Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:02064/11.2BEPRT
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:04/15/2021
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Rosário Pais
Descritores:AÇÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL; PROVA DO PREÇO EFETIVO; INFORMAÇÃO BANCÁRIA DOS ADMINISTRADORES
Sumário:I - A autorização de acesso à informação bancária prevista no artigo 139.º, n.º 6 do CIRC tem como única finalidade a comprovação do preço efetivo na transmissão de imóveis, no âmbito de procedimento aí previsto, com vista, a pedido e como garantia do contribuinte, a obviar à aplicação do disposto no artigo 64.º, n.º 2 do CIRC.

II - Obtida a autorização do sujeito passivo e dos seus administradores ou gerentes de acesso às suas contas bancárias no âmbito de um procedimento para os efeitos do artigo 139.º, n.º 6 do CIRC, essa informação bancária não pode ser utilizada pela Administração Tributária para outros fins que não os constantes do referido normativo, designadamente, para fundamentar correções efetuadas no âmbito de outro procedimento contra o mesmo sujeito passivo.

III - O n.º 6 do artigo 139.º do CIRC, no que respeita à obrigação de serem juntas, pelo sujeito passivo de IRC, para prova do preço efetivo ou real na transmissão de imóveis, declarações de administradores, concedendo autorização para aceder às respetivas informações bancárias, não padece de inconstitucionalidade material, por violação do princípio da tributação pelo lucro real e da igualdade tributária (artigos 104.º, n.º 1, da C.R.P., 3.º, n.º 1, a), e 17.º, n.º 1, do CIRC), do princípio da proporcionalidade (artigo 18.º n.º 2 da C.R.P.), do direito à reserva da intimidade da vida privada (artigo 26.º n.º 1 da C.R.P.) nem do direito de acesso ao direito e à tutela jurisdicional efetiva (artigos 20.º, n.ºs 1 e 4 e 104.º, n.º 1, da C.R.P.).*
* Sumário elaborado pela relatora
Recorrente:BANCO (...), S.A
Recorrido 1:Ministério das Finanças
Votação:Unanimidade
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Não emitiu parecer.
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Decisão Texto Integral:Acordam em conferência os Juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:
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1. RELATÓRIO

1.1. BANCO (...), S.A., devidamente identificado nos autos, interpôs recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, proferida em 31.03.2020, que julgou improcedente a ação administrativa especial deduzida contra a decisão que indeferiu o requerimento de prova do preço efetivo na transmissão do prédio inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Caldas da Rainha, sob o artigo (...), fração AF.

1.2. A Recorrente terminou as respetivas alegações formulando as seguintes conclusões:

«1.ª A douta sentença recorrida julgou improcedente a ação administrativa especial deduzida pelo ora Recorrente contra o despacho do Chefe do Serviço de Apoio às Comissões de Revisão (SACR), da Direção de Finanças do Porto, datado de 23.03.2011, exarado na Informação n.º 13/2011 daquele Serviço, notificado através do Ofício n.º 18509/0208, com a mesma data, o qual determinou o indeferimento do requerimento de prova do preço efetivo na transmissão de imóveis, apresentado pelo Autor, ora Recorrente, em 04.03.2011, nos termos do disposto no artigo 139.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (Código do IRC), com referência à alienação do prédio urbano sito na freguesia e concelho de Caldas da Rainha, inscrito na respetiva matriz predial urbana sob o artigo (...)-AF;
2.ª Não pode, todavia, proceder o entendimento da sentença recorrida;
3.ª Salvaguardando o devido respeito, considera o Recorrente que a sentença em apreço incorre em nulidade por omissão de pronúncia, erro de julgamento da matéria de direito e erro de julgamento da matéria de facto;
4.ª Com efeito, incorre desde logo em omissão de pronúncia pois na sentença recorrida não são apreciadas as seguintes inconstitucionalidades, tal como invocadas pelo Autor, ora Recorrente: i) violação do princípio do Estado de Direito e do princípio do acesso ao direito à tutela jurisdicional efetiva, previstos nos artigos 2.º, 20.º, n.º 1 e n.º 4 e 268.º, n.º 4, todos da CRP; e ii) violação do princípio da tributação das empresas pelo rendimento real, previsto no artigo 104.º, n.º 2, da CRP e violação do princípio da igualdade tributária, previsto nos artigos 104.º, n.º 1 e n.º 2, e no artigo 13.º todos da CRP – isto porque os Acórdãos do Tribunal Constitucional para os quais remete não abordaram estes princípios;
5.ª Em consequência, deverá o Tribunal ad quem conhecer em substituição as questões que o Tribunal a quo não apreciou (cf. artigo 665.º, n.º 2, do CPC, aplicável ex vi artigo 1.º do CPTA, na redação conferida pela Lei n.º 63/2011, de 14 de dezembro);
6.ª Verifica-se, em primeiro lugar, a violação dos princípios do Estado de Direito e do acesso ao direito e à tutela jurisdicional efetiva, visto que o efeito imediato da consagração do regime legal previsto no n.º 6 do artigo 139.º do Código do IRC é o de que o sujeito passivo, ainda que absolutamente convicto da razão que lhe assiste, se retraia no que respeita à utilização do expediente legal em causa, sob pena de sacrificar o seu direito à reserva da intimidade da vida privada;
7.ª Com efeito, o sujeito passivo depara-se, perante aquele n.º 6 do artigo 139.º do Código do IRC, com uma situação em que ou autoriza a derrogação do seu sigilo bancário e obtém de terceiros as autorizações relativas a essa derrogação ou se vê irremediavelmente privado de afastar a aplicação do disposto no n.º 2 do artigo 64.º do Código do IRC e, inclusive, de impugnar judicialmente a própria liquidação de imposto ou, se a este não houver lugar, as correções ao lucro tributável efetuadas por efeitos da aplicação do disposto no n.º 2 do artigo 64.º do Código do IRC;
8.ª Pelo que, não pode deixar de concluir-se, em sintonia com a jurisprudência firmada pelo TC no Acórdão n.º 442/2007, que o disposto no n.º 6 do artigo 139.º do Código do IRC origina que o sujeito passivo renuncie a “(…) um instrumento fundamental de tutela dos direitos (…)”, daí resultando uma evidente violação do princípio do Estado de Direito e do acesso ao direito e à tutela jurisdicional efetiva, a qual se materializa na decisão sub judice, que, por isso, deverá ser anulada com fundamento na violação das normas constantes dos artigos 2.º, 20.º, n.º 1 e n.º 4, e 268.º, n.º 4, todos da CRP;
9.ª Para além disso, a interpretação que do artigo 139.º, n.º 6, do Código do IRC faz a administração tributária no caso vertente ofende outros dois princípios, quais sejam, o da tributação das empresas pelo rendimento real vertido no artigo 104.º, n.º 2, da CRP e o da igualdade contributiva consagrado nos artigos 13.º e 104.º, n.º 1 e n.º 2, ambos da CRP;
10.ª Com efeito, a presunção, quer do rendimento, quer do próprio valor de alienação do imóvel a considerar para efeitos de determinação do rendimento tributável em IRC, apenas poderá ser admissível se consubstanciar uma presunção relativa, ou seja e in casu, se for, na prática, possível efetuar a demonstração do valor real e efetivo da transmissão, razão pela qual, não o sendo, ocorre, no entendimento do Recorrente e salvo melhor opinião, uma manifesta violação do princípio constitucional da tributação pelo rendimento real previsto no artigo 104.º, n.º 3, da CRP;
11.ª Sucede que, à luz da redação do mencionado anterior artigo 139.º, n.º 6, do Código do IRC dada pela Lei n.º 53-A/2006, de 29 de dezembro, e ora aplicada pela administração tributária, o legislador tributário veio tornar, na prática, inilidível a presunção de rendimento consagrada no artigo 64.º, enformando aquela norma, no entendimento do Recorrente, da inconstitucionalidade;
12.ª Efetivamente, a mencionada Lei n.º 53-A/2006, de 29 de dezembro, ao proceder ao aditamento ao artigo 139.º, n.º 6, do Código do IRC, da menção “(…) devendo para o efeito ser anexados os correspondentes documentos de autorização”, veio, na prática, converter o preço efetivo de alienação numa demonstração potencialmente impossível e, nessa medida, suscetível de violar, desde logo, não só o princípio da tributação pelo rendimento real, mas também, o princípio da igualdade contributiva;
13.ª Pelo que, em suma, o artigo 139.º, n.º 6, do Código do IRC, quando interpretado e aplicado da forma em que o fez a administração tributária no caso vertente, ou seja, no sentido de que a autorização de derrogação do sigilo bancário dos administradores ou gerentes constitui um requisito imprescindível ao afastamento da presunção de rendimento prevista no artigo 64.º do Código do IRC, padece de inconstitucionalidade por violação do princípio da tributação pelo rendimento real consagrado no artigo 104.º, n.º 2, da CRP e do princípio da igualdade contributiva, previsto, entre outros, nos artigos 13.º e 104.º, n.º 1 e n.º 2, ambos da CRP, impondo-se, também com esse fundamento, a imediata anulação do ato em crise;
14.ª A sentença recorrida incorre ainda em erro de julgamento sobre a matéria de direito devendo, por conseguinte, ser objeto de anulação;
15.ª No que concerne ao primeiro erro de julgamento sobre a matéria de direito, aquele respeita à invocada inconstitucionalidade do artigo 139.º, n.º 6, do Código do IRC por violação do princípio da reserva à intimidade da vida privada, ínsito no artigo 26, n.º 1, da CRP;
16.ª De facto, tal violação consubstancia-se, desde logo, na circunstância de o eventual acesso à informação bancária do sujeito passivo e dos seus administradores, como condição do deferimento do requerimento apresentado nos termos do artigo 139.º do Código do IRC, determinar o alargamento do núcleo de pessoas que tomam conhecimento de informações protegidas, relativas ao sujeito passivo – e até de terceiros –, sem que este último tenha à sua disposição qualquer garantia de defesa ou alternativa que não seja a de autorizar o levantamento do sigilo bancário;
17.ª Ora, muito embora se reconheça o direito do Estado a cobrar impostos, assim como o objetivo de combate à fraude e evasão fiscal, tal não pode restringir, sem mais, o direito à intimidade da vida privada, quer do sujeito passivo, quer dos terceiros envolvidos;
18.ª O legislador pretendeu consagrar, naquele n.º 6 do artigo 139.º do Código do IRC um regime especial de derrogação do sigilo bancário que visou exigir ao sujeito passivo a apresentação das autorizações para aceder à sua informação bancária e à dos seus administradores, renunciando voluntariamente ao sigilo bancário e providenciando pela renúncia voluntária ao mesmo sigilo de um terceiro, seu administrador à data da transmissão, não tendo, para esse efeito, acautelado minimamente a possível violação daquele direito à reserva da intimidade da vida privada;
19.ª Todavia, não pode justificar-se um levantamento, de forma leviana, do sigilo bancário, com a existência do sigilo fiscal, pois se assim fosse, então não se justificaria o sigilo bancário perante a administração tributária, o que seria, com o devido respeito, absurdo; não pode o Estado, in casu, a administração tributária, pretender conhecer detalhes sobre a vida pessoal dos seus cidadãos de modo absolutamente discricionário e arbitrário, como o que ora se escrutina;
20.ª Por outras palavras, a atuação da administração tributária deve, assim, ser balizada pelos princípios jurídico-constitucionais que se impõem e que protegem e garantem os direitos dos cidadãos/contribuintes, como seja o princípio da reserva da intimidade da vida privada;
21.ª Neste contexto, não é admissível o que se pretende com o n.º 6 do artigo 139.º do Código do IRC: sem a obtenção e apresentação das autorizações de derrogação do sigilo bancário – i.e., sem que o seu direito de reserva da intimidade da vida privada, e o de terceiros, seja violado – o sujeito passivo não pode, na prática, afastar a aplicação do disposto no n.º 2 do artigo 64.º do Código do IRC;
22.ª O princípio da reserva da intimidade da vida privada cobre igualmente uma esfera privada de ordem económica, como aquela que se manifesta através de dados bancários, também merecedora de tutela (cf. Acórdão do TC n.º 442/2007; JORGE LOPES DE SOUSA, BENJAMIN RODRIGUES e DIOGO LEITE DE CAMPOS, «Lei Geral Tributária – Comentada e Anotada», Encontro de Escrita, 2012, página 580);
23.ª A invocação de um qualquer interesse superior prevalecente sempre teria que ser fundamentada (cf. CLOTILDE CELORICO PALMA e ANTÓNIO CARLOS DOS SANTOS, «A derrogação do sigilo bancário para efeitos fiscais», Revista OTOC, n.º 146, maio de 2012, página 52);
24.ª A reserva da intimidade da vida privada constitui um direito extensível às próprias pessoas coletivas, bem como aos seus administradores, pessoas singulares (cf. ANTÓNIO MENEZES CORDEIRO, «Tratado de Direito Civil Português – I Parte Geral Tomo III Pessoas», 2.ª edição, 2007, Almedina, páginas 649-650);
25.ª O disposto no artigo 79.º do RGICSF em nada belisca o entendimento do Recorrente, pois, em primeiro lugar, o referido preceito não contempla a situação ora controvertida, mas ao invés, as situações em que as instituições de crédito poderão ter que revelar dados bancários dos seus clientes (e não relativos a si mesmas), e, em segundo lugar, as exceções ao dever de segredo aqui contempladas também não operam de forma automática, estando igualmente sujeitas às formalidades e condições impostas pela lei, nomeadamente, o artigo 63.º-B, da LGT;
26.ª Por fim, atente-se no teor do Acórdão do STA, de 09.03.2016, proferido no processo n.º 0820/15, em que foi Relatora ANA PAULA LOBO, em que se defendeu que a consulta da informação bancária não é um trâmite obrigatório do procedimento e há-de ser utilizado com a parcimónia que se impõe à Administração Tributária na sua relação com os contribuintes, de preservar a reserva da vida privada destes, acedendo à informação bancária, como a qualquer outra, que a estes diga respeito, sempre e só quando tal se revele necessário, bem como que a prova do preço efetivo pode ser feita através de qualquer meio, não podendo ser exigida a prova proveniente de terceiros que o sujeito passivo nem sequer controla;
27.ª Pelo que, é por demais evidente que o n.º 6 do artigo 139.º do Código do IRC, quando determina expressamente que apenas e só com a obtenção e apresentação das autorizações de derrogação do sigilo bancário – ou seja, que apenas através da violação do direito do sujeito passivo e de terceiros à reserva da intimidade da vida privada – será possível afastar a aplicação do disposto no n.º 2 do artigo 64.º do Código do IRC, incorre aquele em violação do direito à reserva da intimidade da vida privada, previsto no artigo 26.º, n.º 1, da CRP, o que se invoca para os devidos efeitos legais, razão pela qual a referida decisão deve ser anulada, com as demais consequências legais;
28.ª No que respeita à invocada inconstitucionalidade do artigo 139.º, n.º 6, do Código do IRC por violação do princípio da proporcionalidade, ínsito no artigo 18.º, n.º 2, da CRP, verifica-se, desde logo, uma colisão com aquele princípio, no que se refere às mencionadas vertentes da adequação e da necessidade porquanto, embora se reconheça que o eventual controlo e acesso à informação bancária do sujeito passivo poderá, em face do objetivo mediato de combate à evasão e à fraude fiscal que presidiu à consagração do regime legal previsto no artigo 139.º, justificar aquele acesso, já nada poderá justificar que o mesmo se concretize da forma leviana que resulta da aplicação do n.º 6 daquele preceito;
29.ª Existe, assim, uma manifesta desadequação dos meios em face dos fins a atingir, pois, não é aceitável que o exercício do direito consignado no artigo 139.º tenha como decorrência imediata o acesso à informação bancária do sujeito passivo e, fundamentalmente, de terceiros. Isto porque, a derrogação do sigilo bancário prevista naquele n.º 6 do artigo 139.º do Código do IRC pressupõe que o sujeito passivo voluntariamente renuncie ao carácter sigiloso da sua informação bancária e que providencie por essa renúncia de um terceiro, sob pena de não poder lançar mão do expediente legal que lhe permite afastar a aplicação do disposto no n.º 2 do artigo 64.º do Código do IRC;
30.ª Este atropelo desregrado das garantias de confidencialidade das informações bancárias do contribuinte, não sujeito a qualquer controlo de legalidade, afigura-se manifestamente desadequado e desnecessário e, por esse motivo, inteiramente desproporcional;
31.ª E nem sequer se invoque que o acesso à informação bancária do requerente e dos respetivos administradores é essencial ou imprescindível ou constitui o único meio de prova possível ou adequado para demonstrar qual foi o preço efetivo, pois, com efeito, é a própria administração tributária que vem referir, no Ofício-Circulado n.º 20.136, de 11 de março de 2009, da Direção de Serviços do IRC, que o acesso às informações bancárias do requerente e administradores não constitui “(…) uma prova absoluta de que o preço efetivamente praticado corresponde ao valor constante do contrato” (um caso concreto em que tal sucedeu, o Processo n.º 598/2017, do CAAD);
32.ª Pelo que, também por esta razão, se constata que o recurso àquele mecanismo se afigura manifestamente desadequado e desnecessário e, por esse motivo, inteiramente desproporcional;
33.ª A violação do princípio da proporcionalidade ocorre ainda, por fim, numa sua outra vertente, mais estrita, devido à circunstância de se exigir ao sujeito passivo que apresente, para efeitos da utilização do expediente previsto no artigo 139.º do Código do IRC, as autorizações de levantamento do sigilo bancário relativo a terceiros, quais sejam, os seus administradores, visto que não está sequer na sua esfera de decisão e de poderes o de autorizar o acesso à informação bancária daqueles administradores;
34.ª Neste contexto, o direito de cobrar impostos e os especiais objetivos de combate à fraude e à evasão fiscal que a consagração de uma norma do tipo da prevista naquele n.º 6 do artigo 139.º do Código do IRC pretendem assegurar não podem, em circunstância alguma, sobrepor-se aos direitos acima referidos, congregados no direito à confidencialidade das suas informações bancárias, pelo menos da forma como essa sobreposição vem consagrada na referida norma, sob pena de manifesta violação do princípio da proporcionalidade, constante do artigo 18.º, n.º 2, da CRP, o que se invoca para os devidos efeitos legais, devendo anular-se a sentença recorrida, com as demais consequências legais;
35.ª Na eventualidade de o invocado vício de nulidade por omissão de pronúncia não proceder, no que não se concede e apenas por cautela de patrocínio se equaciona, então sempre terá de ser suscitado e apreciado nos presentes autos o erro de julgamento de direito no que concerne à apreciação da inconstitucionalidade do artigo 139.º, n.º 6, do Código do IRC por violação dos princípios do Estado de Direito, do acesso ao direito à tutela jurisdicional efetiva, da tributação das empresas pelo rendimento real e da igualdade tributária;
36.ª A este respeito, remete-se, para os devidos efeitos legais, para as considerações tecidas supra no âmbito da nulidade por omissão de pronúncia (cf. Ponto II – a), das presentes alegações de recurso) e para o exposto nos artigos 55.º a 63.º e 91.º a 115.º da p.i. e nas alegações escritas, os quais aqui se dão por integralmente reproduzidos, nos termos do qual não pode deixar de concluir-se que:
37.ª o disposto no n.º 6 do artigo 139.º do Código do IRC origina que o sujeito passivo renuncie a “ (…) um instrumento fundamental de tutela dos direitos (…) ”, daí resultando uma evidente violação do princípio do Estado de Direito e do acesso ao direito e à tutela jurisdicional efetiva, o que se invoca para os devidos efeitos e se materializa no ato sub judice, que, por isso, deverá ser anulado com fundamento na violação das normas constantes dos artigos 2.º, 20.º, n.º 1 e n.º 4, e 268.º, n.º 4, todos da CRP; e
38.ª o artigo 139.º, n.º 6, do Código do IRC, quando interpretado e aplicado da forma em que o fez a administração tributária no caso vertente, ou seja, no sentido de que a autorização de derrogação do sigilo bancário dos administradores ou gerentes constitui um requisito imprescindível ao afastamento da presunção de rendimento prevista no artigo 64.º do Código do IRC, padece de inconstitucionalidade por violação do princípio da tributação pelo rendimento real consagrado no artigo 104.º, n.º 2, da CRP e do princípio da igualdade contributiva, previsto, entre outros, nos artigos 13.º e 104.º, n.º 1 e n.º 2, ambos da CRP, o que se invoca para os devidos efeitos legais, daí resultando, também com esse fundamento, a ilegalidade do ato em crise, razão pela qual se requer a sua imediata anulação;
39.ª Caso não se entenda verificadas as enunciadas inconstitucionalidades, o que apenas por cautela e dever de patrocínio se concebe, sem conceder, ainda assim o ato em crise infringiu o disposto no artigo 63.º - B da LGT, pelo que padece, igualmente, a sentença recorrida de erro de julgamento sobre a matéria de direito;
40.ª Isto porque, estabelecendo a referida norma os limites até aos quais o legislador ordinário entendeu que o regime da derrogação do sigilo bancário por razões de ordem fiscal estaria conforme com os princípios e direitos constitucionais, nomeadamente, restringindo aquele acesso, mesmo quando o sujeito passivo não dê o seu consentimento, às situações em que haja indícios concretos da prática de um crime fiscal ou da falta de veracidade do declarado e exigindo a autorização judicial prévia nos casos de derrogação do sigilo bancário de terceiros, é por demais evidente que a previsão e aplicação daquele n.º 6 do artigo 139.º do Código do IRC, tal como preconizado pela administração tributária na situação sub judice, extravasou, e muito, os princípios e os limites implícitos no artigo 63.º-B, da LGT;
41.ª Com efeito, não constituindo os factos tributários a apreciar no âmbito do procedimento desencadeado ao abrigo do disposto no artigo 139.º do Código do IRC uma situação que exija um especial controlo por parte da administração tributária, nomeadamente mais apertado do que aquele se verifica, por exemplo, com referência a uma situação de apuramento da matéria coletável através de métodos indiretos, a qual se rege pelas regras previstas naquele artigo 63.º-B da LGT, nada justifica, também, que o acesso às informações bancárias do sujeito passivo e dos terceiros se processe, no âmbito daquele artigo 139.º, ao arrepio das regras e dos princípios constantes do artigo 63.º-B da LGT;
42.ª Fica, assim, demonstrada, também por este motivo, a ilegalidade do disposto no n.º 6 do artigo 139.º do Código do IRC e, nessa medida, do ato sub judice;
43.ª Sem prejuízo de todo o acima exposto e numa tentativa, que o Recorrente crê que vã, de se interpretar o disposto no n.º 6 do artigo 139.º do Código do IRC em conformidade com todos os princípios e normas acima invocados, a única exegese possível do preceito só seria a de se aceitar a eventual exigibilidade da autorização para levantamento do sigilo bancário após a verificação, por parte da administração tributária, da existência de fundamentos concretos que justificassem a análise da informação bancária;
44.ª Nunca quando, como no caso vertente, aquele acesso seja concretizado através de uma exigência “cega” e não justificada, consubstanciada na obrigatoriedade de apresentação das autorizações de levantamento de sigilo bancário em qualquer circunstância;
45.ª Com efeito, a Lei sempre exige, caso o sujeito passivo não o faça voluntariamente, um ato decisório do Tribunal ou, atualmente, da administração tributária, que determine a derrogação do sigilo bancário;
46.ª O entendimento aqui propugnado pelo Recorrente foi inclusive o já adotado, designadamente, no Acórdão Arbitral proferido no Processo n.º 371/2017, de 06.06.2018;
47.ª Pelo que a administração tributária, ao exigir a apresentação das autorizações de derrogação do sigilo bancário noutros termos que não os expostos – e que consubstanciam, insista-se, a única interpretação daquele n.º 6 do artigo 139.º do Código do IRC, suscetível de não violar os princípios consignados na CRP e no artigo 63.º-B da LGT – faz inquinar de manifesta ilegalidade o ato sub judice, o qual deve, também com esse fundamento, ser imediatamente anulado;
48.ª Sem prejuízo, nos presentes autos, ficou evidenciada a verificação de todos os demais pressupostos de facto e de direito justificativos do pedido de prova de preço efetivo apresentado pelo Autor, ora Recorrente, nos termos do disposto no artigo 139.º do Código do IRC, pelo que ao decidir pela manutenção de tal decisão na ordem jurídica, incorreu o Tribunal a quo em erro de julgamento sobre a matéria de facto;
49.ª De facto, o Recorrente juntou aos presentes autos a cópia da escritura pública de compra e venda referente à aquisição em questão, bem como do documento comprovativo do recebimento do preço total declarado naquela e da autorização de acesso à sua informação bancária [cf. factos 1), 2) e 3) da fundamentação de facto da sentença recorrida, em especial, consultar a documentação anexa ao requerimento de prova do preço efetivo apresentado em 04.03.2011 que integra o processo administrativo instrutor], os quais demonstram inequivocamente, que, por um lado, aquele foi o preço pelo qual o Recorrente transmitiu o imóvel em questão e que, por outro lado, o mesmo foi praticado por um montante inferior ao valor patrimonial tributário apurado pela administração tributária;
50.ª Assim, encontra-se no caso sub judice demonstrado e comprovado o preço efetivo de transmissão do imóvel em apreço, sem ser necessária a produção de qualquer prova adicional, pelo que, deve, pois, inequivocamente, o requerimento de prova de preço efetivo em questão ser deferido para efeitos da validação dos montantes declarados pelo Recorrente, com referencia à transmissão do imóvel em causa, na declaração modelo 22 referente ao exercício de 2009, devendo, ainda, a sentença recorrida ser anulada, julgando-se a presente ação administrativa especial procedente.
Por todo o exposto, e o mais que o ilustrado juízo desse Tribunal suprirá, deve o presente recurso ser julgado procedente, por provado, com a consequente revogação da sentença recorrida e, nessa medida, a anulação do ato em crise nos termos peticionados, assim se cumprindo com o DIREITO e a JUSTIÇA!».

1.3. A Autoridade Tributária e Aduaneira apresentou contra-alegações, que findou com as seguintes conclusões:

A) O A., vem intentar ação administrativa especial, deduzindo um pedido de anulação da decisão de indeferimento do requerimento de prova do preço efetivo na transmissão de imóveis, apresentado nos termos do Art.º 139.º do CIRC, e, cumulativamente, um pedido de condenação à prática de ato administrativo devido, em substituição, do ato praticado.
B) Contestando e alegando na ação veio a AT., defender que esse pedido não poderia ser apreciado face ao incumprimento com o disposto no art.º 139.º/6, do Código do Imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas.
C) O TAF do Porto, acolhendo as teses da Ré AT., atendendo a que os documentos de autorização de acesso à informação bancária dos administradores do Autor, enquanto requisito legal para a instauração do mecanismo previsto no artigo 139.º do C.I.R.C. e não tendo os mesmos sido apresentados, decidiu pela improcedência da ação e pelo não provimento de nenhum dos pedidos deduzidos pelo A..
Mas, o Autor,
D) discorda e considera que a Sentença padece de nulidade por omissão de pronúncia, de erro de julgamento em matéria de direito e de erro de julgamento da matéria de facto, no entanto, sem razão.
Na verdade,
E) a Sentença debruça-se alongadamente sobre o regime do art.º 139.º do CIRC., designadamente onde faz uma análise detalhada do regime e da sucessão da lei no tempo, e onde conclui que estamos perante norma procedimental.
F) Ainda a págs. 12, a Sentença recorrida debruça-se sobre a questão da inconstitucionalidade de norma suscitada pelo A., e em nada perturba essa análise o facto de ter em seu auxílio convocado a Jurisprudência do Tribunal Constitucional, no Acórdão n.º 145/2014, de 14/02/2014 (Proc. n.º 521/13), e onde a exigência das declarações de levantamento do sigilo bancário, como requisito do pedido de prova de preço efetivo foi julgada não inconstitucional, sendo claro que toda a análise fundamentação foram, por essa via acolhidas pela decisão.
G) Revelando-se, portanto, destituída de fundamento esta alegação.
H) E não existe qualquer erro de julgamento, quer em matéria de direito, quer em matéria de facto, sendo logo de dizer que anda bem a Sentença quando julga que o n.º 6 do art.º 139.º, do CIRC., não viola o princípio da reserva da vida privada, porquanto, por via da presunção prevista no Art.º 64.º do CIRC, é ao contribuinte que cumpre efetuar a prova de que o preço declarado é o preço efetivo da transmissão do imóvel.
I) Acresce que, no caso presente, a derrogação de sigilo bancário não é uma condição de acesso à via judicial.
J) É que não estamos aqui perante uma derrogação de sigilo bancário de iniciativa da Autoridade Tributária mas sim da iniciativa do contribuinte, se este pretender ilidir a presunção ínsita no Art.º 64.º do CIRC, não se tratando, portanto, de uma derrogação de sigilo bancário imposta ao contribuinte, mas, sim, de um ato voluntário daquele, no intuito de afastar a presunção de rendimento tributável que sobre ele impende, pelo que improcedem liminarmente os argumentos aduzidos pelo A..
K) Em boa verdade, a proteção constitucional da reserva da vida privada, ao nível dos direitos liberdades e garantias fundamentais, só tem razão de ser na medida em que o acesso a dados bancários pode revelar as escolhas, os gostos e o estilo de vida do indivíduo e do seu perfil enquanto ser humano, encontrando-se tal finalidade ligada à proteção da dignidade humana e daí que não se estenda às entidades coletivas que atuam limitadas pelo princípio da especialidade do fim que prosseguem e que, assim, não têm a possibilidade de se autodeterminarem livremente.
L) Já quanto aos administradores ou gerentes do A., mesmo que se considere que o direito ao segredo bancário é um direito fundamental e que está abrangido pela reserva de intimidade da vida privada – o que não é líquido, veja-se, neste sentido, o voto de vencido do Exmo. Conselheiro Gil Galvão no Acórdão n.º 442/07, de 07.08.14, do Tribunal Constitucional – facto é que o segredo bancário não pode ser abrangido pela tutela constitucional da reserva à intimidade da vida privada nos mesmos termos de outras áreas da vida pessoal.
M) Como refere Saldanha Sanches2 «O primeiro ponto que deve ser considerado ao tratarmos do segredo bancário e do segredo fiscal é o de que não estamos perante aquilo que a constituição tutela como “reserva da intimidade da vida privada e familiar”, ou seja aquele núcleo central de características e comportamentos de natureza pessoal (maxime sexual e familiar) que a lei deverá proteger para proporcionar “garantias efectivas contra a utilização abusiva ou contrária à dignidade humana» (n.º 1 e n.º 2 do artigo 26.º da CRP).»
Isto é,
N) estamos perante dados de natureza patrimonial (rendimentos, aquisições, alienações) que podem respeitar à esfera de privacidade, mas não da intimidade da vida privada, conforme se refere no próprio Acórdão n.º 442/2007 do Tribunal Constitucional, o segredo bancário situa-se no âmbito da vida de relação, fora da esfera mais estrita da vida pessoal, daí que ocupe uma zona de periferia, com uma necessidade de menor tutela e mais complacente com restrições advindas da necessidade de acolhimento de outros valores e interesses contrastantes.
O) Acresce que a informação bancária disponibilizada à AT., está protegida por um dever de sigilo o sigilo fiscal - cuja violação é tipificada como crime de violação de segredo profissional (cfr. artigos. 62.º da LGT, 91.º do RGIT e 195.º e 383.º, ambos do Código Penal).
P) E tomando ainda em linha de conta a Jurisprudência firmada no Acórdão n.º 442/2007, do Tribunal Constitucional pode-se dizer que se a lesão do bem jurídico – o direito da reserva à intimidade da vida privada – se tem por muito diminuta em caso de quebra do sigilo bancário por iniciativa da Autoridade Tributária, forçosamente se deve considerar inexistente quando por iniciativa do contribuinte, como é o caso do n.º 6 do Art.º 139.º do CIRC..
Q) Acresce ainda o facto de o sacrifício desse bem se justificar pelos interesses superiores, de natureza pública, que a Administração Fiscal visa atingir através da derrogação do sigilo bancário tal como se decidiu no Acórdão do Tribunal Constitucional nº 442/07, atrás referido «Atendendo ao peso relativo dos interesses aqui ligados à tutela da privacidade e ao diminuto grau da sua afectação, em concreto, pelo levantamento do sigilo bancário, por um lado, e à intensidade da exigência de efectivação da justiça fiscal, por outro, pode concluir-se que, em certas condições, é constitucionalmente legítima a restrição, com este fundamento, do direito à privacidade.»
R) Não se verifica, portanto, qualquer violação do direito à reserva da intimidade da vida privada pelo art.º 139.º/6, do CIRC., face ao disposto no art.º 26.º da CRP..
S) E são esses dados relativos às contas bancárias e aos seus movimentos (ou à aquisição de um bem sujeito a registo como o prédio ou um automóvel) que permitem o controlo da declaração tributária do sujeito passivo e que constituem condição “sine qua non” de um controlo eficaz na fase atual da evolução da relação jurídico tributária.
T) Não fazem nenhum sentido as alegações atinentes à restrição da tutela jurisdicional e fetiva, pois que não existe sequer praticado qualquer ato lesivo.
U) Não podendo invocar o R., de modo algum, a perda de acesso a uma tutela jurisdicional efetiva, como é óbvio, face ao disposto no n.º 7 do Art.º 139.º do CIRC, impõe-se concluir pela constitucionalidade, quando confrontado com o princípio do Estado de Direito e do acesso à tutela jurisdicional efetiva.
V) Também não se verifica qualquer violação do princípio da proporcionalidade estando abundantemente demonstrada a verificação das suas vertentes da adequação, necessidade e da proibição do excesso.
W) Subjacente ao princípio da proporcionalidade está, “in casu”, a tensão dialéctica entre o combate à evasão e à fraude fiscal – que o A. reconhece como “ratio legis” do Art.º 64.º do CIRC – e a autorização da derrogação de sigilo bancário por parte do sujeito passivo e seus administradores.
X) E a autorização de acesso à informação bancária constitui uma medida adequada à obtenção da verdade material que porventura possa estar oculta pelo sigilo bancário, pelo que, considerando o legislador que o dever fundamental de pagar impostos está posto em causa – ratio do disposto no Art.º 64.º do CIRC –, face a uma alienação de imóvel que sai necessariamente dos padrões de normalidade da atividade económica, torna-se evidente a adequação da medida face ao fim visado.
Y) A necessidade prende-se com pertinência da obtenção dos dados bancários para a decisão da AT., e até para a elisão da presunção do art.º 64.º, do IRC., e está observada a proibição do excesso, até porque o acesso à informação está dependente da autorização prévia.
Z) E não se verifica qualquer violação da capacidade contributiva, pois que o A., não só não concedeu acesso à informação bancária dos seus administradores, como também não efetuou qualquer prova, ou sequer solicitou qualquer diligência, no sentido de, por exemplo, demonstrar que os custos de construção foram inferiores aos fixados na portaria a que se refere o n.º 3 do art.º 62.º do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI), como dispõe o n.º 2, do art.º 139.º do CIRC., obstaculizando a uma clara revelação dessa capacidade contributiva.
AA) O ato em crise nos autos não infringiu o disposto no art.º 63.º-B, da LGT., porque desde logo, o âmbito de aplicação material do art.º 63.º-B da LGT, é tão somente as derrogações de sigilo bancário promovidas por iniciativa da Autoridade Tributária e não as autorizações voluntárias de acesso a informação bancária, como é o caso regulado pelo n.º 6 do Art.º 139.º do CIRC..
BB) E ainda que por hipótese se entendesse que o âmbito de aplicação material das duas normas era coincidente, ter-se-ia de considerar que o n.º 6 do Art.º 139.º do CIRC constituía uma norma especial face ao regime estatuído no Art.º 63.º-B da LGT, pelo que nunca existiria uma violação deste regime, como o A. pretende fazer crer. – cfr. n.º 3 do artigo 7.º do Código Civil.
CC) Mesmo que não existisse essa relação de especialidade, o art.º 63.º-B da LGT, sempre teria de se considerar parcialmente derrogado, visto a norma do art.º 139.º/6, do CIRC, ser posterior ao aí estabelecido.
DD) Assim, o âmbito de material de aplicação das duas normas não se confunde, pois, cumpre relembrar o A., que, na redação que foi dada ao n.º 2 do artigo 63.º-B da LGT, pela Lei n.º 94/2009, de 1 de setembro: «A administração tributária, tem, ainda, o poder de aceder diretamente aos documentos bancários, nas situações de recusa da sua exibição ou de autorização para a sua consulta, quando se trate de familiares ou terceiros que se encontrem numa relação especial com o contribuinte.»
EE) cumpre sublinhar que se os limites definidos no art.º 63.º-B da LGT e os princípios que lhe estão subjacentes, devem ser tidos como o parâmetro de legalidade de qualquer norma que, como o n.º 6 do Art.º 139.º do CIRC, discipline o acesso a informações bancárias em matéria tributária, então, não poderá deixar de ser reconhecida a legalidade desta última e, nessa medida, da própria decisão em crise.
FF) não pode o Tribunal substituir a decisão de indeferimento emitida pela Autoridade Tributária, «por outra que defira o pedido de prova do preço efectivo apresentado pela ora Autora com referência à transmissão do imóvel […]» – conforme o pedido formulado pelo A. –, sob pena de violação do art.º 71.º/2, do CPTA., que determina que, quando a emissão do ato pretendido envolva a formulação de valorações próprias do exercício da função administrativa e a apreciação do caso concreto não permita identificar apenas uma solução como legalmente possível, o tribunal não pode determinar o conteúdo do ato a praticar, mas deve explicitar as vinculações a observar pela Administração na emissão do ato devido, e, ainda, do princípio de separação de poderes, conforme previsto no n.º 1 do Art.º 111.º da CRP..
GG) E é por tudo o quanto se deixa expresso que, quando se observa a Sentença e se confronta com os autos, resulta manifesto que não existe qualquer omissão de pronúncia, erro de julgamento em matéria de direito ou em matéria de facto.

Nestes termos e nos melhores de Direito, sempre com o douto suprimento de V. Ex.ªs, deverá ser a Sentença recorrida ser mantida vigente na ordem jurídica por não padecer de qualquer dos vícios que lhe são apontados e a presente ação ser julgada improcedente absolvendo-se a Ré de todos os pedidos, com o que se fará a Sã, Serena e Costumada Justiça.».

1.4. A Meritíssima Juíza a quo sanou a nulidade invocada pela Recorrente, através da “Sentença” de pp. 419-437.

1.5. Notificada desta decisão, por requerimento de pp. 450-457 a Recorrente reiterou a sua intenção de manter o recurso interposto em 20.04.2020, e rematou com as seguintes conclusões:

«1.ª A douta sentença recorrida de 31.03.2020 julgou improcedente a ação administrativa especial deduzida pelo ora Recorrente contra o Despacho do Chefe do SACR, da Direção de Finanças do Porto, datado de 23.03.2011, exarado na Informação n.º 13/2011 daquele Serviço, notificado através do Ofício n.º 18509/0208, com a mesma data;
2.ª Não se conformando com o teor da sentença recorrida, o Recorrente interpôs recurso jurisdicional para a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte, através do qual alegou, entre outros fundamentos, a nulidade da sentença por omissão de pronúncia, no que respeita à violação do Princípio do Estado de Direito e do Princípio do acesso ao direito e à tutela jurisdicional efetiva, previstos nos artigos 2.º, 20.º, n.º 1 e n.º 4 e 268.º, n.º 4, todos da CRP e violação do Princípio da tributação das empresas pelo rendimento real, previsto no artigo 104.º, n.º 2, da CRP e violação do Princípio da igualdade tributária, previsto nos artigos 104.º, n.º 1 e n.º 2, e no artigo 13.º todos da CRP;
3.ª O Tribunal a quo pronunciou-se quanto às nulidades invocadas, através da sentença retificativa de 13.07.2020, ao abrigo dos artigos 145.º, do CPTA e 617.º, n.º 1, do CPC, aplicável ex vi artigo 1.º, do CPTA, tendo notificado o Recorrente como se de uma nova sentença se tratasse, ao invés de as suprir no despacho em que se pronunciava quanto à admissão do recurso interposto, o qual seria parte integrante da sentença recorrida ao abrigo do artigo 617.º, n.º 2, do CPC, aplicável ex vi do artigo 1.º do CPTA (cf. Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, de 23.04.20, proferido no Âmbito do processo n.º 3049/19.6T8STR-A.E1 e Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 13.02.2020, proferido no âmbito do processo n.º 565/18.0BEBJA-R1).;
4.ª Com efeito, o Tribunal a quo incorreu em omissão de pronúncia ao abrigo do artigo 615.º, n.º 1, alínea d) do CPC, aplicável ex vi do artigo 1.º, do CPTA;
5.ª Adicionalmente, apesar de o Recorrente não ter sido notificado nos termos dos artigos 617.º, números 2 e 3 do CPC e como não existe o referido despacho, considera-se a sentença retificativa como complemento e parte integrante da sentença recorrida, nos termos do artigo 617.º, n.º 2, do CPC, pelo que p Recorrente reitera a sua intenção em manter o recurso previamente interposto em 20.04.20, cujo conteúdo se dá aqui por integralmente reproduzido, no que respeita à nulidade por omissão de pronúncia, relativamente ao Princípio do Estado de Direito e do Princípio do acesso ao direito e à tutela jurisdicional efetiva e ao erro de julgamento da matéria de facto e de direito;
6.ª Em face do exposto nas alegações de recurso, resulta inequivocamente provado que a ação administrativa apresentada pelo Autor, ora Recorrente deve proceder, devendo por isso a sentença recorrida ser anulada.

Por todo o exposto, e o mais que ilustrado juízo desse Tribunal suprirá, reitera-se que se mantém o defendido no recurso apresentado em 20.04.20, pelo que deve ser julgado procedente, por provado, com a consequente revogação da sentença recorrida e, nessa medida, a anulação do ato em crise nos termos peticionados, assim se cumprindo com o DIREITO e a JUSTIÇA!».

1.6. A Recorrida manteve e reiterou as contra-alegações oportunamente apresentadas.

1.7. O Ministério Público junto deste Tribunal teve vista dos autos.

Dispensados os vistos legais, nos termos do artigo 657.º, n.º 4, do CPC, cumpre apreciar e decidir pois que a tanto nada obsta.

2. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR

Uma vez que o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações da Recorrente, cumpre apreciar e decidir se a sentença recorrida é nula por omissão de pronúncia e se enferma de erro de julgamento de direito e de facto, conforme alegado pela Recorrente.

3. FUNDAMENTAÇÃO
3.1. DE FACTO

A sentença recorrida contém a seguinte fundamentação de facto:
«Com relevância para a decisão a proferir nos presentes autos, consideram-se provados os seguintes factos:
1. Em 3.04.2009 foi outorgada escritura de compra e venda do imóvel inscrito na matriz predial urbana da freguesia das Caldas da Rainha, sob o artigo (...), fracção AF entre C. em representação do BANCO (...) SA e A. em representação da sociedade O., SA – cfr. fls. 7 a 11 do processo administrativo (PA) junto aos autos.
2. Em 3.04.2009 foi emitido o cheque n.º 1833497497 no valor de €111.580,00 – cfr. fls. 12 do PA junto aos autos.
3. Em 7.03.2011, o BANCO (...), SA apresentou junto do Director de Finanças do Porto requerimento solicitando o afastamento do disposto no n.º 2 do artigo 64.º do CIRC relativamente ao prédio inscrito na matriz predial urbana da freguesia das Caldas da Rainha, sob o artigo (...), fração AF – cfr. fls. 1 a 4 do PA junto aos autos.
4. Em 9.03.2011 o Serviço de Apoio às Comissões de Revisão da Direcção de Finanças do Porto remeteu ao BPI, SA o ofício n.º 15326/0208 de onde decorre o seguinte “(…) ficam (…) desta forma notificados para (…) suprir a falta sob pena do pedido ser liminarmente rejeitado e mando arquivar por falta de requisitos legais” – cfr. fls. 14 do PA junto aos autos.
5. Pelo Serviço de Apoio às Comissões de Revisão da Direcção de Finanças do Porto foi exarada a informação n.º 13/2011 no sentido do indeferimento do pedido formulado em 3. – cfr. fls. 19 a 21 do PA junto aos autos.
6. Em 3.05.2011 foi proferido despacho pelo Chefe do Serviço de Apoio às Comissões de Revisão da Direcção de Finanças do Porto com o seguinte teor: “Concordo com a informação e o parecer infra. Com base nos fundamentos na mesma expressos, indefiro o pedido de revisão, por falta de requisitos legais. (…)” - cfr. fls. 19 do PA junto aos autos.
7. Em 23.04.2011 o Serviço de Apoio às Comissões de Revisão da Direcção de Finanças do Porto remeteu ao BPI SA o ofício n.º 18509/0208, comunicando-lhe o despacho a que se alude em 6. – cfr. fls. 22 e 23 do PA junto aos autos.
**
Não se mostram provados outros factos, além dos supra referidos.».


3.2. De Direito

3.2.1. Da nulidade por omissão de pronúncia

A Recorrente começa por arguir a nulidade da sentença recorrida porquanto, na sua ótica, pese embora a decisão de 13.07.2020, persiste omissão de pronúncia relativamente às arguidas inconstitucionalidades por violação dos princípios do Estado de Direito e do acesso ao direito e à tutela jurisdicional efetiva.

Vejamos se assim é, atentando, desde logo, no teor do mencionado despacho, o qual, como dele expressamente resulta, foi proferido ao abrigo do disposto no artigo 617.º do CPC:
«(…)
Compulsados os autos, constata-se que o Autor veio apresentar AAE, sustentando a violação do princípio do direito à reserva sobre a intimidade da vida privada, do princípio da proporcionalidade, do princípio do Estado de Direito e do princípio do acesso ao direito à tutela jurisdicional efetiva, do princípio da tributação das empresas pelo rendimento real e da igualdade tributária.
Ora, atendendo ao decidido pelo TC no Acórdão 517/2015, proc. 418/2013, o Tribunal, porque aplicável ao caso sob apreciação, chamou à colação o aí decidido relativamente à violação do princípio do direito à reserva sobre a intimidade da vida privada, do princípio da proporcionalidade, do princípio do Estado de Direito e do princípio do acesso ao direito à tutela jurisdicional efetiva, do princípio da tributação das empresas pelo rendimento real e da igualdade tributária.
Quanto à violação do princípio do Estado de Direito e do princípio do acesso ao direito à tutela jurisdicional efetiva e contrariamente ao invocado pelo A., o sobredito Acórdão apreciou e decidiu tal questão.
Com efeito e relativamente à alegada violação dos artigos 2.º, 20.º n.º 1 e n.º 4 e 268.º, n.º 4, todos da Constituição da República Portuguesa, definindo o objecto do recurso refere o mesmo Acórdão que: “Em concordância, finaliza a recorrente referindo que “[e]m suma, a derrogação do sigilo bancário nos moldes previstos no n.º 6 do artigo 139.º, ao constituir uma condição prejudicial do acesso ao direito de produção de prova nele previsto e da impugnação da respetiva liquidação, constitui uma restrição ao exercício efetivo do direito de acesso à justiça desajustada e desproporcionada (…)”. Nestes termos, o objeto do presente recurso de constitucionalidade corresponde ao segmento normativo, extraível do n.º 6 do artigo 129.º, do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas, na redação introduzida pela Lei n.º 53-A/2006, de 29 de dezembro – que corresponde, sem alterações relevantes, à norma plasmada no atual n.º 6 do artigo 139.º, do CIRC (a referida expressamente pelo recorrente no seu requerimento), resultante da renumeração e republicação operada pelo Decreto-Lei n.º 159/2009, de 13 de julho – que exige que o pedido de demonstração do preço efetivo na transmissão de direitos reais sobre bens imóveis, previsto em tal preceito, seja instruído com os documentos de autorização de acesso, por parte da administração fiscal, à informação bancária do requerente e dos seus administradores ou gerentes, referente ao exercício em que ocorreu a transmissão e ao exercício anterior
Assim, a violação do princípio do Estado de Direito e do princípio do acesso ao direito à tutela jurisdicional efectiva é desde logo identificada pelo TC como sendo questão a apreciar.
Ademais, na análise da sobredita questão decidiu-se naquele Aresto que “Relativamente à alegada violação dos artigos 20.º e 268.º, n.º 4, da Constituição, refere o mesmo acórdão: “(…) interessa ponderar (…) se o regime de derrogação do sigilo bancário previsto no n.º 6 do artigo 129º satisfaz as exigências garantísticas do procedimento e do processo administrativo (tomando como assente que o direito ao processo equitativo consagrado no artigo 20º, n.º 4, da Constituição se deve considerar extensivo ao próprio procedimento). Como o Tribunal Constitucional tem repetidamente sublinhado, o direito de acesso aos tribunais é, entre o mais, o direito a uma solução jurídica dos conflitos a que se deve chegar em prazo razoável e com observância das garantias de imparcialidade e independência, mediante o correto funcionamento das regras do contraditório (acórdão n.º 86/88, publicado nos Acórdãos do Tribunal Constitucional, vol. 11º, pág. 741). Como concretização prática do princípio do processo equitativo e corolário do princípio da igualdade, o direito ao contraditório, por seu lado, traduz-se essencialmente na possibilidade concedida a cada uma das partes de “deduzir as suas razões (de facto e de direito)”, de “oferecer as suas provas”, de “controlar as provas do adversário” e de “discretear sobre o valor e resultados de umas e outras” (entre muitos outros, o acórdão n.º 1193/96). Importa reter, no entanto, que o legislador dispõe de uma ampla margem de liberdade na concreta modelação do processo, cabendo-lhe designadamente ponderar os diversos direitos e interesses constitucionalmente relevantes, incluindo o próprio interesse de ambas as partes; em qualquer caso, à luz do princípio do processo equitativo, os regimes adjetivos devem revelar-se funcionalmente adequados aos fins do processo e conformar-se com o princípio da proporcionalidade, não estando o legislador autorizado a criar obstáculos que dificultem ou prejudiquem, arbitrariamente ou de forma desproporcionada, o direito de acesso aos tribunais e a uma tutela jurisdicional efetiva (LOPES DO REGO, Os princípios constitucionais da proibição da indefesa, da proporcionalidade dos ónus e cominações e o regime da citação em processo civil, in «Estudos em homenagem ao Conselheiro José Manuel Cardoso da Costa», Coimbra, 2003, pág. 839, e ainda os acórdãos do Tribunal Constitucional n.ºs 122/02 e 403/02). No caso vertente – recorde-se -, houve lugar a uma correção oficiosa do valor da transmissão de bem imóvel nos termos previstos no artigo 58º-A do CIRC por ter sido detetado que o valor constante do contrato era inferior ao valor tributário do imóvel. A lei permite nessa circunstância que o interessado faça prova, através do procedimento especial previsto no artigo 129º do CIRC, do preço efetivamente praticado, mas com a sujeição, como requisito prévio, à junção de autorização para consulta de dados bancários da requerente e dos seus administradores ou gerentes. O procedimento é, por isso, desencadeado por iniciativa e no interesse do sujeito passivo do imposto e destina-se a ilidir a presunção – de que parte a norma do artigo 58º-A – de que o preço da venda não foi inferior ao valor tributário do prédio. Sendo essa a finalidade do procedimento tributário, seria inteiramente inconsequente que a prova do contrário fosse efetuada, por simples iniciativa do interessado, (…) através dos próprios documentos que titulam o contrato, dos meios de pagamento utilizados e dos elementos de contabilidade, quando o documento contratual é o mesmo que evidenciou a existência de uma possível simulação do preço e justificou a correção do valor da transmissão, e os outros meios de prova, em caso de ter havido a intenção de praticar fraude fiscal, deverão revelar uma aparente conformidade com o que consta do contrato. Para além disso, o consentimento do interessado para permitir à Administração Fiscal confrontar esses elementos probatórios com outros dados cobertos pelo sigilo bancário é uma medida que se mostra consentânea com o dever de cooperação que incumbe ao contribuinte, tanto mais que o procedimento foi instaurado, no seu interesse, para repor a verdade material. A derrogação do sigilo bancário constitui, por outro lado, um meio adequado para a prossecução dos fins visados pela lei, tendo em conta que se trata de uma diligência dirigida à descoberta da verdade fiscal; é um meio necessário já que a demonstração da não veracidade do facto dificilmente poderia ser alcançada através de outros elementos probatórios que o interessado estivesse na disposição de divulgar; e não é um meio desproporcionado ou excessivo se se considerar que a quebra de privacidade é inerente ao exercício do direito e ajusta-se aos objetivos do procedimento tributário utilizado (cfr. artigo 350º, n.º 2, do Código Civil). Não se afigura, por conseguinte, que a disposição legal imponha uma restrição ilegítima do direito à reserva da vida privada e do direito ao processo equitativo em violação do disposto no artigo 18º, n.º 2, da Constituição.
Sabendo-se que “O conceito de processo equitativo é um princípio fundamental de qualquer sociedade democrática, profundamente imbricado com o Estado de Direito (rule of law), não havendo fundamento para qualquer interpretação restritiva e que visa, acima de tudo, defendendo os interesses das partes e os próprios da administração da justiça, que os litigantes possam apresentar o seu caso ao tribunal de uma forma efectiva; (…)” – cfr. Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 16.02.2016 proc. 176/06.3TNLSB.L2-1, resulta claro que o TC no Acórdão que serviu de fundamento à decisão do Tribunal analisou e decidiu pela não violação do princípio do Estado de Direito e do princípio do acesso ao direito à tutela jurisdicional efectiva.
Pelo exposto improcede nesta parte o alegado.
No que respeita à violação do princípio da tributação das empresas pelo rendimento real e da igualdade tributária e apesar do Acórdão do TC fazer referência ao princípio da tributação das empresas pelo rendimento real, efectivamente o TC não apreciou e decidiu tal questão.
Assim, conclui-se que por manifesto lapso do Tribunal, a violação do princípio da tributação das empresas pelo rendimento real e da igualdade tributária deveria ter sido apreciado e decidido, sob pena de nulidade, face ao disposto na referida alínea d) do nº 1 do artigo 615.º do CPC.
Concluindo, considero verificada a nulidade da sentença arguida pelo A.
Sendo lícito ao juiz suprir a nulidade verificada, ao abrigo do disposto no artigo 617.º nº 2 e 6 do CPC cumpre rectificar a sentença proferida em 31.03.2020, a qual passará a ter, assim, a seguinte redacção.
(…)
V – O Direito
Conforme estipula o artigo 608.º n.º 2º do CPC, ex vi artigo 2º, alínea e) do CPPT, compete ao Tribunal o conhecimento de todas as questões suscitadas pelas partes, e apenas destas, sem prejuízo da Lei impor ou permitir o conhecimento oficioso de outras.
Vem o Autor intentar os presentes autos, sustentando a inconstitucionalidade do n.º 6 do artigo 129.º do CIRC por violação do princípio da reserva da vida privada, do Estado de Direito, do acesso ao direito e tutela jurisdicional efectiva, da proporcionalidade e da tributação do rendimento real, a ilegalidade da decisão impugnada face ao regime vertido no artigo 63.º-B da LGT, que constitui fundamento de acção administrativa especial nos termos do que preceitua o artigo 101.º alínea j) da Lei Geral Tributária (LGT) e artigo 97.º n.º 1 alínea p) do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT).
No que respeita ao pedido de substituição da decisão por outra que defira o pedido de prova de preço efectivo tal traduz um pedido de condenação da AT em actuar no sentido defendido pelo A., pelo que não pode o Tribunal apreciar e decidir de tal pedido.
Isto porque, tendo a AT decidido pelo indeferimento por falta de requisitos legais e não tendo emitido pronúncia sobre o mérito do pedido, o Tribunal não se pode substituir à AT.
Com efeito, o poder do Tribunal cingir-se-á à apreciação da decisão de indeferimento por falta dos requisitos legais, na medida em que os Tribunais não se podem substituir às entidades públicas na formulação de valorações que, por já não terem carácter jurídico, traduzem a realização de juízos sobre a conveniência e oportunidade da sua actuação.
Posto isto vejamos.
No caso presente, o A., com o objectivo de lograr comprovar o efectivo preço do imóvel enunciado nos pontos 1) e 3) da factualidade assente, accionou o mecanismo que decorre do n.º 6 do artigo 139.º do Código do Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (CIRC), não tendo, no entanto, logrado apresentar as declarações de autorização mencionadas.
Nessa senda, a Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), por preterição de formalidades legais, indeferiu o requerimento apresentado pelo A. (cfr. pontos 3. a 6. da factualidade assente).
Ora, constituindo a apresentação das declarações de autorização, pressuposto para o mecanismo instituído pelo n.º 6 do artigo 139.º do CIRC, cumpre apreciar num primeiro momento se procedem os fundamentos apresentados pelo A. no que à verificação dos pressupostos legais respeita.

Da inconstitucionalidade do n.º 6 do artigo 139.º do CIRC por violação do princípio da reserva da vida privada, do Estado de Direito, do acesso ao direito e tutela jurisdicional efectiva, da proporcionalidade

Alega o A. a inconstitucionalidade do n.º 6 do artigo 139.º do Código do Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (CIRC), por violação do princípio da reserva da vida privada, do Estado de Direito, do acesso ao direito e tutela jurisdicional efectiva, da proporcionalidade, vertidos nos artigos 26.º n.º 1, 2.º, 20.º n.º 1 e 4, 17.º e 286.º n.º 4 e 104.º n.º 2 da Constituição da República Portuguesa (CRP).
A AT, defende porém, a improcedência do invocado por entender que o acto não enferma de qualquer ilegalidade, por não se mostrar violado qualquer princípio constitucional.

Vejamos.

O Tribunal Constitucional no Acórdão 517/2015, proc. 418/2013, na decorrência de decisão de improcedência de Acórdão do TCA Sul de 19.02.2013, chamado a pronunciar-se sobre a violação do direito constitucional à reserva da intimidade da vida privada, consagrado no n.º 1 do artigo 26.º da CRP, do direito à tutela jurisdicional efetiva, consagrado nos artigos 20.º e 268.º, ambos da CRP e entendido como um dos corolários do princípio do Estado de direito consagrado no seu artigo 2º, a violação do Princípio da proporcionalidade, ínsito no artigo 2º e no artigo 18º n.º 2, ambos da CRP da violação do princípio da boa fé da Administração constante do artigo 266.º da CRP, relativamente ao disposto no artigo 139.º do CIRC decidiu “não julgar inconstitucional a norma, extraída do n.º 6 do artigo 129.º, do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas, na redação introduzida pela Lei n.º 53-A/2006, de 29 de dezembro, na parte em que exige que o pedido de demonstração do preço efetivo na transmissão de direitos reais sobre bens imóveis, previsto em tal preceito, seja instruído com os documentos de autorização de acesso, por parte da administração fiscal, à informação bancária do requerente e dos seus administradores ou gerentes, referente ao exercício em que ocorreu a transmissão e ao exercício anterior”.
Assim, atendendo à decisão do TC, que aqui se acompanha e para o qual se remete, por desnecessidade de qualquer outra consideração, não se verifica a violação de qualquer um dos apontados princípios constitucionais, improcedendo o alegado.

Da violação do princípio da tributação do rendimento real e da igualdade

Vem o A. também alegar que a interpretação do n.º 6 do artigo 139.º do CIRC ofende o princípio da tributação do rendimento real vertido no n.º 2 do artigo 104.º da CRP e o da igualdade contributiva consagrado nos artigos 13.º e 104.º, n.º 1 e 2.º, ambos da CRP.
Para tal, sustenta que a presunção do rendimento e do próprio valor de alineação do imóvel mostrando-se inilidível, porque acarreta uma demonstração potencialmente impossível, é violadora do princípio da tributação pelo rendimento real, mas também do princípio da igualdade.
O Ministério das Finanças veio pugnar pela improcedência do alegado.

Vejamos.

Com previsão constitucional, o princípio da incidência fundamental da tributação das empresas sobre o lucro real, acolhido no n.º 2 do artigo 104.º da Constituição da Republica Portuguesa (CRP), estatui o princípio geral de tributação da matéria tributável por meio do recurso à avaliação directa.
A par, estabelece o n.º 2 do artigo 18.º da CRP que “A lei só pode restringir os direitos, liberdades e garantias nos casos expressamente previstos na Constituição, devendo as restrições limitar-se ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos”.
“No âmbito da tributação das pessoas coletivas, a Constituição optou claramente pela tributação dos lucros reais, ou seja, os lucros efetivamente auferidos pelas empresas, conforme resulta do n.º 2 do artigo 104.º, em detrimento de um outro modelo possível, assente na tributação dos lucros normais, que, partindo de uma pressuposição dos lucros auferíveis em determinadas condições normais, poderia corresponder a um cálculo por excesso ou por defeito dos lucros realmente obtidos em cada ano (Gomes Canotilho, J. J. e Moreira, Vital, op. cit., p. 1100).
Tal opção, porém, é assumida, pela Constituição, de uma forma tendencial, o que impressivamente resulta da utilização do advérbio fundamentalmente. Compreende-se esta consagração mitigada do princípio da tributação pelo rendimento real, uma vez que a prevalência absoluta deste princípio exigiria um sistema também absolutamente fiável de informação sobre os resultados das empresas. Pelo que, em alguns sectores, “acabam por ser tributados não os lucros efetivamente auferidos mas sim os presumivelmente realizados” (cfr. idem, ibidem, p. 1100).
Ainda assim, a prevalência do princípio da tributação das empresas segundo o seu lucro real acarreta um aumento da intensidade da cooperação exigida ao contribuinte, que se traduz numa acrescida exigência dos seus deveres declarativos. Esta exigência poderá, porém, determinar a restrição ou condicionamento de direitos, imposta pela necessidade de fiscalizar o cumprimento de tais deveres.
A este propósito, refere Saldanha Sanches que “os modernos sistemas fiscais em que a tributação (…) do rendimento é feita com base na cooperação do contribuinte têm uma condição de funcionamento eficaz e de distribuição equitativa da carga fiscal: o suporte de um sistema de controlo administrativo que permita tornar excecional o incumprimento da lei”. A exequibilidade prática de tal controlo passa, em grande parte, pelo acesso a informações de natureza financeira (Sanches, J. L.S., “A situação atual do sigilo bancário: a singularidade do regime português”, Estudos de Direito Contabilístico e Fiscal, Coimbra Editora, Coimbra, 2000, p. 85)” – cfr. Acórdão do TC 517/2015, proc. 418/2013.
Por sua vez, o princípio da igualdade encontra-se consagrado como princípio fundamental no artigo 13.º da CRP, e vem exemplificadamente imposto em determinados aspectos enunciados na Lei fundamental.
O núcleo essencial do princípio da igualdade mais não é do que o conjunto de índices expressamente previstos na Constituição como proibitivos da desigualdade.
Ora, no que respeita à igualdade tributária, esta não constitui mais do que uma particularização, resumindo-se na exigência de que o legislador trate de modo igual o que é igual e de modo diferente o que é diferente, isto face à igualdade ou diferença das realidades a tratar e a igualdade ou diferença do tratamento que lhes é dispensado.
Acresce que a igualdade é sempre relativa, estabelecendo-se a igualdade por meio de um juízo de comparação, através do confronto dessas duas realidades ou situações à luz de um critério distintivo ou tertium comparationis, decorrente de uma das suas características.
Com efeito e como decidiu o Tribunal Constitucional no Acórdão de 10.04.1996, n.º 563/96 relativamente ao princípio da igualdade, “o princípio postula que se dê tratamento igual a situações de facto essencialmente iguais e tratamento desigual para as situações de facto desiguais (proibindo, inversamente, o tratamento desigual de situações iguais e o tratamento igual das situações desiguais)”, considerando que “O princípio não impede que, tendo em conta a liberdade de conformação do legislador, se possam (se devam) estabelecer diferenciações de tratamento, «razoável, racional e objectivamente fundadas», sob pena de, assim não sucedendo, «estar o legislador a incorrer em arbítrio, por preterição do acatamento de soluções objectivamente justificadas por valores constitucionalmente relevantes», no ponderar do citado Acórdão n.º 335/94. Ponto é que haja fundamento material suficiente que neutralize o arbítrio e afaste a discriminação infundada (o que importa é que não se discrimine para discriminar, diz-nos J. C. Vieira de Andrade, Os Direitos Fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976, Coimbra, 1987, p. 299). A diferença pode, na verdade, justificar o tratamento desigual, eliminando o arbítrio (cf., a este propósito, Gomes Canotilho, in Revista de Legislação e de Jurisprudência, ano 124, p. 327; Alves Correia, O Plano Urbanístico e o Princípio da Igualdade, Coimbra, 1989, p. 425, e o Acórdão n.º 330/93).”
Atento o exposto e retornando ao caso dos autos, não se vislumbra em que medida é que se verifica a violação de qualquer um destes princípios.

Senão vejamos.

Dispunha, na redacção aplicável à data dos factos, o artigo 64.º n.º 2 do Código do Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (CIRC), para efeitos de determinação do lucro tributável, que sempre que nas transmissões onerosas de direitos reais sobre imóveis, o valor constante do contrato seja inferior ao valor patrimonial tributário (VPT) definitivo do imóvel, é este o valor a considerar pelo alienante e adquirente, decorrendo deste normativo uma presunção de rendimento.
Acresce que, o n.º 1 do artigo 139.º do CIRC veio estabelecer que “O disposto no n.º 2 do artigo 64.º não é aplicável se o sujeito passivo fizer prova de que o preço efectivamente praticado nas transmissões de direitos reais sobre bens imóveis foi inferior ao valor patrimonial tributário que serviu de base à liquidação do imposto municipal sobre as transmissões onerosas de imóveis”
Desta forma e por via deste preceito legal, a presunção que decorre do n.º 2 do artigo 64.º do CIRC pode ser ilidida pelo sujeito passivo de imposto.
A par, determina ainda o n.º 6 do artigo 139.º do CIRC que “Em caso de apresentação do pedido de demonstração previsto no presente artigo, a administração fiscal pode aceder à informação bancária do requerente e dos respectivos administradores ou gerentes referente ao período de tributação em que ocorreu a transmissão e ao período de tributação anterior, devendo para o efeito ser anexados os correspondentes documentos de autorização”.
Assim, por meio da análise da informação bancária do requerente e dos respectivos administradores ou gerentes referente ao período de tributação em que ocorreu a transmissão, pode a presunção em questão ser ilidida, contrariamente ao defendido pelo A. Nesta medida, tal procedimento permitirá a tributação do lucro real, ou seja, a tributação dos lucros efetivamente auferidos pelas empresas em contraposição à presunção pela lei estabelecida.
Invoca o A. que a anexação dos documentos de autorização do levantamento do sigilo bancário por parte dos gerentes ou administradores não se encontra dependente da mera vontade do sujeito passivo, ficando à mercê daquela que for a decisão daqueles outros.
Ora, contrariamente ao defendido pelo A., os administradores e/ou gerentes não são terceiros estranhos às sociedades, na medida em que estes estão adstritos genericamente, no exercício das suas funções a um dever de boa gestão, o qual compreende o rigoroso cumprimento de todas as obrigações legais e contratuais, que se desdobra no dever de cuidado, de lealdade e no dever de informação.
Com efeito, a lei sujeitou os membros dos órgãos de administração a deveres gerais: os deveres de cuidado e de lealdade, cfr. artigo 64.º n.º 1 do Código das Sociedades Comerciais (CSC), que representam fundamentalmente padrões ou “standards” abstratos de conduta que balizam e conformam a atuação geral dos administradores e gerentes das suas funções
Nesta senda, sobre os administradores e/ou gerentes recai o dever de actuar em conformidade com os interesses das sociedades, como seja, no caso presente, o de permitir que a sociedade logre ilidir a presunção que da lei decorre, por meio da autorização de acesso aos elementos bancários, por forma a não obstar à tributação pelo lucro real.
Assim, face aos deveres dos administradores e gerentes que aqui demos conta, a norma controvertida, em consonância com tais deveres que impendem sobre aqueles, em nada contende com o princípio da tributação pelo lucro real.
Ademais, e como decorre da resposta apresentada pelo A. ao Serviço de Apoio às Comissões de Revisão da Direcção de Finanças do Porto, coligida no ponto 5) da matéria de facto assente, nem sequer se pode concluir que no caso sob apreciação houve recusa por parte dos administradores em autorizar o levantamento do sigilo bancário por forma a aventar que a impossibilidade da tributação pelo lucro real decorreu da não permissão de acesso por parte dos administradores do A.
Pelo exposto, constituindo a interpretação da norma que decorre do n.º 6 do artigo 139.º do CIRC no sentido de que a autorização de derrogação do sigilo bancário dos administradores ou gerentes um requisito imprescindível ao afastamento da presunção de rendimento que resulta do disposto no artigo 64.º do CIRC não padece de inconstitucionalidade por violação do princípio da tributação pelo lucro real previsto no artigo 104.º da CRP, uma vez que a presunção é ilidível, nem por maioria de razão por violação do princípio da igualdade contributiva, improcedendo assim o alegado.

Da ilegalidade da decisão impugnada face ao regime vertido no artigo 63.º-B da LGT

Vem também o A. alegar que o acto impugnado infringiu o disposto no artigo 63.º- B da LGT, por considerar que os princípios gerais da possibilidade de derrogação do sigilo bancário em matéria tributária foram expressamente fixados naquele normativo legal, não tendo a interpretação dada pela AT ao n.º 6 do artigo 139.º do CIRC qualquer correspondência com tais princípios, indo muito para além dos mesmos.
A Fazenda Pública, por sua vez, sustenta que as garantias dos contribuintes, consagradas no artigo 63.º- B da LGT não são aplicáveis ao presente caso na medida em que o legislador não o previu expressamente.

Vejamos.

Como decorre do disposto no artigo 63.º-B da LGT com a epígrafe “Acesso a informações e documentos bancários”, “a administração tributária tem o poder de aceder a todas as informações ou documentos bancários sem dependência do consentimento do titular dos elementos protegidos: a) Quando existam indícios da prática de crime em matéria tributária; b) Quando se verifiquem indícios da falta de veracidade do declarado ou esteja em falta declaração legalmente exigível; c) Quando se verifiquem indícios da existência de acréscimos de património não justificados, nos termos da alínea f) do n.º 1 do artigo 87.º; d) Quando se trate da verificação de conformidade de documentos de suporte de registos contabilísticos dos sujeitos passivos de IRS e IRC que se encontrem sujeitos a contabilidade organizada; e) Quando exista a necessidade de controlar os pressupostos de regimes fiscais privilegiados de que o contribuinte usufrua; f) Quando se verifique a impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta da matéria tributável, nos termos do artigo 88.º, e, em geral, quando estejam verificados os pressupostos para o recurso a uma avaliação indirecta. g) Quando se verifique a existência comprovada de dívidas à administração fiscal ou à segurança social. 2 - A administração tributária tem, ainda, o poder de aceder directamente aos documentos bancários, nas situações de recusa da sua exibição ou de autorização para a sua consulta, quando se trate de familiares ou terceiros que se encontrem numa relação especial com o contribuinte.”
Assim, perante o preenchimento dos pressupostos de que a lei faz depender, a derrogação do sigilo bancário pela AT caracteriza-se pelo poder-dever de acesso a informações ou documentos bancários sem que para tal seja necessário o consentimento do titular, da entidade bancária ou de um Tribunal. Neste sentido veja-se Lei Geral Tributária, comentada e anotada, 2015, Almedina, pag. 677.
A par, e como estabelece o artigo 64.º n.º 2 do CIRC, para efeitos de determinação do lucro tributável, sempre que nas transmissões onerosas de direitos reais sobre imóveis, o valor constante do contrato seja inferior ao valor patrimonial tributário (VPT) definitivo do imóvel, é este o valor a considerar pelo alienante e adquirente.
Não obstante, tal imposição pode ser afastada, se o sujeito passivo fizer prova de que o preço efectivamente praticado foi inferior ao VPT.
Para tal, o legislador instituiu um mecanismo próprio a ser instaurado junto do Director de Finanças competente, regendo-se pelo que determina o artigo 91.º e 92.º da LGT, com as devidas adaptações.
Nessa senda, veio o n.º 1 do artigo 139.º do CIRC estabelecer que “O disposto no n.º 2 do artigo 64.º não é aplicável se o sujeito passivo fizer prova de que o preço efectivamente praticado nas transmissões de direitos reais sobre bens imóveis foi inferior ao valor patrimonial tributário que serviu de base à liquidação do imposto municipal sobre as transmissões onerosas de imóveis.”.
Por sua vez o n.º 3 do mesmo preceito legal institui que “a prova referida no n.º 1 deve ser efectuada em procedimento instaurado mediante requerimento dirigido ao director de finanças competente e apresentado em Janeiro do ano seguinte àquele em que ocorreram as transmissões, caso o valor patrimonial tributário já se encontre definitivamente fixado, ou nos 30 dias posteriores à data em que a avaliação se tornou definitiva, nos restantes casos.”
Por último, estabelece o n.º 6 do artigo 139.º do (CIRC que “Em caso de apresentação do pedido de demonstração previsto no presente artigo, a administração fiscal pode aceder à informação bancária do requerente e dos respectivos administradores ou gerentes referente ao período de tributação em que ocorreu a transmissão e ao período de tributação anterior, devendo para o efeito ser anexados os correspondentes documentos de autorização.”.
Ora, procedendo à análise destes dois mecanismos legais que a AT tem ao seu dispor de forma a aceder aos elementos bancários dos sujeitos passivos de impostos, conclui-se que o regime previsto no artigo 63.º-B da LGT é distinto relativamente ao regime instituído pelo n.º 6 do artigo 139.º do CIRC, não estando um dependente do preenchimento dos pressupostos do outro.

Senão vejamos.

No que respeita ao regime de acesso por parte da AT aos elementos bancários à luz do artigo 63.º-B da LGT, o objectivo prosseguido é o combate à fraude e evasão fiscal, estando a AT autorizada a aceder aos elementos bancários quando preenchidos determinados pressupostos, podendo assim extrair dos elementos coligidos toda uma panóplia de informações que lhe permita proceder a correcções a nível de qualquer um dos impostos implementados no ordenamento jurídico português.
Assim, neste regime, o mecanismo é desencadeado pela AT, sem que para tal haja consentimento do titular dos elementos protegidos, podendo resultar nas mais diversas actuações por parte da AT. Nessa senda, o legislador sentiu necessidade de face a esse poder, munir o visado de garantias, seja o dever de comprovar as razões fundamentadoras da actuação da AT, seja o dever de fundamentação que impende sobre aquela.
Por outro lado, na obrigatoriedade de apresentação de declarações de autorização para aceder a elementos bancários previsto no n.º 6 do artigo 139.º do CIRC, o único fim a atingir é a prova pelo sujeito passivo do preço efectivo na transmissão de imóveis permitindo-lhe assim obviar à aplicação do disposto no artigo 64.º n.º 2 do CIRC.
Com efeito, da leitura de tal preceito legal não se vislumbra que a AT possa extrair dos elementos, nessa sede recolhidos, outras informações que lhe permita actuar no sentido da correcção de elementos declarados pelos visados, procedendo a correcções. Neste sentido, vide o decidido no Acórdão do STA de 5.09.2012, rec. 0837/12.
Consequentemente, o acesso da AT a tais elementos, em sede deste mecanismo, limita-se à verificação de que o preço efectivo de venda do imóvel em questão foi inferior ao VPT, sem que lhe seja permitido extrapolar e fundamentar outras quaisquer actuações no âmbito da prossecução dos seus fins.
Ademais, mesmo relativamente a esse mecanismo, a AT encontra-se limitada à análise da informação bancária respeitante “ao período de tributação em que ocorreu a transmissão e ao período de tributação anterior”, informação essa que por estar previamente delimitada por lei é conhecida pelo titular dos elementos protegidos.
Na mesma ordem de ideias, não faria sentido impender sobre a AT a obrigação de permitir ao contribuinte pronunciar-se sobre eventual apresentação de declarações de autorização assim como ter esse mesmo contribuinte, num primeiro momento, que recusar a exibição e consulta desses elementos, para, em fase posterior, autorizar a AT a aceder a esses mesmos elementos. Da mesma forma, mostrar-se-ia inócuo a AT estar obrigada a fundamentar a necessidade de requerer a apresentação de declarações de autorização, quando é um poder que a ela lhe assiste na decorrência de mecanismo desencadeado pelo contribuinte.
Por outro lado, também não vislumbra o Tribunal em que medida o estabelecido no artigo 63.º-B da LGT constitui parâmetro da legalidade de qualquer norma que discipline o acesso a informações bancárias em matéria tributária, uma vez que a par desse preceito legal a própria LGT prevê pelo menos mais dois normativos (artigo 63.º-A e artigo 63.º - C), onde, não obstante os seus distintos contornos, se encontra previsto o acesso da AT a elementos bancários.
Por último, considera-se que, se a pretensão do legislador fosse sujeitar o mecanismo previsto no artigo no n.º 6 do artigo 139.º do CIRC aos princípios e pressupostos que decorrem do artigo 63.º-B da LGT o teria consignado expressamente, como aliás fez em sede do artigo 63.º-C, ao prever expressamente no seu n.º 5 a sujeição às regras e circunstâncias previstas naquele normativo.
Em reforço deste raciocínio, há que atentar que o acesso à informação bancária, a que alude o n.º 6 do artigo 139.º do CIRC, decorre da voluntariedade do contribuinte para desencadear ou não o procedimento administrativo aí vertido.
Desta forma, constituindo estes dois regimes diferenciadas formas de acesso aos elementos bancários, com fins perfeitamente distintos, que não se confundem nem têm contornos semelhantes, não se vislumbra em que medida é que a exigência das declarações de autorização para a AT aceder aos documentos bancários dos administradores encerra em si qualquer ilegalidade e/ou violação de qualquer princípio ou limite imposto pelo legislador, improcedendo assim o vício alegado.
Como tal, e apesar da pretensão material que vem formulada nos presentes autos, sendo os sobreditos documentos de autorização requisito legal para a instauração do mecanismo previsto no artigo 129.º do CIRC e não tendo os mesmos sido entregues pelo A., sem que se vislumbre fundamento para tal, improcede desta forma o ora alegado.
Concluindo-se que não estão preenchidos os pressupostos para o A. accionar o mecanismo ínsito no n.º 6 do artigo 139.º do CIRC, também não seria de proceder o pedido de substituição da decisão impugnada.
(…)».

3.2.1.1. Preceitua o artigo 125.º, nº 1 do CPPT que «Constituem causas de nulidade da sentença a falta de assinatura do juiz, a não especificação dos fundamentos de facto e de direito da decisão, a oposição dos fundamentos com a decisão, a falta de pronúncia sobre questões que o juiz deva apreciar ou a pronúncia sobre questões que não deva conhecer.».
No mesmo sentido estabelece a alínea d), do n.º 1, do artigo 615.º CPC, aplicável ex vi artigo 2.º, alínea e) do CPPT, ao estatuir que «1. É nula a sentença quando: (…) d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar (…)».
Este vício está relacionado com a norma que disciplina as “Questões a resolver - ordem de julgamento” (cf. artigo 608.º n.º 2 do CPC) da qual resulta que o juiz «deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras (…)».
A nulidade da sentença por omissão de pronúncia verifica-se quando existe uma omissão dos deveres de cognição do tribunal, o que sucederá quando o juiz não tenha resolvido todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação e cuja decisão não esteja prejudicada pela solução dada a outras.
Portanto, esta nulidade só ocorre nos casos em que o tribunal não tome posição sobre alguma questão sobre a qual devesse tomar posição, inclusivamente não decidindo explicitamente que não pode dela tomar conhecimento. (Cfr. acórdãos do STA n.ºs 574/11 de 13.07.2011 e 01200/12 de 12.02.2015 e do TCAN nos acórdãos n.ºs 01903/12.5 BEBRG de 26.09.2013, 1481/08.0BEBRG de 10.10.2013, 02206/10.5BEBRG de 16.10.2014 e 03589/04 - Aveiro).
Ora, como se alcança do teor da sentença, a Meritíssima Juíza a quo invocou o acórdão do Tribunal Constitucional n.º 517/2015, proc. 418/2015, cujo teor expressou acompanhar e para o qual se remeteu. Ademais, consta das páginas 2 a 4 da decisão de 13.07.2020 o seu entendimento de que, naquela decisão, o TC se pronunciou expressamente relativamente à questão da violação dos princípios do Estado de Direito e do acesso ao direito e à tutela jurisdicional efetiva, ali incluindo os excertos daquele aresto no que tange à identificação desta questão e à pronúncia sobre ela emitida.
Assim, podendo embora ocorrer erro de julgamento, o certo é que foi emitida pronúncia sobre a questão em causa, não se verificando, por isso, a apontada nulidade da sentença.

3.2.2. Erros de julgamento
A Recorrente não se conforma por a sentença recorrida ter julgado improcedente a ação administrativa especial deduzida contra o despacho proferido em 03.05.2011, de indeferimento do requerimento de prova do preço efetivo na transmissão de imóveis, apresentado nos termos do disposto no artigo 139.º do CIRC, com referência à alienação do prédio urbano inscrito na matriz predial urbana da freguesia das Caldas da Rainha, sob o artigo (...), fração AF.
Por isso, interpôs o presente recurso, alegando que a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento sobre a matéria de direito, porquanto a aplicação da norma do artigo 139.º, n.º 6 do CIRC, tal como foi aplicada ao caso concreto, viola vários princípios constitucionais, tais como: reserva à intimidade da vida privada, do Estado de Direito, do acesso ao direito e tutela jurisdicional efetiva, da proporcionalidade, da tributação do rendimento real e da igualdade tributária (artigos 26.º, n.º 1, 2.º, 20.º, n.º 1 e n.º 4, 17.º, 286.º, n.º 4, 104.º, n.º 2 e 13.º da CRP). Sustenta, ainda, que a sentença enferma de erro de julgamento de facto porquanto, em face da interpretação que entende devida, apresentou toda a prova que permitia o deferimento do seu pedido.
Em causa está a decisão de indeferimento do pedido de prova do preço efetivo, efetuado ao abrigo do artigo 139.º do CIRC, por falta de requisitos legais. A Recorrente apresentou requerimento com vista à comprovação do preço efetivo das transmissões referidas, nos termos dessa norma, por forma a afastar a aplicabilidade do disposto no n.º 2 do artigo 64.º do CIRC. Tendo sido notificada para apresentar documentos de autorização de levantamento do sigilo bancário referente aos seus administradores, sob pena de o pedido ser liminarmente rejeitado e mandado arquivar por falta de requisitos legais, invocou que a interpretação que se faz da norma contida no n.º 6 do artigo 139.º do CIRC, como vem sendo aplicada pela administração tributária, isto é, no sentido da necessidade de autorização de acesso à informação bancária dos administradores ou gerentes dos contribuintes requerentes, sob pena de indeferimento liminar do pedido de prova do preço efetivo na transmissão de imóveis por falta de observância de requisitos legais, constitui manifesta violação de princípios estruturantes da nossa ordem jurídica.

3.2.1. Erro de julgamento de direito

Vejamos, antes do mais, quais as normas aplicáveis:
Nos termos do n.º 2 do artigo 64.º do CIRC, «Sempre que, nas transmissões onerosas …, o valor constante do contrato seja inferior ao valor patrimonial tributário definitivo do imóvel, é este o valor a considerar pelo alienante e adquirente, para determinação do lucro tributável.».
Por seu turno, o artigo 139.º do CIRC estabelece, que:
«1 - O disposto no n.º 2 do artigo 64.º não é aplicável se o sujeito passivo fizer prova de que o preço efectivamente praticado nas transmissões de direitos reais sobre bens imóveis foi inferior ao valor patrimonial tributário que serviu de base à liquidação do imposto municipal sobre as transmissões onerosas de imóveis.
(…)
3 - A prova referida no n.º 1 deve ser efectuada em procedimento instaurado mediante requerimento dirigido ao director de finanças competente e apresentado em Janeiro do ano seguinte àquele em que ocorreram as transmissões, caso o valor patrimonial tributário já se encontre definitivamente fixado, ou nos 30 dias posteriores à data em que a avaliação se tornou definitiva, nos restantes casos.
(…)
6 - Em caso de apresentação do pedido de demonstração previsto no presente artigo, a administração fiscal pode aceder à informação bancária do requerente e dos respectivos administradores ou gerentes referente ao período de tributação em que ocorreu a transmissão e ao período de tributação anterior, devendo para o efeito ser anexados os correspondentes documentos de autorização.».

Como vem sendo entendido, designadamente por este TCAN, no acórdão de 25.02.2021, processo n.º 735/12.5BEPRT, que aqui vamos acompanhar de perto, da interpretação conjugada das disposições citadas resulta que, quando o valor constante do contrato seja inferior ao VPT, será este o valor a considerar para efeitos de determinação do lucro tributável do sujeito passivo alienante, a não ser que este demonstre que o preço efetivamente praticado foi inferior ao VPT fixado. Para o efeito, deverá o contribuinte entregar um requerimento com pedido de demonstração do preço, que contenha em anexo documentos de autorização de acesso à informação bancária que lhe diz respeito, bem como dos seus administradores ou gerentes.
Não existem, pois, dúvidas da obrigatoriedade do requerimento em causa ser acompanhado pelas referidas declarações de autorização, sob pena de indeferimento. Por outras palavras, nos termos do n.º 6 do artigo 139.º do Código do IRC, a autorização de acesso às contas bancárias do sujeito passivo e dos seus administradores, gerentes ou representantes legais é condição necessária da instauração do procedimento de prova do preço efectivo.

Resulta do probatório que a Recorrente alienou um imóvel por um valor inferior ao seu VPT, tendo apresentado junto da AT requerimento de prova do preço efetivo na transmissão, que viu indeferido com fundamento na falta de junção dos documentos de autorização de acesso às contas bancárias dos seus administradores.

Sendo incontroverso que a Recorrente não anexou os documentos de autorização acima mencionados, na apreciação dos vícios imputados à decisão impugnada, a sentença recorrida acolheu jurisprudência dos tribunais superiores, com sustentação em jurisprudência do Tribunal Constitucional, que também nós subscrevemos.

É abundante a jurisprudência dos nossos tribunais superiores acerca do artigo 129.º, n.º 6 do CIRC, a que corresponde o artigo 139.º, n.º 6 do CIRC, aqui em causa, sendo uniformemente entendido que não é de desaplicar no caso concreto este preceito legal, por não se verificar a inconstitucionalidade da norma.

A título de mero exemplo, e porque reúne a apreciação dos princípios que a Recorrente considera aqui violados, fazendo apelo aos vários Acórdãos que já foram proferidos pelo Tribunal Constitucional, quer no âmbito da apreciação da constitucionalidade do artigo 129.º, n.º 6 do CIRC, quer no âmbito da redação posterior a que corresponde o artigo 139.º, n.º 6 do CIRC, visando uma interpretação e aplicação uniforme do direito (artigo 8.º, n.º 3 do Código Civil), aderimos ao Acórdão do STA, de 20/04/2020, proferido no âmbito do processo n.º 01639/10.1BELRA 030/18, que apresenta o seguinte sumário: “O n.º 6 do art. 129.º do CIRC, na redacção dada pela Lei n.º 53-A/2006, de 29/12, no que respeita à obrigação de serem juntas, pelo sujeito passivo de IRC, para prova do preço efectivo ou real na transmissão de imóveis, declarações de administradores, concedendo autorização para aceder às respectivas informações bancárias, não padece de inconstitucionalidade material por violação do princípio da tributação pelo lucro real (art. 104º, nº 1, da CRP, 3º, nº 1, al. a), e 17º, nº 1, do CIRC); do princípio da proporcionalidade (art. 18º, nº 1 da CRP), do direito à reserva da intimidade da vida privada (art. 26º, nº 1 da CRP) nem do direito de acesso ao direito e à tutela jurisdicional efectiva (artigos 20º, nº 1 e 4 e 104º, nº 1 da CRP) ”.

Assim, refere aquele douto Aresto que:
«(…) Ao princípio da tributação pelo lucro real se refere o artigo 104.º n.º1 da C.R.P., com expressão nos artigos 3.º, n.º 1, a), e 17.º, n.º1, do C.I.R.C..
Tal princípio, sendo de contextualizar com o dever de pagar impostos corresponde a um dever fundamental dos cidadãos, plasmado no artigo 103.º da Constituição da República Portuguesa, traduz-se no poder-dever de criar impostos e determinar a forma da sua coleta, com vista a uma repartição justa dos rendimentos e da riqueza, conforme o Tribunal Constitucional refere no acórdão n.º 517/2015, acessível em www.tribunalconstitucional.pt.
De acordo com o que neste acórdão se refere:“10. No âmbito da tributação das pessoas coletivas, a Constituição optou claramente pela tributação dos lucros reais, ou seja, os lucros efetivamente auferidos pelas empresas, conforme resulta do n.º 2 do artigo 104.º, em detrimento de um outro modelo possível, assente na tributação dos lucros normais, que, partindo de uma pressuposição dos lucros auferíveis em determinadas condições normais, poderia corresponder a um cálculo por excesso ou por defeito dos lucros realmente obtidos em cada ano (Gomes Canotilho, J. J. e Moreira, Vital, op. cit., p. 1100).
Tal opção, porém, é assumida, pela Constituição, de uma forma tendencial, o que impressivamente resulta da utilização do advérbio fundamentalmente. Compreende-se esta consagração mitigada do princípio da tributação pelo rendimento real, uma vez que a prevalência absoluta deste princípio exigiria um sistema também absolutamente fiável de informação sobre os resultados das empresas. Pelo que, em alguns sectores, “acabam por ser tributados não os lucros efectivamente auferidos mas sim os presumivelmente realizados” (cfr. idem, ibidem, p. 1100).
Ainda assim, a prevalência do princípio da tributação das empresas segundo o seu lucro real acarreta um aumento da intensidade da cooperação exigida ao contribuinte, que se traduz numa acrescida exigência dos seus deveres declarativos. Esta exigência poderá, porém, determinar a restrição ou condicionamento de direitos, imposta pela necessidade de fiscalizar o cumprimento de tais deveres.”
Ou seja, a previsão legal constante do referido art. 104.º, n.º 2, da C.R.P., comporta que, em alguns sectores possam ser presumidos lucros e, que, resultando tributação por excesso ou por defeito, sejam previstos deveres declarativos acrescidos para fiscalização por parte da administração.
Tal o que ocorre no caso de transmissão de imóveis, em que de acordo com o art. 129.º (actual 139.º) do C.I.R.C., os preços efectivamente praticados podem ser demonstrados pelo contribuinte, em detrimento dos valores patrimoniais tributários, apurados de acordo com o previsto no artigo 58.º-A (actual 64.º) do C.I.R.C. e assim deixem de ser presumidos lucros.
Ao se prever no n.º 6 do dito 129.º, o dever de anexação, para acesso a contas bancárias, de declarações por parte de administradores e gerentes, não só se insere em tais deveres, como ainda no dever geral “de lealdade, no interesse da sociedade”, previsto no art. 64.º do C.S.C., na redacção dada pelo art. 4.º do Dec.-Lei n.º 76-A/2006, de 29/3, por parte de administradores e gerentes.
Aliás, segundo as invocadas normas do IRC em que alegadamente o dito princípio obteve expressão, no caso das pessoas colectivas e das outras entidades nas mesmas mencionadas, resulta que o lucro se apura pela soma de variações patrimoniais positivas e negativas, determinadas com base em contabilidade, eventualmente corrigidas, o que só vem confirmar que o constante da contabilidade não é absoluto.
Assim sendo, não resulta a violação do dito princípio da tributação pelo rendimento real.
O previsto no art. 129.º n.º 6 do C.I.R.C. obedece ao princípio da proporcionalidade, a que se refere o art. 18.º, n.º 2 da C.R.P., e nas suas várias vertentes, de adequação, necessidade e, especificamente, da justa medida.
Tal o que resulta dos fins em vista, de proporcionar ainda desse modo um controle por parte da A.T. da elisão de presunção de rendimento do imóvel transmitido, mediante a prova do preço real, bem como é necessário, a se alcançar a verdade fiscal, pois aquele controle não pode ficar dependente apenas da prova oferecida.
Nesse mesmo sentido se pronunciou o referido acórdão do T.C. n.º 517/2015, reiterando o já decidido anteriormente pelo acórdão n.º 145/2014, citado na sentença recorrida, bem como no referido parecer da magistrada do Ministério Público, e que se encontra também acessível em www.tribunalconstitucional.pt.
A esse propósito, foi aí ainda apreciado o seguinte, a que se adere:
“(…) a situação versada no acórdão nº 442/2007 Invocado pela recorrente não é inteiramente coincidente com a do presente processo. Ali discutia-se, na situação de reclamação graciosa ou de impugnação judicial de atos tributários, a possibilidade de a Administração Fiscal aceder diretamente e, por isso, sem o consentimento prévio do interessado e sem necessidade de autorização judicial, a informação coberta pelo sigilo bancário, desde que esse acesso se mostre justificado perante os factos alegados pelo reclamante ou impugnante e desde que a informação bancária esteja relacionada com a situação tributária objeto da reclamação ou impugnação.
No caso vertente, ainda que esteja em causa um procedimento tributário que é também da iniciativa do sujeito passivo – e que constitui uma faculdade garantística dos contribuintes -, ele destina-se especificamente a efetuar a prova relevante para a fixação da matéria tributável relativamente à liquidação do imposto, e não implica o acesso direto à informação bancária, antes pressupondo um consentimento expresso do interessado mediante a concessão de autorização, a qual deve ser junta ao requerimento.”
Assim sendo, a justa medida não é também afetada.
III.2.3. Quanto à inconstitucionalidade por violação do direito à reserva da intimidade da vida privada se referem os ditos acórdãos 145/2014 e 517/2015, essa inconstitucionalidade não ocorre, numa análise decorrente do bem protegido pelo sigilo bancário, a que também se adere:
“Como se considerou no acórdão do Tribunal Constitucional n.º 442/2007 (…) na linha de anterior jurisprudência, o bem protegido pelo sigilo bancário cabe no âmbito de proteção do direito à reserva da vida privada consagrado no artigo 26.º, n.º 1, da Constituição da República.
(…)
Para além disso, reconhece-se que o segredo bancário se localiza no âmbito da vida de relação, à partida fora da esfera mais estrita da vida pessoal, ocupando uma zona de periferia, mais complacente com restrições advindas da necessidade de acolhimento de princípios e valores com ele conflituantes.
Por isso se afirma que “[o] segredo bancário não é abrangido pela tutela constitucional de reserva da vida privada nos mesmos termos de outras áreas da vida pessoal” (acórdão n.º 42/2007) e é mais suscetível a “restrições (…) impostas pela necessidade de salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos” (acórdão n.º 278/95).
Por outro lado – como ainda se anotou no acórdão n.º 442/2007 - quando a quebra do sigilo bancário promana da Administração Fiscal, não pode esquecer-se que ela não implica a abertura desses dados ao conhecimento geral, visto que os conhecimentos obtidos pelo exercício da função tributária estão sujeitos ao dever de confidencialidade (artigo 64.º da Lei Geral Tributária) e a sua violação está tipificada de forma mais gravosa, face ao crime de violação do sigilo profissional (cfr. o artigo 91.º, n.º 1, do Regime Geral das Infrações Tributárias e o artigo 195.º do Código Penal, por um lado, e artigo 383.º deste Código e os n.ºs 2 e 3 daquele artigo 91.º, por outro).
Nessa medida, o levantamento do sigilo bancário mantém a reserva quanto aos dados que dele são objeto, através da sua cobertura pelo sigilo fiscal, que deixa salvaguardado – ainda que com o alargamento do círculo de pessoas que tomam conhecimento dos dados protegidos – “o conteúdo essencial tanto do direito à privacidade da vida privada e familiar dos contribuintes como da dinâmica da atividade bancária” (CASALTA NABAIS, O dever fundamental de pagar impostos, Coimbra, 1997, pág. 619).
Constata-se, pois, que, não só o sigilo bancário cobre uma zona de segredo francamente suscetível de limitações, como a sua quebra por iniciativa da Administração Tributária representa uma lesão diminuta do bem protegido.
Em contrapartida, em ordem à necessidade de obtenção de receitas para suporte das despesas públicas e à realização dos fins inerentes ao sistema fiscal - incluindo a tributação segundo a capacidade contributiva e a distribuição equitativa da carga fiscal -, a Administração Fiscal está sujeita a um rigoroso princípio do inquisitório, pelo qual deve, no âmbito do procedimento tributário, realizar todas as diligências necessárias à satisfação do interesse público e à descoberta da verdade material, não estando subordinada à iniciativa do autor do pedido. Princípio esse que é completado por um dever de colaboração recíproco entre os órgãos da administração e os contribuintes (artigos 58º e 59º da LGT). O que torna por si justificável que ao dever de averiguação oficiosa da Administração se não possa opor, em termos absolutos, o direito à privacidade relativa a elementos de informação bancária.”
No que respeita à violação do direito à tutela judicial efectiva, e ainda de acordo com o que consta no referido acórdão n.º 517/2015, do T.C., por referência ao anteriormente decidido no n.º 145/2014, salienta-se agora o seguinte:
“No tocante à referência à violação do artigo 266.º da Constituição, igualmente não assiste razão à recorrente, porquanto, como se refere no citado acórdão, este preceito condensa vários princípios que consubstanciam “as medidas materiais da juridicidade administrativa que, como tal respeitam à própria atividade jurídica ou material da Administração.” (…)».
Ao princípio da igualdade tributária ou contributiva, que a Recorrente também considera violado, já se foi fazendo referência a propósito da análise de outros princípios orientadores do ordenamento jurídico tributário, como o princípio da tributação pelo lucro real. Todavia, está intimamente ligado ao princípio da capacidade contributiva. O princípio da capacidade contributiva é expressão do princípio da igualdade, entendido em sentido material, no domínio dos impostos, ou seja, a igualdade no imposto. E, neste sentido, constitui corolário tributário dos princípios da igualdade e da justiça fiscal (cfr. Acórdãos do Tribunal Constitucional n.º 197/2016 e 211/2017).
«O princípio da capacidade contributiva exprime e concretiza o princípio da igualdade fiscal ou tributária na sua vertente de “uniformidade” – o dever de todos pagarem impostos segundo o mesmo critério – preenchendo a capacidade contributiva o critério unitário da tributação.
Consiste este critério em que a incidência e a repartição dos impostos – dos “impostos fiscais” mais precisamente – se deverá fazer segundo a capacidade económica ou “capacidade de gastar” (na formulação clássica portuguesa, de Teixeira Ribeiro, “A justiça na tributação” in “Boletim de Ciências Económicas”, vol. XXX, Coimbra 1987, n.º 6, autor que também se lhe refere como “capacidade para pagar”) de cada um e não segundo o que cada um eventualmente receba em bens ou serviços públicos (critério do benefício).

De forma recorrente, a jurisprudência do Tribunal Constitucional Acórdão n.º 142/2004 de 10 de Março, processo 453/2003; Acórdão 711/2006 de 29 de Dezembro 2006, processo 1067/06; Acórdão 306/2010 de 14 de Julho 2010, processo 107/10.
tem vindo a abordar este princípio estruturante e a aplicá-lo no ordenamento jurídico tributário.

Destacamos o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 451/2010, de 24/11/2010: “(…) No mesmo sentido – e mais recentemente –, o Acórdão nº 84/03 (in D.R., II Série, nº 124, de 29-5-2003, pp. 8338ss) articulou o princípio da capacidade contributiva com a possibilidade de o contribuinte dispor de meios para ilidir os resultados de determinadas formas de tributação: (…)
Não obstante o silêncio da Constituição, é entendimento generalizado da doutrina que a “capacidade contributiva” continua a ser um critério básico da nossa “Constituição fiscal” sendo que a ele se pode (ou deve) chegar a partir dos princípios estruturantes do sistema fiscal formulados nos artigos 103º e 104º da CRP (cfr. Casalta Nabais “O dever fundamental de pagar impostos”, págs. 445 e segs., onde, no entanto, se defende que, embora o princípio não careça – para ter suporte constitucional – de preceito específico e directo, não é de todo inútil ou indiferente a sua consagração expressa). (…)
De todo o modo, deve reconhecer-se não ser fácil retirar consequências jurídicas muito líquidas e seguras do princípio da capacidade contributiva, traduzidas num juízo de inadmissibilidade constitucional de certa ou certas soluções adoptadas pelo legislador fiscal. [...] certos métodos de tributação, pela sua mesma estrutura, podem, afinal, acabar por conduzir à imposição de situações ou realidades em que falece, de todo, a capacidade contributiva, ou (e com maior probabilidade) em que a medida do imposto exigido não tem efectiva correspondência com essa capacidade, indo além (e, porventura, bastante além) dela; é o que ainda Casalta Nabais (“O dever fundamental...”, págs. 497/498 e 501/502) considera, quando se refere a “soluções tradicionais do direito dos impostos” com suporte no “interesse fiscal”, em particular as “presunções”, considerando esta técnica legislativa “movida por legítimas preocupações de simplificação de praticabilidade das leis fiscais”, mas que “tem de compatibilizar-se com o princípio da capacidade contributiva, o que passa, quer pela ilegitimidade das presunções absolutas, na medida em que obstam à prova da inexistência da capacidade contributiva visada na respectiva lei, quer pela idoneidade das presunções relativas para traduzirem o correspondente pressuposto económico do imposto” e, mais adiante, aludindo ao “rendimento normal”, quando sustenta que ele “apenas poderá ser contestado nos casos em que a tributação conduza a situações de intolerável iniquidade
Mas, se nos ativermos ao que aquele autor escreve na obra citada [...], não pode deixar de se concluir que a solução em causa se compatibiliza com o princípio da capacidade contributiva. É que, a admitir-se que na hipótese em apreço se está perante uma “presunção”, ela admite prova em contrário e, a considerar-se que se trata de uma tributação pelo “rendimento normal”, não pode dizer-se que ela necessariamente conduza a “situações de intolerável iniquidade”. Por outro lado, perante a norma que estatui que “a tributação das empresas incide fundamentalmente sobre o rendimento real” – essa, sim, expressamente consagrada no artigo 104.º, n.º 2, da CRP –, o Tribunal Constitucional tem entendido que “não só não é constitucionalmente imperioso que o rendimento tributável consista sempre e apenas no rendimento real, tal como aparentemente resulta da contabilidade empresarial, mas também tal rendimento não é, em si próprio, uma realidade de valor fisicamente apreensível, antes sendo um conceito normativamente modelado” (Acórdãos n.ºs 85/2010 e 162/2004, disponíveis em www.tribunalconstitucional.pt).(...)”.
É entendimento do Tribunal Constitucional e da jurisprudência do STA que os princípios da capacidade contributiva e da tributação pelo lucro real não são absolutos. Estes têm como limites outros valores constitucionalmente protegidos, numa ponderação global dos interesses em presença, devendo dar-se prevalência à protecção do interesse público no combate à fuga e evasão fiscal, subjacente às exigências de natureza formal.
O mecanismo em apreço consubstancia um instrumento de que o contribuinte pode lançar mão no sentido de assegurar a tributação pelo lucro real. Daí que, apresentando-se a exigência de apresentação de documentos de autorização de acesso à informação bancária dos administradores ou gerentes igual para todos os contribuintes que pretendam arredar a previsão constante do artigo 64.º, n.º 2 do CIRC e dar início ao procedimento previsto no artigo 139.º do mesmo Código, não vislumbramos que esta norma deva ser afastada por violação do princípio da igualdade.
Perante estes dados, resulta claro que a exigência a que alude a Recorrente não coloca em causa a Lei Fundamental nos termos propostos, pois que está em causa um mecanismo que visa beneficiar a própria Requerente, em que o elemento em apreço surge no âmbito do princípio da cooperação que incide sobre o mesmo, sendo algo natural neste processo enquanto meio de controlo da pretensão formulada, não se afigurando desproporcionada para o efeito em apreço, estando devidamente balizada nos termos apontados no aresto do STA acima descrito e noutros, como o Acórdão do STA-2ª.Secção, de 05/09/2012, recurso n.º 0837/12; ou o Acórdão do TCA Sul-2ª. Secção, de 19/02/2013, processo n.º 6091/12; ou o Acórdão do TCA Norte, de 11/02/2021, proferido no âmbito do processo n.º 216/09.4BEPRT. Logo, as conclusões 7.ª a 33.ª das alegações de recurso deverão improceder [16.ª a 23.ª Princípio da reserva da intimidade da vida privada; 7.ª a 9.ª, 32.ª e 33.ª Princípio do Estado de Direito e de acesso ao direito e à tutela jurisdicional efectiva; 24.ª a 31.ª Princípio da proporcionalidade; 10.ª a 13.ª, 32.º e 33.ª Princípio da tributação das empresas pelo rendimento real e princípio da igualdade tributária].
Na medida em que não se consideraram verificadas as enunciadas inconstitucionalidades, haverá que apreciar se o ato em crise infringiu o disposto no artigo 63.º - B da LGT, pelo que padece, igualmente, a sentença recorrida de erro de julgamento sobre a matéria de direito.
O artigo 63.º-B da LGT refere-se às situações em que é a própria Autoridade Tributária, independentemente de autorização do tribunal ou do interessado, que decide aceder à totalidade dos documentos cobertos pelo sigilo bancário.

Assim sendo, mais uma vez, acompanhamos e confirmamos o que é referido na sentença recorrida: “(…) no procedimento previsto no artigo 139.º do C.I.R.C. não existe uma derrogação de sigilo bancário da iniciativa da A.T. mas sim da iniciativa do contribuinte. O âmbito de aplicação daquele procedimento não se confunde com o do artigo 63.º-B da L.G.T., pois estamos perante um acto voluntário do contribuinte, ou seja, não é A.T. que acede à informação bancária sem autorização do contribuinte.
De facto, nos termos do artigo 139.º do C.I.R.C., a derrogação do sigilo bancário carece sempre de autorização do requerente e dos seus administradores ou gerentes, pelo que, em caso de recusa ou de não apresentação dos documentos de autorização, a A.T. não pode aceder directamente, ao contrário do que prevê o artigo 63.º-B da L.G.T. (…)”.

Diversamente, o procedimento previsto no artigo 139.º do Código do IRC, previsto no Capitulo VIII do Código do IRC, referente às garantias dos contribuintes, não pressupõe qualquer derrogação de sigilo bancário por iniciativa da Autoridade Tributária, mas sim do contribuinte e tem em vista o seu interesse – de obviar à aplicação do disposto no artigo 64.º, n.º 2 do mesmo diploma legal que impõe a realização de correcções ao valor de transmissão de direitos reais sobre bens imóveis quando inferior ao VPT - e não o da AT. A derrogação do sigilo aqui prevista não é o fim visado pela norma, mas apenas um meio adequado e necessário à obtenção do fim visado (de tributação pelo lucro real e afastamento de uma norma anti abuso).

Destarte, tratando-se de preceitos distintos cujo âmbito é diverso e que não se confundem, não se vê em que medida é que a exigência das declarações de autorização para a AT aceder aos documentos bancários dos administradores encerra em si qualquer ilegalidade e/ou violação de qualquer princípio ou limite imposto pelo legislador, motivo pelo qual improcede o vício alegado.

Alega, ainda, a Recorrente que, a admitir-se a exigibilidade das autorizações de derrogação de sigilo bancário, a mesma apenas se poderia aceitar, no máximo, no caso de a AT efetivamente considerar, em concreto, imprescindível e justificado o acesso às informações bancárias e nunca quando o acesso seja concretizado através de uma exigência cega e não justificada, consubstanciada na obrigatoriedade de apresentação das autorizações de levantamento do sigilo bancário em qualquer circunstância.
Também neste aspeto, consideramos que a sentença recorrida julgou corretamente, pelo que confirmamos esse julgamento:
“(…) Do n.º 6 do artigo 139.º do C.I.R.C. decorre a obrigatoriedade de junção ao pedido dos documentos de autorização de acesso à informação bancária, mas, ao contrário da tese da Autora, já não decorre o acesso não justificado e cego a essa informação por parte da A.T..
Por outras palavras, diremos que a exigibilidade das autorizações não é sinónimo de um acesso cego e injustificado à informação. De facto, no referido normativo é utilizada a expressão “pode aceder”, o que significa que o legislador não impõe que a A.T. aceda; ou seja, caso a A.T. entenda que os elementos apresentados pelo sujeito passivo são suficientes para demonstrar o preço efetivamente praticado, deve abster-se de aceder à informação bancária mas em caso de dúvidas sobre a correspondência entre o preço declarado e o preço efectivamente praticado, a A.T. tem não só o poder como o dever/ónus de aceder à informação bancária com vista a dissipar tais dúvidas.
Nestes termos, ao contrário do entendimento da Autora, esta tinha sempre de apresentar os documentos de autorização, e depois a A.T., perante os elementos apresentados, decidiria se seria ou não necessário aceder à informação bancária. (…)”.

Alertamos que, mesmo nos casos em que lhe é permitido o acesso a toda a documentação bancária, a atuação da Administração Tributária deverá limitar-se ao que for necessário para obtenção dos fins em vista, como impõe o princípio da proporcionalidade, que deve nortear a sua atuação (cfr., neste sentido, Diogo Leite de Campos, Benjamim da Silva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa, Lei Geral Tributária Anotada, 4ª edição, pág. 569).

Ora, esta autorização de acesso às contas bancárias só poderá valer para o procedimento em causa e não para qualquer outro, uma vez que o fim daquele procedimento é claramente determinado, sendo as ações adotadas adequadas e proporcionais aos objetivos a atingir.
Assim, a autorização que seja concedida na qualidade de administrador da referida empresa, para os efeitos do artigo 139.º, n.º 6 do CIRC, não permite concluir que este consentimento permitirá à AT a utilização de elementos protegidos pelo sigilo bancário para outros fins que não os constantes do referido normativo – cfr., neste sentido, o Acórdão do STA, de 05/09/2012, proferido no âmbito do processo n.º 0837/12.

Tendo improcedido todas as conclusões do recurso referentes ao alegado erro de julgamento da matéria de direito, fica prejudicado o conhecimento do erro de julgamento de facto, dado que de nada serve estarem reunidos todos os demais pressupostos, se falta o requisito legal, imprescindível, para dar início ao procedimento previsto no artigo 139.º, n.º 3 do CIRC – a autorização de levantamento do sigilo bancário referente aos administradores da Recorrente (cfr. o seu n.º 6).
Nesta conformidade, não deveria o requerimento de prova de preço efectivo em questão ser deferido para efeitos da validação dos montantes declarados pela Recorrente, como de facto não foi, uma vez que não estão reunidos todos os requisitos previstos no artigo 139.º do CIRC.

Pelo exposto, impõe-se negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.

4. Decisão

Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte, em negar provimento ao recurso jurisdicional interposto pela Recorrente e manter a decisão recorrida.
*
Custas a cargo da Recorrente, que sai vencida neste recurso (Artigo 527.º, n.º 1 e 2 do CPC).
*
Porto, 15 de abril de 2021


Maria do Rosário Pais – Relatora
Tiago Afonso Lopes de Miranda – 1.º Adjunto
Cristina da Nova – 2.ª Adjunta