Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00607/08.8BEPNF
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:05/03/2012
Tribunal:TAF de Penafiel
Relator:Nuno Filipe Morgado Teixeira Bastos
Descritores:CUSTOS
DEDUTIBILIDADE DOS CUSTOS
IRC
PRINCÍPIO DA TRIBUTAÇÃO DO RENDIMENTO REAL
Sumário:I. A dedutibilidade dos custos para efeitos de I.R.C. depende, além do mais, da comprovação de que esse custo foi efetivamente suportado – artigo 23.º, n.º 1, do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas;
II. A verificação de que o custo se encontra documentados em fatura e recibo e foi devidamente escriturado faz presumir a existência material do custo, passando a recair sobre a administração tributária o ónus de comprovar que o custo não existiu – artigo 75.º, n.º 1, da Lei Geral Tributária;
III. Reunidos, porém, indicadores objetivos de que o documento de suporte não titula uma verdadeira transação, em si mesma ou em alguns dos principais componentes (como os sujeitos, o objeto, a data ou o valor), fica abalada a credibilidade desse documento, cabendo ao sujeito passivo oferecer elementos adicionais e externamente confirmáveis que revelem os verdadeiros contornos da operação;
IV. No entanto, se for confirmado que o sujeito passivo adquiriu mesmo artigos da qualidade dos que vêm mencionados na fatura, em valor igual ao que nelas vem mencionado e no exercício correspondente, a impossibilidade de identificar com segurança a identidade do fornecedor não obsta à dedutibilidade do custo correspondente;
V. Entendimento diverso equivaleria a admitir que a correção na parcela dos custos poderia divergir, na sua essência, da verdadeira situação tributária do contribuinte, o que não se concilia com o princípio da tributação do rendimento real das empresas- artigo 104.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa.*
* Sumário elaborado pelo Relator
Recorrente:P..., Lda.
Recorrido 1:Fazenda Pública
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:
1. Relatório
1.1. P…, Lda., n.i.f. 5…, com sede em Rua…, Valongo recorre da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel que julgou improcedente a presente impugnação judicial da liquidação adicional de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (I.R.C.) do exercício de 2001, no valor de € 18.734,75.
Recurso este que foi admitido com subida imediata nos próprios autos e com efeito devolutivo.
1.2. Notificada da sua admissão, a Recorrente apresentou as respectivas alegações e formulou as seguintes conclusões:
1. A sentença recorrida fundamentou-se em factos, tendo-se servido dos mesmos, que deu como provados, que não foram alegados pelas partes;
2. Tais factos são os constantes das alíneas B), C), D), E), F), G), H), I), K), L), M), N), O), P), Q), R), T), U), V), X), Y) e II), dos factos provados;
3. Ao servir-se de tais factos sentença recorrida violou o disposto no art. 264º, n.º 1 e n.º 2 e no art. 664º, do Código de Processo Civil.
4. Sem prejuízo da sua falta de alegação, a matéria constante de K), L), N), O), R), T) é matéria conclusiva;
5. As conclusões constantes destas alíneas foram tiradas no Relatório de Inspecção Tributária e os factos conducentes às mesmas não foram alegados nem sujeitos a contraditório e instrução nos autos;
6. A resposta do Tribunal sobre estas conclusões deve-se ter como não escrita por não versar sobre factos, por aplicação analógica do n.º 4, do art. 646º, do Código de Processo Civil;
7. O tribunal recorrido ao tomar em consideração as conclusões da AT sem discussão dos factos conducentes às mesmas violou o disposto no art. 3º do Código de Processo Civil.
8. A matéria constante da alínea Z) dos factos provados e dos pontos 5), 6), 7), 8), 10) e 11) dos factos não provados foi incorrectamente julgada;
9. Na alínea Z), deveria ter sido dado como provado que a Impugnante comprou os artigos de ourivesaria descriminados nas facturas em causa nos autos, anexas ao Relatório de Inspecção Tributária, apesar dos mesmos não terem sido vendidos por quem figura como emitente das facturas;
10. A matéria constante dos pontos 5), 6), 7), 8), 10) e 11) dos factos não provados, deveria ter sido dada como provada;
11. Tal é o que resulta da prova produzida designadamente do Relatório de Inspecção Tributária, na pág. 12, 1º parágrafo; do Relatório de Inspecção Tributária, na pág. 13, 1º parágrafo; do Relatório de Inspecção Tributária, pág. 13, último parágrafo; da cópia do cheque do montante de 1.845.247$00, junto com o Relatório de Inspecção Tributária; do depoimento da testemunha C…, nas passagens gravadas de 1:13:35 a 1:13:45, de 1:18:20 a 1:19:10, 1:28:00 a 1:29:50 e de 1:36:00 a 1:37:40 que a própria sentença recorrida reconheceu, na pág. 12, 5º e 6º parágrafos, na pág. 16, penúltimo e último parágrafos e na pág. 17, penúltimo e último parágrafos.
12. Sem prejuízo dos pontos anteriores, os factos provados e as conclusões tiradas pelo Tribunal recorrido sobre os mesmos era de molde a que na decisão recorrida fossem considerados verificados os pressupostos previstos na al. a), n.º 1, do art. 23º, do CIRC, considerando-se os valores constantes das facturas de “A…” como efectivamente gastos suportados pela Impugnante, ainda que recebidos por entidade diversa;
13. Ao pretender que a consideração de tais gastos só poderia ser feita se efectivamente tivesse sido o “A…” a vender os artigos constantes das facturas, desconsiderando que a Impugnante, efectivamente, comprou tais artigos ainda que a outra pessoa, o Tribunal recorrido fez uma errada interpretação e aplicação do preceito legal citado.
1.3. A Fazenda Pública não contra-alegou.
1.4. Neste Tribunal, o Digno Magistrado do Ministério Público emitiu douto parecer onde analisou detalhadamente todos os fundamentos do recurso e concluiu que o recurso não merece provimento.
1.5. Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
1.6. São as seguintes as questões fundamentais a decidir:
§ saber se deve ser revogada a decisão da matéria de facto, por terem sido dados como provados factos que não foram alegados e por terem sido inseridas na matéria de facto meras conclusões;
§ saber se o Tribunal “a quo” incorreu em erro de julgamento da matéria de facto, que quanto ao facto dado como provado na alínea “Z” quer quanto à matéria de facto não provada, inserida nos pontos “5)”, “6)”, “7)”, “8)”, “10)” e “11)”;
§ Saber se o Tribunal “a quo” incorreu em erro de julgamento da matéria de direito ao concluir que não estavam verificados os pressupostos na alínea a), n.º 1, do artigo 23.º, do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (doravante sob a sigla «C.I.R.C.»).
2. Fundamentação de Facto
2.1. É o seguinte o acervo dos factos que em primeira instância foram dados como provados:
A. Pela ordem de serviço n.º OI 200503956, a impugnante foi sujeita a um procedimento externo de inspecção parcial ao IRC e IVA do exercício de 2001, com início em 10/8/2005 e termo em 11/8/2005 (fls. 10 do apenso). - - -
B. A impugnante está colectada desde 30/4/1996, data em que iniciou a actividade com o CAE 36222 – Fabricação de artigos de joalharia e de outros de ourivesaria (fls. 10 do apenso). - - -
C. A impugnante está enquadrada no regime geral de tributação em IRC e no regime normal de periodicidade mensal de IVA e cumpriu as suas obrigações declarativas nos exercícios de 2001 a 2004 (fls. 10 e 11 do apenso). - - -
D. A acção inspectiva enquadrou-se na acção especial a operadores do sector dos metais precisos, procedendo-se a uma análise dos movimentos, em termos de peso, dos metais preciosos efectuados pela impugnante no ano de 2001 (fls. 11 do apenso). - - -
E. No ano de 2002 a impugnante vendeu 186.872,00 gramas de produtos em ouro toque 800 (fls. 12 do apenso). - - -
F. Nesse ano a impugnante contrastou 177.210,00 gramas de ouro toque 800 (fls. 12 do apenso). - - -
G. A diferença entre os produtos vendidos e os contrastados, 9.662,00 gramas de ouro toque 800, constavam na existência inicial de produtos (fls. 12 do apenso). - - -
H. No exercício de 2001, a impugnante declarou vendas no valor de 2.012.777,00 €, um custo das mercadorias vendidas e matérias consumidas de 1.705.157,00 € e um lucro tributável de 16.531,00 € (fls. 12 do apenso). - - -
I. No exercício de 2001, a impugnante teve uma margem bruta de 15,28%, a que corresponde uma rentabilidade fiscal de 0,82%, quando a média nacional foi de, respectivamente, 31,34% e 1,74%, o que representa um desvio de -16,06% e de -0,92% (fls. 12 do apenso). - - -
J. A impugnante tinha contabilizado na sua contabilidade e deduzido o IVA das seguintes facturas de A…, contribuinte fiscal n.º 1… (fls. 14 do apenso): - - -
Documento
Número
Data
Valor
IVA
Valor com IVA
Factura1.034
17/1/2001
10.038,67 €
1.706.57 €
11.745,24 €
Factura1.045
18/9/2001
7.866,71 €
1.337,34 €
9.204,05 €
Factura1.048
1/10/2001
19.571,48 €
3.327,15 €
22.898,63 €
Factura1.050
22/10/2001
8.461,37 €
1.438,43 €
9.899,80 €
Total
45.938,23 €
7.809,49 €
53.747,72 €
K. Na acção inspectiva realizada a coberto da ordem de serviço n.º OI200400006, concluída em 9/6/2004, conclui-se que A… seria um dos intervenientes numa fraude de IVA, pela não entrega dos montantes liquidados que eram posteriormente deduzidos pelos utilizadores das suas facturas (fls. 14 do apenso). - - -
L. A administração tributária concluiu também que A… não exerceu a actividade, fundamentada nos seguintes factos: (1) A... não tinha instalações para a fabricação de artigos em ouro, já que apenas ocupou a oficina, que indicou aquando da sua inscrição na contrastaria, durante 3 ou 4 dias; (2) A... não tinha capacidade produtiva para a fabricação de artigos em ouro, já que não tinha nem máquinas nem empregados; (3) ele declarou ter contrastado 173 Kg de ouro em 2001 e 93 Kg em 2002, sendo que a fabricação de artigos com esses pesos, requer uma capacidade produtiva significativa, nomeadamente uma oficina, máquinas e empregados, o que A... não tinha; (4) apesar de ter declarado que contrastou 266 Kg apenas se apuraram compras de 36 Kg de ouro (fls. 14 e 15 do apenso). - - -
M. Em todo esse processo as intervenções A... foram muito raras: ao longo dos dois anos em que contrastou artigos nunca se deslocou à contrastaria, tendo sempre sido outra pessoa a fazê-lo; o fornecedor de ouro de A..., referiu que este apenas se deslocou à sua empresa aquando da primeira compra de ouro, tendo posteriormente sido outras pessoas a levantar o ouro; o gerente da impugnante afirmou não conhecer A..., tendo negociado com F…; a mãe de A... afirma que à data destas operações comerciais, o seu filho encontrava-se no estrangeiro e que a letra que consta das facturas não é a dele; e também referiu que o seu filho nunca foi fabricante de ourivesaria, mas apenas um mero cravador de pedras em artigos de ourivesaria (fls. 15 do apenso). - - -
N. A administração tributária concluiu que A... não exerceu qualquer actividade de fabricação de artigos de ourivesaria, apenas tendo permitido que o seu nome fosse utilizado por terceiros para obtenção de benefícios uma vez que sabiam que este não cumpriria as suas obrigações fiscais; permitiu também que o seu nome fosse utilizado para adquirir ouro que depois de transformado terá sido vendido sem emissão da respectiva factura ou com facturas de A... fugindo assim ao pagamento do IVA; e permitiu ainda que na contrastaria o seu nome fosse utilizado para contrastar artigos fabricados por outras pessoas, evitando assim contrastar em seu nome, o que possibilita a sua posterior venda sem liquidação do respectivo lVA (fls. 15 do apenso). - - -
O. A impugnante não possui comprovativos do pagamento das facturas de A..., já que apenas emitiu um cheque de 1.845.247$00 (9.204,05 €), ou seja, cerca de 20% do valor total das facturas (fls. 16 do apenso). - - -
P. Esse cheque no montante de 1.845.247$00, não foi levantado nem depositado por A... (fls. 16 do apenso). - - -
Q. A administração tributária considerou não dedutível o IVA constante das facturas emitidas em nome de A..., por não titularem negócios reais (fls. 16 do apenso). - - -
R. Por esse motivo também consideraram que o valor dessas facturas não podem ser considerados custos para a impugnante, para efeitos do apuramento do lucro tributável do exercício de 2001 (fls. 16 do apenso). - - -
S. Em consequência foi determinada a seguinte correcção da conta 61 – Custo das Mercadorias Vendidas e Matérias Consumidas (CMVMC), do ano de 2001 (fls. 17 do apenso): - - -
Apuramento do Custo das Mercadorias Vendidas
MercadoriasDeclaradoCorrecçãoCorrigido
Existência inicial1948.020,31 €0,00 €948.020,31 €
Compras21.687.4087,90 €-45.938,23 €1.641.470,67 €
Regularizações30,00 €0,00 €0,00 €
Existência final4884.334,30 €0,00 €884.334,30 €
CMVMC5=1+2+3-41.751.094,91 €-45.938,23 €1.705.156,68 €
T. O custo das mercadorias vendidas de 2001, encontrava-se sobrevalorizado no montante de 45.938,23 €, devido à consideração, no apuramento do lucro tributável, dos valores respeitantes às facturas emitidas em nome de A... (fls. 17 do apenso). - - -
U. A impugnante nos anos de 2001 e 2002, com 8 funcionários produziu 145 Kg de artigos em ouro (fls. 20 do apenso). - - -
V. A caligrafia das facturas n.ºs 1034 e 1045 emitidas em nome de A... é diferente da caligrafia das facturas n.ºs 1048 e 1050 (fls. 34 a 37 do apenso). - - -
W. A impugnante dispõe apenas de recibos das facturas n.ºs 1045, 1048 e 1050 (fls. 38 e 39 do apenso). - - -
X. Mateus de Sousa Almeida, gerente da impugnante, declarou que as facturas em causa nestes autos e os respectivos artefactos foram entregues por F…, sócio gerente da Ourivesaria T…, no Marco de Canavezes (fls. 40 do apenso). - - -
Y. A factura n.º 1045, no valor de 1.845.247$00 está datada de 18/9/2001, o recibo dessa factura está datado de 6/11/2001 e o cheque no mesmo valor, emitido pela impugnante à ordem de A... está datado de 9/11/2001 (fls. 35, 39 e 42 do apenso). - - -
Z. No decurso do ano de 2001, a impugnante comprou artigos de ourivesaria de valor equivalente aos artigos discriminados nas facturas supra referidas, anexas ao Relatório de Inspecção Tributária (fls. 11 e 13 e testemunha C…). - - -
AA. E destinou-os à sua actividade económica, designadamente, à revenda (testemunha H…). - - -
BB. A impugnante, no exercício da sua actividade económica, vendeu a maior parte dos artigos em causa, realizando ganhos e proveitos, os quais foram sujeitos a imposto (testemunha H…). - - -
CC. Alguns desses artigos não foram vendidos (testemunha H…). - - -
DD. A impugnante ainda guarda na sua posse alguns dos artefactos constantes das facturas emitidas em nome de A... (testemunha H…). - - -
EE. Esses artigos encontram-se marcados com o punção de A... (testemunha H…). - - -
FF. A utilização de um punção é obrigatória e a sua marca é colocada nos objectos pelo fabricante dos mesmos identificando-o com tal (fls. 47 e testemunha H…). - - -
GG. Foi a Contrastaria do Porto, entidade pública com esta competência, quem conferiu ao A... o direito a utilizar uma marca identificativa (fls. 47). - - -
HH. Em 2001 era usual fazer pagamentos em dinheiro e por endosso de cheques (testemunhas H… e C…). - - -
II. F… não recebeu remunerações ou comissões de A... (testemunha C…). - - -
2.2. A respeito da matéria de facto não provada, consignou-se em primeira instância o seguinte:
1) As facturas reportam-se a negócios reais e efectivos realizados entre a impugnante e A…. - - -
2) No decurso do ano de 2001, a impugnante foi visitada, nas suas instalações, por um indivíduo de nome F…. - - -
3) F… apresentou-se como vendedor da firma A.... - - -
4) E propôs à impugnante a compra de diversos artigos de ourivesaria da firma da qual era vendedor, tendo, para o efeito, exibido vários desses artigos. - - -
5) A impugnante acordou em comprar os artigos discriminados nas facturas supra referidas, anexas ao Relatório de Inspecção Tributária. - - -
6) Tais artigos, que adquiriu, destinou-os à sua actividade económica, designadamente, à revenda. - - -
7) A impugnante recebeu os artigos constantes das facturas em causa. - - -
8) A impugnante pagou o preço devido pelos artigos constantes das facturas. - - -
9) O vendedor de A... emitiu e entregou as facturas correspondentes às compras efectuadas pela impugnante. - - -
10) A factura n.º 1.045, de 18/09/2001, no valor total de 1.845.247$00 (9.204,056) foi paga através de cheque sacado conta bancária de que a impugnante era titular, emitido à ordem A..., com o valor, igual ao da factura, de 1.845.247$00. - - -
11) As restantes facturas foram pagas, parte em dinheiro, e parte através do endosso de cheques de que a impugnante era legítima portadora, por lhe haverem sido entregues por clientes em pagamento do preço de produtos adquiridos. - - -
12) F… entregou os recibos n.ºs 1035, 1038 e 1039, emitidos em nome de A..., respeitante às facturas n.ºs 1045, 1048 e 1050. - - -

2.3. À fundamentação da resposta à matéria de facto aditou-se ainda na douta sentença o seguinte:
«O tribunal considerou provada a matéria de facto relevante para a decisão da causa com base na análise critica e conjugada dos documentos juntos aos autos e ao processo administrativo que não foram impugnados e bem assim na parte dos factos alegados pelas partes que não tendo sido impugnados (art. 74.º da Lei Geral Tributária (LGT)), também são corroborados pelos documentos juntos aos autos (arts. 76.º, n.º 1, da LGT e 362.º e seguintes do Código Civil (CC)) e dos depoimentos das testemunhas inquiridas, identificados em cada um dos factos provados. - - -
O depoimento da testemunha Patrícia Susana Ribeiro Almeida não relevou para a matéria de facto provada, porquanto prestou um depoimento genérico, sem a assertividade necessária à formação da convicção do tribunal. - - -
Com efeito, respondeu às perguntas feitas de uma forma genérica, esclarecendo que à data dos factos não trabalhava na impugnante, apenas ajudava nos escritórios, nos tempos livres da escola. - - -
Esta circunstância associada à forma genérica como foi respondendo às perguntas feitas (declarando que ajudava desde os 14, 15, 16 anos, não precisando a época a partir da qual pode considerar-se que colaborava nos escritórios da impugnante e à forma como disse que ajudava, nos tempos livres da escola, não permitindo apurar com a certeza necessária a qualquer decisão judicial o período de tempo que permanecia nas instalações da impugnante), à declaração que não se recordava da época em que se passaram os factos em apreço, ao contacto indirecto com os vendedores e não conseguindo esclarecer se no caso do fornecedor em causa os artefactos adquiridos eram entregues de imediato ou se eram encomendados, levaram o tribunal a não atribuir relevância ao seu depoimento, sobretudo por não ter revelado, de forma inequívoca, um conhecimento directo dos factos, indispensável à demonstração da realidade dos factos (arts. 341.º e 396.º do Código Civil (CC)). - - -
O depoimento da testemunha H… revela já alguma maior coerência, porém, conjugada com a restante prova não se revelou integralmente coerente e convincente para o tribunal, sobretudo por uma ou outra incoerência que abalaram o seu depoimento quando confrontado com a restante prova carreada para os autos. - - -
Aqui a incoerência do depoimento da testemunha ressalta do facto de ter declarado que as facturas foram todas emitidas (preenchidas) à sua frente por F…, aquando do fornecimento dos respectivos artefactos, mas se analisarmos as facturas emitidas constatamos que existe uma divergência na caligrafia das facturas, o que objectivamente abala a credibilidade do seu depoimento. - - -
Outra facto que abala a credibilidade do seu depoimento é a circunstância em que terá ocorrido, pelo menos o primeiro fornecimento de material. - - -
Quer do seu depoimento, quer do depoimento de C… ressalta que os contactos e os negócios deste tipo de material pressupõem um grande nível de confiança entre os intervenientes, sobretudo para garantia do pagamento do valor do ouro. - - -
E no que respeita ao primeiro contacto, a testemunha foi peremptória em declarar que não conhecia F... e quando lhe foi perguntado se sabia se o gerente da impugnante, seu tio, já o conhecia, a testemunha declarou que não sabia. Declarou também que não se recordava se pela forma e circunstâncias em que ocorreu esse contacto, se era perceptível que ele já o conhecesse. - - -
Esta alegada falta de conhecimento e de confiança em F..., conjugada com a falta de prova objectiva do pagamento do valor da primeira factura, não é compreensível. - - -
Com efeito, a alegada confiança entre as partes indispensável para este tipo de negócio, não está demonstrada neste primeiro contacto, o que abala a convicção do tribunal para julgar como provado que F... se apresentou à impugnante como vendedor da firma constante das facturas. - - -
Apesar da testemunha ter declarado que F... se apresentou nas instalações da impugnante como vendedor da firma A..., esse depoimento só por si não é bastante para convencer o tribunal, designadamente se conjugarmos esse depoimento com a restante prova junta aos autos, em particular com a falta de prova (objectiva – por documento – e subjectiva – por testemunhas) do pagamento do primeiro fornecimento. - - -
Para formar a sua convicção, o tribunal não pode aceitar o mero depoimento da testemunha, sobretudo quando foi abalado pela discrepância entre o seu depoimento e os documentos juntos aos autos (é incompreensível a discrepância entre as caligrafias das facturas, quando alegadamente terão sido preenchidas pela mesma pessoa). Estas discrepâncias, associadas à dependência familiar e laboral entre a testemunha e a impugnante e os seus sócios gerentes, abalam a credibilidade a atribuir ao seu depoimento. - - -
Daí que apesar de ter declarado que F... se apresentou nas instalações da impugnante como vendedor da empresa A... e forneceu todos os artefactos constantes das facturas emitidas com aquele nome e por aquele preço, emitindo e entregando as respectivas facturas, o tribunal não julgou provada tal matéria de facto. - - -
Esta falta de verosimilhança do depoimento de H… ressalta ainda do facto, incompreensível para o tribunal, da impugnante ser uma empresa familiar e a testemunha presenciar todas as compras e nunca ter presenciado os pagamentos. - - -
Tudo isto, abalou a credibilidade atribuída pelo tribunal a este depoimento, que relevou apenas na parte em que o seu depoimento foi corroborado por outros meios de prova ou pelas regras da experiência. - - -
O depoimento da testemunha C… explicou a forma de realização da inspecção efectuada à impugnante e a sua origem, corroborando os factos descritos no relatório final. - -
Esta testemunha depôs de forma coerente e credível, revelando um conhecimento directo dos factos. - - -
A matéria de facto julgada não provada resulta da ausência de prova. - - -
O ónus da prova de tais factos era da impugnante. Na falta de produção de prova bastante, tais factos têm de ser julgados contra si (arts. 74.º, n.º 1, da LGT e 516.º do CPC). - - -
A prova documental e testemunhal produzida não foi bastante para convencer o tribunal a julgar como provada a matéria de facto que julgou não provada. - - -
Apesar da impugnante ter junto aos autos quatro facturas, três recibos das três últimas facturas e um cheque no valor equivalente ao da segunda factura, ainda assim, essa prova não se revelou suficientemente coerente para formar a convicção do tribunal para julgar como provada a matéria de facto que foi julgada não provada. - - -
Os pontos 1) a 9) pela incoerência do depoimento das testemunhas arroladas pela impugnante, que não lograram convencer o tribunal da correlação existente entre esses documentos e os alegados contactos e fornecimentos realizados por F... em representação de A.... -
Com efeito, ou o gerente da impugnante não conhecia F... e não se compreende como foram efectuadas as referidas transacções (sobretudo as duas primeiras em que não há qualquer prova do pagamento da primeira e em que para pagamento da segunda existe um cheque que apesar da coincidência do valor não demonstra que foi efectivamente usado para pagamento à fornecedora, o que associado à discrepância entre as datas da factura, do recibo e do cheque, abalam a credibilidade a atribuir a esses documentos e à correlação entre a empresa alegadamente fornecedora, o alegado vendedor e a impugnante) ou então já o conhecia e sabia, ou tinha motivos para presumir, que a empresa emitente das facturas não podia ser a fornecedora daqueles artefactos, uma vez que resulta da prova carreada para os autos pela administração tributária, que a empresa A..., apesar de ter punção com a sua marca, não tinha comprovadamente capacidade para produzir artefactos em quantidade equivalente à alegadamente vendida à impugnante. - - -
E estes factos não contrariam a matéria de facto provada nas alíneas Z) a EE). Aí julgou-se provado que a impugnante adquiriu em 2001 artefactos em montante equivalente ao constante das facturas emitidas em nome de A... que vendeu parte na sua actividade comercial, tendo ainda em seu poder uma parte a qual tem aposta o punção de A.... - - -
Porém, este facto não contradiz a matéria de facto não provada nesses números, porque aí apenas se consignou que a aquisição daquele ouro corresponde exactamente ao que consta das facturas desconsideradas pela administração tributária. Só não se provou que esse ouro foi fornecido por F..., como vendedor de A.... - - -
Uma coisa, não exclui a outra. - - -
Os pontos 11) e 12) resultam da total ausência de prova. Nenhuma das testemunhas assistiu aos alegados pagamentos e a junção dos recibos, não é bastante para os comprovar, uma vez que se não há prova da autenticidade das facturas emitidas em nome de A..., também não há prova da autenticidade dos recibos, isto é, que aqueles recibos correspondem ao pagamento das respectivas facturas. - - -
O mesmo vale para o ponto 10), que associado ainda às discrepâncias entre as datas da factura, do recibo e do cheque e à falta de prova do pagamento a A..., abalam a credibilidade do documento, não sendo bastante para comprovar que a factura foi paga. - - -
A prova de tais factos além dos documentos juntos exige ainda uma correspondência entre esses documentos e os meios de pagamento efectivamente utilizados, sobretudo quando está em causa a autenticidade dos factos neles narrados. - - -
E esta correspondência entre os meios efectivamente utilizados para o seu alegado pagamento (dinheiro ou cheque emitido, entregue e pago ao respectivo fornecedor) não foi feita. - - -
Atente-se que a impugnante não tinha conta-corrente de fornecedores, movimentando apenas a conta de caixa o que inviabilizava a comprovação dos pagamentos titulados por recibos (conforme resultou do depoimento da testemunha C…). - - -
Nestes casos, apesar dos factos poderem ser comprovados por prova testemunhal (art. 393.º do CC), os depoimentos devem revelar-se coerentes, assertivos e credíveis ao ponto corroborarem os factos que podiam e deviam ser comprovados documentalmente. O nível de exigibilidade da verosimilhança dos depoimentos das testemunhas nestes casos tem de ser mais exigente, porque têm de substituir a força probatória dum documento. - - -
Ora, não podemos esquecer-nos que «as provas têm por função a demonstração da realidade dos factos» (art. 341.º do CC). - - -
No caso em apreço, a coerência e assertividade dos depoimentos não foi suficiente para o tribunal poder julgar provada a matéria de facto alegada pela impugnante, designadamente o fornecimento efectivo dos artefactos em ouro pela empresa emitente das facturas. - - -
Conjugada toda a prova, o tribunal não ficou convencido que a A... forneceu efectivamente à impugnante os artefactos em ouro constantes das facturas registadas na sua contabilidade emitidas com o nome dele. - - -
Motivo pelo qual julgou não provados os factos constantes da matéria de facto não provada. - - -
Aqui não está em causa a aquisição pelo impugnante de ouro em montante equivalente ao das facturas emitidas com o nome de A.... Está em causa é quem vendeu esse ouro. - - -
E o tribunal não ficou convencido que esse ouro foi efectivamente vendido pelo emitente das facturas: A.... - - -
Os restantes factos alegados não foram julgados provados ou não provados, por constituírem considerações pessoais ou conclusões de facto ou de direito e por não terem relevância para a decisão da causa. - - -».
2.4. A Recorrente não se conforma com o decidido em primeira instância, desde logo, porque o M.mº Juiz a quo levou aos factos provados matéria que, a ser matéria de facto, não foi alegada por nenhuma das partes e de que, por isso, não podia conhecer. Conclui dizendo que foram assim violados os artigos 264.º, nºs 1 e 2 e 664.º, ambos do Código de Processo Civil.
Está em causa o que foi inserido na douta sentença recorrida sob as alíneas “B)” a “I)”, “K)” a “R)”, “T)” a “Y)” e “II)” dos factos provados.
Analisado o respetivo teor, verifica-se que [salvo no caso da alínea “II)”, que adiante analisaremos] foi extraído do relatório de fiscalização de que se junta cópia no processo administrativo em apenso e para que remete expressamente a Senhora Representante da Fazenda Pública no artigo 4.º da douta contestação.
Sucede que as informações oficiais, em que se integra o relatório de fiscalização tributária, não são meio de alegação de factos, mas meio de prova de factos alegados – cfr. artigo 115.º, n.º 2, do Código de Procedimento e de Processo Tributário.
Por outro lado, resulta do artigo 13.º, n.º 1, parte final, do Código de Procedimento e de Processo Tributário que a atividade inquisitória do juiz se deve circunscrever aos factos alegados pelas partes e àqueles que forem do conhecimento oficioso. Sendo que os factos relatados no relatório também não são do conhecimento oficioso do juiz, salvo nos casos a que alude o artigo 264.º, nºs 2 e 3, do Código de Processo Civil.
Não estando alegados determinados factos mencionados no relatório e não sendo estes do conhecimento oficioso, não pode o juiz sobre eles pronunciar-se sem violar o princípio do dispositivo e incorrer em excesso de pronúncia.
Ora, no relatório foram apurados alguns factos a que o M.mº Juiz a quo alude dando como assente, algumas vezes, que a Administração Tributária os apurou e dando como assente, outras vezes o que a Administração Tributária apurou.
Pelas razões sobreditas, entendemos que o Mmº Juiz só podia dar como assente que a Administração Tributária apurou esses factos.
Pelo que, ao abrigo do disposto no artigo 712.º, n.º 1, alínea a) do Código de Processo Civil, decidimo-nos pela modificação da matéria de facto respectiva, que condensaremos numa única alínea com o seguinte teor:
B) Na sequência da ação inspetiva a que alude a alínea anterior, os Serviços de Inspeção Tributária da Direção de Finanças do Porto elaboraram em 20 de Setembro de 2005 o relatório de fiscalização de que se junta cópia de fls. 7 a fls. 42 do processo administrativo em apenso, que aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os legais efeitos e de onde, além do mais, consta o seguinte:
«(…) B. IRC – Compras
Conforme descrito no ponto anterior, as facturas constantes da contabilidade da P…, emitidas por A…, não titulam negócios reais, já que ficou demonstrado que A… nunca realizou estas transacções.
Assim, dado que os valores constantes das Facturas de A... não se referem a negócios reais, esses valores não podem ser considerados custos da empresa, para efeitos de apuramento do Lucro Tributável do exercício de 2001.
Veja-se que o n.º 1 do art.º 23.º do Código do IRC refere que “Consideram-se custos ou perdas os que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora”, o que não é o caso, já que como se referiu anteriormente estas facturas não titulam qualquer negócio real (extrato extraído da pág. 8 do relatório, fls. 16 do apenso). - - -
É diverso o caso da alínea II). O que ali se dá como provado, não só não foi alegado por nenhuma das partes como também não consta do relatório de fiscalização e não se encontra sequer nas decisões graciosas posteriormente proferidas. Este facto foi ventilado pela primeira vez pela testemunha da Fazenda Pública em audiência do tribunal, sem que a Fazenda Pública (a parte que nisso poderia estar interessada) tivesse manifestado a vontade de dele se aproveitar nos termos e para os efeitos do artigo 264.º, n.º 3, do Código de Processo Civil.
E mesmo que o tivesse feito, jamais poderia aproveitar à legalidade do ato porque a fundamentação a posteriori dos atos da administração tributária não é admissível (neste sentido DIOGO LEITE DE CAMPOS, BENJAMIM SILVA RODRIGUES e JORGE LOPES DE SOUSA, in «Lei Geral Tributária Comentada e Anotada», 2.ª edição Revista e Aumentada, Vislis 2000, pág. 327 e jurisprudência aí citada). Pelo que a sua inserção nos factos provados também seria inútil e, por esta via, ilegal – artigo 137.º do Código de Processo Civil.
Assim sendo, o Recorrente também tem razão nesta parte. Pelo que se acorda em eliminar esta alínea dos factos provados.
Fica prejudicado o conhecimento do recurso na parte em que se pedia também a eliminação da matéria integrada nas alíneas “K)”, “L)”, “N)” “O)”, “R)” e “T)” dos factos provados.
2.5. Prossegue a Recorrente impugnando o julgamento da matéria de facto no segmento contido na alínea “Z)” dos factos provados e no ponto “5)” dos factos não provados. Entende a Recorrente que, em vez de se dar como provado que «no decurso do ano de 2001, a impugnante comprou artigos de ourivesaria de valor equivalente aos artigos discriminados nas faturas», se deveria ter dado como provado que «a impugnante comprou os artigos discriminados nas faturas» em causa no relatório de fiscalização.
São, com efeito, coisas distintas a compra dos artigos mencionados nas faturas emitidas em nome de “A...” e a compra de artigos de valor equivalente aos mencionados nessas faturas. Porque, no primeiro caso, se dá como assente que existiu um negócio que teve aquele objeto (e, por conseguinte, que as faturas documentam um negócio jurídico que, objetivamente, se realizou), enquanto no segundo caso se dá apenas como assente que existiu um outro negócio jurídico com objeto semelhante.
Na detalhada fundamentação da resposta à matéria de facto, o M.mº Juiz a quo explicou que não se convenceu «da correlação existente entre esses documentos e os alegados contactos e fornecimentos realizados por F... em representação de A...» pelas seguintes razões fundamentais: 1.ª) ambas as testemunhas apresentadas eram familiares e empregadas da ora Recorrente; 2.ª) o depoimento da segunda testemunha é demasiado genérico e pouco assertivo; 3.ª) a primeira testemunha declarou que todas as faturas foram preenchidas à sua frente por F..., mas esse depoimento não se concilia com a diferente caligrafia das faturas; 4.ª) também não se compreende que, sendo a confiança entre as partes essencial para este tipo de negócio e tendo esta testemunha afirmado que não conhecia F..., não exista prova do pagamento da primeira fatura.
Temos como certo que a proximidade familiar aos sócios gerentes da Recorrente e a relação de dependência laboral justificam maior cautela na livre apreciação da credibilidade dos depoimentos destas testemunhas. É também patente que a caligrafia da fatura n.º 1045 é muito diferente da das outras três faturas, o que indica que não foi preenchida pela mesma pessoa. O que não se concilia com o depoimento da primeira testemunha quando diz que todas as faturas foram preenchidas à sua frente pelo Sr. F... (0:14:20 do cd). Também não está convenientemente explicado como é que – assentando este negócio em relações de confiança e não sendo o Sr. F... uma pessoa conhecida – os pagamentos não tivessem sido efetuados na altura (especialmente na primeira transação). Compreendem-se, por isso, as reservas do tribunal quando confrontado com essas incongruências e que revertesse essas dúvidas contra a parte que se propôs efetuar a prova respetiva.
Por outro lado, não é verdade que as passagens do relatório de fiscalização transcritas nas doutas alegações de recurso ou o depoimento da testemunha C…, imponham resposta diversa. Como o próprio ilustre mandatário da Recorrente assentiu em audiência, essa questão não estava completamente esclarecida no relatório e suportava quer a possibilidade de as transações não terem ocorrido, quer a possibilidade de terem ocorrido, mas entre sujeitos diferentes. E o que a referida testemunha diz não é que as transações ocorreram, mas que «essas mercadorias podem efetivamente ter sido compradas… essas peças ou outras, já agora… no controlo quantitativo em termos de peso do ouro, a matéria-prima, essas mercadorias cabem lá» (01:28:50).
Ora, é precisamente isto que na douta sentença se deu como provado: que entraram mercadorias com o valor – em peso do ouro – das que se mencionam nas faturas, e não necessariamente que entraram as mercadorias mencionadas nas faturas.
Pelo que nenhuma censura merece a sentença recorrida nesta parte.
Consequentemente, também não se concede em erro de julgamento na parte respeitante aos pontos “6)” a “11)” dos factos não provados. É que estes factos são sequenciais em relação ao mencionado no ponto “5)” e, não se concedendo na sua prova, também não se poderia conceder na prova dos factos seguintes.
Pelo que o recurso não merece provimento na parte integrada pelas conclusões 8.ª a 11.ª.
3. Fundamentação de Direito
O último fundamento do recurso é o erro de direito. Considera a Recorrente que o tribunal recorrido fez errada interpretação do artigo 23.º, n.º 1, alínea a) do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas ao pretender que a consideração de tais gastos só poderia ser feita se tivesse sido o “A...” a vender os artigos constantes das faturas, desconsiderando que a Impugnante comprou esses artigos (ainda que a outra pessoa).
Na interpretação que fazemos do preceito (conjugada com o artigo 42.º, n.º 1, alínea g), também do C.I.R.C., na redação vigente à data do facto tributário) são quatro os pressupostos legais de dedutibilidade dos custos para efeitos fiscais: 1.º - a própria existência de um custo, ou seja, de um gasto económico (o que poderemos designar de requisito material); 2.º - a comprovação do custo (o que poderemos designar de requisito formal); 3.º - a indispensabilidade do custo (que optamos por denominar, na falta de melhor, por requisito causal); 4.º - a relevância fiscal do custo (o que poderemos designar de requisito normativo).
Do primeiro resulta que só podem ser deduzidos os custos que a empresa efectivamente suporta, concorrendo para o seu empobrecimento económico. Está ínsito na expressão ali utilizada («comprovadamente») e que nos remete inequivocamente para a sua comprovação material, visto que à comprovação formal já alude o artigo 42.º, n.º 1, alínea g) citado. E está intimamente conexionado com o princípio da tributação do rendimento real.
Do segundo, resulta que só podem ser deduzidos os custos que a empresa devidamente documentou (ou seja, os que a empresa possa comprovar mediante o cumprimento das suas obrigações acessórias de escrituração e documentação). Alguma doutrina alude a este propósito de um princípio da documentação, que emana dos artigos 32.º do Código Comercial e 98.º do C.I.R.C. e que visa, basicamente assegurar a verificabilidade externa do custo (vd. «A Quantificação da Obrigação Tributária, do Prof. José Luis Saldanha Sanches, pág. 242).
Anote-se que, cumpridos os requisitos da comprovação formal, a lei faz presumir a existência material do custo, como decorre do artigo 75.º, n.º 1, da L.G.T.. E que, por conseguinte passa a ser sobre a administração tributária que recai o ónus de comprovar que o custo não existiu, devendo o artigo 23.º citado ser também articulado com as regras materiais do ónus probatório constantes daquela lei geral, que informa todo o ordenamento jurídico tributário. Mas se a administração tributária reunir indicadores sólidos e objetivos de que o custo, apesar de devidamente documentado, não foi efetivamente suportado, renasce, por assim dizer, o dever de comprovação do lado do contribuinte, que já não pode remeter-se para a sua documentação ou escrituração e deve reunir elementos adicionais que o evidenciem. Se o não fizer, não pode ser deduzido o valor registado em tal documento, por força deste dispositivo legal.
Do terceiro pressuposto resulta que só podem ser deduzidos custos que apresentem relação com a obtenção dos proveitos ou com a realização do escopo societário. Havendo quem lhe encontre relação com o princípio da especialidade do fim consagrado nos artigos 160.º do Código Civil e 6.º do Código das Sociedades Comerciais (vd. «Da Relação da Dependência Parcial entre a Contabilidade e o Direito Fiscal Na Determinação do Rendimento Tributável das Pessoas Coletivas: Algumas Reflexões ao Nível dos Custos», de Tomás Tavares, in C.T.F. n.º 396, pág. 136).
Neste plano, como facilmente se intui, já não se discute se o custo existiu ou foi efetivamente suportado, mas se ele tem relação com a fonte produtora. E é para ele – e só para ele – que remete o preceito quando utiliza a expressão «indispensáveis». No entanto, a questão de saber se o custo existiu tem precedência lógica sobre a questão de saber se o custo tinha que ser suportado, só fazendo sentido discutir a relação com o escopo social de um custo verificado.
Do quarto e último pressuposto resulta que só podem ser deduzidos custos cuja dedutibilidade não esteja vedada por expressa previsão legal. A alusão a esta exigência – de conteúdo negativo – justifica-se porque a nossa lei adotou o modelo de dependência parcial entre o balanço fiscal e o balanço contabilístico, que veda ou limita a dedutibilidade, para efeitos fiscais, de muitos custos ou perdas que assumidos pelas regras contabilísticas, por razões diversas (combate à evasão fiscal, razões técnicas e outras). A maioria destas limitações resulta, segundo alguma doutrina, de um compromisso entre o princípio da capacidade contributiva e o princípio da legalidade fiscal, na sua vertente positiva de princípio da determinabilidade da lei, de que decorre a desconsideração fiscal de réditos dificilmente mensuráveis ou sindicáveis (vd. «A Dedutibilidade de Custos em IRC: Reflexos Sobre Custos Incorridos em Atividades Isentas e Não Tributadas», de António Moura Portugal, in C.T.F. n.º 401, págs. 75/76).
No caso, a administração tributária deparou-se com custos que se encontravam documentados em faturas e recibos e devidamente escriturados. Pelo que nenhum problema se colocaria, à partida e do ponto de vista formal, à sua dedutibilidade para efeitos fiscais. Também não estava em causa que esses custos tinham relação com a fonte produtora, visto que a aquisição de artigos de ourivesaria tem relação direta com a atividade desenvolvida (fabricação de artigos de joalharia e de outros de ourivesaria). A única questão que se colocava é mesmo a de saber se estes custos foram efetivamente suportados. Ou seja, tudo se jogava em saber se estava ou não verificado o primeiro pressuposto da dedutibilidade destes custos.
Como se disse, estando confirmado que a Recorrente escriturou e documentou o custo de acordo com as regras da contabilidade e da lei fiscal, passou a recair sobre a administração tributária o ónus de demonstrar que esse custo não existiu. Cientes desse facto, os Serviços de Inspeção Tributária levaram ao relatório de fiscalização um conjunto de indicadores de que as faturas em causa «não titulam negócios reais, já que ficou demonstrado que A...» (doravante referido apenas pelas iniciais A.S.) nunca realizou estas transacções». E que agora sistematizamos do seguinte modo:
1º. A.S. não cumpria as suas obrigações fiscais;
2º. Em ação de inspeção efetuada a A.S., verificou-se que não tinha instalações para a fabricação de artigos em ouro, nem máquinas ou empregados;
3º. Que, apesar de ter contrastado 266 Kg em ouro, só comprou 36 Kg;
4º. Que nunca se deslocou à contrastaria, tendo sido sempre outra pessoa a fazê-lo, e apenas se deslocou à empresa do indicado fornecedor do ouro uma vez, tendo sido sempre outras pessoas a levantar o ouro;
5º. O gerente da ora Recorrente afirmou não conhecer A.S.;
6º. A mãe de A.S. afirmou que este se encontrava no estrangeiro, que a letra que consta das faturas não é dele e que nunca foi fabricante de artigos de ourivesaria;
7º. De acordo com a contabilidade da Recorrente, o valor mencionado nas faturas foi pago em numerário e um cheque no montante de € 9.204,05 que, todavia, não foi levantado nem depositado por A.S.
Embora a esmagadora maioria destes indicadores tenha sido colhida em fiscalização cruzada a A.S., não temos dúvidas em concluir que estamos perante indicadores muito significativos de que não poderia ter sido A.S. a fornecer os produtos mencionados nas quatro faturas referidas pela fiscalização e que estão em causa no relatório. E a constatada impossibilidade de confirmar o efetivo recebimento dos valores mencionados nas faturas por parte de A.S. só vem reforçar estes indicadores.
Torna-se, pois, necessário concluir desde já que os custos deduzidos com as compras respetivas estão suportados em documentos cuja credibilidade foi fundadamente posta em causa e que, por isso, não são já idóneos para justificar a sua dedução. Pelo que o Recorrente também não poderia já remeter-se para o seu teor e para a presunção de verdade de que, à partida, gozariam esses documentos e que já fora eficazmente elidida.
Caberia, por isso, à Recorrente apresentar novos elementos que atestassem que esses custos foram efetivamente suportados. O que se propôs fazer anunciando em primeira instância que ainda tinha alguns artigos com o punção de A.S. e que o direito respetivo lhe foi atribuído pela Contrastaria do Porto, o que só faria depois de se certificar da existência de uma oficina capaz para a produção de artefactos de ourivesaria (cfr. p.i.).
No entanto, e como a própria fiscalização já tinha referido no relatório final, «não está em causa que os artefactos tenham sido contrastados com marca de “A...” na Contrastaria, até porque o foram. O que está em causa é que “A...” alguma vez tenha produzido a quantidade de artefactos que contrastou e, no caso presente, que “A...” tenha vendido o que quer que fosse». Ou seja, a fiscalização já admitira que alguém utilizou o punção de A.S. para contrastar artigos mas também já tinha ressalvado que tal não significava que A.S. tivesse produzido o que quer que fosse. E nesse raciocínio não vê este tribunal qualquer fragilidade, porque, de facto, nada impediria que alguém utilizasse – abusivamente ou até em conluio com A.S. – o referido punção, sobretudo se – como avança o relatório – ele tivesse sido utilizado para servir de missing trader.
Assim, e embora o M.mº Juiz tivesse dado como provado estes factos nas alíneas DD) e EE) não resultaria daí que os negócios titulados nas referidas faturas tivessem efetivamente ocorrido nos termos em que nelas se titulam, designadamente que tivessem ocorrido entre os sujeitos nelas mencionados.
Quanto ao facto de a Contrastaria só atribuir o punção depois de se certificar da existência de uma oficina capaz para a produção de artefactos de ourivesaria (alegado no artigo 32.º da douta p.i.) não foi relevado na sentença recorrida e não pode ser agora considerado, visto que não faz parte do âmbito do recurso.
Sempre se dizendo que, ainda que o tivesse sido, nem por isso deveria relevar para o sentido da decisão. É que, de acordo com as informações colhidas na Contrastaria do Porto (fls. 47 e 48 dos autos), A.S. encontra-se ali matriculado desde 1997, nada impedindo que tivesse sido vistoriado em período muito anterior a 2001 e até que tivesse, no seu papel de missing trader, apresentado à Contrastaria instalações ou equipamentos que não lhe pertenciam e que lhe tivessem sido facultados por quem pretendesse utilizar o seu punção.
O que serve para dizer que a ora Recorrente não chegou a apresentar ao tribunal recorrido dados objetivos que fossem suscetíveis de confirmar as transações tituladas das ditas faturas. O que a Recorrente vai admitindo ao longo das doutas alegações de recurso, dizendo «constatar, agora, face aos elementos dos autos que poderá, efectivamente, ter sido enganada».
A questão que fica é a de saber se, como também alega, «o facto de o valor das facturas não ter sido recebido pela pessoa que figura como emitente em nada prejudica a existência dos gastos nelas espelhados», «ainda que recebidos por entidade diversa». E se o tribunal recorrido, tendo considerado esta possibilidade, deveria ter, com base nela, anulado o ato impugnado.
É uma questão um pouco diferente da que até aqui foi considerada. Não se trata já de saber se as faturas em causa titulam negócios reais, porque já todos os intervenientes admitem que não, pelo menos quanto à identidade do verdadeiro fornecedor, que não terá sido o que nelas vem mencionado. Trata-se apenas de saber se foram reunidos indicadores de que, apesar disso, as mercadorias foram mesmo adquiridas e que foram adquiridas por aquele valor, nas datas nelas mencionadas, mas a um fornecedor diverso.
Importa, então, voltar um pouco atrás para reafirmar que, estando reunidos indicadores suficientes de que o negócio titulado nas referidas faturas não ocorreu (ou não ocorreu nos termos que decorrem do teor dessas faturas), os elementos da declaração do sujeito passivo e os dados os elementos da sua escrita que com elas contendam não beneficiam já da presunção de verdade a que alude o artigo 75.º, n.º 1, da Lei Geral Tributária. E que, por conseguinte, o sujeito passivo já não pode deduzir os custos nelas mencionados tendo por base apenas esses documentos.
Não significa tal, por si só, que esses custos não podem ser deduzidos. Significa apenas que não podem ser comprovados com base nas ditas faturas, obrigando o contribuinte a um esforço adicional de colaboração com a administração tributária, fornecendo outros elementos, suscetíveis de confirmação externa, que evidenciem que esses custos foram mesmo suportados.
Ressalve-se que nada impede que seja a administração tributária a, no âmbito dos seus poderes oficiosos ademais consagrados no artigo 58.º da Lei Geral Tributária, confirmar que o sujeito passivo incorreu em custos equivalentes (ainda que decorrentes de negócio celebrado por pessoa diversa) e a relevar o respetivo valor no cálculo do rendimento tributável. Este entendimento é caucionado pelo legislador na situação extrema dos negócios simulados, ao mandar que a tributação recaia sobre o negócio jurídico real e não sobre o negócio jurídico simulado – artigo 39.º, n.º 1 da mesma lei. O que está, de resto, também de acordo com o princípio da tributação do rendimento real, consagrado na lei constitucional quanto a I.R.C., e a que já acima fizemos alusão, precisamente a respeito do requisito material da dedutibilidade dos custos.
O que se compreende, porque a exigência da documentação do custo para efeitos fiscais tem o escopo de viabilizar a confirmação externa da operação, em todos os seus contornos. Sendo que, se a administração tributária consegue aceder aos contornos reais da operação e confirma-la na sua materialidade, também não carece do documento para confirmar a existência do gasto respetivo.
De resto, e como bem refere o M.mº Juiz a quo, as consequências da falta ou insuficiência de documentação do custo não são tão gravosas em I.R.C. como no I.V.A.: enquanto aqui não se prescinde de «documento que acompanhe a transacção – a factura (al b) do nº 1 do art. 28º do CIVA), com a concreta precisão dos seus requisitos e elementos integrativos (nº 5 do art. 35º do CIVA)», para efeitos de I.R.C. «uma qualquer forma externa de representação da operação (que não uma factura, por não incluir as imperativas e específicas solenidades documentais, com a numeração ou o timbre da empresa) integra-se, claramente, na noção de documento justificativo, desde que explicite, de forma clara, as principais características da operação (os sujeitos, o preço, a data e o objecto da transacção)» (TOMÁS TAVARES, ob. cit., pág.s 122/123).
No caso, porém, embora os elementos disponibilizados no relatório não excluíssem que a Recorrente tivesse, efetivamente, suportando custos com a aquisição das ditas peças ou de peças de valor equivalente (na pág. 5, dá-se conta de que, efetuada a análise quantitativa das existências e produtos desse ano, «não existem indícios de que a margem bruta (…) não reflicta a margem efetivamente praticada»; e a final, ressalvou-se que «é plausível que o contribuinte possa ter na sua posse, artigos com a marca do fabricante de» A.S. «o que no entanto não significa que tenham sido fabricados e/ou vendidos por ele»), também não é possível concluir que a fiscalização tivesse confirmado que a Recorrente efetivamente custeou essas peças, no seu todo ou em parte. E muito menos que tivessem sido adquiridas a determinado fornecedor (diferente de A.S.).
O que vale por dizer que a fiscalização não acedeu aos contornos reais da operação e não a confirmou na sua materialidade. Ao que não será estranho o facto de a Recorrente não ter apresentado documentos adicionais (não havia, designadamente, outros documentos comprovativos dos pagamentos efetuados, para além do que já foram fundadamente postos em causa) e de não ter sido possível contactar nem A.S. nem o referido “Sr. F…”.
Restaria, por isso, à Recorrente demonstrar que a fiscalização poderia ter ido mais longe na confirmação da ocorrência desses custos e da identidade do vendedor. E essa demonstração não foi feita. Nem perante a administração tributária, nem perante o tribunal de primeira instância.
Mas se isto é verdade, não é menos verdade que o M.mº Juiz a quo não deixou de dar como provado na douta sentença recorrida que a ali impugnante comprou artigos de ourivesaria de valor equivalente aos artigos discriminados nas faturas – cfr. alínea “Z)” dos factos provados. Ou seja, apesar de não ter sido possível confirmar que as peças adquiridas foram exatamente as que as referidas faturas mencionam, nem a identidade do imputado fornecedor, o tribunal recorrido pôde confirmar que a Recorrente suportou mesmo custos naquele valor com a aquisição de artigos de ourivesaria.
A razão porque o M.mº Juiz deu como provado este facto consta da cuidada fundamentação da sentença e já lhe aludimos no ponto 2.5. supra: foi a testemunha da Fazenda Pública (o sr. funcionário que elaborou o relatório final) que admitiu que a Recorrente adquiriu mercadorias desse valor porque «no controlo quantitativo em termos de peso do ouro, a matéria-prima, essas mercadorias cabem lá». Foi, por isso, a Fazenda Pública que, de alguma forma, acabou por fazer a demonstração deste facto (de qualquer modo, a decisão proferida sobre este ponto da matéria de facto também não foi impugnada pela Recorrida nos termos do disposto no artigo 684.º-A, n.º 2, do Código de Processo Civil).
E essa constatação tem, a nosso ver, consequências dramáticas no sentido da decisão a proferir. Porque se a exigência da documentação do custo (através de suporte que revele os principais contornos da operação como os sujeitos, o objeto, a data e o preço) tem a sua justificação na necessidade de assegurar a confirmação externa de que a Recorrente suportou efetivamente um custo nesse valor (e, nesse sentido, o custo existiu), e foi possível essa confirmação mesmo sem aceder à verdadeira identidade do fornecedor, então não se vê como possa impedir a relevância fiscal desse custo para efeitos de I.R.C., Pelo menos sem afrontar o já referido princípio da tributação do rendimento real.
É que, a ser assim, é também certo que qualquer correção que desconsidere esse custo implica também que se assuma que o valor corrigido diverge da verdadeira situação tributária do contribuinte. E uma tal interpretação não se concilia com aquele princípio que, como decorre do artigo 104.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa, tem recorte constitucional na tributação das empresas.
Pelo que não pode deixar este tribunal de conceder provimento ao recurso e, em substituição, anular a liquidação impugnada.
4. Conclusões
4.1. A dedutibilidade dos custos para efeitos de I.R.C. depende, além do mais, da comprovação de que esse custo foi efetivamente suportado – artigo 23.º, n.º 1, do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas;
4.2. A verificação de que o custo se encontra documentados em fatura e recibo e foi devidamente escriturado faz presumir a existência material do custo, passando a recair sobre a administração tributária o ónus de comprovar que o custo não existiu – artigo 75.º, n.º 1, da Lei Geral Tributária;
4.3. Reunidos, porém, indicadores objetivos de que o documento de suporte não titula uma verdadeira transação, em si mesma ou em alguns dos principais componentes (como os sujeitos, o objeto, a data ou o valor), fica abalada a credibilidade desse documento, cabendo ao sujeito passivo oferecer elementos adicionais e externamente confirmáveis que revelem os verdadeiros contornos da operação;
4.4. No entanto, se for confirmado que o sujeito passivo adquiriu mesmo artigos da qualidade dos que vêm mencionados na fatura, em valor igual ao que nelas vem mencionado e no exercício correspondente, a impossibilidade de identificar com segurança a identidade do fornecedor não obsta à dedutibilidade do custo correspondente;
4.5. Entendimento diverso equivaleria a admitir que a correção na parcela dos custos poderia divergir, na sua essência, da verdadeira situação tributária do contribuinte, o que não se concilia com o princípio da tributação do rendimento real das empresas- artigo 104.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa.
5. Decisão
Por todo o exposto, acordam os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte em conceder provimento ao recurso e, em consequência:
a) revogar a decisão recorrida;
b) em substituição, anular a liquidação impugnada, com todas as consequências legais.
Custas pela Recorrida.
Porto, 03 de Maio de 2012
Ass. Nuno Bastos
Ass. Irene Neves
Ass. Aragão Seia