Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00039/03-Porto
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:04/30/2015
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Cristina Travassos Bento
Descritores:AGREGADO FAMILIAR
NOTIFICAÇÃO DA LIQUIDAÇÃO DE IRS A UM DOS CÔNJUGES
INEXIGIBILIDADE DA DÍVIDA EXEQUENDA
Sumário:I - Tendo a liquidação do imposto por objecto pessoas singulares, no caso contribuintes casados, a lei determina, em sede de IRS, que o imposto devido é o conjunto de rendimentos do agregado familiar.
II – A noção legal de agregado familiar é dada pela lei civil, à qual se vai buscar as regras por que se devem regular os cônjuges, na salvaguarda da unidade familiar, o que impõe presumir, como principio, que o agregado familiar é composto pelos cônjuges que tem uma residência de família adoptada, de comum acordo.
III - O IRS liquidado a agregado familiar, onde se englobam desde logo os cônjuges, tem como sujeitos passivos ambos os cônjuges, e a respectiva liquidação pode ser validamente notificada a qualquer um deles;
IV - Tendo a liquidação de IRS de 1997, sido notificada ao outro cônjuge, dentro do prazo de caducidade, tem de se considerar que a dívida exequenda é exigível, relativamente à oponente.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:Fazenda Pública
Recorrido 1:L...
Decisão:Concedido provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os Juízes da Secção do Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

1.Relatório

A Fazenda Pública, interpôs recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, dado esta ter julgado procedente a oposição deduzida, por L..., contra a execução fiscal nº 3581200201517449, instaurada para cobrança de dívida de IRS do ano de 1997.

A Recorrente terminou as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões:

A. Em 14.01.2002 foi A..., cônjuge da oponente, notificado das alterações efectuadas à declaração de rendimentos do ano de 1997 e para, querendo, exercer o respectivo direito de audição;

B. Em 28.01.2002, A..., exerceu esse direito de audição;

C. Por carta datada de 25.06.2002, A..., foi notificado das alterações efectuadas à declaração modelo 3 de IRS do ano de 1997 e para, querendo, reclamar ou impugnar o acto de liquidação;

D. A declaração de rendimentos modelo 3 do ano de 1997, identifica como sujeitos passivos, A... e L...;

E. A oponente, em 1997, era casada com A...;

F. Em 2003, confessadamente, a oponente continua casada com o co-executado no regime de comunhão de adquiridos.

G. A liquidação adicional de IRS 1997, com origem na correcção à matéria colectável efectuada pela AF, foi notificada ao sujeito passivo A, que é o marido da oponente.

H. Preceitua o n° 2 do artigo 14° do CIRS que: “Existindo agregado familiar, o imposto é devido pelo conjunto dos rendimentos das pessoas que o constituem, considerando-se como sujeitos passivos aquelas a quem incumbe a sua direcção.”

I. Ora, no caso sub judice, são sujeitos passivos integrantes do mesmo agregado familiar a oponente e seu marido A....

J. A Administração Fiscal está legalmente vinculada a tributar as mais valias sujeitas a tributação provenientes de ambos os sujeitos passivos pertencentes a um mesmo agregado familiar, no seio desse mesmo agregado familiar e não enquanto sujeitos passivos autónomos.

K. Por isso foi notificado o sujeito passivo A, a quem incumbe a direcção do agregado familiar de que a oponente fazia parte em 1997 e nos anos seguintes.

L. A notificação que oportunamente foi efectuada ao marido, dessa liquidação, não pode deixar de abranger a ora oponente, por qualquer dos cônjuges poder praticar todos os actos relativos à situação tributária do agregado familiar, sendo válida e regular a notificação da liquidação efectuada em qualquer um deles.

M. Não se impunha à Administração Fiscal o dever legal de proceder cumulativamente à notificação do sujeito passivo A (como sucedeu) e da ora oponente, enquanto sujeito passivo B do mesmo agregado familiar, para que esta última se possa considerar notificada, de onde errou a douta sentença recorrida ao decidir que a notificação efectuada em nome de A..., e ineficaz em relação a oponente.

N. Deve-se considerar também a oponente como válida e eficazmente notificada dentro do prazo de caducidade aplicável ao imposto em causa.

O. Ao ser exigida a notificação a ambos os Sujeitos Passivos estar-se-ia a desvirtuar as normas tributárias relativas ao Agregado Familiar, mais concretamente o Art.° 13 do CIRS e o Art.° 16 da LGT bem como as razões de certeza, segurança e paz jurídica.

Nestes termos, e nos melhores de Direito,

Sempre com o douto suprimento de V. Exªs,

deve o presente recurso ser julgado procedente e revogada a douta sentença de que se recorre, substituindo-a por outra que julgue a notificação da liquidação do imposto aqui em causa como válida e eficazmente efectuada, relativamente à ora oponente, dentro do respectivo prazo de caducidade.“

A Recorrida, Fazenda Pública, não apresentou contra – alegações.

Remetidos os autos a este Tribunal Central Administrativo Norte, foram os mesmos com Vista o Exmo Procurador-Geral Adjunto que emitiu Parecer no sentido de ser concedido provimento ao recurso.

Colhidos os vistos legais junto dos Exmos. Juízes-Adjuntos, vem o processo à Conferência para julgamento.

Objecto do recurso - Questões a apreciar e decidir:
A questão suscitada pela Recorrente, delimitada pelas alegações de recurso e respectivas conclusões (nos termos dos artigos 660º, nº 2, 684º, nº s 3 e 4, actuais 608, nº 2, 635º, nº 4 e 5 todos do CPC “ex vi” artigo 2º, alínea e) e artigo 281º do CPPT) é saber se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento ao julgar procedente a oposição, determinando a extinção da execução fiscal relativamente à oponente, agora recorrida, por ter concluído que a dívida lhe era inexigível.

II. Fundamentação

II.1. De Facto
O Tribunal a quo decidiu, a matéria de facto, da seguinte forma:

“Com interesse para a decisão, resulta dos autos os seguintes factos provados:

1 - Para cobrança da dívida exequenda de IRS do ano de 1997, foi instaurada a execução fiscal 3581200201517449.
2 - A execução fiscal identificada em 1), tem por base a certidão de dívida constante destes autos a fls.38 e que aqui se dá por reproduzida.
3 - Em 11.02.2003 foi emitido o aviso de citação para pagamento da dívida em trinta dias em nome de “A…”, cfr. fls. 38 verso e fls. 9 e que aqui se dão por reproduzidas.
4 - Por carta datada de 14.01.2002 foi, A..., notificado das alterações efectuadas à declaração de rendimentos do ano de 1997 e para, querendo, exercer o direito de audição nos termos constantes de fls. 7 do PA e que aqui se dá por reproduzida.
5 - Em 28.01.2002. A..., exerceu o direito de audição nos termos constantes de fls.13 a 16 e que aqui se dão por reproduzidas.
6 - Por carta datada de 25.06.2002, A..., foi notificado das alterações efectuadas à declaração modelo 3 de IRS do ano de 1997 e para querendo, reclamar ou impugnar o acto de liquidação.
7 - A declaração de rendimentos modelo 3 do ano de 1997, identifica como sujeitos passivos, A... e L..., conforme fls. 9 e 10 do PA e que aqui se dão por reproduzidas.
8 – A oponente em 1997 era casada com A..., cfr. fls. 9 do PA.
Alicerçou-se a convicção do Tribunal na consideração da matéria de facto dada como assente, nos factos alegados e não impugnados e nos documentos acima identificados e não impugnados.
FACTOS NÃO PROVADOS:
Inexistem, com interesse para a presente decisão.”

II.1.1 Ao abrigo do disposto no artigo 662º, nº1 do Código de Processo Civil (CPC), aplicável ex vi artigo 2º, alínea e), e 281º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), acorda-se em alterar o ponto 4 e aditar os pontos 9, 10 e 11, nos termos que se seguem:

4 - Em 16.01.2002 foi, A..., notificado, por correio postal registado com aviso de recepção, na Rua…, 4415 Pedroso para, querendo, exercer o direito de audição, às alterações à declaração de rendimentos do ano de 1997, de acordo com folhas 7 e 8 do PA e nos termos constantes daquela folha 7 do PA, que aqui se dá por reproduzida.
9 – A declaração de rendimentos respeitante ao ano de 1997 foi entregue em 11.10.2001, pelos sujeitos passivos A... (sujeito passivo A), com o NIF 1…e L... (sujeito passivo B), com o NIF 1…, no estado civil de casados;

10 - A presente oposição deu entrada no Serviço de Finanças de Vila Nova de Gaia em 19.03.2003;

11 – À data da interposição da oposição a oponente era casada com o co-executado A.... – cfr. confissão da recorrida no artigo 6º da p.i. de oposição

II.2. De Direito

II.2.1. A única questão suscitada, no recurso interposto pela Fazenda Pública, é saber se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento ao considerar que a dívida de IRS do ano de 1997, em cobrança no processo de execução fiscal 3581200201517449, não era exigível à oponente, agora recorrida, por a mesma não ter sido notificada da liquidação do imposto.
A sentença recorrida para decidir nos termos em que o fez, alicerçou-se no discurso jurídico, que agora parcialmente se transcreve: “Conforme resulta da matéria de facto dada como assente, a dívida exequenda tem por base uma liquidação adicional de IRS do ano de 1997 efectuada em seguimento às correcções do anexo G da declaração de rendimentos.
Dos documentos juntos aos autos, conclui-se que as notificações remetidas no âmbito do procedimento administrativo de liquidação, foram direccionadas apenas ao sujeito passivo A, ou seja, em nome de A....
O referido A..., é casado com a ora oponente em regime de comunhão de adquiridos (facto que não foi colocado em causa pela Fazenda Pública).
Na certidão de dívida que deu lugar à instauração da execução, verifica-se que a oponente, consta como co- executada.
Defende a oponente, que a dívida não lhe é exigível, porquanto nunca foi notificada da liquidação, designadamente, para exercer o direito de audição.
Ora vejamos,
O n.° 3 do artigo 268.° da C.R.P., sob a epígrafe “Direitos e garantias dos administrados”, estabelece que “os actos administrativos estão sujeitos a notificação aos interessados, na forma prevista na lei”, sendo o direito à notificação uma garantia procedimental não impugnatória dos contribuintes (cfr. JOSÉ CASALTA NABAIS, Direito Fiscal, 5.° ed., Coimbra, Almedina, 2009, p. 370), que se destina não apenas a levar ao seu conhecimento o acto praticado, como também a permitir-lhes reagir contra ele em caso de discordância.
Este entendimento encontra consagração legal, no n.° 1 do artigo 36.° do CPPT, onde se diz o seguinte: “os actos em matéria tributário que afectem os direitos e interesses legítimos dos contribuintes só produzem efeitos em relação a estes quando lhes sejam validamente notificados”.
O que quer dizer, que a notificação dos actos em matéria tributária que afectem direitos e interesses legítimos, é condição da sua eficácia em relação aos notificados.
No que concerne a esta matéria, importa atentar no que diz o n° 6 do art° 77 da LGT, onde se refere que a eficácia da decisão do procedimento tributário depende da notificação.
No caso dos autos, e conforme resulta da certidão de dívida, verifica-se que a oponente é co-executada.
Por outro lado, diz-se que a dívida é exigível quando se verifique a falta de cumprimento voluntário da obrigação, falta que, evidentemente, só vem a verificar-se depois do respectivo vencimento.
E para que o sujeito passivo entre em mora, necessário se torna que a notificação tenha sido eficaz, no sentido de dela ter havido efectivo conhecimento, e regular, no sentido de terem sido cumpridas todas as formalidades legalmente impostas para o efeito.
Assim sendo, e atento o acima descrito, conclui-se que esta exigência de notificação é uma condição de eficácia, dos actos com eficácia externa.
No caso concreto, a tendo por base a matéria de facto dada como assente, conclui-se que a liquidação adicional do IRS, bem como os procedimentos administrativos anteriores à liquidação adicional, não foram notificados à ora oponente.
Os fundamentos de oposição são os prescritos nas diversas alíneas do art° 204° n° 1 do CPPT e percorrendo-as, verifica-se que a oposição pode ter por fundamento a falta da notificação da liquidação do tributo no prazo de caducidade”(alínea e).
Estamos em face de um dispositivo inovador face ao anterior CPT; a caducidade do direito à liquidação contendia com a legalidade dessa liquidação e, face ao anterior CPT, tal questão (caducidade), só poderia ser conhecida no processo de impugnação.
Não obstante, o que constitui agora fundamento de oposição é, não a caducidade do direito à liquidação em si, mas apenas e tão só, a falta de notificação da liquidação dentro do prazo de caducidade.
Neste sentido, cita-se o Exmo. Conselheiro Jorge de Sousa, em anotação efectuada ao art°204° do CPPT, no código anotado e comentado, pág. 359 e 360, volume II, 5° edição, onde se diz o seguinte: “ à face desta alínea e), torna-se agora claro que a falta de notificação afecta a eficácia do acto de liquidação e não a sua validade, pelo que é na oposição que, em princípio, deve ser invocada essa falta de notificação. (…)” E a seguir diz-se ainda o seguinte: “se é instaurada uma execução fiscal e não foi efectuada notificação válida do acto de liquidação, o contribuinte pode sempre opor-se à execução ao abrigo da alínea i) do n° 1 deste artº 204°, invocando a ineficácia do acto, que impede que a dívida seja exigível; é indiferente para este efeito, que o acto de liquidação enferme de qualquer vício, inclusivamente o da extemporaneidade da liquidação: (...) se foi instaurada uma execução e foi efectuada notificação válida do acto de liquidação, mas a notificação foi efectuada fora do prazo de caducidade previsto no art° 45°, n°1 da LGT (...), o contribuinte pode opor-se à execução ao abrigo da alínea e) do n° 1 deste art°204°;”.
No caso concreto, e tendo por base a matéria de facto dada como assente, conclui-se que a liquidação adicional do IRS, bem como os procedimentos administrativos anteriores à liquidação adicional, não foram notificados à ora oponente.
Assim, e atento ao que se acaba de expor é de concluir que a notificação efectuada em nome de A..., é ineficaz em relação à oponente, e como tal os fundamentos aduzidos na petição inicial integram-se na alínea i) do n° 1 do art°204° do CPPT.
Face ao que se acaba de decidir, fica prejudicado o conhecimento das restantes questões suscitadas. ”

Apreciemos:


Em sede de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS), e para efeitos de determinação do rendimento colectável, os sujeitos passivos devem apresentar uma declaração de modelo oficial, relativamente aos rendimentos do ano anterior.

No caso de contribuintes casados, nos termos do artigo 57º e 59º do CIRS, aplicáveis ao tempo, devia ser apresentada uma única declaração pelos dois cônjuges. Dito de outra forma, existindo o chamado agregado familiar, que nos termos do antigo artigo 14º, nº 3 do CIRS, agora artigo 13º, se considerava constituído, desde logo, pelos cônjuges não separados judicialmente de pessoas e bens, devia ser apresentada uma única declaração pelos dois cônjuges.

Também, em sede de incidência pessoal do IRS, o artigo 14º, nº 2 do CIRS, estabelecia que aquele imposto era devido pelo conjunto de rendimentos das pessoas que constituíam o agregado familiar (agora artigo 13º, nº 2), e que a existência do chamado “quociente conjugal”, de acordo com o ínsito na redacção, ao tempo, do artigo 72º, nº 1 do CIRS, no caso de sujeitos passivos casados e não separados judicialmente de pessoas e bens, se traduzia em as taxas aplicáveis serem as correspondentes ao rendimento colectável dividido por 2.

Deste modo, é de concluir que, neste contexto, ou seja, na existência de sujeitos passivos casados e não separados judicialmente de pessoas e bens, existiria uma só liquidação para o conjunto dos rendimentos.

Liquidação, que nos termos do artigo 78º, nº 2 e 81 do CIRS, na redacção aplicável ao caso, podia ser corrigida nos cinco anos subsequentes.

Ora, no caso sub judice, existiu uma correcção à liquidação, dentro dos cinco anos subsequentes, como resultou da matéria dada como provada, pelo que importará apurar o regime legal da sua notificação.

Determinava o artigo 149, nº 1 e 2, do referido Código, na redacção aplicável, que as notificações a que se reportava o artigo 66º, também ele do IRS, (as que se referem a actos de fixação ou alteração previstos no artigo 65º) quando efectuadas por via postal deviam ser feitas no domicílio fiscal do notificando, por meio de carta registada com aviso de recepção.

No caso dos autos, e de acordo com a matéria de facto, a liquidação foi notificada ao cônjuge da oponente, no domicílio fiscal de ambos.

Como mencionado no douto acórdão do TCA Sul, de 18.12.2008, no processo nº 02479: ”atentos o princípio da coerência que deve enformar o sistema jurídico, permitindo uma articulação harmoniosa dos diferentes ramos do direito que o integram, quando da utilização do mesmo tipo de conceitos, sempre que, deles, não seja, especificamente, dada uma noção diversa, temos de entender que a noção de “agregado familiar”, acima referida, ainda que mais extensa, comporta em si a noção que de “família”, do ponto de vista restrito e enquanto resultante do casamento, é dada pela lei civil.
- Ora, se é certo que o Código Civil, após a reforma operada pelo Dec.-Lei nº. 496/77NOV25, e no acatamento do imperativo constitucional, viu revogado o seu artigo 86º, o qual dispunha sobre o domicílio legal da mulher casada (que era, até então e por princípio, o do marido) atento o princípio da igualdade de direitos entre os cônjuges contemplada na constituição, a verdade é que não deixou de continuar a vincular, qualquer dos cônjuges, entre outros e ao que aqui releva, ao dever de coabitação o que vale por dizer que, por princípio e salvo casos de excepção, que, por isso mesmo terão de ser demonstrados por quem aproveite, os cônjuges estão obrigados, como refere Abel P. Delgado (1), com relevância actual, «[...] a viver em comum, a viverem juntos, sob o mesmo tecto, enfim a viverem na residência da família», sob pena de darem causa a divórcio litigioso».

- E nesta linha de entendimento surge o artº. 1673º do C.Civil, nos termos do qual se definem as regras por que, por princípio, se devem regular os cônjuges na salvaguarda da unidade familiar, para o que deverão adoptar a residência de família, a escolher, em primeira linha, de comum acordo.”


No caso em apreço, é um dado assente que a recorrida era esposa de A... à data de 11.10.2001, e que foi nessa circunstância que, em conjunto, ambos os cônjuges entregaram a declaração de rendimentos do ano de 1997, indicando como domicílio do agregado familiar a Rua…, 4415 Pedroso.

Por sua vez, esse foi o domicílio fiscal para onde foi endereçada a notificação para audiência prévia do cônjuge da oponente, e, para onde foi remetida a notificação da liquidação do imposto exequendo – cfr. ponto 4 e 6 da matéria de facto dada como provada.

Não tendo a recorrida colocado em crise a existência do agregado familiar, pelo menos desde 1997, nem a residência conjunta indicada aquando da entrega da declaração de IRS, (recorde-se que nos termos do artigo 19º, nº 1 da LGT, o domicílio fiscal do sujeito passivo salvo disposição em contrário, quando se trata de pessoas singulares, corresponde ao local da residência habitual), é de presumir que a residência habitual do agregado familiar composto por ambos os cônjuges (A... e L...) é a mesma, ou seja, é o domicílio, para onde veio a ser remetido o expediente postal destinado à notificação da liquidação em que foram apurados os montantes exequendos

Assim sendo, não era de exigir, à Administração Tributária, nestas concretas circunstâncias, que emitisse dois actos de liquidação, ou seja, duas vias da mesma liquidação com igual conteúdo, dirigido a cada um dos cônjuges.

Desta modo é de considerar, relativamente à recorrida, validamente efectuada a notificação da liquidação, de IRS de 1997.

Mas não basta que a notificação tenha sido válida para que a dívida se torne exigível, é necessário que ela tenha sido notificada dentro do prazo de caducidade.
De acordo com o ínsito no artigo 5º, nº 5 do DL 398/98 de 17 de Dezembro, que aprovou a LGT, “O novo prazo de caducidade do direito de liquidação dos tributos aplica-se aos factos tributários ocorridos a partir de 1 de Janeiro de 1998”.

Uma vez que o facto tributário, no caso em análise é anterior a 1998 (1997), o prazo de caducidade do direito à liquidação era de cinco (5) anos – artigo 33º do Código de Processo Tributário - , terá de se concluir que a notificação da liquidação foi efectuada ainda dentro daquele prazo(2002) – cfr. ponto 6 da matéria de facto.

Deste modo, será de considerar exigível a dívida exequenda, também relativamente à recorrida/oponente, pelo que mal andou a sentença do tribunal a quo que decidiu em sentido diverso.

Em face do exposto, não pode a sentença recorrida manter-se na ordem jurídica, sendo, por isso de conceder provimento ao recurso.

II.2.2 A procedência do recurso acarreta que este Tribunal Central Administrativo do Norte, em regime de substituição, conheça dos restantes fundamentos da presente oposição e que não tenham sido apreciados pela decisão de 1.ª instância, por prejudicado o seu conhecimento à luz da solução que, ali, foi encontrada.

No caso vertente, a recorrida, no seu articulado inicial, esgrimiu ainda com a falta da sua notificação para efeitos de audição prévia, falta de citação e a nulidade daí decorrentes, nos termos e para os efeitos do artigo 165º, nº1, alínea a) do CPPT e, por fim, com a ilegalidade em concreto da liquidação da quantia exequenda.

No que diz respeito à falta da sua notificação para efeitos de audiência prévia, uma vez que ela não colide com a eficácia dos actos de liquidação mas, eventualmente, com a sua legalidade, se concretizada com a violação do princípio da participação dos interessados, é patente que ela não pode constituir fundamento adequado do processo de oposição fiscal, uma vez que a lei lhe facultou, desde sempre, a possibilidade de reagir contra o acto final devido, isto é, contra o acto tributário, através do processo de impugnação judicial. E, mutatis mutantis se diga para a alegação referente à ilegalidade em concreto da liquidação das quantias exequendas.

Por último, importa referir que também a eventual irregularidade processual consistente na falta de citação para a execução fiscal a que se reportam os presentes autos, é matéria que apenas é susceptível de ser apreciada em sede de oposição fiscal a título meramente incidental e enquanto pressuposto de apreciação da tempestividade de tal meio processual. No mais, tal vício de forma constitui questão com sede de apreciação na própria execução fiscal, não constituindo fundamento subsumível a qualquer uma das alíneas do n.º 1, do art.º 204.º, do CPPT.

Destarte, improcedendo as alegações da oponente, é de julgar improcedente a oposição deduzida.

II.2.3 Preparando a decisão, formulam-se as seguintes conclusões:

1. Tendo a liquidação do imposto por objecto pessoas singulares, no caso contribuintes casados, a lei determina, em sede de IRS, que o imposto devido é o conjunto de rendimentos do agregado familiar.

2. A noção legal de agregado familiar é dada pela lei civil, à qual se vai buscar as regras por que se devem regular os cônjuges, na salvaguarda da unidade familiar, o que impõe presumir, como principio, que o agregado familiar é composto pelos cônjuges que tem uma residência de família adoptada, de comum acordo.

3. O IRS liquidado a agregado familiar, onde se englobam desde logo os cônjuges, tem como sujeitos passivos ambos os cônjuges, e a respectiva liquidação pode ser validamente notificada a qualquer um deles;

4. Tendo a liquidação de IRS de 1997, sido notificada ao outro cônjuge, dentro do prazo de caducidade, tem de se considerar que a dívida exequenda é exigível, relativamente à oponente.

III- Decisão

Termos em que, acordam os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte em conceder provimento ao recurso, revogando a sentença recorrida, e julgando em substituição julgar a oposição improcedente.
Custas pela recorrida, em 1ª instância.
Porto, 30 de Abril de 2015
Ass. Cristina Travassos Bento
Ass. Paula Moura Teixeira
Ass. Mário Rebelo