Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00334/22.3BEPNF-A
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:11/25/2022
Tribunal:TAF de Penafiel
Relator:Antero Pires Salvador
Descritores:ANTECIPAÇÃO DECISÃO ACÇÃO PRINCIPAL.
ACTO CONFIRMATIVO
ACTO INIMPUGNÁVEL
Sumário:Mostrando-se verificados todos os pressupostos da confirmatividade do acto – nomeadamente, o mesmo quadro normativo, entre o acto confirmado e confirmativo – o mesmo é contenciosamente inimpugnável.
Recorrente:CECAJUVI – CENTRO de CONVÍVIO e APOIO à JUVENTUDE e IDOSOS de
Recorrido 1:INSTITUTO da SEGURANÇA SOCIAL, I.P.
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Procedimento Cautelar Suspensão Eficácia (CPTA) - Recurso Jurisdicional
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Não foi emitido parecer.
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, no Tribunal Central Administrativo Norte – Secção do Contencioso Administrativo:
I. RELATÓRIO
1. CECAJUVI – CENTRO de CONVÍVIO e APOIO à JUVENTUDE e IDOSOS de ..., com sede no Largo da ..., inconformado, veio interpor recurso jurisdicional da sentença do TAF de Penafiel, datada de 14 de Setembro de 2022, que, no âmbito de Processo Cautelar apenso à Acção Administrativa que havia instaurado contra o INSTITUTO da SEGURANÇA SOCIAL, I.P., no qual requeria a suspensão da eficácia do despacho do Presidente do Conselho Directivo do ISS que negou provimento ao recurso hierárquico interposto pelo Requerente e que manteve a decisão relativa à pretensa obrigação de o Requerente proceder à devolução ao Requerido da quantia de 142.273,35€ antecipando a decisão do processo principal, art.º 121.º do CPTA - julgou procedente a excepção dilatória da inimpugnabilidade do acto.
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2. Nas suas Alegações, o Recorrente formulou as seguintes conclusões:
I – Constitui requisito da natureza meramente confirmativa de um acto administrativo a estabilidade e manutenção dos pressupostos de direito vigentes à data da prolação do acto confirmado.
II – Não constitui um acto meramente confirmativo um acto administrativo praticado em sede de decisão de recurso hierárquico que, mantendo a decisão objecto de recurso, o faz num quadro de regulação jurídica diferente do que vigorava à data da prolação do acto de 1º grau, em matéria relativa aos próprios fundamentos expressamente associados à decisão recorrida.
III – Praticado o acto de 1º grau com fundamento na nulidade decorrente da prática de um crime, nos termos do artº 161º, 2., c) do C.P.A., não há identidade dos fundamentos quando a conduta tipificada como crime é descriminalizada, entre a prolação do acto de 1º grau e a prolação do acto de 2º grau, que incidiu sobre a validade do primeiro; e o referido acto de 2º grau é praticado após a descriminalização da conduta típica.
IV – Reconduz-se à situação em análise o caso dos autos, em que o Recorrente viu rejeitada, pelo despacho que constitui o acto de 1º grau, a sua alegação em audiência prévia em procedimento administrativo, no sentido de que se verificara a prescrição, total ou parcial, da quantia eventualmente em dívida ao Recorrido, tendo este decidido, pelo acto de 1º grau, não haver lugar à prescrição, em virtude de a dívida decorrer de processamento pelo Recorrido de comparticipações em excesso pela Segurança Social, a título de um acordo de cooperação com uma IPSS – a Recorrente –, fundadas em falsas declarações relativamente à frequência de utentes e serviços prestados, o que constituiria crime, enquadrável pelo citado artº 161º do C.P.A. ...
V – Mantendo-se a decisão no acto de 2º grau, com a mesma fundamentação, não obstante ter sido, entretanto, publicado o Decreto-Lei nº 126-A/2021, de 31 de Dezembro, que desgraduou as falsas declarações em causa em mera contraordenação social, pelo seu artº 39-C, f), descriminalizando tal comportamento – mesmo que tivesse ocorrido na espécie.
Alteração legislativa que passou sem qualquer referência no acto de 2º grau, que, não obstante tivesse mantido a decisão de 1º grau, é impugnável pelos vícios próprios.
VI – Ao considerar meramente confirmativo o acto de 2º grau, e, nessa medida, inimpugnável, omitindo os efeitos que a alteração legislativa intercalar necessariamente implicava na situação dos autos, como o Recorrente alegou na petição inicial, a sentença violou, por erro de interpretação, o aludido artº 161º, 2., c) do CPA, bem como, por inaplicação, o artº 39º-C, f) do Decreto-Lei nº nº 64/2007, de 14 de Março, com a redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei nº 126-A/2021, de 31 de Dezembro.
VII – O acordo de cooperação celebrado entre Recorrente e Recorrido para funcionamento de um Serviço de Apoio Domiciliário constitui um contrato administrativo – qualificação aliás expressamente formulada pelo artº 7º, 2 da Portaria nº 196-A/2015, de 1 de Julho, para os acordos de cooperação em geral – e para o dos autos em particular.
VIII – Deve ser qualificada como “declaração negocial”, para os efeitos do artº 307º, 1 do Código dos Contratos Públicos, no âmbito desse contrato administrativo, a notificação do Recorrente “para (o Recorrente) acordar (com os Serviços do Centro Distrital do Porto) os termos e condições em que serão efectuadas as rectificações necessárias à regularização das situações detectadas” na acção de fiscalização que deu causa ao procedimento administrativo.
IX – Sufragando os dizeres da sentença, “quando estão em causa litígios sobre questões de validade e interpretação de contratos” – como é o caso dos autos –, “a Administração não dispõe de poder de dizer unilateralmente o Direito, decidindo através de acto administrativo se os contratos em que são parte são válidos ou não, ou interpretando o respectivo clausulado. É que o poder para efectuar tal interpretação e declaração de validade cabe aos tribunais, daí que as declarações do contraente público emitidas neste âmbito sejam meras declarações negociais e como tal não revistam a natureza de actos administrativos impugnáveis ...”
X – Não nos encontramos, portanto, perante um acto administrativo – mas perante a mera possibilidade de um acto administrativo futuro, consoante o resultado do processo negocial entre Recorrente e Recorrido, susceptível de impugnação antecipada, nos termos do artº 54º, 2., b) do CPTA.
XI – Isto é, não se compreende como a sentença considerou procedente a excepção da inimpugnabilidade do acto, por ser confirmativo, quando a mesma sentença considera que a questão é de contrato, judicialmente sindicável, e a todo o tempo – não é de acto administrativo, aliás ainda inexistente, mesmo na tese da sentença.
XII – Não tendo a mesma sentença razão quando invoca em auxílio da decisão absolutória o disposto no artº 307º, 2. do Código do Contratos Públicos, considerando que o despacho de 23.6.2020 do Director da Unidade de Fiscalização – o acto de 1º grau – constitui um acto administrativo, por estabelecer uma sanção determinada pelo contraente público relativamente ao cocontratante e constituir, nessa medida, uma situação enquadrável sob a alínea c) do mesmo preceito: “aplicação de sanções previstas para a inexecução do contrato”.
XIII – Em primeiro lugar, porque não estamos perante a aplicação de nenhuma sanção, decorrente do incumprimento do contrato, como erradamente – salvo o devido respeito – considera a sentença: “o despacho de 23.06.2020 do Director da Unidade de Fiscalização do Norte ... lhe aplicou (ao Recorrente) a sanção prevista no artigo 34º, alínea a) da Portaria nº 196-A/2015, de 01/07, ou seja, a advertência escrita para a regularização das circunstâncias que deram origem ao incumprimento ...”
XIV – Ora, a advertência a que se refere a disposição citada não constitui uma sanção. Constitui, apenas, uma notificação, como estabelece o artº 35º da referida Portaria: “Considera-se advertência escrita a notificação dirigida à instituição para regularizar a circunstância que deu origem ao incumprimento.”
XV – As sanções relativas ao eventual incumprimento das normas da cooperação são as que constam do Decreto-lei nº 64/2007, de 14 de Março, com a redacção que lhe foi conferida pelo Decreto-Lei nº 126-A/2021, de 31 de Dezembro; mas essas só serão convocadas se se gorarem as negociações entre Recorrente e Recorrido.
XVI – Em segundo lugar, não estamos também perante uma inexecução do contrato, que é do que trata a alínea c) do nº 2 do artº 307º do CCP, disposição invocada na sentença.
XVII – Não se pode considerar inexecutado um contrato que se encontra em execução, pelo menos desde 31 de Julho de 2001 – há mais de 20 anos (alínea B da Matéria de Facto).
XVIII – O que está em causa é apenas a interpretação do conteúdo e contexto do contrato – isto é, a sua execução.
XIX – Por outro lado, como resulta do nº 1 do mesmo artº 307º, a regra é a de as declarações negociais do contraente público não constituírem actos administrativos – sendo o disposto no nº 2 um conjunto de excepções a essa regra.
XX – Ora, é da natureza das normas excepcionais deverem ser interpretadas restritivamente, pelo que, para os efeitos do nº 2, “inexecução” é “inexecução”; não é “execução com dúvidas de interpretação”.
XXI – A sentença, ao não ordenar o prosseguimento dos autos para decisão de fundo, designadamente no que toca à interpretação do acordo de cooperação e do seu (in)cumprimento, a partir da declaração negocial emitida pelo Recorrido, violou o referido artº 307º do CCP - por erro de interpretação, no que toca ao nº 1 desse artigo; e por erro de aplicação, no que toca à alínea c) do nº 2 do mesmo artigo.
XXII – A sentença não apreciou sequer a pertinência dos pedidos subsidiários formulados pelo Recorrente, qualificando-os como “mera decorrência do pedido impugnatório”, “não verdadeiramente autónomos, pois constituem os fundamentos em que a Requerente alicerçou a sua causa de pedir para impugnar o acto ...” – pelo que a sua formulação não foi sequer apreciada, por não obstarem à procedência da excepção da inimpugnabilidade do acto impugnado.”
XXIII – Salvo o devido respeito, tal asserção da sentença omite duas circunstâncias:
O facto de o Recorrente ter formulado, além dos 3 pedidos subsidiários referidos na sentença, três pedidos principais – sendo o segundo deles o de condenação do Recorrido a reconhecer que o Recorrente nada tem a reembolsar o mesmo Recorrido pelos factos apurados na acção de fiscalização.
XXIV – São deste pedido principal, que corresponde a uma acção de condenação ao reconhecimento de situações jurídicas subjectivas decorrentes de um contrato administrativo, e de que a sentença passou “ao lado”, que são tributários os 3 pedidos subsidiários, como o Recorrente alegou na Réplica; não são tributários do pedido de anulação, como pretende a sentença.
XXV – E o mesmo 2º pedido principal, de condenação ao reconhecimento de situações jurídicas subjectivas, ou relativo ao contencioso dos contratos, é autónomo relativamente à pretensão impugnatória que caracteriza o restante pedido principal.
XXVI – Basta pensar que o processo de rectificação das situações detectadas pode concluir-se no âmbito do processo de negociações para que o Recorrido convidou o Recorrente, para constatar que, se assim for, não haverá ocasião de produzir qualquer acto administrativo de natureza sancionatória: nem com base no artº 307º, 2., c) do CCP; nem com base no artº 38º, 3 da Portaria nº 196-A/2015, de 1 de Julho; nem com base no regime sancionatório constante do Decreto-lei nº 64/2007, de 14 de Março, com a redacção que lhe foi conferida pelo Decreto-Lei nº 126-A/2021, de 31 de Dezembro.
XXVII – O Recorrente tem o direito de partir para o processo negocial com menores constrangimentos do que uma ameaça de mais de 146.000,00 euros.
XXVIII – É para isso que servem o 2º pedido principal e os três pedidos subsidiários – para, pela procedência de qualquer dos fundamentos aí aduzidos, o Recorrente poder partir para o processo negocial com a determinação judicial, em acção administrativa, de um montante mais reduzido a eventualmente repor – ou mesmo a nada repor, consoante for decidido.
XXIX – Ao contrário da sentença, os pedidos subsidiários não são mera decorrência do pedido impugnatório, na medida em que lógica e cronologicamente o precedem.
XXX – O procedimento pode acabar, em caso de acordo das partes no processo negocial, sem emissão de qualquer acto administrativo sancionatório – pelo que a sorte processual dos pedidos subsidiários, bem como do 2º pedido principal, não pode ficar dependente do êxito ou inêxito da componente impugnatória de actos administrativos.
XXXI – Quer a decisão de 1º grau, quer a de 2º grau, se traduzem, até ao momento, apenas na declaração negocial para que as partes negoceiem os termos e condições de rectificação das inconformidades elencadas no relatório da Fiscalização, como temos abundantemente salientado;
XXXII – O desenvolvimento desse processo negocial tem natureza procedimental, constituindo uma instância preliminar de mediação envolvendo as duas partes do acordo de cooperação – que ainda não ocorreu.
XXXIII – Tais actos administrativos estão, assim, desprovidos de eficácia actual; ou, para utilizar a linguagem do C.P.A., estaremos perante actos administrativos com eficácia diferida ou condicionada, na medida em que “os seus efeitos, pela natureza do acto ..., dependam de trâmite procedimental ou da verificação de qualquer requisito que não respeite à validade do próprio acto”, nos termos do artº 157º, c) do C.P.A.
XXXIV – O mesmo entendimento decorreria do disposto no artº 38º, 1 da Portaria nº 196-A/2015, de 1 de Julho, remetendo para essa mesma mediação bilateral: “acordar os termos e condições em que serão efectuadas as rectificações necessárias à regularização” – e que constitui o trâmite procedimental a que alude o artº 157º do C.P.A.
XXXV – Tais actos são, pois, até ao momento, ineficazes, como resulta das disposições legais citadas.
XXXVI – Com efeito, o objecto da presente acção circunscreve-se à questão do montante a eventualmente devolver – e cuja definição de conteúdo é remetida para conversações entre Recorrente e Recorrido.
XXXVII – Só nesse segmento tendo sido impugnado o despacho.
XXXVIII – A advertência ao Recorrente, nos termos do artº 34º da Portaria nº 196­A/2015, não foi objecto de impugnação contenciosa global, já que tal impugnação ficou restrita à questão do montante em discussão.
XXXIX – Nem o podia ser: não se impugnam notificações, e a advertência não constitui nenhum acto, nem nenhuma sanção - mas apenas uma notificação.
Como estatui o artº 35º, 1 da Portaria nº 196-A/2015, de 1 de Julho: “Considera-se advertência escrita a notificação dirigida à instituição para regularizar a circunstância que deu origem ao incumprimento.”
XL – Como se referiu nos artsº 32º a 40º da petição inicial, no que se refere aos valores a devolver, a decisão administrativa que encerra o procedimento de fiscalização ainda não teve início de execução – ainda não houve conversações entre as partes para esse efeito.
XLI – É, portanto, nessa parte das verbas a eventualmente devolver, ineficaz.
XLII – Estabelece o artº 54º, 1 do C.P.T.A. que “os actos administrativos só podem ser impugnados a partir do momento em que produzam efeitos.”
XLIII – É do que se trata no que respeita à devolução das verbas pagas nos termos do acordo de cooperação, que constitui o objecto material do presente processo – a notificação efectuada pelo Recorrido ainda não produziu efeitos.
XLIV – Nessa parte, ainda se não iniciou qualquer prazo para impugnação judicial da decisão administrativa – nem da decisão de 1º grau, nem da decisão de 2º grau – pelo que, se não se iniciou, tão-pouco acabou.
XLV – A acção foi posta, no entanto, no que se refere ao referido 1º pedido principal, ao abrigo do artº 54º, 2., b) do C.P.T.A., que permite a impugnação de actos ineficazes quando um juízo de prognose torne muito provável que o acto acabará por produzir efeitos, por tal produção de efeitos se encontrar dependente de termo inicial ou de condição suspensiva dependente da acção do beneficiário do acto, sendo tal produção provável de efeitos susceptível de causar lesão dos interesses legítimos do impugnante.
XLVI – Mas – repete-se –, pode acontecer que não haja sequer lugar à produção de efeitos dos actos impugnados, bastando que as partes cheguem a acordo quanto à regularização da situação de execução do acordo de cooperação, nos termos do nº 1 do artº 38º da Portaria nº 196-A/2015, de 1 de Julho, não chegando a vez da intervenção autoritária da Administração prevista no nº 3 do mesmo artigo.
XLVII – O que basta também para fazer soçobrar o entendimento da sentença de que os pedidos para o reconhecimento de situações jurídicas subjectivas ou relativos à interpretação do acordo de cooperação enquanto contrato administrativo, dependem da procedência da pretensão impugnatória e são meras decorrências dela.
XLVIII – A decisão sobre esses pedidos – de condenação ao reconhecimento de situações jurídicas subjectivas e de execução do contrato – têm interesse para o Recorrente para o desenvolvimento das conversações para que foi convidado, e que ocorrerão em momento anterior à verificação da eficácia dos actos administrativos objecto de impugnação (diferida) e independentemente dessa eficácia posterior.
XLIX – Também por esta fundamento, deverá a acção prosseguir os seus termos até final.
L – A sentença violou, nos termos expostos, por inaplicação, o artº 157º, c) do CPA; e, por erro de interpretação, o artº 54º, 1 e 2, b) do CPTA e o artº 34º da Portaria nº 196-A/2015, de 1 de Julho.
LI – Deverá a Matéria de facto ser acrescida da factualidade alegada no nº 15, alíneas P a CC das presentes Alegações, que, brevitatis causa, se dá por reproduzida, por a mesma relevar em caso de provimento do recurso".
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3. O Recorrido, Instituto da Segurança Social, I.P., apresentou contra-alegações, concluindo do seguinte modo:
1. O presente recurso vem interposto da douta sentença proferida pelo tribunal “a quo” que julgou procedente a exceção dilatória da impugnabilidade do ato impugnado, invocada pelo ora Recorrido, na sua contestação.
2. A Recorrente, não conformada com tal decisão, entendeu interpor o presente recurso alegando os seguintes fundamentos:
“Na verdade, ao considerar meramente confirmativo o acto de 2º grau, omitindo os efeitos que a alteração legislativa intercalar necessariamente implicava na situação dos autos, como o Recorrente alegou na petição inicial, a sentença violou, por erro de interpretação, o aludido artº 161º, 2., c) do CPA, bem como, por inaplicação, o artº 39º-C, f) do Decreto-Lei nº nº 64/2007, de 14 de Março, com a redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei nº 126-A/2021, de 31 de Dezembro.
A sentença, ao não ordenar o prosseguimento dos autos para decisão de fundo, designadamente no que toca à interpretação do acordo de cooperação e do seu (in)cumprimento, a partir da declaração negocial emitida elo Recorrido, violou o referido artº 307º do CCP - por erro de interpretação, no que toca ao nº 1 desse artigo; e por erro de aplicação, no que toca à alínea c) do nº 2 do mesmo artigo.
A sentença violou, desta sorte, o disposto no artº 38º, 1, 2 e 3 da Portaria nº 196- A/2015, de 1 de Julho, por inaplicação, no que se refere aos nsº 1 e 2; e por erro de interpretação, no que se refere ao nº 3. Ao contrário da sentença, os pedidos subsidiários não são mera decorrência do pedido impugnatório, na medida em que logicamente o precedem.
Como se referiu já a vários propósitos, este processo pode acabar em sede de contencioso dos contratos, sem emissão de qualquer acto administrativo sancionatório – pelo que a sorte processual dos pedidos subsidiários, bem como do 2º pedido principal, não pode ficar dependente do êxito ou inêxito da componente impugnatória de actos administrativos.
A sentença violou, nos termos expostos, por inaplicação, o artº 157º, c) do CPA; e, por erro de interpretação, o artº 54º, 1 e 2, b) do CPTA e o artº 34º da Portaria nº 196-A/2015, de 1 de Julho.
Deverá a Matéria de facto ser acrescida da factualidade alegada no nº 15, alíneas P a CC das presentes Alegações, que, brevitatis causa, se dá por reproduzida, por a mesma relevar em caso de provimento do recurso.”
3. A douta sentença está bem fundamentada, quer de facto, quer de direito, sendo assim, formal e materialmente, uma sentença justa e conforme à lei, a cujo teor se adere, o qual por si só infirmará os fundamentos do recurso que a pretendem contrariar, não padecendo, por isso, a mesma dos vícios que são apontados nas alegações do recorrente, quer no tocante à decisão de facto, quer no tocante à sua subsunção jurídica.
4. O 1º acto não foi praticado com fundamento na nulidade decorrente da prática de um crime, mas sim, tendo por fundamento, no âmbito da acção inspetiva, irregularidades de regras e diplomas que regem a cooperação e o funcionamento das respostas sociais prosseguidas, nos termos do artigo 34' e 35' da Portaria n.º 196-A/2015, de 1 de julho, na redação que lhe foi dada pela Portaria 218-D/2019, de 15 de julho, que deu lugar a “advertência escrita”, nomeadamente, para promover pela regularização das circunstâncias que deram origem ao incumprimento.
5. Em sede de audiência prévia, a Recorrente não logrou demonstrar a inexistência das irregularidades detetadas em sede de ação inspetiva vertidas no relatório enviado para pronúncia, bem como que as irregularidades não se encontravam sanadas,
6. Pelo que, foi a Recorrente notificada do despacho do Diretor da Unidade de Fiscalização do Norte de 23/06/2020, que manteve a advertência, devendo a entidade regularizar as situações detetadas.
7. Não se conformando, a Recorrente interpôs recurso hierárquico facultativo o qual foi objeto de decisão desfavorável à sua pretensão pois foi decidido manter a decisão recorrida e que constitui o ato impugnado.
8. Mais se verifica, ao contrário do alegado pelo Recorrente, que a advertência escrita para promover pela regularização das circunstâncias que deram origem ao incumprimento, constitui um ato administrativo à execução do contrato que é contenciosamente impugnável pela via da acção administrativa.
9. Verifica-se assim, claramente que tal ato é inimpugnável, uma vez que não preenche os requisitos da impugnabilidade dos atos previstos no artigo 53.º do CPTA.
10. No que à decisão sobre o recurso hierárquico concerne, é de referir que a mesma vem confirmar, nos seus precisos termos, o acto recorrido, pelo que, se trata de um acto meramente confirmativo.
11. Deste modo, tendo o douto Tribunal “a quo” verificado que a decisão proferida em sede de recurso hierárquico foi meramente confirmativa que configura uma exceção, obstou a que conhecesse do mérito da causa, e ao prosseguimento do processo, pelo que o Recorrido foi absolvido da instância.
12. Consequentemente, entendemos que a douta Sentença proferida pelo Tribunal “a quo” ao considerar meramente confirmativo o acto de 2º grau, não violou, por erro de interpretação ou por inaplicação a legislação invocada pelo Recorrente.
13. Na cumulação subsidiária de pedidos existe uma cumulação meramente aparente de pedidos operada pelo Autor, em que este formula o primeiro pedido subsidiário apenas para o caso do Réu vir a ser absolvido da instância ou do pedido quanto ao pedido principal que deduz, e em que formula o segundo pedido subsidiário apenas para o caso do Réu ser absolvido da instância ou do pedido quanto ao pedido principal e ao primeiro pedido subsidiário que formula, e assim sucessivamente, e daí que entre pedido principal e pedidos subsidiários, e entre estes últimos, não tenha de existir compatibilidade substancial de pedidos, sequer de causas de pedir, mas exige-se que entre pedido principal e pedidos subsidiários deduzidos se verifique um dos elementos de conexão previstos no art. 4º, n.º 1 do CPTA.
14. O pedido subsidiário é, por natureza, um pedido condicional, acessório e subordinado de um pedido principal, pelo que o juiz apenas pode conhecer do primeiro pedido subsidiário deduzido pelo Autor, caso o Réu seja absolvido da instância ou do pedido em relação ao pedido principal formulado pelo Autor, e apenas pode conhecer do segundo pedido subsidiário formulado pelo último, caso o Réu seja absolvido da instância ou do pedido em relação ao pedido principal e ao primeiro pedido subsidiário formulado pelo Autor, e assim sucessivamente
15. Nesta conformidade não poderia o tribunal a quo ter decidido de forma diferente, do vertido na douta sentença: “Ora, estes pedidos subsidiários estão em mera cumulação aparente com o pedido impugnatório, já que, os pedidos subsidiários são mera decorrência do pedido impugnatório; os pedidos subsidiários não são verdadeiramente autónomos, pois constituem os fundamentos em que a Requerente alicerçou a sua causa de pedir para impugnar o ato suspendendo (e também para interpor recurso hierárquico facultativo), sendo que, mesmo que assim não se entendesse então estaria preenchida a previsão do artigo 38.º, n.º 2 do OPTA.
Assim, a formulação destes pedidos subsidiários (e em cumulação aparente) não obsta à procedência da exceção da inimpugnabilidade do ato impugnado, o que se decidirá.”
16. Vem ainda o Recorrente, na sua perspetiva, alegar que deveria ser acrescentado à factualidade alegada no nº 15, alíneas P a CC das presentes Alegações, por a mesma relevar em caso de provimento do recurso.
17. Em sede de recurso jurisdicional o tribunal de recurso, em princípio, só deve alterar a matéria de facto em que assenta a decisão recorrida se, após ter sido reapreciada, for evidente que ela, em termos de razoabilidade, foi mal julgada na instância recorrida, nem é suposto que o tribunal cuide de selecionar e fixar todos os factos que se mostrem provados, mas tão-só aqueles que sejam relevantes para a boa decisão da causa.
18. O julgador deve proceder ao julgamento de facto, selecionando da alegação feita pelas partes aquela realidade factual concreta tida por provada e necessária à apreciação da pretensão formulada à luz das várias e/ou possíveis soluções jurídicas da causa, não sendo de exigir a fixação ou a consideração de factualidade que se repute ou se afigure despicienda para e na economia do julgamento da causa, na certeza de que daquele juízo estarão sempre arredadas todas as alegações de direito e ou conclusões insertas nos articulados.
19. Ora, a convicção do Tribunal para julgar provados os factos dados como provados assentou no teor de toda a documentação que compõe o processo administrativo e nos documentos juntos aos autos pelas Partes, conjugados com a posição assumida pelas Partes nos seus articulados que mereceram a credibilidade do Tribunal.
20. Sendo certo que o Recorrido apresentou defesa tanto em sede principal como em sede cautelar em manifesta oposição com o alegado pelo Requerente nos seus articulados, tendo impugnado e demonstrado através de prova documental o dissídio em causa.
21. Consequentemente, entendemos que a douta sentença do Tribunal a quo não padece de qualquer vicio, devendo a mesma deve ser mantida na ordem jurídica, por válida e legal".
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4. A Digna Magistrada do M.º P.º neste TCA, notificada nos termos do art.º 146.º n.º 1 do CPTA, não se pronunciou.
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5. Sem vistos, mas com envio prévio do projecto aos Exmos. Srs. Juízes Desembargadores Adjuntos, foram os autos remetidos à Conferência para julgamento.
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6. Efectivando a delimitação do objecto do recurso, cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, sendo certo que o objecto do recurso se acha delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, acima elencadas, nos termos dos arts. 660.º, n.º 2, 664.º, 684.º, ns. 3 e 4 e 685.º A, todos do Código de Processo Civil, “ex vi” dos arts. 1.º e 140.º, ambos do CPTA.
II. FUNDAMENTAÇÃO
1. MATÉRIA de FACTO
São os seguintes os factos fixados na sentença recorrida, cuja fidelidade e completude não se mostram questionadas em sede recursiva:
A) A Requerente é uma instituição particular de solidariedade social que mantém em atividade várias respostas e serviços de ação social, entre eles, um serviço de apoio domiciliário – facto admitido por acordo e cfr. documento n.º 1 junto com a petição inicial;
B) A 31/07/2001, a Requerente e a Entidade Requerida outorgaram o documento denominado “Acordo de Cooperação”, que constitui o documento n.º 2 junto com a petição inicial e cujo teor, por brevidade, se dá por integralmente reproduzido;
C) A 14/09/2006, foi assinado pelas Partes a 1.ª Revisão do Anexo do Acordo de Cooperação celebrado a 31/07/2021 – cfr. documento n.º 3 junto com a petição inicial e cujo teor, por brevidade, se dá por integralmente reproduzido;
D) A Requerente foi objeto de uma ação de inspeção, promovida pela Entidade Requerida e realizada pelo Núcleo de Fiscalização de Equipamentos Sociais, da Unidade de Fiscalização do Norte, do Departamento de Fiscalização, de âmbito equipamento social de natureza Centro de Dia, Serviço de Apoio Domiciliário e Auditoria Jurídica – facto admitido por acordo e cfr. P.A.;
E) Por ofício com a ref.ª ...19, a Requerente foi notificada para se pronunciar em sede de audiência prévia acerca das irregularidades que foram detetadas no âmbito da ação de fiscalização a que se alude na alínea antecedente e constantes de relatório anexo a esse ofício, as quais consubstanciariam o incumprimento das cláusulas constantes do acordo de cooperação celebrado com a Entidade Requerida – cfr. fls. 870 do P.A.;
F) No relatório que acompanhou o ofício para pronúncia, em sede de audiência prévia consta, nomeadamente, o seguinte:
«Do preenchimento dos guiões aplicáveis às respostas de Centro de Dia (CD), Serviço de Apoio Domiciliário (SAD), bem como o relativo à Auditoria Jurídica (AJ), com todos os dados obtidos no decurso da instrução do presente processo, quer decorrentes da ação inspetiva realizada à Instituição, quer decorrentes dos documentos solicitados e entregues à equipa, foram detetadas irregularidades cujo teor e respetivo enquadramento legal cumpre agora reportar.
A – Auditoria Jurídica
(Proave n.º ...37)
1. Livros de Atas
Da análise dos livros de Atas da Instituição, constatou-se relativamente ao órgão Direção que as atas n.º 253 de 19-03-2019 e n.º 254 de 03-05-2019 (cfr. páginas 40 a 42 e doc. inseridos em SAF), não estão assinadas pelos intervenientes nas referidas reuniões, pelo que a IPSS não cumpre com o definido nos seus Estatutos, nomeadamente o constante no n.º 6 do art.º 16.a, onde se lê que; “ (...) serão sempre lavradas atas que serão obrigatoriamente assinadas pelos membros presentes nem com o definido no Estatuto das IPSS , nomeadamente o n.º 3 do art.º 16 º do decreto lei n.º 172-A/2014 de 16 de novembro.
C – Centro de Dia
(Proave n.º ...04)
1. Recursos Humanos
De acordo com o mapa de recursos humanos fornecido pela instituição, encontram-se afetos ao Centro de Dia os seguintes elementos:
2 Ajudantes de ação Direta (sendo que uma assume as funções de Animadora);
1 Socióloga a 100%;
1 Enfermeira (em regime de prestação de serviços), a 100%;
1 Professor de Ginástica (prestador de serviços), a 100%;
1 Diretora Técnica afeta a 30%;
1 Assistente administrativa a 50%;
1 Auxiliar de Serviços Gerais a 50%.
Mais se dirá, que:
O Centro de Dia dispõe de uma Coordenadora, AA, Socióloga, a qual pratica o seguinte horário de trabalho: 9h30-17h30m;
As funções de Motorista são desenvolvidas pelas ajudantes de ação direta afetas ao SAD e ao CD, de forma rotativa.
Refira-se que o Centro de Dia tem uma frequência de 26 utentes.
De acordo com os n.•s 1 e 2 da Norma XII (Responsável pelo Serviço) do Anexo 1 do Guião Técnico n.• 8 da ex-DGAS existente para a resposta social de Centro de Dia referem, respetivamente, que “O Centro de Dia é dirigido por um diretor técnico que é responsável pela organização e desenvolvimento dos serviços” e que “O diretor técnico deve estar habilitado com formação no âmbito das ciências sociais e humanas”. Acresce que, de acordo com o quadro tipo de pessoal para 30 utilizadores (Centro de Dia autónomo) constante do Anexo 1 do Guião Técnico n.• 8 da ex-DGAS existente para esta resposta social, o pessoal exigido é o seguinte:
1 Diretor Técnico que acumule a Animação (atendendo a que o Centro de Dia tem uma capacidade inferior a 30 utentes);
1 Ajudante de Centro de Dia;
1 Motorista;
1 Empregada Auxiliar.
No caso em apreço não serão indicados os recursos humanos afetos à cozinha, na medida em que este serviço é de contratualização externa, ou seja, os recursos humanos dispõem de vínculo contratual com a empresa U....
Face ao exposto, verifica-se assim que: da análise do mapa de recursos humanos no que toca ao cumprimento dos rácios legalmente previstos, resulta que as funções de Motorista são desenvolvidas pelas ajudantes de ação direta afetas ao SAD e ao CD, de forma rotativa, sendo que o transporte dos utentes do Centro de Dia, quando realizado pelas ajudantes de ação direta afetas ao SAD é efetuado no período que antecede a deslocação aos domicílios dos utentes do SAD. Contudo estas colaboradoras não deveriam executar outras tarefas estando afetas a 100% à resposta de SAD, devendo assim esta função ser desempenhada por um elemento com afetação ao Centro de dia.
Acresce ao exposto, que no âmbito do Protocolo de Colaboração com a Junta de freguesia de ... e ... – Projeto “Ferias Divertidas” (cfr. doc inserido em SAF), resulta que é da responsabilidade da IPSS “(...) implementar um plano de atividades inicialmente para duas semanas, disponibilizando recursos humanos e logísticos para a realização das atividades com as crianças e jovens.” (clausula 1 do Protocolo).
Ora, da analise do Plano de atividades (efr. página 139 e 140) verifica-se que no período decorrente da atividade (1 a 12 de julho de 2019), dos Recursos Humanos da IPSS foram alancadas a esta atividade as seguintes colaboradoras:
AA – Socióloga e afeta a 100% ao CD; (responsável pela planificação e desenvolvimento da atividade);
AA – Auxiliar de Serviços Gerais – afeta ao CD;
BB – Ajudante de ação direta – afeta a 100% ao SAD.
*Estas duas últimas responsáveis apenas por efetuar o transporte das crianças para as atividades no exterior.
Do apurado, cumpre esclarecer que a instituição não pode utilizar colaboradores que estejam afetos ao funcionamento das respostas sociais, que desenvolve, para o desenvolvimento de atividades extra, ou qualquer outra, mesmo que temporárias.
2. Comparticipação dos utentes e seus familiares
Para averiguar do cumprimento da Portaria n.• 196-A/2015, de 1 de julho, com a redação que lhe foi dada pela Portaria n.• 218-D/2019, de 15 de julho, no que diz respeito ao cálculo das comparticipações pagas pelos utentes/familiares, foram analisados alguns processos individuais de utentes (como por exemplo o processo da utente CC, junto a páginas 103 a 119) tendo-se verificado que ao efetuar o cálculo da comparticipação familiar, a IPSS divide o valor do rendimento anual do agregado familiar por 14 (meses), quando deveria dividi-lo por 12 (meses), conforme determina o ponto 6.1. do anexo à Portaria n.• 218-D/2019, de 15 de julho.
Acresce ainda ao exposto o explanado pela Diretora Técnica da IPSS, a qual referiu que, não obstante aplicarem as regras definidas na Portaria em todos os processos individuais, caso o utente refira a impossibilidade de comportar o valor apurado, a mesma transmite a informação à Direção da Instituição (oralmente) e esta redefine o valor do cálculo da comparticipação familiar definidas na supra, mencionada Portaria.
Verifica-se assim que em algumas situações, o valor da comparticipação familiar advém de um valor acordado entre o utente e a IPSS, o que contraria o disposto no n.º 2 do Anexo à Portaria 2018-D/2019, de 15 de julho, que refere que a mensalidade a pagar pelo utente é aferida com base numa percentagem sobre o rendimento per capita do agregado familiar. Face ao exposto resulta que a IPSS não cumpre com o definido no Anexo à Portaria n.º 196-A/2015, de 1 de julho, com as alterações introduzidas pela Portaria n.º 218-D/2019, de 15 de julho, nomeadamente o constante no seu ponto 6.1..
D – Serviço de Apoio domiciliário
(Proave n.º ...04)
1. Recursos Humanos
De acordo com o mapa de recursos humanos fornecido pela instituição, encontram-se afetos ao SAD os seguintes elementos:
3 Ajudantes de ação direta, a 100%;
1 Diretora Técnica a 70%;
1 Escriturária comum a toda a IPSS;
1 Auxiliar de Serviços Gerais a 50%.
No que toca aos indicadores de pessoal refere a Portaria 38/2013, de 30 de janeiro, que:
“A direção técnica é assegurada por um elemento com formação superior, nas áreas das ciências sociais e do comportamento, saúde ou serviços sociais e, preferencialmente, com experiência profissional para o exercício das funções” (n.º 1 do artº 8), sendo que “Quando o SAD funcione integrado num estabelecimento de apoio social a direção técnica pode ser assegurada pelo diretor técnico desse estabelecimento” (n.º 4 do art.º 8.º).
Devendo ainda ser considerada pela instituição a afetação ao SAD de “(...) unidades de pessoal técnico, ajudantes de ação direta e outro, necessárias ao normal funcionamento dos serviços (...)” (n.º 1 do art.º 9.º).
Por outro lado, e de acordo com os indicadores constantes do Boletim Informativo n.º 19, de 1 de julho de 2013, os quais são meros referenciais, o mapa de recursos humanos do SAD, atendendo ao número de utentes em frequência (21) deveria ser composto por:
1 Técnico de Serviço Social (que pode ser assegurado pelo Diretor técnico do estabelecimento);
3 Ajudantes familiares;
1 Trabalhador Auxiliar (Serviços Gerais).
Da análise do mapa de recursos humanos da IPSS, consta que a colaboradora com a categoria de Auxiliar de Serviços Gerais se encontra afeta a 50% ao SAD e 50% ao CD. Acresce que se verificou que esta colaboradora está a tempo inteiro no Centro de dia, pelo que se conclui que o SAD não cumpre os rácios legalmente previstos, no Boletim Informativo n.º 19, de 1 de julho de 2013, uma vez que está em falta 1 elemento com a categoria de empregado auxiliar.
2. Comparticipação dos utentes e seus familiares
Da análise de alguns processos individuais (como por exemplo o processo da utente DD, inserido em SAF), verifica-se situação idêntica à apurada no Centro de Dia, pelo que também nesta resposta a IPSS não cumpre com o definido no Anexo à Portaria n.º 196-A/2015, de 1 de julho, com as alterações introduzidas pela Portaria n.º 218-D/2019, de 15 de julho, nomeadamente o constante no seu ponto 6.1,.
E – Acordos de Cooperação
Verificação do cumprimento dos acordos ao nível da frequência e comparticipação de utentes
1. Enquadramento prévio
De forma a enquadrar esta matéria, cumpre fazer referência aos Protocolos de Cooperação celebrados entre o atualmente denominado Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social (MTSSS) e a Confederação Nacional das Instituições de Solidariedade (CNIS), a partir do ano de 2013, sendo que, nos mesmos, é definida que o Serviço de apoio domiciliário (SAD) inclui, no mínimo, dois dos serviços considerados indispensáveis, a saber, higiene pessoal, higiene habitacional, alimentação, tratamento de roupas, serviço de teleassistência, e serviço de animação/socialização, bem como ao documento intitulado “FAQ’S-Operacionalização da revisão dos acordos de cooperação SAD”, publicitado na página eletrónica da CNIS, segundo o qual o serviço de higiene pessoal deverá ser garantido, no mínimo, uma vez por dia, todos os dias contratualizados; o serviço de higiene habitacional, caso seja contratualizado para os dias úteis, deverá ser prestado, no mínimo, uma vez por semana, e caso seja contratualizado para dias úteis e fim-de-semana, deverá também ser prestado aos fins-de-semana; o serviço de alimentação deverá ser prestado uma vez por dia (com fornecimento de almoço e jantar); o serviço de tratamento de roupas, caso seja contratualizado para os dias úteis, deverá ser prestado, no mínimo, uma vez por semana, e caso seja contratualizado para dias úteis e fim-de- semana, deverá também ser prestado aos fins-de-semana; o serviço de animação/socialização, o qual abrange, no mínimo, quatro atividades semanais que podem variar entre animação, lazer, cultura, aquisição de bens e de géneros alimentares, pagamento de serviços, e deslocação a entidades da comunidade; e o serviço de teleassistência, o qual implica um serviço prestado através de uma linha telefónica disponível 24 horas por dia, 365 dias por ano, com um centro de atendimento por pessoal especializado; o apoio psicossocial deverá ser prestado por uma equipa multidisciplinar constituída no mínimo por dois técnicos: um do serviço social e um psicólogo.
De notar que, para efeito de cálculo das comparticipações financeiras indevidamente pagas pelo CDist do Porto ao “CECAJUVI — Centro de Convívio e apoio à juventude e idosos de ... – Associação de Solidariedade”, foram considerados os valores, por resposta social/utente/mês, definidos nos diversos Protocolos de Cooperação e respetivas adendas, sendo tais valores os seguintes:
RespostaComparticipação por utente /mês Protocolos e
SAD
Importa, ainda, referir que, para o cálculo da resposta de SAD foi, igualmente, considerada a percentagem de comparticipação atribuída a cada utente e definida nas listagens de frequência remetidas pela “CECAJUVI” ao CDist do Porto, sendo que a percentagem é de 100%.
2. Comparticipações – Procedimento de Pagamento
No âmbito da cooperação entre o Estado e as IPSS ou instituições equiparadas, e porque as instituições substituem o Estado concretizando objetivos de solidariedade social mediante o desenvolvimento de respostas sociais de reconhecido interesse geral, o Estado, através dos Centros Distritais territorialmente competentes, para além do acompanhamento técnico que presta às instituições, apoia-as financeiramente.
Este apoio financeiro é efetuado através de transferências mensais, que têm por base o registo feito pelas instituições numa aplicação informática, disponível através da Segurança Social Direta (SSD).
Nesta aplicação, e para que haja pagamento das referidas comparticipações, as instituições têm a obrigação de inserir todos os meses, até ao dia 10, a identificação nominal, através do respetivo Número de Identificação da Segurança Social (NISS), de cada um dos utentes, que no mês anterior frequentou cada uma das respostas sociais por si desenvolvidas.
No âmbito da resposta de Serviço de Apoio Domiciliário, para além da referida identificação, a instituição, tem ainda de registar os serviços que no mês anterior prestou àquele utente.
O pagamento da comparticipação financeira é feito pelo número de utentes que frequentaram a resposta em determinado mês, pelo que a falta de inserção da identificação de cada um destes utentes, determina que a Segurança Social não efetue o pagamento da comparticipação definida, por utente, em sede de cooperação.”
3. Recolha de Prova
(...).
3.3. Foram analisados os registos da prestação do serviço que a Diretora Técnica refere como sendo de cuidados de imagem, e regista como “outros serviços”, e verificou-se que genericamente, consiste no corte de cabelo, unhas, passar creme e fazer a barba 1 vez por mês, que não se enquadra num dos 6 serviços considerados indispensáveis.
Quanto ao serviço de animação/socialização, apesar da existência de alguns registos da sua prestação, o modo e a periodicidade com que terão sido prestados não consubstancia o serviço animação/socialização para efeitos de comparticipação financeira da segurança social.
3.4. Mais é de mencionar que foram detetadas outras situações em que também resultaram em comparticipações indevidas, uma vez que a higiene pessoal, não era efetuada diariamente e a higiene habitacional e o tratamento de roupa, não eram prestados no mínimo uma vez por semana. Nesta condição estão as utentes EE e FF.
(...).
4. Comparticipações financeiras indevidas na resposta social de SAD
Da presente análise resultou que a IPSS inseriu nas listagens de frequência utentes a quem teriam sido prestados diversos serviços, porém da análise dos contratos, dos registos dos serviços prestados e das declarações prestadas, apurou-se que apenas lhes foi prestado um único serviço, alimentação, higiene pessoal, higiene habitacional ou tratamento de roupas (cf. doc. inseridos em SAF).
Conforme já mencionado, a IPSS não poderia comunicar utentes para efeito de comparticipação financeira no âmbito da resposta social em causa, por quanto a estes não prestou, no mínimo, dois dos serviços considerados indispensáveis, tendo, por isso, sido apuradas as verbas indevidamente recebidas pela instituição nesse âmbito:
(...).
Foi ainda detetado que aos utentes abaixo identificados foram prestados dois ou mais serviços, contudo não eram prestados com a periodicidade prevista nas FAQ's, isto é a higiene pessoal, não era efetuada diariamente e a higiene habitacional e o tratamento de roupa não eram prestados no mínimo uma vez por semana, cfr. quadro infra:
(...).
Acresce que, de acordo com o informado pela Diretora Técnica, GG, a utente HH, apesar de dispor de Contrato de Prestação de Serviços de SAD e dos respetivos registos, conforme resultou da consulta ao processo individual da utente (cfr. documentos inseridos em SAP), facto é que a mesma é utente do Centro de Dia desde outubro de 2018, frequentando o Centro de Dia de segunda a sexta feira, apesar de ter sido transferida para esta resposta social apenas a 05-08-2019, ocupando uma vaga extra acordo no CD (cfr. Auto de Declarações da diretora técnica do SAD).
Acresce ao exposto que nas deslocações ao equipamento a utente em apreço se encontrava a frequentar o CD, tendo referido à equipa signatária que estava muito satisfeita com os serviços porque assim não estava sozinha em casa. O que também se comprova pelo mapa de presenças da resposta junto a página 86.
Resulta assim que a Instituição inseriu indevidamente 1 (um) utente de Centro de Dia em SAD para efeitos de comparticipação da segurança social, conforme quadro infra:
(...).
A instituição em análise foi indevidamente comparticipada, pelo CDist do Porto, relativamente aos supra identificados utentes, totalizando tais comparticipações o montante global de 142.272,35 €.
Ao inserir nas listagens enviadas ao CDist, utentes que não cumpriam com os requisitos definidos em sede de cooperação para a resposta de Serviço de Apoio Domiciliário, a IPSS atuou em violação do disposto nas alíneas b) cumprir as cláusulas estipuladas no acordo e i) comunicar aos serviços da segurança social a frequência da resposta social, do artigo 12.º da Portaria n.º 196-A/2015, de 1 de julho, com a redação que lhe foi dada pela Portaria n.º 218-D/2019, de 15 de julho.” – cfr. fls. 852 a 868 do P.A.;
G) A Requerente pronunciou-se em sede de audiência prévia, nos termos que constam do documento a fls. 875 a 880 do P.A, cujo teor, por brevidade, se dá por integralmente reproduzido;
H) Os Serviços Inspetivos do Núcleo de Fiscalização de Equipamentos Sociais elaboraram o relatório final, que consta a fls. 885 a 891 do P.A., cujo teor, por brevidade, se dá por integralmente reproduzido e do qual se extrai, nomeadamente, o seguinte:
«Foram apresentadas alegações, conforme documento inserido em SAF e que aqui se dá por integralmente reproduzido, sendo de referir o seguinte:
1. Assinatura das atas
Pese embora a omissão na lei quanto ao momento da assinatura das atas, a doutrina nomeadamente o Professor Pacheco Amorim, defende que as mesmas podem ser assinadas até à sessão seguinte em que o referido órgão colegial esteja reunido.
Do apurado a 01/07/2019, data da ação inspetiva, resultou que as atas n.º 253, de 19-03­2019 e a n.º 254, de 03-05-2019, do órgão Direção, não se encontravam assinadas, conforme exigência legal, pelo que se mantém o já referido no relatório.
2. Recursos humanos
Quanto à matéria relativa aos recursos humanos, a IPSS tem obrigatoriamente que dar cumprimento aos preceitos legais, no que toca aos rácios de recursos humanos face ao número de utentes em frequência, não podendo, igualmente, utilizar recursos existentes para o desempenho de outras atividades, na medida em que a resposta social a que o elemento se encontra afeto, mesmo que temporariamente ausente, fica em incumprimento.
Quanto à formação, da Diretora Técnica da resposta social de SAD o, constante, no relatório, é uma referência ao exigido pela Portaria, nunca sendo referido que a formação desta colaboradora não é a adequada.
Quanto à auxiliar dos serviços gerais o relatório remete para a proposta de referencial constante do Boletim Informativo n.º 19/2013 e que refere que, caso o SAD tenha lavandaria, deve ser afeta a esta resposta, um trabalhador Auxiliar de Serviços Gerais.
3. Comparticipações familiares devidas pela utilização dos serviços e equipamentos sociais
O anexo à Portaria define de forma clara quais os rendimentos (nomeadamente declaração de IRS e respetiva nota de liquidação), bem como, quais as despesas que devem ser consideradas para efeitos do cálculo do rendimento per capita, sendo que sempre que haja fundadas dúvidas sobre a veracidade das declarações de rendimento, as IPSS´s podem convencionar um montante de comparticipação familiar, até ao limite da comparticipação familiar máxima.
Contudo estas exceções devem ser explanadas em sede de processo individual dos utentes. O estipulado no anexo à Portaria n.º 218-D/2019 é aplicável às IPSS's nomeadamente quanto aos elementos que constituem prova dos rendimentos dos utentes.
Quanto à resposta de Centro de Dia e SAD, a IPSS vem confirmar o referido no relatório na medida em que o valor da comparticipação familiar é definido pela Direção. Não obstante proceder ao cálculo de rendimento per capita, no final é sempre a Direção que estipula o valor a pagar pelo utente, sem que conste do processo qualquer fundamento sobre o motivo desta correção.
Ora mantém-se o já mencionado quanto ao incumprimento do disposto no n.º 2 do Anexo à Portaria 2018-D/2019, de 15 de julho.
4. Comparticipações financeiras indevidas na resposta de SAD
Independentemente do entendimento tido pela IPSS no que se refere ao alegado desajustamento da legislação aplicável à resposta, facto é que a legislação é imperativa. Por outro lado, o que aqui se encontra em análise não são os serviços que cada utente possa ou não pretender, mas sim quais os serviços que a IPSS presta aos mesmos e em função destes serviços se reúnem ou não os critérios para que permitam ser comparticipados pela Segurança Social.
Dentro dos limites definidos pela capacidade constante no acordo de cooperação para a resposta de SAD, a IPSS poderá sempre prestar os serviços que os utentes pretendam, contudo só os poderá considerar como utentes abrangidos por acordo de cooperação caso cumpra com os critérios definidos para o efeito.
Conforme já mencionado no relatório os Protocolos de Cooperação celebrados entre o atualmente denominado Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social (MTSSS) e a Confederação Nacional das Instituições de Solidariedade (CNIS), a partir do ano de 2013, definem que o Serviço de apoio domiciliário (SAD) inclui, no mínimo, dois dos serviços considerados indispensáveis.
Quanto ao serviço de animação/socialização, estabelecem os diversos protocolos bem como as FAQ' s que o mesmo abrange, no mínimo, quatro atividades semanais que podem variar entre animação, lazer, cultura, aquisição de bens e de géneros alimentares, pagamento de serviços, e deslocação a entidades da comunidade.
Ora conforme referido no relatório, apesar da existência de alguns registos da sua prestação, o modo e a periodicidade com que terão sido prestados não consubstancia o serviço animação/socialização para efeitos de comparticipação financeira da segurança social.
Quanto aos serviços denominados “Outros” dos registos da prestação do serviço e das declarações da Diretora Técnica que refere que se trata de cuidados de imagem, concluiu-se que não se enquadram num dos 6 serviços considerados indispensáveis para efeito de comparticipação.
Caso a IPSS preste outros cuidados e serviços previstos no n.º 4 do artigo 4o da Portaria n.º 38/2013, de 30 de janeiro, para além dos previstos no n.º 1, poderá ser considerado um acréscimo à comparticipação financeira.
Ora nas situações detetadas o que se verificou foi que a IPSS apenas prestava um serviço considerado indispensável para efeito de comparticipação.
Quanto à utente HH, considera-se que foi inserida indevidamente na resposta social de SAD para efeito de comparticipação, isto porque, de 02.2018 a 09.2018 apenas usufruiu do serviço de alimentação, por outro lado, em 10.2018 esta utente passou a frequentar a resposta de Centro de Dia, aliás conforme é declarado pela Diretora técnica, bem como visionado pela equipa inspetiva nas datas das visitas efetuadas, em que a utente se encontrava a frequentar o Centro de Dia, posição corroborada pela listagem de utentes.
Cumpre ainda acrescentar que a IPSS vem validar a análise efetuada pela equipa inspetiva ao referir que “se o que estava mencionado nos contratos não se verifica nos registos é porque os utentes não quiseram a realização desses serviços ...”.
Ora, assim se pode concluir que o que consta dos registos foram os serviços efetivamente prestados aos utentes e daí se procedeu ao apuramento dos utentes que poderiam ser considerados para efeitos de comparticipação financeira.
Relativamente à exceção por prescrição alegada pela IPSS, cumpre referir que a IPSS inseriu nas listagens enviadas ao CDist do Porto para efeitos de comparticipação, serviços que não prestou aos seus utentes de SAD.
Verifica-se assim que o apuramento feito decorreu de falsas declarações prestadas junto da Segurança Social.
Tendo em consideração o disposto na alínea c) do n.º 2 do artigo 161.º do Código do Procedimento Administrativo, nos termos do qual são nulos os atos administrativos “cujo objeto ou conteúdo (...) ou constitua ou seja determinado pela prática de um crime”, entende-se como nulo o ato administrativo de atribuição de valores patrimoniais, sendo, de acordo com o preceituado no n.º 2 do artigo 162.º do mesmo Código, a nulidade invocável a todo o tempo por qualquer interessado e não produzindo o ato nulo quaisquer efeitos jurídicos.”
III – CONCLUSÕES
Da pronúncia remetida pela IPSS, conclui-se que a instituição não logrou demonstrar a inexistência das irregularidades detetadas em sede de ação inspetiva e vertidas no relatório enviado para pronúncia, bem como que as irregularidades não se encontram sanadas, pelo que os factos e argumentos aduzidos, em nada alteram os pressupostos que decorrem da análise vertida no relatório.
IV – PROPOSTA
Que a IPSS seja advertida nos termos do disposto no artigo 35.º da Portaria n.º 196-A/2015, de 1 de julho bem como para que promova a regularização das circunstâncias que deram origem ao incumprimento;
Tornar públicos ao Centro Distrital do Porto, através do Sistema de Apoio à Fiscalização (SAF), os documentos associados a este procedimento de fiscalização, para que, em articulação com a instituição, seja elaborado plano que defina termos, condições e prazos para a retificação das irregularidades detetadas, em cumprimento do disposto na alínea e), do artigo 33.º-A e n.º 2, do artigo 38.º, ambos da Portaria n.º 218-D/2019, de 15 de julho, bem como reavaliar o Acordo de Cooperação do SAD no que toca aos recursos humanos. (...).»
I) A 23/06/2020, foi proferido despacho pelo Diretor da Unidade de Fiscalização do Norte do seguinte teor:
“Concordo com o presente relatório, suas conclusões e propostas, bem como o parecer que antecede, (...), cujo teor acompanho.
(...).
Assim, proceda-se como vem proposto.” cfr. fls. 884 do P.A.;
J) Por ofício datado e remetido a 26/06/2020, a Requerente foi notificada do relatório final e decisão referidos nas alíneas antecedentes, nos termos de fls. 882 e 883 do P.A. e do qual consta, nomeadamente, o seguinte:
“(...).
Face ao incumprimento verificado, cumpre notificar V/Exa. da advertência prevista no artigo 34.º da Portaria n.º 196-A/2015, de 1 de julho, na versão que lhe foi dada pela Portaria n.º 218-D/2019, de 15 de julho, bem como para promover a regularização das circunstâncias que deram origem ao incumprimento.
Para concretização do processo de regularização a que se refere o artigo 38.º, n.º 2 do mesmo diploma legal, pode dirigir-se ao Centro Distrital do Porto, (...), com cujos serviços se poderá articular, no sentido de acordar os termos e condições em que serão efetuadas as retificações necessárias à regularização das situações detetadas.
(...).”
K) A 20/09/2020, a Requerente apresentou recurso hierárquico facultativo dirigido ao Presidente do Conselho Diretivo da Entidade Requerida,
L) A 01/02/2022, o Presidente do - nos termos que constam a fls. 896 a 901 do P.A., e cujo teor, por brevidade, se dá por integralmente reproduzido - Conselho Diretivo da Entidade Requerida decidiu negar provimento ao recurso hierárquico interposto pela Requerente – cfr. fls. 992 do P.A.;
M) A decisão referida na alínea antecedente foi exarada sob a proposta do Diretor do Gabinete de Assuntos Jurídicos e Contencioso, a qual foi exarada sob a proposta do Chefe do Setor de Coordenação Técnica do seguinte teor:
“(...).
O presente recurso hierárquico vem apresentado da advertência do Departamento de Fiscalização, Unidade de Fiscalização do Norte, notificada pelo ofício n.º ...76, de 26/06/2020, nos termos do artigo 34.º da Portaria n.º 196-A/2015, de 01/06, na versão que lhe foi dada pela Portaria n.º 218-D/2019, de 15/07, bem como da decisão de devolução ao ISS, I.P. da quantia de € 142.272,35.
A sobredita decisão fundamentou-se na sequência externa de fiscalização realizada pela Unidade de Fiscalização do Norte, Núcleo de Fiscalização de Equipamentos Sociais, Setor 1, que deu origem ao processo de averiguações PROAVE n.º ...83, que concluiu que dos factos apurados resultaram irregularidades que consubstanciam um incumprimento das cláusulas constantes dos acordos de cooperação celebrados entre a IPSS e o Centro Distrital da Segurança Social do Porto, nos termos da Portaria n.º 196-A/2015, de 1 de julho, na versão que lhe foi dada pela Portaria 218-D/2019, de 15 de julho.
Compulsado o processo administrativo, analisados os factos e os argumentos de direito expendidos no recurso hierárquico, bem como a legislação ao caso aplicável, e inexistindo outros elementos que possam obstar à decisão supra referida, propõe-se à consideração superior a improcedência do recurso hierárquico, confirmando-se a decisão de acordo com os fundamentos apresentados na pronúncia do autor do ato (nos termos dos n.ºs 1 e 2 do artigo 197.º do CPA) que se anexa.” – cfr. fls. 993 e 994 do P.A.;
N) A pronúncia do autor do ato a que se alude na proposta do Chefe do Setor de Coordenação Técnica referida na alínea antecedente tem o seguinte teor:
“Face ao solicitado pelo Gabinete de Assuntos Jurídicos e Contencioso do ISS IP, elabora-se Pronúncia ao recurso hierárquico facultativo, apresentado pela CECAJUVI – Centro de Convívio e Apoio à Juventude e Idosos de ... – Associação de Solidariedade Social.
Vem a IPSS, no que toca aos recursos humanos, referir que têm havido “interpretações díspares e exigências de rácios de pessoal diferentes das indicações do acompanhamento técnico do Centro Distrital relativamente às que são referidas pelo Serviço de Fiscalização.” Ora, tal como já referido em sede de relatório final, a IPSS tem obrigatoriamente que dar cumprimento aos preceitos legais, no que toca aos rácios de recursos humanos face ao número de utentes em frequência.
Rácios estes definidos pela lei ou através de orientações emanadas pela tutela, como, por exemplo, os referenciais aprovados pelo Conselho Diretivo do ISS, I.P. no dia 16.05.2013, que passaram a constituir um referencial a aplicar pelos CDist na definição do quadro de pessoal da resposta de SAD, e que por constituírem um simples referencial, a sua violação não consubstancia uma infração, pelo que a situação descrita em sede de relatório, a saber
“Quanto à auxiliar dos serviços gerais o relatório remete para a proposta de referencial constante do Boletim Informativo n.º 19/2013 e que refere que, caso o SAD tenha lavandaria, deve ser afeta a esta resposta, um trabalhador Auxiliar de Serviços Gerais.”, não foi noticiada a NCO do CDist do Porto, para abertura de procedimento contraordenacional.
Acresce que decorre da Portaria 196-A /2015, de 1 de julho pela redação que lhe foi dada pela Portaria 218-D/2019 de 15 de julho, a obrigatoriedade por parte da IPSS, nomeadamente de “...garantir o funcionamento do serviço e equipamento social, de harmonia com a legislação em vigor e com as normas complementares inscritas no respetivo acordo” (alínea c do artº 12), bem como “Observar as disposições constantes de instrumentos regulamentares provados pelo membro do Governo responsável pela área da segurança social e com as entidades representativas das instituições”(alínea j do art.º 12), obrigações estas que não poderão ser afastadas em nenhum processo negocial, nomeadamente em sede de acordos de cooperação.
Relativamente às comparticipações familiares, vem a instituição referir que “...quanto à alegada violação do n.º 2 do Anexo à Portaria n.º 196-A/2015, de 1 de julho, importa salientar que se trata sempre de comparticipações definidas em valores inferiores aos alegadamente resultariam da aplicação do Regulamento em causa”, cumpre esclarecer que a violação da lei resulta do incumprimento das regras aí definidas e não do valor da comparticipação paga pelo utente ser inferior ou superior ao que o do seu cumprimento resultaria.
Ainda sobre este assunto, vem a instituição alegar o disposto no n.º 7.1.1. do Anexo do referido Regulamento, aplicável às situações que levantam dúvidas sobre a veracidade das declarações de rendimento apresentado para cálculo da comparticipação.
Pese embora esta norma permita que, sempre que hajam fundadas dúvidas sobre a veracidade das declarações de rendimento apresentadas pelos utentes, as IPSS possam convencionar um montante de comparticipação familiar até ao limite da comparticipação familiar máxima, facto é que estas exceções devem ser explanadas em sede de processo individual dos utentes, de forma a que a decisão da Direção quanto ao valor da comparticipação familiar esteja documentalmente espelhada, por forma a garantir o princípio da transparência e da fundamentação das decisões tomadas em sede de Direção. Contudo tal fundamentação não consta dos processos de utentes, pelo que se concluiu pelo incumprimento do disposto no n.º 2 do Anexo à Portaria 2018-D/2019, de 15 de julho.
No que reporta ao, constante do ponto 4 “Comparticipações indevidas na resposta de SAD”, independentemente do entendimento tido pela IPSS no que se refere ao alegado desajustamento da legislação aplicável à resposta, facto é que a legislação é imperativa. Por outro lado, o que aqui se encontra em análise não são os serviços que cada utente possa ou não pretender, mas sim quais os serviços que a IPSS presta aos mesmos e, em função dos serviços prestados, se estes reúnem ou não os critérios para que possam ser comparticipados pela Segurança Social.
Dentro dos limites definidos pela capacidade constante no acordo de cooperação para a resposta de SAD, a IPSS poderá sempre prestar os serviços que os utentes pretendam, contudo só os poderá considerar como utentes para efeitos de comparticipação da Segurança Social, ou seja, só poderá inserir nas listagens que submete em SSD para efeitos de comparticipação, a identificação daqueles a quem foram prestados mais do que um serviço.
Conforme já mencionado no relatório os Protocolos de Cooperação celebrados entre o atualmente denominado Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social (MTSSS) e a Confederação Nacional das Instituições de Solidariedade (CNIS), a partir do ano de 2012, definem que o Serviço de apoio domiciliário (SAD) inclui, no mínimo, dois dos serviços considerados indispensáveis.
Cumpre ainda acrescentar que a IPSS vem validar a análise efetuada pela equipa inspetiva ao referir que “se o que estava mencionado nos contratos não se verifica nos registos é porque os utentes não quiseram a realização desses serviços ...”.
Ora, assim se pode concluir que o que consta dos registos foram os serviços efetivamente prestados aos utentes.
Relativamente à exceção por prescrição alegada pela IPSS, cumpre referir que a IPSS inseriu nas listagens enviadas ao CDist do Porto para efeitos de comparticipação, serviços que não prestou aos seus utentes de SAD, pelo que o apuramento feito decorreu de falsas declarações prestadas junto da Segurança Social.
Tendo em consideração o disposto na alínea c) do n.º 2 do artigo 161.º do Código do Procedimento Administrativo, nos termos do qual são nulos os atos administrativos “cujo objeto ou conteúdo (...) ou constitua ou seja determinado pela prática de um crime”, entende-se como nulo o ato administrativo de atribuição de valores patrimoniais, sendo, de acordo com o preceituado no n.º 2 do artigo 162.º do mesmo Código, a nulidade invocável a todo o tempo por qualquer interessado e não produzindo o ato nulo quaisquer efeitos jurídicos.” cfr. fls. 996 a 998 do P.A.;
O) A petição inicial da ação administrativa foi apresentada em juízo a 09/05/2022cfr. fls. 1 dos autos da ação administrativa.
2. MATÉRIA de DIREITO
No caso dos autos, delimitando o objecto do recurso, atentas, por um lado, as conclusões das alegações supra transcritas, por outro, as contra alegações, também supra transcritas nas suas conclusões e, essencialmente, a sentença recorrida, nos seus fundamentos e dispositivo, importa elucidar a posição das partes e objectivar concretamente o dissídio que nos cumpre apreciar decidir.
Assim, a sentença em análise, antecipando a decisão do processo principal, entendeu que, pese embora o "Acordo de cooperação", celebrado entre as partes, constitua um contrato, enquadrável no Código dos Contratos Públicos, art.º 307.º, n.º1 - o acto questionado, cautelarmente e a título principal, constitui uma decisão sancionatória, nos termos do disposto no art.º 307.º, n.º2. al. c) do mesmo CCP e assim um acto administrativo autonomamente impugnável.
Tirada essa conclusão - estando em causa dois actos administrativos - um, de 23/6/2021 --- cfr. Al. I) do probatório --- - o 1.º acto - e outro, prolatado, na sequência de um recurso hierárquico facultativo - de 1/2/2021 --- cfr. Al. L) do probatório --- - 2.º acto -, entendeu a Sr.ª Juíza de direito do TAF de Mirandela, assertivamente - convenhamos e como infra se verá - que, sendo o 2.º acto um acto confirmativo do 1.º, era aquele contenciosamente inimpugnável e assim, julgando procedente, por provada, a excepção dilatória da inimpugnabilidade do ato impugnado (proferido pelo Presidente do Conselho Directivo da Entidade Requerida a 01/02/2022), e, em consequência, absolveu a Entidade Ré/Recorrida da instância.
Ora, é este o nó górdio do presente recurso --- estamos (ou não) perante ou acto administrativo inimpugnável, por confirmativo.
A sentença justificou a decisão nos seguintes termos:
"De direito
A nossa Lei Fundamental garante aos administrados o direito a impugnarem junto dos tribunais administrativos quaisquer atos ou condutas desenvolvidas pela Administração Pública que os lesem na sua esfera jurídica e independentemente da sua forma – cfr. artigo 268.º, n.º 4 da CRP –, pelo que, para a definição do que constitui ou deve ser conceptualizado como “ato administrativo impugnável” importa considerar, desde logo, este comando constitucional.
No artigo 51.º do CPTA vem definido, como princípio geral, o que é tido como ato contenciosamente impugnável, estipulando o n.º 1 que “ainda que não ponham termo a um procedimento, são impugnáveis todas as decisões que, no exercício de poderes jurídico-administrativos, visem produzir efeitos jurídicos externos numa situação individual e concreta (...).”
Referem M. Aroso de Almeida e Carlos Alberto Fernandes Cadilha, in Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, 2017, 4.ª edição, Almedina, em anotação a este artigo, o seguinte: “a) na caracterização do ato administrativo impugnável que o n.º 1 deste artigo 51.º nos oferece, o acento tónico reside, antes de mais, no conteúdo decisório do ato: só são impugnáveis as decisões, os atos que contém decisões. Fora do âmbito dos atos impugnáveis estão, por isso, todas as declarações ou manifestações da Administração que não contêm uma definição jurídica unilateral. É o caso dos atos instrumentais (...), dos atos extraprocedimentais (...), das operações materiais (...) e das declarações negociais sobre a interpretação e validade de contratos ou sobre a sua execução, a que se refere o artigo 307.º do CCP, que não revestem a natureza de atos administrativos.”
(...).
b) Por outro lado, o n.º 1 deste artigo 51.º estabelece a regra de que só são impugnáveis os atos decisórios com eficácia externa.
São externos os atos que produzem efeitos jurídicos no âmbito de relações entre a Administração e os particulares ou que afetam a situação jurídico-administrativa de coisas (...). Por contraposição, são internos os atos que se inscrevem no âmbito das relações interorgânicas ou das relações de hierarquia, como as ordens de serviço, que apenas indiretamente se refletem no ordenamento jurídico geral.”
Isto posto, o acordo de cooperação celebrado entre as Partes a 31/07/2001 e objeto de revisão a 14/09/2006 assentou numa parceria, com partilha de objetivos e interesses comuns, mediante a repartição de obrigações e responsabilidade, com vista ao desenvolvimento de serviços e equipamentos sociais para a proteção social dos cidadãos e que se encontra previsto na Portaria n.º 196-A/2015, de 01/07, a qual define os critérios, regras e formas em que assenta o modelo específico de cooperação estabelecida entre o Instituto da Segurança Social e as instituições particulares de solidariedade social ou legalmente equiparadas.
No que diz respeito aos contratos da Administração Pública, dispõe o artigo 200.º do CPA o seguinte:
“1 – Os órgãos da Administração Pública podem celebrar contratos administrativos, sujeitos a um regime substantivo de direito administrativo, ou contratos submetidos a um regime de direito privado.
2 – São contratos administrativos os que como tal são classificados no Código dos Contratos Públicos ou em legislação especial.
3 – Na prossecução das suas atribuições ou dos seus fins, os órgãos da Administração Pública podem celebrar quaisquer contratos administrativos, salvo se outra coisa resultar da lei ou da natureza das relações a estabelecer.”
A Portaria n.º 196-A/2015, de 01/07 refere expressamente no seu artigo 7.º, n.º 1 que a cooperação pode assumir a forma de acordo de cooperação (alínea a), acordo de gestão (alínea b) e protocolo (alínea c), sendo que o n.º 2 estipula que “o acordo de cooperação é um contrato escrito, através do qual se estabelece uma relação jurídica com vista ao desenvolvimento de uma resposta social.”
Assim, é a própria legislação aplicável aos autos que classifica o acordo de cooperação celebrado entre as Partes como contrato administrativo e, como tal, é-lhe aplicável a parte III do Código dos Contratos Públicos – cfr. artigo 280.º do Código dos Contratos Públicos (CCP).
Dispõe o artigo 307.º, n.º 1 do CCP que “com exceção dos casos previstos no número seguinte, as declarações do contraente público sobre interpretação e validade do contrato ou sobre a sua execução são meras declarações negociais, pelo que, na falta de acordo do cocontratante, o contraente público apenas pode obter os efeitos pretendidos através do recurso à ação administrativa.”
Assim, quando estão em causa litígios sobre questões de validade e interpretação de contratos a Administração não dispõe do poder de dizer unilateralmente o Direito, decidindo através de ato administrativo se os contratos em que é parte são válidos ou não, ou interpretando o respetivo clausulado. É que, o poder para efetuar tal interpretação e declaração de validade cabe aos tribunais, daí que as declarações do contraente público emitidas neste âmbito sejam meras declarações negociais e como tal não revistam a natureza de atos administrativos impugnáveis; aliás, é esta a posição defendida pela Requerente para defender a impugnabilidade da decisão proferida em sede de recurso hierárquico (defende a Requerente que o ato recorrido – o despacho de 23/06/2020 do Diretor da Unidade de Fiscalização do Norte – é uma mera declaração negocial).
No entanto, importa também ter presente que o n.º 2 do artigo 307.º do CCP dispõe que “revestem a natureza de ato administrativo as declarações do contraente público sobre a execução do contrato que se traduzam em:
a) Ordens, diretivas ou instruções no exercício dos poderes de direção e de fiscalização;
b) Modificação unilateral das cláusulas respeitantes ao conteúdo e ao modo de execução das prestações previstas no contrato por razões de interesse público;
c) Aplicação das sanções previstas para a inexecução do contrato;
d) Resolução unilateral do contrato;
e) Cessão da posição contratual do cocontratante para terceiro.”
No caso presente, o despacho de 23/06/2020 do Diretor da Unidade de Fiscalização do Norte que decidiu que a Autora havia incumprido o acordo de cooperação celebrado com a Entidade Requerida e que, por tal facto, havia recebido indevidamente comparticipações no valor de € 142.272,35 e que, em consequência, lhe aplicou a sanção prevista no artigo 34.º, alínea a) da Portaria n.º 196-A/2015, de 01/07, ou seja, a advertência escrita para a regularização das circunstâncias que deram origem ao incumprimento, constitui um ato administrativo relativo à execução do contrato que é contenciosamente impugnável pela via da ação administrativa.
Sucede que, desta decisão, a Autora interpôs recurso hierárquico facultativo o qual foi objeto de decisão desfavorável à sua pretensão pois foi decidido manter a decisão recorrida e que constitui o ato impugnado.
Ora, defende a Entidade Requerida que este ato não é impugnável pois é um ato confirmativo, e com razão como se passará a demonstrar.
O legislador do CPTA, na revisão de 2015, introduziu no artigo 53.º, n.º 1 uma definição de ato confirmativo, noção que até aí estava apenas tratada doutrinal e jurisprudencialmente.
Assim, nos termos do citado preceito “não são impugnáveis os atos confirmativos entendendo-se como tal os atos que se limitem a reiterar, com os mesmos fundamentos, decisões contidas em atos administrativos anteriores”.
Prende-se esta noção com a de ato administrativo, agora claramente assumida pelo legislador do CPA e do CPTA como tendo de ser estatuição com carácter autoritário, proferida por um órgão da Administração no uso dos seus poderes próprios, que define inovatoriamente uma dada situação jurídica, produzindo efeitos jurídicos externos.
Na definição do artigo 148.º do CPA, atos administrativos são “decisões que, no exercício de poderes jurídico-administrativos, visem produzir efeitos jurídicos externos numa situação individual e concreta”.
Assim, para o legislador do CPA e CPTA atuais, qualquer decisão que se limite a manter um anterior ato administrativo sem alterar em nada a situação jurídica precedente, não tem conteúdo inovatório, logo, não é sequer um (novo) ato administrativo, pois falta-lhe o conteúdo decisório e a eficácia externa.
Resulta, assim, do artigo 53.º, n.º 1 do CPTA, que o ato confirmativo, porque não inova na ordem jurídica, porque não produz efeitos externos – não sendo também nessa mesma medida um “verdadeiro” ato administrativo – teria também (e por norma) de ser inimpugnável.
Isto posto, analisando o teor do despacho do Diretor da Unidade de Fiscalização do Norte, de 23/06/2020 (que decidiu que a Autora havia incumprido o acordo de cooperação celebrado com a Entidade Requerida e que, por tal facto, havia recebido indevidamente comparticipações no valor de € 142.272,35 e que, em consequência, lhe aplicou a sanção prevista no artigo 34.º, alínea a) da Portaria n.º 196-A/2015, de 01/07) e o teor do despacho proferido pelo Presidente do Conselho Diretivo da Entidade Requerida a 01/02/2022 que incidiu sobre o recurso hierárquico facultativo interposto pela Requente, constata-se que, este último despacho apenas confirmou o ato recorrido já que manteve nos seus precisos termos e com os mesmos fundamentos, quer de facto, quer de direito, a anterior decisão administrativa impugnada administrativamente e, por isso, não introduziu qualquer alteração na esfera jurídica da Requerente.
O ato confirmativo não possui lesividade autónoma pois o ato que decidiu pelo incumprimento do acordo de cooperação pela Requerente e que lhe aplicou a sanção prevista no artigo 34.º, alínea a) da Portaria n.º 196-A/2015, de 01/07 foi o ato impugnado em sede de recurso hierárquico facultativo, tendo a decisão proferida sobre o mesmo se limitado a reiterar o conteúdo e fundamentos da decisão hierarquicamente impugnada, com idênticos pressupostos de facto e de direito.
Importa, por último referir que na petição inicial apresentada na ação administrativa, a Requerente peticionou a anulação da decisão do Presidente do Conselho Diretivo da Entidade Requerida de 01/02/2022 (que, como referido supra, consubstancia um ato confirmativo) e peticiona ainda, a título subsidiário, “a condenação do R. a reconhecer que devem ser mantidos como utentes em acordo de cooperação os utentes que celebraram contratos de prestação de serviços em data anterior a 1 de Janeiro de 2013, com os efeitos na redução do montante a devolver, nos termos expostos.
Ainda subsidiariamente, requer a condenação do R. a reconhecer que o Protocolo de Cooperação para 2013/2014 cessou a sua vigência em 31 de Dezembro de 2014, cessando a partir dessa data o requisito da existência de um mínimo de dois serviços para qualificar os utentes em SAD cobertos por acordo de cooperação, com os correspondentes efeitos na redução dos montantes a devolver, igualmente nos termos expostos.
Também a título subsidiário sucessivo, a condenação do R. a considerar que o acordo cooperação celebrado entre A. e R. tem a natureza de um instrumento obrigacional bilateral, com compromissos estabelecidos no domínio da autonomia privada, podendo ser qualificado como contrato administrativo – o que implica o reconhecimento da verificação da excepção da prescrição, de 5 anos, nos termos do artº 310º do Código Civil.”
Ora, estes pedidos subsidiários estão em mera cumulação aparente com o pedido impugnatório, já que, os pedidos subsidiários são mera decorrência do pedido impugnatório; os pedidos subsidiários não são verdadeiramente autónomos, pois constituem os fundamentos em que a Requerente alicerçou a sua causa de pedir para impugnar o ato suspendendo (e também para interpor recurso hierárquico facultativo), sendo que, mesmo que assim não se entendesse então estaria preenchida a previsão do artigo 38.º, n.º 2 do CPTA.
Assim, a formulação destes pedidos subsidiários (e em cumulação aparente) não obsta à procedência da exceção da inimpugnabilidade do ato impugnado, o que se decidirá".
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A dissintonia do A./Recorrente - como se depreende das suas alegações recursivas - consiste no facto de, entre os dois actos - confirmado e confirmativo, de 23/6/2021 e 1/2/2022 - ter ocorrido alteração legislativa, repercutida na fundamentação administrativa decisória que importa, seguindo a doutrina e jurisprudência, inverificação da excepção de inimpugnabilidade do 2.º acto, o acto confirmativo.
Porém, carece de razão o A./Recorrente.
Efectivamente, o Dec. Lei n.º 74/2007, de 14/3, foi alterado pelos Dec. Lei ns. 99/2021, de 28/9 e 33/2014, de 4/3, sendo que foi neste que foi aditado o art.º 39.º -C, onde se refere
Artigo 39.º-C - sob a epígrafe "Infrações graves"
"Constituem infrações graves:
a) A não apresentação, no prazo de 30 dias contados da sua ocorrência, de requerimento de substituição da licença de funcionamento, na sequência de alteração da denominação do estabelecimento, da localização, da identificação da entidade requerente, da atividade prosseguida ou da capacidade autorizada;
b) A falta de comunicação, aos serviços competentes do Instituto da Segurança Social, I.P., da interrupção ou cessação da atividade do estabelecimento por iniciativa do proprietário, no prazo de 30 dias;
c) A falta de comunicação prévia, aos serviços competentes do Instituto da Segurança Social, I.P., das alterações ao regulamento interno do estabelecimento, até 30 dias antes da sua entrada em vigor;
d) A falta da remessa anual, aos serviços competentes do Instituto da Segurança Social, I.P., dos mapas estatísticos dos utentes e da relação do pessoal existente no estabelecimento, bem como do preçário em vigor".
Por sua vez, o Dec. Lei 126-A/2021, de 31/12, alterou/aditou aquele normativo no seguinte sentido:
"Artigo 39.º-C
Infrações graves
Constituem infrações graves:
a) A não apresentação, no prazo de 30 dias contados da sua ocorrência, de requerimento de substituição da comunicação prévia ou da autorização de funcionamento, na sequência de alteração da denominação do estabelecimento ou da identificação da entidade gestora;
b) A ausência de comunicação na sequência de alterações de localização da atividade prosseguida pela resposta social ou da capacidade autorizada;
c) A falta de comunicação, aos serviços competentes do ISS, I. P., da interrupção ou cessação da atividade do estabelecimento por iniciativa do proprietário, no prazo de 30 dias;
d) A falta de comunicação prévia, aos serviços competentes do ISS, I. P., das alterações ao regulamento interno do estabelecimento, até 30 dias antes da sua entrada em vigor;
e) A falta da remessa anual, aos serviços competentes do ISS, I. P., dos mapas estatísticos dos utentes e da relação do pessoal existente no estabelecimento, bem como do preçário em vigor;
f) A inexistência de comunicação mensal de dados ou a comunicação de dados errados relativos à frequência de utentes, no caso das respostas com acordo de cooperação;
g) A prestação de falsas informações na comunicação prévia, sem prejuízo das demais sanções aplicáveis;
h) A falta de apresentação de registo criminal dos titulares dos órgãos de direção ou administração e de recursos humanos, nos termos da regulamentação específica".
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Porém, como decorre do seu art.º 48.º, este Dec. Lei 126-A/2021, publicado em 31/12/2021, entrou em vigor no prazo de 60 dias após a sua publicação, ou seja, apenas em finais de Fevereiro de 2022, o que, indubitavelmente, significa que, à data da prolação do 2.º acto - de 1/2/2022 - ainda não se encontrava em vigor, ou seja, mantinha-se a mesma legislação, o mesmo quadro jurídico em vigor à data do 1.º acto (de 23/6/2021).
Temos, por conseguinte de desconsiderar a argumentação do Recorrente, nesta parte, por manifestamente insubsistente, sendo que, assim, se verificam todos os requisitos - como demonstrado na sentença recorrida - do acto confirmativo e assim inimpugnável, acto este, porque não deixa de ser, em função da acção inspectiva levada a cabo pelos serviços de fiscalização da Segurança Social, um acto sancionatório, ainda que o A./Recorrente o queira restringir - n.º 38.º das conclusões - ao respectivo montante.
Efectivamente, vista a disciplina que emana dos arts. 34.º e 38.º da Portaria 196-A/2015, de 1/7[1] - mantidos, na sua essência, na Portaria 218-D/2019, de 15/7 - não podemos deixar de qualificar a decisão de aplicação da "repreensão escrita" como uma sanção, a par de outras mais penalizadoras, como sejam a suspensão e resolução do acordo, sendo que a negociação subsequente, terá em vista, não tanto a questão da devolução da "ajuda" indevidamente recebida - nos termos constantes das decisões de 23/6/2021 e 1/2/2022 - no valor de 142.273,35 €, mas a correcção das irregularidades que importaram o recebimento, alegadamente indevido, da Segurança Social.
Mas ... se entende - como defende - que não se trata de um acto administrativo, então porquê impugná-lo, cautelarmente e em acção principal (esta em reanálise, atenta a antecipação da causa principal - art.º 121.º do CPTA - opção judicial, não contestada pelas partes) ???
Quanto à qualificação dos pedidos, reitera-se, por correcta, a argumentação propendida pelo TAF de Penafiel, sendo, aliás, apodíctico o pedido expresso, textualmente, na parte final da p.i. --- transcritos na sentença recorrida - supra evidenciada --- ou seja, repetidamente, referindo o seu carácter subsidiário e sub-subsidiário.
Mas se o texto é paradigmático, a sua substância também não deixa de inculcar essa subsidariedade.... ou seja ... sem razões a crítica asseverada à sentença recorrida, mal grado, a sua eloquência argumentativa.
*
Por todo o exposto --- prejudicada a alegação no que se refere à factualidade provada aditanda, pois que - como, aliás, defende o próprio A./Recorrido, na conclusão LI[2] - apenas seria de ponderar para aferir da (im)procedência das invalidades suscitadas ao acto efectivamente impugnado, ou seja, em função do provimento deste recurso que - como vimos -, não se verifica --- importa apenas, em negação do provimento ao recurso, manter a sentença recorrida.
III
DECISÃO
Nestes termos, acordam, em conferência, os juízes deste Tribunal em negar provimento ao recurso e assim manter a sentença recorrida.
Custas pelo A./Recorrente.
Notifique-se.
DN.
*
Porto, 25 de Novembro de 2022
Antero Salvador
Helena Ribeiro
Nuno Coutinho
_____________________________________
[1] Que dispõem:
" Artigo 34.º
Consequências do incumprimento
O não cumprimento das cláusulas constantes dos acordos de cooperação, gestão e protocolos pode dar lugar a:
a) Advertência escrita;
b) Suspensão;
c) Resolução.
Artigo 35.º
Advertência escrita
1.º Considera-se advertência escrita a notificação dirigida à instituição para regularizar a circunstância que deu origem ao incumprimento.
..." - sublinhados nossos.
[2] Onde consta "Deverá a Matéria de facto ser acrescida da factualidade alegada no nº 15, alíneas P a CC das presentes Alegações, que, brevitatis causa, se dá por reproduzida, por a mesma relevar em caso de provimento do recurso" - sublinhado nosso.