Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00669/05.0BECBR
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:05/13/2021
Tribunal:TAF de Coimbra
Relator:Rosário Pais
Descritores:IVA; SERVIÇOS ISENTOS; ÓNUS DA PROVA; SERVIÇOS DE FISIOTERAPIA PRESCRITOS E SUPERVISIONADOS POR NUTRICIONISTA
Sumário:I – Em sede de decisão de facto, não é, em princípio, aplicável o regime das nulidades da sentença previsto no artigo 615.º, n.º 1, alíneas b) e c), do CPC.

II - Decorrente dos artigos 342.º do Código Civil e 74.º, n.º 1, da Lei Geral Tributária, que o ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos da AT ou dos contribuintes recai sobre quem os invoque.

III - Invocando a Recorrente a isenção da liquidação de IVA nas operações de prestação de serviços de “fisioterapia”, impendia sobre ela o encargo de demonstrar a verificação dos pressupostos de tal isenção.*
* Sumário elaborado pela relatora
Recorrente:M., Lda.
Recorrido 1:Fazenda Pública
Votação:Unanimidade
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido de dever ser negado provimento ao recurso.
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência os Juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:
*

1. RELATÓRIO
1.1. M., Lda., devidamente identificado nos autos, vem recorrer da sentença proferida no Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra em 13.06.2013, pelo qual foi julgada improcedente a impugnação judicial deduzida contra as liquidações adicionais de IVA dos anos de 2001 a 2003 e dos correspondentes juros compensatórios, no valor global de €99.740,11.

1.2. O Recorrente terminou as respetivas alegações formulando as seguintes conclusões:

“a) A douta sentença procedeu a um errado julgamento da matéria de facto na parte em que deu como não provado que a execução das actividades classificadas como “fisioterapia” fosse supervisionada por um nutricionista por entender que “a supervisão é um conceito aberto, conclusivo, que carece de ser analisado em actos concretos que não foram alegados”.
b) Não é exacto que o conceito de supervisão, no caso dos autos, seja um conceito aberto, indeterminado ou conclusivo, sendo claro que no contexto em que o termo vem referido, “supervisão” significa direcção e controlo por parte do médico nutricionista.
c) Face às regras de experiência comum, é patente que a referência à realização de um determinado tratamento sob supervisão médica pressupõe que o mesmo seja determinado no an e no quantum por esse profissional, tendo essa realidade sido demonstrada pela prova testemunhal produzida, como se desenvolveu nas alegações.
d) Por outro lado, contrariamente ao invocado na sentença, a recorrente alegou e provou factos que integram o referido conceito de supervisão, tais como:
c) Os tratamentos chamados de fisioterapia efectuados pela impugnante são prescritos por nutricionistas (art. 64.º da pi).
ci) São essencialmente tratamentos mecânicos, isto é totalmente automatizados e executados pelo equipamento, limitando-se a intervenção humana do nutricionista à prescrição e instrução da parametrização das máquinas. (art. 65.º da p.i.).
cii) são “actividades não requerem a presença permanente de um médico, uma vez que, se desenrolam de forma quase completa através de aparelhos mecânicos, mas apenas a sua supervisão e a respectiva parametrização das máquinas” (art. 31.º da p.i.).
e) Sobre essa realidade fáctica não foi feita qualquer menção ou recaiu qualquer juízo do Tribunal recorrido, o que configura uma nulidade por omissão de pronúncia por se tratarem de factos nos quais se encontra assente o pedido formulado pela impugnante e que contraditam o juízo administrativo, sendo que os mesmos deviam ter sido dados por provados, como alegado.
f) As Correntes de Kotz (TRIMII), os Campos Magnéticos (TRIMI) e a Drenagem linfática mecânica (Endermologia), quando prescritas, dirigidas e parametrizadas por médico nutricionista, integram a isenção prevista no CIVA, porquanto o nutricionista é um profissional que exerce uma actividade paramédica tal como consta da lista do Decreto-Lei n.º 261/93, encontrando-se o exercício dessa actividade profissional tipificada na isenção prevista na alínea b) do n.º 1 do artigo 9.º do CIVA, que abrange as prestações de serviços efectuadas no exercício das (...) profissões de médico, odontologista, parteiro, enfermeiro e outras profissões paramédicas”.
g) Tratando-se de um tratamento que pode ser prescrito por um médico ou por um nutricionista, a sua realização sob direcção, supervisão, orientação daqueles é acto que se reconduz ao exercício da profissão médica ou paramédica e da exclusiva responsabilidade desse profissional, cabendo na letra e na ratio da citada norma.
h) A douta sentença olvida que se tratam de tratamentos essencialmente mecânicos e em que toda a intervenção humana relevante sobre a máquina, seja na definição do tratamento, seja na sua duração, nível ou intensidade era efectuada por profissional habilitado para o exercício de profissão paramédica.
i) Assim, o facto do tratamento ser executado por massagistas ou auxiliares de fisioterapia, reconduz-se a um mínimo que não pode ser confundido com qualquer actuação material que determine a alteração da qualificação do tratamento. O ligar ou desligar da máquina de acordo com as instruções recebidas, tendo o demais sido estabelecido pelo profissional, no exercício da sua actividade, não transporta para fora da previsão do artigo 9.º, um tratamento prescrito, dirigido, supervisionado e configurado por um profissional de saúde.
j) O Tribunal afastou a aplicabilidade da isenção prevista no n.º 2 do artigo 9.º do CIVA, com base no argumento de que a impugnante não provou que o estabelecimento da impugnante fosse licenciado ou sequer redutível ao conceito de hospital ou clínica médica, enquanto estabelecimento de prestação de cuidados médicos, dispensário ou estabelecimento similar.
k) No entanto, a impugnante alegou a prestação de serviços ao nível da saúde e, como tal, a consideração de que a Clínica (...) se trata de um estabelecimento onde são prestados cuidados de saúde, decorre da Lei, sendo obrigatório o registo dessa actividade junto da Entidade Reguladora da Saúde ERS, nos termos do disposto no Decreto-Lei n.º 127/2009 em conjugação com a Portaria n.º 52/2011.
l) O que vale por dizer que a impugnante é legalmente considerada como estabelecimento de saúde por ser uma “instalação fixa onde com carácter profissional são prestados cuidados de saúde”, estando sob alçada da ERS e sujeita ao registo obrigatório quanto ao exercício dessa actividade.
m) Sendo o estabelecimento da impugnante considerado um estabelecimento de saúde e como tal sujeito à respectiva entidade reguladora, não pode o mesmo deixar de integrar a previsão do artigo 9.º, n.º 2, do CIVA, pelo menos na parte em que aí se referem os estabelecimentos similares aos que realizam a prestação de cuidados médicos na parte em que a impugnante presta cuidados de saúde como sejam as consultas de nutrição e os tratamentos de Correntes de Kolz (TRIMII), Campos Magnéticos (TRIMI) e Drenagem linfática mecânica (Endermologia).
n) Assim, seja com base na alínea b) do n.º 1 do artigo 9.º, seja com base no seu n.º 2, do CIVA, e no cotejo dos factos relevantes para a decisão do caso, pode concluir-se que o pressuposto subjacente à liquidação não se verifica na medida em que não nos encontramos perante meros tratamentos do âmbito da estética, e que, sendo os mesmos realizados em estabelecimento de prestação de cuidados de saúde, prescritos por profissionais de saúde, que procedem à configuração/parametrização dos aparelhos que executam os tratamentos, encontram-se isentos de IVA.
Termos em que e nos mais de direito deve o presente recurso ser julgado provido, revogando-se a sentença recorrida e proferindo-se douto acórdão que julgue a impugnação procedente com todas as legais consequências.”

1.3. Não foram apresentadas contra-alegações.

1.4. O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu o parecer, com o seguinte teor:
“1 — Vem o presente recurso jurisdicional interposto da sentença proferida pelo TAF de Coimbra em 13.6.2013 que decidiu julgar improcedente a impugnação judicial.
2 — A impugnante/recorrente veio deduzir impugnação judicial pedindo a anulação das liquidações adicionais de IVA relativas aos anos de 2001 a 2003 e juros compensatórios, no valor global de 99 740,11 €, todas emitidas em 15.6.2005, na sequência de correcções aritméticas levadas a cabo no âmbito de um procedimento de inspecção tributária de que foi objecto.
3 — Alega, em síntese: insuficiência de fundamentação do relatório inspectivo/falta de fundamentação por incumprimento dos artºs 84º nº3 e 77º nºs 4 e 5 da LGT/ violação das regras do ónus da prova constantes do artº 74º da LGT e erro nos pressupostos de facto e de direito, concluindo pela procedência da impugnação e anulação das liquidações e juros impugnados.
4 — A FP na contestação pugna pela legalidade e manutenção das liquidações adicionais e juros compensatórios e pela improcedência da impugnação.
5 — Foi produzida prova testemunhal.
6 — A impugnante apresentou alegações escritas.
7 — Nas conclusões das alegações a recorrente vem arguir a nulidade da sentença decorrente da omissão de pronúncia e imputar-lhe erro de julgamento.
8 — Não foram juntas contra-alegações.
9 — No despacho proferido ao abrigo do disposto no artº 617 do NCPC constante de fls 291 e v., o Sr. Juiz pronuncia-se no sentido da inexistência da alegada nulidade e manutenção do decidido.
10 — Entendemos que não assiste razão á recorrente.
11 — Não se acompanha, por isso, a argumentação desenvolvida nas suas alegações, uma vez que a decisão recorrida, fez correcta valoração da prova e acertada interpretação dos factos e aplicação do direito, com apoio na jurisprudência, não violando qualquer norma legal, razão pela qual deverá ser mantida.
Assim,
12 — No que respeita á invocada nulidade da decisão, remete-se para a fundamentação do despacho de sustentação ou reparação do agravo e, pelas razões e fundamentos aí desenvolvidos a que se adere, afigura-se-nos que não padece de nulidade.
Com efeito,
13 — Tal nulidade, “só ocorrerá nos casos em que o tribunal pura e simplesmente não tome posição sobre qualquer questão sobre a qual devesse tomar posição, inclusivamente não decidindo explicitamente que não pode dela tomar conhecimento” — Jorge Lopes de Sousa, in CPPT, I vol., 2006, pág.912.
14 — A omissão de pronúncia como nulidade da sentença só se verifica quando o juiz tenha deixado de proferir decisão sobre questões de que devia conhecer e não quando tenha deixado de apreciar qualquer argumento ou raciocínio apresentado pelas partes em defesa das teses por si expendidas.
Mas,
15 - Também não ocorre erro de julgamento, pois, contrariamente ao entendimento da recorrente, a sentença impugnada encontra-se suficientemente fundamentada de facto e de direito.
Na verdade,
16 — O Tribunal seleccionou toda a matéria de facto relevante e pronuncia-se sobre todas as questões para a boa decisão da causa, dando a conhecer as razões que o levaram a decidir como decidiu.
Termos em que
deve ser NEGADO provimento ao recurso.”

Dispensados os vistos legais, nos termos do artigo 657.º, n.º 4, do CPC, cumpre apreciar e decidir, pois que a tanto nada obsta.


2. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR

Uma vez que o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações da Recorrente, cumpre apreciar e decidir se a sentença recorrida enferma de nulidade por omissão de pronúncia, bem como de erro de julgamento de facto e de direito.

3. FUNDAMENTAÇÃO
3.1. DE FACTO
A decisão recorrida contém a seguinte fundamentação de facto:

“Atentas as posições das partes e considerando os documentos juntos com os articulados e integrantes do PA, julgo provados os seguintes factos suficientes para a discussão e ou a decisão do objecto do processo:
1
Nos anos de 2001 a 2003 a impugnante encontrava-se tributada em IRC no regime geral com contabilidade regularmente organizada, pela actividade de “actividades de investigação e segurança” CAE 64600, e registada em IVA no regime normal de periodicidade trimestral, utilizando o sistema de dedução parcial (pró rata) aplicável a actividade mista.
2
Sem embargo, nos anos supra referidos a Impugnante exerceu a sua actividade no âmbito de um contrato dito de “franchising” cuja cópia a fs. 15 e segs aqui se dá como reproduzida, no âmbito do qual podia utilizar o nome “P.” nas venda de produtos e prestação de serviços em “Clínicas/institutos nas áreas da saúde, beleza, estética, tratamentos, comercialização de produtos dietéticos e cosmética e outros serviços conexos “(cf. contrato).
3
A impugnante foi alvo de um procedimento de inspecção externa que incidiu sobre os anos de 2001 a 2003, no âmbito do qual foi elaborado o relatório final de fls. 27 e sgs do p.a., do qual resultaram correcções aritméticas à matéria colectável em IVA, relatório que se dá por integralmente reproduzido e do qual se destaca os seguintes segmentos:
FACTOS E FUNDAMENTOS DE CORRECÇÕES ARITMÉTICAS -
a) Caracterização e actividade da empresa
A empresa em análise foi constituída em 00.06.20 por escritura do 4º Cartório Notarial de Coimbra, como sociedade por quotas e, objectivamente, destinada a exercer a sua actividade em regime de “franchising”, conforme contrato respectivo firmado em 00.04.03 com P. Lda, NIPC (…), em data anterior à sua constituição e em nome de um dos sócios-gerentes, tendo, este, por aditamento, transmitido a sua posição contratual à firma entretanto constituída, M., Lda.
De acordo com o artigo segundo do contrato de sociedade, aquela tem por objecto “a organização de actividades de segurança, higiene e saúde no trabalho, a gestão e exploração de serviços de saúde e estética, a representação e comercialização de produtos de estética.
Segundo o nº 3 da cláusula primeira do contrato de “franchising” antes referido, “o objecto da actividade comporta a existência de clinicas/institutos nas áreas da saúde, beleza, estática, tratamentos, comercialização de produtos dietéticos e cosmética e serviços conexos.
Possuindo instalações, arrendadas, especialmente adaptadas ao exercício da actividade, conforme cláusulas contratuais expressas, situadas na Av. (...), nesta cidade de Coimbra, interessa caracterizar, concretamente, que tipo de tratamentos e intervenções são praticados, uma vez que é determinante saber se estamos perante actos médicos ou paramédicos ou se pelo contrário, se limitam a intervenções no âmbito de tratamentos estéticos, uma vez que em alguns casos não basta a designação que é atribuída mas é fundamental esta caracterização com vista ao seu enquadramento em sede de IVA, na medida em que só aproveitam da isenção da alínea b) do nº. 1 e nº. 2 do artº. 9º do respectivo código, as actividades aí referidas ligadas intrinsecamente á saúde humana.
Para o exercício de actividades médicas e paramédicas apenas estão habilitados os profissionais de saúde com formação própria, como sejam os médicos, enfermeiros e outros técnicos de saúde com habilitações específicas.
Segundo definição do dicionário da língua portuguesa contemporânea da Academia das Ciências de Lisboa, clínica é um “estabelecimento hospitalar privado que comporta um conjunto de instalações e sectores organizados para ministrar consultas, tratamentos médicos ou intervenções cirúrgicas e internamento de doentes.”, ou um “consultório particular ou local de atendimento de doentes, sem internamento e onde exercem medicina vários médicos de uma ou várias especialidades.”, logo, à luz destas descrições, compete-nos caracterizar e definir o estabelecimento da empresa.
Pelo preçário de serviços que nos foi facultado e que existe no estabelecimento, podemos verificar que com a pequena excepção das consultas de nutrição e psicologia clínica, todos os serviços oferecidos se desenvolvem no âmbito estético e de beleza, logo, não nos parece que o mesmo se insira em qualquer das acepções de clínica supra referendadas, mais nos parecendo um instituto de beleza onde pontualmente surgem umas consultas na área da saúde, tanto assim que, questionados os responsáveis sobre a identificação do director clínico que é legalmente exigível em qualquer unidade de saúde, me foi afirmado que não existe e, segundo um fax de 04.1202 da empresa “franshisadora”, a mesma afirma peremptoriamente que no âmbito da actividade de nutrição não é exigível qualquer director clínico, logo, mais se confirma não estarmos perante uma clínica de saúde e onde o acompanhamento médico se resume à área da nutrição.
a) Quadro de pessoal e colaboradores
Ainda para aquilatar da qualidade dos serviços prestados, interessa analisar a formação académica dos colaboradores e, compulsando os quadros de pessoal da empresa, referentes aos anos de 2001, 2002 e 2003, verifica-se que com excepção da sócia-gerente, T. que é psicóloga, temos duas recepcionistas uma relações publicas e quatro técnicas de estética cujas habilitações literárias medeiam entre o antigo ensino primário, o 9º ano e o 12º ano de escolaridade.
Relativamente a outros colaboradores, apenas os há em regime liberal ou sob contrato de prestação de serviços prestados pela entidade “franshisadora”, segundo dois contratos, ambos de 02.06.18, o que acontece com o Dr. S. que segundo o seu “curriculum vitae” é licenciado em Ciências da Nutrição pela Faculdade de Ciências de Nutrição e Alimentação da Universidade do Porto. Este profissional, em princípio, é que assegura as consultas de nutrição por conta da casa-mãe que factura regularmente estes serviços à “franchisada”.
Daqueles contratos de prestação de serviços consta que a firma “P. Lda” presta serviços de consultas médicas e de nutrição, obrigando-se a firma M. a contratar profissionais para o efeito sob a orientação técnica dos Drs. H. e P., no entanto, na cláusula segunda daqueles contratos diz-se que “os profissionais que vierem a ser contratados assegurarão a prestação de serviços clínicos com total autonomia, independência técnica e isenção.”. Ficamos sem saber muito bem em que condições de responsabilidade é que estes serviços são prestados, todavia, aquele profissional presta os serviços por conta da entidade “franshisadora” que por sua vez os factura à “franchisada”, logo, aquela cede não a orientação técnica mas o próprio técnico.
Da grelha de colaboradores permanentes e eventuais, nenhum, sequer, é da área de medicina, o que reforça a ideia de que não estamos perante uma clínica médica.
Dos elementos analisados, conclui-se ainda pela colaboração de uma nutricionista, M., que no entanto apenas apresenta um recibo mod/6 de €236,70 no ano de 2001 e de uma médica de clínica geral, C., que apresenta seis recibos mod/6 em 2001 no total de 734,36 e três recibos em 2002 no valor total de € 176,66, o que representa uma participação meramente esporádica no contexto dos serviços de saúde.
b) Natureza dos proveitos
Como se deixou antever, a actividade principal da firma é a de prestação de serviços, no entanto, mantém igualmente um sector de vendas que se referem a produtos dietéticos e de cosmética.
Utiliza duas séries de recibos (não usa facturas ou vendas a dinheiro) sendo uma para a prestação de serviços e outra para a venda dos produtos, fazendo por aqui a diferenciação entre o sector tributado e o sector isento de IVA, sendo que nas vendas é liquidado o imposto à taxa normal e toda a prestação de serviços é considerada isenta de IVA.
Nos recibos referentes aos serviços é indicada a referência “isento de IVA”, sem que se indique ou refira os termos dessa isenção que se pressupõe ser a prevista no artº. 9º por alegadamente se referir a serviços de saúde.
E desta discriminação que surge a utilização da percentagem de dedução de imposto (pro-rata) que foi de 13%, 17% e 12%, respectivamente em 2001, 2002 e 2003, coincidindo estas percentagens, como se deduz, com o peso das vendas sobre o total dos proveitos.
Se a série de recibos referente às vendas não nos mereceu reparo, o mesmo já não sucede na referente aos serviços, porquanto, estes, nestes três exercícios analisados, se distribuem por consultas de nutrição e tratamentos de fisioterapia sendo que estes últimos são majoritários, representando 78%, 51% e 90%, respectivamente nos exercícios de 2001, 2002 e 2003 do total dos serviços o que nos leva a uma questão elementar: onde se incluem os tratamentos estéticos e de beleza se a empresa mantém no quadro, quatro profissionais deste sector?
Relativamente aos tratamentos de fisioterapia e recorrendo mais uma vez ao dicionário já antes citado, fisioterapia é um “tratamento de doenças ou recuperação de lesões através de agentes físicos ou por meios mecânicos…”, logo, pressupõe um processo de diagnóstico médico de fisiatria, prescrição do tratamento específico para cada caso diagnosticado e desenvolvimento dos tratamentos correspondentes com acompanhamento de técnicos fisioterapeutas. Ora, nada disto se passa, na medida em que não há processos clínicos das pessoas sujeitas a esses tratamentos nem profissionais vocacionados para esta área da medicina, logo, não se trata de tratamentos de fisioterapia mas outros, no âmbito do tratamento estético do corpo e como tal, consubstanciando serviços tributados em sede de IVA, tanto assim que o acompanhamento dos utentes é feito pelas técnicas de estética. Corroborando esta conclusão, nenhum dos recibos analisados refere qualquer sistema ou subsistema de saúde que como é sabido, inclui este tipo de tratamento nas suas comparticipações, logo, ao não fazê-lo, é por que aqueles se encontram fora do âmbito da medicina convencional e, consequentemente, não abrangidos por qualquer das isenções da alínea b) do nº. 1 e nº. 2 do art.º 90 do CIVA. (itálico e carregado meus).
d) Apuramento do IVA em falta
De acordo com as conclusões da alínea anterior e da análise efectuada, verifica-se que o sector não tributado se refere apenas ás consultas de nutrição e uma ou outra de psicologia clinica, que se identificam nos respectivos recibos, sendo que, todos os recibos que referem “tratamentos de fisioterapia”, respeitam a serviços estéticos sujeitos a tributação e, destes, juntamos em anexo a este relatório para dele fazer parte integrante, uma relação em 9 folhas onde se identificam os recibos em que deveria ter sido liquidado IVA e o correspondente imposto agora liquidado que se resume no quadro seguinte:
(...).
4
Segue-se uma enunciação dos valores somados dos recibos sem IVA ditos relativos a “Tratamentos de Fisioterapia”, por período trimestral, desde Janeiro de 2001 a Dezembro de 2003, com o cálculo do IVA não cobrado em cada trimestre.
5
Em anexo ao relatório foi elaborada uma lista exaustiva dos recibos passados sem IVA e relativos a “tratamentos de fisioterapia”, dos anos de 2001 a 2003.
6
Com base neste relatório, sancionado por despacho de 23/9/2003, foram emitidas e notificadas, para pagamento, à Impugnante as liquidações adicionais de IVA e juros compensatórios ora impugnadas, cujas cópias de fs. 28 a 51 aqui se dá como reproduzidas.
Da inquirição de testemunhas e dos documentos de fs. 112 a 115, 116 a 143 e 145 e 146, juntos pela Impugnante, resulta ainda a prova dos seguintes factos relevantes para a discussão da causa:
7
No período de 2001 a 2003 a impugnante prestava os serviços de aplicação de correntes de Kotz (vulgo TRIM II), Campos Magnéticos e Drenagem Linfática Mecânica), que mencionava como fisioterapia nos recibos que emitia.
8
Estas actividades têm por objectivo a activação da circulação sanguínea, o tratamento de edemas linfáticos e ainda a tonificação muscular.
9
As Correntes de Kotz (vulgo TRIM II) produzem uma acção estimulante que optimiza o metabolismo oxidativo dos ácidos gordos, evitando o enfraquecimento muscular. As Correntes de Kotz foram criadas por um cientista russo quando preparava um programa para os atletas olímpicos russos, com o objectivo de fortalecer a massa muscular e evitar o aparecimento de lesões.
10
Nos estabelecimentos que usam o nome “P.” este método é usado para tratamento da hipotrofia muscular (enfraquecimento dos músculos) e para eliminar o excesso de gordura.
11
Dez minutos deste tratamento aplicado na região abdominal equivalem a 600 (seiscentos) abdominais.
12
As Correntes de Kotz estão particularmente indicadas para as pessoas idosas que têm enfraquecimento do tónus muscular e que não podem fazer ginástica devido à sua idade avançada e risco de sobrecarga cardíaca.
13
Os Campos Magnéticos (vulgo TRIM 1) permitem tratar a lipodistrofia e a má circulação sanguínea evitando o aparecimento de fibroses e edemas linfáticos.
14
Os Campos Magnéticos servem para desfazer os nódulos de gordura (fibroses) que interrompem a circulação linfática e causam celulite, edemas, retenção de líquidos e varizes.
15
Drenagem Linfática Mecânica (vulgo Endermologia) é uma técnica de massagem mecânica profunda de recuperação que restaura a circulação de retorno do tecido conjuntivo da hipoderme.
16
Para além de activar a circulação, reduz a gordura localizada e celulite que muitas vezes dão origem aos derrames e varizes.
17
É também um tratamento para recuperar o tónus muscular após cirurgia.
18
Quando alguém sofre de obesidade e consegue perder peso com um regime alimentar equilibrado deve fazer tratamento de endermologia para evitar a flacidez e a hipotrofia muscular.
19
Estas actividades eram executadas por massagistas e auxiliares de fisioterapeuta, não detentores da habilitação académica e profissional de fisioterapeuta.
20
Em resposta ao pedido da Sociedade Comercial “Persona — Clinicas de Nutrição e Estética, Lda”, a Administração Fiscal emitiu a informação nº 1006 de 10/1/2005, cujo teor de fs. 157 a 160 dos autos aqui se dá como reproduzida.
21
Procedendo despacho de 26/2/86, em resposta a consulta da sociedade comercial S. Lda, foi emitida pelo serviço de administração do IVA da Direcção Geral das Contribuições e impostos a informação nº E.N. 683/86, cujo teor a fs. 65 e 66 aqui se dá como reproduzido.
Não se provou:
Que a execução destas actividades fosse supervisionada por um nutricionista.
Com efeito, por um lado, a supervisão é um conceito aberto, conclusivo, que carece de ser analisado em actos concretos, que não foram alegados. Por outro lado, tal como se refere no relatório inspectivo, um pagamento de apenas 236,70 e em 2001 é incompatível com a colaboração estreita e permanente de um nutricionista, de 2001 a 2003.”.

3.2. DE DIREITO
3.2.1. Da nulidade da sentença

A Recorente entende que a sentença enferma de nulidade por omissão de ronúncia porquanto o Meritíssimo Juiz a quo nada referiu quanto aos factos seguintes:
« c) Os tratamentos chamados de fisioterapia efectuados pela impugnante são prescritos por nutricionistas (art. 64.º da pi).
ci) São essencialmente tratamentos mecânicos, isto é totalmente automatizados e executados pelo equipamento, limitando-se a intervenção humana do nutricionista à prescrição e instrução da parametrização das máquinas. (art. 65.º da p.i.).
cii) são “actividades não requerem a presença permanente de um médico, uma vez que, se desenrolam de forma quase completa através de aparelhos mecânicos, mas apenas a sua supervisão e a respectiva parametrização das máquinas” (art. 31.º da p.i.).».

Preceitua o artigo 125.º, n.º 1, do CPPT que «Constituem causas de nulidade da sentença a falta de assinatura do juiz, a não especificação dos fundamentos de facto e de direito da decisão, a oposição dos fundamentos com a decisão, a falta de pronúncia sobre questões que o juiz deva apreciar ou a pronúncia sobre questões que não deva conhecer.».

No mesmo sentido estabelece a alínea d) do n.º 1 do artigo 615.º CPC, aplicável ex vi artigo 2.º, alínea e) do CPPT, ao estatuir que «1. É nula a sentença quando: (…) d) O Juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento; (…)».

Este vício está relacionado com a norma que disciplina as “Questões a resolver - ordem de julgamento” (cf. artigo 608.º n.º 2 do CPC) da qual resulta que o juiz «deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras (…)».

A nulidade da sentença por omissão de pronúncia verifica-se quando existe uma omissão dos deveres de cognição do tribunal, o que sucederá quando o juiz não tenha resolvido todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação e cuja decisão não esteja prejudicada pela solução dada a outras.

Portanto, esta nulidade só ocorre nos casos em que o tribunal não tome posição sobre alguma questão sobre a qual devesse tomar posição, inclusivamente não decidindo explicitamente que não pode dela tomar conhecimento. (Cfr. acórdãos do STA n.ºs 574/11 de 13.07.2011 e 01200/12 de 12.02.2015 e do TCAN nos acórdãos n.ºs 01903/12.5 BEBRG de 26.09.2013, 1481/08.0BEBRG de 10.10.2013, 02206/10.5BEBRG de 16.10.2014 e 03589/04 - Aveiro).

No caso, a Recorrente não identifica qualquer questão concreta que o Juiz a quo tivesse deixado de apreciar, referindo-se apenas a alguma da factualidade por si alegada, pelo que a propalada omissão pode configurar erro de julgamento, mas já não nulidade da sentença.

Neste preciso sentido se pronunciou o STJ, no seu acórdão de 23.03.2017, proc. 7095/10.7TBMTS.P1.S1, disponível em http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003 fa814/c3e13ed356928302802580ed0053e3ba?OpenDocument:

«(…) no que se refere à decisão de facto, importa ter presente que esta se integra na fundamentação da sentença e que os juízos probatórios parcelares que a consubstanciam podem, quando muito, padecer dos vícios de deficiência, obscuridade ou de contradição nos termos especificamente previstos na alínea c) do n.º 2 do artigo 662.º do CPC. Por sua vez, a falta ou insuficiência da fundamentação da decisão sobre algum facto essencial constitui irregularidade suprível, mesmo oficiosamente, nos termos do citado artigo 662.º, nº 2, alínea d), e 3, alínea b). Nessa medida, em sede de decisão de facto, não se afigura, em princípio, aplicável o regime das nulidades da sentença previsto no artigo 615.º, n.º 1, alíneas b) e c), do CPC.

Por outro lado, o não atendimento de um facto que se encontre provado ou a consideração de algum facto que não devesse ser atendido nos termos do artigo 5.º, n.º 1 e 2, do CPC, não se traduzem em vícios de omissão ou de excesso de pronúncia, dado que tais factos não constituem, por si, uma questão a resolver nos termos do artigo 608.º, n.º 2, do CPC. Reconduzem-se antes a erros de julgamento passíveis de ser superados nos termos do artigo 607.º, n.º 4, 2.ª parte, aplicável aos acórdãos dos tribunais superiores por via dos artigos 663.º, n.º 2, e 679.º do CPC.

Segundo o ensinamento de Alberto dos Reis[1]:
«(…) quando o juiz tome conhecimento de factos de que não pode servir-se, por não terem sido, por exemplo, articulados ou alegados pelas partes (art. 664.º), não comete necessariamente a nulidade da 2.ª parte do art. 668.º. Uma coisa é tomar em consideração determinado facto, outra conhecer de questão de facto de que não podia tomar conhecimento; o facto material é um elemento para a solução da questão, mas não é a própria questão.
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(…) uma coisa é o erro de julgamento, por a sentença se ter socorrido de elementos de que não podia socorrer-se, outra a nulidade de conhecer questão de que o tribunal não podia tomar conhecimento. Por a sentença tomar em consideração factos não articulados, contra o disposto no art. 664.º, não se segue, como já foi observado, que tenha conhecido de questão de facto de que lhe era vedado conhecer.»
(…)».

Concluímos, pois, que a sentença recorrida não enferma da nulidade por omissão de pronúncia que lhe vem apontada.

3.2.2. Do erro de julgamento de facto

Na perspetiva da Recorrente foi produzida prova nos autos demonstrativa da factualidade discriminada nos já transcritos pontos c), ci) e cii) das suas conclusões.

É já sabido que legislador impõe ao Recorrente um ónus muito particular no que diz respeito à fundamentação do recurso quanto à matéria de facto (cfr. artigo 640.º do CPC, aplicável ex vi do artigo 281.º do CPPT), que encontra a sua razão de ser na necessidade imperiosa de garantir o direito ao contraditório, por um lado, e, por outro, na salvaguarda da “(…) rigorosa delimitação do objeto do recurso, até porque o sistema consagrado não permite recursos genéricos contra a matéria de facto” (cf. GERALDES, António Abrantes, PIMENTA, Paulo, e SOUSA, Luís Filipe Pires de – Código de Processo Civil Anotado. Vol. I. 2.ª edição, reimpressão. Coimbra: Almedina, 2020, págs. 797-798).

Assim, sempre que seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, o Recorrente deve obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição (cfr. n.º 1 do artigo 640.º CPC), os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados [alínea a)], os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida [alínea b)] e a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas [cf. alínea c)].

Como resulta do n.º 2 do mesmo artigo 640.º, quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes [cf. alínea a)].

No presente recurso, é pacífico que tais ónus se mostram cumpridos, pelo que nada obsta à apreciação do recurso nesta parte.

Pois bem, quanto ao 1.º facto (“os tratamentos chamados de fisioterapia efectuados pela impugnante são prescritos por nutricionistas”), efetivamente, a testemunha H. referiu que «O tratamento é prescrito pelo nutricionista. É o nutricionista parametriza o tratamento. (…) É o nutricionista que vai ao gabinete certificar-se que esse tratamento está a ser feito dessa forma, que fala com o cliente, que pergunta se a dieta está a correr bem, que pesa o cliente, que pega na fita métrica e mede (…), e apenas e só o nutricionista é que pode alterar essa prescrição, é que pode aumentar a intensificação do tratamento (…)». É igualmente verdade que a testemunha Dr.ª A. (pneumologista de profissão) confirmou que os tratamentos por si realizados foram prescritos por um “colega” nutricionista; contudo, apesar de referir que teve consultas periódicas, não esclareceu se as mesmas ocorreram também com um nutricionista.
Já a testemunha Dr.ª P. afirmou perentoriamente que os tratamentos por si realizados tiveram assistência de um nutricionista.
Sucede que o Tribunal a quo não se limitou a considerar como não provado «Que a execução destas actividades fosse supervisionada por um nutricionista» apenas por falta de alegação de factos/atos concretizadores do conceito de “supervisão”. Tal conclusão resultou ainda da conclusão, não impugnada pela Recorrente, de que «(…) um pagamento de 236,70 € em 2001 é incompatível com a colaboração estreita e permanente de um nutricionista, de 2001 a 2003.».

Na falta de impugnação do facto que sustenta esta conclusão (a qual resulta evidenciada no RIT), não é possível dar como provado que os serviços faturados como “fisioterapia” eram, nos anos em questão, supervisionados por um nutricionista. E, pese embora a Recorrente não evidencie quando ocorreram os tratamentos aludidos pelas testemunhas Aida e Paula, da concatenação da prova produzida não é possível inferir que os mesmos se reportam a outros anos que não o de 2001 – data em que foram prestados serviços de nutricionista à Recorrente -, sendo, porém, certo que também não está provado nos autos quais as faturas correspondentes aos serviços prestados àquelas testemunhas.

Em face do que vem considerado, afiguram-se sem pertinência os factos discriminados em ci) [São essencialmente tratamentos mecânicos, isto é totalmente automatizados e executados pelo equipamento, limitando-se a intervenção humana do nutricionista à prescrição e instrução da parametrização das máquinas. (art. 65.º da p.i.).] e cii) [São essencialmente tratamentos mecânicos, isto é totalmente automatizados e executados pelo equipamento, limitando-se a intervenção humana do nutricionista à prescrição e instrução da parametrização das máquinas. (art. 65.º da p.i.).], importando referir, no entanto, que nenhuma das testemunhas aludiu a tais factos, nem a Recorrente identifica qualquer outro meio probatório de onde seja possível extraí-los.
Concluímos, pois, que não ocorre o erro de julgamento de facto arguido pela Recorrente, não se justificando qualquer alteração à matéria de facto assente na sentença.

3.2.3. Erro de julgamento de direito

Em face do probatório fixado, cuja seleção é de manter, analisemos agora o erro de julgamento de direito que a Recorrente aponta à sentença e que, segundo se alcança das conclusões j) e seguintes, resultam do afastamento da aplicabilidade da isenção prevista no artigo 9.º, n.º 2, do CIVA, com base no argumento de que a impugnante não provou que o seu estabelecimento fosse licenciado ou sequer redutível ao conceito de hospital ou clínica médica, enquanto estabelecimento de prestação de cuidados médicos, dispensário ou estabelecimento similar.

A Recorrente sustenta que “alegou a prestação de serviços ao nível da saúde e, como tal, a consideração de que a Clínica (...) se trata de um estabelecimento onde são prestados cuidados de saúde, decorre da Lei, sendo obrigatório o registo dessa actividade junto da ERSE, nos termos do disposto no Decreto-Lei n.º 127/2009 em conjugação com a Portaria n.º 52/2001».

Se bem percebemos, a Recorrente limita-se a alegar uma mera conclusão (“presta serviços ao nível da saúde”), aliás controvertida [porque questionada no RIT, especificamente no seu ponto III-b)], sem identificar os factos que permitem a ela chegar nem ter produzido a necessária prova, e dela pretende extrair as consequências legais da sua verificação. Ora, a Recorrente devia ter demonstrado que tem sua atividade registada na ERSE, nos termos legalmente exigidos, pois tal registo só se prova por documento, não se podendo concluir que o mesmo existe apenas porque a Recorrente alegou a prestação de serviços ao nível da saúde. O que constata é que tal facto não integra o probatório nem a Recorrente identifica o concreto meio de prova constante dos autos que permite julgá-lo provado.

Tal pretensão está, pois, votada ao inexorável insucesso, porque contrária a todas as regras de direito, designadamente às do ónus da prova, decorrentes quer do artigo 342.º do Código Civil, quer do artigo 74.º, n.º 1, da Lei Geral Tributária dos quais decorre que o ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos da AT ou dos contribuintes recai sobre quem os invoque.

Assim, invocando a Recorrente a isenção da liquidação de IVA nas operações de prestação de serviços de “fisioterapia”, impendia sobre ela o ónus de demonstrar a verificação dos pressupostos de tal isenção.

Constatando-se que a Recorrente não cumpriu encargo probatório que a lei faz sobre ela impender, não pode julgar-se verificado o erro de julgamento de direito por si invocado, pelo que, também por improcedência deste fundamento, deve ser negado provimento ao seu recurso.

4. DECISÃO

Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte, em negar procedência ao recurso, mantendo a sentença recorrida.

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Custas a cargo da Recorrente, que sai vencida neste recurso, nos termos do artigo 527.º, n.º 1 e 2 do CPC.
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Porto, 13 de maio de 2021


Maria do Rosário Pais - Relatora
Manuel Santos – 1.º Adjunto (em substituição)
Ana Patrocínio – 2.ª Adjunta