Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00046/14.1BEPNF
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:06/12/2014
Tribunal:TAF de Penafiel
Relator:Pedro Nuno Pinto Vergueiro
Descritores:RECURSO.
MANIFESTAÇÕES DE FORTUNA.
VALOR DA CAUSA.
JULGAMENTO DA MATÉRIA DE FACTO.
ERRO NOS PRESSUPOSTOS DE FACTO E DE DIREITO.
Sumário:I) Estando em causa a decisão de avaliação da matéria colectável pelo método indirecto constante do art. 89º-A da LGT, de que cabe recurso para o tribunal tributário, com efeito suspensivo, a tramitar como processo urgente, não sendo aplicável o procedimento constante dos artigos 91.º e seguintes, pois que ao recurso referido no número anterior aplica-se, com as necessárias adaptações, a tramitação prevista no artigo 146.º-B do Código de Procedimento e de Processo Tributário, é manifesto que os Recorrentes não têm razão neste domínio, na medida em que o enquadramento da matéria em apreço tem expressa previsão no art. 97º-A nº 1 al. b) do CPPT, sendo que o valor contestado está relacionado com o alcance da decisão posta em crise no âmbito do presente processo, ou seja, com o valor da matéria colectável fixada e não com o eventual imposto que virá a ser liquidado.
II) Ao TCA assiste o poder de alterar a decisão de facto fixada pelo tribunal “a quo” desde que ocorram os pressupostos vertidos no art. 712.º, n.º 1 do CPC (actual art. 662º), incumbindo-lhe, nessa medida, reapreciar as provas em que assentou a decisão impugnada objecto de controvérsia, bem como apreciar oficiosamente outros elementos probatórios que hajam servido de fundamento à decisão sobre aqueles pontos da factualidade controvertidos.
III) Na medida em que o recurso ao método indirecto foi fundamentado na alínea f) do artigo 87.º da LGT, norma que estabelece que “a avaliação indirecta só pode efectuar-se em caso de: … f) Acréscimo de património ou despesa efectuada, incluindo liberalidades, de valor superior a (euro) 100 000, verificados simultaneamente com a falta de declaração de rendimentos ou com a existência, no mesmo período de tributação, de uma divergência não justificada com os rendimentos declarados”, face à factualidade que vem provada, tem de considerar-se justificado, pois que de acordo com o probatório, os ora Recorrentes não conseguiram provar a origem dos depósitos nas contas bancárias, não tendo fornecido qualquer elemento justificativo para tanto e existe uma divergência apurada, nos anos em apreço, entre as entradas em dinheiro/depósitos e o rendimento declarado em sede de IRS, superior a € 100.000,00, sendo que não pode aceitar-se a tese dos Recorrentes no sentido de que “da leitura do nº.3 do art.89ºA da LGT apenas se infere que o que se exige é a prova da fonte dos fundos e não da origem desses mesmos fundos. E não exigindo a Lei a prova da origem daqueles fundos, não se lhes poderá exigir que provem como é que os adquiriram, uma vez que tais rendimentos poderiam ter sido já sujeitos à tributação nos anos em que foram produzidos”, ou seja, para os Recorrentes basta a alusão à causa dos valores creditados na conta para cumprir com a obrigação estabelecida na lei, quando o que está em causa, em termos essenciais, é afastar a ideia de que tais rendimentos estão sujeitos a tributação, nomeadamente, como referem os Recorrentes, evidenciando que se trata de rendimentos já sujeitos a tributação em devido tempo.
IV) Nesta sequência, e a partir do momento em que a AT fez a prova da verificação dos pressupostos legais do recurso a métodos indirectos para a determinação da matéria tributável que suporta o acto posto em crise, passou então a recair sobre os Recorrentes o ónus da prova da inexistência dos factos tributários ou de erro ou excesso na quantificação da matéria tributável efectuada, sendo que para afastar a utilização de métodos indirectos de avaliação da matéria tributável o contribuinte tem de demonstrar que detinha proventos que não tinham de ser declarados para efeitos de imposto sobre o rendimento, suficientes para assegurar a manifestação de fortuna que estiver na base de tal utilização, só sendo esta afastada se esses proventos chegarem para assegurar a totalidade da manifestação de fortuna em causa, sendo ainda necessário que se demonstre que ela foi efectivamente assegurada com esses bens.
V) Nestas condições, não merece censura o exposto na decisão recorrida, posto que os Recorrentes não logram demonstrar a tal ligação entre a actividade da empresa em que o recorrente é sócio gerente e os valores depositados nas contas que estão na origem do acréscimo de património, sendo que não seria difícil através dos competentes meios de prova evidenciar quais os movimentos a crédito da conta em causa que titulam os invocados rendimentos provenientes de retirada por conta de lucros no montante de € 61.389,07 e de € 45.000,00 da sociedade Antunes Oliveira Têxteis, Lda., verificando-se que os Recorrentes, para além de criticarem a ligeireza de procedimento da actuação da AT, pretendem agora trilhar o mesmo caminho, reclamando que em função dos dados apurados na inspecção à referida sociedade, naturalmente, tais valores têm de estar englobados nos rendimentos considerados, quando aquilo que se impunha evidenciar era qual a data ou datas em que tais valores saíram da esfera da sociedade e foram integrados na esfera do sócio, aqui Recorrente marido, apontando para os concretos movimentos a crédito que titulam tal situação.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:J... e R...
Recorrido 1:Diretor de Finanças do Porto
Decisão:Negado provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:
1. RELATÓRIO

J… e R…, devidamente identificados nos autos, inconformados, vieram interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel, datada de 11-04-2014, que julgou improcedente a pretensão pelos mesmos deduzida na presente instância de RECURSO DA DECISÃO DE AVALIAÇÃO DA MATÉRIA COLETÁVEL POR MÉTODOS INDIRETOS, relacionado com a decisão do Senhor Director de Finanças do Porto, de 18/12/2013, que lhe fixou a correcção da matéria tributável, por métodos indirectos, para efeitos de IRS, a enquadrar na Categoria G, nos termos dos arts. 39.º do CIRS, 87.º, alínea f), e 89.º-A, n.º 6, da LGT, nos montantes de €173.238,42 e €139.137,21, nos anos de 2010 e 2011, respectivamente, tendo fixado o rendimento coletácvel, para efeitos de IRS nesses anos, em €199.230,42 e €155.233,21.

Formularam nas respectivas alegações (cfr. fls. 130-149), as seguintes conclusões que se reproduzem:
“ (…)
I – A douta decisão recorrida incorreu em erro de julgamento ao considerar que o valor da causa é o valor das correções introduzidas pela AT aos rendimentos declarados de IRS dos Recorrentes aos anos de 2010 e 2011 no valor respetivamente de € 173.238,42 e € 139.137,21, em vez do valor que resultar da taxa aplicável ao englobamento dos rendimentos de IRS pela introdução daquelas correções.
II - A resposta à matéria de facto vertida em “C” dos factos provados e a resposta dada a matéria de facto vertido em “1” dos factos não provados é contraditória entre si.
III - Resultando dos autos a prova de que os Recorrentes declararam rendimentos da categoria “A” e “F” no valor de € 34.200,00 e € 22.976,91 respetivamente para os anos de 2010 e 2011, deve ser eliminada dos factos não provados a resposta vertida em “1” dos factos não provados.
IV - Estando provado que a conta nº. 6880582939 aberta no banco… era cotitulada pela Recorrente mulher e pela sua mãe, só metade daquela conta que importava em € 82.199,21 poderia ser atribuída à Recorrente mulher e só este valor poderia integrar o englobamento dos rendimentos dos Recorrentes objeto das correções pelos métodos indiretos.
V – O nº. 3 do art.89ºA da LGT apenas impõe aos sujeitos passivos e por esse facto aos aqui Recorrentes, o dever de demonstrar que é outra a fonte das manifestações de fortuna e não que provem a origem desses rendimentos.
VI – Os Recorrentes provaram que a fonte dos seus rendimentos provêm de retirada por conta de lucros no montante de € 61.389,07 e de € 45.000,00 da sociedade A…, Lda, e de resgate de valores que já eram seus de instrumentos financeiros como resulta da transcrição dos extratos da conta corrente, cumprindo assim a obrigação que sobre elas impende pela aplicação do nº.3 do art.89ºA da LGT.
VII – O relatório inspetivo ao invocar que a totalidade do depósito da conta 6880582939 pertence à Recorrente mulher não tem qualquer força probatória dado que não obedece aos princípios estabelecidos nos arts.362º a 396º do CC.
VIII – A douta sentença recorrida incorreu assim em erro de julgamento ao dar respostas contraditórias à matéria de facto e a julgar contra disposição expressa da Lei que define nas relações de solidariedade ativa nos depósitos a titularidade a partes iguais no depósito bancário quando não resulta da relação jurídica estabelecida que são diferentes as suas partes, não sendo,
IX – Não é dever dos Recorrentes provar o direito à titularidade de apenas metade do depósito por esse direito resultar da Lei, e sim à parte – AT – que impugna esse direito.
Termos em que,
Deve ser dado provimento ao recurso e, por via dele, ser revogada a douta sentença recorrida e, em consequência:
Ser alterada a decisão do Tribunal a quo sobre a matéria de facto, e corrigindo-se o direito,
Fazendo-se assim, como sempre, a costumada Justiça!”

A Recorrida AT apresentou contra-alegações, tendo concluído da seguinte forma (cfr. fls. 167-176 dos autos):
“(…)
I - A douta sentença recorrida, ao julgar improcedente o recurso, fez uma correcta interpretação e aplicação da lei aos factos, bem como fez um correcto julgamento e uma correcta apreciação da prova, motivo pelo qual deve ser mantida.
II - O valor da causa para efeitos de custas foi considerado nos termos legalmente estabelecidos no artigo 87° - A, n°1, al b) do CPPT e encontra-se devidamente fundamentado, pelo que deve ser mantido sem qualquer alteração.
III - A resposta à matéria de facto vertida em “C” dos factos provados e resposta dada a matéria de facto vertido em “1” dos factos não provados não é contraditório entre si. Sendo que os recorrentes demonstram falta de compreensão do teor da sentença é que o tribunal a quo limitou-se a fazer e bem uma distinção entre os rendimentos brutos declarados e os rendimentos líquidos declarados, bastando olhar com atenção para o que está escrito naqueles dois pontos.
IV - Portanto o tribunal a quo deu como provado que os rendimentos brutos declarados foram 22.976,91 Euros, no ano de 2010, e 34.200,00 Euros no ano de 2011.
V - Provando-se que os rendimentos líquidos declarados foram 16.096,00 Euros em 2011 e 25.992,00 Euros em 2010.
VI - O facto da conta banco n.º no 6880582939 estar aberta em nome da recorrente e da sua mãe faz com que exista uma presunção elidível em como o montante ali existente é das duas titulares.
VII - Ora a AT elidiu tal presunção com a confissão do recorrente marido quando o mesmo afirmou, em sede de inspecção, que a mãe da recorrente tinha 80 anos, encontrava-se em cadeira de rodas e sem capacidade de falar há cerca de 10 anos, acrescentando aquele que, por isso, quem movimentava a conta ea/é a sua esposa R… (a agora recorrente).
VIII - Os recorrentes, quando propuseram a acção de recurso em 1a instância não impugnaram o relatório de inspecção na parte em constava aquela afirmação do recorrente. Portanto, a AT aceitou tal omissão de impugnação como sendo a admissão e aceitação da confissão dos factos.
IX - Mais, o facto de vir agora desdizer uma coisa que disse em sede de inspecção e não impugnou logo quando propôs a acção em primeira instância é “venire contra factum proprium”, o que é proibido.
X - Os recorrentes não demonstram nem provam qual é a fonte da manifestação de fortuna nos anos de 2010 e 2011.
XI - Aliás de tal forma não o fazem que os extratos das contas demonstram que na sua grande maioria, para não se dizer todos, têm proveniência em depósitos em numerário e transferências de contas de offshores.
XII - Ora, não se pode aceitar que os depósitos em numerário em transferências de offshores são aceites como manifestação fortuna.
XIII - Se tal fosse aceite, estaria descoberta a forma para justificar as manifestações de fortuna, designadamente aquelas que têm origem ilegal, já que bastava depositar o dinheiro numa conta, no caso dos depósitos em numerário, o dinheiro todo de uma só vez ou de forma parcelar e nesse mesmo ano investi-lo para o tomar dinheiro legal.
XIV - No caso das transferências de offshores para a conta bancária dos recorrentes, sem se saber quem era o proprietário da conta sediada no offshore e sem se saber o que motivou essa transferência, é evidente que não se pode aceitar forma de justificar as manifestações de fortuna e muito menos como alegam os recorrentes que serve para provar os já eram rendimentos seus em data anterior aos anos de 2010 e 2011.
XV - Nessa medida, por tudo o que foi dito nas presentes contra-alegações de recurso e por tudo o que foi dado como provado na sentença do tribunal a quo, os recorrentes não demonstram ter a razão, já que não demonstram qual a fonte das manifestações de fortuna.
Termos em que não deve ser dado provimento ao recurso e, dessa forma, manter-se a sentença do tribunal a quo.”

O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu o parecer de fls. 190-192 dos autos, no sentido da improcedência do recurso.

Sem vistos, por se tratar de processo classificado de urgente, vem o processo à Conferência para julgamento.



2. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO –QUESTÕES A APRECIAR
Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelos Recorrentes, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que as questões suscitadas resumem-se, em suma, em analisar a matéria do valor da causa, apreciar o invocado erro em sede de julgamento de matéria de facto e indagar da legalidade da decisão de fixação da matéria tributável, por erro nos pressupostos de facto e de direito, quer no que concerne à decisão de aplicação dos métodos indirectos, quer no diz respeito à quantificação da matéria colectável.

3. FUNDAMENTOS
3.1 DE FACTO
Neste domínio, consta da decisão recorrida o seguinte:
“…

A) Os recorrentes são casados entre si (fls. 68 e seguintes do PA e confissão dos recorrentes).

B) O recorrente é sócio gerente da empresa A…, Ld.ª, pessoa coletiva n.º 5… (fls. 68e seguintes do PA e confissão dos recorrentes).

C) Os recorrentes nos anos de 2008 a 2011 apresentaram declarações de rendimentos de IRS em que declararam os seguintes rendimentos (fls. 72 do PA):
Ano Tipo de rendimento Rendimento bruto declaradoRendimento líquido declarado
2011Categorias A e F€22.976,91€16.096,00
2010Categorias A e F€34.200,00€25.992,00
2009Categorias A e F€34.200,01€25.681,28
2008Categorias A e F€35.449,25€27.345,24
D) Estas declarações correspondem aos seguintes valores nos anos de 2010 e 2011 (fls. 70 do PA):
Ano 2010Ano 2011
DescriçãoValores declaradosDescriçãoValores declarados
Rendimentos da Categoria A€25.200,00Rendimentos da Categoria A€13.976,91
Dedução específica€8.208,00Dedução específica€6.880,91
Rendimento líquido Cat. A€16.992,00Rendimento líquido Cat. A€7.096,00
Rendimentos da Categoria F€9.000,00Rendimentos da Categoria F€9.000,00
Rendimento coletável total€25.992,00Rendimento coletável total€16.096,00
E) Em 2010 e 2011 os recorrentes eram titulares da conta n.º 00002088826001, do banco Santander Totta (fls. 71 e 79 do PA).

F) Nesta conta no ano de 2010 entraram os salários da recorrente (fls. 71, 72 e 131 a 143 do PA).

G) Além dos salários da recorrente, nesta conta, no ano de 2010, entrou em 30/12/2010 uma transferência internacional no montante de €9.000,00 (fls. 71, 72 e 131 a 143 do PA).

H) Em 2011, além dos salários da recorrente, entrou nesta conta o montante de €139.137,31, correspondente à soma do valor das entradas discriminadas a fls. 71 verso, cujo teor aqui se dá por reproduzido (fls. 71, 72 e 131 a 143 do PA).

I) Em 2010 e 2011 a recorrente e sua mãe, M…, contribuinte fiscal n.º 161 221 157, eram titulares da conta n.º 6880582939, do Banco ….

J) A conta n.º 6880582939, do Banco…, era uma conta solidária (fls. 71 e 79 verso do PA).

K) Nesta conta, no ano de 2010, só entraram os valores referentes à reforma de M… e além deles o montante de €164.238,42, respeitantes às entradas discriminadas a fls. 71 verso e 72, do PA, cujo teor aqui se dá por reproduzido (fls. 71 a 72 e 144 a 161 verso do PA).

L) No ano de 2011, nesta conta só entraram os valores das reformas de M… (fls. 71 a 72 e 144 a 161 verso do PA).

M) No decorrer do procedimento de inspeção documentado realizado aos recorrentes nos anos de 2010 e 2011, documentado no relatório de inspeção tributária (RIT) de fls. 68 a 73 do PA, cujo teor aqui se dá por reproduzido, os serviços de inspeção tributária (SIT) não verificaram qualquer ligação entre a atividade da empresa referida em B), de que o recorrente é sócio gerente, as entradas de valores referidas em G), H) e K) (fls. 68 a 73 do PA).

N) M… é mãe da recorrente, tem 80 anos, anda em cadeira de rodas e sem capacidade para falar há cerca de 10 anos (fls. 68 a 73 do PA).

O) M… auferiu em cada um dos anos de 2010 e 2011 um rendimento bruto de €6.018,80 de pensões, a que corresponde um rendimento líquido de €108,00 (fls. 68 a 73 do PA).

P) Quem movimenta a conta referida em I) e J) é a recorrente (fls. 68 a 73 do PA).

Q) Em 1/11/2013, no âmbito do procedimento de inspeção referido em M), os recorrentes foram notificados para apresentarem elementos que justifiquem as entradas de dinheiro referidas em G), H) e K) (fls. 56 a 57 e 68 a 73 do PA).

R) A notificação realizada consta de fls. 56 a 57 do PA, cujo teor aqui se dá por reproduzido.

S) Os recorrentes não apresentaram nenhuns elementos aos SIT (fls. 56 a 57 e 68 a 73 do PA).

T) Com base nos elementos apurados no procedimento de inspeção constante do RIT de fls. 68 a 73 do PA, cujo teor aqui se dá por reproduzido, os SIT concluíram que o dinheiro entrado nessas contas bancárias pertencia aos recorrentes e que por haver uma divergência não justificada com os rendimentos declarados nos respetivos anos, havia motivo para a correção do rendimento coletável dos recorrentes dos anos de 2010 e 2011, nos termos do art. 87.º, n.º 1, alínea f), da LGT (fls. 68 a 73 do PA).

U) A administração tributária com base no RIT de fls. 68 a 73 do PA, cujo teor aqui se dá por reproduzido, e nas suas conclusões decidiu proceder à correção do rendimento coletável dos recorrentes nos anos de 2010 e 2011, nos termos dos arts. 9.º, n.º 1, alínea d), e 39.,º do CIRS, 87.º, n.º 1, alínea f), 88 e 89.º-A, da LGT, tendo apurado incrementos patrimoniais injustificados nos montantes de €173.238,42 e €139.137,21, nos anos de 2010 e 2011, respetivamente.

V) Em consequência a administração tributária alterou os rendimentos declarados pelos recorrentes, nos seguintes termos (fls. 68 a 73 do PA):
Ano 2010
DescriçãoValores declaradosMétodos indiretos Valores corrigidos
Rendimentos da Categoria A€25.200,00€25.200,00
Dedução específica€8.208,00€8.208,00
Rendimento líquido Cat. A€16.992,00€16.992,00
Rendimentos da Categoria F€9.000,00€173.238,42€173.238,42
Rendimento coletável total€25.992,00€173.238,42€199.230,42
Ano 2011
DescriçãoValores declaradosMétodos indiretos Valores corrigidos
Rendimentos da Categoria A€13.976,91€13.976,91
Dedução específica€6.880,91€6.880,91
Rendimento líquido Cat. A€7.096,00€7.096,00
Rendimentos da Categoria F€9.000,00€139.137,21€139.137,21
Rendimento coletável total€16.096,00€139.137,21€155.233,21
W) A Autoridade Tributária e Aduaneira, por decisão de 18/12/2013 do Diretor de Finanças do Porto, junta de fls. 74 a 75 do PA, cujo teor aqui se dá por reproduzido, apurou e fixou, por avaliação indireta, nos termos dos arts. 9.º, n.º 1, alínea d), e 39.º do CIRS, 87.º, n.º 1, alínea f), e 89-ºA, n.º 6, da LGT, o rendimento líquido tributável dos recorrentes nos anos de 2010 e 2011, a enquadrar na Categoria G, nos montantes de €199.230,42 e €155.233,21, para cada dum desses anos (fls. 68 a 76 do PA).

X) A sociedade comercial referida em B) foi sujeita a uma ação inspetiva que está documentada no RIT junto aos autos de fls. 47 a 57, cujo teor aqui se dá por reproduzido.

II) Com relevância para a decisão da causa, o tribunal julga não provado:

1) Os rendimentos líquidos declarados pelos recorrentes nos anos de 2010 e 2011 foram de €34.200,00 e €22.976,91 (RIT).

3.1.1 – Motivação.

O tribunal julgou provada a matéria de facto relevante para a decisão do recurso com base nos documentos juntos aos autos e ao PA que não foram impugnados, identificados em cada um dos factos, bem como pela confissão dos recorrentes (arts. 341.º, 352.º e seguintes e 362.º e seguintes do CC).

Aqui cumpre apenas explicar a matéria de facto julgada não provada.

Os recorrentes alegaram que a administração tributária não deduziu o valor dos rendimentos líquidos declarados nos anos de 2010 e 2011, no valor de €34.200,00 e €22.976,91. Todavia, os recorrentes não juntaram qualquer prova desse facto, isto é, qualquer prova da declaração de rendimentos de IRS de 2010 e 2011 em que fossem declarados valores que correspondiam a um rendimento líquido desse montante.

Por outro lado, a administração tributária no RIT alegou e demonstrou que o valor do rendimento líquido declarado pelos recorrentes nos anos de 2010 e 2011 foi de €25,992,00 e €16.096,00 e os recorrentes forma notificados desses documentos e nunca os impugnaram.

Por isso, da prova produzida nos autos resulta que o rendimento líquido declarado pelos recorrentes em 2010 e 2011 foi de €25,992,00 e €16.096,00, motivo pelo qual o tribunal julgou provado esses valores em C), D) e V) e, pelo contrário, não provado os valores referidos em 1), porquanto estes valores são desmentidos pelos documentos que comprovam os valores julgados provados.

Sendo um facto alegado pelos recorrentes recaía sobre eles o respetivo ónus da prova (art. 74.º, n.º 1, da LGT), pelo que não tendo feito prova os mesmos têm de ser julgados contra eles, isto é, têm de ser julgados não provados.

A restante matéria de facto alegada não foi julgada provada ou não provada, por revelar-se inútil para a decisão da causa ou por integrar conceitos de direito ou alegações conclusivas quer de facto quer de direito.”

3.2 DE DIREITO

Assente a factualidade apurada cumpre, então, antes de mais, entrar na análise da realidade em equação nos autos, sendo que a este Tribunal, está cometida, desde logo, a tarefa de indagar da questão do valor da causa, sendo que, neste domínio, a decisão recorrida ponderou que “para efeito de custas ou outros previstos na lei, o Tribunal fixa o valor da causa em €312.375,60 (arts. 306.º, n.º 1, ab initio do CPC, ex vi 2.º, alínea e), e 97.º-A, n.º 1, alínea b), do CPPT).”.
Nas suas alegações, os Recorrentes defendem que a douta decisão recorrida incorreu em erro de julgamento ao considerar que o valor da causa é o valor das correcções introduzidas pela AT aos rendimentos declarados de IRS dos Recorrentes aos anos de 2010 e 2011 no valor respectivamente de € 173.238,42 e € 139.137,21, em vez do valor que resultar da taxa aplicável ao englobamento dos rendimentos de IRS pela introdução daquelas correcções.
Ora, o art. 97-A nº 1 al. b) do CPPT, norma que trata a matéria do valor da causa, refere que “os valores atendíveis, para efeitos de custas ou outros previstos na lei, para as acções que decorram nos tribunais tributários, são os seguintes: b) Quando se impugne o acto de fixação da matéria colectável, o valor contestado.
A partir daqui, estando em causa a decisão de avaliação da matéria colectável pelo método indirecto constante do art. 89º-A da LGT, de que cabe recurso para o tribunal tributário, com efeito suspensivo, a tramitar como processo urgente, não sendo aplicável o procedimento constante dos artigos 91.º e seguintes, pois que ao recurso referido no número anterior aplica-se, com as necessárias adaptações, a tramitação prevista no artigo 146.º-B do Código de Procedimento e de Processo Tributário, é manifesto que os Recorrentes não têm razão neste domínio, na medida em que o enquadramento da matéria em apreço tem expressa previsão no art. 97º-A nº 1 al. b) do CPPT, sendo que o valor contestado está relacionado com o alcance da decisão posta em crise no âmbito do presente processo, ou seja, com o valor da matéria colectável fixada e não com o eventual imposto que virá a ser liquidado.

Em seguida, os Recorrentes questionam a sentença recorrida quanto à decisão sobre a matéria de facto, sendo que constituindo tal erro de julgamento não só o primeiro aduzido mas, em especial, aquele de cuja decisão estaria dependente o que este Tribunal de recurso viesse a decidir quanto ao erro de julgamento de direito, impõe-se, naturalmente, que à sua apreciação venha a ser dada primazia.
Vejamos.
Na óptica dos Recorrentes, a resposta à matéria de facto vertida em “C” dos factos provados e a resposta dada a matéria de facto vertido em “1” dos factos não provados é contraditória entre si e resulta dos autos a prova de que os Recorrentes declararam rendimentos da categoria “A” e “F” no valor de € 34.200,00 e € 22.976,91 respetivamente para os anos de 2010 e 2011, o que significa que deve ser eliminada dos factos não provados a resposta vertida em “1” dos factos não provados.
Pois bem, neste domínio, cumpre ter presentes os dois elementos descritos:
C) Os recorrentes nos anos de 2008 a 2011 apresentaram declarações de rendimentos de IRS em que declararam os seguintes rendimentos (fls. 72 do PA):
Ano Tipo de rendimento Rendimento bruto declaradoRendimento líquido declarado
2011Categorias A e F€22.976,91€16.096,00
2010Categorias A e F€34.200,00€25.992,00
2009Categorias A e F€34.200,01€25.681,28
2008Categorias A e F€35.449,25€27.345,24
1) Os rendimentos líquidos declarados pelos recorrentes nos anos de 2010 e 2011 foram de €34.200,00 e €22.976,91 (RIT).

Neste ponto, não se afigura que exista uma contradição nos termos propostos pelos Recorrentes, na medida em que basta olhar para o quadro apontado para verificar que o Tribunal fez uma distinção entre rendimento bruto declarado e rendimento líquido declarado, sendo que na sua motivação, o Tribunal apontou ainda que “os recorrentes alegaram que a administração tributária não deduziu o valor dos rendimentos líquidos declarados nos anos de 2010 e 2011, no valor de €34.200,00 e €22.976,91. Todavia, os recorrentes não juntaram qualquer prova desse facto, isto é, qualquer prova da declaração de rendimentos de IRS de 2010 e 2011 em que fossem declarados valores que correspondiam a um rendimento líquido desse montante.

Por outro lado, a administração tributária no RIT alegou e demonstrou que o valor do rendimento líquido declarado pelos recorrentes nos anos de 2010 e 2011 foi de €25,992,00 e €16.096,00 e os recorrentes forma notificados desses documentos e nunca os impugnaram.

Por isso, da prova produzida nos autos resulta que o rendimento líquido declarado pelos recorrentes em 2010 e 2011 foi de €25,992,00 e €16.096,00, motivo pelo qual o tribunal julgou provado esses valores em C), D) e V) e, pelo contrário, não provado os valores referidos em 1), porquanto estes valores são desmentidos pelos documentos que comprovam os valores julgados provados.”

Assim sendo, não se vislumbra a contradição defendida pelos Recorrentes, sendo que em relação à consideração como não provados dos pontos T, U e V, bem como a parte do ponto N que dá como provado “... sem capacidade de falar”, tem de acompanhar-se o exposto pela Recorrida quando aponta que, por um lado, como é referido no Relatório de Inspecção que se limitou a transcrever as afirmações do recorrente (J…), a mãe da recorrente (M…) tinha 80 anos, encontrava-se em cadeira de rodas e sem capacidade de falar há cerca de 10 anos, acrescentou o recorrente em declarações à Inspecção que, por isso, quem movimenta a conta nº 6880582939 no banco… é a sua esposa R… (a recorrente), sendo certo que M… auferiu em cada um dos anos de 2010 e 2011 um rendimento bruto de €6.018,80 relativo a pensões, correspondendo a um rendimento líquido de € 108,90, de modo que, as afirmações em apreço são eloquentes no que concerne ao verdadeiro titular da conta e dos montantes aí depositados era a recorrente e, por outro lado, e de forma decisiva, os Recorrentes tiveram a possibilidade de contestar o exposto quer em sede de audiência prévia, quer quando apresentaram a petição inicial do recurso da aplicação dos métodos indirectos, no entanto não o fizeram, sendo que podiam, designadamente, ter requerido a realização de prova testemunhal da mãe da requerente ou até prova pericial, tendo, com isso, demonstrado que aquela não se encontrava nas condições que são descritas no Relatório de Inspecção e que o próprio recorrente tinha afirmado, perante a inspecção, que era aquele o estado em que aquela se encontrava, não tendo qualquer virtualidade esta nova abordagem apenas em sede de recurso.


Os Recorrentes insistem depois que estando provado que a conta nº. 6880582939 aberta no banco… era co-titulada pela Recorrente mulher e pela sua mãe, só metade daquela conta que importava em € 82.199,21 poderia ser atribuída à Recorrente mulher e só este valor poderia integrar o englobamento dos rendimentos dos Recorrentes objecto das correcções pelos métodos indirectos.

No entanto, em função do insucesso dos Recorrentes em questionar a matéria vertida no probatório, tem de entender-se, como faz a sentença recorrida, que independentemente de qualquer presunção decorrente da titularidade da conta, nos termos dos arts. 513.º e 516.º do CC e 1.º, n.º 7, do CIS, a administração tributária alegou e demonstrou que era aos recorrentes que pertencia o valor dos depósitos e transferências bancárias realizadas para a conta do Banco…, detida pela recorrente e pela sua mãe e que considerou que faziam parte do acréscimo de património dos recorrentes, elidindo dessa forma a presunção que metade do montante depositado nessa conta, e que foi considerado acréscimo patrimonial dos recorrentes, pertencia à mãe da recorrente.

Ao invés, os recorrentes não foram capazes de demonstrar que do valor considerado pela administração tributária como acréscimo de património a totalidade, metade ou qualquer outra parte desse valor pertencia à mãe da recorrente, co-titular da conta bancária do Banco… em que foram depositados esses montantes. Acresce ainda que os recorrentes além de não fazerem qualquer prova que dos montantes depositados na conta da recorrente e da mãe, metade ou qualquer outra parte, com excepção do valor das reformas depositadas nessa conta e que a própria administração tributária considerou que eram valores da mãe da recorrente e que não os englobou no valor do acréscimo patrimonial dos recorrentes, pertenciam à mãe da recorrente e além disso não impugnaram a prova em que a administração tributária sustentou a sua conclusão de que os valores depositados nessa conta que foram considerados acréscimo patrimonial pertenciam aos recorrentes e bem assim os factos alegados pela administração tributária que revelam que esses montantes eram pertença deles, não merecendo qualquer censura a posição assumida pela decisão recorrida neste âmbito.


Os Recorrentes referem depois que o nº. 3 do art.89ºA da LGT apenas impõe aos sujeitos passivos e por esse facto aos aqui Recorrentes, o dever de demonstrar que é outra a fonte das manifestações de fortuna e não que provem a origem desses rendimentos, sendo que os Recorrentes provaram que a fonte dos seus rendimentos provêm de retirada por conta de lucros no montante de € 61.389,07 e de € 45.000,00 da sociedade A…, Lda, e de resgate de valores que já eram seus de instrumentos financeiros como resulta da transcrição dos extractos da conta corrente, cumprindo assim a obrigação que sobre elas impende pela aplicação do nº. 3 do art.89ºA da LGT, além de que o relatório inspectivo ao invocar que a totalidade do depósito da conta 6880582939 pertence à Recorrente mulher não tem qualquer força probatória dado que não obedece aos princípios estabelecidos nos arts.362º a 396º do CC, o que significa que a douta sentença recorrida incorreu assim em erro de julgamento ao dar respostas contraditórias à matéria de facto e a julgar contra disposição expressa da Lei que define nas relações de solidariedade activa nos depósitos a titularidade a partes iguais no depósito bancário quando não resulta da relação jurídica estabelecida que são diferentes as suas partes, não sendo, não sendo dever dos Recorrentes provar o direito à titularidade de apenas metade do depósito por esse direito resultar da Lei, e sim à parte - AT - que impugna esse direito.
Que dizer?
Nos termos do disposto no artigo 89º-A, nº 1, da LGT, “há lugar a avaliação indirecta da matéria colectável quando falte a declaração de rendimentos e o contribuinte evidencie as manifestações de fortuna constantes da tabela prevista no n.º 4 ou quando o rendimento líquido declarado mostre uma desproporção superior a 50%, para menos, em relação ao rendimento padrão resultante da referida tabela”.
Decorre, pois, da norma acabada de transcrever, que constituem pressupostos legais vinculativos da actuação da administração tributária no sentido da determinação da matéria tributável nos termos ali previstos e que esta está, portanto, obrigada a provar (cf. artigo 74º, nº 1 da LGT e artigo 342º, nº 1 do Código Civil): (i) a existência de uma das manifestações de fortuna legalmente tipificadas e bem assim (ii) a desproporção entre os rendimentos declarados pelo sujeito passivo que evidencia tal manifestação e o rendimento padrão resultante da tabela do nº 4 do artigo 89º - A da LGT.
Como assinala a melhor doutrina, “a tributação dos rendimentos inferidos das manifestações de fortuna tem como fundamento o dever fundamental de pagar impostos e a necessidade, daí decorrente, de combater a evasão fiscal [que] visa evitar que certo tipo de rendimentos, actuais ou passados, que tenham escapado ao controlo legal, deixem de ser tributados” - nestes termos, João Sérgio Ribeiro, Tributação Presuntiva do Rendimento, Um Contributo para Reequacionar os Métodos Indirectos de Determinação da Matéria Tributável, Almedina, 2010, pág. 273.
Na sequência do exposto, cabe então à Administração Tributária (art. 74.º, n.º 1, da LGT e art. 342.º, n.º 1, do C. Civil) provar o facto que, segundo a lei, constitui uma manifestação de fortuna e ao sujeito passivo cabe o ónus de provar que os rendimentos declarados correspondem à realidade e que é outra a fonte das manifestações de fortuna ou do acréscimo do património ou da despesa efectuada (ou seja, ocorre uma inversão do ónus da prova).
Pois bem, de acordo com o relatório de inspecção que suporta o acto posto em crise, a AT considerou patenteada uma capacidade contributiva dos impugnantes, ora Recorrentes, significativamente maior do que a declarada, ponderando queDe acordo com o exposto no capitulo IV e nos termos do número 5, do artigo 89.º - A da Lei Geral Tributaria, no caso da alínea f) do artigo 87.º da Lei Geral Tributaria, considera-se como rendimento tributável em sede de IRS, a enquadrar na Categoria G - artigo 9.º, n.º 1, alínea d) do CRS, a diferença entre o acréscimo do património e os rendimentos líquidos declarados pelos sujeitos passivos no mesmo período de tributação.
Dado que não foi possível comprovar a origem dos depósitos e transferências recebidas na conta bancária, 00002088826001 no banco Santander Totta no valor de € 148.137,21 e na conta n.º 6880582939 no banco…, no valor de € 164.238,42, iremos enquadrar estes valores na categoria G de IRS, como incrementos patrimoniais não justificados.
De referir que os valores de € 148.137,21 e € 164.238,42 já são a diferença entre o acréscimo de património evidenciado e os rendimentos líquidos declarados, uma vez que nestes valores já foram descontados os valores dos salários e rendas auferidos pelos sujeitos passivos em 2010 e 2011, que por terem sido identificados não foram solicitados elementos para justificarem a sua proveniência.
Assim os incrementos patrimoniais não justificados em 2010 são de € 9.000,00 + € 164.284,42 = € 173.238,42.
Os incrementos patrimoniais não justificados em 2011 são de € 139.137,21 …”

Assim, e na medida em que o recurso ao método indirecto foi fundamentado na alínea f) do artigo 87.º da LGT, norma que estabelece que “a avaliação indirecta só pode efectuar-se em caso de: … f) Acréscimo de património ou despesa efectuada, incluindo liberalidades, de valor superior a (euro) 100 000, verificados simultaneamente com a falta de declaração de rendimentos ou com a existência, no mesmo período de tributação, de uma divergência não justificada com os rendimentos declarados”, face à factualidade que vem provada, tem de considerar-se justificado.
Com efeito, de acordo com o probatório, os ora Recorrentes não conseguiram provar a origem dos depósitos nas contas bancárias, não tendo fornecido qualquer elemento justificativo para tanto e existe uma divergência apurada, nos anos em apreço, entre as entradas em dinheiro/depósitos e o rendimento declarado em sede de IRS, superior a € 100.000,00, sendo que não pode aceitar-se a tese dos Recorrentes no sentido de que “da leitura do nº.3 do art.89ºA da LGT apenas se infere que o que se exige é a prova da fonte dos fundos e não da origem desses mesmos fundos. E não exigindo a Lei a prova da origem daqueles fundos, não se lhes poderá exigir que provem como é que os adquiriram, uma vez que tais rendimentos poderiam ter sido já sujeitos à tributação nos anos em que foram produzidos”.
Ou seja, para os Recorrentes basta a alusão à causa dos valores creditados na conta para cumprir com a obrigação estabelecida na lei, quando o que está em causa, em termos essenciais, é afastar a ideia de que tais rendimentos estão sujeitos a tributação, nomeadamente, como referem os Recorrentes, evidenciando que se trata de rendimentos já sujeitos a tributação em devido tempo.

Nesta sequência, e a partir do momento em que a AT fez a prova da verificação dos pressupostos legais do recurso a métodos indirectos para a determinação da matéria tributável que suporta o acto posto em crise, passou então a recair sobre os Recorrentes o ónus da prova da inexistência dos factos tributários ou de erro ou excesso na quantificação da matéria tributável efectuada.
Com efeito, e como referem Diogo Leite Campos, Benjamim da Silva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa, Lei Geral Tributária, Anotada e comentada, 4ª edição, 2012, pág. 782-783, “… De harmonia com o n.º 3 deste art. 89.º-A, quando se prova a existência de uma das manifestações de fortuna dos tipos previstos no n.º 4 ou uma situação enquadrável na alínea f) do n.º 1 do art. 87.º da LGT, cabe ao sujeito passivo a prova de que correspondem à realidade os rendimentos declarados e de que a fonte das manifestações de fortuna evidenciadas não é rendimentos sujeitos a declaração em sede de impostos sobre o rendimento. …
Para afastar a utilização de métodos indirectos de avaliação da matéria tributável o contribuinte tem de demonstrar que detinha proventos que não tinham de ser declarados para efeitos de imposto sobre o rendimento, suficientes para assegurar a manifestação de fortuna que estiver na base de tal utilização, só sendo esta afastada se esses proventos chegarem para assegurar a totalidade da manifestação de fortuna em causa.
Porém, se o sujeito passivo conseguiu demonstrar que parte dos proventos que asseguraram a manifestação de fortuna não tinham de ser declarados, não será afastada a utilização de métodos indirectos, mas ao rendimento presumido nos termos deste art. 89.º-A, que é a base da tributação, será de abater a parte dos proventos que se tiver provado que não tinham de ser declarados.
Para tal demonstração, não basta que se demonstre que o sujeito passivo possuía, no período de tempo em causa, bens suficientes que lhe permitiriam assegurar a manifestação de fortuna, sendo necessário que se demonstre que ela foi efectivamente assegurada com esses bens. …”.

Pois bem, em função do probatório apurado nos autos, tem de entender-se que não assiste razão aos recorrentes, porquanto não demonstraram que os rendimentos declarados correspondiam à realidade e que era outra a fonte do acréscimo do património, na medida em que se impunha comprovar a origem das operações descritas, afirmando também o enquadramento dos negócios subjacentes, por forma a permitir uma percepção da realidade nos termos propostos pelos Recorrentes.

Com efeito, provados os pressupostos de aplicação do n.º 1 do artigo 89.º-A da LGT, passa a caber ao sujeito passivo a prova de que correspondem à realidade os rendimentos declarados e de que é outra a fonte das manifestações de fortuna evidenciadas, nomeadamente, herança ou doação, rendimentos que não esteja obrigado a declarar, utilização do seu capital ou recurso a crédito (arts. 74.º, n.º 3, e 89.º-A, n.º 3, da 89º-A da LGT).

A lei ao dizer que o sujeito passivo tem de provar que “é outra a fonte das manifestações de fortuna evidenciada” pretende o sujeito passivo indique a “fonte”, o mesmo é dizer, a origem da manifestação de fortuna, como é que ela se materializou, facto que, como se disse, não se basta com a indicação da sua origem, impondo-se a afirmação do circuito em causa para afastar a afirmação de que tais rendimentos estão sujeitos a tributação.
Aliás, como bem refere a Recorrida, os Recorrentes tentam justificar os incrementos patrimoniais com transferências de contas sediadas em offshores e depósitos em numerário, sendo que o facto das transferências internacionais terem sido feitas para as contas dos recorrentes não quer dizer que o dinheiro já lhes pertencia, já que não se sabe quem era o proprietário na origem e muito menos qual foi o motivo que deu origem àquelas transferências e, muito menos fica demonstrado que aquela fortuna foi obtida em anos anteriores, ou seja, não se sabe se o dinheiro aqui em apreço deveria ter sido ou não declarado, já que não se sabe qual a sua proveniência e qual o motivo que levou à realização daquelas transferências para a conta dos recorrentes, de modo que, a fortuna evidenciada não se encontra minimamente justificada.
Diga-se ainda que não pode deixar de assinalar-se que a proceder o entendimento dos Recorrentes, a partir de agora seria fácil legalizar os rendimentos ilícitos, bastava para tanto colocar esse dinheiro em offshores depois transferia-se para Portugal e, automaticamente, seria considerado dinheiro justificado e legal.

Avançando, e tratada que está a questão da conta titulada pela Recorrente mulher e sua mãe, importa apenas analisar a matéria dos rendimentos provenientes de retirada por conta de lucros no montante de € 61.389,07 e de € 45.000,00 da sociedade A…, Lda, a sentença recorrida ponderou que:

“…

Os recorrentes alegam ainda que ocorre excesso de quantificação porquanto na sequência duma ação inspetiva à sociedade comercial de que o recorrente é sócio gerente foram presumidos adiantamentos por conta dos lucros no valor de €61.089,07 e €45.000,00, nos termos do art. 6.º, n.º 4, do CIRS, pelo que esses montantes têm de ser deduzida à matéria tributável corrigida o valor do rendimento parcialmente justificado.

A este propósito a jurisprudência do Colendo Supremo Tribunal Administrativo tem afirmado reiteradamente que a justificação parcial do rendimento sujeito a tributação através da manifestação de fortuna não obsta à verificação dos pressupostos para aplicação da tributação por manifestação de fortuna, mas tem de ser deduzida no valor da matéria coletável.

A este propósito cita-se o douto acórdão do pleno da secção do contencioso tributário do Colendo Supremo Tribunal Administrativo de 10/04/2013 (processo 298/12, disponível em www.dgsi.pt):

“I - O acto tributário, enquanto acto divisível, tanto por natureza como por definição legal, é susceptível de anulação parcial.

II - O critério para determinar se o acto deve ser total ou parcialmente anulado passa por determinar se a ilegalidade afecta o acto tributário no seu todo, caso em que o acto deve ser integralmente anulado ou apenas em parte, caso em que se justifica a anulação parcial.

III - Sendo legal o recurso ao método indirecto previsto no n.º 4 do artigo 89.º-A e verificando-se que a ilegalidade da quantificação operada pela Administração tributária se circunscreve à desconsideração da justificação parcial da manifestação de fortuna no cálculo do rendimento padrão - ilegalidade esta que se verifica apenas na medida da não justificação, que não no demais, e corrigível mediante mera operação aritmética que, em cumprimento do decidido, expurgue do valor da matéria colectável fixada o valor justificado -, haverá lugar à anulação apenas parcial do acto sindicado, que não à sua anulação total”.

Assim, ainda que se considerasse existir uma justificação parcial do rendimento, esse facto não obstava à legalidade da aplicação da tributação da matéria coletável por métodos indiretos através de manifestação de fortuna.

A justificação parcial só contenderia que com a quantificação da matéria tributável, à qual teria de deduzir-se o valor do rendimento parcialmente justificado.

Todavia, no caso em apreço não existe qualquer justificação parcial do rendimento.

Desde logo, porque resulta da fundamentação do RIT que na análise das contas bancárias e dos depósitos e transferências que determinaram o acréscimo de património dos recorrentes não se verificou qualquer ligação entre a atividade da empresa em que o recorrente é sócio gerente donde resulta que os valores depositados nas contas que estão na origem do acréscimo de património não tiveram origem na referida sociedade, isto é, não foram acréscimos de património oriundos dessa sociedade e como tal não são montantes provenientes de adiantamentos de lucros dessa sociedade. Assim sendo, não está justificado que parte do valor da matéria tributável corrigida esteja justificada como sendo proveniente de adiantamentos de lucros e como tal não pode considerar-se parcialmente justificado o rendimento tributável corrigido.

Por outro lado, apesar da lei presumir que os movimentos realizados na conta da sociedade do recorrente são adiantamentos por conta dos lucros, isso pode não corresponder à realidade, porque podem ser restituição de empréstimos realizados pelos recorrentes.

As correções realizadas pelos SIT na sociedade comercial de que o recorrente é sócio gerente não significam, direta e necessariamente, que esses valores correspondam a rendimentos dos recorrentes - por intermédio do recorrente marido - e muito menos que correspondam a parte do valor do acréscimo rendimento que esteve na origem da correção da matéria coletável. Isto é, os recorrentes não lograram comprovar que parte do rendimento corrigido resultou do valor corrigido pela administração tributária no âmbito do procedimento de inspeção da sociedade comercial do recorrente. Por outras palavras, ao invés do alegado, os recorrentes não lograram justificar ainda que parcialmente o valor dos rendimentos que estiveram na origem da correção da matéria tributável. …”.

Nestas condições, não merece censura o exposto na decisão recorrida, posto que os Recorrentes não logram demonstrar a tal ligação entre a actividade da empresa em que o recorrente é sócio gerente e os valores depositados nas contas que estão na origem do acréscimo de património, sendo que não seria difícil através dos competentes meios de prova evidenciar quais os movimentos a crédito da conta em causa que titulam os invocados rendimentos provenientes de retirada por conta de lucros no montante de € 61.389,07 e de € 45.000,00 da sociedade A…, Lda.

Ora, os Recorrentes, para além de criticarem a ligeireza de procedimento da actuação da AT, pretendem agora trilhar o mesmo caminho, reclamando que em função dos dados apurados na inspecção à referida sociedade, naturalmente, tais valores têm de estar englobados nos rendimentos considerados, quando aquilo que se impunha evidenciar era qual a data ou datas em que tais valores saíram da esfera da sociedade e foram integrados na esfera do sócio, aqui Recorrente marido, apontando para os concretos movimentos a crédito que titulam tal situação.
Daí que na improcedência das conclusões da alegação da recorrente, se impõe, nos termos acima expostos, confirmar a decisão aqui sindicada, com todas as legais consequências.
Improcede, por conseguinte, o presente recurso jurisdicional.

4. DECISÃO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal, de harmonia com os poderes conferidos pelo art. 202.º da Constituição da República Portuguesa, em negar provimento ao recurso jurisdicional interposto pelos Recorrentes, mantendo-se a decisão judicial recorrida.
Custas pelos Recorrentes.
Notifique-se. D.N..
Porto, 12 de Junho de 2014
Ass. Pedro Vergueiro

Ass. Mário Rebelo

Ass. Fernanda Esteves