Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01752/06.0BEPRT
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:01/24/2017
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Vital Lopes
Descritores:OPOSIÇÃO
PRESCRIÇÃO
PROCURADOR
Sumário:1. A outorga pelo gerente de direito de procuração a terceiro para o exercício da gerência de uma sociedade não afasta a sua responsabilidade subsidiária pelas dívidas daquela sociedade, no regime decorrente do art.º13.º do CPT.
2. Antes da entrada em vigor da redacção do nº3 do art.º49.º da LGT, introduzida pela Lei 53-A/2006, ocorrendo sucessivas causas de interrupção da prescrição, devem todas elas ser consideradas autonomamente, para efeitos de contagem do respectivo prazo, desde que susceptíveis de influir no seu decurso;
3. Ainda que tenha havido citação, com efeito interruptivo duradouro, para decidir a prescrição é decisivo que os autos esclareçam se o processo esteve subsequentemente parado por período superior a um ano por facto não imputável ao contribuinte e/ou se ocorreram outras causas com virtualidade interruptiva ou suspensivas do decurso do prazo;
4. Não contendo os autos tais elementos, é de ordenar a sua baixa à 1.ª instância para competente instrução. *
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:Fazenda Pública
Recorrido 1:M...
Decisão:Concedido provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:ACORDAM EM CONFERÊNCIA NA SECÇÃO DO CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO NORTE

1 – RELATÓRIO

A Exma. Representante da Fazenda Pública, recorre da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto que julgou procedente a oposição deduzida por M... contra a execução fiscal n.º39642002070018510 contra ela revertida e originariamente instaurada contra a sociedade “F..., Lda.”, por dívidas de Contribuições à Segurança Social respeitantes a períodos de 1998 e 1999, perfazendo a quantia de 49.372,57€.

O recurso foi admitido com subida imediata nos próprios autos e efeito devolutivo (fls.252).

Na sequência do despacho de admissão, a Recorrente apresentou alegações e formulou as seguintes «Conclusões:
A) Não se conforma a Fazenda Pública com a douta sentença recorrida, porquanto considera que da prova produzida se não podem extrair as conclusões em que se suportou, determinando que se julgasse pela ausência de culpa do oponente na falta de pagamento das dividas tributárias, in casu reportadas dívidas respeitantes a Contribuições da Segurança Social relativas aos meses de Agosto, Outubro, Novembro e Dezembro de 1998 e Janeiro de 1999, procedendo a presente oposição, extinguindo-se a execução em relação à oponente.
B) A douta sentença recorrida incorreu em erro de julgamento, quanto à matéria de facto, porquanto da prova produzida não se podem extrair as conclusões em que se alicerça a decisão proferida.
C) O assim decidido baseia-se na consideração de que a oponente não teve culpa na constituição das dívidas tributárias o que nos leva a concluir por uma errónea apreciação dos factos levados aos autos, aí documentalmente provados pela AT, já alegados em sede de contestação, cujo teor se reitera.
D) E incorre também em erro de direito, porquanto a douta sentença fez uma errada interpretação e aplicação da lei - art. 13° do CPT, 24° da LGT e 487° n.°2 do Código Civil (CC).
E) Contrariamente ao sentenciado, não consideramos que da prova produzida resulta a demonstração de que a oponente não teve culpa na insuficiência patrimonial da sociedade originariamente devedora e na falta de pagamento dos créditos aqui em causa, não tendo logrado ilidir a presunção legal de culpa ínsita no regime resultante do citado art. 13° do CPT.
F) O que se extrai dos autos, nos períodos a que se reportam os factos geradores das dívidas, a oponente dirigia de tacto e de direito os destinos da sociedade executada originária.
G) Nos termos do preceituado no citado dispositivo do art. 13° do CPT, no que respeita às dívidas do ano de 1998, incumbe aos gerentes e administradores, e não à Administração Tributária, o ónus da prova, por sobre eles impender uma presunção de culpa de que a insuficiência do património da empresa para a satisfação daqueles créditos não resultou de culpa sua.
H) Consideramos que da prova produzida nos autos, bem como das Informações oficiais prestadas pelos competentes Serviços da Administração Tributária (AT) e ainda do alegado em sede de contestação e dos documentos juntos pela Fazenda Pública, resulta inequivocamente que,
I) Se mostram verificados os pressupostos legais de que depende a reversão da execução contra os que somente a titulo subsidiário respondem pelas dívidas da sociedade originariamente devedora, e ainda,
J) Que resulta demonstrada a gerência de facto por parte da oponente nos períodos a que se reportam os factos geradores de tais dividas, assim como naqueles em que terminou o prazo legal para o seu pagamento ou entrega.
K) O mesmo é dizer que, a prova documental junta aos autos e que sustenta a posição da AT demonstra precisamente o contrário do aduzido pela oponente, abstendo-se a douta sentença de se pronunciar sobre esses factos, senão veja-se,
L) A oponente, ora recorrida, apresentou prova testemunhal no sentido de afastar a sua responsabilidade.
M) Mas, o Tribunal deve apreciar a prova produzida no seu todo, e perante a factualidade dada como provada e como não provada, deve construir a decisão de acordo com as regras da experiência comum.
N) Isto porque da factualidade se evidencia o exercício efectivo da administração por parte da oponente, quer porque foi designada administradora única, a quem competia em exclusivo a vinculação externa da sociedade, que porque consta em arquivo no Serviço e Finanças onde pende a execução declaração de alterações do cadastro da sociedade em que se dá a conhecer a sua nomeação como administradora, declaração por si mesmo assinada, apresentada em 08/11/1996 (cf. doc. 6 junto à contestação), e da própria outorga da procuração em 25/10/1996 (cf. Doc. 3 junto à PI)
O) E, mesmo se por mera hipótese se admitisse, que fossem os únicos actos praticados pela oponente enquanto gerente da sociedade, eles revelam o exercício, ainda que restrito, da gerência, como decorre do art. 260°, n.° 4, do Código das Sociedades Comercias, perpassando a ideia que, quem dirigia de direito e de facto os destinos da sociedade primitiva executada, era também a oponente.
P) Deste modo, não pode dar-se por ilidida a presunção da correspondência da gerência in nomine à gerência efectiva, tanto ao tempo do nascimento das obrigações como da respectiva entrega ou pagamento, retirada do preceituado no art. 13º do CPT e art. 24° da LGT.
O) Perante tais factos, não devia ter o Tribunal valorado nos termos em que o fez, a prova testemunhal, por insuficiente e por contraditória com a prova documental, tendo em conta as especificidades do caso concreto.
R) Mas ainda que se aceite o entendimento sufragado pelo Acórdão do Pleno da Secção da CT, de 28/02)2007, Recurso n.° 01132/06 (e de outros que a posteriori prosseguem o mesmo entendimento, v.g. o Acórdão do STA, de 11/04/2007, proc. 040/07), o que dele decorre é que compete à Fazenda Pública o ónus da prova dos pressupostos da responsabilidade subsidiária do gerente, não só da gerência de direito, como também da gerência de facto.
S) Tal não invalida, como bem realça o douto acórdão a que vimos aludindo, que o efectivo exercício da gerência possa o juiz inferi-lo do conjunto da prova, usando as regras da experiência, fazendo juízos de probabilidade etc., pese embora não possa retira-lo mecanicamente do tacto de ter sido designado gerente, na falta de presunção legal.
T) É precisamente o que acontece na situação em apreço, em que uma vez que a revertida e aqui oponente auferiu verbas da executada a título de remuneração da gerência, parecendo razoável admitir que tais verbas se destinavam a retribuir uma qualquer actividade de gerência na sociedade, implicando essa actuação a tomada de opções em nome e/ou no interesse da sociedade, e interveio em representação da sociedade em pelo menos uma declaração cadastral e na outorga da procuração, também daí se podendo inferir que não se alheou completamente da vida da empresa, e, identificando-se perante terceiros, desde logo perante os serviços da Segurança Social (como MOE) e da AT na qualidade de gerente da sociedade, assim exteriorizando a vontade daquela, vinculando-a, revelando o exercício da gerência.
U) Sendo a gerente nomeada, segundo as regras da experiência, há pelo menos, um juízo de forte probabilidade, da prática pela oponente de actos de gerência, sendo esta, a convicção da Fazenda Pública no momento da efectivação da reversão.
V) Não tendo aquela, logrado afastar a presunção da gerência de facto decorrente da circunstância de ser gerente de direito, pelo que, não poderia a oponente ter sido considerada parte ilegítima na execução contra si revertida no que tange aos tributos.
W) A douta sentença recorrida violou o disposto nos art. 13º do CPT e art. 24° da LGT e ainda os art.s 125° do CPPT, 712°, n.° 1 alínea a) e 668°, ambos do CPC, aplicável ex vi art. 2° e) do CPPT e art. 2° d) da LGT.
Termos em que Deve ser dado provimento ao recurso, revogando-se a douta sentença recorrida».

A Recorrida não contra-alegou.

O Exmo. Senhor Procurador-Geral Adjunto emitiu mui douto parecer no sentido de que o recurso merece integral provimento.

Colhidos os vistos legais e nada mais obstando, cumpre decidir.

2 – DO OBJECTO DO RECURSO

Delimitado o objecto do recurso pelas conclusões das alegações do Recorrente (cf. artigos 684.º, n.º3 e 685.º-A, n.º1, do CPC/61), são estas as questões que importa resolver: (i) se a outorga pelo gerente de direito de procuração a terceiro para o exercício da gerência de uma sociedade afasta a sua responsabilidade subsidiária pelas dívidas daquela sociedade; (ii) se a oponente logrou provar ausência de culpa na inexistência/ insuficiência de bens da devedora originária; (iii) se a dívida exequenda está prescrita.

3 – DA MATÉRIA DE FACTO

Em sede factual, deixou-se consignado na sentença recorrida:

«Com base em documentos, informações oficiais foi possível apurar a seguinte factualidade:
A). Contra F..., foi instaurado o processo de execução fiscal n° 3964200207001851, referente a dívidas de Contribuições para a Segurança Social, referentes a diversos períodos de 1998, no montante de 49.372,57€.
B). Por despacho de 22/04/2002 a execução fiscal indicada em A)., reverteu contra o aqui oponente, na qualidade de responsável subsidiário pelas dividas da executada originária, tendo a oponente sido citado em 24/02/2002, cf. fls. 124, 126 e 127 dos autos.
C). A oponente foi nomeada administradora da executada da sociedade executada originária para o triénio 1996/1998, cf. fls. 111 a 113 dos autos.
D). Para o triénio 1999/2001, foi nomeado administrador único, E…, cf. fls. 111 a 113 dos autos.
E). Dá-se por reproduzida a declaração de venda/recibo junto a fls. 22 dos autos datada de 1011011998, através da qual a oponente declarou vender a Manuel… 200 acções da sociedade executada originária.
F). Dá-se por reproduzido o teor da procuração junta a fls. 23 dos autos, outorgada pela aqui oponente, na qualidade de administradora da sociedade executada originária, a favor de Manuel….
G). Quem dava ordens e decidia todo o destino da sociedade executada originária era Manuel…, cf. depoimento de testemunhas.
H). A presente oposição foi apresentada em 17/06/2005, cf. fls. 1 dos autos.
*
IV. FACTOS NÃO PROVADOS
Inexistem outros factos com pertinência para a decisão.
*
O Tribunal firmou a sua convicção nos documentos juntos aos autos, os quais não foram impugnados e nos depoimentos das testemunhas inquiridas que revelaram conhecimento pessoal e directos dos factos.
A instauração da execução contra a sociedade, posterior reversão e a altura a que se reportam as contribuições, constituem factos de conhecimento oficioso do Tribunal, dispensando a respectiva alegação, nos termos do art. 514° C.P.C»

Ao abrigo do disposto no art.º662.º do CPC adita-se ao probatório o seguinte facto, provado como se indica:

I – A oponente foi citada para a execução em 19/05/2005, conforme certidão de citação constante de fls.135 do apenso de execução.

4 – APRECIAÇÃO JURÍDICA

Decorre da lei que o âmbito do recurso se encontra delimitado pelas conclusões das alegações extraídas da motivação do recurso apresentado pelo Recorrente, não podendo o tribunal de recurso conhecer de matéria nelas não inserida, com ressalva dos casos em que se impõe o seu conhecimento oficioso, de harmonia com as disposições conjugadas dos artigos 282.º, n.ºs 5 a 7 do CPPT e 684.º, n.º3, do CPC/61 (actual 635.º, n.º4).

Nas suas alegações e conclusões insurge-se a Recorrente contra o decidido na sentença quanto à não verificação da efectividade da gerência da oponente.

Estando em causa dívidas tributárias de 1998, o regime aplicável de responsabilidade subsidiária dos gerentes é o decorrente do art.º13.º do Código de Processo Tributário.

Como se deixou consignado no Ac. do STA, de 28/09/2006, proferido no proc.º0488/06, «A normas com base nas quais se determina a responsabilidade subsidiária, inclusivamente aquelas que determinam as condições da sua efectivação e o ónus da prova dos factos que lhe servem de suporte, devem considerar-se como normas de carácter substantivo, pois a sua aplicação tem reflexos materiais na esfera jurídica dos revertidos.
Por isso, o CPT é aplicável para regular as condições da reversão contra os responsáveis subsidiários, bem como para estabelecer as regras do ónus da prova dos factos em que assenta a responsabilidade, relativamente a dívidas cujos períodos de constituição decorreram na sua vigência».

Estabelece o n.º1 daquele art.º13.º do CPT: «Os administradores, gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração nas empresas e sociedades de responsabilidade limitada são subsidiariamente responsáveis em relação àquelas e solidariamente entre si por todas as contribuições e impostos relativos ao período do exercício do seu cargo, salvo se provarem que não foi por culpa sua que o património da empresa ou sociedade de responsabilidade limitada se tornou insuficiente para a satisfação dos créditos fiscais».

A responsabilidade subsidiária dos gerentes, por dívidas da executada originária, tem por pressuposto o exercício efectivo do cargo de gerente.

É pacífico na jurisprudência o entendimento de que é à Fazenda Pública como titular do direito de reversão que compete fazer a prova da efectividade da gerência. Na verdade, ao abrigo do regime em análise, o constante do artº.13.º, n.º1, do CPT, já não existe qualquer presunção legal que imponha que, provada a gerência de direito, por provado se dê o efectivo exercício da função de gerente ou administrador, pelo que compete à Fazenda Pública o ónus da prova dos pressupostos da responsabilidade subsidiária do gerente, neles se incluindo o exercício de facto da gerência, e apenas se podendo esta valer da presunção legal respeitante à culpa pela insuficiência do património social – cf. Ac. do STA (Pleno da Secção do CT), de 28/02/2007, rec. 1132/06 e Ac. STA de 10/12/2008, rec.861/08.

No caso dos autos, não resulta controvertida a gerência ou administração de direito da oponente no período a que respeitam as dívidas.

O que resulta controvertido é saber se a outorga pelo gerente de direito de procuração a terceiro para o exercício da gerência/administração de uma sociedade afasta a sua responsabilidade subsidiária pelas dívidas daquela sociedade, no regime de responsabilidade subsidiária decorrente do art.º13.º do CPT.

Ora, sobre esta questão de há muito se formou jurisprudência consolidada no sentido de que podendo a gerência ser exercida por procurador ou mandatário e produzindo os actos praticados por este os seus efeitos na esfera jurídica do mandante, deve este ser considerado gerente de facto para atribuição da responsabilidade prevista no art.º13.º do CPT. Nesse sentido, podem ver-se os Acs. do STA, de 26/02/1997, tirado no proc.º020946; de 14/02/2001, tirado no proc.º025594.

Compreende-se que assim seja. Acompanhando o que sobre a matéria tem vindo a ponderar a jurisprudência dos nossos tribunais, se por um lado a procuração outorgada a favor de terceiro é ineficaz para a transmissão da administração de direito nos termos do disposto no art.º.252º nº 5 e 6 do CSC [“Os gerentes não podem fazer-se representar no exercício do seu cargo, sem prejuízo do disposto no n.º 2 do artigo 261.º”; “O disposto nos números anteriores não exclui a faculdade de a gerência nomear mandatários ou procuradores da sociedade para a prática de determinados actos ou categorias de actos, sem necessidade de cláusula contratual expressa”], por outro, a dita procuração é também ineficaz para a transmissão da administração de facto porque titula um mandato com representação, nos termos do qual os actos do representante produzem os seus efeitos na esfera jurídica do representado gerente, nos termos do disposto nos arts.258º [“O negócio jurídico realizado pelo representante em nome do representado, nos limites dos poderes que lhe competem, produz os seus efeitos na esfera jurídica deste último”] e 1178º nº l, ambos do Cód. Civil.

Como se escreveu no recente Ac. deste TCAN, de 26/03/2015, no proc.º 01044/11.2BEBRG «Da conjugação dos n.º 5 e 6 do art.º 252.º do CSC esta vedado aos gerentes “fazer-se representar no exercício do seu cargo” podendo no entanto, a sociedade constituir procuradores ou mandatários, sendo que os atos praticados por estes se repercutem na esfera jurídica do mandante».

No caso em apreço, não se discutindo a administração «de jure» da oponente, a responsabilidade subsidiaria dela radica em exercício efectivo do cargo, por intermédio do procurador, autorizado por título jurídico válido, com claro fundamento legal no art.ºl3.º nº1,
do CPT (vd. al. f) do probatório).

Não pode, por conseguinte, a oponente desresponsabilizar-se da gerência quando resulta demonstrado que «Quem dava ordens e decidia todo o destino da sociedade executada originária era Manuel… », justamente o terceiro a quem a oponente, na qualidade de gerente de direito, outorgou procuração para o exercício da gerência da sociedade, fundando-se a sua responsabilidade subsidiária na outorga da procuração.

Salienta-se que os autos não evidenciam que a procuração para aquele terceiro exercer a gerência da sociedade, tenha sido emitida sem o propósito de determinar ou controlar a actividade do procurador, desconhecendo o representado gerente e não podendo conhecer, também, em absoluto, como se desenvolve a gestão dessa actividade, situação excepcional susceptível de configurar o afastamento da sua responsabilidade subsidiária, conforme decidido no recente acórdão deste TCAN, de 27/11/2014, tirado no proc.º 00824/06.5BEPRT, não ressumando dos autos qualquer relação de dependência do representado face ao terceiro a quem outorgou a procuração.

No regime do n.º1 do art.º13.º do CPT cabe ao gerente demonstrar ausência de culpa sua na insuficiência patrimonial da sociedade executada para solver as dívidas – art.º350.º, n.º1 do Código Civil; vd. Ac. deste TCAN, de 27/11/2014, tirado no proc.º 00455/10.5BEVIS.

E ainda o Ac. deste mesmo tribunal de 18/09/2014, tirado no proc.º 01126/06.2BEBRG, onde se escreveu: «O regime legal da responsabilidade subsidiária dos gerentes por dívidas fiscais do art. 13.º do CPT, faz recair sobre o gerente que exerceu funções durante o período em que se constituíram e/ou em que deviam ser pagas tais dívidas, a prova de que não teve culpa pela insuficiência do património social para satisfazer os créditos exequendos.
Esta presunção legal de culpa só pode ser ilidida com a prova do contrário, i.e., a prova das iniciativas empreendidas para evitar, ou minimizar, o impacto negativo de factos adversos».

Ora, da prova produzida nos autos não se extraem factos que permitam concluir pelo afastamento da culpa da oponente na situação de insuficiência/inexistência patrimonial da sua gerida, não se podendo tal concluir unicamente da circunstância de ter outorgado a terceiro procuração para o exercício da gerência da sociedade.
E a falta de prova quanto à ausência de culpa na situação de insuficiência/inexistência patrimonial da sociedade, contra a oponente tem de ser valorada, que era a parte onerada com a prova, tornando-se ela parte legítima na execução por dívidas da sociedade devedora originária.

A sentença incorreu pois em erro de julgamento, não podendo manter-se na ordem jurídica, assim se concedendo provimento ao recurso.

Nas alegações em 1.ª instância, feitas ao abrigo do disposto no art.º120.º do CPPT, a oponente e ora Recorrida invocava a prescrição da dívida exequenda, relativa aos períodos de Agosto, Outubro, Novembro e Dezembro de 1998 e Janeiro de 1999, sobre que a sentença recorrida não se pronunciou.

Assim, embora se trate de questão não suscitada na petição inicial, importa dar pronúncia sobre a invocada excepção peremptória, por se tratar de matéria de conhecimento oficioso.

Em causa, como vimos, estão dívidas provenientes de contribuições para a Segurança Social de períodos de 1998 e 1999.

O prazo de prescrição aplicável era, à data, o de dez anos decorrente do art.º14.º do DL n.º103/80, de 9 de Março e 53.º, n.º2, da Lei n.º28/84, de 14 de Agosto.

Com a Lei n.º17/2000, de 8 de Agosto, com entrada em vigor em 04/02/2001 (art.º119.º) esse prazo foi encurtado para cinco anos, computando-se o decurso do prazo de prescrição a partir da data em que a obrigação deveria ter sido cumprida.

Na sucessão de regimes, importa ter me conta o disposto no art.º297.º do Cód. Civil, cujo n.º1 estatui: «A lei que estabelecer, para qualquer efeito, um prazo mais curto do que o fixado na lei anterior é também aplicável aos prazos que já estiverem em curso, mas o prazo só se conta a partir da entrada em vigor da nova lei, a não ser que, segundo a lei antiga, falte menos tempo para o prazo se completar».

Assim, aplica-se às dívidas em causa o prazo de cinco anos decorrente do art.º63.º da Lei n.º17/2000, por ser patentemente aquele em que primeiro se completaria o prazo de prescrição (ou seja, em 04/02/2006 e não 2008 ou 2009).

Ora, como bem salienta o Exmo. Senhor PGA, a citação da oponente ocorrida em 19/05/2005, interrompeu a prescrição, com efeito duradouro.

No entanto, há que ter em conta que na LGT, os efeitos dos factos interruptivos (o instantâneo e o duradouro), cessam com a paragem do processo por mais de um ano por facto não imputável ao contribuinte, sem prejuízo da relevância autónoma que têm os factos a que é atribuído efeito suspensivo da prescrição – vd. Jorge Lopes de Sousa, “Sobre a Prescrição da Obrigação Tributária”, Áreas Editora, 2008, a pág.61.

Com a revogação do n.º2 do art.º49.º da LGT, pela Lei n.º53.º-A/2006, de 29 de Dezembro, é certo, afastaram-se as consequências da paragem do processo por mais de um ano por facto não imputável ao contribuinte e a transformação do efeito interruptivo em suspensivo que resultava daquele n.º2 do art.º49.º.

Porém, nos termos do art.º91.º daquela Lei 53.º-A/2006, «a revogação do n.º2 do artigo 49.º da LGT aplica-se a todos os prazos de prescrição em curso, objecto de interrupção, em que ainda não tenha decorrido o período superior a um ano de paragem do processo por facto não imputável ao sujeito passivo».

Regressando aos autos, o que se constata com base na informação executiva de 14/06/2006, a fls.143 dos autos (elaborada no seguimento da oposição) e elementos que dele constam, é que a oponente foi pessoalmente citada em 19/05/2005, não tendo apresentado reclamação ou impugnação e não se achando a dívida garantida por penhora ou caução.

Nestas circunstâncias, sugere tal informação que entre a data da citação e pelo menos a da referida informação (14/06/2006), nenhum acto terá sido praticado no processo executivo com virtualidade interruptiva ou suspensiva, sendo que a informação do competente serviço de finanças a fls.305 nada esclarece a tal respeito.

Ora, não podemos avançar perante tal dúvida, que importa previamente esclarecer. Acresce que, na eventualidade de ter havido paragem do processo por período superior a um ano por facto não imputável ao contribuinte, contar-se-ia o prazo de prescrição desde a entrada em vigor da lei nova (04/02/2001) até à data da citação (19/05/2005), acrescido do período posterior à data em que se teria completado um ano de paragem do processo por facto não imputável ao contribuinte (i.e., 19/05/2006).

É que, ocorrendo sucessivas causas de interrupção da prescrição, antes da entrada em vigor da referida redacção do nº3 do art.º49.º da LGT, devem todas elas ser consideradas autonomamente, para efeitos de contagem do respectivo prazo, desde que susceptíveis de influir no seu decurso, como se salienta no Ac. do STA, de 30/04/2013, tirado no proc.º0443/13.
Assim, na apreciação da prescrição, mostra-se decisivo indagar na execução e junto da entidade credora, se foi praticada qualquer diligência administrativa, realizada com conhecimento do responsável pelo pagamento, conducente à liquidação ou à cobrança da dívida (art.º63.º, n.º3 da Lei n.º17/2000), após a citação da oponente e quais e em que momento, para se aferir da sua virtualidade interruptiva, assim como da eventual existência de causas suspensivas da prescrição.

Importa pois que os autos baixem à 1.ª instância para instrução com os elementos pertinentes à apreciação da prescrição e prolação de nova decisão, em que também conheça daquela excepção peremptória.

Fica prejudicado o conhecimento das restantes questões da oposição.

5 - DECISÃO

Pelo exposto, acordam em conferência os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte em:
Ø Conceder provimento ao recurso e revogar a sentença recorrida;
Ø Ordenar a baixa dos autos à 1.ª instância para instrução com os elementos necessários à apreciação da prescrição da dívida e prolação de nova decisão em que se conheça daquela excepção.
Sem custas.
Porto, 24 de Janeiro de 2017
Ass. Vital Lopes
Ass. Cristina da Nova
Ass. Pedro Vergueiro