Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01989/15.0BEPRT
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:02/07/2020
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Paula Moura Teixeira
Descritores:IMPOSTO DE SELO; INCIDÊNCIA;
Sumário:I. A redação da verba nº 28.1 da Tabela Geral, introduzida pela Lei n.º 83-C/2013, de 31 de dezembro, tem por âmbito de incidência objetiva a utilização de conceitos que se encontram legalmente definidos no artigo 6º do Código do IMI

II. O Imposto do Selo previsto na nova verba n.º 28.1 da Tabela Geral faz uma clara distinção entre “prédios urbanos habitacionais” e “terrenos para construção”, cuja edificação autorizada ou prevista, seja para habitação, nos termos do disposto no IMI. *
* Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:P., Lda
Recorrido 1:Autoridade Tributária e Aduaneira
Votação:Unanimidade
Decisão:Conceder provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Parecer no sentido de ser concedido provimento ao recurso.
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

1. RELATÓRIO
A Recorrente, AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA (AT), recorre da sentença emitida, pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, que julgou procedente a impugnação judicial intentada por P., Lda., NIPC (…), com sede na Rua (…), (…), visando a liquidação de imposto de selo, do ano de 2014.

A Recorrente não se conformando com a decisão tendo interposto o presente recurso formulou nas respetivas alegações as seguintes conclusões que se reproduzem:
“(...)
A. A sentença recorrida julgou procedente a Impugnação apresentada por P., Lda. NIPC (…), contra a liquidação de Imposto de selo com o nº 2014000357104 de 20-03-2015, no montante de € 17.137,30, relativa ao ano de 2014 e concernente ao prédio urbano, composto por terreno destinado à construção urbana, inscrito na matriz predial de (...), concelho do Porto sob o artigo ...
B. A sentença fixou, como matéria provada, os seguintes factos:
“1. No dia 20.03.2015, foi emitida a liquidação de imposto de selo n.º 2014 000357104, no valor de €17 137, 30, relativa ao prédio inscrito na matriz urbana da freguesia de (...), sob o artigo U…, sendo depois emitidas notas de cobrança para pagamento em prestações, cada uma destas no valor de € 5 712, 44 (…)
2. O prédio inscrito na matriz urbana da freguesia de (...), concelho do Porto, sob o artigo U-.., encontra-se descrito como “terreno para construção” com tipo de coeficiente de localização “habitação” (…)
3. O prédio referido em 1. está descrito na respectiva caderneta predial com o valor patrimonial actual de € 1.713 730, determinado no ano 2014 (…)”
C. A Fazenda Pública entende que, à matéria provada deveria ser acrescentado o seguinte facto:
“A liquidação de Imposto de Selo com o nº 2014 000357104 de 30-03-2015 respeita ao ano de 2014 – cfr. folhas 11 do Processo Administrativo de Impugnação.”
D. A Lei 83-C/2013 de 31-12 (Orçamento de Estado para 2014), que entrou em vigor em 01-01-2014, alterou a redação da verba 28.1 da Tabela Geral do Imposto de Selo passando a referir que será devido imposto de selo “Por prédio habitacional ou terreno para construção cuja edificação, autorizada ou prevista, seja para habitação, nos termos do disposto no Código do IMI.
E. Esta alteração torna inequívoco que os terrenos para construção cuja edificação, autorizada ou prevista, seja para habitação, se encontram abrangidos no âmbito da verba 28.1 da Tabela Geral do Imposto do Selo (desde que o respetivo valor patrimonial tributário seja de valor igual superior a 1 milhão de euros), como é o caso do prédio a que respeita a liquidação impugnada.
F. Afigura-se, pois, que a douta sentença, não valorou, como devia, a matéria dos autos, incorrendo em erro de julgamento de facto e de direito, porquanto no ano de 2014, a lei previa expressamente a sujeição dos terrenos para construção ao Imposto de Selo previsto na verba 28.1 da TGIS.
G. Pelo exposto, entende a Fazenda Pública:
· Deverá a douta sentença ser revogada;
· Deverá ser acrescido, aos factos provados, o seguinte “A liquidação de Imposto de Selo com o nº 2014 000357104 de 30-03-2015, respeita ao ano de 2014 – cfr. folhas 11 do Processo Administrativo de Impugnação.”
· Subsumidos os factos à lei em vigor em 2014, será, em nosso entender, de decidir pela legalidade da liquidação do imposto de selo, atinente a 2014, incidente sobre o terreno para construção com afetação habitacional, inscrito na respetiva matriz urbana da freguesia de (...), concelho do Porto sob o artigo …., com as necessárias e legais consequências.
Termos em que, com o douto suprimento de V. Exas, deverá ser a acrescida à matéria provada o facto referido nas presentes conclusões (em C) e por via disso ser a sentença revogada, por violação da norma contida na TGIS sobre a Verba 28.1 na redação conferida pela Lei 83-C/2013 de 31-12..(…)”

1.2. A Recorrida não apresentou contra-alegações.

O Exmo. Procurador - Geral Adjunto junto deste tribunal, secundando a posição da Recorrente, emitiu parecer no sentido de ser concedido provimento ao recurso revogando a sentença recorrida.

Colhidos os vistos dos Exmºs Juízes Desembargadores Adjuntos, foi o processo submetido à Conferência para julgamento.

2. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR E DECIDIR
Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, as quais são delimitadas pelas conclusões das respetivas alegações, sendo a questão principal a de saber se a sentença incorreu em erro de julgamento de facto e direito ao não considerar que era devido imposto de selo em 2014, ao abrigo da verba 28.1 da tabela de Imposto de Selo, relativamente a terreno para a construção.

3. JULGAMENTO DE FACTO
3.1. É a seguinte a matéria de facto dada como provada e como não provada na 1ª instância e que aqui se reproduz ipsis verbis:

“(…)No dia 20.03.2015, foi emitida a liquidação de imposto de selo n.º2014 000357104, no valor de €17 137, 30, relativa ao prédio inscrito na matriz urbana da freguesia de (...), sob o artigo U-…, sendo depois emitidas notas de cobrança para pagamento em prestações, cada uma destas no valor de €5 712, 44 – cf. liquidação de Imposto Selo junta a fls. 11 do Processo Administrativo apenso aos autos;
2. O prédio inscrito na matriz urbana da freguesia de (...), concelho do Porto, sob o artigo U-…, encontra-se descrito como “terreno para construção” com tipo de coeficiente de localização “habitação” – cf. caderneta predial urbana a fls. 25 dos autos (numeração referente ao processo físico), documento 1 da contestação;
3. O prédio referido em 1. está descrito na respectiva caderneta predial com o valor patrimonial actual de €1 713 730, determinado no ano 2014 - cf. também a caderneta predial-(…)”.

3.2. A Recorrente na conclusão C. alega que deve ser aditado novo facto ao probatório, no entanto não se vislumbra essa necessidade uma vez, que da máteria de facto decorre que a liquidação do imposto de selo se reporta ao ano de 2014 como é afirmado pelo, a ora Recorrida, no ponto n.º 4 da sua petição inicial.
Destarte não sendo controverso, não se procede ao aditamento requerido.
4. JULGAMENTO DE DIREITO
4.1. A questão principal que importa apreciar e decidir, é a de saber se o Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto incorreu erro de julgamento ao anular a liquidação sindicada, no entendimento de que os terrenos para construção não se subsumem no conceito de prédios com “afetação habitacional” para efeitos de incidência do Imposto do Selo a que se refere a verba 28.1 da Tabela Geral do Imposto do Selo, aditada pela Lei n.º 55-A/2012, de 29 de outubro, na sua redação originária.
Vejamos:
Estabelece-se no artigo 1º do Código do Imposto do Selo (CIS):
1. O imposto do selo incide sobre todos os atos, contratos, documentos, títulos, livros, papéis, e outros factos previstos na Tabela Geral, incluindo as transmissões gratuitas de bens.
(…).
Dispõe o n.º 1 do artigo 9.° do CIS que: “
O valor tributável do imposto do selo é o que resulta da Tabela Geral, sem prejuízo do disposto nos números e artigos seguintes.”.
Porém a Tabela Geral do Imposto do Selo foi alterada pela Lei n.º 55-A/2012, de 29.10, no qual consta a seguinte norma:

Artº.6
(Disposições transitórias)
1 - Em 2012, devem ser observadas as seguintes regras por referência à liquidação do imposto do selo previsto na verba n.º 28 da respetiva Tabela Geral:
a) O facto tributário verifica-se no dia 31 de outubro de 2012;

b) O sujeito passivo do imposto é o mencionado no n.º 4 do artigo 2.º do Código do Imposto do Selo na data referida na alínea anterior;
c) O valor patrimonial tributário a utilizar na liquidação do imposto corresponde ao que resulta das regras previstas no Código do Imposto Municipal sobre Imóveis por referência ao ano de 2011;
d) (…)
e) (…)
f) As taxas aplicáveis são as seguintes:
i) Prédios com afetação habitacional avaliados nos termos do Código do IMI: 0,5 %;
ii) Prédios com afetação habitacional ainda não avaliados nos termos do Código do IMI: 0,8 %;
iii) Prédios urbanos quando os sujeitos passivos que não sejam pessoas singulares sejam residentes em país, território ou região sujeito a um regime fiscal claramente mais favorável, constante da lista aprovada por portaria do Ministro das Finanças: 7,5 %.
2 - Em 2013, a liquidação do imposto do selo previsto na verba n.º 28 da respetiva Tabela Geral deve incidir sobre o mesmo valor patrimonial tributário utilizado para efeitos de liquidação de imposto municipal sobre imóveis a efetuar nesse ano.
3 - (…).”
Por sua vez, à Tabela Geral do Imposto de Selo, foi aditado a verba nº. 28 com a seguinte redação: “(…)
28 - Propriedade, usufruto ou direito de superfície de prédios urbanos cujo valor patrimonial tributário constante da matriz, nos termos do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI), seja igual ou superior a (euro) 1 000 000 - sobre o valor patrimonial tributário utilizado para efeito de IMI:
28.1 - Por prédio com afetação habitacional - 1 %;
28.2 - Por prédio, quando os sujeitos passivos que não sejam pessoas singulares sejam residentes em país, território ou região sujeito a um regime fiscal claramente mais favorável, constante da lista aprovada por portaria do Ministro das Finanças - 7,5 %.
Todavia, a Lei n.º 83-C/2013, de 31 de dezembro - Lei do Orçamento do Estado para 2014 - alterou novamente a verba nº. 28.1 da Tabela Geral do Imposto de Selo, à qual foi dada a seguinte redação:
28.1 - Por prédio habitacional ou por terreno para construção cuja edificação autorizada ou prevista, seja para habitação, nos termos do disposto no IMI. “
Nesta conformidade a redação da verba nº 28.1 da Tabela Geral, introduzida pela Lei n.º 83-C/2013, de 31 de dezembro, tem por âmbito de incidência objetiva a utilização de conceitos que se encontram legalmente definidos no artigo 6º do Código do IMI.
Assim, o Imposto do Selo previsto na nova verba n.º 28.1 da Tabela Geral faz uma clara distinção entre “prédios urbanos habitacionais” e “terrenos para construção”, cuja edificação autorizada ou prevista, seja para habitação, nos termos do disposto no IMI.
Acresce ainda referir que, a jurisprudência entendeu que “a nova redação da verba nº 28.1 da Tabela Geral do Selo introduzida pela Lei nº 83-C/2013, de 31 de dezembro, vem fazer incidir a tributação sobre “prédio habitacional ou terreno para construção cuja edificação, autorizada ou prevista, seja para habitação”, mas tal norma não tem carácter interpretativo, antes é inovatória.” Cfr. acórdãos do STA n.º 1870/13 de 09.04.2014 e 0419/14 de 28.01.2015)
Resulta da matéria assente nos pontos n.ºs 1 e 2 que a liquidação do imposto de selo reporta-se ao ano de 2014 e tem por objeto o prédio inscrito na matriz urbana da freguesia de (...), concelho do Porto, sob o artigo U-…, encontra-se descrito como “terreno para construção” com tipo de coeficiente de localização “habitação”.
Com efeito, tratando-se de liquidação de imposto de selo reportada ao ano de 2014, estava em vigor desde o dia 01.01.2014, a alteração introduzida pela Lei n.º 83-C/2013, de 31 de dezembro, a qual sujeitava a imposto de selo terreno para construção cuja edificação autorizada ou prevista, seja para habitação, nos termos do disposto no IMI.
Destarte, a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento de facto e direito ao considerar procedente a impugnação judicial e anular a liquidação.

4.2 A sentença recorrida deu como prejudicado as restantes questões, ou seja, a questão equacionada no ponto n.º 15 da petição inicial, onde a Recorrida alega que configura violação do princípio da igualdade, substanciado no principio constitucional da tributação do património que programaticamente deve contribuir para a igualdade dos cidadãos.
Por força do disposto no art.º 665º do CPC cabe a este tribunal conhecer do mérito dessa parte, em substituição, se os autos fornecessem os necessários elementos.
Com efeito o n.º 2 art.º 665.º do CPC prevê a hipótese do TCA se entender que a apelação procede e nada obsta à apreciação daquelas, delas conhece no mesmo acórdão em que revogar a decisão recorrida, sempre que disponha de elementos necessários.
Face ao supra decidido, e tendo a sentença recorrida bem como a Recorrida laborado em erro nos pressupostos de facto e de direito, não se vislumbra qualquer utilidade na apreciação da alegada inconstitucionalidade, uma vez que, se reputava a um regime jurídico diferente do que se aplica ao caso em análise.
No entanto, sempre dira, seguindo que “ (…) I - O Tribunal Constitucional tem decidido no sentido da não inconstitucionalidade por violação do princípio da igualdade da norma da verba 28 da Tabela Geral do Imposto do Selo, na redacção introduzida pela Lei n.º 55-A/2012, de 29 de Outubro.
II - Essa jurisprudência manteve-se após a alteração introduzida naquela norma pela Lei n.º 83-C/2013, de 31 de Dezembro, que impõe a tributação anual sobre a propriedade de prédio habitacional ou de terreno para construção cuja edificação, autorizada ou prevista, seja para habitação, cujo valor patrimonial tributário seja igual ou superior a € 1.000.000.
III - O juízo de não inconstitucionalidade formulado nos acórdãos do Tribunal Constitucional, quer pela força dos seus argumentos, quer por provir do tribunal a que a ordem judiciária comete a competência específica para a apreciação das questões da constitucionalidade das normas, deve ser observado (cfr. art. 8.º, n.º 3, CC), tanto mais que a parte que dele discorde tem sempre ao seu dispor o recurso para aquele Tribunal. “ Cfr. acórdão STA n.º 0835/17 de 20.06.2018, em que está em questão imposto de selo de 2014 e relativo a terreno para construção.
Nesta conformidade improcede a pretensão da Recorrida.

4.2. E assim formulamos as seguintes conclusões / sumário:
I. A redação da verba nº 28.1 da Tabela Geral, introduzida pela Lei n.º 83-C/2013, de 31 de dezembro, tem por âmbito de incidência objetiva a utilização de conceitos que se encontram legalmente definidos no artigo 6º do Código do IMI
II. O Imposto do Selo previsto na nova verba n.º 28.1 da Tabela Geral faz uma clara distinção entre “prédios urbanos habitacionais” e “terrenos para construção”, cuja edificação autorizada ou prevista, seja para habitação, nos termos do disposto no IMI.

5. DECISÃO
Assim, pelo exposto, acordam os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte em conceder provimento ao presente recurso e, consequentemente, revogar a sentença recorrida e julgar a impugnação judicial improcedente e, em consequência, manter a liquidação impugnada.

Custas pela Recorrida, com dispensa do pagamento da taxa de justiça nesta instância, por não ter apresentado contra-alegações.

Porto, 07 de fevereiro de 2020



Paula Maria Dias de Moura Teixeira
Maria da Conceição Soares
Carlos Alexandre Morais de Castro Fernandes