Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01321/08..0BEBRG
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:09/16/2021
Tribunal:TAF de Braga
Relator:Paulo Moura
Descritores:CERTIDÃO DE DÍVIDA; TÍTULO EXECUTIVO; ATO ADMINISTRATIVO DE REPOSIÇÃO DE SUBSÍDIO;
NÃO PODE SER CONHECIDO EM SEDE DE OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO FISCAL.
Sumário:I - A certidão de dívida, tem a função de título executivo, nas situações em que é determinado o pagamento de quantia certa por ato administrativo.

II - A falsidade do título executivo, alegada com base na incompetência de quem praticou o ato administrativo de reposição de quantias, não pode apreciada em sede de Oposição, uma vez que implica apreciar a legalidade do ato administrativo; o que deve ser efetuado em ação própria.

III - Verificando-se que a certidão de dívida pretende identificar como devedora a Recorrente, uma vez que era sócia da sociedade e promotora do projeto, é a Oponente parte legítima na Execução Fiscal.
Recorrente:N.
Recorrido 1:Instituto de Emprego e Formação Profissional
Votação:Unanimidade
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência os Juízes Desembargadores que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:
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N., interpõe recurso da sentença que julgou improcedente a Oposição deduzida contra a execução fiscal instaurada por dívidas ao Instituto de Emprego e Formação Profissional.

Formula nas respetivas alegações as seguintes conclusões que se reproduzem:

1. A recorrente entende que o processo executivo padece de nulidade, por falta de título executivo.
2. Aquando da entrega da nota de citação à recorrente, aquela não fazia qualquer referência à entrega a qualquer dos executados de título executivo, que servia de base á execução. Nunca tendo a recorrida recebido, no acto da citação, nem posteriormente, qualquer titulo executivo. Ora, nos termos do artº 45 nº 1 do CPC “toda a execução tem por base um título pelo qual se determina o fim e os limites da acção executiva.”
3. Correspondendo o título executivo corresponde à causa de pedir, a sua falta é cominada com a nulidade de todo o processo por ineptidão da petição inicial, como decorre da al. a) do nº 2 do artº 193º do CPC.
4. Não podia o Tribunal a quo dar como provados os pontos 5 e 6 da matéria de facto provada, ou seja, não podia o Tribunal ter interpretado o Termo de Responsabilidade como o fez, pois que não poderia imputar à recorrente uma divida que pertence, única e exclusivamente, à sociedade F., Lda
5. Na verdade, do documento 11 junto com a petição inicial, ou seja, da constituição da sociedade, resulta que a devedora ao IEFP é a sociedade F. L.da, representada pelos seus sócios e promotores N. e R., aliás constituída previamente ao requerimento de concessão de incentivos. Sendo a devedora a sociedade comercial referida, aqueles N. e R., são apenas seus sócios e gerentes, e é óbvio que não são eles os devedores, pois que, a sociedade comercial referida é pessoa jurídica distinta dos seus sócios.
6. De facto, o título indica quem é o próprio devedor, a referida sociedade F., curiosamente contra a qual não é conhecida a instauração de qualquer execução.
7. Aquela certidão, “certifica” “que a sociedade F. Ldª, …, representada pelos sócios e promotores N. e R.… e C. e M., na qualidade de fiadores, devem a este organismo a quantia de 49.616,15€…” E tanto assim é que como consta do doc. 5 junto com a petição inicial, e designadamente do seu ponto 6, o apoio financeiro foi concedido á sociedade F. e não à recorrente.
8. Ora, é sabido que os sócios e gerentes de uma sociedade, não respondem, directa e imediatamente pelas dívidas desta.
9. E a sua responsabilidade pessoal enquanto tais, apenas pode resultar do instituto fiscal da reversão, ou das relações anteriores á celebração do contrato de sociedade, previstas no art. 36º do C.S.C. Coisa que jamais o IEFP invocou, como decorre da notificação para reembolso junta à petição inicial como documento 7.
10. Acresce que, por opção da F., documentada no processo de candidatura, esta optou, pela aplicação dos regimes contidos nos diplomas e preceitos revogados pela portaria 196-A/2001 de 10 de Março, ao abrigo do seu art. 33º, mantendo a “vigência” in casu, do DL 189/86 de 8/10. Mas isto só foi possível por inabilidade do IEFP, uma vez que, este último diploma não prevê, senão a criação da sociedade posteriormente à aprovação da candidatura, esta sim promovida por pessoas individuais, cfr. nº 2 do art. 8º, a fazer imperativamente.
11. Sendo a F. a requerente dos incentivos, a própria promotora do projecto de investimento que os confere, obviamente não podem ser promotores os sócios desta ou os seus gerentes. E o regime aplicável sempre será e apenas poderá ser, o da portaria referida 196-A/2001, que permite e prevê que os candidatos aos incentivos sejam sociedades comerciais constituídas.
12. O que, tendo por base todo o sobredito, determina a falsidade do título executivo, por não corresponder com o quadro fáctico e normativo subjacente, não podendo o processo executivo seguir os seus termos legais.
13. De facto, e em face da al. b) do art. 204º do CPPT, não restam dúvidas da ilegitimidade da pessoa citada, neste caso a recorrente, porquanto não é ela a própria devedora que figura no título, mas antes a sociedade comercial F., nem ser responsável pela divida
14. Uma vez que, esta apenas figurava representante a titulo de sócia e promotora, da dita sociedade comercial F., Industria de calçado, Lda NIF (...), com sede na Av.ª (...), e não como devedora.
15. E como tal, não poderá ser demandada em sede executiva.
16. Acresce ainda que, aquando da concessão do subsídio pretendido cobrar, o recorrido, exigiu à sociedade F., a subscrição de um termo de responsabilidade já junto aos autos com a petição inicial, como documento 5, pelo qual declarou que atribui a F. Lda, (…) um apoio financeiro…
17. Desse mesmo termo de responsabilidade, mas no seu nº 1, resulta que a beneficiária é a sociedade, e tanto assim é que o termo de reconhecimento das assinaturas, ressalta a qualidade de gerentes daquela sociedade em que intervieram. 18. Não sendo, até ao momento, conhecida qualquer iniciativa de reversão, nem sequer qualquer preenchimento dos respectivos pressupostos. 19. Sendo a devedora a sociedade comercial referida, e aqueles N. (ora recorrente) e R., apenas e alegadamente seus sócios, é óbvio que não são eles nem os promotores nem os devedores. 20. Violou o Tribunal a quo, o disposto nos artigos 45º nº 1 al. a) e 193º/2 do CPC, bem como o artigo 36º do C.S.C.

Termos em que V/Exas., Venerandos Desembargadores, decidindo em conformidade com o supra alegado, farão a costumada JUSTIÇA.

Não foram apresentadas contra-alegações.

O Ministério Público emitiu parecer no sentido de o recurso ser julgado improcedente.

Foram dispensados os vistos legais, nos termos do n.º 4 do artigo 657.º do Código de Processo Civil, com a concordância das Exmas. Desembargadoras Adjuntas, atenta a disponibilidade do processo na plataforma SITAF (Sistema de Informação dos Tribunais Administrativos e Fiscais).
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Delimitação do Objeto do Recurso – Questões a Decidir.

As questões suscitadas pela Recorrente, delimitada pelas alegações de recurso e respetivas conclusões [vide artigos 635.º, n.º 4 e 639.º CPC, ex vi alínea e) do artigo 2.º, e artigo 281.º do CPPT] são as de saber: (A) se a incompetência do Diretor do Centro de Emprego, pode ser apreciada na Oposição; (B) se há falta de título executivo; (C) se existe falsidade do título executivo; e (D) se a Oponente é parte ilegítima na execução.
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Relativamente à matéria de facto, o tribunal, deu por assente o seguinte:

FACTOS PROVADOS:

Pelos documentos juntos aos autos, não impugnados, com relevância para o caso, considero provados os seguintes factos:
1. Foi instaurada execução fiscal n° 1775 2008 01012959 contra a Oponente por dívida referente a um apoio financeiro que foi concedido a F., Lda., pelo Instituto de Emprego e Formação Profissional, Delegação de Felgueiras, e respectivos juros de mora, no montante total de 49 619.15 € e acrescidos legais;
2. Em 01.04.2008, foi emitido a certidão de dívida, pelo Centro de Emprego de Felgueiras, o constante de fls. 12 dos autos, documento que aqui se dá por integralmente reproduzido;
3. No âmbito desse apoio financeiro, foi assinado um documento designado "Termo de Responsabilidade", datado de 21.12.2001, constante de fls. 15/17 dos autos;
4. A cláusula n° 11, do referido Termo, consta que, "O promotor da iniciativa, mencionados no n° 1 deste documento, beneficiário do apoio financeiro, é responsável pelo reembolso do referido apoio. No caso de vir a constituir uma sociedade, cooperativa ou associação, fica ainda obrigado a efectuar a transmissão da dívida para aquelas, nos termos do art.º 595º do Código Civil, não ficando por isso ilibados de responder individualmente à dívida";
5. No artigo n° 1 é identificado a sociedade F., Lda. com NIPC (...), com sede na Av. (…), e como promotores a Oponente e R.;
6. O Termo de responsabilidade foi assinado pela Oponente e R., na qualidade de beneficiários;
7. Por despacho da Sr.ª Directora do Centro de Emprego de Felgueiras do IEFP, de 25.09.2007, foi determinado a conversão do subsídio recebido não reembolsável em subsídio reembolsável, conforme consta de documento de fls. 24 e 25 que aqui se dá por integralmente reproduzido;
8. Por ofício n° 8572 DNEPF, datado de 25.09.2007, foi a Oponente notificada do despacho de 25.09.2007, conforme consta de fls. 20 e 21 dos autos;
9. A F., foi constituída em Cartório Notarial de Celorico de Bastos, em 22.12.2000, tendo por sócios a Oponente e R. (fls. 29 a 31 dos autos);
10. Em 30.07.2008, a Oponente foi citada, para proceder ao pagamento da dívida, nos termos do documento de fls. 11 dos autos;
11. A citação foi acompanhada de certidão de dívida, constante de fls. 12 dos autos que aqui se dá por integralmente reproduzida.

Alicerçou-se a convicção do Tribunal, quanto aos factos provados, na consideração e confronto dos documentos os colhidos pela administração fiscal e constantes do processo administrativo apenso.
Não resultam provados ou não provados outros factos com interesse para decisão.
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Apreciação jurídica do recurso.

Em primeiro lugar invoca a Oponente, ora Recorrente, que o despacho de delegação de competências e do regulamento especifico dos programas de incentivo ao emprego, consignado na Portaria n.º 196-A/2001 de 10 de março, que a competência para conversão de subsídios e declaração imediata de vencimento de dividas não foi objeto da delegação no Diretor do Centro de Emprego.
A este respeito a sentença referiu que se trata de matéria não passível de ser conhecida em sede de Oposição, mas antes em impugnação judicial autonomamente instaurada.
Conforme consta dos pontos 7 e 8 da matéria de facto, a Oponente foi notificada do despacho do Diretor do Centro de Emprego de 25/09/2007, que determinou a conversão do subsídio recebido não reembolsável, em subsídio reembolsável. Aliás, é a Oponente que junta o ofício que a notifica.
Ora, o referido despacho corresponde a um ato administrativo, pelo que caso pretendesse assacar qualquer invalidade ao ato de conversão, deveria ter sido nessa ocasião deduzida a competente ação judicial, que seria a Ação Administrativa Especial, prevista nos artigos 46.º e seguintes do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, na sua redação originária.
Refira-se, que na 2.ª página desse ofício estão indicadas as possibilidades de impugnação dessa decisão, conforme se pode ver pelo que consta no penúltimo parágrafo, que se transcreve:
«Da presente decisão poderá V.Exa., se assim o entender:
- reclamar para ao autor do acto, no prazo de 15 dias úteis, nos termos dos artigos 158°, n° 2, alínea a) e 162° do Código do Procedimento Administrativo (CPA);
- Interpor recurso hierárquico para o Conselho Directivo do IEFP, no prazo de 3 meses, nos termos dos artigos 158°, nº 2, alínea b) e 168°, nº 2 do CPA;
Ou reagir contenciosamente através dos Tribunais competentes.».
Desta forma, deveria ter sido nessa ocasião questionada a legalidade da decisão, pelo que não o tendo feito, é extemporânea a sua apreciação.

Mas ainda que fosse tempestiva a impugnação desse ato que ordena a devolução das verbas, não é possível conhecer na Oposição as eventuais ilegalidades do mesmo, uma vez que a lei possibilita, a quem seja citado, intentar a competente ação judicial para discussão da legalidade da dívida exequenda, conforme determina a alínea h) do n.º 1 do artigo 204.º do Código de Procedimento e Processo Tributário.
Por outro lado, na Oposição também não pode ser apreciada a legalidade concreta da dívida exequenda, conforme determina a alínea i) do n.º 1 do mesmo artigo 204.º do CPPT.
Veja-se sobre o assunto, o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, proferido em 05/11/2014, no processo n.º 01322/13 (disponível em www.dgsi.pt), cuja parte do sumário com interesse para o assunto em apreço se transcreve:
I - Decorre expressa e inequivocamente da letra da alínea h) do n.º 1 do artigo 204.º do CPPT que a ilegalidade da liquidação da dívida exequenda apenas constitui fundamento de oposição à execução fiscal quando a lei não assegure meio judicial de impugnação ou recurso contra o acto de liquidação, o que não sucede no caso dos autos em que a deliberação do IFADAP de rescisão unilateral do contrato era directamente impugnável, ao tempo por via de recurso contencioso de anulação e desde a entrada em vigor do Código de Processo nos Tribunais Administrativos por via de acção administrativa especial.

No mesmo sentido, temos o Acórdão deste TCA Norte de 06/12/2007, proferido no processo 00711/05.4BEBRG (disponível em www.dgsi.pt), cuja parte do sumário com interesse para o assunto em apreço se transcreve:

III - Saber se as quantias provenientes de apoios recebidos pela Executada do FSE e do Estado Português e cuja devolução lhe está a ser exigida coercivamente são ou não devidas constitui matéria que contende com legalidade em concreto da dívida exequenda (com a validade do acto que ordenou a devolução desses montantes), que não pode discutir-se em sede de oposição à execução fiscal, atento o disposto nas alíneas h) e i) do art. 204º, nº 1, do CPPT, pois tal discussão apenas é possível relativamente a dívidas que não tenham origem num acto administrativo-tributário (quanto a este, a lei prevê sempre meio judicial de impugnação ou recurso, como decorre do art. 268.º, n.º 4, da CRP).

Em face do exposto, improcede o recurso neste segmento.
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Alega a Recorrente que não existe título executivo, pois na nota de citação não se fazia qualquer referência à entrega de título executivo, que servisse de base à execução. Mais refere, que a falta de título executivo, comina com nulidade todo o processo.

Vejamos.
Conforme já referido, está aqui em causa a execução de um ato administrativo que ordena a reposição de quantia certa.
Há data dos factos (e ainda hoje) era possível realizar o pagamento de quantia certa determinada por ato administrativo, conforme dispunha o artigo 155.º do Código de Procedimento Administrativo, que se transcreve:

Artigo 155.º (Execução para pagamento de quantia certa)
1 - Quando, por força de um acto administrativo, devam ser pagas a uma pessoa colectiva pública, ou por ordem desta, prestações pecuniárias, seguir-se-á, na falta de pagamento voluntário no prazo fixado, o processo de execução fiscal regulado no Código de Processo Tributário.
2 - Para o efeito, o órgão administrativo competente emitirá nos termos legais uma certidão, com valor de título executivo, que remeterá, juntamente com o processo administrativo, à repartição de finanças do domicílio ou sede do devedor.

Para além desta previsão geral, no caso concreto encontrava-se previsto no Decreto-Lei n.º 437/78, de 28 de dezembro, o regime relativo à emissão de título executivo, para as situações de concessão de apoios financeiros pelo estado, cujo regime se transcreve de seguida:
Artigo 4.º
1 - Para cobrança coerciva dos créditos resultantes do apoio financeiro concedido nos termos do artigo 1.º, constitui título executivo a certidão de dívida passada pelo serviço processador, acompanhada do despacho de concessão e do impresso referido no artigo 3.º.

Verifica-se, assim, que a certidão que certifica a dívida, tem o mesmo valor de título executivo, pelo que a execução fiscal pode ser instaurada com base nessa certidão de dívida.
No caso em apreço, não existe uma referência a um título executivo, mas antes a uma certidão de dívida, que tem o mesmo valor de título executivo.
Veja-se o que diz a Nota de Citação, de que transcreve o conteúdo integral:
«Para cumprimento de um mandado de citação do Chefe do 1.º Serviço de Finanças de Felgueiras, passado em 2008/05/06, procedi à citação de N., NIF. (…), residente no no lugar de (…) deste concelho, na qualidade de sócia da firma F. Lda, contribuinte na (…), com sede na Av. (…) deste concelho, tendo deixado cópia da certidão de dívida, extraída do processo de execução fiscal nº. I775200801012959, por dívidas no valor total de € 49.616,15, proveniente de Cobrança Coerciva de Dívida ao Instituto do Emprego e Formação Profissional, do ano de 2008.».

Ora, a certidão de dívida é o título executivo, sendo que a Recorrente junta com o seu articulado de Oposição a certidão de dívida, sob o doc. n.º 2, cujo teor é:
«CERTIDÃO DE DIVIDA
«C., Director do Centro de Emprego de Felgueiras do Instituto do Emprego e Formação Profissional (IEFP), pessoa colectiva de direito público nos termos do Decreto Lei 247/85 de 12 de Julho, com o número 501442600, e sede na Av. José Malhoa nº 11, 1099-018 Lisboa, vem, ao abrigo da subdelegação de competências emitida em 16/02/2006 pelo Sr. Delegado Regional do Norte do referido Instituto conforme Despacho n° 8011/2006, publicado na II Série do DR n° 70 de 7/04/2006, certificar que a sociedade F. , Lda., Identificação Fiscal nº (...), sede em Avª (…), representada pelos sócios e promotores N., contribuinte nº (…), residente em Lugar de (…) e R., contribuinte nº (…), residente em Lugar de (…), e C. e M., na qualidade de fiadores, contribuintes n° 114272 867 e 159 358 043, respectivamente, casados e residentes ambos em Bairro (…), devem a este Organismo a quantia de 49.616,15 (quarenta e nove mil, seiscentos e dezasseis euros e quinze cêntimos), correspondente ao apoio financeiro no valor 51.174 74 € (cinquenta e um mil, cento e setenta e quatro euros e setenta e quatro cêntimos que e foi concedido por despacho do Sr. Sub-Delegado do Norte, datado de 2001/12/20, do qual foi reembolsado 3.016,36 € (três mil, dezasseis euros e trinta e seis cêntimos) e 1.457,77 € (mil, quatrocentos e cinquenta e sete euros e setenta e sete cêntimos), a título de juros de mora vencidos à data da certidão de dívida, à qual serão acrescidos os juros de mora vincendos, calculados à taxa legal ao abrigo do artigo 559° do Código Civil, até à data do efectivo pagamento.
Porque não foram cumpridas as obrigações que se assumiram, foi determinada pela Sr. Director do Centro de Emprego de Felgueiras, em despacho datado de 2007/09/25, a cobrança coerciva da quantia em dívida.
Nos termos e para efeitos do disposto no art° 4° do Decreto Lei nº 437/78 de 28 de Dezembro, lavra-se a presente certidão, devidamente assinada e autenticada com o selo branco deste Organismo, a fim de se instaurar a competente acção executiva.
Felgueiras, 01 de Abril de 2008.».

Por sua vez, estabelece o artigo 162.º do Código de Procedimento e Processo Tributário:

Artigo 162 (Espécies de títulos executivos)
Só podem servir de base à execução fiscal os seguintes títulos executivos:
a) Certidão extraída do título de cobrança relativa a tributos e outras receitas do Estado;
b) Certidão de decisão exequível proferida em processo de aplicação das coimas;
c) Certidão do acto administrativo que determina a dívida a ser paga;
d) Qualquer outro título a que, por lei especial, seja atribuída força executiva.

Conforme acima transcrito, o Centro de Emprego emitiu uma certidão de dívida, na qual indicou a existência de uma dívida àquele organismo correspondente ao apoio financeiro concedido em 20/12/2001, assim como juros de mora vencidos, calculados à taxa legal. Mais refere a certidão que serve para instaurar a competente ação executiva.
Para além disso, a Nota de Citação refere que se deixa cópia da certidão de dívida, extraída do processo de execução fiscal. A Nota de citação não refere título executivo, mas antes certidão de dívida. Seja como for, a certidão de dívida, tem a função de título executivo.
Conforme se pode ver pelo que fica descrito e transcrito, existe título executivo, ainda que com a designação de certidão de dívida.
Neste aspeto, a Recorrente não tem a mínima razão, até porque acaba por alegar, que no título não figura como devedora (vide alegação a seguir apreciada).

Face ao exposto, soçobra, igualmente, mais esta alegação da Recorrente.
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Invoca a Recorrente a falsidade do título executivo, na medida em que é a sociedade a requerente dos incentivos, assim como a promotora do projeto, pelo que não podem ser os seus sócios ou gerentes devedores, o que determina a falsidade do título executivo.
Alega, ainda, a Recorrente a sua ilegitimidade, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 204.º do CPPT, por o devedor ser a sociedade e não os seus sócios gerentes, mais referindo que não podia ser responsabilizada como promotora do projeto.
Mais alega, que o título indica que o devedor é a sociedade, não respondendo os sócios e gerentes direta e imediatamente pelas dividas desta, sendo a própria sociedade a promotora do projeto.
Segundo se percebe do alegado pela Recorrente, a mesma imputa falsidade ao título executivo por considerar que o mesmo apenas indica como devedora a sociedade e não os seus sócios ou os promotores do projeto.
Apreciando.
Para melhor apreensão do assunto em apreço, transcreve-se o Termo de Responsabilidade, referido no ponto 3 da matéria de facto, bem como o despacho do Diretor do Centro de Emprego mencionado no ponto 7 da matéria de facto, que ordena a reposição de quantias, assim como o parecer que o antecede, tendo em conta que estes documentos apenas foram dados como por reproduzidos na matéria de facto.
«TERMO DE RESPONSABILIDADE
1 - F., LDA., do sector de Fabricação de Calçado, CAE 19301, com o Número de Identificação Fiscal (…), cujos promotores são: N. (…) e R. (…), responsáveis por uma Iniciativa Local de Emprego (ILE) da qual resulta a criação de 5 postos de trabalho, solicitaram o apoio financeiro e técnico previsto no Art° 3° do decreto lei n° 189/96 de 8 de Outubro.- - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -
2 - O investimento total do projecto, base da criação dos postos de trabalho é de (…).--------------
(…)
5 - Assim tendo em conta o citado Decreto Lei e o Decreto Lei n° 132/99 de 21/4, o IEFP atribui a F., LDA. (sociedade por quotas) nos termos do disposto Decreto Lei n° 437/78 de 28/12 e ao abrigo da al e) do Art° 4° do Decreto lei n° 247/85 de 12 de Julho, um apoio financeiro até ao montante de Esc: 10 259 613$00 (dez milhões duzentos e cinquenta e nove mil seiscentos e treze escudos) para criação de 5 postos de trabalho, nas seguintes condições:
(…)
8 - No caso de incumprimento injustificado das obrigações assumidas constantes deste Termo de Responsabilidade e dos normativos que regem a concessão de apoios ás ILE, será declarado o vencimento imediato da dívida e exigida a devolução das importâncias concedidas ou obtida a Cobrança Coerciva nos termos do Decreto Lei n° 437/78, de 28/12, se aquela não for efectuada voluntariamente no prazo que lhe for fixado.----------------
(…)
11 - O promotor da iniciativa, mencionado no nº 1 deste documento, beneficiário do apoio financeiro, é responsável pelo reembolso do referido apoio. No caso de virem a constituir uma sociedade, cooperativa ou associação, ficam ainda obrigados a efectuar a transmissão da divida para aquelas nos termos do artº 595º do Código Civil, não ficando por isso ilibados de responder individualmente á divida. - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -
12 - Do presente Termo de Responsabilidade será entregue cópia ao beneficiário desta iniciativa.»

Por sua vez, o despacho proferido para repor a quantia, foi antecedido de uma Informação prestada por uma Técnica Superior, cujo teor é o seguinte:
«N. e R., entregaram em 06-03-2001, candidatura a um projecto de emprego ao abrigo do Programa Iniciativas Locais de Emprego. Por despacho do Sr Sub Delegado Regional do Norte de 20-12-2001, foi concedido à entidade: F. , Lda., com NIP (...), sociedade por quotas com sede em Lugar da (…), CAE 19301 - Fabricação de Calçado, um apoio financeiro no montante de: 10.259.613$00 (51.174,74 € - cinquenta e um mil, cento e setenta e quatro euros e setenta e quatro cêntimos), sendo 15.081,72€ de subsidio reembolsável e 36.093,02€ de subsidio não reembolsável.
A entidade é representada pelos sócios e promotores: N. (…) e R. (…) o apoio financeiro está titulado pelo Termo de Responsabilidade e pelo Contrato de Fiança, ambos assinados em 21-12-2001.
Os fiadores são: C. (…) e M. (…).
De acordo com termo de responsabilidade, o subsídio reembolsável deveria ser reembolsado em 20 prestações trimestrais, com início em 20- 12-2003 e fim em 20-09-2008. Verifica-se que a entidade não tem cumprido com o plano de reembolso apesar dos avisos de incumprimento que foram enviados quer à entidade, quer aos promotores, assim, encontram-se 11 prestações vencidas e não pagas. Os últimos 5 ofícios com a documentação de aviso de pagamento das prestações foram devolvidos.
Face ao exposto, os promotores encontram-se em incumprimento com as obrigações assumidas, constantes do Termo de Responsabilidade ponto 10.
Perante o incumprimento das obrigações assumidas aplica-se o previsto no ponto 8 do Termo de Responsabilidade, pelo que propomos:
- A conversão do subsídio recebido não reembolsável, no montante de: 36.093,02 €, em subsídio reembolsável;
- A declaração do vencimento imediato do total em dívida, no montante de: 48158,38 €;
- A notificação da entidade, promotores e fiadores no sentido da devolução do montante total em dívida e não devolvendo voluntariamente, no prazo estipulado, seja instaurado o processo de cobrança coerciva, nos termos do DL 437/78 de 28 de Dezembro.
À Consideração Superior
A Técnica Superior»

Sobre esta Informação recaiu o seguinte despacho do Diretor do Centro de Emprego:
«Concordo com o parecer técnico.
Assim, no uso da competência subdelegada através do despacho n.º 8011, de 16/02/2006, publicado no DR, 2.ª série, n.º 70, de 2006/04/06, com base nas razões e fundamentos invocados, de acordo com o disposto no ponto nº 8 do Termo de Responsabilidade, determino:
-Converta-se o subsídio não reembolsável em reembolsável, no valor global de 36.093,02 Euros; -Declaro o vencimento imediato da divida no valor de 48.158,38 Euros;
-Notifique-se promotor para devolução voluntária do valor de 48158,38 Euros, no prazo de 15 (quinze) dias úteis a contar da data em que se considere notificado, nos termos do Decreto-lei nº 437/78, de 28 de Dezembro, sob pena de obtenção de processo de cobrança coerciva.
2007/09/25.».

Relembremos em que termos está exarada a Certidão de Dívida:
«CERTIDÃO DE DIVIDA
«C. (…), Director do Centro de Emprego de Felgueiras do Instituto do Emprego e Formação Profissional (IEFP), pessoa colectiva de direito público (…), vem, ao abrigo da subdelegação de competências emitida em 16/02/2006 pelo Sr. Delegado Regional do Norte do referido Instituto conforme Despacho n° 8011/2006, publicado na II Série do DR n° 70 de 7/04/2006, certificar que a sociedade F. , Lda., Identificação Fiscal nº (...), sede em Avª (…), representada pelos sócios e promotores N., contribuinte nº (…), residente em Lugar de (…) e R. (…), e C. (…) e M. (…), na qualidade de fiadores (…), devem a este Organismo a quantia de 49.616,15 (quarenta e nove mil, seiscentos e dezasseis euros e quinze cêntimos), correspondente ao apoio financeiro no valor 51.174 74 € (…) e 1.457,77 € (…), a título de juros de mora vencidos à data da certidão de dívida, à qual serão acrescidos os juros de mora vincendos, calculados à taxa legal ao abrigo do artigo 559° do Código Civil, até à data do efectivo pagamento.
Porque não foram cumpridas as obrigações que se assumiram, foi determinada pela Sr. Director do Centro de Emprego de Felgueiras, em despacho datado de 2007/09/25, a cobrança coerciva da quantia em dívida.
Nos termos e para efeitos do disposto no art° 4° do Decreto Lei nº 437/78 de 28 de Dezembro, lavra-se a presente certidão, devidamente assinada e autenticada com o selo branco deste Organismo, a fim de se instaurar a competente acção executiva.
Felgueiras, 01 de Abril de 2008.».

Não obstante a certidão num primeiro momento apenas parecer querer identificar os sócios e promotores, enquanto tal, resulta que a seguir a certidão refere que todos os anteriormente identificados devem a este Organismo a quantia de 49.616,15 euros, acrescida de juros de mora vencidos.
Daqui resulta que, não obstante a redação da certidão, que a mesma pretende abranger todos os que ali estão identificados, como seja a sociedade, os sócios e promotores e até os fiadores.
Diga-se, ainda que a certidão está de acordo com o despacho de conversão de subsídio não reembolsável em não reembolsável, na medida em que esse despacho concorda com o parecer técnico, que diz expressamente para ser notificada a entidade (portanto, a sociedade), os promotores (portanto, a Oponente, ora Recorrente) e os fiadores – vide último parágrafo (e travessão) daquela Informação.
Para além de acolher a Informação da Técnica Superior, o despacho do Diretor do Centro de Emprego, converte o subsídio não reembolsável em reembolsável, declara o seu vencimento imediato e ordena a notificação do promotor para devolução, sendo que promotor é a aqui Recorrente.
Em face do exposto, verificando-se que a certidão de dívida pretende identificar como devedora a Recorrente, uma vez que era sócia da sociedade e promotora do projeto, por isso é a Oponente parte legítima na Execução Fiscal.
Para além disso, conforme transcrito no ponto 11 do Termo de Responsabilidade, o promotor da iniciativa, mesmo em caso de transmissão da dívida para a sociedade, não fica ilibado de responder individualmente por esta.
Desta forma, verifica-se pela certidão e dívida e pelos demais documentos que a recorrente pode ser responsabilizada pessoalmente pela dívida em apreço.
Portanto, estando identificada a Oponente na certidão de dívida como promotora e como devedora, é parte legítima na execução fiscal.
Aliás, é este o entendimento jurisprudencial, conforme se pode ver pelo Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 21/11/2012, proferido no processo n.º 0714/12 (em www.dgsi.pt, assim como no Diário da República, Apêndice de 08/11/2013, páginas 3481 a 3488), cujo sumário se transcreve:

I - As dívidas emergentes de incumprimento de um Contrato de Concessão de Incentivos Financeiros, promovido pelo Instituto do Emprego e Formação Profissional, não seguem o regime das liquidações sujeitas às regras do CPPT e da LGT referentes a responsabilidade subsidiária nem a reversão, sendo que o facto de as mesmas serem cobradas coercivamente não lhes muda a natureza transformando-as em dívidas tributárias.
II - Constando o oponente da certidão de dívida, conforme o exigido no art. 88º, nº 2, alínea j), do CPPT, e uma vez que também é responsável solidário pelo cumprimento do contrato de incentivos financeiros em causa, não pode deixar de improceder a alegada ilegitimidade com base no art. 204º, nº 1, alínea b), do CPPT.
III - O erro na forma do processo traduz-se numa nulidade que consiste na utilização de meio processual impróprio, aferindo-se tal erro pela adequação do meio processual utilizado ao fim por ele visado: se o pedido, ou seja, a concreta pretensão de tutela solicitada pelo autor ao tribunal não se ajusta à finalidade abstractamente figurada pela lei para essa forma processual ocorre erro na forma do processo.
IV - Se o oponente pede a extinção da execução e estrutura a causa de pedir com fundamentos adequados à oposição, tais como, a ilegitimidade para ser chamado à execução e vícios formais do acto de reversão, não se verifica qualquer erro na forma do processo, o que não significa que, atentas as causas de pedir, a oposição seja de proceder.
V - Respeitando a dívida exequenda a restituição de quantias recebidas no âmbito de comparticipações do Fundo Social Europeu, ou de dívidas ao Instituto do Emprego e Formação Profissional, o meio processual adequado é a acção administrativa especial a intentar contra o despacho que ordena a reposição ou a restituição das importâncias indevidamente recebidas, nos termos do disposto no art. 6º do Decreto-Lei nº 443/78, de 28 de Dezembro, a intentar nos tribunais administrativos de círculo (art. 44º do ETAF).
VI - Como a infracção das regras de competência em razão da hierarquia e da matéria determinam a incompetência absoluta do tribunal (cfr. o art. 16º do CPPT), cuja consequência é a absolvição da instância, nos termos do disposto no art. 288º, nº 1, alínea a), do CPC, caberá ao recorrente decidir, nos termos do disposto no art. 289º do CPC, intentar ou não a acção administrativa especial, o que torna impossível a convolação da oposição nesta forma de processo.

Verifica-se, portanto, que o título executivo refere o mesmo do que está anteriormente documentado, ou seja, de que são devedores, a sociedade, os sócios e promotores e os fiadores, pelo que não se pode considerar haver falsidade do título executivo.
Aliás, não invoca a Recorrente que conste do título executivo algo diferente do que consta dos documentos que o enformam e o antecedem, como por exemplo o despacho que ordena o reembolso, pelo que também por este motivo não ocorre falsidade do título executivo.
Veja-se sobre o assunto o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte de 15/04/2010, proferido no processo n.º 02286/06.8BEPRT (em www.dgsi.pt):
V - A falsidade que pode servir de fundamento à oposição à execução fiscal refere-se exclusivamente à desconformidade entre o título executivo e a base fáctico-documental cuja atestação nele se exprime, às divergências entre o teor do título e os conhecimentos ou outros instrumentos de cobrança que nele se referem como lhe estando subjacentes e já não à divergência entre a realidade e o acto tributário subjacente a esses instrumentos, vício este que se refere, não ao título, mas ao acto de liquidação
Veja-se, ainda, o acórdão do STA de 07/07/2020, proferido no processo n.º 0342/10 (em www.dgsi.pt), cuja parte do sumário com interesse se transcreve:
III - A falsidade do título executivo traduz-se na falta de correspondência da atestação nele firmada em relação ao acto que esse título se destina a certificar.

No que concerne ao demais alegado sobre a falsidade do título executivo, como por exemplo não poder ser a sociedade a promotora e não a Oponente, ou as competências de quem exarou o título, é matéria que aqui não pode ser apreciada, conforme já acima referido, na medida em que tal apenas pode ser analisado em ação própria, conforme acima referido.

Em face de tudo quanto fica exposto, o recurso não merece provimento.
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Nos termos do n.º 7 do artigo 663.º do Código de Processo Civil, elabora-se o seguinte sumário:

I - A certidão de dívida, tem a função de título executivo, nas situações em que é determinado o pagamento de quantia certa por ato administrativo.

II - A falsidade do título executivo, alegada com base na incompetência de quem praticou o ato administrativo de reposição de quantias, não pode apreciada em sede de Oposição, uma vez que implica apreciar a legalidade do ato administrativo; o que deve ser efetuado em ação própria.

III - Verificando-se que a certidão de dívida pretende identificar como devedora a Recorrente, uma vez que era sócia da sociedade e promotora do projeto, é a Oponente parte legítima na Execução Fiscal.
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Decisão

Termos em que, acordam em conferência, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte, em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.
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Custas a cargo da recorrente.
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Porto, 16 de setembro de 2021.

Paulo Moura
Irene Isabel Neves
Ana Paula Santos