Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00247/19.6BEVIS-A
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:04/30/2020
Tribunal:TAF de Viseu
Relator:Frederico Macedo Branco
Descritores:PROCESSO CAUTELAR; FUNDO DE APOIO À INOVAÇÃO; ELEGIBILIDADE DE CANDIDATURA; SUSPENSÃO DE UM ATO NEGATIVO
Sumário:1 – Nas Providências Cautelares há que averiguar agora, desde logo, a existência do periculum in mora, a constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no processo principal.
Na nova versão do CPTA, continua a recair sobre o requerente o ónus de fazer prova sumária dos requisitos do periculum in mora, enquanto receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para o requerente; e, se for caso disso, do fumus boni iuris, enquanto sumária avaliação da probabilidade de existência do direito invocado.
Ao referido acresce ainda a eventual necessidade de ser feita uma ponderação de todos os interesses em presença (públicos e/ou privados).

2 – Não tendo o Requerente logrado demonstrar que a não suspensão do ato cuja suspensão veio requerida, inviabilizaria, no caso, o seu projeto de aproveitamento de energia geotérmica, pois não alega, e muito menos prova, quaisquer factos concretos que permitissem tirar tal conclusão, não estão assim e designadamente, demonstrados quaisquer prejuízos irreparáveis.
Alegando o Requerente da Providência apenas de modo predominantemente conclusivo, danos de ordem financeira, não mensurados, os quais, se fosse caso disso, sempre seriam ressarciveis perante um eventual ganho de causa no correspondente processo principal, não é aceitável o argumento de acordo com o qual a Entidade Administrativa poderá em momento ulterior não deter verbas disponíveis para compensar os alegados prejuízos entretanto sofridos.
É incontornável que o regime legal vigente prevê para que possa ser concedida a Providencia Cautelar que se verifique, designadamente, um fundado receio na constituição de uma situação de facto consumado ou na produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente vise assegurar no processo principal.

3 - Um ato é de conteúdo puramente negativo se não produz qualquer modificação na ordem jurídica, mantendo inalterada a situação jurídica do Requerente.
Em concreto, o ato que não reconheceu a elegibilidade de uma candidatura (ato negativo) não é suscetível de suspensão por via de Providência Cautelar, uma vez que o seu eventual provimento, não determinaria qualquer efeito modificativo na situação do Requerente. *
* Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:Município de (...)
Recorrido 1:Fundo de Apoio à Inovação
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Procedimento Cautelar Suspensão Eficácia (CPTA) - Recurso Jurisdicional
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Não emitiu parecer.
1
Decisão Texto Integral:Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:

I Relatório
O Município de (...), tendo apresentado contra o Fundo de Apoio à Inovação - FAI, o presente Processo Cautelar, no qual veio requerer a suspensão da eficácia da deliberação adotada pela sua Comissão Executiva, a 22/05/2019, que manteve a decisão de não elegibilidade da sua candidatura, e aprovou apenas duas candidaturas, com uma despesa total elegível de €2.427.315,47, inconformado com a Sentença proferida no TAF de Viseu em 24 de janeiro de 2020 que julgou a presente providência totalmente improcedente e, consequentemente, absolveu a Entidade Requerida do pedido, veio em 14 de fevereiro de 2020, apresentar Recurso para esta instância, no qual concluiu:
“I. Vem o presente recurso interposto da Decisão proferida pelo Meritíssimo Tribunal a quo que indeferiu a providência cautelar de suspensão de eficácia da deliberação da Comissão Executiva do FAI, aqui Recorrido, proferida em 22.05.2019, que decidiu da não elegibilidade da candidatura apresentada pelo ora Recorrente, e aprovou apenas duas candidaturas, com uma despesa total elegível de €2.427.315,47, dos aqui Contrainteressados Município de (...) e T., EM, SA.
II. Face aos elementos de prova carreados para o processo, designadamente os documentos juntos aos autos, a posição assumida pelas partes nos próprios articulados, e as características próprias da lide cautelar – celeridade e summario cognitio – entendeu o Mmº Tribunal a quo, dispensar a produção de prova testemunhal, tendo de imediato proferido sentença a indeferir a providência cautelar requerida, por considerar não estar preenchido um dos requisitos necessários para o decretamento da mesma, o do periculum in mora. É esta a decisão objeto do presente recurso.
III. Face à prova dada como provada, o Mmº Tribunal a quo entendeu que não se encontra verificado o primeiro requisito do artigo 120º do CPTA – periculum in mora - e, nessa medida, sendo os requisitos desta norma de natureza cumulativa, a falta do preenchimento deste primeiro é condição bastante para que a providência não possa ser decretada.
IV. Entendeu o Mmº Tribunal a quo que o ora Recorrente se limitou a alegar prejuízos de ordem monetária, não obstante, mesmo que em sede de ação principal se venha a concluir que a candidatura do ora Recorrente deva ser considerada elegível, sempre poderá o ora Recorrido ser condenado a ressarcir o Recorrente de tais montantes, por via da reintegração da sua esfera jurídica em que estaria caso não tivesse sido praticado o ato anulável.
V. Com o devido respeito, entende o Recorrente, por um lado, que para além dos alegados prejuízos de ordem monetária, outros prejuízos existem que não são suscetíveis de ser ressarcidos por via de uma condenação do Recorrido a repor a situação em que o Recorrente estaria caso não tivesse sido praticado o ato anulável; por outro lado, mesmo quanto aos prejuízos de ordem monetária, não é de todo em todo manifesto que, mesmo condenado nesse sentido, o Recorrido execute a decisão em tempo e em conformidade. Senão vejamos.
VI. Até que seja proferida Decisão nos autos principais – o que, face aos tempos dos processos, mesmos os cautelares, poderá levar vários anos - a execução dos contratos de incentivos financeiros outorgados com as CI, acarretará o esgotamento de todo o financiamento disponível afeto ao concurso sub judice.
VII. Acontece que, mesmo que a decisão dos autos principais venha a ser procedente e o Recorrido venha a ser condenado a ressarcir o Recorrente dos montantes dos incentivos financeiros, tal não é suficiente para que não se verifique um grave prejuízo para os interesses que o Recorrente pretende acautelar.
VIII. É que, para além do tempo que poderá decorrer até que a decisão no processo principal – procedente - transite em julgado, o cumprimento dessa decisão por parte do Recorrido, mesmo que o seja voluntariamente (ao que não se exclui a hipótese de ter que ser necessário lançar mão do processo executivo), será sempre – como se sabe, neste tipo de processos - prolongado no tempo, quer por força de questões burocráticas, quer mesmo pelo facto de, à data, poderem não existir verbas disponíveis para esse cumprimento. Significa isto que, até que venha a ser ressarcido dos montantes em causa, poderá o Recorrente ter que esperar mais um ano, dois ou mesmo mais, uma vez que o ressarcimento dos montantes não é imediato.
IX. Nesta medida, são as populações privadas de aceder por tempo indeterminado a um equipamento termal com melhores condições, um serviço que cada vez mais se tem como essencial, que não é suscetível de quantificação monetária, prejuízo que não poderá deixar de ser tomado em consideração na decisão a proferir.
X. Acresce que, com todos os atrasos que podem decorrer do efetivo cumprimento duma decisão procedente nos autos principais, também os privados - que estarão dispostos a investir num prazo curto no sentido de aproveitar a energia geotérmica produzida através do projeto alvo da candidatura ao concurso sub iudice - com probabilidade séria, canalizarão o investimento que tinham destinado para este projeto, para outros investimentos, perdendo completamente o interesse na aquisição da energia geotérmica, o mesmo sucedendo relativamente às próprias unidades hoteleiras existentes na zona.
XI. E, desaparecendo estes interesses, desaparecem também outros possíveis investimentos junto das Termas do (...), sendo que, aliado à falta de investimento e criação de empregos, surgem outras consequências como desertificação, empobrecimento das zonas e envelhecimento das populações [cfr. alínea G), H), I) e M)dos FP]; o retorno financeiro esperado com a implementação deste projeto e a diminuição de custos que o mesmo pode trazer ao Recorrente [cfr. alínea L) dos FP], ficará adiado sine diem.
XII. Ora, estes prejuízos não só não são mensuráveis, como, a ser procedente a ação principal, não são reparáveis por via pecuniária, consubstanciando, por isso, uma situação de facto consumado e prejuízos de difícil reparação.
XIII. Acresce que, lê-se também na douta Sentença recorrida que o Recorrente não logrou demostrar que não consegue obter financiamento por outra via, designadamente junto do Estado Central, da União Europeia, ou inclusive junto de identidades privadas. Entende-se que sem razão. Vejamos.
XIV. Para que o Recorrente possa executar uma obra desta envergadura precisa de cerca de meio milhão de euros [cfr. alínea J) dos FP], Recorrente que, como é facto notório, é um Município situado no interior do país, com um orçamento parco e limitado, e poucas receitas próprias, o que implica uma gestão cuidada, de modo a dar resposta às necessidades prioritárias das suas populações.
XV. Esta realidade faz com que projetos como aquele que o Recorrente pretende implementar no âmbito do concurso sub iudice, sejam sucessivamente adiados, por não haver capacidade económica e financeira para os executar, aliás, refira-se, que se o ora Recorrente pudesse implementar só com o seu orçamento o projeto de geotermia que agora pretende ver executado, com toda a certeza que não estaria a incumprir o contrato com a DGEG, desde pelo menos 01.01.2016. (...)”.[cfr. alínea C) dos FP].
XVI. Acresce que, para a área da Geotermia, não só não está previsto novo concurso com este objeto e objetivo, como tão pouco se sabe se – e, em caso afirmativo, quando - abrirá um outro que permita ao ora Recorrente aceder a verbas nestes montantes, sendo que, só por esta via poderá haver financiamento estatal ou comunitário.
XVII. Para além disso, também as entidades privadas põem inúmeros entraves na concessão de financiamento de projetos como este, exigindo por parte do Recorrente a assunção de pesados e complexos compromissos que comprometem completamente a obtenção de financiamento.
XVIII. Por último, entende o Tribunal a quo que, quanto ao alegado incumprimento das obrigações assumidas pelo aqui Recorrente para com a DGEG, decorrentes do contrato de exploração celebrado e respectivas adendas, não resultou ainda qualquer repercussão ou prejuízo, sendo que este incumprimento por parte do aqui Recorrente já se verifica pelo menos desde há mais de 4 anos, sem que, para isso, o Recorrente tenha demostrado a impossibilidade de obter financiamento por outra via.
XIX. Ora, resulta da factualidade provada que, desde o ano de 2000, o Recorrente é titular de um contrato de exploração de Água Mineral Natural denominada “Termas do (...)”, que a DGEG entidade responsável pela exploração destes recursos fixou-lhe como objetivo obrigatório iniciar o aproveitamento geotérmico até 31 de Dezembro de 2015. [cfr. alínea A), B) e C) dos FP]
XX. Sucede que, mantendo-se a decisão ora recorrida, até que seja proferida Decisão no processo principal, o Recorrente manter-se-á em incumprimento, sem fundamento e por tempo indeterminado, e impossibilitado de justificar junto a DGEG porque razão permanece em incumprimento.
XXI. Pelo exposto, entende-se que face a factualidade dado como provada, sempre o Tribunal a quo deveria ter concluído pela existência de fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado e da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o Recorrente pretende acautelar no processo, que poderão advir da não suspensão da deliberação da Comissão Executiva do FAI, aqui Recorrido que, em 22.05.2019, manteve a decisão de não elegibilidade da candidatura apresentada pelo Município, e aprovou apenas duas candidaturas, com uma despesa total elegível de € 2.427.315,47, os dos Contrainteressadas Município de (...) e T., EM, S.A.. Deste modo,
XXII. Deverá ser revogada a Decisão proferida por errada interpretação da factualidade sub iudice e consequentemente por uma sua incorreta subsunção legal, violando, designadamente os artigos 120.º do CPTA e artigo 268.º, n.º 4 da Constituição da República Portuguesa, devendo ser substituída por outra que julgue provado e procedente o pedido de suspensão de eficácia da deliberação da Comissão Executiva do FAI, aqui Recorrido, de 22.05.2019
Assim, E confiando-se no douto suprimento de Vossas Excelências, Deve ser dado provimento ao presente recurso, com todas as consequências legais, assim se fazendo inteira justiça!”

O Contrainteressado Município de (...), veio apresentar as suas Contra-alegações de Recurso em 10 de março de 2020, tendo aí concluído:
“A. Nos termos conjugados do nº 1 e do nº 2 do art. 120 do CPTA, a adoção das providências cautelares depende dos seguintes critérios:
i. haja fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no processo principal – periculum in mora –;
ii. seja provável que a pretensão formulada ou a formular nesse processo (o principal) venha a ser julgado procedente – periculum in mora –;
iii. devidamente ponderados os interesses públicos e privados, em presença, os danos que resultarem da sua concessão não se mostrem superiores àqueles que podem resultar da sua recusa, sem que possam ser evitados ou atenuados pela adoção de outras providências.
B. A Recorrente apenas apresentou recurso quanto ao facto de na sentença não se ter considerado verificado o primeiro requisito – periculum in mora – dado se ter concluído que não se mostra sumariamente provada a existência de facto consumado ou ocorrência de difícil reparação
C. A concessão da providência depende da verificação cumulativa do primeiro e do segundo critérios referidos, periculum in mora e fumus boni iuris
D. A sentença, por se julgar suficiente a verificação do primeiro requisito, não se tomou conhecimento do mencionado segundo requisito, fumus bonis iuris, isto é, não foi considerado como provável que a pretensão formulada na ação principal seja julgada procedente.
E. A Recorrente alegou no requerimento cautelar – nº 163 a 166 – que o ato suspendendo está ferido de nulidade por, i) preterição de audiência prévia; ii) falta de fundamentação; iii) vício de violação da lei; iiii) erro sobre os pressupostos de facto e de direito, considerando estar preenchido o requisito para decretamento de providência cautelar relativo à aparência do bom direito fumus boni iuris
F. O Requerido Fundo de Apoio à Inovação quer os contrainteressados Município de (...) e T., SA, vieram nas oposições que deduziram impugnar a existência do requisito fumus boni iuris por não ser provável que a pretensão formulada no processo principal venha a ser julgada procedente dado que não se mostram verificadas as ilegalidades apontadas pelo requerente ao processo e ao ato impugnado.
G. Não se tendo tomado conhecimento sobre a questão relativa ao critério de fumus boni iuris e não tendo o Recorrente formulado conclusão no sentido de que, em sede de recurso, também se ajuizasse quanto à verificação cumulativa do critério de aparência de bom direito, deve ser negado provimento ao recurso
Caso assim não se entenda, sempre se dirá o seguinte:
H. Face ao recurso interposto pelo Recorrido, e atendendo à configuração jurídica invocada em juízo e ao tipo de danos que o Recorrente alega, não é crível concluir-se pela existência de qualquer facto consumado ou que ocorram prejuízo de difícil reparação
I. A recorrente limita-se a alegar prejuízos de ordem monetária no montante de 1.700.000€ devido ao facto de entender que tendo em consideração o tempo que poderá durar o processo principal, resultaria consumido todo o financiamento disponível previsto no presente concurso.
J. Caso ocorra a procedência nos autos principais sempre poderá o Fundo Recorrido ser condenado a ressarci-la nos montantes dos incentivos financeiros sem necessidade de novo concurso para o efeito
K. A Recorrente alegou que não tem outra possibilidade de implementar o projeto que candidatou, que consiste na construção de uma central geotérmica de armazenamento e conduta de distribuição de calor, sem auxílio comunitário ou do Estado, sendo certo que não alegou nem provou quaisquer factos que substanciem tal afirmação
L. A Recorrente conclui que ficará sem possibilidade de cumprir as obrigações assumidas para com a DGEG decorrentes de contrato de exploração já celebrado e respectivas adendas, sendo certo que como resulta da matéria indiciariamente provada, o Recorrente já se encontra em incumprimento desse contrato desde 01.01.2016 e nunca foram atribuídas a esse facto quaisquer repercussões ou prejuízos para ele daí decorrentes
M. Relativamente à impossibilidade de cumprir as obrigações assumidas para com a DGEG referida na conclusão anterior, o Recorrente também não alega factos dos quais se possa retirar ser impossível a obtenção de outro tipo de financiamento, seja de outra espécie ou através de outra entidade, pelos quais se possa ajuizar a situação de facto consumado ou de prejuízo de difícil reparação
N. Dúvidas não existem quanto à não verificação do critério de periculum in mora previsto no nº 1 do art. 120 do CPTA e ao bem fundado da sentença ao decidir pela improcedência da providência de suspensão de eficácia do ato.
Termos em que, deve ser negado provimento ao presente recurso confirmando-se a sentença recorrida. JUSTIÇA”

O Recorrido Fundo de Apoio à Inovação veio igualmente apresentar as suas Contra-alegações de Recurso em 10 de março de 2020, aí tendo concluído:
“A. O Recorrente não contesta a factualidade considerada como indiciariamente provada na sentença recorrida.
B. Estão unicamente em causa e em discussão neste recurso as conclusões retiradas pelo Tribunal da referida factualidade relativamente à verificação ou não do requisito do periculum in mora, um dos três requisitos exigidos pelo art. 120.° do CPTA para a adoção da providência cautelar requerida.
C. A lei exige, quanto ao requisito do periculum in mora, que o Requerente faça prova de que haja fundado receio (neste caso) de que a não suspensão do ato suspendendo e do procedimento do qual o mesmo se integra levaria à "constituição de uma situação de facto consumado" ou à "produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o Requerente visa assegurar no processo principal"(art. 120.°, n.º 1 do CPA).
D. O Recorrente não demonstrou que a não suspensão dos efeitos do ato impugnado na ação principal inviabiliza o seu projeto de aproveitamento de energia geotérmica.
E. O Recorrente não demonstrou que a não suspensão dos efeitos do ato impugnado na ação principal lhe provoque prejuízos irreparáveis.
F. O Recorrente apenas alega prejuízos monetários, que sempre serão ressarcíveis por via da reintegração da sua esfera jurídica na situação em que estaria caso não tivesse sido praticado o ato suspendendo.
G. O Recorrente apresenta um cenário em que o Recorrido se recusa e/ou não tem capacidade de cumprir os termos de uma eventual decisão que lhe impusesse o ressarcimento dos danos alegados pelo Recorrente.
H. Mas ainda que tal cenário se viesse a concretizar na realidade, o CPTA prevê todos os meios necessários para a reintegração da esfera jurídica de lesados por atos administrativos ilegais, pelo que este argumento avançado pelo Recorrente não procede.
I. O preenchimento do requisito do periculum in mora não depende exclusivamente do decurso do tempo, resultando antes, como já se referiu, do fundado receio na constituição de uma situação de facto consumado ou na produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no processo principal.
J. O Recorrente não logrou demonstrar neste processo cautelar que o referido requisito se verificasse em qualquer das duas vertentes citadas na conclusão anterior.
K. O Recorrente não distingue entre, por um lado, a ausência de benefícios imediatos para os residentes na área do município, para os privados alegadamente interessados na aquisição de energia geotérmica e para as unidades hoteleiras da zona e, por outro lado, os prejuízos resultantes da manutenção dos efeitos do ato suspendendo para a pessoa coletiva pública Município de (...), que é parte neste processo cautelar.
L. A sentença recorrida decidiu - e bem - que o Requerente Município de (...) não demonstrou que a exclusão da sua candidatura e consequente não obtenção dos incentivos financeiros concedidos pelo FAI no contexto do Aviso 05/2018 só por si inviabiliza o seu projeto. Também não demonstrou que não dispõe dos recursos próprios necessários para implementar o seu projeto e não demonstrou por que razão lhe é impossível obter o financiamento eventualmente necessário através de outras fontes.
M. Nas suas alegações de recurso, o Recorrente acrescenta elementos novos, alegando que o seu orçamento é limitado, que desconhece quando voltarão a estar disponíveis verbas públicas para financiar o seu projeto, e que as entidades privadas a que poderia recorrer para o efeito colocam entraves e exigem compromissos que inviabilizariam a obtenção de financiamento.
N. Trata-se de factos novos, que, por imposição do princípio do dispositivo, não podem ser trazidos ao processo já em instância de recurso, e a que consequentemente o Tribunal ad quem não deverá atender, pois as normas processuais aplicáveis apenas admitem a alegação de novos factos até ao encerramento da discussão em primeira instância.
O. O Recorrente celebrou em 2000 um contrato com o Ministério da Economia, objeto de várias adendas, nos termos de um dos quais qual o Recorrente tem perante a DGEG a obrigação de proceder ao aproveitamento geotérmico das águas das Termas do (...), obrigação que até ao momento o Recorrente não cumpriu.
P. O Recorrente tentar dar a entender que a decisão de não elegibilidade da sua candidatura aos incentivos financeiros concedidos através do Aviso 05/2018 é a única causa desse incumprimento.
Q. No entanto, esse incumprimento já se verificava muito antes da publicitação do Aviso 05/2018, e o Recorrente não demonstrou que não existe qualquer outra via (em particular, meio de financiamento) através do qual pudesse cumprir as suas obrigações perante a DGEG.
R. Termos em que o Recorrido entende que a sentença ora em crise não merece qualquer reparo ou censura, devendo ser mantida nos seus exatos termos, sendo julgado totalmente improcedente o recurso interposto pelo Recorrente Município de (...), e mantida a decisão de improcedência da providência cautelar requerida com a consequente absolvição do pedido do Requerido.
Nestes termos e nos mais de Direito que V. Exas. muito doutamente suprirão, deve ser mantida a sentença recorrida, improcedendo o recurso interposto pelo Recorrente.”

Por Despacho de 17 de março 2020 foi admitido o Recurso interposto.

O Magistrado do Ministério Público junto deste tribunal, notificado em 19 de março de 2020, nada veio dizer, requerer ou Promover.

Com dispensa de vistos prévios (art.º 36º, nº 2, do CPTA), cumpre decidir.

II - Questões a apreciar
Importa apreciar e decidir as questões colocadas pelo Recorrente, sendo que o objeto do Recurso se acha balizado pelas conclusões expressas nas respetivas alegações, nos termos dos Artº 5º, 608º, nº 2, 635º, nº 3 e 4, todos do CPC, consubstanciando-se na necessidade de verificar a questionada factualidade dada como provada e a sua repercussão relativamente à verificação do requisito do periculum in mora.
III – Fundamentação de Facto
O Tribunal a quo, considerou a seguinte matéria de facto relevante para a apreciação da questão controvertida, cujo teor infra se reproduz:
“A) O Requerente é titular de um contrato de exploração de Água Mineral Natural denominada “Termas do (...)”, situada na sua área concelhia, e outorgado com o Ministério da Economia a 18/09/2000 (cfr. documento junto com a petição inicial do processo principal sob o nº 2);
B) Desde a construção do Furo AC-G1 – furo principal, cuja água brota por artesianismo a 60º C – que a DGEG, entidade que tutela a exploração destes recursos, fixou ao Requerente como objetivo obrigatório, para além da exploração da água termal, o aproveitamento geotérmico (cfr. acordo de partes);
C) Por força da obrigação referida em B), foram sendo feitas adendas ao referido contrato, sendo que, na Adenda nº 3 ao plano de exploração de água mineral natural, número HM-43, refere no artigo 5º, nº 1, alínea c), que o Requerente deveria “propor à DGEG a revisão do plano de exploração que contemple o aproveitamento geotérmico do recurso até 31 de Dezembro de 2013”, e na alínea f) era indicado que a Câmara Municipal do Requerente teria que “iniciar o aproveitamento geotérmico do recurso até 31 de Dezembro de 2015” (cfr. documento junto com a petição inicial do processo principal sob o nº 2);
D) Por Aviso 05/2018 da Entidade Requerida foi aberto concurso para a apresentação de candidaturas à atribuição de incentivos financeiros sob a forma de subsídio não reembolsável a projetos na área de Geotermia de Baixa Entalpia (cfr. documento junto com a petição inicial do processo principal sob o nº 3, que aqui se dá por integralmente reproduzido);
E) No aviso identificado em D) consta, designadamente, o seguinte: “(…) Artigo 3º. Requisitos de elegibilidade das candidaturas. 1. São suscetíveis de apoio no âmbito do presente Concurso «Projetos de investimento que visem o aumento da eficiência energética», nos termos da alínea c) do nº 1 do art.º 3º do Regulamento Gestão do FAI. 2. Apenas são elegíveis projetos cujas operações sejam localizadas em Portugal. 3. Apenas são elegíveis projetos que apresentem um retorno financeiro menor ou igual a 15 anos. (…) Artigo 6º. Documentos que compõem as candidaturas. 1. As candidaturas são compostas pelos seguintes documentos, sob pena de exclusão: a) Formulário de candidatura, que compreende as seguintes secções: i. Identificação do Promotor e demais entidades envolvidas; ii. Indicação, quantitativa e qualitativa, dos objetivos a atingir com o Projeto; iii. Memória descritiva do Projeto (que deverá descrever detalhadamente o Projeto, justificar a sua elegibilidade, ao nível dos impactos na eficiência energética gerada); iv. Cronograma de execução; v. Cronograma financeiro, incluindo a demonstração de que se encontram asseguradas as fontes de financiamento do projeto; vi. Mapa de investimentos; vii. Enquadramento na estratégia nacional de energia. (…) Artigo 7º. Avaliação dos Projetos. 1. Os Projetos são avaliados de acordo com os seguintes critérios: a) Eficácia para a redução da dependência de energia fóssil; b) Dimensão da rede de distribuição de calor geotérmico; c) Retorno financeiro. 2. A densificação dos referidos critérios em fatores e subfactores de avaliação, com atribuição de ponderações relativas, consta do Anexo 1 ao presente Aviso. (…)” (cfr. idem);
F) Ainda nos termos do referido aviso, a dotação financeira máxima afeta ao Concurso era de €1.700.000 e a taxa máxima de cofinanciamento era de 70% (cfr. idem);
G) A 28/01/2019, o Requerente apresentou a sua candidatura, denominada “Promoção da Utilização Geotérmica – Aproveitamento do Recurso Geotérmico das Termas do (...)”, apresentando um projeto de aproveitamento geotérmico das potencialidades existentes na água termal que lhe está concessionada (cfr. documentos juntos com a petição inicial do processo principal sob os nºs 4 e 5, que aqui se dão por integralmente reproduzidos);
H) O projeto identificado em G) tinha como fim aproveitar o diferencial de energia produzida pela utilização de água termal que brota por artesianismo a 60º e é utilizada na atividade termal a cerca de 30º, ou seja, tinha como objetivo aproveitar essa diferença, fornecendo calor para aquecimento do balneário termal e também para as unidades hoteleiras existentes na área, bem como para clientes particulares – blocos habitacionais e habitações unifamiliares existentes (cfr. idem);
I) No formulário da candidatura apresentada pelo Requerente, pode ler-se, designadamente, o seguinte: “Objetivo do Projeto: O projeto tem como objetivo o aquecimento de águas sanitárias e climatização do edifício das Termas, a climatização e aquecimento das águas sanitárias de unidades hoteleiras, o aquecimento da água da piscina pública perto das termas e a climatização de habitações particulares.” (cfr. documento junto com a contestação da ER na ação principal sob o nº 3);
J) Já na memória descritiva que acompanha o referido projeto, pode ler-se, designadamente, o seguinte: “(…) o que esta memória descritiva pretende demonstrar é tão só as potencialidades do recurso disponível e uma perspetiva de aproveitamento da energia disponível nos termos em que se seguem. (…) A obra que se pretende construir de acordo com o projeto técnico em anexo, memória descritiva, cálculos e peças desenhadas, num orçamento total de 588.266,870€, consta da construção e do fornecimento de equipamento de forma a poder aproveitar-se a diferença de temperatura da água no seu estado puro 60ºC e os 30ºC de temperatura para uso balnear, o armazenamento e o fornecimento a possíveis clientes, para aquecimento dos edifícios e uso em aquecimento de águas sanitárias. (…) furo artesiano com caudal de 6.3 l/s por artesianismo que pode chegar por bombagem, aos 15 l/s, segundo Ferreira Gomes (…)” (cfr. idem);
K) Do documento que compõe a candidatura do Requerente e designado “Projeto Geotérmico (...)– Memória Descritiva”, datado de 2012, consta, nomeadamente, o seguinte: “(…) O presente projeto é realizado a pedido da Câmara Municipal de (...), de modo a implementar com carácter de urgência o uso do recurso da nova captação, que sendo quente (água mineral a 60ºC), é necessário ser arrefecido, e integrado no atual Plano de Exploração das Termas do (...). Além de uma solução direta para o arrefecimento da água mineral apresentam-se ainda outras soluções, de modo a usufruir do calor a retirar à água mineral, integrando o processo num aproveitamento geotérmico adequado, para aquecimento ambiental de edifícios, aquecimento de águas sanitárias, de entre outros. (…) O Furo AC-G1 tem potencial de ser explorado com um caudal de cerca de 15 l/s, com bombagem a 60ºC, no entanto o caudal máximo a fixar, em termos de dimensionamento, considera-se de 10 l/s, por ser o valor máximo em artesianismo.(…) Deve ser previsto o sistema para implementar PP2 e PP#, em separado de PP1, dado que este poderá ser implementado numa próxima fase. Os coletores associados ao RIT do sistema geotérmico, não são previstos em orçamento por se prever a sua implementação numa fase seguinte. (…)” (cfr. idem);
L) O Requerente apresentou ainda, juntamente com a sua candidatura, um documento designado “Just. Retorno Financeiro”, no qual se pode ler, designadamente, o seguinte: “(…) Objetivos do projeto: - Arrefecimento da água mineral quente, a 60ºC, para temperaturas da ordem de 30ºC. – Arrefecimento de água sanitária para autoconsumo no balneário das termas. – Climatização do edifício termal. – Venda de energia geotérmica para: * Climatização e aquecimento de águas sanitárias de unidades hoteleiras nas imediações; * Climatização e aquecimento de águas sanitárias no sector residencial. – Aquecimento da água da piscina pública próxima das Termas. – Diminuição de emissões de dióxido de carbono. – Aumento da eficiência energética, tanto no edifício em causa bem como nos potenciais utilizadores abrangidos pela rede de abastecimento. – Diminuição dos custos, nomeadamente com o menor consumo de energia elétrica. (…) Potencial caudal de 15 l/s, com bombagem, a 60ºC, considerado no presente estudo um caudal de 10 l/s. (…)” (cfr. idem);
M) Da documentação inserta na candidatura apresentava pela Requerente constavam ainda declarações emitidas por entidades privadas revelando interesse na aquisição da energia geotérmica produzida (cfr. documento junto com a petição inicial da ação principal sob o nº 5);
N) A 06/02/2019, a Entidade Requerida solicitou junto do Requerente diversos esclarecimentos quanto à sua candidatura, esclarecimentos que foram por este prestados a 20/02/2019 (cfr. documentos juntos com a petição inicial da ação principal sob os nºs 7 e 8, que aqui se dão por integralmente reproduzidos);
O) Em Março de 2019, a Entidade Requerida comunicou ao Requerente o Relatório Preliminar, que concluiu pela não elegibilidade da sua candidatura, mais considerando elegíveis as candidaturas apresentadas pelos aqui CI (cfr. documento junto com a petição inicial da ação principal sob o nº 9, que aqui se dá por integralmente reproduzido);
P) Em data não especificada, um representante do Requerente deslocou-se à sede da Entidade Requerida por forma a consultar o processo, tendo tal consulta sido facultada, mas com truncagem de informação, na parte correspondente a documentação classificada ou que revelasse segredo comercial ou industrial (cfr. acordo das partes);
Q) A 03/04/2019, e pelo ofício 3537, o Requerente solicitou cópias de todo o processo e requereu prazo para a respetiva análise, bem como para apresentação da sua defesa (cfr. documento junto com a petição inicial da ação principal sob o nº 10);
R) A 18/04/2019, a Entidade Requerida remeteu ao Requerente cópias das candidaturas apresentadas pelos CI, com truncagem de informação, remetendo para o disposto no artigo 83º, nº 2, do CPA (cfr. documentos juntos com a petição inicial da ação principal sob os nºs 11 e 12, que aqui se dão por integralmente reproduzidos);
S) A 22/05/2019, a Entidade Requerida emitiu o Relatório Final, o qual pugnou pela consideração da candidatura apresentada pelo Requerente como não elegível, considerando elegíveis apenas as candidaturas apresentadas pelos CI (cfr. documento junto com a petição inicial da ação principal sob o nº 1, que aqui se dá por integralmente reproduzida;
T) Pode ler-se no indicado relatório final, nomeadamente, o seguinte: “(…) C05.004 – Município de (...). Face à documentação apresentada pelo Município de (...) (MCD), e de acordo com o formulário de candidatura, esta tem por objetivo «(…) o aquecimento de água sanitária e climatização das do edifício das Termas, a climatização e aquecimento de águas sanitárias de unidades hoteleiras o aquecimento da água da piscina pública perto das termas e a climatização de habitações particulares». No documento denominado «Just. Retorno Financeiro.pdf» são apresentados os seguintes dados do projeto: - Caudal de 15 l/s; - Variação de temperatura, ÄT = 30ºC; - PVP = 0,0452 kW/h; - Produção anual estimada = 6 931 833 kWh/ano. No que diz respeito ao caudal acima referido, há a esclarecer que, com base no Plano de Exploração das Termas do (...), o caudal máximo autorizado para o furo AC-G1 é de 4,2 l/s. Por outro lado, na página 3 da memória descritiva é referido que «o caudal máximo a fixar, em termos de dimensionamento, considera-se de 10 l/s, por ser o valor máximo em artesianismo». O aumento do caudal autorizado carece de uma revisão do plano de exploração, não se encontrando garantido que o furo AC-G1 possa ser explorado com o caudal de 15 l/s. Quanto à produção anula estimada de 6 931 833 kWh, esta corresponde a 596 tep e não a 1 490 tep, valor utilizado para o cálculo do mérito da operação pelo MCD. Por outro lado, e embora o MCD tenha anexado à sua candidatura várias declarações de interesse no fornecimento de calor geotérmico, não dispomos de dados suficientes para avaliar se as necessidades desses eventuais consumidores se aproximam desse valor, tendo em consideração a tipologia dos interessados. No entanto, a memória descritiva apresentada pelo MCD visa: a) O arrefecimento da água mineral natural para utilização nas termas é efetuado no permutador PP3, recorrendo à água da Ribeira da (...) a qual, depois de permutada com a água mineral natural, é restituída a jusante do açude existente; b) A construção de redes de distribuição da água mineral natural a 60ºC e a 30ºC para utilização em tratamentos termias no balneário; c) A construção de uma rede de distribuição de AQS interna do balneário, assente no permutador PP2; d) A construção de uma rede de distribuição para venda de calor a unidades hoteleiras vizinhas e aquecimento da piscina pública, assente no permutador PP1 que tem por objetivo armazenar «geocalor» no Reservatório de Inércia Térmica (RIT). As alíneas a) e b) não são enquadráveis no âmbito do Aviso 05 do FAI, pois não se tratam se projetos que promovam a eficiência energética. A ação que consta da alínea d), de acordo com o estipulado na página 19 da memória descritiva, «Os coletores associados ao RIT do sistema geotérmico, não são previstos em orçamento por se prever a sua implementação em próxima fase», pelo que se afigura que as ligações a unidades hoteleiras vizinhas dos balneários não estão previstas nesta memória descritiva. Relativamente à ação referida na alínea c) verifica-se que os respetivos valores de poupança energética e de investimento não se encontram diferenciados na memória descritiva, sendo estimado no documento «Just. Retorno Financeiro.pdf» o valor de poupança no consumo de energia primária de aproximadamente 117 490,00 kWh/ano, que correspondem a 10 tep (e não a 25,30 tep como consta no referido documento), relativamente à climatização no edifício termal. Note-se ainda que, nas páginas 24 e 25 da memória descritiva é afirmado que «…salienta-se que nesta fase da obra não se contemplam a título de estimativa orçamental, os sistemas associados ao aproveitamento geotérmico, ou seja, os sistemas a jusante de PP1, bem como os sistemas de distribuição de AQS a jusante do reservatório, apesar destas soluções terem sido contempladas a nível de projeto». Esta afirmação contraria, mais uma vez, os objetivos declarados pelo MCD no formulário de candidatura e coloca a candidatura fora do âmbito do Aviso 05 do FAI, pois a parte referente à geração de poupança de energia ficou excluída da orçamentação do projeto descrito na memória descritiva. É igualmente de salientar que, de acordo com o projeto apresentado na memória descritiva, se pretende arrefecer um caudal de 10 l/s de 60ºC para cerca de 30ºC. O projeto apresentado está estruturado para a necessidade de arrefecimento da água mineral natural, sendo dado maior enfâse à solução de dissipação de calor na Ribeira de (...), e não para o aproveitamento do calor deste recurso geotérmico, objeto do Aviso 05 do FAI. Desta forma verifica-se que a memória descritiva apresentada não corresponde aos objetivos declarados pelo MCD no formulário de candidatura, nem tampouco aos objetivos traçados no Aviso 05 do FAI, pois grande parte das tarefas da candidatura apresentada não se enquadra no âmbito deste. Assim, e face às incongruências, incorreções e contradições demonstradas nos vários documentos que compõem a candidatura apresentada pelo MCD e tendo em consideração a não elegibilidade ao Aviso 05 do FAI da maioria das tarefas aí previstas, esta candidatura deve ser considerada não elegível. (…)” (cfr. idem);
U) Também a 22/05/2019, a Comissão Executiva da Entidade Requerida deliberou aprovar o Relatório Final referido supra (cfr. fls. 254 e seguintes dos presentes autos);
V) A decisão referida em U) foi comunicada ao Requerente a 23/05/2019, por correio eletrónico (cfr. idem);
W) A petição inicial da ação principal foi apresentada neste Tribunal a 24/06/2019 (cfr. fls. 1 e seguintes dos autos principais);
X) O requerimento inicial da presente providência cautelar foi apresentado em Tribunal a 08/10/2019 (cfr. fls. 1 e seguintes dos presentes autos).”

IV - Do Direito
Visa o presente processo cautelar a suspensão da eficácia do ato praticado pela Entidade Requerida, aqui Recorrida, de 22/05/2019, que aprovou o Relatório Final das candidaturas ao Aviso 05/2018, para a atribuição de incentivos financeiros a projetos na área de Geotermia de Baixa Entalpia, e que considerou a candidatura por si apresentada como não elegível, o que em bom rigor, e como se verá, relativamente à Recorrente se consubstancia predominantemente num pedido de suspensão de um ato negativo, pois que a eventual suspensão de tal ato não teria quaisquer consequências no que concerne à pretensão do Município de ver reconhecida a elegibilidade da sua candidatura.
No que ao “direito” concerne, discorreu-se em 1ª instância:
“As providências cautelares estão necessariamente dependentes de uma ação já pendente ou a instaurar posteriormente à sua dedução em juízo, conforme previsto no nº 1 do artigo 114º do CPTA, acautelando ou antecipando provisoriamente os efeitos da providência definitiva, na pressuposição de que venha a ser favorável ao requerente, a decisão a proferir no processo principal (Alberto dos Reis, in BMJ, nº 3, pág. 45 e Castro Mendes, in DPC, ed. 1973, vol. I, pág. 198), isto é, visam assegurar a utilidade da sentença do processo principal.
Mesmo para aqueles que consideram os procedimentos cautelares uma categoria diferenciada, um tertium genus, entre o processo declarativo e o processo executivo, vendo neles um instrumento jurídico cujo objeto é distinto do objeto principal, não deixam de apontar como uma das características fundamentais a instrumentalidade.
(...)
Na presente instância, a pretensão requerida – suspensão da eficácia de ato administrativo – consiste na adoção de uma providência conservatória, como reação ao ato de conteúdo pretensamente lesivo, que se consubstancia na decisão de não elegibilidade da candidatura apresentada pelo Requerente para efeitos de atribuição de incentivos financeiros a projetos na área de Geotermia de Baixa Entalpia.
Visa, portanto, a providência requerida tão só manter ou conservar a situação jurídica atualmente existente, não antecipando, ainda que provisoriamente, qualquer situação ou efeito jurídico novos, diferente daquele que existe no atual momento e que, por virtude da decisão tomada pela Administração, se encontra ameaçada.
Determina o artigo 120º do CPTA os critérios de decisão dos quais depende a concessão das providências cautelares, prevendo-se nos artigos 128º e 129º, especificamente, aqueles exigidos quanto à providência cautelar de suspensão de eficácia do ato administrativo.
(...)
Nos termos do nº 1 do artigo 120º do CPTA, depende a concessão da providência do fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou em alternativa da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses da Requerente (periculum in mora) e que seja provável que a pretensão formulada ou a formular na ação principal venha a ser julgada procedente (fumus boni iuris).
Deste modo, interessa como parâmetro decisório do primeiro segmento, respeitante ao periculum in mora, aferir da existência de um perigo de inutilidade da decisão a proferir no processo principal, ainda que meramente parcial, pela constituição de uma situação de facto consumado ou pelo receio de se produzirem prejuízos de difícil reparação.
No que a esta matéria respeita, e como se viu supra, invoca o Requerente existir um fundado receio de constituição de um facto consumado que torne inútil a decisão que vier a ser tomada na ação principal, uma vez que, caso não seja decretada a suspensão da decisão da Comissão Executiva, é possível que a Entidade Requerida e os dois candidatos aprovados, aqui CI, venham a celebrar os contratos de incentivos financeiros, assim esgotando parcialmente a dotação disponível afeta ao presente concurso. Invoca ainda que não tem outra possibilidade de levar a cabo o projeto apresentado, assim incorrendo em incumprimento das suas obrigações para com a DGEG, não sendo de aceitar que sejam tais prejuízos ressarcíveis, porquanto já não existirão verbas disponíveis para o efeito.
Ora, para que se possa entender pelo fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado, forçoso será formular um juízo no sentido de a demora do processo principal acarretar na esfera jurídica da Requerente uma situação de irreparabilidade dos danos, na ótica de uma reintegração específica ou por se ter consumado, com a demora da decisão, uma situação de facto incompatível com a sentença a proferir no processo principal, por forma a torná-la inútil, em caso de procedência (neste sentido, Vieira de Andrade, A Justiça Administrativa, Almedina, Coimbra, pág. 308).
Isto é, verifica-se o pressuposto do fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado quando, à data em que a sentença da causa principal é prolatada, em sentido favorável ao demandante, não seja mais possível a reintegração no plano dos factos, da situação conforme à legalidade que deveria existir se não fosse praticado tal decisão ilegal.
Atendendo à configuração da situação jurídica trazida a juízo e ao tipo de danos que o Requerente alega, não é crível concluir-se pela existência de qualquer facto consumado ou que ocorram prejuízos de difícil reparação.
De facto, limita-se este a alegar prejuízos de ordem monetária, especificamente, o facto de, considerando o tempo estimável que pode tardar o processo principal, e em caso de procedência do mesmo, ter sido já consumido todo o financiamento disponível previsto para o presente concurso, o qual, como advém do probatório coligido, é de €1.700.000.
Não obstante, sempre se diga que, caso ocorra tal procedência nos autos principais, e efetivamente conclua o Tribunal que a candidatura apresentada pelo Requerente deva ser reputada de elegível, sempre poderá a Entidade Requerida ser condenada a ressarci-lo de tais montantes de incentivos financeiros, por via da reintegração da sua esfera jurídica na situação em que estaria caso não tivesse sido praticado o ato anulável, independentemente da existência de um especial concurso para o efeito.
Invoca ainda o Requerente que não tem outra possibilidade de levar a cabo o projeto que consubstancia a sua candidatura, isto é, a construção de uma central geotérmica de armazenamento e conduta de distribuição de calor, se não tiver auxílio Estatal ou Comunitário.
Todavia, não veio o Requerente provar, ou sequer alegar, quaisquer factos que sustentem tal juízo conclusivo. Efetivamente, em nenhum momento indica o Requerente que não logra obter qualquer financiamento por outro via, junto do Estado Central, da União Europeia ou inclusive junto de entidades financeiras privadas, nem tampouco junta qualquer documento comprovativo que ateste que não dispõe de qualquer dotação orçamental, ainda que de cariz plurianual, para o efeito.
Conforme afirmado pelo Venerando Tribunal Central Administrativo do Norte, no seu Acórdão de 31/05/2013, no P. 19/13.1BEMDL “(…) É que, de facto, a alegação vertida no articulado inicial mostra-se como insuficiente e inidónea para o preenchimento do requisito em questão, sendo, em grande medida, genérica/vaga e conclusiva [cfr., v.g., arts. 49.º e 50.º da petição inicial]. LXVI. Impunha-se que tal alegação tivesse sido concretizada com realidade factual que corporizasse efetivamente o requisito em questão, mormente, com a demonstração de que é da execução dos atos suspendendos que resultará a impossibilidade de cumprimento dos compromissos contratual e legalmente assumidos, quando é certo que, contabilisticamente, a situação económico-financeira da requerente já não é positiva e para tal estado não contribuiu a execução dos atos em crise, na certeza de que nada é dito quanto a uma impossibilidade de financiamento e obtenção de crédito ou que as efetivas disponibilidades financeiras e rendimentos/proventos auferidos/realizados mensal/anualmente não lhe permitam suportar a reposição determinada se necessário com uma reprogramação de compromissos e atividades, alteração da estrutura de custos. (…) LXVIII. Nessa medida e reiterando o supra referido, temos que não se mostra no caso concreto configurada qualquer situação fáctica donde se possa concluir pela existência, por um lado, de risco fundado da constituição de uma situação de facto consumado mercê de haver receio fundado de que se a providência for recusada se tornará impossível a reintegração no plano dos factos da situação conforme à legalidade uma vez decidido o processo principal com decisão favorável à pretensão da requerente, e, por outro, da provável existência de risco de ocorrência de prejuízos de difícil reparação, mormente, por a sua reintegração no plano dos factos se perspetivar difícil ou por haver prejuízos para os interesses da requerente ou de outros, já produzidos ou a produzir ao longo do tempo, e cuja reintegração da legalidade não é possível reparar ou reparar integralmente. (…)”
Por fim, e no que concerne ao alegado incumprimento das obrigações assumidas pelo Requerente para com a DGEG, decorrentes do contrato de exploração celebrado e respectivas adendas, sempre cumprirá sublinhar dois pontos. Em primeiro lugar, e conforme advém do probatório coligido, já se encontra o Requerente em situação de incumprimento do mencionado contrato desde 01/01/2016, isto é, desde há mais de 4 anos, não tendo sido referidas quaisquer repercussões ou prejuízos para esta parte de tal incumprimento. Por outro lado, sempre valerão aqui as mesmas razões aduzidas supra, quanto à insuficiência da factualidade concreta alegada e respeitante à impossibilidade de obtenção de outro tipo de financiamento, de distinta natureza ou entidade, para que possa ser formulado um juízo de situação de facto consumado ou de prejuízos de difícil reparação.
Nestes termos, não tendo sido em momento algum alegado qualquer facto suscetível de fazer gerar um prejuízo de difícil reparação ou de facto consumado, não se verifica o preenchimento do primeiro requisito para o decretamento da presente providência, do periculum in mora, o que desde já se declara.
Sendo os requisitos constantes do artigo 120º do CPTA de natureza cumulativa, basta a falta de preenchimento de um deles para que a providência cautelar não possa ser decretada, pelo que se afigura inútil a apreciação da verificação ou não dos demais, conhecimento este que fica assim prejudicado.
Consequentemente, está a presente providência votada à improcedência, o que desde já se declara.”

Vejamos:
Com a nova redação do CPTA, deixou de existir o critério da evidência que permitia decretar, só por si, a providência requerida.

Há que averiguar agora, desde logo, a existência do periculum in mora, a constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no processo principal.

Continua a recair sobre o requerente o ónus de fazer prova sumária dos requisitos do periculum in mora, enquanto receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para o requerente; e, se for caso disso, do fumus boni iuris, enquanto sumária avaliação da probabilidade de existência do direito invocado.
Ao referido acresce ainda a eventual necessidade de ser feita uma ponderação de todos os interesses em presença (públicos e/ou privados).

Analisemos então com a necessária perfunctóriedade o suscitado:
Estão recursivamente em causa predominantemente as ilações tiradas pelo tribunal a quo relativamente à matéria dada com provada e a não verificação do requisito do periculum in mora.

Tal como decidido em 1ª instância, não se mostra preenchido o critério constante do nº 1 do Artº 120º do novel CPTA, uma vez que não se reconhece a verificação de “fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o Recorrente visa assegurar no processo principal e seja provável que a pretensão formulada ou a formular nesse processo venha a ser julgada procedente.”

O referido normativo estabelece a necessidade de verificação cumulativa dos indicados requisitos, a saber, o periculum in mora, consubstanciado no risco de a demora na resolução definitiva do litígio conduzir a uma situação de facto consumado ou de causar ao Recorrente prejuízos de difícil reparação e o fumus boni iuris, que consiste na probabilidade de o Recorrente vir a obter a procedência da pretensão por si formulada no processo principal.

Efetivamente o Requerente, aqui Recorrente, não logrou demonstrar que a não suspensão do cuja suspensão veio requerida, inviabilizaria o seu projeto de aproveitamento de energia geotérmica, pois não alega, e muito menos prova, quaisquer factos concretos que permitissem tirar tal conclusão, pois que, se for caso disso, sempre poderá aceder a outras vias de financiamento, não estando assim e designadamente, demonstrados quaisquer prejuízos irreparáveis.

Na realidade, o Recorrente apenas alega de modo predominantemente conclusivo, danos de ordem financeira, não mensurados, os quais, se fosse caso disso, sempre seriam ressarciveis perante um eventual ganho de causa no correspondente processo principal, não sendo aceitável o argumento de acordo com o qual a Entidade aqui Recorrida poderia em momento ulterior não deter verbas disponíveis para compensar os alegados prejuizos entretanto sofridos.

É incontornável que o regime legal vigente prevê para que possa ser concedida a Providencia Cautelar que se verifique, designadamente, um fundado receio na constituição de uma situação de facto consumado ou na produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente vise assegurar no processo principal.

E o que é facto é que, como sublinhado em 1ª instância, a aqui Recorrente não logrou provar que se verificassem preenchidos os pressupostos tendentes sequer ao preenchimento do periculum in mora, em qualquer das suas vertentes já assinaladas.

Como sumariado, entre muitos outros, no acórdão do STA nº 0435/18, de 14 de junho de 2018, "o «periculum in mora» constitui verdadeiro leitmotiv da tutela cautelar, pois é o fundado receio de que a demora, na obtenção de decisão no processo principal, cause uma «situação de facto consumado ou prejuízos de difícil ou impossível reparação» aos interesses perseguidos nesse processo que motiva ou justifica este tipo de tutela urgente. Efectivamente, na linha da jurisprudência deste Supremo Tribunal, a decisão do processo principal pode já não vir a tempo de dar resposta às situações jurídicas envolvidas no litígio, ou porque a evolução da situação durante a pendência do processo «tomou a decisão totalmente inútil», ou porque essa evolução levou à «produção de danos dificilmente reparáveis». No primeiro segmento alternativo, estaremos em face de uma situação de «facto consumado». Como já disse este tribunal, «o facto será havido como consumado por referência ao fim a que se inclina a lide principal, de que o meio cautelar depende; e isto significa que só ocorre uma situação de facto consumado quando, a não se deferir a providência, o estado de coisas que a acção quer influenciar ganhará entretanto a irreversível estabilidade inerente ao que já está terminado ou acabado - ficando tal acção inutilizada ex ante». Já no segundo segmento alternativo, a demora da acção principal não retira, de todo, utilidade a esta lide, todavia, há o fundado receio de que provoque «danos de difícil reparação», nomeadamente porque a sua indemnização pecuniária, ou a reconstituição da situação, ou, de um modo geral, a reintegração da respectiva legalidade, não é capaz de os reparar, ou, pelo menos, de os reparar integralmente."

Alude ainda o Recorrente ao facto de, em caso de manutenção dos efeitos do ato suspendendo, terem as populações de esperar até poderem usufruir plenamente dos benefícios decorrentes do projeto do Recorrente.

Em qualquer caso, o referido argumento mostra-se falacioso, pois que já pressupõe a viabilidade, validade e utilidade do projeto em causa, o que manifestamente não está, nem poderia estar aqui em causa, no âmbito de um processo de natureza meramente cautelar.

Afirma ainda o Recorrente que, não sendo suspensos os efeitos do ato aqui objeto de pedido de suspensão, "o retorno financeiro esperado com a implementação deste projecto e a diminuição de custos que o mesmo pode trazer ao Recorrente [...] ficará adiado sine die".

Mais uma vez, tratam-se de afirmações descontextualizadas e não concretizadas, por se mostrarem meramente conclusivas, insuscetíveis de permitir o preenchimento dos requisitos e pressupostos tendentes à procedência de uma Providência cautelar.

Alega ainda o Município no Recurso Jurisdicional em apreciação, de algum modo inovatoriamente, que o seu Orçamento é limitado e que desconhece quando voltarão a estar disponíveis verbas públicas, para financiar a concretização do seu projeto.

Como está bem de ver, o referido argumento não colhe como forma de fazer valer o seu ponto de vista, pois que mal se compreenderia que se pudesse viabilizar uma qualquer pretensão entendida como não elegivel, em função de se desconhecer se voltarão a ser disponibilizadas verbas como um determinado objetivo.
Desde logo, e se mais razões não houvesse, não poderia este tribunal atender a factualidade não suscitada em 1ª instância e apenas trazida inovatoriamente em sede recursiva, como resulta desde logo do estatuído no art. 5.°, n.°s 1 e 2 do Código de Processo Civil (CPC), no que concerne e no respeito pelo principio dispositivo.

O derradeiro argumento do Municipio Recorrente para sustentar a verificação do requisito legal de adoção das providências cautelares do periculum in mora, previsto no art. 120.°, n.° 1 do CPTA, é o das consequências que terá para si o incumprimento do contrato celebrado com a Direção-Geral de Energia e Geologia (DGEG), nos termos do qual o Município terá a obrigação de proceder ao aproveitamento geotérmico das águas das Termas do (...).

Alega a este respeito o Recorrente/Municipio que "[...] não ficando o acto impugnado suspenso, manter-se-á o Recorrente em incumprimento do contrato celebrado com a DGEG por mais 6 ou 7 anos, durante este período é muito provável, que a DGEG aplique ao Recorrente sanções pelo incumprimento definitivo do contrato"

Sendo certo, como já se afirmou, que o municipio está confessadamente em falta e incumprimento há vários anos, não pode imputar ao procedimento objeto do presente Processo qualquer responsabilidade pelo seu incumprimento, ao que acresce que a FAI, não poderia adequar o procedimento e decisões adotadas em função dessa circunstância, ao que acresce que não é sequer parte no processo no qual se verifica o referido atraso.

A circunstância do FAI - Fundo de Apoio à Inovação - não ter considerado a proposta do Municipio de (...) como elegivel aos incentivos financeiros a que se candidatou, terá resultado de factos e factores objetivos, não podendo pois ficar dependente e condicionado pelo posicionamento do Municipio em procedimento diverso decorrente de diferentes compromissos.

Na realidade, a argumentação predominantemente conclusiva inserta no Recurso Jurisdicional do Municipio não poderá justificar qualquer inflexão na decisão adotada em 1ª instância.

Como se afirmou já, quaisquer eventuais prejuízos meramente pecuniários, se fosse caso disso, sempre seriam ressarcíveis perante a eventual procedência da Ação principal.

Aqui chegados, não merece censura a decisão recorrida ao considerar que se não mostra preenchido o pressuposto do Periculum in mora, o que só por si faz soçobrar a pretensão do Recorrente, uma vez que os requisitos e pressupostos a preencher o são cumulativamente.
***
Acresce a tudo quanto precedentemente ficou dito e que foi argumentativamente esgrimido entre as partes nos seus articulados, que relativamente à Recorrente/Município, vem requerida a suspensão de um ato negativo, o que só por si comprometeria irremediavelmente as suas pretensões, pois que a eventual suspensão da decisão controvertida do FAI não teria a virtualidade de determinar a satisfação da pretensão do Município aqui Recorrente.

Recorda-se que vem requerida “a suspensão da eficácia da deliberação adotada pela Comissão Executiva, a 22/05/2019, que manteve a decisão de não elegibilidade da candidatura por si apresentada (...)”, pelo que, mesmo que se suspendesse a referida decisão, tal facto não alteraria, por natureza, a situação de não elegibilidade da candidatura do Município de (...)

Como se sumariou no Acórdão do TCAN nº 02210/11.6BEPRT, de 08-03-2012, e se reiterou já mais recentemente no Acórdão igualmente deste TCAN nº 222/17.5BEVIS de 15-06-2018 “Um ato é de conteúdo puramente negativo se não produz qualquer modificação na ordem jurídica, mantendo inalterada a situação jurídica do administrado;
Tal ato não é suscetível de suspensão de eficácia, porque não tem qualquer efeito modificativo da situação jurídica preexistente, nada havendo a suspender”.

Igualmente se sumariou no Acórdão deste TCAN nº 02379/15.0BEBRG, de 21-10-2016 que “É de excluir a possibilidade da suspensão da eficácia de atos puramente negativos, insuscetíveis de perturbar as situações pré-existentes.”

De resto, como resultou demonstrado, o Recorrente não logrou comprovar a existência, em concreto, de quaisquer danos ou prejuízos de difícil reparação advindos da não adoção da presente providência cautelar.

Independentemente de tudo quanto se afirmou, importa reiterar que estando-se em presença de um pedido de suspensão de um ato negativo, consubstanciado na não elegibilidade da candidatura do aqui Recorrente, qualquer que fosse a decisão cautelar, tal não teria a virtualidade de determinar a elegibilidade da candidatura do Município de (...).

IV - DECISÃO
Deste modo, em conformidade com o precedentemente expendido, acordam os Juízes que compõem a Secção de Contencioso Administrativo do presente Tribunal Central Administrativo Norte, ainda que com fundamentação não integralmente coincidente, em negar provimento ao Recurso, confirmando-se a decisão recorrida.

Custas pelo Recorrente

Porto, 30 de abril de 2020

Frederico de Frias Macedo Branco
Nuno Coutinho
Ricardo de Oliveira e Sousa