Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00088/14.7BEPRT
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:10/13/2016
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Vital Lopes
Descritores:IMI
BENEFÍCIOS FISCAIS
ISENÇÃO
Sumário:1. A alínea d) do artigo 1.º da Lei n.º 151/99, de 14 de Setembro não constitui fundamento de isenção de imposto municipal sobre imóveis;
2. A afetação dos rendimentos decorrentes da alienação ou oneração de imóvel à realização dos fins de pessoa coletiva de utilidade pública que o adquiriu não constitui fundamento da isenção de imposto municipal sobre imóveis a que alude o artigo 44.º, n.º 1, alínea e), do CIMI;
3. As decisões proferidas no âmbito de normas fiscais revogadas não podem constituir instruções genéricas vinculativas para efeitos de decisão sobre benefícios fiscais inseridos em normas que essas decisões não apreciaram nem podiam ter apreciado.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:Caixa Económica...
Recorrido 1:Autoridade Tributária e Aduaneira
Decisão:Negado provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:ACORDAM EM CONFERÊNCIA NA SECÇÃO DO CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO NORTE

1 – RELATÓRIO
A Caixa Económica... recorre da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, que julgou improcedente a acção administrativa especial por si interposta contra o Sr. Director-Geral dos Impostos, tendo por objecto a decisão proferida no recurso hierárquico interposto do acto de 25/01/2013, do Sr. Chefe do Serviço de Finanças do Porto - 1, que indeferiu o pedido de isenção de imposto municipal sobre imóveis referente aos prédios urbanos sitos em Campanhã – Porto, inscritos na matriz predial urbana sob os artigos 1….º-D (anterior 1….º-D) – Campanhã, Porto; 1….º-A – Campanhã, Porto e 8….º - Bonfim, Porto.

Nas alegações de recurso, formulou as seguintes «Conclusões:
1. Diz-se a folhas 14 “Temos assim que todos estes atos e operações, muito embora consistindo em atos próprios de uma instituição de crédito, visam, porque fazem parte precisamente do seu âmbito e objecto social servir os seus fins estatutários (sociais) da aqui autora CE...”.
2. E depois conclui-se a folhas 15: “não se pode inferir que … a aquisição e posse (propriedade) se destine à realização dos fins estatutários das caixas económicas” …
3. No fundo decide-se que a isenção de IMI das PCUP só abrange os prédios “necessários às suas instalações”, o que é contraditório com o que se conclui antes e atenta contra o que a AT defende.
4. É que nem a AT disse que a isenção das PCUP tinha apenas essa dimensão .
5. Refere-se: “Não se pode inferir que … a aquisição e posse (propriedade) se destine à realização dos fins estatutários das caixas económicas”.
6. Ora, em lado algum se fundamentou a isenção de IMI na “posse” ou na “propriedade”. A fundamentação da isenção de IMI usada foi no critério do “rendimento” que é seguido em centenas de processos na AT.
7. Ou seja, não só estão isentos de IMI os imóveis das PCUP que se destinem às instalações das PCUP, como o estão aqueles que se destinem a produzir rendimentos com vista a realizar os fins estatutários das mesmas, como é claramente o caso.
8. Valerá aqui a regra do nº 1 do artigo 160º do Código Civil: “a admissão do fim de uma pessoa colectiva implica o reconhecimento dos meios para atingir esse fim”.
9. Parte-se de um lapso evidente e notório de confusão entre o que são os fins de uma entidade (fins mediatos) e o seu objecto (fins imediatos).
10. Não se teve o cuidado de se ler o que consta das alegações apresentadas em Juízo que explica isso mesmo: “Nota-se que na contestação o Réu parte de uma confusão técnica no que à distinção entre objecto (fim imediato) e fim teleológico (fins mediatos) dum determinado ente, diz respeito. Recorrendo ao estudo “Da natureza jurídica das caixas económicas” (BMJ, 312, 1982) do Prof. Januário Gomes, refere-se o seguinte a páginas 35/36: “Da mesma opinião é Vincenzo Sinagra que, acerca do critério de determinação da natureza jurídica escreve: A função dum ente jurídico é, na verdade, o que determina a sua natureza. A função, por sua vez, é determinada pelo escopo que explica a própria actividade, e por escopo deve entender-se não o escopo concreto, específico, imediato, mas o escopo último e directo, a finalidade suprema pela qual o ente se constitui, uma vez que o primeiro é só um meio para a consecução do segundo. E continua: Entendemos por função, não a actividade concreta, a acção prática que o ente é chamado geralmente a efectuar, mas a função económico-social que é chamado a desenvolver em sociedade, a actividade que é chamado a desenvolver como fim em relação à primeira que tem o valor de meio”.
11. Ora, uma coisa é o objecto/actividade e os resultados daí decorrentes, outra bem distinta são os fins mediatos, o escopo, o verdadeiro fim de um ente (onde se gastam os proveitos, onde são aplicados).
12. Os fins mediatos, o escopo da Autora são os do próprio M... – Associação Mutualista: “Mais clara se configura a conclusão a que chega o Sr. Prof. Freitas do Amaral no estudo “Natureza jurídica da CEL, anexa ao M...” (precisamente quanto à autora) in “Estudos em Homenagem à Drª Maria de Lourdes Correia do vale”, Cadernos de Ciência e Técnica Fiscal, CEF, Lisboa 1995, páginas 100/1001: “As caixas económicas exercem uma função vincadamente social, de carácter previdencial e beneficente: a maioria delas são instituições anexas a associações de socorros mútuos ou a misericórdias, e de futuro só se verificar esta ligação a instituições de beneficência é que serão autorizadas novas caixas económicas”.
13. Pelo que, sendo pacífico que o M...-AM é uma IPSS que prossegue fins de previdência e beneficência, verifica-se que a CE... a ele anexa tem a mesma natureza.
14. Ou seja, cai por terra toda a construção sustentada no aresto recorrido – que decalca da posição da Autoridade Tributária – de que o que releva para a norma isentiva em causa é o objecto e não os fins, o escopo da entidade.
15. Segundo o douto aresto a isenção da alínea e) do nº 1 do artigo 44º do EBF e a da alínea d) do nº 1 da Lei 151/99, de 14.12 têm hierarquias iguais. A asserção vai contra lei expressa. Vejamos:
16. Em primeiro lugar tratando-se de normas legais sobre benefícios fiscais, sujeitas ao princípio da legalidade (reserva relativa da AR) afirmar-se, sem mais, que um decreto-lei do Governo e uma Lei da Assembleia da República, sobre benefícios fiscais, têm a mesma hierarquia, corresponde smo a lapso manifesto.
17. Por outro lado, mesmo que o DL anterior resultasse de autorização legislativa, o facto da Lei 151/99, de 14.12 , ser posterior e menos exigente, faz com que o diploma anterior passe a estar revogado na parte em que é supostamente mais exigente. Repare-se:
18. A alínea e) do nº 1 do artigo 44º do EBF refere que “estão isentos de imposto municipal sobre imóveis: as pessoas colectivas de utilidade pública administrativa e as de mera utilidade pública, quanto aos prédios ou parte de prédios destinados directamente à realização dos seus fins”.
19. Mas da alínea d) do nº 1 da Lei 151/99, de 14.12 o legislador retirou a expressão “directamente”, exactamente para permitir a isenção: a) Aos prédios sejam instalações das entidades beneficiárias da disposição isentiva; b) E aos prédios que se destinam à obtenção de proveitos das entidades beneficiárias, no desenvolvimento dos seus fins estatutários (critério da produção de rendimentos para a manutenção da fonte geradora).
20. Concluindo-se ao contrário do aresto recorrido: a norma isentiva a aplicar deverá ter a amplitude conferida pela Lei 151/99, de 14.12 e não a dimensão da norma anterior: a alínea e) do nº 1 do artigo 44º do EBF.

21. Segundo a decisão recorrida não procede a alegação da recorrente de que se deve aplicar a mesma interpretação da norma de isenção do IMI relativamente à norma que confere a isenção de IMT às PCUP (alíneas d) e) do artigo 6º do CIMT).
22. Diz-se na decisão recorrida “… por não existir, nem ter sido invocado que exista, qualquer orientação genérica visando a uniformização de interpretação e aplicação de normas tributárias que aqui estão em causa”.
23. Mas, veja-se o que se alegou na PI: “Sendo esta a orientação uniforme que a DGI (DSIMI e DSIMT) têm aplicado, desde 1976, quer ao nível do IMT, quer ao nível do hoje IMI”.
24. Ora, a AT não impugnou esta alegação! Naturalmente porque corresponde à verdade e infirmar estes factos seria manifesta má-fé. Pelo que deverá dar-se por assente esta factualidade.
25. A questão que se coloca é esta: como é que uma expressão isentiva para as PCUP (letra da lei) ao nível do IMT que é claramente mais restritiva que a expressão usada no IMI, não tem que ser levada em conta aio nível da leitura harmónica (amplitude) de todos os benefícios fiscais?
26. Como se pode defender – com as letras da lei citadas – que um imóvel que se destine a arrendar (obter proveitos) beneficie de isenção de IMT e depois não beneficie de Isenção de IMI, se a norma isentiva de IMI é claramente menos restritiva!?

O que está em causa nestes autos: a questão de fundo
27. É a isenção de IMI das Pessoas Colectivas de Utilidade Pública na sua dimensão conferida pela Lei 151/99 de 14.12 (Lei da AR publicada em 1999).
28. No caso o benefício fiscal não carece de acto administrativo meramente declarativo.
29. O M...-Associação Mutualista e a sua Caixa Económica anexa são “UMA UNIDADE com as funções de realizar as FINALIDADES do M...” – artigo 2º da PI – Deliberação do Conselho de Administração Fiscal.
30. Em termos de natureza jurídica as entidades M...-AM e sua CE... anexa, tendo como base a atividade (fim imediato ou objeto), o M...-AM insere-se nas “outras atividades complementares de segurança social” e a sua CE anexa insere-se em “outra intermediação monetária”, sendo ambas consideradas instituições financeiras nos termos da alínea a) do nº 1 do artigo 97º do Código do IRC.

31. Sendo pacífico que o M...-AM é uma IPSS que prossegue fins de previdência e beneficência, verifica-se que a CE... a ele anexa, tem a mesma natureza ou carácter como resulta dos pareceres acima referidos e que aqui se dão por reproduzidos.
32. Ambas as entidades prosseguem ou comungam os mesmos fins, os do M..., sendo uma e a mesma unidade económico funcional, como o entendeu o Conselho de Administração Fiscal na deliberação citada no artigo 2º da PI.
33. Nº 2 do artigo 5º do EBF: “ O reconhecimento dos benefícios fiscais pode ter lugar por acto administrativo ou por acordo entre a Administração e os interessados, tendo, em ambos os casos, efeito meramente declarativo, salvo quando a lei dispuser em contrário”. Ou seja, no caso, não é a AT que tem o poder para dizer o que cabe ou não no âmbito do benefício fiscal. Essa amplitude dimana da lei da AR, neste caso a Lei 151/99, de 14.12, uma vez que o acto de reconhecimento do benefício tem sempre efeito meramente declarativo.
34. Conforme tem sido jurisprudência uniforme de vários tribunais as normas com as que constam do EBF, ora em causa, são de mero controlo dos benefícios fiscais, e não podem limitar ou restringir os benefícios conferidos pela AR, como é o caso.
35. As normas sobre benefícios fiscais admitem interpretação extensiva (artigo 10º do EBF)
36. A lei das caixas económicas, o Decreto-Lei 136/79, de 18 de Maio, em lado algum diz que as caixas económicas têm ou mantêm personalidade jurídica e estatutos próprios, mas também não o proíbe, podendo dispôr dos órgãos sociais homólogos e estar integradas na própria estrutura orgânica e funcional prevista nos estatutos das entidades a que estão anexas.
37. A CE... integra o sector social da economia, não tem fins lucrativos. Os bancos comerciais do sector privado lucrativo integram o sector privado da economia. Não há comparação possível. Nem se pode colocar aqui em causa o princípio da igualdade (da isonomia/isocracia) porque se trata de situações muito diferentes.
38. Sendo os elementos literais das normas isentivas de IMI e IMT idênticos, ocorrendo que quanto à isenção do IMI, o EBF (redacção que vem desde 1989) diz mais que a lei da AR alínea d) do artigo 1º da Lei 151/99, de 14.12,): “Contribuição autárquica – hoje IMI - de prédios urbanos destinados à realização dos seus fins estatutários”,
39. No caso, a isenção de IMI das PCUP, a sua amplitude, resulta da lei que é a alínea d) do artigo 1º da Lei 151/99 de 14.12 (Lei da AR publicada em 1999) por força do nº 2 do artigo 5º do EBF, onde não se usa o termo “directamente” que é ainda usado na alínea e) do nº 1 do artigo 44º do EBF que vem desde a primeira redacção do EBF (1989).
40. No caso do IMT a lei prevê a forma como se integra o conceito da “directa e imediata” afectação do bem aos fins. Refere o artigo 10º nº 2 alínea b) do CIMT que esse desiderato se comprova: “b) Nos casos a que se referem as alíneas d), e) e f) do artigo 6.º, de documento comprovativo da qualidade do adquirente e de certidão ou cópia autenticada da deliberação sobre a aquisição onerosa dos bens, da qual conste expressa e concretamente o destino destes.”
41. No caso do IMI a lei não tem uma norma igual à alínea b) do nº 2 do artigo 10º do CIMT. E não será preciso porque a alínea d) do artigo 1º da Lei 151/99, de 14.12, não coloca limitações ao benefício fiscal.
42. Diz que pode ser concedida isenção de “Contribuição autárquica – hoje IMI - de prédios urbanos destinados à realização dos seus fins estatutários”.
43. Se a lei da AR que tem competência exclusiva sobre a matéria não coloca entraves à amplitude do benefício não poderá a lei ordinária, anterior (EBF com redacção de 1989) colocá-los tendo em conta o nº 2 do artigo 5º do EBF.
44. O reconhecimento do benefício tem efeito meramente declarativo.
45. Mas mesmo considerando a redacção da alínea e) do nº 1 do artigo 44º do EBF, ou seja, mesmo que se considerasse em vigor a expressão “directamente” ter-se-ia que aplicar o mesmo critério que a AT tem para interpretar e aplicar a norma de isenção de IMT, porque tem uma literalidade igual e mais restritiva (no IMI fala-se em “directamente” no IMT fala-se em “direta e imediatamente”.
46. No parecer acima reproduzido o que se pretende dizer é que o termo “directa” não causa problemas alguns porque se entende que aí cabem os prédios para instalações, para locação ou para revenda, ou seja, para obter proveitos para a PCUP.
47. Dir-se-à que a CE... não pode exercer actividade de compra de prédios para revenda. Não pode, nem quer. O que acontece é o funcionamento do mecanismo do artigo 18º da Lei das Caixas Económicas (Decreto-Lei nº 137/79, de 18.05). Pode adquirir os imóveis para recuperar créditos e tem que os vender no prazo de 3 anos. No ínterim pode locá-los, mas tem que os alienar, certamente tentando obter mais-valias se possível.
48. A CE... é anexa a uma instituição de previdência social, (tem os fins desta) sendo uma das características destas instituições as aplicações dos seus fundos em imóveis para obtenção de rendimentos.

49. A actividade/objecto da CE... é um meio para obter proveitos para entregar ao M... – AM, que é o detentor a 100% do seu capital institucional (não capital social/ acções ou quotas).
50. Ou seja, ter-se-á que aplicar, em última instância, a doutrina do parecer acima reproduzido parcialmente, por interpretação extensiva da lei.
51. Quer seja por aplicação do regime da Lei 151/99, de 14.12, quer seja pela aplicação extensiva do regime de IMT ao IMI quanto à prova suficiente do destino dos bens (mera declaração exarada ou não em acta) o certo é que, no caso dos autos deveria a AT conferir o benefício fiscal. Trata-se do princípio da legalidade ínsito na CRP.
52. Foram violadas as disposições legais a que se aduziu nas conclusões supra se interpretadas de forma diferente à que é proposta nestas alegações, para além da violação da CRP conforme também acima se explanou.

Termos em que, devem julgar-se procedentes as nulidades do aresto e julgar-se alterada a resposta à factualidade acima indicada, considerando-se adicionada a decisão sobre a matéria de facto, anulando-se o aresto recorrido e julgando-se a acção procedente nos termos constantes do pedido inserto na petição inicial, assim se fazendo a costumeira,
Justiça!»

O Recorrido apresentou contra-alegações que termina com as seguintes «Conclusões:

a) A questão em apreço nos autos, consiste em saber se as fracções autónomas inscritas na matriz predial urbana sob os artigos 1…º, fracção “A”, da freguesia de Campanhã, concelho do Porto, 1…º, fracção D, da freguesia de Campanhã e 8…º, da freguesia do Bonfim, concelho do Porto, visam ou não a realização directa e imediata dos fins do ora recorrente.
b) Relativamente à questão da legislação aplicável, designadamente se à isenção requerida de IMI se aplica a Lei nº 151/99, de 14/09 ou o normativo constante na alínea e), nº 1 do art.44° do EBF, é nosso entendimento que a norma legal do EBF é que deve ser aplicável. Até porque foi com base nesta norma que a isenção foi requerida e foi igualmente com fundamento nela que foi indeferido.
c) Ou seja, para a resolução desta questão identificaram-se dois problemas jurídicos fundamentais: o problema se saber qual a lei aplicável [ou seja, o de saber se é aplicável a alínea d) do artigo 1.º da Lei n.º 151/99, de 14 de Setembro, ou a alínea e) do n.º 1 do artigo 44.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais – redacção em vigor] e o problema de saber se, a ser aplicável a alínea e) do n.º 1 do artigo 44.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais, o que se deve entender por «prédios destinados directamente à realização dos seus fins» (sublinhado nosso) para efeitos deste normativo.
d) Na acção administrativa especial, a ora Recorrente insistiu que a isenção é devida porque se lhe aplica a alínea d) do artigo 1.º da Lei n.º 151/99, de 14 de Setembro.
e) E, como decorre dos autos, a Recorrente não pediu o reconhecimento oficioso de nenhuma isenção de contribuição autárquica sobre o prédio em causa.
f) Pelo que o benefício em causa só poderia ser concedido ao abrigo do disposto do artigo 44º/1, al.e) do EBF.
g) Com efeito, a questão cinge-se fundamentalmente à interpretação e aplicação da alínea e), do nº 1, do art. 44º do EBF que prevê a isenção de IMI de que sejam titulares as pessoas colectivas de utilidade pública administrativa e as de mera utilidade pública, quanto aos prédios ou parte de prédios destinados directamente à realização dos seus fins.
h) A isenção do art. 44º, nº1, al. e) do EBF abrange, como se já referiu, as pessoas colectivas de utilidade pública administrativa e mera utilidade pública, relativamente aos prédios destinados à realização dos seus fins.
i) Tal quer dizer que não é a totalidade dos prédios detidos pelas pessoas colectivas de mera utilidade pública que está abrangida pela isenção, mas apenas os que estiverem directamente afectos á realização dos seus fins.
j) Tal isenção tem natureza selectiva, já que depende do requisito da afectação dos prédios aos fins específicos da pessoa colectiva.
k) O legislador fala em prédios destinados directamente aos fins dessas pessoas colectivas.
l) Tal isenção tem natureza selectiva, já que depende do requisito da afectação dos prédios aos fins específicos da pessoa colectiva. A Caixa Económica... (CE...) não é uma IPSS com personalidade jurídico-tributária própria, constituindo antes um centro autónomo de direitos e deveres em matéria tributária.
m) De facto o art. 10º, nº1, al. b) do IRC anteriormente à redacção dada pelo art. 113º da Lei 64-B/2011, de 30 de Dezembro, isentava de IRC as IPSS e entidades anexas bem como as pessoas colectivas legalmente equiparadas às IPSS. Ao dizer que a isenção de IRC abrangia não apenas as IPSS como as entidades anexas, a anterior redacção do CIRC, no art. 10º, nº 1 reconhecia expressamente que as entidades anexas às IPSS tinham independência jurídico-tributária das IPSS.
n) De facto, a CE... não é uma IPSS mas uma instituição financeira. Actua em concorrência no mercado financeiro com as demais instituições financeiras que estão sujeitas e não isentas de IMI.
o) O referido art. 15º da Lei 64-B/2011, de 30 de Dezembro, revogou a isenção de IRC anteriormente aplicável às entidades anexas às IPSS. Os rendimentos provenientes da sua actividade financeira passaram a ser sujeitos às normas gerais de tributação, o que resulta logicamente da sua natureza empresarial.
p) Manteria, no entanto, a CE... a condição de pessoa colectiva de mera utilidade pública que lhe tinha sido reconhecida por despacho do Primeiro-Ministro publicado no Diário da República, II Serie, nº 243, de 22 de Outubro de 1991.
q) A Caixa Económica está sujeita ao Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras (RGICSF), aprovado pelo art. 1º do Decreto - Lei nº 298/92, de 31 de Dezembro, sem prejuízo das especificadas dos arts. 3º, alínea b), 4º, nº 2, 19º, alínea b), 29º e 41º de que resulta não estarem obrigadas a adoptar a forma de sociedade anónima e não disporem do chamado passaporte comunitário, do que resulta não poderem exercer a sua actividade noutros países da União Europeia, através de sucursais ou em regime de livre prestação de serviços.
r) A qualidade de utilidade pública da CE... não lhe advém obviamente do exercício de uma actividade financeira. De outro modo, todas as restantes instituições de crédito deveriam partilhar, por um princípio de igualdade, de idêntico reconhecimento de utilidade pública. E, tal como reconhece o Acórdão a lei pretende isentar de IMI os prédios que a pessoa colectiva de utilidade publica utilize diretamente na realização dos seus fins, isto é, dos prédios que ela tem necessidade de utilizar para a realização dos seus fins estatutários.
s) Resulta tal utilidade pública do art. 4º dos Estatutos, de acordo com o qual devem colocar à disposição do M..., uma instituição de solidariedade social (IPSS), os resultados dos seus exercícios, feitas as deduções estatutariamente previstas, para que este os aplique na realização dos seus fins. Assim, a prossecução pela CE... de fins de utilidade pública é meramente indirecta. Tais fins são directamente prosseguidos pelo M..., com os fundos entregues pela CE....
t) Inexiste, assim, qualquer conexão directa entre tais bens imóveis e o fundamento da declaração de utilidade pública da CE....
u) Nos termos do art. 3º, nº 1, dos seus Estatutos, o M..., para auxiliar a realização dos seus fins: dispõe de uma caixa económica anexa, com personalidade jurídica e estatutos próprios, denominada Caixa Económica... pode criar estabelecimentos dele dependentes; pode constituir rendas vitalícias e pode deter participações financeiras.
v) Segundo o nº 2, o M... para a prossecução dos seus fins pode, designadamente: fazer aplicações mobiliárias e imobiliárias; contrair empréstimos e desenvolver outras iniciativas e realizar todos os actos e contratos legalmente permitidos. Existem, assim, no património do M... e CE... bens imóveis que apenas indirectamente estão afectos a fins de utilidade pública.
w) Outra solução esvazia o conteúdo restritivo da limitação da isenção de IMI aos bens imóveis directamente - e não indirectamente - aplicados nos fins de utilidade pública prosseguidos pela pessoa colectiva.
x) Todos os bens imóveis da propriedade da pessoa colectiva de utilidade pública estariam abrangidos pela isenção, a não ser, na hipótese absurda de a pessoa colectiva prosseguir, com violação do seu estatuto e do princípio da especialidade, fins privados.
y) A recorrente, tal como na p.i., faz um paralelismo entre o IMI e o IMT relativamente à isenção das pessoas colectivas de utilidade pública.
z) A razão fundamental da rejeição da transposição directa de entendimentos administrativos sobre normas do IMT para normas do IMI é a de que estamos ali perante um imposto de obrigação única e aqui perante um imposto periódico, logo isenções distintas. Diferença que tem reflexos nas diferentes soluções técnicas adoptadas quanto ao modo como operam cada um destes benefícios e nos meios de controlo sobre os regimes de isenção respectivos e que pode justificar, em abstracto, interpretações diversas de dispositivos com redacções equivalentes, quando esteja em causa um e outro imposto. Além do mais, nem existe orientação genérica da AT neste sentido, pelo que nem se põe em causa a violação do artigo 68.º-A da LGT.
aa) O IMI e IMT são impostos distintos quanto à natureza da sua obrigação, e enquanto no IMI a obrigação é duradoura, no IMT é instantânea. Ora, por forma a provar antes do acto translativo da propriedade o fim a que se destina o bem, a lei optou por uma prova irrefutável e expedita para o acto de aquisição que se pretende isentar.
bb) Por outro lado, o benefício fiscal em apreço não é automático, mas de reconhecimento oficioso, o que implica a verificação dos pressupostos de que depende a sua concessão pela entidade competente para o seu reconhecimento, onde se insere, o efectivo destino do imóvel a comprovar pela entidade beneficiária.
cc) As isenções são reconhecidas oficiosamente desde que verificados determinados condicionalismos, contidos no nº 4, do art.44° do EBF, tais como: inscrição do prédio na matriz em nome das entidades beneficiadas, que os prédios se destinem directamente à realização dos seus fins e que seja feita a prova da sua natureza jurídica, razão pela qual reveste natureza declarativa do direito ao benefício fiscal.
dd) Não tendo a recorrente diligenciado no sentido de comprovar qual o efectivo destino do bem, não poderá beneficiar da isenção a que alude o art.44°, nº 1, alínea e) do EBF.
ee) O fundamento que conduziu ao indeferimento da pretensão da ora recorrente residiu no facto de invocar como fundamento do seu direito, não a afectação do imóvel aos seus fins de utilidade pública, mas sim que serão as rendas ou as eventuais mais-valias obtidas pela sua alienação que constituirão os rendimentos da pessoa colectiva. Assim, uma vez que não ficou provado que os prédios em causa estão destinados directamente à realização dos fins da Recorrente, não é aplicável a isenção de IMI do artigo 44º/1 al.e) do CIMI.
Nestes termos e nos mais de Direito, deve ser indeferido o presente recurso jurisdicional, mantendo-se, por consequência, o despacho de indeferimento do pedido de isenção de IMI, por ser legal e conforme a al. e) do nº 1 do art. 44º do EBF».

Foi dada vista dos autos à Exma. Senhora Procuradora-Geral Adjunta, nos termos do disposto no art.º146.º, n.º1 do CPTA, que não se pronunciou sobre o mérito do recurso pelas razões aduzidas a fls.285.

Colhidos os vistos legais e nada mais obstando, cumpre decidir.

2 – DO OBJECTO DO RECURSO

Delimitado pelas conclusões das alegações apresentadas pela Recorrente, o objecto do recurso reconduz-se, no essencial, em indagar se o julgado incorreu em erro de julgamento ao concluir que a isenção de IMI em causa não pode aproveitar à Autora, ora Recorrente.

3 – DA MATÉRIA DE FACTO

Em sede factual, deixou-se consignado na sentença recorrida:

«Factos provados com relevância para a decisão da causa:
1. A aqui Autora CAIXA ECONOMICA M... dirigiu ao Chefe do Serviço de Finanças do Porto, em finais de 2012, pedidos de isenção de IMI referente aos artigos urbanos 1…D (Campanhã); 1… (Campanhã); e 8… (Bonfim), a contar do ano da sua aquisição (fls. 14 e ss.);
2. Naqueles requerimentos a Autora refere que os imóveis se destinam a directa e imediata realização dos fins da requerente por as mais-valias eventualmente realizáveis pela sua alienação serem transferidas como resultado da Caixa, anualmente, para o M..., para que este as aplique em pensões, subvenções e subsídios aos seus beneficiários e pensionistas e ainda por os rendimentos derivados de eventuais situações temporárias de arrendamento serem entregues, em regime de exclusividade, ao M..., para pagamento de pensões, subvenções e subsídios aos beneficiários e pensionistas, após a constituição das reservas legais e estatutárias;
3. A Autora foi notificada para se pronunciar em sede de audiência prévia relativamente ao projecto de decisão de indeferimento, ali sendo mencionado como fundamento o seguinte: “A alínea e) do n.º 1 do art. 44.º, do EBF prevê a isenção de IMI para os prédios destinados directamente à realização dos fins da p. colet. de útil publ. No caso, não foi efectuada prova concreta da afectação do imóvel aos ditos fins (n.º 4 do art. 44 do EBF).” (fls. 24 e ss.16);
4. A Autora respondeu nos termos de fls. 27 e ss., cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido, alegando em síntese que o imóvel se destina à imediata e directa realização dos fins da CE...;
5. Os requerimentos de isenção de IMI foram indeferidos por despacho de 25.01.2013 (fls. 39 e ss.);
6. Do referido despacho consta o teor seguinte:
“Fundamentos:
No exercício do direito de audição, a requerente não apresentou elementos concretos que provem que o imóvel para o qual solicita a isenção esta afecto directamente à realização dos fins estatutários da p colet de útil publ. ”
7. A Autora interpôs recurso hierárquico da referida decisão (fls. 42 e ss.);
8. O RH foi alvo de decisão de indeferimento, proferida em 14.06.2013, a fls. 56 a 64, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais;
9. Deste despacho a Autora intentou a presente acção;
10. A CAIXA ECONOMICA M... (CE...) é a actual designação da Caixa Económica de L…, anexa ao M..., conforme DRIII Série, n.º 205, de 06.09.1991;
11. O M... e a sua Caixa constituem uma unidade com funções de realizar as finalidades do M..., tendo o Conselho da Administração Fiscal, por deliberação de 2804.1980 considerado extensivas à Caixa Económica as isenções fiscais estabelecidas a favor do M..., aplicando-se tal entendimento ainda a todas as Caixas Económicas anexas a Associações de Socorros Mútuos;
12. Os seus fins são os próprios fins do M... – ASSOCIAÇÃO MUTUALISTA, a saber:
Conceder e garantir através de modalidades individuais e colectivas benefícios de segurança social e de saúde destinados a prevenir ou a reparar as consequenciais da verificação de factos contingentes, relativos à vida e saúde dos associados e seus familiares e dos beneficiários por aqueles designados;
Prosseguir outras formas de protecção social e de promoção da melhoria da qualidade de vida, através da organização e gestão de equipamentos, serviços e obras sociais e outras actividades que visem, principalmente, o desenvolvimento cultural, moral, intelectual e físico dos associados e seus familiares e dos beneficiários, por aqueles designados, em especial das crianças, jovens, idosos e deficientes;
Contribuir para a resolução dos problemas habitacionais dos associados;
Gerir regimes profissionais complementares das prestações garantidas pela segurança social e outras formas colectivas de protecção social (tudo conforme fls. 29 e ss.).
Factos não provados:
Inexistem com interesse para a decisão da causa.
*
MOTIVAÇÃO
A convicção do tribunal baseou-se no correlacionamento e análise crítica de toda a prova produzida nestes autos, com especial destaque para os documentos juntos aos autos, não impugnados, conforme a remissão feita nos respectivos factos dados como provados.
Os restantes factos alegados não foram julgados provados ou não provados, por constituírem considerações pessoais ou conclusões de facto ou de direito e por não terem relevância para a decisão da causa.
Além do mais, verifica-se que as partes estão de acordo quanto aos factos divergindo apenas da sua interpretação jurídica».

4 – APRECIAÇÃO JURÍDICA

Assente a factualidade apurada cumpre, então, entrar na análise da realidade em equação nos autos, sendo que a este Tribunal está cometida a tarefa de apreciar a bondade da decisão recorrida que julgou improcedente o pedido de anulação da decisão que confirmou hierarquicamente o indeferimento do pedido de isenção de imposto municipal sobre o imóvel descrito nos autos, nomeadamente em função dos vícios de raciocínio apontados pela Recorrente.

Avançando, e com referência às questões essenciais apontadas em sede de recurso, independentemente do tipo de abordagem vertido no acórdão recorrido, deparamos com matéria objecto de várias decisões proferidas por este Tribunal que, em função da sua semelhança em relação ao caso sub judice e por economia de meios, visando a interpretação e aplicação uniforme do direito (cfr. artigo 8.º n.º 3 do Código Civil), cabe ter presente o exposto no Ac. deste Tribunal de 09-06-2015, Proc. nº 699/13.8BECBR, www.dgsi.pt, que se debruçou sobre a realidade essencial em discussão nestes autos, apreciando a proposta de análise vertida nas alegações da Recorrente, e onde se ponderou de forma esclarecida e mais abrangente que:
“…
Para a resolução desta questão identificamos dois problemas jurídicos fundamentais: o problema se saber qual a lei aplicável [ou seja, o de saber se é aplicável a alínea d) do artigo 1.º da Lei n.º 151/99, de 14 de setembro, ou a alínea e) do n.º 1 do artigo 44.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais – redação em vigor - ou ambas] e o problema de saber se, a ser aplicável (apenas) a alínea e) do n.º 1 do artigo 44.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais, o que se deve entender por «prédios destinados diretamente à realização dos seus fins» (sublinhado nosso) para efeitos deste normativo.
Comecemos pelo primeiro problema.
Dos elementos dos autos resulta que a isenção foi requerida pelo ora Recorrente a coberto das duas disposições. E foi indeferida por não estarem reunidos os pressupostos legais exigidos pela alínea e) do n.º 1 do artigo 44.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais (ou seja, a coberto apenas desta última disposição). Na ação administrativa especial, o ora Recorrente insistiu que a isenção e devida porque se lhe aplica a alínea d) do artigo 1.º da Lei n.º 151/99, de 14 de setembro e - ainda que assim não fosse entendido - da aplicação da alínea e) do n.º 1 do artigo 44.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais também decorreria que o benefício lhe deveria ser concedido. …
Observa-se, a título introdutório, que os pressupostos objetivos da concessão do benefício contido em cada uma dessas normas não são totalmente sobreponíveis: enquanto a alínea d) do artigo 1.º da Lei n.º 151/99, de 14 de setembro tem em vista prédios urbanos e pressupõe que sejam destinados à realização dos seus fins estatutários, o artigo 44.º, n.º 1, alínea f), do Estatuto dos Benefícios Fiscais (na redação do Decreto-Lei n.º 108/2008, de 26 de Junho, que sucedeu ao artigo 40.º, n.º 1, alínea f), na redação anterior, sem alteração do seu teor) tem em vista prédios ou parte de prédios e pressupõe que sejam destinados diretamente à realização dos seus fins.
É verdade, no entanto, que não existe - desde a reforma da tributação o património - nenhuma antinomia entre as duas normas, ainda por razões bem diversas das que sustenta o Mm.º Juiz a quo.
É que a disposição correspondente da Lei n.º 151/99, de 14 de setembro não consagra nenhuma isenção de imposto municipal sobre imóveis: consagra - isso sim - uma isenção de contribuição autárquica. E o artigo 44.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais não consagra (nem consagrava na redação vigente à data da aquisição do imóvel) nenhuma isenção de contribuição autárquica: consagra – isso sim – uma isenção de imposto municipal sobre imóveis.
Pelo que as disposições em causa têm âmbitos de aplicação distintos.
E é incontroverso que o Recorrente não pediu o reconhecimento oficioso de nenhuma isenção e contribuição autárquica sobre o prédio em causa. Aliás, o Código de Contribuição Autárquica já tinha sido revogado à data em que o Recorrente adquiriu o prédio em causa.
Pelo que o benefício em causa só poderia ser concedido ao abrigo do artigo 44.º, n.º 1, alínea f), do Estatuto dos Benefícios Fiscais.
E não se diga que o imposto municipal sobre imóveis sucedeu à contribuição autárquica e que, por conseguinte, os benefícios consagrados na lei para aquele se transferem para este.
Porque a extinção do tributo importa a supressão da isenção respetiva do sistema tributário. Sem prejuízo, naturalmente, do direito à isenção adquirido na vigência do tributo extinto (como decorre do artigo 3.º, n.º 2, do Estatuto dos Benefícios Fiscais - que não vem ao caso, porque não está em causa nenhum direito adquirido na vigência da contribuição autárquica a coberto do regime transitório consagrado no artigo 11.º, nºs 3 e 4, e no artigo 31.º, nº.s 5 e 6, ambos do Decreto-Lei n.º 287/2003, de 12 de novembro).
É o que decorre do facto de os benefícios fiscais serem medidas de desagravamento fiscal que incidem sobre normas de incidência fiscal: se a norma de incidência desaparece do ordenamento jurídico, a norma de desagravamento desaparece concomitantemente. Não se transfere para outra norma de incidência. A menos que a lei o determine especialmente, designadamente no seu regime transitório.
E a lei confirma esta interpretação, quando refere os benefícios fiscais são medidas fiscais de caráter excecional, relacionadas com a própria tributação que impedem – artigo 2.º, n.º 1, do Estatuto dos Benefícios Fiscais.
No sentido de que a supressão do tributo a que o benefício fiscal respeita extingue o próprio benefício fiscal se pronunciou Nuno Sá Gomes, na sua obra «Teoria Geral dos Benefícios Fiscais» [in Cadernos de Ciência e Técnica Fiscal (165), 1991, pag.s 222/223 e 281].
Do exposto decorre que a alínea d) do n.º artigo 1.º da Lei n.º 151/99 de 14 de setembro não se aplica ao caso e que nunca poderia decorrer da inobservância do seu teor alguma violação de lei, quanto ao ato impugnado.
4.3 Estando assente que ao caso se aplica (apenas) o artigo 44.º, n.º 1, alínea e), do Estatuto dos Benefícios Fiscais, passemos ao segundo problema, que é o de saber como esta norma deve ser interpretada.
Podemos adiantar desde já que a isenção ali consagrada deve ser qualificada como um benefício fiscal misto (subjetivo e objetivo): é um benefício subjetivo porque atende à natureza ou qualidade do sujeito e é um benefício objetivo porque atende também ao elemento objetivo do facto desagravado.
Concretizando: a isenção da alínea e) do n.º 1 do artigo 44.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais tem natureza subjetiva porque só dela beneficiam as pessoas coletivas de utilidade pública administrativa e as de mera utilidade pública; e tem natureza objetiva porque estas entidades só dela beneficiam quanto aos prédios ou parte dos prédios destinados diretamente à realização dos seus fins.
Saliente-se, também, que nunca esteve em causa no procedimento a verificação do pressuposto subjetivo do benefício fiscal a que os autos se reportam. Aliás, na informação que serviu de base à decisão do recurso hierárquico consignou-se expressamente que «relativamente à qualificação jurídica da Recorrente, constata-se que a Caixa Económica..., anexa ao M... – Associação Mutualista, Instituição Particular de Solidariedade Social, é uma pessoal colectiva de utilidade pública, conforme despacho de 08/10/1991, publicado no Diário da República, II Série, n.º 243 de 22/10/1991».
Pelo que o litígio dos autos se centra exclusivamente no seu pressuposto objetivo e muito em particular na questão de saber se o Recorrente destinou o imóvel em causa à direta realização dos seus fins, nos termos da parte final da alínea e) do n.º 1 do artigo 44.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais.
Ora, a interpretação que fazemos deste segmento do dispositivo é a de que só se verifica o pressuposto objetivo do benefício se os próprios prédios forem destinados à realização dos fins prosseguidos pelas pessoas coletivas de utilidade pública. E já não assim quando as pessoas coletivas de utilidade pública destinem à realização desses fins os rendimentos obtidos com a alienação ou oneração desses prédios.
Porque é para aí que apontam todos os fatores da hermenêutica jurídica, quando aplicados à norma em análise.
Como é sabido, a interpretação parte do teor verbal da lei, tendo em conta as regras da gramática e o uso corrente da linguagem.
Ora, do teor da lei resulta que tem que existir uma relação direta entre o destino dos prédios e os fins prosseguidos pela pessoa coletiva. Sendo que essa relação só é direta quando resulta da própria afetação ou utilização do prédio. Já quando são os rendimentos do prédio que estão afetos a utilidade pública da pessoa coletiva, a relação entre o prédio e os fins de utilidade pública não é direta, mas indireta. O prédio em si mesmo pode estar afeto a uma utilização particular, mas os rendimentos resultantes da sua exploração são aplicados nos fins públicos da pessoa coletiva.
Além do teor verbal da lei, deve atender-se à coerência interna do preceito, o lugar em que se encontra e as suas relações com outros preceitos (interpretação logico-sistemática).
Ora, a interpretação que fazemos do preceito é também a única que se sustenta do ponto de vista da sua coerência interna. Porque a alternativa inutilizava totalmente a segunda parte do mesmo preceito: todos os prédios estariam destinados à realização dos fins de utilidade pública da pessoa coletiva, na medida em que não estivesse afastada a possibilidade de, em algum momento, ser afetado a essas finalidades o produto da sua alienação ou oneração. Deixaríamos de ter um benefício misto e passaríamos a ter um benefício meramente subjetivo.
A interpretação que fazemos é também aquela que se enquadra melhor no capítulo dos benefícios fiscais relativos a bens imóveis (em que a norma interpretanda se insere efetivamente). Se o legislador tivesse pretendido relevar a afetação à utilidade pública dos rendimentos dos imóveis, o mais adequado seria isentar de imposto esses rendimentos em si mesmos e não a propriedade ou posse dos imóveis.
E a interpretação que fazemos é também a que melhor se enquadra se atendermos ao conjunto de isenções consagradas naquele artigo 44.º. Sobretudo porque, quando o legislador enquadra ou concretiza os fins prosseguidos por essas entidades, o faz reportando-se sempre à utilização dos prédios em si mesma. Assim, as associações religiosas também estão isentas quanto aos templos ou edifícios exclusivamente destinados ao culto ou outros fins económicos (e não também quanto aos edifícios rentabilizados para financiar atividades religiosas). E as coletividades de cultura e recreio apenas estão isentas quanto aos prédios utilizados como sedes dessas entidades.
Finalmente, a interpretação que fazemos é também a que sugere a ratio do preceito (interpretação teleológica). Entendeu o legislador que não deveria tributar a capacidade contributiva das pessoas coletivas de utilidade pública revelada pela propriedade ou posse de imóveis se o seu proprietário ou possuidor abre mão do seu valor de utilização e os aloca a fins de utilidade pública. Porque o proprietário que afeta os seus bens a benefício público não revela riqueza disponível que deva contribuir para o bem comum, mas riqueza já afetada ao bem comum. Ora, a questão não se coloca do mesmo modo se o imóvel é rentabilizado ou se encontra disponível para gerar rendimento nos mesmos termos em que o faz qualquer contribuinte. Porque o seu proprietário não abre mão dessa riqueza. E se vier a abrir mão riqueza gerada pela sua exploração, a isenção deve incidir sobre o produto dessa exploração (e não sobre o imóvel em si mesmo).
A esta luz, não tem qualquer relevo a discussão sobre os fins estatutários da Caixa Económica..., da sua relação com a associação mutualista M... e do destino que é dado ao seu resultado líquido. Porque não está em causa aqui a aplicação dos seus rendimentos, mas a afetação do imóvel em si mesmo.
4.4 Estando assente que o dispositivo em causa deve ser interpretado no sentido de que a isenção de imposto municipal sobre imóveis só abrange o imposto que incida sobre os prédios ou a parte dos prédios que, em si mesmos, sejam destinados aos fins de utilidade pública prosseguidos pela pessoa coletiva, importa agora acrescentar que a isenção em causa é reconhecida oficiosamente desde que, além do mais, se verifique que os prédios se destinem diretamente à realização dos seus fins, sem prejuízo do dever dos seus titulares de revelarem à administração tributária dos pressupostos da sua concessão – artigos 44.º, n.º 4, do Estatuto dos Benefícios Fiscais e 14.º, n.º 2, da Lei Geral Tributária.
Ora, tendo em conta que do título de aquisição não consta que o prédio seja destinado a fins de utilidade pública da Recorrente (aliás, consta que o destino do prédio é a «habitação»), cabia a esta revelar e justificar o destino que deu do imóvel.
A este respeito, importa referir que o Recorrente também não requereu a isenção com base em deliberação de onde constasse o destino que lhe foi atribuído. Em vez disso, veio declarar o seguinte (cfr. requerimento para que remete a alínea “D” dos factos provados na sentença recorrida):
«4. O imóvel identificado destina-se à direta e imediata realização dos fins da requerente, uma vez que:
- As mais-valias eventualmente realizáveis pela sua alienação – (obrigatória nos termos do n.º 1 do artigo 18º do Decreto-Lei n.º 136/79, de 18.05) – são transferidas, como resultado da Caixa, anualmente, para o M..., para que este as aplique em pensões, subvenções e subsídios aos seus beneficiários e pensionistas.
- Igualmente os rendimentos derivados de eventuais situações temporárias de arrendamento são entregues, em regime de exclusividade, ao Município, para pagamento de pensões, subvenções e subsídios aos beneficiários e pensionistas, após a constituição das reservas legais e estatutárias».
À luz de tal justificação e da interpretação que fazemos da lei aplicável, é notório que o Recorrente não tem direito à isenção. Porque invoca como fundamento do seu direito, não a afetação do imóvel a fins de utilidade pública, mas a afetação a esses fins dos rendimentos eventuais que consiga extrair da afetação desse imóvel a outros fins.
4.5 Estando assente que o imóvel não está isento de imposto municipal sobre imóveis, uma última questão se coloca: a de saber se, não obstante, a administração tributária estava vinculada a reconhecer esse direito por ter, anteriormente, uniformizado o seu próprio entendimento nesse sentido.
Com efeito, o Recorrente invoca a seu favor o entendimento firmado num parecer da Direção de Serviços Jurídicos e do Contencioso da Direção-Geral dos Impostos, de 2003/05/14. E que, no seu entendimento, constitui uma orientação uniforme, quer por ser seguido desde 1976, quer por ter sido sancionado por despacho do Senhor Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais de 2003/06/24.
Na verdade, e nos termos do disposto no artigo 68.º-A da Lei Geral Tributária, a administração tributária está vinculada às orientações genéricas constantes de circulares, regulamentos ou instrumentos de idêntica natureza, independentemente da sua forma de comunicação, desde que visem a uniformização da interpretação e da aplicação das normas tributárias.
Deixamos consignado desde já que constitui, para nós, instrumento de idêntica natureza para efeitos daquele normativo, os despachos interpretativos ou as instruções que se destinem a esclarecer ou uniformizar o entendimento da lei e o procedimento dos serviços, isto é, os que não se dirigem à resolução de uma hipótese concreta mas à aplicação a uma pluralidade de casos.
Ora, os elementos disponibilizados nos autos são insuficientes para o concluir. O despacho em causa não foi inserido e não é possível saber se o Senhor Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais determinou que o mesmo fosse aplicado a outras situações (qualquer que fosse o seu concreto teor). O mesmo se dizendo do parecer sobre que incidiu e de que só foi fornecida a transcrição de um trecho truncado.
Mas sabemos que ele não foi proferido a propósito da norma aqui em causa e - ao contrário do que pretende o Recorrente - também não o poderia ter sido a propósito do artigo 6.º do Código do Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis, que à data ainda não vigorava. Quando muito, teve-se em vista disposição correspondente do Código do Imposto Municipal de Sisa (o seu artigo 11.º, § 16.º). E não decorre do dispositivo em causa que as orientações genéricas possam ser invocadas contra a administração tributária a propósito de outro dispositivo. Aliás, as orientações genéricas visam a uniformização da interpretação e aplicação de normas concretas, e não de expressões que sejam utilizadas em diferentes normas.
Mas a razão fundamental que nos leva a rejeitar a transposição direta de entendimentos administrativos sobre normas do IMT para normas do IMI é a de que estamos ali perante um imposto de obrigação única e aqui perante um imposto periódico. Diferença que tem reflexos nas diferentes soluções técnicas adotadas quanto ao modo como operam cada um destes benefícios e nos meios de controlo sobre os regimes de isenção respetivos e que pode justificar, em abstrato, interpretações diversas de dispositivos com redações equivalentes, quando esteja em causa um e outro imposto.
Razão por que entendemos que o teor do despacho invocado, ainda que tivesse por objeto normas de IMT, nunca podia valer como orientação genérica quanto a normas de IMI. O que nos dispensa também de aferir as consequências da inobservância de uma instrução administrativa numa ação judicial onde seja discutida a legalidade de uma decisão que a contrarie».

Perante a bondade do que fica exposto, sendo que a matéria em apreciação nestes autos é essencialmente idêntica, e não se vislumbrando na alegação das partes matéria capaz de determinar uma outra leitura da realidade em apreço, tendo em conta que do título de aquisição não consta que o prédio seja destinado a fins de utilidade pública da Recorrente (no caso em apreço tratam-se prédios urbanos sitos em Campanhã – Porto, inscritos na matriz predial urbana sob os artigos 1….º-D (anterior 1….º-D) – Campanhã, Porto; 1….º-A – Campanhã, Porto e 8…º - Bonfim, Porto), cabia a esta revelar e justificar o destino que deu ao imóvel, sendo de sublinhar que a Recorrente também não requereu a isenção com base em deliberação de onde constasse o destino que lhe foi atribuído, pois que, considerando o teor do pedido de isenção, verificamos que são as mais-valias eventualmente realizáveis pela alienação do imóvel que seriam transferidas, como resultado da Caixa, anualmente, para o M..., para que este as aplique em pensões, subvenções e subsídios aos seus beneficiários e pensionistas. Igualmente, os rendimentos derivados de eventuais situações temporárias de arrendamento seriam entregues, em regime de exclusividade, ao M..., para pagamento de pensões, subvenções e subsídios aos beneficiários e pensionistas, após a constituição das reservas legais e estatutárias - cf. doc. de fls.22/23 junto com a petição inicial e pontos 1 e 2 da factualidade assente.

Tal significa que o mote para o pedido de isenção são os rendimentos a auferir do imóvel e não a afectação do imóvel em si mesmo aos fins prosseguidos pela Recorrente, enquanto pessoa colectiva de utilidade pública, de modo que, à luz de tal justificação e da interpretação que fazemos da lei aplicável, é notório que a Recorrida não tem direito à isenção, na medida em que invoca como fundamento do seu direito, não a afectação do imóvel a fins de utilidade pública, mas a afectação a esses fins dos rendimentos eventuais que consiga extrair da afectação desse imóvel a outros fins, pelo que, atento o disposto no artigo 44.º, n.º 1, alínea e) do Estatuto dos Benefícios Fiscais, designadamente os pressupostos para reconhecimento do benefício fiscal - direito de isenção de IMI, o despacho impugnado nesta acção administrativa especial não merece censura.

A partir daqui, cabe apenas analisar se atentará contra a coerência do sistema fiscal que uma norma isentiva em sede de IMT aparentemente mais restritiva em termos de literalidade, seja aplicada com uma amplitude total (prédios de uso em instalações e prédios de rendimento) e uma norma literalmente menos restritiva, em sede de IMI, seja aplicada de forma muitíssimo mais restritiva em termos de amplitude e ainda se a aplicação do regime da alínea b) do nº 2 do artigo 10º do CIMT ao caso em discussão (procedimento de controlo do benefício em sede de IMI de PCUP e IPSS) não corporiza integração analógica da lei, mas apenas a sua aplicação extensiva partindo de um raciocínio por paridade de razão ou até por maioria de razão, uma vez que a norma isentiva em sede de IMI é literalmente menos restritiva.

Nesta matéria, tal como se aponta no Ac. deste Tribunal de 11-02-2016, Proc. nº00996/13.3BEPRT, www.dgsi,pt, “… Em matéria de benefícios fiscais, como em matéria de incidência tributária, não há, por definição, lacunas, pois as situações não previstas como isentas de imposto (como as não sujeitas a imposto) estão, pura e simplesmente, fora do âmbito da norma de isenção (ou de incidência, consoante os casos), mercê do especial vigor que o princípio da legalidade, na sua vertente de tipicidade tributária - artigo 103.º n.º 2 da CRP - assume nestes domínios.
A integração analógica encontra-se, pois, vedada naquelas matérias mercê do princípio constitucional da legalidade, sendo as afirmações concordantes do legislador ordinário nesse sentido – contidas, no domínio tributário, nos artigos 11.º, n.º 4 da Lei Geral Tributária e (actual) 10.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais (EBF), meros corolários daquelas normas constitucionais (reconhecendo, embora, ser esta a doutrina tradicional, CASALTA NABAIS admite, porém, que o legislador – mas não o juiz ou a Administração - não estará, ele próprio, impedido de admitir, dentro de certos limites, a integração de lacunas nas matérias sujeitas à reserva de lei, nos casos em que tal se justifique mercê de uma adequada e equilibrada ponderação dos bens jurídico-constitucionais em presença - cfr. JOSÉ CASALTA NABAIS, Direito Fiscal, 6.ª ed., Coimbra, Almedina, 2010, pp. 214/215).
Não é, pois, constitucionalmente permitido ao juiz integrar uma suposta lacuna existente numa norma tributária de isenção.
As normas que estabelecem isenções de imposto são, obviamente, normas tributárias, com natureza de benefícios fiscais.
Os benefícios fiscais podem visar a promoção de objectivos extra-fiscais em domínios muito diversos, incluindo o fomento empresarial, o incentivo a empresas em dificuldades, auxiliando a respectiva recuperação, ou a prossecução de fins de utilidade pública, como é o caso presente.
Assim, à norma de isenção em sede de IMT invocada pela recorrente encontra-se constitucionalmente vedada a integração pelo intérprete de supostas lacunas, mercê do princípio da legalidade tributária, na sua vertente de tipicidade dos benefícios.
Não se encontra, porém, constitucionalmente vedada a possibilidade de interpretação extensiva – como, aliás, expressamente o admite a parte final do artigo 10.º do EBF -, daí a recorrente ter solicitado uma aplicação extensiva, partindo de um raciocínio por paridade de razão ou até por maioria de razão, uma vez que a norma isentiva em sede de IMI é literalmente menos restritiva.
Não podem restar dúvidas que, na situação colocada pela recorrente, a letra da lei se quedou aquém do seu espírito, e aí haverá que adequar a letra ao respectivo espírito por via da interpretação extensiva (sobre a interpretação extensiva na doutrina tradicional, pressuposta pelo nosso legislador, cfr. BAPTISTA MACHADO, Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, 13.ª reimpressão, Coimbra, Almedina, 2002, pp. 185/186).
Pressuposto para assim operar é, contudo, a demonstração de que o legislador minus dixit quam voluit. É difícil detectar estas situações, na medida em que os benefícios fiscais são medidas fiscais de carácter excepcional, relacionadas com a própria tributação que impedem – artigo 2.º, n.º 1, do Estatuto dos Benefícios Fiscais. Sendo medidas com carácter excepcional, o legislador delimita, com rigor, as situações concretas objecto de benefício e as condições para operar.
Desde logo, existe dificuldade em efectuar o paralelismo e a paridade entre os dois impostos (IMT e IMI), atenta a sua natureza diversa já referida. Isto é, o que ficou dito acerca da instrução administrativa vale para a questão em análise:
A razão fundamental que nos leva a rejeitar a aplicação extensiva de normas do IMT para normas do IMI é a de que estamos ali perante um imposto de obrigação única e aqui perante um imposto periódico. Diferença que tem reflexos nas diferentes soluções técnicas adoptadas quanto ao modo como operam cada um destes benefícios e nos meios de controlo sobre os regimes de isenção respectivos e que pode justificar, em abstracto, interpretações diversas de dispositivos com redacções equivalentes, quando esteja em causa um e outro imposto.
Todos os elementos disponíveis, incluindo os preâmbulos das normas isentivas em apreço, não permitem concluir, com a segurança e certeza exigíveis, que o legislador tenha dito, no caso concreto, menos do que pretendia. Pelo que a abordagem efectuada no processo n.º 699/13.8BECBR, em 11/06/2015, permanece válida e deve manter-se, ajustada aos presentes autos. …”.

Atento o teor do acórdão que se reproduziu, nenhumas outras considerações se nos afigura acrescentar à fundamentação transcrita, as quais se enquadram cabalmente na situação ora em análise.

Por último, importa notar que a questão da inconstitucionalidade que emerge da alegação da Recorrente, por violação do princípio da reserva de lei da AR, pois atribui a um Decreto-Lei uma força que não pode ter em função da matéria (benefícios fiscais), porque não precedido de autorização legislativa em concreto [Inconstitucionalidade orgânica] está prejudicada na medida em que não é com base nessa interpretação que se nega procedência ao recurso.

Mas, ainda que assim não fosse, o diploma de criação do IMI e extinção da contribuição autárquica e SISA, foram precedidas de lei de autorização concreta da Assembleia da República para as matérias ali tratadas, a Lei n.º 26/2003 de 30/7.

Na verdade, o DL n.º 287/2003, no uso da autorização legislativa concedida pela aquela Lei, aprova o Código do Imposto Municipal sobre Imóveis e o Código do Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis, altera o Código do Imposto do Selo, altera o Estatuto dos Benefícios Fiscais (…) e revoga o Código da Contribuição Predial e do Imposto sobre a Indústria Agrícola, o Código da Contribuição Autárquica e o Código do Imposto Municipal da Sisa e do Imposto sobre as Sucessões e Doações”.

Daí que na improcedência in toto das conclusões da alegação da recorrente, se impõe, nos termos acima expostos, confirmar a decisão aqui sindicada, com todas as legais consequências.

Improcede, por conseguinte, o presente recurso jurisdicional.

5 - DECISÃO
Por todo o exposto, acordam em conferência os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte em negar provimento ao recurso.
Custas pela Recorrente, nesta instância, nos termos da tabela I-B - cf. artigos 6.º, n.º 2, 7.º, n.º 2 e 12.º, n.º 2 do Regulamento das Custas Processuais.
Porto, 13 de Outubro de 2016
Ass. Vital Lopes
Ass. Cristina da Nova
Ass. Pedro Vergueiro