Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00407/07.2BEPNF
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:04/17/2020
Tribunal:TAF de Penafiel
Relator:Maria Fernanda Antunes Aparício Duarte Brandão
Descritores:ACÇÃO ADMINISTRATIVA COMUM, RESOLUÇÃO DO ACORDO CELEBRADO, DIREÇÃO REGIONAL DE EDUCAÇÃO DO NORTE (DREN),
LEI 42/98, DE 06 DE MARÇO (LEI DAS FINANÇAS LOCAIS LFL)
Sumário:I-Dos factos assentes extrai-se que o Réu/Recorrente, antes da publicação da LFL estava muito aquém do limite máximo permitido para endividamento, e embora não dispusesse, na data da resolução do acordo, da possibilidade de contrair um empréstimo de montante equivalente ao valor do preço do terreno adquirido para a construção da escola, a contração de empréstimos não era a única forma de que dispunha para cumprir a sua parte do contrato, visto que possuía outras formas de financiamento e receita, resultantes designadamente de Impostos, Taxas e outras penalidades além de Transferências correntes e da posse de bens transacionáveis que, de acordo com o que ficou plasmado na sentença, lhe permitiam honrar o cumprimento das obrigações de natureza pecuniária que assumiu no âmbito do acordo, pagando as importâncias reclamadas pelo Autor, ao que acresce que nos anos imediatos, de 2004 a 2006 o Réu teve capacidade para contrair empréstimos de Médio e Longo Prazo, pelo que adquiriu capacidade de endividamento para efetuar os pagamentos em falta.*
* Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:Município de (...)
Recorrido 1:Estado Português
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Comum
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:

RELATÓRIO
O Magistrado do Ministério Público junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel instaurou acção administrativa comum com processo ordinário em representação do Estado Português - Direcção Regional de Educação do Norte (DREN), contra o Município de (...), pedindo a condenação deste no pagamento do montante total de € 967.523,78, acrescido dos respectivos juros de mora à taxa legal desde a citação até integral pagamento.
Por sentença proferida pelo TAF de Penafiel foi julgada procedente a acção e condenado o Réu a pagar ao Autor a quantia de € 967.523,78, acrescida dos juros de mora, à taxa legal, desde a data da citação (26/06/2007) até integral pagamento.
Desta vem interposto recurso.
Alegando, o Réu formulou as seguintes conclusões:
1. A decisão sobre a matéria de facto, no que respeita aos pontos de facto nºs 2º, 3º, 4º, 5º, 6º da Base Instrutória que o tribunal recorrido deu como não provados, deve ser alterada por este Venerando Tribunal de 2ª instância, nos termos do disposto no artº 662º do CPC.
2. Os pontos de facto constantes dos artigos nºs 2º, 3º, 4º, 5º, 6º da Base Instrutória devem ser considerados como provados restritivamente, com a seguinte redacção:
Base Instrutória:
2 - A resposta que deve ser dada a este facto deve ser a seguinte:
O montante global dos encargos anuais da autarquia com as amortizações e juros dos empréstimos, de médio e longo prazo, calculado segundo a LFL, seria em 2003 era, no pior cenário, de € 1.394.851,22.
3- A resposta que deve ser dada a este facto deve ser a seguinte:
O montante dos fundos relevantes para o efeito, no mesmo período, era de € 13.221.652,00, pelo que a soma dos duodécimos atingia 3.305.413,00.
4- A resposta que deve ser dada a este facto deve ser a seguinte:
Montante correspondente a 20% das despesas realizadas para investimento pelo R. no ano de 2000 foi de € € 2.425.574,42.
5- A resposta que deve ser dada a este facto deve ser a seguinte:
De acordo com a LFL o limite de endividamento do R. seria de € 2.425.574,42.
6- A resposta que deve ser dada a este facto deve ser a seguinte:
O empréstimo a contrair para pagamento do preço da aquisição do terreno implicaria, no total dos encargos anuais com esse serviço de dívida do R, um acréscimo de juros e amortizações que tivessem sido contratados e se vencessem nesse ano e, ainda, que com a contracção do referido empréstimo o que aumentaria seria o stock da divida de empréstimos de Médio e Longo Prazo e não, necessariamente, o serviço da dívida.
3. A fundamentação para a pretendida alteração desses pontos de facto é o teor do Relatório Pericial que confirmou, embora restritivamente, essa matéria factual, a fls. 27 a 23 do mesmo.
4. Independentemente do facto de dever ser alterada a decisão sobre a matéria de facto também a acção deverá improceder tendo em conta apenas a matéria de facto dada como assente pela sentença recorrida.
5. O CPA de 1991 e o Dec. Lei nº 100/84 estatuem o princípio da especialidade dos órgãos das pessoas colectivas.
6. No que respeita especificamente às autarquias territoriais, nenhuma lei lhes confere poderes em matéria de assunção de custo de aquisição de terrenos para cedência à administração central do Estado.
7. A lei das atribuições das autarquias locais (Lei nº 100/84 – e mais, recentemente, também, a Lei nº 159/99, de 14 de Setembro) não menciona em lado nenhum a possibilidade de os municípios se encarregarem da aquisição de terrenos para construção de escolas para a Administração Central.
8. Ora, as atribuições das autarquias territoriais, obedecem ao princípio da enunciação ou princípio da atribuição específica, e não a um princípio geral de competência universal dessas autarquias - artigos 76º do Dec Lei nº 100/84e13º e 14º da Lei 159/99.
9. O Dec Lei nº 100/84 procede a uma elencagem das competências da Assembleia Municipal e da Câmara Municipal nos artºs 39º, 41º, 51º, 52º, e 53º.
10.As obrigações assumidas pelo Réu no protocolo em referência violam o disposto nos arts. 39º, 41º, 51º, 52º, e 53º do DL nº 100/84, pois as obrigações ali assumidas não integram nenhuma das competências legalmente atribuídas aos órgãos do Réu no supra referido diploma, pelo que viola o princípio da especialidade previsto no art. 76º do referido diploma.
11. Falta um dos requisitos para que o ajuizado Acordo de Colaboração seja qualificado como contrato administrativo, uma vez que não foi celebrado para a prossecução das atribuições da pessoa colectiva em que se integram, violando o artº 179º do CPA de 1991.
12. À data da celebração de tal acordo, nenhuma legislação atribui competências ou atribuições legais ao Município para custear a expensas próprias terrenos para a construção de escolas por parte da administração central do Estado.
13.A possibilidade de as populações do município beneficiarem da construção da escola não acarreta atribuição legal para o efeito e é irrelevante para a vinculação á lei.
14. A Escola referida no Acordo de Colaboração está arredada do âmbito do artigo 8º, n.º1, alíneas b) e c), da Lei 46/86, de 14.10 (Lei de Bases do Sistema Educativo).
15.O compromisso assumido no dito “Acordo de Colaboração” de o Réu providenciar pela aquisição dos terrenos necessários à construção de uma escola que, integra o ensino secundário, está fora das atribuições e competências do Município de (...).
16. O Decreto-Lei n.º 77/1984, de 8 de Março define a construção da rede escolar nos artºs 40º a 45º os quais não atribuem às autarquias a responsabilidade de adquirir terrenos ou contribuir para a edificação desse tipo de construções escolares.
17. À míngua de norma específica que atribuísse tais competências aos órgãos do Município de (...), é ilegal e inválido o aludido acordo de colaboração.
18. E o artº 76º do Dec Lei nº 100/84 tem que ser conjugado com o art. 2º nº1 f) da Lei nº 100/84, versando quer sobre matéria das atribuições da autarquia quer sobre a competência dos seus órgãos, que impede as obrigações assumidas pelo R. no citado acordo de colaboração.
19.A ilegalidade do Acordo de Colaboração viola, ainda, o disposto nos arts. 43º, 74º, 75º, 90º al. b), da CRP, uma vez que a garantia dos direitos ali consagrados incumbe ao Estado e não ao Réu que é uma autarquia local.
20.Os arts. 6º, 235º e 237º, sendo normas meramente programáticas todos da CRP têm que ser integrados com o disposto no artº 237º nº 1 da CRP que dispõe que nas atribuições e organização das autarquias locais, bem como a competência dos seus órgãos serão reguladas por lei, de harmonia com o princípio da descentralização administrativa.

21. Por força da entrada em vigor da Lei nº 159/99, de 14/08, já depois da celebração do acordo de colaboração, o Autor não fica desonerado da obrigação de proporcionar ao Réu os recursos adequados e necessários à execução do acordo, designadamente, no caso de impossibilidade de cumprimento por parte do Réu da pagar a expensas suas o preço do terreno para a construção da Escola.
22.Teria o Autor de reassumir a sua obrigação arcando com esse custo cfr. art. 8º nº 2 da referida lei.
23. Tendo entrado em vigor a Lei das Finanças Locais (Lei nº 42/98, de 06/03), publicada depois da assinatura do protocolo e antes da declaração de resolução constata-se que a mesma dispõe para o passado, abrangendo a realidade fáctica das autarquias anterior à data da entrada em vigor dessa Lei e contrariando o princípio da não retroactividade das leis.
24. Após a celebração do acordo em causa nos autos entrou em vigor a Lei das Finanças Locais (Lei nº 42/98, de 06/03), que impossibilitou o Réu de recorrer a empréstimos para poder assumir os encargos decorrentes do acordo celebrado.
25. Uma vez que, por força do art. 19º nº 1 da Lei nº 32-B/2002, de 30/12, a capacidade de endividamento dos municípios para o ano de 2003 foi drasticamente reduzida.
26.O nº2 do referido art. 19º dessa lei bloqueou, ainda, o recurso a novos empréstimos de médio e longo prazo dos municípios que, devido a empréstimos contraídos em anos anteriores, já excedam o maior dos limites previstos no art. 19º nº 1 da Lei nº 32-B/2002.
27.Esta norma tinha efeitos retroactivos, dispondo para o passado e contrariava o princípio da não retroactividade das leis e que por força do art. 19º nº 2 da Lei nº 32-B/2002, e da situação de tesouraria resultante dos empréstimos de médio e longo prazo contraídos em anos anteriores pelo Réu.
28.O R. não dispunha à data de resolução do acordo de possibilidade de contrair um empréstimo equivalente ao montante do preço do terreno para construção da Escola, o que constituiria um grave delito financeiro contrário ao art. 53º nº 2 al. d) da Lei nº 169/99, de 18/09.
29.Do elenco dos factos provados pelo Tribunal e, também, dos factos que, em sede de ampliação da matéria de facto neste recurso é patente a impossibilidade de contracção de empréstimo equivalente ao montante do preço do terreno para construção da Escola.
30.Por força do art. 19º nº 2 da Lei nº 32-B/2002, e da situação de tesouraria resultante dos empréstimos de médio e longo prazo contraídos em anos anteriores pelo Réu, este não dispunha, à data de resolução do acordo, de possibilidade de contrair um empréstimo equivalente ao montante do preço do terreno para construção da Escola.
31.Caso o Réu violasse essa Lei, incorreria na prática de um grave delito financeiro contrário ao art. 53º nº 2 al. d) da Lei nº 169/99, de 18/09
32.A entrada em vigor desta Lei das Finanças Locais introduziu uma alteração anormal e não prevista nas condições e pressupostos que determinaram a celebração do acordo entre Autor e Réu.
33.O R. tendo sido parte afectada por tais alterações legislativas tem direito à resolução do contrato ou à modificação do mesmo, nos termos do disposto nos arts. 266º nº 2 da CRP, 6º-A do CPA e 13º do DL 97/99, de 08/06.
34. Sendo certo que foi o próprio Autor que, pela aprovação e promulgação da referida legislação (através dos seus órgãos Assembleia da república e Presidente da República), impediu o Réu de cumprir o acordo em questão.
35. O Recorrente estava impedido legalmente de poder dar cumprimento ao contrato, sob pena de f incorrer em grave delito financeiro contrário ao art. 53º nº2 al. d) da Lei nº 169/99, de 18/09.
36.A autarquia local está obrigada ao princípio da legalidade e só pode invocar perante os tribunais a inconstitucionalidade das leis e só os tribunais é que a podem decidir, não podendo desaplicar ou incumprir voluntariamente a lei com o argumento na sua inconstitucionalidade, pois violaria aquele princípio.
37. O acordo de colaboração sub judice não foi submetido a visto do Tribunal de Contas sendo, por isso, ineficaz por força dos arts. 8º al. b) e c) e 13º al. a), b) e c) e d) da Lei nº 86/89, de 08/09, não se lhe aplicando a excepção do art. 14º da referida Lei.
38.O aludido acordo de colaboração nunca chegou a ser eficaz, visto que não se verificou a condição que lhe conferiria eficácia jurídica e validade, ou seja, o visto.
39.O facto de o Acordo de Colaboração não conter qualquer valor atribuído pelo que por esse motivo ficaria afastada a necessidade de visto prévio do Tribunal de Contas por aplicação do art. 13º nº 3 da Lei nº 86/89.
40.Os contratos-programa devem obrigatoriamente conter a definição dos instrumentos financeiros utilizáveis e a quantificação da responsabilidade financeira de cada uma das partes – cfr artº 9º nº 1 alíneas d) e e) do Decreto-Lei nº 384/87, de 24 de Dezembro, sob pena de ilegalidade, por violação das normas imperativas do artº 9º nº 1 – d) e e) do Decreto – Lei nº 384/87, de 24/12 e do artº 13º nº 1 e 3 da Lei nº 86/89.

41.A norma do artigo 12.º dessa Lei 86/89 é uma norma especial que não pode ser derrogada por um Decreto Lei.
42.O legislador no art. 7º nº 2 do DL nº 384/87, previu que os contratos-programa celebrados ao abrigo deste diploma, não carecem de visto do Tribunal de Contas, o que torna essa norma materialmente inconstitucional, por violação do artº 168º nº 1 – alínea q) da CRP na sua versão da Lei n.º 1/82, de 30/09, então vigente.
43.O Decreto-Lei n.º 384/87, de 24 de Dezembro é um diploma do Governo aprovado nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 201.º da Constituição (na versão da Lei n.º 1/82, de 30/09, então vigente) e pelo artº 14º da Lei nº 1/87, de 6 de Janeiro (que aprova a Lei das Finanças Locais e que, para o caso é irrelevante).
44.O acordo de colaboração viola os princípios da anualidade, consignação e especificação (art. 7º, 10º e 11º da Lei nº 41/83, de 21/06, art. 2º nº 1 da LFL, art. 3º nº 1 da Lei nº 42/98 e POCAL), pois no ano da resolução o Réu não tinha cabimento orçamental nem verbas para efectuar os pagamentos que o Autor peticiona, nem afectar ou utilizar receitas de outras rúbricas ou ano financeiro.
Termos em que, com o suprimento do omitido, deve ser concedido ao presente recurso e, em consequência, ser revogada a sentença recorrida e ser julgada improcedente a acção.
O Autor juntou contra-alegações, concluindo:
1-A apreciação das questões de constitucionalidade de normas jurídicas feita pelos tribunais administrativos não pode ser feita a título principal, mas tão só a título concreto e sucessivo.
2 – As normas constantes dos artigos 281º da CRP e 72º do CPTA restringem essa apreciação a título principal à competência material do Tribunal Constitucional.
3 – As apreciações feitas na douta sentença recorrida a respeito dos factos dados como provados e respectiva fundamentação não pecam por qualquer falta de clareza, coerência ou fundamentação. Pelo contrário, a sua motivação (fls. 11 e ss. da douta sentença, e em especial fls. 14 e 15 ) é objectiva e concisa, baseando-se expressamente nas respostas constantes do relatório pericial, pelo devem improceder as consideração do recurso neste âmbito.
4- Constituindo atribuição das autarquias locais, por força do disposto no artº 2º nº 1 al. f) do citado DL nº 100/84, de 29.03, a prossecução de fins relacionados com a educação e o ensino dos seus munícipes, e prevendo-se no artigo 8º do DL nº 77/84, de 08.03, ser da competência dos municípios a realização de investimentos públicos ao nível das escolas do ensino básico, a aquisição de um terreno para construção de uma escola EB/S no seu território insere-se nos fins legalmente atribuídos ao Réu Município de (...).
5- Encontrando-se o Réu, antes da publicação da Lei das Finanças Locais (LFL) muito aquém do limite máximo permitido para endividamento, e embora não dispusesse, na data da resolução do acordo, da possibilidade de contrair um empréstimo de montante equivalente ao valor do preço do terreno adquirido para a construção da escola, verifica-se que a contracção de empréstimos não era a única forma de que dispunha para cumprir a sua parte do contrato, visto que possuía outras formas de financiamento e receita, resultantes designadamente de Impostos, Taxas e outras penalidades além de Transferências correntes e da posse de bens transaccionáveis.
6- Pelo que, de acordo com o que ficou plasmado na douta sentença recorrida tais recursos (fls. 29 respectiva), «… lhe permitiam honrar o cumprimento das obrigações de natureza pecuniária que assumiu no âmbito do acordo pagando as importâncias reclamadas pelo Autor.»
7- Não se verifica uma alteração anormal e não prevista das condições e pressupostos que determinaram a celebração do acordo entre ambas as partes e que lhes conferiria o direito à resolução ou modificação do contrato, se tal alegada alteração de circunstâncias não foi devidamente invocada no acto de resolução do contrato, designadamente face ao que se dispõe no artº 180º al. c) do Código de Procedimento Administrativo.
8- Entre todas a modalidades ou formas contratuais que se apresentavam como possíveis para ultrapassar as dificuldades em cumprir a sua parte do acordo, não deveria o Réu ter optado logo pela ultima ratio que se traduz na respectiva resolução sem procurar outras modalidades menos gravosas.
9- Se ao Acordo de Colaboração em causa não foi atribuído qualquer valor, nos termos previstos no artº 13º nº 3 da Lei nº 86/89, está afastada a necessidade de visto prévio do Tribunal de Contas como condição de eficácia de tal acto jurídico.
10- Tendo o Acordo de Colaboração entre os dois órgãos públicos sido celebrado ao abrigo do disposto no DL 384/87, que prevê esta modalidade para aquelas situações em que não se justifique a adopção da forma (mais solene, portanto) de Contrato-Programa, e tendo em conta que o artº 7º nº 2 do referido diploma isenta os contratos-programa firmados no seu âmbito de visto prévio do Tribunal de Contas, será forçoso concluir, por maioria de razão, que os acordos como o aqui celebrado não carecem de visto prévio daquele tribunal para serem eficazes.
11- Os princípios da anualidade, consignação e especificação constantes dos artigos 7º, 10º e 11º da Lei nº 41/83, 21.06, 2º nº 1 da LFL e 3º nº 1 da Lei nº 42798, além do Plano Oficial de Contabilidade das Autarquias Locais - POCAL) não seriam violados de forma necessária no caso dos autos com o cumprimento das obrigações do Réu Município de (...), pois além de nunca o recorrente ter feito depender do seu futuro cumprimento das regras referidas a execução e muito menos a celebração do acordo, o recurso a empréstimos não constituía a única via de satisfação da dívida que assumira para com o Autor Estado Português (DREN), estando demonstrado de forma exaustiva e abundante na douta sentença recorrida que o Réu possuía outras formas de cumprir a sua obrigação sem colocar em causa os princípios da anualidade, consignação e especificação mencionados.
12- Assim, foi por este Tribunal feita uma correcta análise dos factos e uma rigorosa interpretação do direito aplicável, sendo inteiramente acertada a decisão de condenação do Réu Município de (...).
13– Termos em que se conclui que a douta sentença recorrida não violou quaisquer normas legais, pelo que deve ser mantida.
14- Condenando-se assim o Réu a pagar ao Estado Português a quantia de € 967.523,78, acrescida de juros de mora à taxa legal contados desde a data da sua citação (26-06-2007) até integral pagamento, além do pagamento das custas da acção.
Nestes termos e nos mais de direito, deve o presente recurso ser julgado improcedente.
Pelo exposto, mantendo na íntegra a sentença recorrida, farão
JUSTIÇA!
Cumpre apreciar e decidir.
FUNDAMENTOS
DE FACTO

Na decisão foi fixada a seguinte factualidade:
A) Em 28 de Outubro de 1996 foi celebrado entre Direcção Regional de Educação do Norte (DREN) e a Câmara Municipal de (...) (CM(.)) um “Acordo de colaboração para construção escolar” que tinha por objectivo a construção da Escola do Ensino Básico e Secundário EB 3/S de (...) (cf. doc. de fls. 9 dos autos - matéria de facto considerada assente no Despacho Saneador);
B) Naquele acordo foram constituídas obrigações para cada um dos intervenientes, sendo certo que de entre outras obrigações assumidas, ficou estipulado que competia à CM(.) adquirir, a expensas próprias, o terreno onde iria ser implantado o edifício escolar, assegurando a sua disponibilidade atempada para colocar o empreendimento a concurso, bem como executar, a expensas próprias, os acessos e infra-estruturas urbanísticas de suporte ao funcionamento da escola (cfr. art. 3°, nº 4 e 5 do acordo - matéria de facto considerada assente no Despacho Saneador);
C) Em 20-12-96 o Sr. Vereador substituto do Presidente da Câmara Municipal de (...) comunica ao Director da DREN a Deliberação Camarária tomada na reunião de 09-12-96, com o seguinte teor. "A Câmara Municipal delibera, por unanimidade, na sequência do acordo de colaboração assinado entre a Câmara Municipal e a DREN, em que concordou disponibilizar os terrenos necessários para a edificação da Escola Secundária nº2, solicitar à DREN que diligencie a tramitação processual com vista a ser obtida a declaração de utilidade pública urgente e a posse administrativa das parcelas de terreno em causa, devidamente identificadas na planta apresentada e que aqui se dá por inteiramente reproduzida", comunicando ainda que "para a prossecução da declaração de utilidade pública solicitada, a Câmara Municipal de (...) assume o pagamentos de verbas que o Exmo. Juiz do Tribunal venha a solicitar no tempo certo" - (cf. doc. de fls. 10 dos autos - matéria de facto considerada assente no Despacho Saneador);
D) Por despacho do Director Regional - Adjunto de Educação do Norte, publicado no DR, II Série, nº 30 de 05-02-1997, foi aprovado o terreno destinado à implantação da referida escola (cfr. doc. de fls. 11 dos autos - matéria de facto considerada assente no Despacho Saneador);

E) A pedido do Presidente da CM(.) foi necessário alterar os limites do terreno, de acordo com planta cadastral e traçado por este proposto, o que foi aceite conforme despacho de 03-02-97, publicado no DR, II Série nº 60, de 12-03-1997 (cfr. doc. de fls. 12 a 18 dos autos - matéria de facto considerada assente no Despacho Saneador);
F) Os processos expropriativos foram desencadeados a pedido da CM(.) e tramitaram no Tribunal Judicial de (...) sob os números 243/01 - 4° Juízo, 71/00 - 1° Juízo e 241/99 - 4° Juízo (cf. doc. de fls. 34 a 59, 66 e71 a 89 dos autos - matéria de facto considerada assente no Despacho Saneador);
G) A CM(.) efectuou o pagamento da parcela expropriada sob o nº 1 no montante de 8.783.240$00 (montante não impugnado), nº2, no montante de 22.878.809$50 e da parcela sob o nº 3 no montante de 52.025.278$00 (cf. fls. 90 e 102 dos autos - matéria de facto considerada assente no Despacho Saneador);
H) Em 23-04-2003 a CM(.) comunica à DREN que denúncia o acordo de colaboração (cfr. doc. de fls. 20 a 26 dos autos - matéria de facto considerada assente no Despacho Saneador);
I) A DREN depositou em relação à parcela expropriada sob o nº 1 o montante de 104.245,21 euros (em 03-01-2006), mais 2.234,40 euros (em 14-03-2006), perfazendo o total de 106.479,61 euros, valor depositado à ordem do Processo 243/01, valor despendido pela DREN e correspondente à indemnização fixada judicialmente no respectivo processo expropriativo (cfr. doc. de fls. 67 e 70 dos autos - matéria de facto considerada assente no Despacho Saneador – facto admitido por acordo em sede de audiência de discussão e julgamento);
J) Em relação à parcela 2 a DREN depositou o montante de 193.325,30 euros (em 29-05-2006) e mais 2.478,80 euros (em 12-07-2006), o que perfaz um total de 195.804,10 euros, valor depositado à ordem do Processo 71/2000 e despendido pela DREN, correspondente à indemnização fixada judicialmente no respectivo processo expropriativo (cfr. doc. de fls. 71,93,95,96,98 a 100 dos autos - matéria de facto considerada assente no Despacho Saneador – facto admitido por acordo em sede de audiência de discussão e julgamento);
K) Em relação à parcela nº3 a DREN depositou em 30-01-20104 o montante de €577.510,14 à ordem do Processo 241/99, despendido pela DREN e correspondente à indemnização fixada judicialmente no respectivo processo expropriativo (matéria de facto considerada assente no Despacho Saneador – facto admitido por acordo em sede de audiência de discussão e julgamento);
L) De custas relativas a dois processos (243/2001 e 71/2000) a DREN pagou em 30-06-2006 e 29-09-2006 a importância de 1.461,53 euros e 757,57 euros, o que totaliza 2.219,10 euros (cfr. doc. de fls. 133 a 137 dos autos - matéria de facto considerada assente no Despacho Saneador);
M) Para implantação da escola foi necessário adquirir 6 parcelas de terreno, sendo certo que a CM(.) chegou a acordo com os proprietários de 3 dessas parcelas, avançando-se com o processo expropriativo em relação às outras 3 parcelas (matéria de facto considerada assente no Despacho Saneador);
N) Em devido tempo, o Autor teve ocasião de o comunicar ao Presidente da Câmara Municipal de (...) que não aceitava a denúncia referida em H), pelas razões exposta no documento nº7 junto à PI e cujo teor se dá por reproduzido, conforme despacho do Sr. Secretário de Estado da Administração Educativa, de 09-07-2003 (facto admitido por acordo em sede de audiência de discussão e julgamento);
O) Antes da publicação da LFL, o endividamento do Réu estava muito aquém do limite máximo permitido para o endividamento (cfr. resposta dada no Relatório Pericial ao quesito nº 1 da Base instrutória e cujo teor se dá por reproduzido);
P) Para o ano de 2003 o Réu viu diminuir a sua capacidade de endividamento (cfr. resposta dada no Relatório Pericial ao quesito nº 7 da Base instrutória, que o confirma, e cujo teor se dá por reproduzido);
Q) O Réu não dispunha, à data da resolução do acordo, da possibilidade de contrair empréstimo equivalente ao montante do preço do terreno para a construção da Escola Secundária (...) (cfr. resposta dada no Relatório Pericial ao quesito nº 8 da Base instrutória, que o confirma e cujo teor se dá por reproduzido);
R) No ano de resolução do contrato o Réu não tinha cabimento orçamental nem verbas no seu orçamento, para poder efectuar o pagamento (cfr. resposta dada no Relatório Pericial ao artigo 9º da Base instrutória e cujo teor se dá por reproduzido, e da qual se extrai que no ano de 2003 o Réu tinha cabimento orçamental para pagamento de terrenos, embora de valor inferior ao compromisso assumido e que face aos documentos contabilísticos disponibilizados, mas que não foi possível concluir se o Réu em 2003 possuía verbas no seu orçamento para efectuar o pagamento);
S) O Réu à data da celebração do acordo de colaboração aqui em causa nunca pôs em causa a sua capacidade financeira (cfr. prova documental junta a fls.254/271 do processo físico, de onde se extrai que tal questão nunca foi levantada, e, ainda, cfr. prova testemunhal, nomeadamente depoimento das testemunhas L. e E., que confirmaram o quesito);
T) O recurso a empréstimos não é a única forma de cumprir o acordo [cfr. prova pericial, resposta dada no relatório pericial à questão nº3 formulada pelo Autor (e identificada no relatório pericial como quesito nº12), de onde se extrai que o Réu tinha nos anos de 2002 a 2007 bens, recursos, mecanismos, instrumentos e/ou capacidade financeira que lhe permitiam honrar o cumprimento das obrigações de natureza pecuniária que assumiu no âmbito do supra referido acordo, pagando as importâncias reclamadas na acção pelo Autor e, ainda, quanto mais não seja, porque com excepção do ano de 2003, em todos os restantes o Réu tinha capacidade para contrair empréstimos de Médio e Longo Prazo e cfr. prova testemunhal, nomeadamente a testemunha A., que afirmou que em 2008 o Réu recuperou capacidade de financiamento e que hoje em dia o Réu podia endividar-se e pagar o valor em causa nos autos];

U) O Réu tem outras fontes de receitas [cfr. prova pericial, resposta dada à questão nº 3 formulada pelo Autor (e identificada no relatório pericial como quesito nº12), de onde se extrai que o Réu tinha outras receitas (Impostos, Taxas e outras penalidades, Transferências correntes/Outros tipos de receitas correntes e bens transaccionáveis) que foi aumentando de 2002 a 2007, pelo que se conclui que o Réu tinha nos anos de 2002 a 2007 possuía receitas bens, recursos, mecanismos, instrumentos e/ou capacidade financeira que lhe permitiam honrar o cumprimento das obrigações de natureza pecuniária que assumiu no âmbito do supra referido acordo];
V) No ano de 2003 o Réu tinha cabimento orçamental para pagamento de terrenos, embora de valor inferior ao compromisso assumido (Facto instrumental extraído da prova pericial cfr. resposta do relatório pericial ao quesito nº9 e cujo teor se dá por reproduzido);
W) No ano de 2003 o Réu aumentou os seus compromissos para com terceiros (Facto instrumental extraído da prova pericial cfr. resposta do relatório pericial ao quesito nº10 e cujo teor se dá por reproduzido);
X) Em 2003, com as restrições à capacidade de endividamento constantes da Lei do Orçamento de Estado, o Réu pagou de encargos financeiros a quantia de € 1.394.851,00, não tendo contratado novos empréstimos nesse ano (Facto instrumental - cfr. resposta dada no Relatório Pericial ao “DÉCIMO PRIMEIRO QUESITO”, que o confirma e cujo teor se dá por reproduzido);
Y) O Réu tinha nos anos de 2002 a 2007 bens, recursos, mecanismos, instrumentos e/ou capacidade financeira provenientes, designadamente, de Impostos, Taxas e outras penalidades, Transferências correntes/Outros tipos de receitas correntes e bens transaccionáveis, que lhe permitiam honrar o cumprimento das obrigações de natureza pecuniária que assumiu no âmbito do acordo pagando as importâncias reclamadas pelo Autor, quanto mais não seja porque, com excepção do ano de 2003, em todos os restantes anos o Réu tinha capacidade para contrair empréstimos de Médio e Longo Prazo (tanto é que contraiu vários entre 2004 e 2006) no montante reclamado na acção judicial (Facto instrumental - cfr. fundamentação e resposta dada no Relatório Pericial ao “DÉCIMO SEGUNDO QUESITO”, que o confirma e cujo teor se dá por reproduzido);
Z) Nos balanços do Réu dos anos de 2004 a 2007, nos Passivos autónomos, a conta encontra-se a “0”, não tendo sido constituída pelo Réu qualquer provisão no seguimento da instauração da presente acção judicial (Facto instrumental - cfr. prova pericial ponto 3.12.5 do Relatório pericial e cujo teor se dá por reproduzido e prova testemunhal nomeadamente, o depoimento da testemunha A., que afirmou que o Réu não constituiu provisão com a instauração da presente acção);
AA) Hoje em dia o Réu podia endividar-se e pagar o valor em causa (Facto instrumental extraído da prova testemunhal, nomeadamente, o depoimento da testemunha A. que afirmou tal facto);

BB) Em reunião realizada em 09-09-1996, a Câmara Municipal de (...) deliberou por unanimidade aprovar a minuta do Acordo de colaboração para a construção da Escola Secundária de (...) nº2 ES/24T (Facto instrumental extraído do documento junto a fls.255/256 do processo físico e cujo teor se dá por reproduzido);
CC) O saldo de gerência do Réu que transitou do ano de 2003 para o ano de 2004 era de € 791.700,18 (Facto instrumental extraído da resposta dada no Relatório Pericial ao quesito nº8 e de onde se extrai tal facto);
DD) O Réu foi citado para a presente acção em 26-06-2007 (fls.139 do processo físico).

O Tribunal consignou:

Factos não provados:
Dos factos fixados na base instrutória, o tribunal considera não provados os seguintes factos:
1) O montante global dos encargos anuais da autarquia com as amortizações e juros dos empréstimos, de médio e longo prazo, calculado segundo a LFL, seria em 2003 de €1. 714.91,22 (cfr. resposta dada no Relatório Pericial ao artigo 2º da Base instrutória e cujo teor se dá por reproduzido, e da qual se extrai que tal montante era, no pior cenário, de € 1.394.851,22);

2) O montante dos fundos relevantes para o efeito, no mesmo período, era de €13.323.066,00, pelo que a soma dos duodécimos atingia €3.330.766,50 (cfr. resposta dada no Relatório Pericial ao artigo 3º da Base instrutória e cujo teor se dá por reproduzido, e da qual se extrai que tais montantes eram, respectivamente, de € 13.221.652,00 e € 3.305.413,00);

3) O Montante correspondente a 20% das despesas realizadas para investimento pelo Réu no ano de 2000 foi de €2.842.902,30 (cfr. resposta dada no Relatório Pericial ao artigo 4º da Base instrutória e cujo teor se dá por reproduzido, e da qual se extrai que tal montante era de € 2.425.574,42);

4) De acordo com a LFL o limite de endividamento do Réu seria de €1.615,850,20 (cfr. resposta dada no Relatório Pericial ao artigo 5º da Base instrutória e cujo teor se dá por reproduzido, e da qual se extrai que tal montante era de € 1.652.706,50);

5) O empréstimo a contrair para pagamento do preço da aquisição do terreno implicaria, no total dos encargos anuais com esse serviço de dívida do Réu, um acréscimo de €1.079.669,38 (cfr. resposta dada no Relatório Pericial ao artigo 6º da Base instrutória e cujo teor se dá por reproduzido, e da qual se extrai que caso o Réu tivesse contraído tal empréstimo no montante de €1.079.669,38, o serviço da dívida do Réu não aumentava nesse montante mas apenas dos juros e amortizações que tivessem sido contratados e se vencessem nesse ano e, ainda, que com a contracção do referido empréstimo o que aumentaria seria o stock da divida de empréstimos de Médio e Longo Prazo e não, necessariamente, o serviço da dívida).
*
Motivação
O Tribunal julgou provada e não provada a matéria de facto constante da fundamentação de facto, com base na matéria considerada assente no Despacho Saneador, com base no Relatório Pericial elaborado pela Sr.ª Perita junto por apenso ao processo principal, na análise crítica e conjugada dos documentos juntos aos autos e, ainda, na prova testemunhal produzida, tal como indicado em cada um dos factos constantes da referida fundamentação de facto.
Relativamente à prova testemunhal, refira-se que os depoimentos das testemunhas inquiridas se mostraram na generalidade imparciais e credíveis, demonstrando algumas das testemunhas conhecimento directo dos factos controvertidos (em especial as testemunhas A., L. e E.), pelo que o seu depoimento se mostrou especialmente relevante para dar resposta a alguns dos factos controvertidos cfr. indicado infra.
Assim, por via do Relatório Pericial elaborado e junto por apenso ao processo físico, foi possível considerar provados alguns dos factos constantes da Base instrutória e que constam, nomeadamente, das alíneas O), P), Q), R), T) e U), e considerar não provados os quesitos nºs 2º, 3º, 4º, 5º e 6º, ainda que conjuntamente com outros meios de prova, nomeadamente, testemunhal e documental nos termos melhor identificados e concretizados infra.
Foi ainda possível considerar provados por via da prova pericial os factos instrumentais constantes das alíneas V), W), X), Y), Z) e CC).
Relativamente à prova testemunhal, foi possível considerar como provados os factos constantes das alíneas S) e T), ainda que conjuntamente com outros meios de prova, nomeadamente, pericial e documental nos termos melhor identificados e concretizados infra.
Foi ainda possível considerar provados por via da prova pericial e testemunhal os factos instrumentais constantes das alíneas Z) e AA).
Por via da prova documental patente nos autos, foram considerados provados os factos constantes da alínea S), BB) e DD), ainda que conjuntamente com outros meios de prova, nomeadamente, testemunhal e documental, nos termos melhor identificados e concretizados infra.
Finalmente o teor das alíneas I), J), K) e N) foi considerada por acordo das partes.
Assim, os factos constantes das alíneas infra identificadas do probatório, foram considerados provados por via da seguinte prova produzida:
A) a M)- Factos considerados assentes no Despacho Saneador, acrescentando-se que os factos constantes das alíneas I), J) e K) foram considerados provados, por um lado, por via da matéria considerada assente no despacho saneador e por, por outro lado, foram admitidos por acordo das partes;
N)- Facto admitido por acordo em sede de audiência de discussão e julgamento;
O) -Resposta dada no Relatório Pericial ao quesito nº 1 da Base instrutória e cujo teor se dá por reproduzido;
P) -Resposta dada no Relatório Pericial ao quesito nº 7 da Base instrutória, que o confirma, e cujo teor se dá por reproduzido;
Q) -Resposta dada no Relatório Pericial ao quesito nº 8 da Base instrutória, que o confirma, e cujo teor se dá por reproduzido;
R) -Resposta dada no Relatório Pericial ao artigo 9º da Base instrutória e cujo teor se dá por reproduzido, e da qual se extrai que no ano de 2003 o Réu tinha cabimento orçamental para pagamento de terrenos, embora de valor inferior ao compromisso assumido e que face aos documentos contabilísticos disponibilizados, não foi possível concluir se o Réu em 2003 possuía verbas no seu orçamento para efectuar o pagamento;
S) -Prova documental junta a fls.254/271 do processo físico, de onde se extrai que tal questão nunca foi levantada, e, ainda, cfr. prova testemunhal, nomeadamente depoimento das testemunhas L. e E., que confirmaram o quesito;
T) - Prova pericial, resposta dada no relatório pericial à questão nº3 formulada pelo Autor (e identificada no relatório pericial como quesito nº12), de onde se extrai que o Réu tinha nos anos de 2002 a 2007 bens, recursos, mecanismos, instrumentos e/ou capacidade financeira que lhe permitiam honrar o cumprimento das obrigações de natureza pecuniária que assumiu no âmbito do supra referido acordo, pagando as importâncias reclamadas na acção pelo Autor e, ainda, quanto mais não seja, porque com excepção do ano de 2003, em todos os restantes o Réu tinha capacidade para contrair empréstimos de Médio e Longo Prazo e cfr. prova testemunhal, nomeadamente a testemunha A., que afirmou que em 2008 o Réu recuperou capacidade de financiamento e que hoje em dia o Réu podia endividar-se e pagar o valor em causa nos autos;
U) -Prova pericial, resposta dada à questão nº 3 formulada pelo Autor (e identificada no relatório pericial como quesito nº12), de onde se extrai que o Réu tinha outras receitas (Impostos, Taxas e outras penalidades, Transferências correntes/Outros tipos de receitas correntes e bens transaccionáveis) que foi aumentando de 2002 a 2007, pelo que se conclui que o Réu tinha nos anos de 2002 a 2007 possuía receitas bens, recursos, mecanismos, instrumentos e/ou capacidade financeira que lhe permitiam honrar o cumprimento das obrigações de natureza pecuniária que assumiu no âmbito do supra referido acordo;
V) -Facto instrumental extraído da prova pericial cfr. resposta do relatório pericial ao quesito nº9 e cujo teor se dá por reproduzido;
W) -Facto instrumental extraído da prova pericial cfr. resposta do relatório pericial ao quesito nº10 e cujo teor se dá por reproduzido;
X) -Facto instrumental extraído da resposta dada no Relatório Pericial ao “DÉCIMO PRIMEIRO QUESITO”, que o confirma e cujo teor se dá por reproduzido;
Y) -Facto instrumental extraído da fundamentação e resposta dada no Relatório Pericial ao “DÉCIMO SEGUNDO QUESITO”, que o confirma e cujo teor se dá por reproduzido;
Z) -Facto instrumental extraído da prova pericial ponto 3.12.5 do Relatório pericial e cujo teor se dá por reproduzido e prova testemunhal nomeadamente, o depoimento da testemunha A., que afirmou que o Réu não constituiu provisão com a instauração da presente acção;
AA) -Facto instrumental extraído da prova testemunhal, nomeadamente, o depoimento da testemunha A. que afirmou tal facto;
BB) -Facto instrumental extraído do documento junto a fls.255/256 do processo físico e cujo teor se dá por reproduzido;
CC) -Facto instrumental extraído da resposta dada no Relatório Pericial ao quesito nº8 e de onde se extrai tal facto;
DD) -Facto extraído de fls.139 do processo físico.
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Factos não provados
Dos factos fixados na base instrutória, o tribunal considera não provados os factos constantes dos artigos nºs 2º, 3º, 4º, 5º, 6º da mesma, por considerar que de toda a prova produzida não se provou o teor dos referidos artigos da Base instrutória cfr. se discrimina infra:
Art. 2º da Base instrutória: Cfr. resposta dada no Relatório Pericial ao artigo 2º da Base instrutória e cujo teor se dá por reproduzido, e da qual se extrai que tal montante era, no pior cenário, de € 1.394.851,22;
Art. 3º da Base instrutória: Cfr. resposta dada no Relatório Pericial ao artigo 3º da Base instrutória e cujo teor se dá por reproduzido, e da qual se extrai que tais montantes eram, respectivamente, de € 13.221.652,00 e € 3.305.413,00;
Art. 4º da Base instrutória: Cfr. resposta dada no Relatório Pericial ao artigo 4º da Base instrutória e cujo teor se dá por reproduzido, e da qual se extrai que tal montante era de € 2.425.574,42;
Art. 5º da Base instrutória: Cfr. resposta dada no Relatório Pericial ao artigo 5º da Base instrutória e cujo teor se dá por reproduzido, e da qual se extrai que tal montante era de € 1.652.706,50;
Art. 6º da Base instrutória: Cfr. resposta dada no Relatório Pericial ao artigo 6º da Base instrutória e cujo teor se dá por reproduzido, e da qual se extrai que caso o Réu tivesse contraído tal empréstimo no montante de €1.079.669,38, o serviço da dívida do Réu não aumentava nesse montante mas apenas dos juros e amortizações que tivessem sido contratados e se vencessem nesse ano e, ainda, que com a contracção do referido empréstimo o que aumentaria seria o stock da divida de empréstimos de Médio e Longo Prazo e não, necessariamente, o serviço da dívida.

DE DIREITO
Atente-se no discurso fundamentador da decisão:
Como referido supra, a única questão a decidir é se assiste ao Autor o direito ao pagamento pelo Réu da importância de € 967.523,78, acrescida dos respectivos juros de mora à taxa legal contados desde a data da citação até integral pagamento, devida pela resolução unilateral por parte do Réu do Acordo de colaboração m.i. na alínea A) do probatório.
Vejamos:
O Autor pretende na presente acção obter a condenação do Réu a pagar-lhe a quantia global de € 967.523,78 (novecentos e sessenta e sete mil quinhentos e vinte e três euros e setenta e oito cêntimos), acrescida dos respectivos juros de mora.
Funda tal pedido nos termos que expôs na Petição Inicial, no “Acordo de Colaboração”, referido em A) supra da factualidade assente, celebrado entre a Direcção Regional de Educação do Norte (DREN) e a Câmara Municipal de (...), alegando, em síntese, que aquele “Acordo de Colaboração” foi celebrado com vista à construção da Escola Básica e Secundária EB 3/S de (...), que nos termos daquele acordo competia entre o demais ao Réu Município adquirir, a expensas próprias, os terrenos com vista à construção da identificada escola, que havendo necessidade de expropriações os respectivos processos expropriativos poderiam ser desenvolvidos pela Direcção Regional de Educação do Norte responsabilizando-se o Réu Município pelo depósito, no momento próprio, dos respectivos montantes indemnizatórios, que aprovada a localização da escola foi declarada a utilidade pública das parcelas de terrenos abrangidos, cujas indemnizações foram, nuns casos, que identifica, acordadas com os proprietários e pagas pelo Réu, e noutros, fixadas judicialmente pelo Tribunal Judicial de (...), tendo estas últimas o pagamento das indemnizações sido suportadas pelo Autor no montante global de € 967.523,78, montante este que, por força do referido Acordo de Colaboração, deve ser suportada pelo Réu Município e que não obstante o Réu Município ter comunicado à DREN que denunciava o referido Acordo de Colaboração, em 23-04-2003, o Autor não aceita tal denúncia por serem ilegais, injustificados e infundados os motivos para tal alegados, como em devido tempo havia sido comunicado pelo Secretário de Estado da Administração Educativa nos termos do seu despacho de 09-07-2003.
Por seu turno o Réu pugna pela improcedência da acção alegando, em síntese, que tal “Acordo de Colaboração” foi por ele denunciado em virtude de entender que as obrigações assumidas pelo Réu violam o disposto nos arts. 39º, 41º, 51º, 52º, e 53º do DL nº 100/84, pois as obrigações ali assumidas não integram nenhuma das competências legalmente atribuídas aos órgãos do Réu no supra referido diploma, pelo que viola o princípio da especialidade previsto no art. 76º (e não 75º) do supra referido diploma, que quem assinou o acordo de colaboração em causa nos autos foi o Presidente da Câmara da (...) o qual, por força do disposto no art. 53º do DL nº 100/84, não tinha competência para o efeito, que o referido acordo viola ainda o disposto nos arts. 43º, 74º, 75º, 90º al. b), da CRP, uma vez que a garantia dos direitos ali consagrados incumbe ao Estado e não ao Réu que é uma autarquia local e que ainda que assim não se entenda, por força da Lei nº 159/99, de 14/08, o Autor não fica desonerado da obrigação de proporcionar ao Réu os recursos adequados e necessários á execução do acordo, designadamente, no caso de impossibilidade de cumprimento por parte do Réu da pagar a expensas suas o preço do terreno para a construção da Escola, teria o Autor de reassumir a sua obrigação arcando com esse custo cfr. art. 8º nº2 da referida lei, que, por outo lado, após a celebração do acordo em causa nos autos entrou em vigor a Lei das Finanças Locais (Lei nº 42/98, de 06/03), por via da qual ficou o Réu impossibilitado de recorrer a empréstimos para poder assumir os encargos decorrentes do acordo celebrado e, bem assim, por força do art. 19º nº1 da Lei nº 32-B/2002, de 30/12, a capacidade de endividamento dos municípios para o ano de 2003 foi drasticamente reduzida, além de que o nº2 do referido art. 19º bloqueou, ainda, o recurso a novos empréstimos de médio e longo prazo dos municípios que, devido a empréstimos contraídos em anos anteriores, já excedam o maior dos limites previstos no art. 19º nº1 da Lei nº 31-B/2002, dispondo para o passado e contrariando o princípio da não retroactividade das leis e que, assim, por força do art. 19º nº2 da Lei nº 32-B/2002, e da situação de tesouraria resultante dos empréstimos de médio e longo prazo contraídos em anos anteriores pelo Réu, este não dispunha à data de resolução do acordo de possibilidade de contrair um empréstimo equivalente ao montante do preço do terreno para construção da Escola, o que constituiria um grave delito financeiro contrário ao art. 53º nº2 al. d) da Lei nº169/99, de 18/09, que a alteração legislativa financeira para o ano de 2003, da responsabilidade do Autor, radical, introduziu uma alteração anormal e não prevista nas condições e pressupostos que determinaram a celebração do acordo entre Autor e Réu, sendo certo que a parte lesada por tais alterações, no caso o Réu, nos termos dos arts. 266º nº 2 da CRP, 6º-A do CPA e 13º do DL 97/99, de 08/06, tem direito à resolução do contrato ou à modificação do mesmo, sendo certo que foi o próprio Autor que promoveu, aprovou a supra referida legislação que impediu o Réu de cumprir o acordo em questão, que o acordo em causa não foi submetido a visto do Tribunal de Contas sendo, por isso, ineficaz por força dos arts. 8º al. c) e 13º al. a), b) e c) da Lei nº 86/89, de 08/09, não se lhe aplicando a excepção do art. 14º da referida Lei e, finalmente, que o acordo em causa viola os princípios da anualidade, consignação e especificação (art. 7º, 10º e 11º da Lei nº 41/83, de 21/06, art. 2º nº1 da LFL, art. 3º nº1 da Lei nº 42/98 e POCAL), pois no ano da resolução o Réu não tinha cabimento orçamental nem verbas para efectuar esse pagamento ao Autor nem afectar ou utilizar receitas de outras rúbricas ou ano financeiro.
Ora, antes do mais devemos ter presente que o “Acordo de Colaboração” em crise nos autos constitui um contrato administrativo à luz das disposições dos artigos 178º e 179 nº 1 do Código de Procedimento Administrativo (CPA) então em vigor, no caso celebrado entre duas entidades administrativas e pelo qual ambas acordaram os termos em que, com mútua colaboração, levariam a cabo a realização dos interesses públicos integrados nas respectivas atribuições, no caso os ligados e decorrentes da construção da Escola do Ensino Básico e Secundário EB 3/S de (...).
Através dele ambos os outorgantes, a DREN por um lado, e a Câmara Municipal de (...), por outro, assumiram reciprocamente, pelo acordo de vontades que nele manifestaram, as obrigações que nele plasmaram.
Atentemos nos termos do celebrado “Acordo de Colaboração”.
Nos termos vertidos no seu cabeçalho e no seu artigo 1º, o acordo aqui em causa, designado por “Acordo de Colaboração” foi celebrado com base nos artigos 17º e 20º do Decreto-Lei nº 387/87, de 24 de Dezembro (diploma que à data veio estabelecer o regime de celebração de contratos-programa de natureza sectorial ou plurissectorial no âmbito da cooperação técnica e financeira entre a administração central e um ou mais municípios, associações de municípios ou empresas concessionárias destes) e tinha por objecto a construção da Escola do Ensino Básico e Secundário EB 3/S de (...).
Constitui, por conseguinte, como já se referiu, um contrato administrativo à luz das disposições dos artigos 178º e 179 nº 1 do CPA, no caso celebrado entre um departamento da Administração Central do Estado (no caso a DREN) e uma Autarquia Local (no caso o Município de (...)) e pelo qual ambos acordaram os termos em que, com mútua colaboração, levariam a cabo a realização dos interesses públicos integrados nas respectivas atribuições, no caso os ligados e decorrentes da construção da Escola do Ensino Básico e Secundário EB 3/S de (...).
Como decorre do objecto e teor de tal acordo e do regime legal ao abrigo do qual foi celebrado, e para o qual ele expressamente remete, aquele acordo constitui um “Acordo de Colaboração” a que alude o nº 1 do artigo 17º do Decreto-Lei nº 387/87, de 24 de Dezembro, nos seguintes termos:
“(…)
Artigo 17.º Acordos de colaboração
1 - Poderão ainda ser celebrados acordos de colaboração nos domínios técnico e financeiro entre municípios e departamentos da administração central para a realização de empreendimentos de natureza sectorial e que, relevando exclusivamente do âmbito da competência de um departamento e de um município, não se revistam de complexidade, custo e duração de execução justificativos da elaboração de um contrato-programa.(…)”
Subsume-se aquele acordo, por conseguinte, na classe ou espécie de contrato administrativo a que MÁRIO ESTEVES DE OLIVEIRA, PEDRO COSTA GONÇALVES e J. PACHECO DE AMORIM, apelidam, in Código do Procedimento Administrativo, Comentado, Almedina, 2ª Edição, pág. 813, de contratos administrativos de cooperação ou coordenação, e que se caracterizam por serem celebrados entre entes públicos que cooperam entre si na realização de atribuições comuns ou no cumprimento de deveres legais da mesma natureza.
Através deste “Acordo de Colaboração” ambos os outorgantes assumiram reciprocamente entre si, pelo acordo de vontades que nele manifestaram, as obrigações que nele plasmaram e que dizem respeito a cooperação técnica nas tomadas de decisão que a cada um deles incumbia, nos termos das respectivas atribuições e a cooperação financeira, repartindo entre si, nos termos que ali estipularam, os encargos financeiros decorrentes da realização do empreendimento ali em causa.
Assim, de harmonia com o artigo 2º daquele Acordo incumbia à DREN o seguinte:
“1 – Indicar a melhor localização para a Escola, ouvida a Câmara Municipal;
2 – Escolher e aprovar, em colaboração com a Câmara Municipal, o terreno mais apropriado para a construção da escola;
3 – Assegurar o fornecimento dos projectos dos edifícios e dos arranjos exteriores, incluindo no perímetro da Escola;
4 – Lançar o concurso, adjudicar e garantir a fiscalização e coordenação das empreitadas;
5 – Garantir o financiamento do empreendimento através de dotações orçamentais inscritas, aprovadas e visadas nos termos legais;
6 – Assegurar a construção dos edifícios, englobando construção civil, instalação eléctrica, redes de água, esgotos e telefones, aquecimento e equipamentos fixos de cozinha e bufete;
7 – Assegurar a execução dos arranjos exteriores dentro do perímetro da escola, incluindo movimento de terras, pavimentações, ajardinamento, redes exteriores de abastecimento de água, incluindo furo (quando manifestamente necessário), drenagem de esgotos e águas pluviais, rede de cabos e iluminação exterior, incluindo posto de transformação (quando necessário);
8 – Assegurar a construção dos passeios e parqueamento da escola;
9 – Fornecer e instalar o mobiliário, material didáctico e equipamento de apoio administrativo;
10 – Promover o registo em favor do Estado de todos os bens que constituem o complexo escolar.”.

Por seu turno, e de harmonia com o artigo 3º daquele Acordo incumbia à Câmara Municipal de (...) o seguinte:
“1 – Colaborar com a DRE na definição da melhor localização da Escola, tendo em conta o Plano Director Municipal e os estudos existentes no âmbito da Carta Escolar, e indicar os terrenos que satisfaçam as exigências técnicas em vigor para a construção escolar;
“2 – Colaborar na escolha do terreno e fornecer à DRE o levantamento topográfico, a planta cadastral e todos os elementos solicitados para o seu registo a favor do Estado;
3 – Obter os pareceres de todas as entidades responsáveis pelo planeamento urbanístico e área de reserva e protecção, sempre que necessário;
4 – Adquirir, a expensas próprias, o terreno referido no nº2 assegurando a sua disponibilidade atempada, para efeitos do descrito no artigo 4º;
5 – Executar, a expensas próprias, os acessos e infra-estruturas urbanísticas de suporte ao funcionamento da Escola, nomeadamente, redes de saneamento, de águas pluviais, de abastecimento de água e de electricidade;
6 – Prestar o apoio técnico que lhe seja solicitado pela DRE.”.

À luz daquele Acordo e no que respeita ao terreno onde a Escola haveria de ser implantada incumbia à DREN indicar, escolher e aprovar o terreno mais apropriado para o efeito, ainda que após audição da Câmara Municipal e em colaboração com esta – cfr. decorre dos pontos 2.1. e 2.2 da cláusula 2ª, e incumbia à Câmara Municipal de (...) adquirir, a expensas próprias, tal terreno, assegurando a sua disponibilidade atempada para efeito do lançamento do concurso para a sua construção, a cargo da DREN – cfr. resulta da leitura conjugada do ponto 3.4 da cláusula 3ª e dos pontos 2.2, 2.4 da cláusula 2ª e da cláusula 4ª.
Assim, nos termos daquele Acordo os encargos com a construção e com o apetrechamento da Escola pertenciam à DREN, que era quem também, de acordo com as suas atribuições e competências, lançaria o concurso para a sua construção adjudicando a respectiva empreitada, estando a cargo da Câmara Municipal de (...) a aquisição, a expensas próprias, tal terreno. (negrito nosso)
Sucede porém que, conforme resulta do probatório, nomeadamente da conjugação das alíneas F), G), H), I), J), K), L), M) e N), a Câmara Municipal de (...) não adquiriu a totalidade do terreno onde haveria de ser implantada a Escola mas apenas parte dele, tendo as demais (as parcelas, nºs 1,2 e 3) sido adquiridas pela DREN no âmbito dos respectivos processos de expropriação em que foi entidade expropriante, e que correram termos no Tribunal Judicial de (...), tendo despendido com as respectivas indemnizações a quantia total de € 967.523,78, quantia cujo reembolso é aqui reivindicado.
O Réu contrapõe vários argumentos no sentido da ilegalidade (por nulidade) do Acordo assinado e que, na sua óptica, justificam a sua resolução do Acordo.
Analisemos cada um desses argumentos de per se.

Desde logo verifica-se que o Réu começa por alegar que as obrigações assumidas pela Câmara Municipal de (...) no referido Acordo violam o disposto nos arts. 39º, 41º, 51º, 52º, e 53º do DL nº 100/84, pois as obrigações ali assumidas não integram nenhuma das competências legalmente atribuídas aos órgãos do Réu no supra referido diploma, pelo que viola o princípio da especialidade previsto no art. 76º do referido diploma.
Porém não lhe assiste razão.
Com efeito, nos termos do referido Acordo a Administração Central comprometia-se, no essencial, a custear a construção da Escola e o Município a adquirir e ceder, atempadamente, o terreno necessário ao empreendimento.
Porém, tal empreendimento tratava-se, e trata-se, de um empreendimento que beneficia não só o Estado mas também o Município uma vez que é facto notório que se trata de uma escola que, pela sua própria natureza, terá principalmente como utentes as famílias do município (escola secundária mas também uma escola básica), pelo que a sua construção e custeio apenas pelo Réu também se compreenderia, independentemente do “Acordo de Colaboração”, no âmbito das atribuições e competências do Réu.
Com efeito, a Escola do Ensino Básico e Secundário EB 3/S de (...) integra o segundo e o terceiro ciclos do ensino básico – cfr. artigo 8º, n.º1, alíneas b) e c), da Lei 46/86, de 14.10 (Lei de Bases do Sistema Educativo), antes da alteração operada pela Lei 29/2005, de 30.08, aplicável ao caso, resultando por isso a atribuição do Réu neste âmbito do disposto no artigo 2º, n.º1, alínea f), do Decreto-Lei n.º 100/84, de 29.03, então em vigor, e que dispunha o seguinte:
“É atribuição das autarquias locais o que diz respeito aos interesses próprios, comuns e específicos das populações respectivas e, designadamente:
(…) f) à educação e ensino; (…)”(negrito nosso)

Acresce que a responsabilidade pela construção deste tipo de equipamentos resulta para o Município do artigo 8º do Decreto-Lei n.º 77/1984, de 8 de Março, também então em vigor, onde expressamente se refere que é “da competência dos municípios a realização de investimentos públicos”, entre outros, no domínio das “Escolas dos níveis de ensino que constituem o ensino básico”, diploma este que alude também o Decreto-Lei n.º 384/87, de 24.12, e promulgado a coberto de leis habilitantes, as Leis nº1/79, de 2/1, e nº10/83, de 06/09.
Assim sendo, como é, o compromisso assumido no dito “Acordo de Colaboração” de o Réu providenciar pela aquisição dos terrenos necessários à construção de uma escola que, para além do ensino secundário, também ministra o ensino básico é, plenamente válido e legal porque celebrado ao abrigo de decreto-lei produzido a coberto de lei habilitante, legislação ordinária que não padece de nenhuma inconstitucionalidade, em particular por violação do disposto no artigo 112º da Constituição da República Portuguesa, por alegada falta de lei habilitante ou por contradição com leis hierárquicas de valor hierárquico superior, razão pela qual o Decreto-Lei n.º 384/87, de 24.12, ao abrigo do qual foi celebrado o “Acordo de Colaboração” aqui em causa, é perfeitamente consentâneo com os seus ditames.
Em suma e não obstante não se surpreender no teor dos arts. 39º, 41º, 51º, 52º, e 53º do DL nº 100/84, a atribuição ao Réu (ou à Câmara Municipal de (...)) dos interesses da população respectiva em matéria de educação e ensino, tal matéria faz taxativamente e inquestionavelmente parte das suas atribuições enquanto Autarquia local por força do supracitado art. 2º nº1 f) da Lei nº 100/84, além de que os preceitos legais invocados pelo Réu não versam sobre matéria das atribuições da autarquia mas sim sobre a competência dos seus órgãos, o que é coisa diversa e não preclude as atribuições referidas no art. 2º do DL nº 100/84, pelo que por aqui não assiste razão ao Réu no sentido de considerar ilegal o Acordo celebrado com a DREN e justificada a sua resolução, não assistindo razão ao Réu neste segmento argumentativo.

Por outro lado, como outra causa justificativa da resolução do Acordo celebrado com a DREN e causa de ilegalidade do mesmo refere, ainda, o Réu que quem assinou o acordo de colaboração em causa nos autos foi o Presidente da Câmara da (...) o qual, por força do disposto no art. 53º do DL nº 100/84, não possuía competência para o efeito.
Porém, também neste argumento não assiste razão ao Réu.
De facto, resulta do disposto no art. 53º al. a) e b) do DL nº100/84, que é da competência do Presidente da Câmara Municipal representar o município em juízo e fora dele e executar as deliberações da câmara municipal e coordenar a respectiva actividade.
Ora atentado no probatório – alínea A) - verifica-se que a assinatura aposta no Acordo celebrado entre a DREN e a Câmara Municipal de (...) é do seu Presidente, razão pela qual se considera que no referido Acordo o Sr. Presidente da Câmara Municipal de (...) possuía competência para o acto na medida em que se encontrava a representar a Câmara Municipal de (...), não em juízo mas fora dele, mas sempre no âmbito das atribuições do município previstas no art. 2º nº1 f) do DL nº 100/84.
Acresce que, também resulta do probatório – mormente as alíneas C) e BB) – que a Câmara Municipal de (...) em reuniões realizadas em 09-09-1996 e 09-12-1996 deliberou por unanimidade a aprovação da minuta do Acordo de Colaboração m.i. na alínea A) do probatório e, bem assim, a disponibilização dos terrenos para construção da Escola do Ensino Básico e Secundário EB 3/S de (...) e para que a DREN diligenciasse no sentido de o Réu tomar posse administrativa urgente das parcelas de terreno necessárias para construção da Escola, pelo que também por aqui se verifica que o Sr. Presidente da Câmara Municipal de (...) possuía, além da competência supra referida por via do art. 53º al. a) para assinar o referido Acordo, igualmente competência para o efeito ao abrigo do disposto no art. 53º al. b) do DL nº 100/84, na medida em que se encontrava a executar deliberações da Câmara Municipal de (...). Assim sendo, como é, também por aqui não assiste razão ao Réu no sentido de que o Acordo celebrado era ilegal e que lhe assistia o direito à resolução do Acordo por falta de competência do Presidente da Câmara Municipal de (...) para o efeito, improcedendo também este segmento de argumentação defendido pelo Réu.

Mas o Réu defende, ainda, como causa de ilegalidade do Acordo e justificativa da resolução do mesmo, o facto de este violar o disposto nos arts. 43º, 74º, 75º, 90º al. b), da CRP, uma vez que a garantia dos direitos ali consagrados incumbe ao Estado e não ao Réu que é uma autarquia local.
Também nesta parte não se acompanha o entendimento do Réu.
Os artigos da CRP invocados pelo Réu dispõe o seguinte:
Artigo 43.º
(Liberdade de aprender e ensinar)
1. É garantida a liberdade de aprender e ensinar.
2. O Estado não pode programar a educação e a cultura segundo quaisquer directrizes filosóficas, estéticas, políticas, ideológicas ou religiosas.
3. O ensino público não será confessional.
4. É garantido o direito de criação de escolas particulares e cooperativas.
O art. 74º, por seu lado, sob a epígrafe “Ensino”, dispõe o seguinte:
1. Todos têm direito ao ensino com garantia do direito à igualdade de oportunidades de acesso e êxito escolar.
2. Na realização da política de ensino incumbe ao Estado:
a) Assegurar o ensino básico universal, obrigatório e gratuito;
b) Criar um sistema público e desenvolver o sistema geral de educação pré-escolar;
c) Garantir a educação permanente e eliminar o analfabetismo;
d) Garantir a todos os cidadãos, segundo as suas capacidades, o acesso aos graus mais elevados do ensino, da investigação científica e da criação artística;
e) Estabelecer progressivamente a gratuitidade de todos os graus de ensino;
f) Inserir as escolas nas comunidades que servem e estabelecer a interligação do ensino e das actividades económicas, sociais e culturais;
g) Promover e apoiar o acesso dos cidadãos portadores de deficiência ao ensino e apoiar o ensino especial, quando necessário;
h) Proteger e valorizar a língua gestual portuguesa, enquanto expressão cultural e instrumento de acesso à educação e da igualdade de oportunidades;
i) Assegurar aos filhos dos emigrantes o ensino da língua portuguesa e o acesso à cultura portuguesa;
j) Assegurar aos filhos dos imigrantes apoio adequado para efectivação do direito ao ensino.
Por seu lado, o art. 75º da CRP, sob a epígrafe “Ensino público, particular e cooperativo”, refere o seguinte:
1. O Estado criará uma rede de estabelecimentos públicos de ensino que cubra as necessidades de toda a população.
2. O Estado reconhece e fiscaliza o ensino particular e cooperativo, nos termos da lei.

Finalmente, o art. 90º da CRP dispõe que “Os planos de desenvolvimento económico e social têm por objectivo promover o crescimento económico, o desenvolvimento harmonioso e integrado de sectores e regiões, a justa repartição individual e regional do produto nacional, a coordenação da política económica com as políticas social, educativa e cultural, a defesa do mundo rural, a preservação do equilíbrio ecológico, a defesa do ambiente e a qualidade de vida do povo português.”.
Ora dos preceitos legais supracitados extrai-se, numa leitura prima facie é certo, que incumbe ao Estado a promoção da educação e cultura, incumbindo-lhe, designadamente, assegurar uma política de ensino que garanta a todos igualdade de oportunidades de acesso e êxito escolar e ainda, designadamente, incumbe ao Estado cria uma rede de estabelecimentos públicos de ensino que cubra as necessidades de toda a população.
Porém, para uma perspectiva plena de todo o quadro constitucional aplicável impõe-se chamar, ainda, à colação o disposto, designadamente, nos arts. 6º, 235º e 237º, todos da CRP.
Com efeito, dos referidos preceitos constitucionais retira-se, em súmula, que:
-no conceito de Estado se inserem, também, as Autarquias locais, com respeito pela sua autonomia;
-que as Autarquias locais são pessoas colectivas territoriais dotadas de órgãos representativos, que visam a prossecução de interesses próprios das populações respectivas, e, ainda,
-que as atribuições e a organização das Autarquias locais, bem como a competência dos seus órgãos, serão reguladas por lei, de harmonia com o princípio da descentralização administrativa.
Ou seja, por aqui verifica-se desde logo que não assiste razão ao Réu na defesa da tese de que a garantia do direito à educação e ao ensino das populações em todas as suas vertentes (nomeadamente na da construção de escolas) pertence apenas ao Estado corporizado na sua Administração Central mas, também, ao às Autarquias Locais enquanto parte integrante e descentralizada do Estado.
Foi no respeito por este quadro constitucional referido no parágrafo anterior que, designadamente, foram emanados quer o DL nº 100/84, quer o DL nº 384/87, os quais mais não são do que a concretização a nível infraconstitucional e de legislação ordinária, entre outros, dos preceitos constitucionais referidos retro (43º, 74º, 75º, 90º da CRP invocados pelo Réu) mas, também, do disposto nos arts. 6º, 235º e 237º da CRP, e de onde se retira que em matéria relativa à educação e ensino não existe um monopólio atribuído ao Estado enquanto Administração Central, no sentido da criação e construção de equipamentos para as populações mas, ao invés, tal tarefa pode ser atribuída e/ou repartida com as autarquias locais, como sucedeu in casu com a celebração do Acordo m.i. na alínea A) do probatório onde a Administração Central se comprometia, no essencial, a custear a construção da Escola e o Município a adquirir e ceder, atempadamente, o terreno necessário ao empreendimento, o que se mostra conforme, como já referimos, com as atribuições do Réu previstas no art. 2º nº1 f) do DL nº 100/84.
Tal empreendimento como referido supra tratava-se, e trata-se, de um empreendimento que beneficia não só o Estado mas também e em especial a população do Município – aliás como ressalta a todas as luzes da deliberação camarária de 09-09-1996 e m.i. na alínea BB) do probatório - uma vez que a escola em causa terá principalmente como utentes as famílias do município (escola secundária mas também uma escola básica), pelo que a sua construção também se compreenderia, independentemente do “Acordo de Colaboração”, no âmbito das atribuições e competências do Réu.
Como também referimos supra, a Escola do Ensino Básico e Secundário EB 3/S de (...) integra o segundo e o terceiro ciclos do ensino básico – cfr. artigo 8º, n.º1, alíneas b) e c), da Lei 46/86, de 14.10 (Lei de Bases do Sistema Educativo), antes da alteração operada pela Lei 29/2005, de 30.08, aplicável ao caso, resultando por isso a atribuição do Réu neste âmbito do disposto no artigo 2º, n.º1, alínea f), do Decreto-Lei n.º 100/84, de 29.03, então em vigor, e que dispunha que é atribuição das autarquias locais o que diz respeito aos interesses próprios, comuns e específicos das populações respectivas e, designadamente em matéria de educação e ensino.
A responsabilidade de construir este tipo de equipamentos resulta para o Município, ainda, do artigo 8º do Decreto-Lei n.º 77/1984, de 8 de Março, também então em vigor, onde expressamente se refere que é “da competência dos municípios a realização de investimentos públicos”, entre outros, no domínio das “Escolas dos níveis de ensino que constituem o ensino básico”, diploma este que alude também o Decreto-Lei n.º 384/87, de 24.12, e promulgado a coberto de leis habilitantes, as Leis nº1/79, de 2/1, e nº10/83, de 6/9.
Aliás, tal como resulta do preâmbulo do DL nº 384/87, diploma emanado ao abrigo do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 201º da CRP, por via de tal diploma visava-se proceder “à definição das condições para a participação do Estado no financiamento de projectos de investimento da responsabilidade dos diferentes níveis da Administração Pública, através da celebração de contratos-programa e de acordos de colaboração. A necessidade de adoptar medidas articuladas aconselha a que a cooperação técnica e financeira entre o Governo e as autarquias locais no domínio do desenvolvimento regional e local privilegie os projectos das autarquias locais incluídos em programas integrados de desenvolvimento regional e programas de reordenamento do litoral, ou incluídos em outros tipos de programas com carácter integrado, preferentemente no quadro da cooperação intermunicipal”, sendo referido no seu art. 17º que ao abrigo de tal diploma poderiam ser celebrados acordos de colaboração nos domínios técnico e financeiro entre municípios e departamentos da administração central para a realização de empreendimentos de natureza sectorial e que, relevando exclusivamente do âmbito da competência de um departamento e de um município, não se revistam de complexidade, custo e duração de execução justificativos da elaboração de um contrato-programa, entre os quais em matéria de educação e ensino cfr. resulta do art. 3º f) do DL nº 384/87, matéria que se inclui, manifestamente, nas atribuições do Réu (cfr. art. 2º nº1 f) do DL nº 100/84).
Assim sendo, o compromisso assumido no dito “Acordo de Colaboração” de o Réu providenciar pela aquisição dos terrenos necessários à construção de uma escola que, para além do ensino secundário, também ministra o ensino básico é, plenamente válido e legal porque celebrado ao abrigo de decreto-lei produzido a coberto de lei habilitante, legislação ordinária essa (os DL nºs 100/84 e nº 384/87 e ao abrigo dos quais foi celebrado o “Acordo de Colaboração” aqui em causa) que não padece de nenhuma inconstitucionalidade das apontadas pelo Réu mostrando-se em conformidade com os preceitos constitucionais constantes dos arts. 43º, 74º, 75º, 90º, 6º, 235º e 237º da CRP, pelo que se impõe concluir que também quanto a este fundamento não assiste razão ao Réu no sentido de justificar quer da resolução unilateral do Acordo celebrado com a DREN quer a sua ilegalidade por violação dos preceitos constitucionais invocados.

Acresce que o Réu funda, também, a legalidade do acto de resolução do Acordo e a ilegalidade do mesmo no facto de que por força da Lei nº 159/99, de 14/08, o Autor não ficar desonerado da obrigação de proporcionar ao Réu os recursos adequados e necessários á execução do acordo, designadamente, no caso de impossibilidade de cumprimento por parte do Réu da pagar a expensas suas o preço do terreno para a construção da Escola, teria o Autor de reassumir a sua obrigação arcando com esse custo cfr. art. 8º nº2 da referida lei e que, por outro lado, após a celebração do acordo em causa nos autos entrou em vigor a Lei das Finanças Locais (Lei nº 42/98, de 06/03), por via da qual ficou o Réu impossibilitado de recorrer a empréstimos para poder assumir os encargos decorrentes do acordo celebrado, que por força do art. 19º nº1 da Lei nº 32-B/2002, de 30/12, a capacidade de endividamento dos municípios para o ano de 2003 foi drasticamente reduzida, além de que o nº2 do referido art. 19º bloqueou, ainda, o recurso a novos empréstimos de médio e longo prazo dos municípios que, devido a empréstimos contraídos em anos anteriores, já excedam o maior dos limites previstos no art. 19º nº1 da Lei nº 32-B/2002 (e não 31-B/2002), dispondo para o passado e contrariando o princípio da não retroactividade das leis e que por força do art. 19º nº2 da Lei nº 32-B/2002, e da situação de tesouraria resultante dos empréstimos de médio e longo prazo contraídos em anos anteriores pelo Réu, este não dispunha à data de resolução do acordo de possibilidade de contrair um empréstimo equivalente ao montante do preço do terreno para construção da Escola, o que constituiria um grave delito financeiro contrário ao art. 53º nº2 al. d) da Lei nº169/99, de 18/09.
Também não acompanhámos o Réu quanto a este fundamento.
Com efeito, é certo que aquando da resolução do Acordo celebrado entre a DREN e a Câmara Municipal de (...), o Réu resolveu o contrato invocando a impossibilidade do seu cumprimento por razões que se prendem com falta de recursos financeiros/tesouraria e da impossibilidade de contrair novos empréstimos.
Todavia tal alegação não se mostra corroborada pelo probatório.
De facto, sendo certo que da matéria de facto considerada provada resulta, designadamente, que antes da publicação da LFL o Réu estava muito aquém do limite máximo permitido para o endividamento, que para o ano de 2003 viu ser diminuir a sua capacidade de endividamento, que não dispunha à data da resolução do acordo da possibilidade de contrair empréstimo equivalente (negrito nosso) ao montante do preço do terreno para a construção da Escola do Ensino Básico e Secundário EB 3/S de (...) e que no ano de resolução do contrato o Réu não tinha cabimento orçamental nem verbas no seu orçamento, para poder efectuar o pagamento [alíneas O), P), Q), R) do probatório], não é menos certo que resulta também do probatório que no ano de 2003 [alíneas R), S), T), U), V), W), Y), AA) e CC)]:
-o Réu possuía cabimento orçamental para pagamento de terrenos, embora de valor inferior ao compromisso assumido mas que face aos documentos contabilísticos disponibilizados, não foi possível concluir se o Réu em 2003 possuía verbas no seu orçamento para efectuar o pagamento;
-que o Réu à data da celebração do acordo de colaboração aqui em causa nunca pôs em causa a sua capacidade financeira;
-que o recurso a empréstimos não era a única forma de o Réu cumprir o acordo;
-que o Réu tinha outras fontes de receitas provenientes de Impostos, Taxas e outras penalidades, Transferências correntes/Outros tipos de receitas correntes e bens transaccionáveis, as quais até foram aumentando de 2002 a 2007, e que lhe permitiam honrar o cumprimento das obrigações de natureza pecuniária que assumiu no âmbito do acordo pagando as importâncias reclamadas pelo Autor;
-que, com excepção do ano de 2003, em todos os restantes anos o Réu tinha capacidade para contrair empréstimos de Médio e Longo Prazo (tanto é que contraiu vários entre 2004 e 2006) no montante reclamado na acção judicial;
-que o saldo de gerência que transitou do ano de 2003 para 2004 era de € 791.700,18;
-que, entretanto, o Réu adquiriu capacidade de endividamento para efectuar os pagamentos em falta.
Acresce que não resultou provado, ao contrário do alegado pelo Réu aquando da resolução do Acordo e em sede de contestação, que (cfr. referido na fundamentação da matéria de facto não provada):
-o montante global dos encargos anuais da autarquia com as amortizações e juros dos empréstimos, de médio e longo prazo, calculado segundo a LFL, seria em 2003 de €1.714.91,22 (tal montante era, no pior cenário, de € 1.394.851,22);
-que o montante dos fundos relevantes para o efeito, no mesmo período, era de €13.323.066,00, pelo que a soma dos duodécimos atingia €3.330.766,50 (tais montantes eram, respectivamente, de € 13.221.652,00 e € 3.305.413,00);
-que o montante correspondente a 20% das despesas realizadas para investimento pelo Réu no ano de 2000 foi de €2.842.902,30 (tal montante era de € 2.425.574,42);
-que de acordo com a LFL o limite de endividamento do Réu seria de €1.615,850,20 (tal montante era de € 1.652.706,50);
-que o empréstimo a contrair para pagamento do preço da aquisição do terreno implicaria, no total dos encargos anuais com esse serviço de dívida do Réu, um acréscimo de €1.079.669,38 (com tal empréstimo no montante de €1.079.669,38, o serviço da dívida do Réu não aumentava nesse montante mas apenas dos juros e amortizações que tivessem sido contratados e se vencessem nesse ano e, ainda, que com a contracção do referido empréstimo o que aumentaria seria o stock da divida de empréstimos de Médio e Longo Prazo e não, necessariamente, o serviço da dívida).
Do supra exposto conclui-se, cremos que com segurança, que o Réu não só não comprova que estivesse numa situação de impossibilidade de cumprimento das obrigações por si assumidas no Acordo celebrado com a DREN como resulta ao invés que o Réu não utilizou de todos os recursos, bens e capacidade financeira/tesouraria de que dispunha e que lhe permitiriam cumprir o Acordo, designadamente, por via da alienação de bens transaccionáveis, do saldo de gerência existente ou da cabimentação orçamental para aquisição de terrenos de que ainda dispunha, ou seja, o Réu não equacionou de entre todos os instrumentos e meios de que dispunha se e quais os que lhe permitiriam cumprir o acordado tendo optado, tout court pela resolução do Acordo celebrado com a DREN.
Façamos aqui um parêntesis para referir que ainda que se admitisse, o que não se concede, que o art. 19º nº2 da Lei nº 32-B/2002 é uma lei que dispõe para o passado e, nessa medida, é de aplicação retroactiva diga-se que desde logo nada na CRP proíbe a retroactividade das leis nem tal preceito legal foi declarado inconstitucional pelo Tribunal Constitucional, pelo que tal argumento não poderia colher.
De todo o modo, no nosso entendimento, tal não é o que sucede no caso em apreço na medida em que tal preceito legal apenas impedia que fossem contraídos novos empréstimos de médio e longo prazo, não versando sobre os já contraídos.
Com efeito, e quanto a estes últimos, o que o legislador fez foi vedar para o futuro a contracção pelos municípios de novos empréstimos de médio e longo prazo quando, tendo por base empréstimos anteriores, se mostre ultrapassado o limite constituído pelo valor correspondente a um oitavo dos Fundos de Base Municipal, Geral Municipal e de Coesão Municipal que cabe ao município ou a 10% das despesas realizadas para investimento pelo município no ano anterior.
Ou seja, o que na prática o legislador pretendeu introduzir foi uma figura analógica à da taxa de esforço máxima a que os municípios ficariam sujeitos de forma a garantir a sua sustentabilidade financeira futura, sendo certo que, naturalmente, na fixação de tal limite não poderia deixar de se ter em consideração os empréstimos de médio e longo prazo já contraídos pelos municípios ante, sob pena de, a não ser assim e caso se entendesse que seriam desprezáveis os montantes dos empréstimos anteriormente contraídos, o legislador estar a aumentar consideravelmente os limites de endividamento municipal no ano de 2003 para valores muito superiores aos do passado, o que, notoriamente, não é o escopo do legislador nem se mostraria desejável do ponto de vista da sustentabilidade financeira dos municípios no futuro com níveis de endividamento muito elevados e que poderiam pôr em causa a própria actividade dos municípios e o desenvolvimento das suas atribuições por constrangimentos financeiros, razão pela qual, e em suma, também quanto a este fundamento não colhe o argumento do Réu, mostrando-se o art. 19º nº2 da Lei nº 32-B/2002, perfeitamente conforme o quadro legal e constitucional em vigor.
Quanto à alegação de que por força do art. 19º nº2 da Lei nº 32-B/2002 e da situação de tesouraria resultante dos empréstimos de médio e longo prazo contraídos em anos anteriores pelo Réu, este não dispunha à data de resolução do acordo de possibilidade de contrair um empréstimo equivalente ao montante do preço do terreno para construção da Escola, o que constituiria um grave delito financeiro contrário ao art. 53º nº2 al. d) da Lei nº169/99, de 18/09, remetemos para o referido supra no que concerne ao facto de que o Réu tinha cabimento orçamental para pagamento de terrenos, embora de valor inferior ao compromisso assumido, que o Réu à data da celebração do acordo de colaboração aqui em causa nunca pôs em causa a sua capacidade financeira, que o recurso a empréstimos não era a única forma de cumprir o acordo, que o Réu tinha outras fontes de receitas provenientes de Impostos, Taxas e outras penalidades, Transferências correntes/Outros tipos de receitas correntes e bens transaccionáveis, as quais foram aumentando de 2002 a 2007 e que lhe permitiam honrar o cumprimento das obrigações de natureza pecuniária que assumiu no âmbito do acordo pagando as importâncias reclamadas pelo Autor, que com excepção do ano de 2003, em todos os restantes anos o Réu tinha capacidade para contrair empréstimos de Médio e Longo Prazo (tanto é que contraiu vários entre 2004 e 2006) no montante reclamado na acção judicial e que o saldo de gerência que transitou do ano de 2003 para 2004 era de € 791.700,18, razões pelas quais não necessitando o Réu de contrair empréstimos para cumprir o acordado e de se endividar fora dos limites previstos no art. 19º nº2 da Lei nº 32-B/2002, não haveria lugar à aplicação do disposto no art. 53º nº2 al. d) da Lei nº169/99 pelo que, também por aqui, se conclui que o Réu não estava (nem está) impossibilitado (legalmente e na prática) de cumprir com as obrigações de natureza pecuniária assumidas no Acordo de Colaboração celebrado com a DREN, não se mostrando o Acordo celebrado ilegal por violação dos arts. 8º da Lei nº 159/99, art. 19º, da Lei nº 42/98, dos nºs 1 e 2 da Lei nº 32-B/2002 ou do art. 53º nº2 al. d) da Lei nº169/99, e, bem assim, do princípio da não retroactividade não assistindo, também, quanto a este fundamento, razão ao Réu no sentido de justificar a resolução do Acordo celebrado com a DREN nem pouco que o Acordo celebrado seja ilegal por violação dos supra referidos preceitos legais.

O Réu invoca, ainda, como causa justificativa da resolução do Acordo celebrado com a DREN o facto de a mesma – a resolução - se dever a uma alteração legislativa financeira para o ano de 2003, da responsabilidade do Autor, radical, que introduziu uma alteração anormal e não prevista nas condições e pressupostos que determinaram a celebração do acordo entre Autor e Réu, sendo certo que a parte lesada por tais alterações, no caso o Réu, nos termos dos arts. 266º nº 2 da CRP, 6º-A do CPA e 13º do DL 197/99, de 08/06, tem direito à resolução do contrato ou à modificação do mesmo, sendo certo que foi o próprio Autor que promoveu, aprovou a supra referida legislação que impediu o Réu de cumprir o acordo em questão.
A questão que se coloca, então, é saber se a alegada existência de impossibilidade objectiva do cumprimento do objecto do Acordo pela Câmara se deveu a uma essencial alteração das circunstâncias do Acordo inicial ocorrida por razões imputáveis à DREN e de incumprimento da obrigação de boa-fé contratual desta.
Cremos que não por várias ordens de razões.
Desde logo porque, como já referimos supra e para onde remetemos por razões de economia processual, não se comprovou que o Réu estivesse impossibilitado (ou esteja), bem pelo contrário, de cumprir com as obrigações assumidas no Acordo m.i. na alínea A) do probatório.
Por outro lado, note-se que não obstante o Autor Estado Português dizer no artigo 15º da sua PI que não aceita a “denúncia” do Acordo, afirmando serem ilegais, injustificados e infundados os motivos ali alegados para tal, na realidade o que consta daquela declaração – alínea H) do probatório-, feita pelo Presidente da Câmara Municipal de (...) assume antes a natureza de uma rescisão unilateral do contrato e não de denúncia.
Porém para essa rescisão unilateral não foram invocados imperativos de interesse público, mormente na acepção dada na alínea c) do artigo 180º do Código de Procedimento Administrativo a tal expressão, sendo certo que tal normativo nem é invocado pelo Réu na comunicação da resolução do contrato.
Note-se que o contrato administrativo é uma figura material ou substancialmente distinta da figura do negócio ou contrato ius civilista, investindo as partes numa posição ou relação jurídica diversa daquela que resulta para os contraentes que se comprometem no domínio do direito privado, e que se traduz desde logo no facto de poder prevalecer o factor interesse público sobre o acordado entre as partes (o pacta sunt servanda) que domina imperialmente no direito privado.
No caso em apreço, o respeito pela boa-fé no contexto de qualquer actuação da Administração Pública, e por conseguinte também no âmbito da execução dos contratos, decorre desde logo do artigo 266º nº 2 da CRP e do artigo 6º-A do CPA (e, bem assim, do art. 13º do DL 197/99, de 08/06), disposições estas de acordo com as quais no exercício da actividade administrativa e em todas as suas formas e fases, a Administração Pública, bem como os particulares, devem agir e relacionar-se segundo as regras da boa-fé, devendo para o efeito ponderar-se os valores fundamentais do direito, relevantes em face das situações consideradas, em especial a confiança suscitada na contraparte pela actuação em causa e o objectivo a alcançar com a actuação empreendida.
Este princípio é igualmente acolhido no domínio do cumprimento contratual pelo artigo 762º nº 2 do CC.
Neste âmbito proceder segundo as regras da boa-fé significará, genericamente, actuar "de acordo com os padrões da diligência, da honestidade e da lealdade exigíveis do homem no comércio jurídico" (nas palavras de PIRES DE LIMA e ANTUNES VARELA, in, Código Civil Anotado), sendo numa perspectiva ou dimensão subjectiva " um estado ou situação de espírito que se traduz no convencimento da licitude de certo comportamento ou na ignorância da sua ilicitude", e numa perspectiva ou dimensão objectiva um " princípio normativo de actuação” significando “que as pessoas devem ter um comportamento honesto, correcto, leal, nomeadamente no exercício dos direitos e deveres, não defraudando a legítima expectativa dos autos" (nas palavras de J. COUTINHO DE ABREU, in Do Abuso do Direito, 1983, pág. 55).
Por contraposição, agir sem boa-fé, significa, actuar através de um comportamento desonesto, incorrecto, desleal ou negligente, assumindo-se, nos casos de má-fé, "com fito, directo ou necessário, de lesar os interesses de outra pessoa" (nas palavras de MENEZES CORDEIRO, in, Obrigações, 1980, 1.º Vol., pág. 145).

Ora, quanto a esta matéria o que decorre dos autos insofismavelmente e resulta da factualidade provada é que a DREN cumpriu com todas as suas obrigações contratuais (e com algumas da responsabilidade do Réu) e que a Câmara Municipal de (...) só cumpriu com parte das obrigações por si assumidas tendo a DREN cumprido com as restantes.
Com efeito, logo após a celebração do “Acordo de Colaboração” o Município de (...) solicitou à DREN que esta desencadeasse os processos expropriativos dos terrenos envolvidos, cujas plantas cadastrais enviou, assumindo o compromisso dos correspondentes pagamentos, sendo que posteriormente e no decurso do ano de 1997, concordou com os novos limites do empreendimento propostos.
Por outro lado, não decorre que tenham sido estipulados valores considerados razoáveis ou pelo menos críveis ou prováveis com a aquisição ou expropriação de tais terrenos, como também não resulta que tenha sido acordado entre os entes públicos envolvidos qualquer forma de articulação, colaboração ou assistência na condução dos processos expropriativos, cuja direcção ficou totalmente a cargo da DREN, pelo que neste aspecto não se pode dizer que pelo facto de ter sido a DREN a conduzir os processos expropriativos, não tendo a Câmara Municipal de (...) intervindo neles seja de concluir que aquela teve um comportamento desleal ou incorrecto para com o Município nem sequer quanto à circunstância de as indemnizações que foram judicialmente fixadas terem atingido os valores que atingiram e que, alegadamente (pelo Réu) mas não comprovadamente, eram incomportáveis para o Réu.
Quanto à falta de cabimentação orçamental necessária para que o Município fizesse face a tais custos por via da alteração legislativa ocorrida em 2003 e à diminuição da sua capacidade de endividamento, como já referimos supra não só o Réu dispunha (e dispõe) de outras formas e meios que, de per se ou conjuntamente com outros, lhe permitiam (e permitem) cumprir pontualmente com o acordado com a contraparte [pois o Réu dispunha de cabimento orçamental parcial para aquisição de terrenos, de bens transaccionáveis cuja alineação poderia permitir cumprir com o acordado ou quer porque dispunha de um saldo de gerência que transitou do ano de 2003 para 2004 de € 791.700,18 (valor ligeiramente inferior ao aqui causa nos autos)], como também se verifica que mesmo face a tal alteração legislativa e diminuição da capacidade de endividamento impunha-se que o Réu lançasse mão dos mecanismos financeiros e orçamentais para o efeito, mormente em articulação com a DREN à luz do previsto no Ponto 2.5 do “Acordo de Colaboração” e de harmonia com o quadro legal aplicável, mormente o decorrente da Lei das Finanças Locais então vigente e do regime de cooperação e colaboração técnica e financeira previsto no Decreto-Lei nº 384/87, de 24 de Dezembro e não resolver, sublinhe-se, tout court o Acordo celebrado, sendo pacífico que a resolução de um contrato por uma das partes constitui a última ratio e fronteira a ultrapassar no âmbito de uma relação de cariz contratual.
Por seu lado, e ao invés, constata-se que foi o Autor a suportar os custos das indemnizações devidas pela expropriação das parcelas 1,2, e 3 e cuja responsabilidade pelo seu pagamento incumbia ao Réu por força do Acordo celebrado.
Finalmente, note-se que a alteração a que o Réu se refere é, efectivamente, de natureza legislativa, ou seja, tem a sua origem na Assembleia da República no âmbito do exercício da função legislativa do Estado Não é despiciendo recordar que é um facto notório que alterações legislativas ao nível da Lei do Orçamento de Estado para o ano de 2003 se deveram à necessidade de o Estado Português atingir no ano de 2003 um défice orçamental inferior 3% do Produto Interno Bruto (PIB) – o qual no ano de 2002 foi segundo o Eurostat de 2,7% -, pelo que, nesta medida, as alterações legislativas a que o Réu alude e que foram introduzidas na Lei do Orçamento de Estado para 2003 são consequência dos compromissos e obrigações assumidas internacionalmente pelo Estado Português (onde se incluem as Autarquias locais como vimos) junto da Comissão Europeia., e não administrativa/executiva, não sendo a mesma imputável à DREN (ou ao Ministério da Educação), a qual sempre actuou ao abrigo e de acordo com os diplomas legais supra referidos os quais, se mostram, como vimos, conformes com o quadro constitucional e legal vigente à data e, bem assim, cumprindo com todas as cláusulas do Acordo das quais resultavam obrigações para si (DREN).
Em suma, pelos motivos supra expostos, não só não está comprovado – mormente cfr. decorre das alíneas S), T), U), V), Y), AA) e CC) – que o Réu não estava (nem está) impossibilitado de cumprir com as obrigações por si assumidas no âmbito do Acordo de colaboração, como também a referida alteração legislativa nem é imputável à DREN, além de que, não é despiciendo recordar, a mesma teve na sua origem um interesse eminentemente público e geral e que consistia na necessidade de o Estado Português (onde se incluem, designadamente, a Administração Central, as Regiões Autónomas e as Autarquias Locais) cumprir com os compromissos internacionais assumidos para com a Comissão Europeia no sentido de atingir no ano de 2003 um défice orçamental inferior a 3% do PIB.
Visto tudo isto, forçoso é concluir que não se mostra violado o principio da boa-fé pela DREN e que o “Acordo de Colaboração” foi incumprido injustificadamente pelo Réu Município no que respeita ao compromisso de depósito atempado das indemnizações por expropriação dos terrenos envolvidos no empreendimento objecto daquele Acordo, incumprimento que lhe é imputável já que não é de concluir, como se viu, que tenha sido a DREN (ou o Estado Português) a incumprir tal acordo ou a conduzir, por culpa sua, ao incumprimento em que incorreu o Réu, sendo certo que a falta de cabimentação orçamental parcial do Réu ou a impossibilidade de contracção de novos empréstimos, não era justo motivo para não proceder ao pagamento em causa face á disponibilidade de quantias (saldo de gerência de € 791.700,18), existência de bens alienáveis e outras fontes de receitas e, dessa forma, cumprir o acordado, não se mostrando nessa medida violado pela DREN (ou pelo Estado) o princípio da boa-fé previsto no art. 266º nº2 da CRP e 6º-A do CPA (afigurando-se sim que tal princípio se mostra violado sim pelo Réu e pelos motivos expostos), razão pela qual também por aqui improcede a argumentação do Réu no sentido de justificar a resolução do Acordo celebrado ou que o mesmo padeça de qualquer ilegalidade.
Refere, ainda, o Réu como causa justificativa da resolução do Acordo em causa o facto de que o mesmo não foi submetido a visto do Tribunal de Contas sendo, por isso, ineficaz por força dos arts. 8º al. c) e 13º al. a), b) e c) da Lei nº 86/89, de 08/09, não se lhe aplicando a excepção do art. 14º da referida Lei.
O Autor refere que tendo em consideração que no referido Acordo não foi atribuído qualquer valor e que por força do art. 13º nº3 da Lei nº 86/89, só devem ser remetidos ao Tribunal de Contas, para efeitos de fiscalização prévia, os contratos celebrados pelas autarquias locais que excedam um valor superior a definir por lei, o Acordo em causa mostra-se válido e eficaz não estando sujeito ao referido visto.
Todavia, também quanto a este fundamento não assiste razão ao Réu.
Desde logo porque, de facto e como refere o Autor, do Acordo em causa não consta qualquer valor atribuído pelo que por aqui desde logo fica afastada a necessidade de visto prévio do Tribunal de Contas por aplicação do art. 13º nº3 da Lei nº 86/89.
Porém, uma razão maior justifica esta desnecessidade.
Com efeito, resulta do teor do Acordo celebrado entre a DREN e a Câmara Municipal de (...) que o mesmo é celebrado ao abrigo do DL nº 384/87.
Do referido diploma consta o regime regulador da celebração dos vários tipos de Contrato Programa [entre o Estado (enquanto administração central) e as Autarquias Locais], prevendo, ainda, a possibilidade de recurso a Acordos de Colaboração quando não se justifique o recurso a Contrato Programa, ou seja, os Acordos de Colaboração surgem no referido DL nº 384/87 como um instrumento jurídico “menor” e de hierarquia inferior face ao Contrato Programa.
Ora, o legislador no art. 7º nº2 do DL nº 384/87, previu que os contratos-programa celebrados ao abrigo deste diploma, não carecem de visto do Tribunal de Contas.
Assim sendo, aplicando tal norma mutatis mutandis, a fortiori e por analogia aos Acordos de colaboração previstos no mesmo diploma, impõe-se concluir que o legislador pretendeu afastar a necessidade de visto prévio do Tribunal de Contas destes instrumentos legais, ou seja, os Contratos-Programa e os Acordos de Celebração celebrados ao abrigo do DL nº 387/84, não carecem de visto prévio do Tribunal de Contas para serem perfeitamente válidos e eficazes, razão pela qual também por aqui improcede este argumento apresentado pelo Réu.
Alega, ainda, o Réu como razão justificativa para a resolução do Acordo de Colaboração em causa nos autos que o acordo em causa viola os princípios da anualidade, consignação e especificação (art. 7º, 10º e 11º da Lei nº 41/83, de 21/06, art. 2º nº1 da LFL, art. 3º nº1 da Lei nº 42/98 e POCAL), pois no ano da resolução o Réu não tinha cabimento orçamental nem verbas para efectuar esse pagamento ao Autor nem afectar ou utilizar receitas de outras rúbricas ou ano financeiro.
Ora, o art. 2º nº 1 da Lei nº 1/87, de 06/01 (Lei das Finanças Locais), refere que os orçamentos das Autarquias locais respeitam, designadamente, os princípios da anualidade, especificação e não consignação.
Porém, e não obstante o postulado pelos referidos princípios os quais se encontram melhor densificados no DL nº 341/83, de 21/07 (arts. 7º, 10º nº1 e 11º) e no POCAL, não é menos certo que também aqui não podemos acompanhar o Réu nesta alegação na medida em que, sendo certo que no ano da resolução do contrato o Réu não dispunha de cabimento orçamental total para aquisição de terrenos que lhe permitisse suportar o custo integral dos montantes em causa nos autos [cfr. alínea R) do probatório, pois no ano de 2003 o Réu tinha cabimento orçamental para pagamento de terrenos, embora de valor inferior ao compromisso assumido], não é menos certo que está provado - cfr. alíneas S), T), U), V), W), Y), AA) e CC) do probatório - que o Réu à data da celebração do Acordo de Colaboração em crise não só nunca pôs em causa a sua capacidade financeira/orçamental, como também que o recurso a empréstimos não era a única forma de cumprir o acordo (pois o Réu possuía outras fontes de receitas que foi aumentando de 2002 a 2007), que no ano de 2003 o Réu tinha cabimento orçamental para pagamento de terrenos, embora de valor inferior ao compromisso assumido e que neste ano o Réu até aumentou os seus compromissos para com terceiros, que com excepção do ano de 2003, em todos os restantes anos o Réu tinha capacidade para contrair empréstimos de Médio e Longo Prazo (tanto é que contraiu vários entre 2004 e 2006) no montante reclamado nesta acção judicial, que o Réu tinha nos anos de 2002 a 2007 bens, recursos, mecanismos, instrumentos e/ou capacidade financeira (provenientes, designadamente, de Impostos, Taxas e outras penalidades, Transferências correntes/Outros tipos de receitas correntes e bens transaccionáveis e passiveis de alineação), que lhe permitiam honrar o cumprimento das obrigações de natureza pecuniária que assumiu no âmbito do acordo pagando as importâncias reclamadas pelo Autor e, ainda, porque possuía um saldo de gerência no final do ano de 2003 de € 791.700,18, montante que por si só permitiria suportar a quase totalidade do montante em dívida.
Ou seja, aquando da resolução do Acordo o Réu não estava impedido de efectuar o pagamento do valor em causa nos autos no quadro do seu orçamento, designadamente, com recurso ao imobilizado corpóreo ou dos saldos disponíveis e indicados na sua contabilidade, visto que da mesma (da contabilidade do Réu reportada ao ano de 2003) consta, designadamente, a existência quer de bens transaccionáveis/alienáveis (cfr. alínea Y) do probatório), quer de saldos de gerência (no montante de € 791.700,18 – cfr. alínea CC) do probatório), passíveis de serem utilizados/canalizados no sentido do pagamento dos valores em causa nos autos e cujo pagamento incumbia ao Réu, pelo que assim sendo, se impõe concluir que o Réu dispunha de um leque de meios/bens/recursos financeiros e tesouraria que lhe permitiriam suportar o valor em dívida e efectuar os pagamentos a que se obrigou por via da celebração do Acordo de Colaboração referido em A), não colocando em causa os referidos princípios ou normas invocados [princípios da anualidade, consignação e especificação (art. 7º, 10º e 11º da Lei nº 41/83, de 21/06, art. 2º nº1 da LFL, art. 3º nº1 da Lei nº 42/98 e POCAL)] o que é suficiente para concluir que também neste segmento não assiste razão ao Réu na resolução do Acordo de Colaboração celebrado com a DREN ou no sentido de que o mesmo viola os supra referidos preceitos legais.
Aqui chegados, improcedendo todos os fundamentos invocados pelo Réu no sentido de justificar a resolução do Acordo m.i. na alínea A) do probatório e constatando-se que o Acordo celebrado se mostra plenamente cfr. o quadro constitucional e legal aplicável, sendo válido e eficaz, impõe-se concluir que a presente acção tem de proceder.
*
Relativamente aos juros de mora, nos termos do disposto no artigo 805º nºs 1 e 2 do Código Civil são devidos juros de mora à taxa legal, desde a data da citação do Réu [26-06-2007 – cfr. alínea DD) do probatório] até integral pagamento.
X
Apesar das diversas falhas assacadas a esta decisão, salta à evidência que a razão está do lado do Autor/Recorrido.
O recurso interposto visa a apreciação da sentença nas suas vertentes fáctica e jurídica.
De acordo com as respectivas conclusões, que delimitam o seu objecto, pretende o Recorrente vê-la revogada com o consequente julgamento no sentido da improcedência da acção contra si interposta pelo Ministério Público.
Já se disse que a decisão considerou a acção procedente condenando o Réu a pagar ao Estado Português a soma de € 967.523,78, acrescida de juros de mora à taxa legal contados desde a citação (26/06/2007) até integral pagamento.
Isto porque considerou improcedentes todos os fundamentos invocados pelo Réu no sentido de justificar a resolução do Acordo que havia celebrado com o A., através da Direcção Regional de Educação do Norte (DREN), que tinha por objectivo a construção da Escola do Ensino Básico e Secundário EB 3/S de (...), e por força do qual o Réu se obrigou a adquirir a expensas próprias o terreno onde iria ser implantado o edifício escolar, assegurando a sua disponibilidade atempada para colocar o empreendimento a concurso, bem como executar, também a expensas próprias, os acessos e infra-estruturas urbanísticas de suporte ao funcionamento da escola.
Na sua alegação, invoca o Réu que devem ser alteradas as respostas dadas na sentença recorrida aos pontos nº 2 a 6 da Base Instrutória, que em seu entender se deverão restringir ao que consta do teor do Relatório Pericial constante dos autos, invocando também de novo a argumentação jurídica já usada na contestação e que foi considerada improcedente na sentença recorrida.
Suscita ainda, vide os pontos nº 42 e 43 das suas «conclusões», a questão da apreciação da inconstitucionalidade do artigo 7º nº 2 do DL 384/87, de 24 de Dezembro, ao prever que os contratos-programa celebrados ao abrigo desse diploma não carecem de visto do Tribunal de Contas, por violação do artigo 168º nº 1 al. q) da Constituição da República Portuguesa, por entender que a Assembleia da República não conferiu ao Governo autorização para declarar a isenção de visto dos contratos-programa.
Vejamos:
Do erro de julgamento de Facto -
Conforme tem sido sistematicamente entendido, quer pela doutrina quer pela jurisprudência, no que respeita à modificação da matéria de facto dada como provada pela 1ª instância, o Tribunal de recurso só deve intervir quando a convicção desse julgador não seja razoável, isto é, quando seja manifesta a desconformidade dos factos assentes com os meios de prova disponibilizados nos autos, dando-se, assim, a devida relevância aos princípios da oralidade, da imediação e da livre apreciação da prova, bem como à garantia do duplo grau de jurisdição sobre o julgamento da matéria de facto - acórdão do STA, de 19/10/2005, proc. 0394/05. Aí se refere, no que aqui releva, que “o art. 690º-A do CPC impõe ao recorrente o ónus de concretizar quais os pontos de facto que considera incorretamente julgados e de indicar os meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão diversa da recorrida. Este artigo deve ser conjugado com o 655° do CPCivil que atribui ao tribunal o poder de apreciar livremente as provas, decidindo os juízes segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto. Daí que, dos meios de prova concretamente indicados como fundamento da crítica ao julgamento da matéria de facto deva resultar claramente uma decisão diversa. É por essa razão que a lei utiliza o verbo “impor”, com um sentido diverso de, por exemplo, “permitir”. Esta exigência decorre da circunstância de o tribunal de recurso não ter acesso a todos os elementos que influenciaram a convicção do julgador, só captáveis através da oralidade e imediação e, muitas vezes, decisivos para a credibilidade dos testemunhos. (É pacífico o entendimento dos Tribunais da Relação, neste ponto. Só deve ser alterada a matéria de facto nos casos de manifesta e clamorosa desconformidade dos factos assentes com os meios de prova disponibilizados nos autos, dando assim prevalência ao princípio da oralidade, da prova livre e da imediação - cfr. Abrantes Geraldes “Temas da Reforma do processo Civil, II vol., 4ª edição, 2004, págs. 266 e 267
Este entendimento tem sido seguido pela generalidade da jurisprudência (...): “A garantia do duplo grau de jurisdição não subverte, nem pode subverter, o princípio da livre apreciação das provas e não se pode perder de vista que na formação da convicção do julgador entram, necessariamente, elementos que em caso algum podem ser importados para a gravação da prova e fatores que não são racionalmente demonstráveis”, de tal modo que a função do Tribunal da 2.ª instância deverá circunscrever-se a “apurar a razoabilidade da convicção probatória do 1.° grau dessa mesma jurisdição face aos elementos que agora lhe são apresentados nos autos” Acórdão de 13/10/2001, em Acórdãos do T. C. vol. 51°, pág. 206 e ss..)”.
Na verdade, decorre do regime legal vertido nos arts. 140º e 149º do CPTA que este Tribunal ad quem conhece de facto e de direito sendo que na apreciação do objeto de recurso jurisdicional que se prende com a impugnação da decisão de facto proferida pelo tribunal a quo se aplica ou deve reger-se, na ausência de regime legal especial, pelo regime que se mostra fixado em sede da legislação processual civil nesta sede. Ora com a revisão do CPC operada pelo DL 329-A/95, de 12/12, e pelo DL 180/96, de 25/09, foi instituído, de forma mais efectiva, a garantia do duplo grau de jurisdição da matéria de facto. Importa, porém, ter presente que o poder de cognição deste Tribunal sobre a matéria de facto ou controlo sobre a decisão de facto prolatada pelo tribunal a quo não assume uma amplitude tal que implique um novo julgamento de facto, sendo certo que da situação elencada (impugnação jurisdicional da decisão de facto - artº 690º-A do CPC) se distinguem os poderes previstos no n.º 2 do artº 149º do CPTA que consagram solução diversa e de maior amplitude da que se mostra consagrada nos artº 712º e 715º do CPC. Assim, pese embora tal regime e situações diversas temos, todavia, que referir que os poderes conferidos no artº 149º/2 do CPTA não afastam os poderes de modificação da decisão de facto por parte deste Tribunal ao abrigo do artº 712º do CPC por força da remissão operada pelos arts. 1º e 140º do CPTA porquanto o TCA mantém os poderes que assistem ao tribunal de apelação no âmbito da fixação da matéria de facto quando esta constitui objeto ou fundamento de recurso jurisdicional. Daí que sobre o Recorrente impenda um especial ónus de alegação quando pretenda efetuar impugnação com aquele âmbito mais vasto, impondo-se-lhe, por conseguinte, dar plena satisfação às regras previstas no artº 690º-A do CPC. É que ao TCA assiste o poder de alterar a decisão de facto fixada pelo tribunal a quo desde que ocorram os pressupostos vertidos no artº 712º/1 do CPC, incumbindo-lhe, nessa medida, reapreciar as provas em que assentou a decisão impugnada objecto de controvérsia, bem como apreciar oficiosamente outros elementos probatórios que hajam servido de fundamento à decisão sobre aqueles pontos da factualidade controvertidos.
A este propósito e tal como sustentado pelo Prof. Mário Aroso e pelo Cons. Fernandes Cadilha “(…) é entendimento pacífico que o tribunal de apelação, conhecendo de facto, pode extrair dos factos materiais provados as ilações que deles sejam decorrência lógica (…). Por analogia de situação, o tribunal de recurso pode igualmente sindicar as presunções judiciais tiradas pela primeira instância pelo que respeita a saber se tais ilações alteram ou não os factos provados e se são ou não consequência lógica dos factos apurados. (…) ” (em ob. cit., pág. 743).” (…) “Retomando o que supra fomos referindo sobre a amplitude dos poderes de cognição do tribunal de recurso sobre a matéria de facto temos que os mesmos não implicam um novo julgamento de facto, porquanto, por um lado, tal possibilidade de conhecimento está confinada aos pontos de facto que o Recorrente considere incorretamente julgados e desde que cumpra os pressupostos fixados no artº 690º-A n.ºs 1 e 2 do CPC, e, por outro lado, o controlo de facto, em sede de recurso, tendo por base a gravação e/ou transcrição dos depoimentos prestados em audiência, não pode aniquilar (até pela própria natureza das coisas) a livre apreciação da prova do julgador, construída dialeticamente na base da imediação e da oralidade.
Os poderes de modificabilidade da decisão de facto que o artigo 712º do CPC atribui ao tribunal superior envolvem apenas a deteção e correção de pontuais, concretos e excepcionais erros de julgamento e não uma reapreciação sistemática e global de toda a matéria de facto.” “Para que seja alterada a matéria de facto dada como assente é necessário que, de acordo com critérios de razoabilidade, apreciando a prova produzida “salte à vista” do Tribunal de recurso um erro grosseiro da decisão recorrida, aparecendo a convicção formada em 1ª instância como manifestamente infundada”.
E como ressalta ainda do sumário do proc. nº 00242/05.2BEMDL, de 22/02/2013, acolhido por este TCAN em 22/05/2015 no âmbito do proc. 840/05.4BEVIS I. “Como tem sido jurisprudencialmente aceite, a garantia do duplo grau de jurisdição não subverte o princípio da livre apreciação das provas (art. 655º, n.º 1 do CPC) já que o juiz aprecia livremente as provas e decide segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto, sendo que na formação dessa convicção não intervêm apenas fatores racionalmente demonstráveis, já que podem entrar também elementos que em caso algum podem ser importados para o registo escrito, para a gravação vídeo ou áudio.
II. Será, portanto, um problema de aferição da razoabilidade, à luz das regras da ciência, da lógica e da experiência da convicção probatória do julgador no tribunal «a quo», aquele que, no essencial, se coloca em sede de sindicabilidade ou fiscalização do julgamento de facto pelo tribunal “ad quem”.
Como ensinava A. Varela, M. Bezerra e S. Nora (Manual de Processo Civil, 2ª ed., 1985, pág. 670/672), a propósito da al. b) do nº 1 do artigo 668º do anterior CPC: “Para que a sentença careça de fundamentação, não basta que a justificação da decisão seja deficiente, incompleta, não convincente; é preciso que haja falta absoluta, embora esta se possa referir só aos fundamentos de facto ou só aos fundamentos de direito”.
Voltando ao caso concreto, relativamente à parte das alegações de recurso que visam a alteração das respostas dadas aos pontos 2 a 6 da matéria de facto, dir-se-á apenas que as apreciações feitas na sentença a tal respeito não pecam por qualquer falta de clareza, coerência ou fundamentação; pelo contrário, a sua motivação é objectiva e concisa, baseando-se expressamente nas respostas constantes do relatório pericial.
Mas como o Réu menciona em seguida nas suas alegações (conclusões, ponto 4), independentemente da pretendida alteração sobre a matéria de facto a acção em seu entender deveria improceder mesmo tendo em conta apenas a matéria de facto dada como assente na sentença recorrida. Desta forma, a argumentação do Réu assume assim, ela própria, a escassa relevância dessas alterações às respostas aos pontos 2 a 6 da Base Instrutória, pelo que não se bulirá no probatório.
Do erro de julgamento de direito -
Afirma o Recorrente que as obrigações assumidas pelo Município de (...) por via do acordo que foi celebrado não integram nenhuma das competências legalmente assumidas aos seus órgãos, designadamente previstas nos artigos 39º, 41º, 51º, 52º e 53º do DL nº 100/84, onde, diz, não se menciona a possibilidade de os municípios se encarregarem da aquisição de terrenos para a construção de escolas para a Administração Central.
No entanto, e como bem se salienta na sentença recorrida, a escola em causa constitui um empreendimento que beneficia não só o Estado como também o Município, uma vez que é facto notório que se trata de uma escola dos níveis básico e secundário que teria como principais utentes, pela sua própria natureza, as famílias residentes na área da autarquia. Constituindo atribuição das autarquias locais, por força do disposto no artº 2º nº 1 al. f) do citado DL nº 100/84, de 29.03, a prossecução de fins relacionados com a educação e o ensino dos seus munícipes, e prevendo-se no artigo 8º do DL nº 77/84, de 08.03, ser da competência dos municípios a realização de investimentos públicos ao nível das escolas do ensino básico, não se vê como pode o Réu/Recorrente insistir nesta linha de argumentação, que nasce da confusão entre atribuições das autarquias locais e atribuições específicas dos seus órgãos, já detectada de forma perspicaz na sentença, chegando ao ponto de afirmar que tal eventual benefício das populações do município com a construção da nova escola é para o caso «…totalmente irrelevante…» - lê-se nas contra-alegações e aqui corrobora-se.
Para além do mais, este entendimento sempre seria ilegal por ignorar (artigos 6º, 235º e 237º da CRP) que no conceito de Estado e dos seus fins e atribuições se integram também as autarquias locais, sem que tal belisque a autonomia de actuação que lhes é reconhecida e o princípio da descentralização.
Afirma ainda o Réu que após a celebração do acordo aqui em causa entrou em vigor a Lei nº 42/98, de 06.03 (Lei das Finanças Locais LFL), que o impossibilitou de recorrer a empréstimos para poder assumir os encargos do acordo celebrado, e que o artigo 19º da Lei 32-B/2002 de 30.12, reduziu de forma drástica a capacidade de endividamento dos municípios, pelo que não tinha, à data da resolução do acordo, a possibilidade de contrair um empréstimo equivalente ao montante do preço do terreno adquirido para a construção da escola; e que se o fizesse tal constituiria um grave delito financeiro face ao que se dispõe no artigo 53º nº 2 al. d) da Lei nº 169/99, de 18.01, pelo que tal legislação introduziu uma alteração anormal e não prevista das condições e pressupostos que determinaram a celebração do acordo entre ambas as partes que lhe conferem o direito à resolução ou modificação do contrato, nos termos previstos nos artigos 266º nº 2 da CRP, 6º-A do CPA e 13º do DL 97/99, de 08.06.
No entanto, também aqui não tem razão.
Dos factos assentes extrai-se que o Réu/Recorrente, antes da publicação da LFL estava muito aquém do limite máximo permitido para endividamento, e embora não dispusesse, na data da resolução do acordo, da possibilidade de contrair um empréstimo de montante equivalente ao valor do preço do terreno adquirido para a construção da escola, a contracção de empréstimos não era a única forma de que dispunha para cumprir a sua parte do contrato, visto que possuía outras formas de financiamento e receita, resultantes designadamente de Impostos, Taxas e outras penalidades além de Transferências correntes e da posse de bens transaccionáveis que, de acordo com o que ficou plasmado na sentença recorrida, «…lhe permitiam honrar o cumprimento das obrigações de natureza pecuniária que assumiu no âmbito do acordo pagando as importâncias reclamadas pelo Autor», ao que acresce que nos anos imediatos, de 2004 a 2006 o Réu teve capacidade para contrair empréstimos de Médio e Longo Prazo, pelo que adquiriu capacidade de endividamento para efectuar os pagamentos em falta.
Por outro lado, carece de autenticidade a invocação de que lhe adveio, com a legislação referida neste ponto, uma alteração anormal e não prevista das condições e pressupostos que determinaram a celebração do acordo entre ambas as partes que lhe conferem o direito à resolução ou modificação do contrato, desde logo porque tal alegada alteração de circunstâncias não foi devidamente invocada no acto de resolução do contrato, designadamente face ao que se dispõe no artº 180º al. c) do Código do Procedimento Administrativo (CPA), o que se tornaria necessário para, entre todas as modalidades ou formas contratuais que se apresentavam como possíveis ao Réu para ultrapassar as suas invocadas dificuldades em cumprir a sua parte do acordo, ter optado logo pela ultima ratio que se traduz na resolução do contrato.
Por último quanto a este ponto, diga-se ainda que a alteração do quadro legislativo em que o Réu se pretende estribar para justificar a sua opção pela resolução do contrato adveio da função legislativa do Estado, através dos seus órgãos, e foi determinada pelo interesse público de os entes públicos, onde Autor e Réu se inserem, observarem normas de cumprimento dos seus compromissos que no conjunto permitissem a obtenção de um défice orçamental não superior a 3% do Produto Interno Bruto (PIB).
Ora, também nesta perspectiva a atitude do Réu resulta incompreensível e no mínimo vai ao arrepio das regras de solidariedade institucional a que devia atender, como bem aduz o Senhor Procurador Geral Adjunto.
Prosseguindo, o Réu defende, tal como já o havia feito na contestação, que a sentença recorrida não está conforme à lei aplicável porque o Acordo de Colaboração em apreço não foi submetido a visto do Tribunal de Contas, o que determina a sua ineficácia, nos termos previstos nos artigos 8º als. b) e c) e 13º als. a) a d) da Lei nº 86/89, de 08/09.
Quanto a este ponto, deve ser desde já sublinhado que estamos a falar do visto prévio do Tribunal de contas, e não da fiscalização deste órgão em termos absolutos, porque como é evidente esta última sempre existiria e existiu. Mas quanto ao visto prévio sempre será de salientar, tal como se assinala na sentença recorrida, que ao contrato em causa não foi atribuído qualquer valor, o que, nos termos previstos no artº 13º nº 3 da Lei nº 86/89, afasta a necessidade de visto prévio.
E por outro lado, tem especial relevo na análise desta matéria o facto de o Acordo de Colaboração entre os dois órgãos públicos ter sido celebrado ao abrigo do disposto no DL 384/87, que prevê esta modalidade para aquelas situações em que não se justifique a adopção da forma (mais solene, portanto) de Contrato-Programa.
Assim sendo, e tendo em conta que o artº 7º nº 2 do referido diploma isenta os contratos-programa firmados no seu âmbito de visto prévio do Tribunal de Contas, será forçoso concluir, por maioria de razão, que os acordos como o aqui celebrado não carecem de visto prévio daquele tribunal para serem eficazes. De qualquer forma, sempre esta linha de argumentação do Recorrente tem de ser desatendida, na medida em que se traduz claramente num venire contra factum proprium do qual não pode aquele que (no entender do Recorrente) transgrediu, beneficiar disso mesmo para se desobrigar do que assumiu.
Ademais, defende-se no recurso que o acordo de colaboração firmado viola os princípios da anualidade, consignação e especificação constantes dos artigos 7º, 10º e 11º da Lei nº 41/83, 21.06, 2º nº 1 da LFL e 3º nº 1 da Lei nº 42798, além do Plano Oficial de Contabilidade das Autarquias Locais - POCAL), pois no ano da resolução do acordo não tinha cabimento orçamental nem verbas para efectuar os pagamentos peticionados nem podia afectar ou utilizar receitas de outras rubricas ou outros anos financeiros para o efeito.
Porém, também esta argumentação não pode colher, visto que, sendo previsível a ocorrência de tal possível situação, nunca o Recorrente fez depender do futuro cumprimento das regras referidas a execução e celebração do acordo, ao que acresce que o recurso a empréstimos, como já se disse, não constituía a única via de satisfação da dívida que assumira para com o Autor, estando demonstrado de forma exaustiva e abundante na sentença recorrida que o Réu tinha formas de cumprir a sua obrigação sem colocar em causa os princípios da anualidade, consignação e especificação a que se encontra legalmente vinculado.
Aliás, este argumento final das alegações de recurso não se encontra sequer fundamentado, pois não se diz por que motivo concreto a eventual possibilidade de o Réu satisfazer os seus compromissos com recurso ao imobilizado corpóreo ou aos saldos disponíveis de contabilidade pela forma apontada na sentença recorrida o faria incorrer na inobservância dessas regras.
Por último refira-se que tratando-se de uma questão de constitucionalidade é consabido que não pode a jurisdição administrativa ser levada a apreciar, a título principal, a questão da constitucionalidade suscitada, visto desde logo que o artº 281º da Constituição da República Portuguesa o impede.
Na verdade, a apreciação das questões de constitucionalidade de normas jurídicas feita pelos tribunais administrativos não pode ser feita a título principal, mas tão só a título concreto e sucessivo pois as normas constantes dos artigos 281º da CRP e 72º do CPTA restringem essa apreciação a título principal à competência material do Tribunal Constitucional.
Apesar do labor jurídico que se reconhece à sua peça processual, improcedem as conclusões da alegação, face à também escorreita leitura do Autor/Recorrido.
DECISÃO
Termos em que se nega provimento ao recurso.
Custas pelo Recorrente.
Notifique e DN.

Porto, 17/04/2020


Fernanda Brandão
Hélder Vieira
Helena Canelas