada se se verificar qualquer uma das hipóteses previstas nas alíneas a, b) e c) do seu n.º 1.
4 - Considera o recorrente que, nas circunstâncias em que foi proferida a decisão recorrida, não pôde requerer a junção aos Autos da certidão da pendência da acção executiva a que nos vimos referindo, documento que poder ia ainda juntar para efeitos de prova.
5 - Tal documento é de relevância para o apuramento da verdade, dos factos e da aplicação ao direito, revelando-se o mesmo de fundamental importância na matéria em discussão nos presentes Autos, e o recorrente não pôde por isso juntar esse documento, e não tendo por isso outro momento para o fazer, só em sede de recurso lhe pode ser permitida a sua junção, conforme ou nos termos do disposto no artigo 693-B do CP.- Vide doc. N.º 1 que protesta juntar.
6 - A decisão recorrida, com o devido respeito violou, além do mais que se vai alegar, o disposto no art. 3.º do C.P.C, o princípio da inquisitório, do 265.º (1 e 3), na medida em que não assegurou as diligências necessárias ao apuramento da verdade.
7 - Para obstar injustificadamente a prestação do trabalho por parte do aqui recorrente, e para atingir os objectivos que não conseguiu no recurso contencioso acima referido, deliberadamente, desfigurou de forma grosseira o conteúdo das funções e da prestação laboral do recorrente colocando-o a carregar malas e objectos como ajudante de topógrafo, sem funções definidas mesmo nesse tipo de serviços, sem nexo e de forma completamente arbitrária, para aparentar um cumprimento que apenas enxovalha o recorrente.
8 - E tal matéria, com o devido respeito mantêm-se como totalmente controversa na presente data, pois tanto é assim que se encontra a decorrer no Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra a execução de sentença desse processo 18/2002, agora como apenso A.
9 - Bastou, com o que o recorrente não se conforma a junção pela E.D a junção dum mero recibo de vencimento para se dar tal matéria como provada, mas incontornavelmente controversa, conforme o recorrente pretende provar pois como se disse, dada a pendência, nesta data, da execução de sentença no processo 18/2202, a correr no Tri. Ad. E Fiscal de Coimbra( 18-A/2002, como apenso).
10 - E ao não cumprir com os seus deveres consagrados numa sentença inequívoca, violou a E.D. e a sentença recorrida normas de natureza constitucional (art. 26.º, 1, 53.º, 58.º, n.º os 1 e 2 e 59.º, 1, al. b), da CRP, e n.º 2 do art. 119 do, n.º 1 do Código de Trabalho.
11 - Pensa o autor que tem plena aplicabilidade o que se decidiu no acórdão n.º 08S007, do S.T. J., de 21 de 2008, que dispôs o seguinte:
“Não cumpre integralmente a decisão judicial que anulou o acto administrativo em causa e que determinaria a reintegração plena do trabalhador, com todos os seus direitos, incluindo o da antiguidade e da categoria profissional, a entidade empregadora que, embora procedendo à reintegração não confere o desempenho das tarefas que se incluem na categoria profissional e que, antes do despedimento, que veio a ser nulo, exercia.
12 - Com o devido respeito, a sentença recorrida, de qualquer dos modos, não fundamentou sequer a razão de ser da consideração que consignou na sentença quanto à fundamentação do que assim considerou, violando também a lei aplicável, designadamente o disposto nos artigos 268 da CRP, no n.º 1, a) do art. 124.º do C.P.A.
13 - Considera o recorrente que não foram explicados os fundamentos de facto e de direito da decisão recorrida no que respeita aos factos supra expostos uma reintegração de todo inexistente e infirmada pela pendência dum processo que está a cor rer no TAF de Coimbra para se assegurar tal reintegração do A),
14 - Nem fundamenta de forma que se perceba a razão porque considera tal reintegração efectuada com base na junção dum simples documento de vencimento do A, não sendo suficiente nem congruente pois não possibilita ao A perceber a sua razão de ser.
AINDA QUANTO À MODIFIBILIDADE DA MATÉRIA DE FACTO DADA COMO PROVADA – Art. 712.º do CPC.
15 - Ora, o recorrente, como se disse, e com o devido respeito por mais douta opinião, considera que o Tribunal errou notoriamente na apreciação crítica da prova, em vários aspectos importantes e documentalmente iniludíveis, pois, de acordo com a prova documental, que nem sequer foi feita e na que insuficientemente foi junta aos autos pela E.D. e que parece ter sido determinante, teria necessariamente que conduzir a uma decisão diferente da que foi proferida, pelo menos quanto a este aspecto.
16 - E sem esquecer que parece mesmo que tal erro parte dum raciocínio que os factos e os documentos não confirmam, que se traduz na insuficiência de prova do facto vertido na aliena J dos factos provados e que resulta do de estar ou ter sido dado como provado que o recorrente está reintegrado, (com a mera apreciação do recibo de vencimento desactualizado) sem ser explicado como ou de que modo o recorrente pode ser considerado reintegrado.
17- A decisão recorrida considerou bastante que a E.D. desta forma, com a mera junção dum papel que nem sequer é legal, consegue nesta demanda o que não conseguiu numa acção anterior e numa acção executiva que está pendente.
18 - Tal facto, considera o recorrente não poderia ser dado como provado porque como se disse está infirmado pelas 4 razões supra indicadas:
1 - A pendência da acção executiva no TAF de Coimbra para a reintegração do A;
2 - A reintegração não poderia ser dada como provada por A E.. ter feito a junção dum vencimento que nem sequer corresponde ao vencimento real e legal do A/recorrente da data a que tal vencimento se refere;
3 - De todo o modo, não parece que possa ser dada como provada uma reintegração do recorrente quando as suas funções legais de aferidor são substituídas pela imposição duma outra função que nada tem, nem minimamente sequer com o núcleo das funções que o A exercia.
4 - Não foi feita qualquer outra prova no sentido acolhido pela decisão neste aspecto mas poderia ter sido evitada se o fosse.
19 - As questões que se decidem na referida execução parecem mesmo intermináveis e por isso se calhar é que tal acção executiva se mantém pendente há tantos anos, pelo que na opinião do recorrente dar-se como provado o que é desmentido com o que se passa com a acção que ao tem a correr contra a E.D. no TAF de Coimbra que confirma que a E.D. ainda não reintegrou o exequente até à presente data.
20 - E como parece desnecessário salientar, tal facto constitui o direito essencial dos direitos do recorrente, (o direito de ocupação efectiva mas nas suas funções reais) que a E.D nunca quis entender como tal e nunca quis cumprir, sem esquecer todo o acervo de direitos acessórios, mas de âmbito material, – o pagamento do que o A tem direito, dos retroactivos, dos juros, e o cumprimento de tantos outros direitos do A que a E.D. nunca cumpriu – as actualizações normais do seu vencimento de acordo com o escalão em que deveria ter sido sucessivamente colocado e os índices respectivos que, ao longo dos anos, deveriam ter sido observados na sua remuneração e não o foram ainda.
21 - Aliás, no TAF de Coimbra o que se determina ainda são mesmo as operações concretas tendo em vista a execução integral dessa sentença, designadamente, o valor do seu vencimento do A e as respectivas diferenças do que a E.D. pagou e do que deveria ter pago, o direito de actualização da sua remuneração.
22 - O A recorrente aqui chegado sublinha o que a própria E.D tem dito nas peças que subscreveu na mencionada execução que corre contra si os seus termos no TAF de Coimbra, e a propósito da ilegalidade cometida por si, aí executado, nas retenções ilegais que fez ao A/recorrente: -
“O que acontece é que, aquando do pagamento ao exequente em Setembro de 2003, das retribuições a que tinha direito e referentes aos anos de 2000, 2001 e 2002, por força da sentença ora executada, foi-lhe retida na fonte, nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 114.º do CIRS, o imposto correspondente À globalidade dos rendimentos auferidos pelo exequente em 2003, o que terá conduzido a que lhe fosse aplicado uma taxa de incidência do imposto de 34%, superior à devida…”
23 - Mais ainda, e a propósito do que diz A E.D. em peça do mencionado processo executivo pendente no TAF de Coimbra, quando aí em sede de contra alegações diz isto:
Porém, como bem refere o douto despacho a fls. 107 e 198, aqui acrescem as menções inúmeras do A., a validade deste mesmo acto da autoria do Sr. Vice – Presidente da Câmara, em matéria que está que está a ser dirimida nos autos de execução de sentença que, sob o n.º 18/02, corre presentemente termos no Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra. –
24 - O que determina dever ser, na opinião do recorrente ordenada a modificação da matéria dada como provada sob ao alínea J) dos factos provados.»
Ali concluindo requerendo: «…que seja dado provimento ao presente recurso de apelação, revogando-se a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo de Aveiro de forma a que seja proferida nova decisão no sentido de ser declarada a nulidade da deliberação proferida pelo Recorrido em 26 de Abril de 2005, pela qual lhe foi, pela segunda vez consecutiva, aplicada a pena de “ Aposentação compulsiva” na sequência dum processo disciplinar que lhe foi instaurado pelo recorrido e que correu os seus termos no Recorrido como Processo Disciplinar 1/2004, com todas as consequências legais daí resultantes.» (cfr. fls. 685 ss. SITAF).
14) Por acórdão de 12/10/2012 deste TCA Norte foi dado provimento ao recurso, com revogação do acórdão recorrido, determinando-se a baixa dos autos à 1ª instância para aí prosseguirem os seus termos com vista ao apuramento do facto que havia sido dado como provado no acórdão do TAF sob a alínea J) do probatório, mas que se achava controvertido: saber se o Autor foi (ou não) reintegrado na sua carreira técnica e respetiva categoria de aferidor de pesos e medidas - (cfr. fls. 736 ss. do suporte físico do processo e fls. 685 ss. SITAF).
15) Após suspensão da instância, determinada por despacho de 05/02/2013 da Mmª Juíza a quo então titular do processo (fls. 734 SITAF), até ao trânsito em julgado da sentença de 17 de Setembro de 2012 proferida nos autos de execução n.º 18-A/2002, que correu termos no Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, então pendente de recurso interposto para este TCA Norte, prosseguiram os autos, tendo a nova Mmª Juíza a quo titular do processo considerado, por despacho de 11/07/2016 (de fls. 1020-SITAF) que transitada em julgado a identificada sentença, o processo já continha os elementos documentais necessários, não sendo necessário proceder a quaisquer diligências de prova, pelo que determinou a notificação das partes para produzirem alegações escritas nos termos previstos no artigo 91º nº 4 do CPTA. – (cfr. 734-SITAF e fls. 1020-SITAF)
16) Após as quais foi proferida a sentença de 24/01/2017 que julgando parcialmente procedente a ação absolveu o réu Município do pedido de anulação do ato de 11/06/2003, que determinou a recolocação do Autor, mantendo-o na ordem jurídica e anulou o ato que lhe aplicou a pena de aposentação compulsiva datado de 26/04/2005. - (cfr. fls. 1072 ss. SITAF)
3.2.2 Em face do contexto processual assim explicitado a primeira observação que emerge fazer é a de que o acórdão de 31/07/2010 do TAF não transitou em julgado em qualquer dos seus segmentos decisórios, isto é, seja no julgamento de improcedência do pedido impugnatório dirigido ao ato de 11/06/2003 seja no julgamento de improcedência do pedido impugnatório dirigido ao ato de 26/04/2005, em face do recurso de apelação dele interposto pelo autor e do decidido no acórdão de 12/10/2012 deste TCA Norte.
3.2.3 Note-se que aquele acórdão do TCA Norte reconheceu ocorrer, como vinha invocado naquele recurso, erro de julgamento da matéria de facto por não poder ter sido dado como provado sob a alínea J) do respetivo probatório, com elementos então constantes dos autos, como havia sido feito pelo TAF, que o autor foi reintegrado na carreira técnica e respetiva categoria de aferir de pesos e medidas, tendo procedido, por um lado à alteração do facto dado como provado em J) do respetivo probatório passando dele a constar, restritivamente, apenas o que resultava provado do identificado recibo de vencimento (vide pág. 6 do acórdão de 12/10/2012 do TCAN) e por outro determinado a necessidade de proceder a diligências instrutórias por se mostrar controvertido o facto essencial se saber se o autor foi (ou não) reintegrado na sua carreira técnica e respetiva categoria de aferidor de pesos e medidas (vide págs. 12-14 do acórdão de 12/10/2012 do TCAN), impondo a baixa do processo ao TAF «para aí prosseguir os seus termos com vista ao apuramento do facto acima referido, se o Autor foi (ou não) reintegrado na sua carreira técnica e respetiva categoria.»
3.2.4 A procedência daquele recurso, com revogação (anulação) do acórdão do TAF de 31/07/2010, implicava, assim, o apuramento daquele facto considerado controvertido e tido como essencial para a resolução do objeto do litígio. E isso foi feito pelo Tribunal a quo.
Mas, obviamente, a causa não se encontrava decidida, pelo que se impunha ao TAF que proferisse nova decisão. E este TCA Norte no seu acórdão de 12/10/2012 não condicionou a solução a dar pelo TAF ao objeto do litígio.
3.2.5 É certo que se encontrava, no demais, já estabelecida a base factual para a decisão.
Mas a circunstância de o TAF, na nova decisão de 24/01/2017, ter elencado a matéria de facto provada de modo distinto ao que constava da sua anterior decisão de 31/07/2010, que não havia sido objeto do recurso, não é bastante para se considerar ocorrer violação de caso julgado quanto ao julgamento da matéria de facto, nos termos da tese propugnada pelo recorrente. Para que a mesma ocorresse mister era que houvesse oposição entre o probatório das duas decisões. O que não sucede nem, aliás, invocado.
3.2.6 Não colhem, por conseguinte, as conclusões 1ª a 11ª das alegações de recurso.
3.2.7 Como também não colhe a argumentação esgrimida pelo recorrente que aponta no sentido de que o objeto da ação se circunscrevia tão só e apenas à apreciação do pedido impugnatório dirigido ao ato de 11/06/2003 (cuja decisão, de improcedência, veio a ser favorável ao réu ora recorrente) e já não ao ato de 26/04/2005 (cuja decisão, de procedência, veio a ser desfavorável ao réu ora recorrente).
3.2.8 Com efeito, resulta dos autos que na petição inicial da ação o autor pretendeu impugnar dois atos que assim identificou pela seguinte ordem: (1) o ato proferido pela Câmara de SJM, no âmbito do processo disciplinar n.º 01/2004, de 26/04/2005, que lhe aplicou a pena disciplinar de aposentação compulsiva; (2) o ato proferido pelo Vice-Presidente daquela Câmara Municipal em 11/06/2003, através do qual a Entidade demandada lhe determinou que a partir de então deveria passar a exercer funções de ajudante de topógrafo. Na contestação o réu Município suscitou a questão prévia da ilegal cumulação dos pedidos impugnatórios formulados (vide artigo 1º a 20º daquele seu articulado), e em face da questão assim suscitada, o então Mmº Juiz titular do processo determinou, por despacho de 05/01/2006, a notificação do autor, para tomar posição quanto a ela, nos termos do disposto nos artigos 47º nº 5 e 87º nº 1 alínea a) do CPTA. O qual, por requerimento de 17/01/2006, veio então dizer ter incorrido em lapso de escrita quando disse cumuladamente, porque pretendia dizer subsidiariamente, afirmando que pretendia ver estabelecida uma relação de subsidiariedade nos pedidos. Nesse seguimento, o Mmº Juiz a quo consignou, por despacho de 29/03/2006, entre o demais que «… a existir possibilidade de formulação e apreciação subsidiária dos pedidos, de acordo com o disposto no art. 469º do CPC, a única hipótese admissível seria a inversa. Isto é, o Tribunal apreciaria primeiramente a validade da deliberação que determinou a alteração das funções exercidas desde Junho de 2003, e só no caso de improcedência apreciaria então a regularidade da deliberação punitiva aplicada em Abril de 2005 que determinou a sua aposentação compulsiva (…)», concluindo do seguinte modo: «Assim, considerando ilegal a cumulação dos pedidos formulados e inviável a sua apreciação subsidiária de acordo com a ordem indicada pelo autor, deve o mesmo, no prazo de 10 dias, indicar qual o pedido que pretende ver apreciado neste processo, sob cominação de não o fazendo, ser determinada a absolvição da instância quanto aos dois pedidos». Notificado o autor veio, por requerimento de 21/04/2006, indicar que os pedidos formulados na petição inicial fossem apreciados «…numa relação de subsidiariedade, mas inversa à ordem em que tais pedidos foram feitos», no sentido de não sendo julgado procedente o pedido pelo qual o autor peticiona a declaração de nulidade do despacho de 01/06/2003, fosse apreciado, na eventualidade da sua improcedência o outro pedido impugnatório dirigido ao despacho de 26/04/2005. E sobre este requerimento recaiu o despacho de 22/03/2007 da Mmª Juíza a quo, então titular do processo que deferiu «…a ordem de apreciação dos pedidos formulados na presente ação».
3.2.9 Significa, pois, que por aquele despacho de 22/03/2007 a Mmª Juíza a quo então titular do processo considerou como admissível a formulação dos pedidos impugnatórios dirigidos a ambos os identificados atos de 26/04/2005 e de 11/06/2003, enquanto impugnação subsidiária (pedido subsidiário), entendendo a impugnação dirigida ao ato de 11/06/2003 como pedido principal, e a impugnação dirigida ao ato de 26/04/2005 como subsidiária. Com o que ficou resolvida (suprida) a suscitada questão da ilegal cumulação de pedido.
3.2.10 E conduziu, assim, ao conhecimento prioritário do pedido impugnatório dirigido ao ato de 11/06/2003, e face à sua improcedência ao conhecimento seguinte do pedido impugnatório dirigido ao ato de 26/04/2005. O que foi observado quer na inicial decisão do TAF de 31/07/2010 (relatada pela mesma Mmª Juíza que havia proferido o despacho de 22/03/2007, até então ainda titular do processo), quer na decisão do TAF de 24/01/2017, objeto do presente recurso (agora proferida por nova titular do processo).
3.2.11 Novamente, e reiterando o já supra afirmado, através daquele despacho de 22/03/2007 foi admitido o requerido pelo autor no sentido de ser considerado o pedido impugnatório dirigido ao ato de 11/06/2003 como pedido principal e o pedido impugnatório dirigido ao ato de 26/04/2005 como pedido subsidiário daquele.
3.2.12 Não colhe, pois, a interpretação propugnada pelo recorrente do despacho de 22/03/2007 a Mmª Juíza a quo então titular do processo, que não tem qualquer amparo seja no próprio elemento literal, seja no contexto processual em que foi proferido. Improcedendo, assim, as conclusões 12ª a 15ª das conclusões de recurso.
3.2.13 E cumpre ainda explicitar que a invocação, também feita pelo recorrente (a título subsidiário), no sentido de que ao Tribunal a quo só competia pronunciar-se na nova decisão sobre o pedido impugnatório dirigido ao ato de 26/04/2005, por a decisão de improcedência do pedido impugnatório dirigido ao ato de 11/06/2003, tomada no acórdão do TAF de 31/07/2010 não ter sido objeto de impugnação no primeiro recurso, apresenta-se como inócua e infrutífera já que a sentença do TAF de 24/01/2017, objeto do presente recurso, foi nessa parte favorável ao réu, ora recorrente, na exata medida em que o absolveu do pedido impugnatório dirigido ao ato de 11/06/2003.
Estando apenas em causa no presente recurso a decisão de procedência do pedido impugnatório dirigido ao ato de 26/04/2005, que é aliás, aquela para a qual detém legitimidade e interesse (cfr. artigo 141º do CPTA). O que é evidenciado pelo pedido recursivo formulado pelo réu-recorrente: de revogação daquela decisão com substituição por outra que julgue válido o ato que nela foi considerado ilegal, improcedendo a ação na sua totalidade.
3.2.14 Não colhem, por isso, também as conclusões 16ª e 17ª das alegações de recurso.
3.2.15 De todo o modo, sempre se diga que não se pode subscrever a consideração feita pela Digmª Procuradora-Geral-Adjunta no seu parecer, no sentido de que no anterior recurso de apelação interposto do acórdão do TAF de 31/07/2010 o autor, ali recorrente, apenas impugnou aquele aresto no que tange ao julgamento de improcedência do pedido impugnatório dirigido ao ato de 11/06/2003, deixando incólume a decisão judicial na parte em que recaiu sobre o ato de 26/04/2005, com consequências na formação de caso julgado, na exata medida em que, nos termos apurados supra, aquele recurso interposto pelo autor abrangeu a decisão de improcedência do pedido impugnatório dirigido ao ato de 26/04/2005, como é evidenciado no pedido recursório ali por ele formulado, onde solicitou que «(…)revogando-se a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo de Aveiro de forma a que seja proferida nova decisão no sentido de ser declarada a nulidade da deliberação proferida pelo Recorrido em 26 de Abril de 2005(…)».
3.2.16 Sendo que, por outro lado, o acórdão de 12/10/2012 deste TCA Norte, após delimitar o objeto do recurso «…ao erro de julgamento da matéria de facto e de eventual realização de diligências com vista ao apuramento de matéria relevante» (vide pág. 5 do acórdão), concluiu assistir razão ao recorrente-autor, revogando o acórdão recorrido, e determinando a baixa dos autos à 1ª instância para aí prosseguirem os seus termos com vista ao apuramento do facto que havia sido dado como provado no acórdão do TAF sob a alínea J) do probatório, mas que se achava controvertido: saber se o Autor foi (ou não) reintegrado na sua carreira técnica e respetiva categoria de aferidor de pesos e medidas. E fez isso sem que tivesse emitido qualquer apreciação ou pronúncia sobre a solução jurídica dada pela 1ª instância a qualquer dos pedidos impugnatórios em causa. E sem que delimitasse, bem ou mal, no que aqui não interessa nem releva, se o apuramento daquele facto era necessário apenas para algum (e qual) ou para os pedidos impugnatórios dirigidos a ambos os atos. E não é correto procurar agora fazer esse juízo, extraindo que os autos baixaram à 1ª instância para diligências instrutórias com vista ao julgamento de facto apenas relevante para a decisão sobre o pedido impugnatório dirigido ao ato de 11/06/2003, se tal juízo não foi feito naquele acórdão; nem concomitantemente, é de concluir que se formou caso julgado (material) quanto à decisão de improcedência do pedido impugnatório dirigido ao ato de 26/04/2005 inicialmente proferida pelo TAF, quando, ademais, o autor abrangeu naquele seu recurso a impugnação da decisão de improcedência da impugnação daquele ato de 26/04/2005 e o acórdão proferido em sede de recurso expressamente revogou a decisão da 1ª instância que negou procedência àquele pedido.
Pelo que também por tal razão não se formou caso julgado material quanto ao objeto (total) do litígio.
O que se impunha à 1ª instância era que, após as diligências instrutórias necessárias, proferisse nova sentença que apreciasse não só o pedido impugnatório dirigido ao ato de 11/06/2003, mas também, na relação de subsidiariedade estabelecida, ao ato de 26/04/2005. Que foi o que fez, acatando a decisão do Tribunal superior.
3.2.18 Improcedem, pois, estes fundamentos do recurso.
3.3 Vejamos agora se a sentença recorrida violou, na apreciação do pedido impugnatório dirigido ao ato de 26/04/2005, o disposto no artigo 95º nº 2 do CPTA.
3.3.1 Propugna o recorrente (nos termos que reconduz às conclusões 17ª a 18ª das suas alegações de recurso) que a Mmª Juíza a quo usou, ao contrário do coletivo do TAF que a precedeu, uma interpretação criativa do artigo 95º nº 2 do CPTA, fazendo uma interpretação extraliteral sem correspondência com as expressas causas de invalidade apontadas pelo autor na petição inicial da ação, em termos que os vício elencados nas alíneas a) a f), na pág. 4 da sentença recorrida, como vício que efetivamente o autor, ao contrário do que é alegado, não imputa a esse ato.
3.3.2 Na sua versão original (anterior à revisão do CPTA operada pelo DL. nº 214-G/2015, de 2 de Outubro, aqui temporalmente aplicável, face à data da instauração da ação – cfr. artigo 15º nº 2 do DL. 214-G/2015) o nº 2 do artigo 95º do CPTA (correspondente ao atual nº 3 do mesmo artigo) dispunha que: “Nos processos impugnatórios, o tribunal deve pronunciar-se sobre todas as causas de invalidade que tenham sido invocadas contra o ato impugnado, exceto quando não possa dispor dos elementos indispensáveis para o efeito, assim como deve identificar a existência de causas de invalidade diversas das que tenham sido alegadas, ouvidas as partes para alegações complementares pelo prazo comum de 10 dias, quando o exija o respeito pelo princípio do contraditório.”
3.3.3 Na sentença recorrida a Mmª Juíza a quo identificou terem sido invocadas pelo autor as seguintes invalidades apontadas ao ato de 26/04/2005 (vide pág. 4 da sentença):
«a) Vício de violação de lei, em virtude do vício do ato antecedente, de violação de sentença judicial transitada em julgado, que havia determinado a anulação de anterior ato, através do qual o Réu aplicara a sanção disciplinar de aposentação compulsiva. Não tendo o Réu cumprido os deveres que para ele decorriam de tal sentença, o Autor apenas exercia um seu direito e não se encontrava sujeito ao poder disciplinar do Réu;
b) Vício de violação de lei, por erro de direito, na medida em que a pena aplicada se baseia na violação do dever da assiduidade, mas o Autor nunca faltou injustificadamente ao serviço, apenas se recusou a picar o ponto, o que resulta da prova produzida no próprio processo disciplinar: quando muito, estaria em causa a violação do dever de obediência;
c) Vício de violação de lei, por erro de direito, na medida em que a conduta da Entidade Demandada constitui uma circunstância dirimente da responsabilidade do Autor, que exercia um seu direito;
d) Vício de violação de lei, por erro de direito, na medida em que foi nomeado um relator impedido, contra o qual o recorrente tinha movido uma queixa-crime;
e) Vício de desvio de poder, na medida em que o Réu conhecia o erro em que persistiu, numa atitude vingativa e punitiva; e
f) Vício de violação de lei, por violação dos princípios da legalidade do procedimento, do princípio da prossecução do interesse público e da proteção dos direitos e interesses dos cidadãos, da igualdade e da proporcionalidade, da boa-fé, da justiça e da imparcialidade, em virtude da errónea apreciação da conduta do Autor.»
E no corpo fundamentador da sentença, a Mmª Juíza a quo apreciou cada uma daquelas apontadas causas de invalidade (vide págs. 34 ss. da sentença).
3.3.4 No anterior acórdão do TAF de 31/07/2010 foi referido que o pedido impugnatório dirigido pelo autor ao ato de 26/04/2005 se suportava nos seguintes fundamentos, nos seguintes termos: «…sustentando ser falso que tenha cometido novas faltas que determinem a instauração contra si de novo processo disciplinar, pois apenas deixou de picar o ponto para marcar a sua situação de extremo desagrado baseada numa revolta legalmente relevante, circunstância dirimente da responsabilidade do Autor. E que assim ocorreu errada apreciação da sua conduta disciplinar em violação dos princípios da legalidade dos procedimentos, da prossecução do interesse público e da protecção dos direitos e interesse do cidadão, da igualdade e proporcionalidade, da boa-fé, da justiça e da imparcialidade consagrado nos artigos 3°, 4°, 5° e 6° do Código de Procedimento Administrativo. Refere ainda que, quanto muito, os factos que fundamentam a deliberação impugnada correspondiam à aplicação de uma pena fundada, não em faltas injustificadas por violação dos deveres de obediência e pontualidade, antes de desobediências a ordens dos seus superiores hierárquicos em não marcar o ponto.» (vide pág. 14 do acórdão do TAF de 31/07/2010).
3.3.5 Ora, a circunstância de num e noutro aresto a enunciação dos fundamentos do pedido impugnatório não tenha sido feita do mesmo exato modo é aqui irrelevante para efeitos do disposto naquele nº 2 do artigo 95º do CPTA (na versão original).
O que releva é que o tribunal se tenha circunscrito à apreciação dos fundamentos de impugnação do ato (causas de invalidade) invocados pelo autor na ação, os quais configuram a causa de pedir (isto sem prejuízo da possibilidade de conhecimento oficioso de distintos fundamentos de invalidade não concretamente alegados, mas que possam ter ser constatados pelo juiz, assegurado que seja, neste caso, o necessário contraditório). Tendo em conta, de todo o modo, que o tribunal não está absolutamente vinculado ao nomen juris atribuído ou usado pela parte, como aliás decorre do disposto no artigo 5º do CPC novo (aprovado pela Lei nº 41/2013), correspondente ao artigo 664º do CPC antigo.
3.3.6 O recorrente não explicita no recurso em que termos ou modos, ou em que dimensão, a sentença recorrida violou o nº 2 do artigo 95º do CPTA, não identificando qual ou quais as causas de invalidade que nela foram identificadas (nominadas) como tendo sido invocadas pelo autor na petição inicial da ação assim o não foram. E impunha-se que essa explicitação tivesse sido feita.
A alegação feito pelo recorrente no sentido na violação do nº 2 do artigo 95º do CPTA mostra-se, assim, genérica e não concretizada.
3.3.7 De todo o modo sempre se diga que compulsada a petição inicial da ação, é efetivamente de perspetivar que os vícios sistematizados na sentença recorrida correspondem e abrangem os fundamentos da impugnação que o autor dirigiu ao ato de 26/04/2005.
3.2.8 Não merecem, pois, acolhimento, as conclusões 18ª e 19ª das alegações de recurso.
3.4 Por último vejamos agora se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento ao considerar verificadas as causas de invalidade que fundaram a anulação do ato de 26/04/2005.
3.4.1 A sentença recorrida anulou o ato de 26/04/2005 – consubstanciado na deliberação da Câmara Municipal de SJM que aplicou ao autor a pena disciplinar de aposentação compulsiva, conforme proposta constante do Relatório Final do instrutor de 29/03/2005 – com fundamento na verificação das seguintes causas de invalidade:
i) - por violação de lei, por inexistência de violação do dever de assiduidade;
ii) - por violação de lei, por impedimento do relator.
Decisão que, relativamente a cada um daqueles vícios, assentou na seguinte fundamentação, que se passa a transcrever.
No que tange ao vício de violação de lei, por inexistência de violação do dever de assiduidade, a sentença recorrida explanou o seguinte:
«b) Vício de violação de lei, por alegada inexistência de violação do dever de assiduidade
Invoca ainda o Autor que o ato de aplicação de pena de aposentação compulsiva, datado de 26.04.2005, padece de um vício de violação de lei, por erro de direito, na medida em que se baseia no dever de assiduidade, quando este nunca faltou injustificadamente ao serviço, mas apenas se recusou a picar o ponto, conforme resulta da prova produzida no próprio processo disciplinar. Alega que, quando muito, estaria em causa a violação do dever de desobediência, sendo certo que uma tal violação não configura o motivo da aplicação da pena.
Em sentido contrário, invoca a Entidade Demandada que as faltas do Autor ao serviço enumeradas na acusação e no relatório final são efetivamente injustificadas, louvando-se, no demais, no relatório final constante do processo administrativo, que constituiu fundamento da pena de aposentação compulsiva.
Vejamos então se procedem as alegações do Autor.
Nos termos do art. 3.º, n.º 4, als. g) e h), do Estatuto Disciplinar dos Funcionários e Agentes da Administração Central, Regional e Local (adiante designado apenas por “Estatuto Disciplinar”), tal como aprovado pelo Decreto-lei n.º 24/84, de 16 de janeiro, em vigor à data do procedimento disciplinar em causa nos autos, consideram-se deveres gerais do funcionário ou agente, os deveres de assiduidade e de pontualidade.
Segundo o n.º 2 deste preceito, “Considera-se infração disciplinar o facto, ainda que meramente culposo, praticado pelo funcionário ou agente com violação de algum dos deveres gerais ou especiais decorrentes da função que exerce.”
A aplicação da pena de aposentação compulsiva, que foi aplicada ao Autor no caso concreto, encontra-se regulada no art. 26.º do Estatuto Disciplinar.
Segundo o art. 26.º, n.º 1, deste diploma, “As penas de aposentação compulsiva e de demissão serão aplicáveis em geral às infrações que inviabilizarem a manutenção da relação funcional.”
No n.º 2 deste preceito, o legislador exemplifica situações que podem dar lugar às penas de aposentação compulsiva e de demissão. Entre estas, encontra-se a situação em que os funcionários “dentro do mesmo ano civil derem 5 faltas seguidas ou 10 interpoladas sem justificação”.
No caso dos autos, o Autor foi notificado da intenção da Entidade Demandada de considerar injustificadas as faltas cometidas, por não ter procedido ao registo da assiduidade (cfr. ponto 10 do probatório).
O Autor veio exercer o direito de pronúncia alegando que nunca faltou ao serviço, pese embora admitindo a falta de registo da sua assiduidade (cfr. ponto 12 do probatório).
Não obstante, o Presidente da Câmara Municipal da Entidade Demandada considerou as ausências de picagem de ponto nos dias 11, 12, 13, 16, 17, 18, 19, 20, 23, 25, 26 e 27 de fevereiro, e nos dias 1, 2, 3, 4, 5, 8, 9, 10, 11, 12, 15, 16, 17, 18 e 19 de março como faltas injustificadas (cfr. ponto 14 do probatório) e, com base na violação do dever de assiduidade, a Entidade Demandada deliberou instaurar um processo disciplinar ao Autor (cfr. ponto 15 do probatório).
Posteriormente, em 29.03.2005, na sequência da prolação de despacho de acusação e da instrução do procedimento disciplinar (cfr. ponto 20 do probatório), veio a ser emitido relatório final por parte do instrutor do procedimento, em que este propôs a aplicação de uma pena de aposentação compulsiva, o que veio a ser determinado pela Entidade Demandada (cfr. pontos 22 e 23 do probatório).
Neste relatório final, o instrutor considerou que, não obstante a existência de um despacho claro do Vice-presidente da Câmara no sentido de ser obrigatório o registo de assiduidade, através da picagem do ponto diário, sob pena de os funcionários incorrerem em faltas injustificadas, o Autor, ali arguido, não picou o ponto, o que desencadeou um procedimento que culminou na consideração de faltas injustificadas (cfr. pontos 9 e 23 do probatório).
Mais referiu o instrutor que, face às alegações do Autor de que tinha comparecido ao serviço, foram juntos aos autos registos manuais do relatório confidencial dos serviços de segurança, onde se confirma à evidência que o funcionário nunca cumpriu com o seu horário de trabalho, entrando indiscriminadamente, sempre no meio ou finais da manhã e não cumprindo com o horário rígido a que estava obrigada (cfr. ponto 23 do relatório).
Ora, de facto, encontra-se junto ao procedimento disciplinar um registo de entradas e saídas elaborado pelos serviços de segurança que atestam as entradas e saídas do Autor em quase todas as datas consideradas como faltas injustificadas (cfr. ponto 13 do probatório). E de tal registo resulta que o Autor esteve efetivamente presente nos dias em que foi considerada a verificação de faltas injustificadas, ainda que, eventualmente, fora do horário rígido invocado pelo instrutor no relatório final (ponto 13 do probatório), tal como definido pelo art. 17.º, n.º 2, do Decreto-lei n.º 259/98, de 18 de agosto, que estabelecia, à data, as regras e princípios gerais em matéria de duração e horário de trabalho na Administração Pública, a saber: das 9 às 13 horas e das 14h às 18 h.
Em consonância com a acusação que havia sido formulada, o relatório final conclui pela existência de uma conduta reiterada de falta de assiduidade e de pontualidade, com um grau de ilicitude e de culpa elevados, “tanto mais que nos curtos períodos diários em que compareceu ao serviço, recusou-se a exercer as funções ou tarefas que lhe eram cometidas superiormente.”
Segundo o relatório, a infração em causa excede em muito os dias seguidos ou interpolados, o que inviabiliza a manutenção da relação funcional (cfr. ponto 23 do probatório).
Face a uma tal factualidade, há que aferir se assiste ou não razão ao Autor.
É que, de facto, o procedimento disciplinar foi instaurado com base na falta de assiduidade do Autor apenas, em virtude da verificação de faltas injustificadas, por falta de picagem do ponto (cfr. ponto 15 do probatório).
Ora, ainda que o trabalhador esteja obrigado à “picagem do ponto”, a verdade é que a sua falta apenas estabelece uma presunção da sua falta ao serviço, mas não conduz inexoravelmente, a tal conclusão.
E, na verdade, o Autor logrou pôr em causa a alegada violação do dever de assiduidade, na medida em que ficou provado no procedimento disciplinar que efetivamente comparecia ao serviço, ainda que fora do horário rígido, conforme reconhece o próprio instrutor.
Recorrendo às palavras do Tribunal Central Administrativo Norte, “Se o relógio de ponto electrónico nada regista a respeito de um funcionário, presume-se que não compareceu ao serviço e não que se esqueceu do cartão ou da marcação do ponto, pois a situação de esquecimento do registo da presença pressupõe sempre a comparência do funcionário. Desde que comprovada a normal comparência do trabalhador em causa nunca há violação do dever de assiduidade. Mas se o trabalhador se esquecer do cartão ou da marcação do ponto por mais que duas vezes por mês, então há violação do dever de zelo, por violação das normas regulamentares.” (cfr. Ac. do TCAN de 13.01.2011, proc. n.º 02570/06.0BEPRT, in www.dgsi.pt).
Sucede que a conduta pela qual foi instaurado o procedimento disciplinar – de ausência ao serviço - e a conduta que veio a ser apurada no âmbito do mesmo – de atrasos ao serviço – são condutas que se reconduzem a infrações substancialmente diferentes, a que devem ser atribuídas valorações também diferenciadas.
Não obstante, apesar de o instrutor reconhecer, na instrução do processo, que o Autor esteve efetivamente presente ao serviço, a acusação baseia-se, quer na falta de assiduidade, quer na falta de pontualidade (cfr. ponto 23 do probatório).
E foi também a violação de ambos estes deveres que esteve no fundamento da sanção de aposentação compulsiva aplicada, por aplicação do art. 26.º, n.º 1, al. h) do Estatuto Disciplinar (cfr. ponto 23 do probatório).
Ora, recorrendo às palavras do Supremo Tribunal Administrativo, “Os atrasos do funcionário na chegada ao serviço constituem violações do dever de pontualidade e não de assiduidade, pelo que não podem ter a mesma incidência e valoração para efeitos disciplinares” (cfr. Ac. do STA de 24.03.2004, proc. n.º 0757/03, in www.dgsi.pt).
Assim sendo, ao retirar da conduta do trabalhador, ao não picar o ponto, a existência de faltas não justificadas, caraterizando tal conduta como a violação do dever de assiduidade, a Entidade Demandada claramente incorreu num erro de direito.
Há que apurar agora se um tal erro necessariamente inquina o ato de aplicação da pena de aposentação compulsiva, na medida em que também constitui fundamento de tal pena a violação do dever de pontualidade, em virtude dos atrasos que resultam dos relatórios de segurança, e que tal fundamento não foi posto em causa pelo Autor no âmbito do processo disciplinar.
Desde já se diga que sim.
Na verdade, o facto de o Autor não ter faltado, mas ter apenas chegado atrasado ao serviço foi um facto que surgiu no âmbito do procedimento de injustificação de faltas (ponto 13 do probatório), mas que, na verdade, não constituiu sequer um fundamento fáctico direto do despacho de acusação, referindo-se nele apenas, a esse respeito, que “a simples presença no serviço, às horas e nos horários mais desencontrados e muito menos durante o regime normal de duração do seu trabalho de 35 horas semanais, o cumprimento desses mesmos deveres de assiduidade e pontualidade” (cfr. ponto 23 do probatório).
Os atrasos também não constituem o fundamento principal do relatório final do ato de aplicação da pena de aposentação compulsiva (cfr. ponto 23 do probatório), sendo a existência de atrasos registados nos relatórios dos serviços de segurança nele apenas referido como um facto adicional a considerar, e sendo a falta de assiduidade em virtude da falta de picagem de ponto o principal fundamento da aplicação da pena de aposentação compulsiva.
Ora, não pode manter-se na ordem jurídica uma sanção gravosa como é a aplicada nos autos, se apenas se evidencia a existência de atrasos ao serviço e inerente violação do dever de pontualidade, mas cai o seu principal fundamento, que é a existência de faltas e a inerente violação do dever de assiduidade. De facto, a manutenção de um ato desta índole destituído do seu principal fundamento implicaria até a violação do princípio da proporcionalidade.
Como se refere no douto aresto do Supremo Tribunal Administrativo que vem citado, “Tem de considerar-se que, para efeitos das finalidades da repressão disciplinar, e levando em linha de conta critérios de proporcionalidade e adequação, não é a mesma coisa o funcionário ter deixado em absoluto de comparecer ao serviço durante 10 dias, e ter-se ausentado apenas por 6, sendo que nos restantes 4 foi trabalhar, muito embora chegando atrasado (uma hora na parte da manhã e alguns minutos da parte da tarde). São factos que podem ser assimiláveis no que toca à sua qualificação como faltas injustificadas (e esse aspecto não está aqui em discussão, porque aparentemente o recorrido conformou-se com a injustificação de todas as faltas), mas que o não são do ponto de vista da valoração do seu comportamento com vista à aplicação duma sanção.
Essa diferente valoração não se mostra feita pelo acto impugnado, que por isso enferma da denunciada violação de lei (por erro de interpretação e aplicação do preceituado na al. h) do nº 1 do art. 26º do Estatuto, bem como no art. 3º, nºs 1, 4, 11 e 12).”
Procede, pois, o invocado vício de violação de lei, por erro de direito, na medida em que o ato impugnado se baseia na violação do dever de assiduidade.»
E quanto ao vício de violação de lei, por impedimento do relator, a sentença recorrida explanou o seguinte:
«d) Vício de violação de lei: impedimento do relator
O Autor invoca ainda que o ato de aplicação da sanção de aposentação compulsiva padece de um vício de violação de lei, na medida em que foi nomeado um relator impedido, contra o qual havia movido uma queixa-crime.
Em sentido contrário, invoca a Entidade Demandada que a participação crime a que alude o Autor foi presente ao Ministério Público não apenas contra o instrutor como contra o Presidente da Câmara Municipal, contra o Vice-presidente e contra todos os funcionários do departamento jurídico e contra o chefe da secção de pessoal, mas que nenhuma destas entidades foi constituída arguida, tendo o inquérito sido arquivado por despacho do Ministério Público de 26.05.2005.
Vejamos então.
O Autor invocou, na pendência do processo disciplinar que contra si correu, o justo impedimento do instrutor (cfr. ponto 17 do probatório), pelo facto de ter apresentado participação criminal contra o mesmo junto dos serviços do Ministério Público (cfr. ponto 18 do probatório). Tal incidente veio a ser indeferido pela Entidade Demandada, que motivou o indeferimento no facto de o instrutor não haver sido, à data, constituído arguido (cfr. ponto 19 do probatório).
Para se aferir da procedência do vício invocado, cumpre então determinar se a apresentação de uma denúncia por parte do Autor contra o instrutor do processo (cfr. pontos 17 e 18 do probatório) constitui motivo legalmente relevante para a invocada suspeição do instrutor.
Estabelece o art. 52.º, n.º 1, al. c), do Estatuto Disciplinar que, se estiver pendente em tribunal civil ou criminal processo em que o instrutor e o arguido ou o participante sejam partes, o arguido poderá deduzir a suspeição do instrutor do processo disciplinar.
Ficou demonstrado nos presentes autos que o Autor apresentou, junto dos serviços do Ministério Público, uma denúncia, entre outros, contra o instrutor (cfr. ponto 18 do probatório).
Nos termos do art. 48.º Código de Processo Penal (CPP), na versão à data dos factos, é o Ministério Público quem tem legitimidade para promover o processo penal, com as restrições constantes dos artigos 49.º a 52.º. Tais restrições dizem respeito às situações em que a promoção por parte do Ministério Público depende de queixa ou de acusação particular (cfr. arts. 49.º e 50.º), por estarem em causa crimes semipúblicos ou particulares.
Nos termos do art. 262.º, n.º 2, do CPP, “Ressalvadas as exceções previstas neste Código, a notícia de um crime dá sempre lugar à abertura de inquérito.”
Ora, a fase de inquérito é já uma fase do procedimento criminal, conforme decorre dos arts. 262.º e ss, inseridos no Título II do CPP. Nos termos do art. 262.º, n.º 1, do CPP, “O inquérito compreende o conjunto de diligências que visam investigar a existência de um crime, determinar os seus agentes e a responsabilidade deles e descobrir e recolher as provas, em ordem à decisão sobre a acusação”.
E tal fase finda com o arquivamento ou com a acusação, nos termos dos arts. 276.º e ss do CPC.
Assim sendo, ainda que, conforme alega a Entidade Demanda, à data da dedução do incidente de suspeição por parte do Autor (cfr. ponto 17 do probatório), o instrutor do processo não tivesse sido notificado de que tinha sido constituído arguido, a verdade é que se encontrava um procedimento disciplinar em curso, por força da denúncia apresentada pelo Autor.
Pelo que, à data da condução do procedimento disciplinar em causa, verificava-se o fundamento da suspeição do instrutor previsto no art. 52.º, n.º 1, al. c) do Estatuto Disciplinar, conforme vem aduzido pelo Autor.
À luz do que vem dito, há que proceder o invocado vício de violação de lei.»
3.4.2 No presente recurso o recorrente defende a validade do ato de 26/04/2005, afirmando louvar-se, para tanto, na fundamentação do acórdão do TAF de 31/07/2010 (vide conclusões 20ª a 22ª das alegações de recurso).
Mas se bem que relativamente ao vício de violação de lei por impedimento do relator o recorrente proceda à explanação dos argumentos pelos quais considera ter a sentença recorrida errado ao decidir pela sua verificação (vide conclusões 23ª a 27ª das alegações de recurso), assim já não acontece quanto ao vício de violação de lei por inexistência de violação do dever de assiduidade, não tendo o recorrente, quanto a este vício, concretizado, ao menos minimamente, em que termos, no seu entender, andou mal o tribunal a quo ao decidir pela sua verificação, limitando-se, apenas a remeter para a fundamentação do acórdão do TAF de 31/07/2010 (vide conclusões 20ª a 22ª das alegações de recurso). O que é manifestamente insuficiente, e não dá cumprimento ao ónus de impugnação da decisão jurisdicional recorrida, já que não enuncia, quanto a tal aspeto, o ou os vícios assacados à sentença (como o exige o artigo 144º nº 2 do CPTA).
3.4.3 Note-se que na fase de recurso o que importa é apreciar se a sentença proferida deve ser mantida, alterada ou revogada, circunscrevendo-se as questões a apreciar em sede de recurso, à luz das disposições conjugadas dos artigos 144º nº 2 do CPTA e 639º nº 1 e 635º do CPC novo (ex vi dos artigos 1º e 140º do CPTA), às que integram o objeto do recurso tal como o mesmo foi delimitado pelo recorrente nas suas alegações, mais concretamente nas suas respetivas conclusões (sem prejuízo das que sejam de conhecimento oficioso) e simultaneamente balizadas pelas questões que haviam já sido submetidas ao Tribunal a quo (vide, neste sentido António Santos Abrantes Geraldes, inRecursos no Novo Código de Processo Civil”, 2014, Almedina, págs. 27 e 88-90).
É que os recursos jurisdicionais são meios judiciais de refutar o acerto da decisão judicial, tendo o recorrente de alegar e concluir os fundamentos porque considera a decisão recorrida sofre dos vícios que lhe imputa e que conduzem à sua anulação ou revogação. Sendo pela alegação e conclusões que se fixa o conteúdo do recurso. Alegações em que a parte deverá expor as razões por que ataca a decisão recorrida e conclusões em que procederá à indicação resumida dos fundamentos por que pede a revogação, alteração ou a anulação da decisão recorrida (cfr. artigo 639º do CPC novo, correspondente ao anterior artigo 690º, ex vi dos artigos 1º e 140º do CPTA).
3.4.4 Ora, se o recorrente não impugna operativamente o julgamento de verificação do vício de violação de lei por inexistência de violação do dever de assiduidade feito na sentença recorrida, e que motivou (a par do outro identificado vício de violação de lei por impedimento do relator) a anulação do ato impugnado, emerge como infrutífero o recurso, já que terá que manter-se o julgamento de procedência do pedido impugnatório dirigido ao ato de 26/04/2005 com fundamento naquela causa de invalidade, mesmo que as demais se não verifiquem.
3.4.5 Sendo certo que no caso presente não há que fazer aplicar o nº 4 do artigo 146º do CPTA, que dispõe que “Quando o recorrente, na alegação de recurso contra sentença proferida em processo impugnatório, se tenha limitado a reafirmar os vícios imputados ao ato impugnado, sem formular conclusões ou sem que delas seja possível deduzir quais os concretos aspetos de facto que considera incorretamente julgados ou as normas jurídicas que considera terem sido violadas pelo tribunal recorrido, o relator deve convidá-lo a apresentar, completar ou esclarecer as conclusões formuladas, no prazo de 10 dias, sob pena de não se conhecer do recurso na parte afetada”.
É que o recorrente, por não ser o autor na ação, naturalmente não reafirmou os vícios imputados ao ato impugnado, hipótese que é a única prevista naquele normativo. E como dizem Mário Aroso de Almeida e Carlos Alberto Fernandes Cadilha in, “Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos”, Almedina, 2017, 4ª edição, pág. 1120, “a hipótese prevista no n.º 4 do presente artigo 146º tem um âmbito muito específico, que se circunscreve às situações em que, na alegação de recurso contra sentença proferida em processo impugnatório, o recorrente se limite a reafirmar os vícios imputados ao ato impugnado. Esta regra especial dirigiu-se a contrariar jurisprudência praticamente uniforme que entendia ser de julgar improcedente o recurso jurisdicional quando o recorrente, na sua alegação, se tivesse limitado a reeditar o alegado contra o ato impugnado, não imputando quaisquer vícios à decisão judicial recorrida, a qual tinha por base o argumento meramente formal de que o objeto do recurso jurisdicional era o acórdão recorrido e não o ato administrativo contenciosamente impugnado.
E sendo, como é, o recorrente a entidade demandada na ação, também nem sequer apresentou qualquer argumentação em defesa da inverificação daquela ilegalidade, mesmo que por repetição que fosse daquela que por si já havia sido aduzida em sede de ação.
3.4.6 O que tem como inevitável consequência a manutenção do julgamento de procedência do pedido de impugnação dirigido ao ato de 26/04/2005 com fundamento na verificação do vício de violação de lei por inexistência de violação, feito pela sentença recorrida, com a respetiva anulação.
Tornando-se por conseguinte inútil, porque infrutífera, a apreciação do erro de julgamento apontado à sentença recorrida no que tange ao juízo de verificação do vício de violação de lei por impedimento do relator, de que assim nos abstemos de conhecer. Isto porque em nada alteraria a decisão de anulação do ato proferida pela 1ª instância, nem produziria qualquer outra utilidade. Improcedendo, assim, o recurso.
***
IV. DECISÃO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo deste Tribunal em negar total provimento ao recurso, confirmando-se a sentença recorrida.
Custas pelo recorrente - artigo 527º nºs 1 e 2 do CPC novo (aprovado pela Lei nº 41/2013) e artigos 7º e 12º nº 2 do RCP (artigo 8º da Lei nº 7/2012, de 13 de fevereiro) e 189º nº 2 do CPTA.
Notifique.
D.N.
Porto, 1 de fevereiro de 2019
Ass. Helena Canelas
Ass. Isabel Costa
Ass. João Beato