Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00145/15.2BEVIS
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:02/22/2018
Tribunal:TAF de Viseu
Relator:Pedro Vergueiro
Descritores:ACÇÃO ADMINISTRATIVO ESPECIAL
PRÉDIO
INSCRIÇÃO NA MATRIZ
Sumário:I) Para efeitos de Imposto Municipal sobre Imóveis, “prédio” é toda a fracção de território, abrangendo águas, plantações, edifícios e construções de qualquer natureza nela incorporados ou assentes com carácter de permanência (elemento físico), que faça parte do património de uma pessoa singular ou colectiva (elemento jurídico) e que em circunstâncias normais tenha valor económico (elemento económico) – art. 2º do CIMI.
II) Um Parque Eólico estrutura-se sobre uma fracção de território, que ocupa, organizando-se com variados e interligados elementos constituintes ou partes componentes (onde se destacam os aerogeradores conectados em paralelo, os postos de transformação, as linhas áreas e os cabos subterrâneas de ligação, a subestação e o centro de comando), com ligação ao solo com carácter de permanência, sendo esse conjunto de elementos imprescindível à actividade económica que se pretende desenvolver: a produção de energia eléctrica, através da actividade de transformação da energia eólica, e a sua injecção no sistema eléctrico de potência para venda de acordo com a tarifa regulada em Portugal, sendo essa injecção ou conexão ao sistema eléctrico um dos principais parâmetros de um parque eólico.
III) Os elementos constituintes e partes componentes de um parque eólico não podem, de per si, ser considerados como prédios urbanos da espécie “outros”, na medida em que não constituem partes economicamente independentes, isto é, não têm aptidão suficiente para, por si só, desenvolverem a referida actividade económica, caracterizando-se como elementos ad integrandum domum, sem autonomia económica relativamente ao todo de que fazem parte.
IV) Cada aerogerador, integrante de um parque eólico, não se subsume à figura de “prédio” de acordo com a definição constante do Código de IMI, atenta a falta de valor económico próprio, o que significa que não é aceitável a inscrição oficiosa desta realidade física na matriz predial como prédio urbano da espécie “outros”.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:Autoridade Tributária e Aduaneira
Recorrido 1:Eólica..., S.A.
Decisão:Negado provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:
1. RELATÓRIO
A Autoridade Tributária e Aduaneira, devidamente identificada nos autos, inconformada, veio interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu, datada de 20-06-2017, que julgou procedente a pretensão deduzida por “Eólica…, S.A.” na presente AÇÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL relacionada com o acto de inscrição oficiosa na matriz do prédio urbano sob o artigo P 1..., da freguesia de Cabril, Castro Daire.

Formulou nas respectivas alegações (cfr. fls. 177-189), as seguintes conclusões que se reproduzem:
“ (…)
1 - Visa o presente recurso reagir contra a douta sentença a qual determinou a procedência da acção administrativa especial, e consequentemente, anulou o acto de inscrição oficiosa na matriz predial urbana sob o artigo P 1..., da freguesia de Cabril, actos praticado pelo Chefe do Serviço de Finanças de Castro Daire.
2 - A douta sentença concluiu que um aerogerador não alcança, nem possui, sem que esteja ligado aos demais equipamentos, que por sua vez também configurarão edificações de natureza vária e com carácter permanente, a susceptibilidade ou potencialidade de gerar rendimentos, pelo que não tem valor dito económico para efeitos deste artigo 2º do CIMI.
3 - Assim, entendeu que não se verificando o elementos económico, por falta de preenchimento deste pressuposto, não poderá um aerogerador, individualmente considerado, ser qualificado como prédio para efeitos de IMI.
4 - Entende a Recorrente que a sentença para além de proceder a uma errónea apreciação e interpretação do conceito de prédio para efeitos fiscais, em manifesta e clara violação do disposto no Art.º 2.º do CIMI, enferma de erro de base nas premissas em que escorou a sua fundamentação, sendo violadora dos princípios constitucionais da justiça, equidade e segurança fiscais.
5 - O conceito fiscal de prédio afasta-se da noção civilista, o artigo 2º do CIMI estabelece um conceito específico para a determinação da incidência do IMI, mais amplo do que o constante no artigo 204º do Código Civil, explica NUNO SÁ GOMES que, parece resultar da comparação entre o conceito civil de imóvel consagrado no art. 204.º do Código Civil, com o conceito fiscal de prédio, previsto no art. 2.º do CIMI, que este último parece não abranger todas as realidades que são consideradas imóveis, para efeitos civis. É o que sucede, v.g., com os direitos inerentes aos imóveis, que não tendo a referida estrutura física, nunca serão prédios. Sendo assim, parece que, para efeitos da Reforma de Tributação do Património, o conceito civil de imóvel não coincide com o conceito fiscal de prédio.
6 - O conceito fiscal de prédio prevê a existência de três requisitos necessários para que se possa estar perante o conceito de prédio: o elemento de natureza física, o elemento de natureza jurídica e o elemento de natureza económica, pois só da confluência destes três vectores podemos qualificar determinada realidade como “prédio” para efeitos de enquadramento em sede de IMI.
7 - A douta sentença deu como verificados para efeitos de inscrição do aerogerador como prédio na matriz predial, o elemento de natureza física e o elemento de natureza jurídica, não tendo considerado como verificado o elemento de natureza económica, por considerar, que um aerogerador por si só não tem valor económico, sendo um componente do parque eólico o qual é essencial para injectar na rede publica energia eólica.
8 - Mas tal argumento é claramente infundado, tendo em conta a composição do parque eólico, o qual é constituído por aerogeradores assíncronos (torres eólicas), subestações (edifícios de comando), redes de cabos que ligam os primeiros aos segundos e respectivos acessos, dai que, cada aerogerador é uma unidade independente em termos funcionais, constituindo prédio urbano para efeitos do Código do IMI, e atendendo á sua natureza, é qualificado como prédio urbano do tipo “Outros”, preenchendo os requisitos estatuídos no art.º 2.º do CIMI.
9 - Nos termos do art.º 203.º do Código Civil, as coisas podem ser, entre outras, móveis ou imóveis, simples ou compostas e de acordo com o art.º 206.º do mesmo Código, é havida como coisa composta, ou universalidade de facto, a pluralidade de coisas móveis que pertencendo à mesma pessoa, têm um destino unitário.
10 - Atendendo às definições de coisa simples e composta e, às realidades físicas em causa, é possível inferir que contrariamente ao raciocínio sufragado na sentença, que cada aerogerador constitui uma unidade independente e possui valor económico, na medida em que cada aerogerador admite um único direito e opera como uma unidade, tratando-se de coisa simples, que abrange uma coisa com várias peças que perderam a autonomia com a sua junção. Com vista à prossecução de um fim unitário: a produção de energia eléctrica.
11 - Cada aerogerador (“coisa simples” formada pela junção dos seus componentes: sapata de betão, torre, cabine e pás), constitui uma unidade funcional independente (dado que o aproveitamento energético do vento pode ser efectuado por uma só unidade), e o parque eólico, com os seus elementos e estruturas principais (torres eólicas, redes de cabos, acessos e edifício de comando) constitui uma “coisa composta”, isto é, engloba várias “coisas” simples, pertencentes à mesma pessoa e com um destino unitário, e embora possa ser objecto de actos jurídicos unitários.
12 - Para efeitos de subsunção ao conceito de prédio ínsito no art.º 2.º do CIMI, cada aerogerador deve ser considerado como realidade distinta, pelo que à revelia da douta sentença os aerogeradores devem ser qualificados como prédios, de acordo com o disposto no art.º 2.º do CIMI, constituindo realidades físicas distintas ou autónomas dos terrenos em que se encontram implantadas, as quais possuem, claramente, valor económico.
13 - Verifica-se, de forma clara, o preenchimento dos requisitos estatuídos na lei para o aerogerador ser considerado como prédio para efeitos fiscais, incluindo o elemento económico, não considerado pela sentença a quo.
14 - Quanto ao elemento de natureza económica (patrimonialidade) a sentença sufragou que o mesmo não se encontra verificado por o aerogerador pertencer a um parque destinado à injecção de energia eléctrica na rede pública, não se verificando o requisito da existência do valor económico, em relação a cada um dos aerogeradores, mas apenas em relação a este, na sua unidade atenta a sua finalidade.
15 - O elemento de natureza económica encontra-se associado ao requisito de patrimonialidade, o bem tem que ter valor económico, ser susceptível de gerar rendimento ou outro tipo de utilidade para o seu titular. (v.d. ALFARO, Martins – O conceito de prédio no IMI e algumas contradições normativas.
16 - Um aerogerador possui valor económico de per se, por força da sua natureza intrínseca e individual, bem como pela função que desempenha no conjunto, no parque eólico.
17 - Um aerogerador, por si só, é um bem que, em circunstâncias normais, tem valor económico, susceptível de expressão monetária, seja qual for a perspectiva de análise – o mercado, a utilidade económica potencial ou os fluxos rendimento esperados – por conseguinte preenche todas os requisitos legais que habilitam à qualificação `como ‘prédio’, para efeitos da incidência do IMI.
18 - A construção em que consubstancia um aerogerador é uma realidade física e económica completa, que desempenha autonomamente uma função produtora, portanto, dotada de valor económico, e aliás, mesmo na perspectiva contabilística, o ‘parque eólico’ não é tratado individualmente como um activo.
19 - As estruturas que, no âmbito de um parque eólico têm como função a conversão da potência da energia eléctrica produzida pelo aerogerador e a sua injecção no ramal da rede pública de energia eléctrica, desempenham funções complementares da função nuclear que é a produção.
20 - Considerar que um aerogerador integrado num parque eólico destinado à injecção de energia eléctrica na rede pública, não tem valor económico próprio, é esvaziar a dimensão económica da actividade desenvolvida na fase nuclear – a produção - do circuito económico da energia.
21 - Diferentemente do que é sustentado na jurisprudência citada, não é o parque eólico que é remunerado, o que é objecto de venda, nos termos do Decreto-Lei n.º 33-A/2005, de 16.02 (que alterou o Decreto-Lei n.º 339-C/2001, de 29.12) é a electricidade produzida por cada centro produtor (aerogerador), cujo volume e valor depende do número de aerogeradores concentrados em cada local designado por ‘parque eólico’.
22 - O preenchimento do requisito da autonomia económica encontra-se verificado, traduzindo-se na susceptibilidade do aerogerador gerar rendimentos, através da comercialização da energia gerada com o parque eólico ou outro tipo de utilidades para o seu titular.
23 - O aerogerador deve ser qualificado como prédio, de acordo com o disposto no art.º 2.º do CIMI, constituindo uma realidade física distinta ou autónoma do terreno em que se encontra implantado - possuindo valor económico.
24 - Segundo Vasco Branco Guimarães (in sobre o conceito fiscal de prédio, Estudo feito por ocasião da comemoração do L aniversário do Centro de Estudos Fiscais, publicado na Ciência e Técnica Fiscal, n.º 433 pág. 201) “uma vez que as torres eólicas não podem ser prédios rústicos terão de ser prédios urbanos. A doutrina publicada enquadra-os na qualificação: Outros. De entre os urbanos deverão ser considerados como Outros. Esta é a solução que corresponde á correcta interpretação do normativo em vigor.”
25 - A sentença a quo procede a uma errada interpretação do disposto no art.º 2.º do CIMI, na medida em que um aerogerador preenche todos os pressupostos legais (elementos jurídico, económico e físico) para ser considerado como prédio para efeitos fiscais.
26 - O entendimento propugnado na sentença enferma ainda de um erro nas suas premissas, ofendendo claramente os mais basilares princípios constitucionais da equidade, justiça e segurança fiscais.
27 - Com efeito, a sentença aquilatou que o aerogerador integrado num parque eólico não tem, valor económico próprio: pelo contrário, é no próprio parque eólico que se encontra a manifestação da capacidade contributiva que releva a existência de tal valor, motivo pelo qual é o parque eólico, e não o aerogerador que é remunerado e objecto de tributação.
28 - Considerando que apenas o parque eólico deve ser objecto de tributação uma vez que apenas aquele preenche os requisitos para ser qualificado como prédio para efeitos de IMI, perguntar-se-á de que modo tal entendimento é compaginável com parques eólicos que se encontram inseridos em vários concelhos, cuja taxa de IMI é claramente díspar em todos eles? Qual então a taxa a aplicar? E como se tributa e inscreve tal realidade na matriz? Apenas num concelho? Onde se encontrem situados o maior número de componentes? Através de rotatividade?
29 - O entendimento propalado na sentença é claramente violador do princípio da justiça, equidade e segurança fiscal, bastando para o efeito pensar-se que a seguir-se tal entendimento, e a tributar-se o parque eólico ao invés dos seus componentes (aerogeradores), originaria que em parque eólicos cuja área de circunscrição abrange vários concelhos, com taxas diferentes, fosse o parque eólico apenas inscrito num só concelho, ou no concelho que tivesse mais componentes, em detrimento de ou do concelho limítrofe com menos componentes.
30 - O entendimento vertido na sentença viola os mais elementares princípios da equidade, segurança e justiça fiscal, consignados no art.º 5.º da LGT e art.º 103.º e 104.º ambos da CRP.
31 - O entendimento vertido pela Recorrente é transversal em países da União Europeia, desde logo, e a título meramente exemplificativo veja-se o caso de Espanha no qual os parques eólicos são tributados em sede de Impuesto sobre Construcciones, Instalaciones y Obras (Inclusión en la base imponible del valor de las placas solares o de los aerogeradores), e em sede de BICES (Impuesto sobre Bienes Inmuebles de Caracteristicas Especiales, antes IBI), o qual se paga todos los años y se aplica al conjunto de la instalación. Se aplica sobre un valor catastral que determina Hacienda (ligado a las inversiones y las amortizacones), sobre el que los ayuntamientos aplican un impuesto que va del 0,4 al 1,3% (de entre 800 y 2.000 euros por Mwh al año. Para un parque de 50Mw, supone entre 40.000 y 130.000 euros a año.)
32 - De igual modo, no ordenamento jurídico francês La cotisation fonciére des entreprises (CFE) constitui um imposto baseado em valores de aluguer de propriedade a que os parques eólicos se encontram sujeitos.
33 - Conclui-se que o aerogerador reúne todos os requisitos legais para que seja qualificado como prédio para efeitos das normas de incidência em sede de IMI, razão pela qual a sentença procede a uma errada interpretação e apreciação do art.º 2.º do CIMI, colidindo tal entendimento com os princípios constitucionais da segurança, equidade e justiça fiscal.
Termos em que, concedendo-se provimento ao recurso, deve ser revogada a sentença proferida pelo Tribunal a quo, por errada interpretação e aplicação do art.º 2.º do CIMI, e por manifesta violação dos princípios constitucionais da segurança, equidade e justiça fiscal, com todas as legais consequências.

A Recorrida “Eólica…, S.A., apresentou contra alegações em defesa da manutenção da sentença sob recurso, embora sem formular conclusões (cfr. fls. 194-202).

O Ministério Público junto deste Tribunal tomou posição nos termos de fls. 333.

Colhidos os vistos dos Exmºs Juízes Desembargadores Adjuntos, vem o processo submetido à Conferência para julgamento.


2. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR
Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que a questão sucitada, no essencial, resume-se, em indagar do invocado erro de julgamento no que concerne à subsunção do prédio urbano sob o artigo P 1..., da freguesia de Cabril, concelho de Castro Daire no conceito de prédio previsto no art. 2º do CIMI, impondo-se ainda apreciar a suscitada dos princípios constitucionais da equidade, justiça e segurança fiscais.

3. FUNDAMENTOS
3.1 DE FACTO
Neste domínio, consta da decisão recorrida o seguinte:
“…
III I Factos provados
Com relevância para a decisão a proferir nos presentes autos julgam-se provados os seguintes factos:
A) A AT procedeu à inscrição oficiosa e avaliação patrimonial tributária do prédio urbano tipo “Outros”, constituído por um aerogerador inscrito na matriz predial urbana sob o artigo P 1..., da freguesia de Cabril, Castro Daire, notificando a avaliação à A. em novembro de 2014, vide os docs. 1 que instruiu a petição inicial (PI);
B) Não se conformando com a referida inscrição oficiosa e avaliação remeteu, via postal, em 10-12-2014, ao Chefe de Finanças do serviço de Finanças de Castro Daire, esgrimindo argumentação próxima da apresentada na PI que originou os presentes autos, requerimento a solicita, para além do mais, a segunda avaliação do prédio em causa, cfr. doc. nº 3 que instruiu a PI;
C) e, no dia 08-02-2015, remeteu, via postal, a PI que deu origem aos presentes autos, vide o respectivo código de registo postal constante da parte superior direita da primeira folha da PI.

III II Factos não provados
Inexistem outros factos, para além dos que foram dados como provados, que revelem interesse para a boa decisão da causa.

A convicção do Tribunal relativamente à matéria de facto provada resultou da análise crítica dos documentos e informações constantes dos autos e do processo administrativo apenso aos autos, os quais não foram impugnados, tudo conforme se encontra especificado em cada um dos pontos do probatório.”
3.2 DE DIREITO
Assente a factualidade apurada cumpre, então, entrar na análise da realidade substancial em equação nos autos, sendo que a este Tribunal está cometida a tarefa de indagar da bondade da decisão recorrida que não sancionou o acto de inscrição oficiosa na matriz do artigo P 1... da freguesia de Cabril, concelho de Castro Daire.

Para atender a pretensão da ora Recorrida, a decisão posta em crise, após a transcrição do Acórdão do S.T.A. de 15.03.2017, proferido no Proc. nº 0140/15, disponível em www.dgsi.pt, aponta o seguinte:
“…
Volvendo ao caso em apreço, do quadro probatório resulta que a Administração Tributária procedeu à inscrição oficiosa na matriz de um aerogerador (torre eólica).
Resulta do Acórdão vindo de transcrever que um ou vários aerogeradores ou outros elementos constituintes de parque eólico destinado à injeção de energia elétrica na rede pública, não tem, por si só, valor económico próprio, não podem, de per si, ser considerados um prédio urbano (“outros”), na medida em que não constituem uma parte economicamente independente mas sim, são um elemento ad integrandum domum, isto é, não têm aptidão suficiente para, por si só, desenvolver uma atividade.
Nestes termos, perante esta falta de autonomia económica, não é aceitável a inscrição oficiosa destas realidades na matriz predial como um prédio urbano, o que determina a anulação de tal ato. …”

Nas suas alegações, a Recorrente defende que a sentença recorrida, para além de proceder a uma errónea apreciação e interpretação do conceito de prédio para efeitos fiscais, em manifesta e clara violação do disposto no art.º 2.º do CIMI, enferma de erro de base nas premissas em que escorou a sua fundamentação, sendo violadora dos princípios constitucionais da justiça, equidade e segurança fiscais.
Desde logo, o conceito fiscal de prédio afasta-se da noção civilista, o artigo 2º do CIMI estabelece um conceito específico para a determinação da incidência do IMI, mais amplo do que o constante no artigo 204º do Código Civil, explica NUNO SÁ GOMES que, parece resultar da comparação entre o conceito civil de imóvel consagrado no art. 204.º do Código Civil, com o conceito fiscal de prédio, previsto no art. 2.º do CIMI, que este último parece não abranger todas as realidades que são consideradas imóveis, para efeitos civis. É o que sucede, v.g., com os direitos inerentes aos imóveis, que não tendo a referida estrutura física, nunca serão prédios. Sendo assim, parece que, para efeitos da Reforma de Tributação do Património, o conceito civil de imóvel não coincide com o conceito fiscal de prédio que prevê a existência de três requisitos necessários para que se possa estar perante o conceito de prédio: o elemento de natureza física, o elemento de natureza jurídica e o elemento de natureza económica, pois só da confluência destes três vectores podemos qualificar determinada realidade como “prédio” para efeitos de enquadramento em sede de IMI, sendo que a douta sentença deu como verificados para efeitos de inscrição do aerogerador como prédio na matriz predial, o elemento de natureza física e o elemento de natureza jurídica, não tendo considerado como verificado o elemento de natureza económica, por considerar, que um aerogerador por si só não tem valor económico, sendo um componente do parque eólico o qual é essencial para injectar na rede publica energia eólica.
Tal argumento é claramente infundado, tendo em conta a composição do parque eólico, o qual é constituído por aerogeradores assíncronos (torres eólicas), subestações (edifícios de comando), redes de cabos que ligam os primeiros aos segundos e respectivos acessos, dai que, cada aerogerador é uma unidade independente em termos funcionais, constituindo prédio urbano para efeitos do Código do IMI, e atendendo á sua natureza, é qualificado como prédio urbano do tipo “Outros”, preenchendo os requisitos estatuídos no art.º 2.º do CIMI e nos termos do art.º 203.º do Código Civil, as coisas podem ser, entre outras, móveis ou imóveis, simples ou compostas e de acordo com o art.º 206.º do mesmo Código, é havida como coisa composta, ou universalidade de facto, a pluralidade de coisas móveis que pertencendo à mesma pessoa, têm um destino unitário, de modo que, atendendo às definições de coisa simples e composta e, às realidades físicas em causa, é possível inferir que contrariamente ao raciocínio sufragado na sentença, que cada aerogerador constitui uma unidade independente e possui valor económico, na medida em que cada aerogerador admite um único direito e opera como uma unidade, tratando-se de coisa simples, que abrange uma coisa com várias peças que perderam a autonomia com a sua junção. Com vista à prossecução de um fim unitário: a produção de energia eléctrica.
Cada aerogerador (“coisa simples” formada pela junção dos seus componentes: sapata de betão, torre, cabine e pás), constitui uma unidade funcional independente (dado que o aproveitamento energético do vento pode ser efectuado por uma só unidade), e o parque eólico, com os seus elementos e estruturas principais (torres eólicas, redes de cabos, acessos e edifício de comando) constitui uma “coisa composta”, isto é, engloba várias “coisas” simples, pertencentes à mesma pessoa e com um destino unitário, e embora possa ser objecto de actos jurídicos unitários e para efeitos de subsunção ao conceito de prédio ínsito no art.º 2.º do CIMI, cada aerogerador deve ser considerado como realidade distinta, pelo que à revelia da douta sentença os aerogeradores devem ser qualificados como prédios, de acordo com o disposto no art.º 2.º do CIMI, constituindo realidades físicas distintas ou autónomas dos terrenos em que se encontram implantadas, as quais possuem, claramente, valor económico, ou seja, verifica-se, de forma clara, o preenchimento dos requisitos estatuídos na lei para o aerogerador ser considerado como prédio para efeitos fiscais, incluindo o elemento económico, não considerado pela sentença a quo.
Quanto ao elemento de natureza económica (patrimonialidade) a sentença sufragou que o mesmo não se encontra verificado por o aerogerador pertencer a um parque destinado à injecção de energia eléctrica na rede pública, não se verificando o requisito da existência do valor económico, em relação a cada um dos aerogeradores, mas apenas em relação a este, na sua unidade atenta a sua finalidade, sendo que tal elemento encontra-se associado ao requisito de patrimonialidade, o bem tem que ter valor económico, ser susceptível de gerar rendimento ou outro tipo de utilidade para o seu titular e um aerogerador possui valor económico de per se, por força da sua natureza intrínseca e individual, bem como pela função que desempenha no conjunto, no parque eólico e é um bem que, em circunstâncias normais, tem valor económico, susceptível de expressão monetária, seja qual for a perspectiva de análise – o mercado, a utilidade económica potencial ou os fluxos rendimento esperados – por conseguinte preenche todas os requisitos legais que habilitam à qualificação `como ‘prédio’, para efeitos da incidência do IMI.
A construção em que consubstancia um aerogerador é uma realidade física e económica completa, que desempenha autonomamente uma função produtora, portanto, dotada de valor económico, e aliás, mesmo na perspectiva contabilística, o ‘parque eólico’ não é tratado individualmente como um activo e as estruturas que, no âmbito de um parque eólico têm como função a conversão da potência da energia eléctrica produzida pelo aerogerador e a sua injecção no ramal da rede pública de energia eléctrica, desempenham funções complementares da função nuclear que é a produção, pelo que, considerar que um aerogerador integrado num parque eólico destinado à injecção de energia eléctrica na rede pública, não tem valor económico próprio, é esvaziar a dimensão económica da actividade desenvolvida na fase nuclear – a produção - do circuito económico da energia e diferentemente do que é sustentado na jurisprudência citada, não é o parque eólico que é remunerado, o que é objecto de venda, nos termos do Decreto-Lei n.º 33-A/2005, de 16.02 (que alterou o Decreto-Lei n.º 339-C/2001, de 29.12) é a electricidade produzida por cada centro produtor (aerogerador), cujo volume e valor depende do número de aerogeradores concentrados em cada local designado por ‘parque eólico’, o que significa que o preenchimento do requisito da autonomia económica encontra-se verificado, traduzindo-se na susceptibilidade do aerogerador gerar rendimentos, através da comercialização da energia gerada com o parque eólico ou outro tipo de utilidades para o seu titular e o aerogerador deve ser qualificado como prédio, de acordo com o disposto no art.º 2.º do CIMI, constituindo uma realidade física distinta ou autónoma do terreno em que se encontra implantado - possuindo valor económico, pelo que, a sentença a quo procede a uma errada interpretação do disposto no art.º 2.º do CIMI, na medida em que um aerogerador preenche todos os pressupostos legais (elementos jurídico, económico e físico) para ser considerado como prédio para efeitos fiscais.

Que dizer?
Ora, tal como se afirma no Ac. do S.T.A. de 22-11-2017, Proc. nº 0661/17, www.dgsi.pt, “… A primeira questão que importa analisar é a de saber se um parque eólico (e, em particular, um dos seus subparques) pode subsumir-se à figura de “prédio”, tendo em conta que, como se viu, os serviços de finanças consideraram como tal o Subparque da Bezerreira, que faz parte integrante do Parque Eólico do Caramulo (e não cada um dos seus aerogeradores, como passou a ser prática dos serviços da administração tributária após a Circular nº 8/2013 da Direção de Serviços do Imposto Municipal sobre Imóveis).
Segundo o entendimento vertido na sentença, o conceito fiscal de “prédio”, para efeitos de incidência do IMI, afasta-se da noção civilística contida no art.º 204º do Código Civil, corporizando um conceito mais amplo, «porquanto prevê a existência de um elemento de natureza física (o território, o qual deve ser autónomo e ter um carácter de permanência); um elemento de natureza jurídica (resultante da necessidade do prédio fazer parte do património de uma pessoa física ou jurídica) e um elemento de natureza económica (traduzido na exigência de possuir um valor económico em circunstâncias normais), sendo «que só com a confluência dos três elementos podemos qualificar determinada realidade como prédio para efeitos de enquadramento em sede de IMI».
Entendimento que se mostra correto, na medida em que o art.º 2º do CIMI define o conceito de prédio do seguinte modo:
«1 - Para efeitos do presente Código, prédio é toda a fracção de território, abrangendo as águas, plantações, edifícios e construções de qualquer natureza nela incorporados ou assentes, com carácter de permanência, desde que faça parte do património de uma pessoa singular ou colectiva e, em circunstâncias normais, tenha valor económico, bem como as águas, plantações, edifícios ou construções, nas circunstâncias anteriores, dotados de autonomia económica em relação ao terreno onde se encontrem implantados, embora situados numa fracção de território que constitua parte integrante de um património diverso ou não tenha natureza patrimonial.
2 - Os edifícios ou construções, ainda que móveis por natureza, são havidos como tendo carácter de permanência quando afectos a fins não transitórios.
3 - Presume-se o carácter de permanência quando os edifícios ou construções estiverem assentes no mesmo local por um período superior a um ano.».
Temos, assim, que para efeitos deste imposto, “prédio” é toda a fracção de território (elemento físico), abrangendo águas, plantações, edifícios e construções de qualquer natureza nela incorporados ou assentes com carácter de permanência, que faça parte do património de pessoa singular ou coletiva (elemento jurídico) e que em circunstâncias normais tenha valor económico (elemento económico).
Posto isto, e vista a importância vital do elemento de natureza económica, traduzido na necessidade de a fracção de território em causa possuir, por si só, valor económico para poder ser qualificado como “prédio” para efeitos de incidência objectiva de IMI, a problemática reside, desde logo, em saber se, à luz desta norma, um “parque eólico” pode ser classificado como “prédio” nos termos e para os efeitos da inscrição na matriz predial e consequente avaliação e tributação neste imposto municipal sobre o património imobiliário.
O que passa, necessariamente, por saber o que é um parque eólico.
Da leitura de obras técnicas da especialidade (Cfr., entre outras, a dissertação de mestrado de YESMARY CAROLINA DA SILVA GOUVEIA, no Instituto Superior de Engenharia de Lisboa - Área Departamental de Engenharia Civil, intitulado “Construção de um Parque Eólico Industrial” e bibliografia aí citada.) decorre, de forma clara, que o objetivo final de um parque eólico consiste no aproveitamento da velocidade do vento para a produção de energia elétrica, sendo que, para que tal aconteça, é necessário que o parque seja constituído por alguns elementos essenciais, nomeadamente por um conjunto de aerogeradores que são interligados por cabos de média tensão e cabos de comunicação ligados a uma subestação e a um edifício de comando, que se liga a uma (habitualmente aérea) rede elétrica de transporte.
Deste modo, um parque eólico é constituído por um conjunto obrigatório e interligado de bens, equipamentos e infraestruturas – aerogeradores (Cada um composto por uma sapata de betão ou “fundação”, uma estrutura metálica ou “torre”, uma naceile, um rotor, e três pás.), postos de transformação, edifícios de comando e de subestação, rede elétrica de cabos subterrâneos com ligação entre os aerogeradores e o edifício de comando/subestação e, no caso de existência de várias subestações, linhas elétricas de ligação destas, bem como caminhos de acesso - tudo com vista a converter a energia cinética do vento em energia elétrica e a injetá-la no sistema eléctrico de potência, sendo que os grandes parques eólicos exigem a construção de várias subestações e de linhas de transmissão para a conexão ao sistema elétrico de potência, sendo esta injeção ou conexão ao sistema elétrico um dos principais parâmetros de um parque eólico.
Em suma, um parque eólico é uma fracção de território (terrestre ou marítimo) organizado e estruturado com variados e interligados elementos constituintes e partes componentes – onde se destacam os aerogeradores conectados em paralelo (no mínimo cinco), um ou mais edifícios onde se localizam a(s) subestação(ões) e o centro de operação e manutenção - com ligação ao solo e com carácter de permanência, sendo todo esse conjunto de bens e equipamentos imprescindível à atividade económica em questão: atividade de transformação da energia eólica em energia elétrica, sua injeção no sistema elétrico de potência e consequente venda desta eletricidade à rede elétrica de acordo com a tarifa regulada em Portugal para o sector eólico em geral.
O que significa que cada um desses elementos constituintes e partes componentes de um parque eólico não pode, de per si, ser considerado um prédio urbano (“outros”), na medida em que não constitui uma parte economicamente independente, isto é, não tem aptidão suficiente para, por si só, desenvolver a aludida atividade económica (A mesma razão leva a que não possam ser considerados como “prédios” (nem a AT ousa considerá-los como tal) os diversos elementos e estruturas que integram um estádio de futebol (as balizas, as bancadas, a estrutura coberta, os balneários, etc.) ou que integram um campo de golfe (o green, o tee, o fairway, os obstáculos, o edifício de atendimento, etc.), já que cada uma dessas estruturas e elementos, que se encontram interligados e conexionados com vista ao mesmo objetivo e finalidade económica, não possuem autonomia económica em relação à fração de território ocupada, pese embora seja incontroverso que tanto o estádio de futebol como o campo de golfe constituem, à luz do mencionado preceito do CIMI, prédios urbanos para efeitos de incidência objetiva de IMI.).
Por conseguinte, e em suma, caracterizando-se como elementos ad integrandum domum, sem autonomia económica relativamente ao todo de que fazem parte, fica afastada a possibilidade de classificar como “prédios” autónomos cada um dos diversos elementos constituintes e partes componentes de um parque eólico, não só porque o seu destino normal não é diferente de todo o prédio, como, também, porque não é possível avaliá-los separadamente, na medida em que não são partes economicamente independentes.

Posto isto, e apesar de se poder concluir que se deteta, em princípio, na porção de território ocupada por todo o parque eólico não só a presença do apontado elemento físico como, também, do elemento económico, razão por que o Parque Eólico do Caramulo poderá constituir um único prédio afeto ao mesmo fim e atividade económica, há que atender ao caso em análise, onde se constata que um dos seus subparques (o da Bezerreira) foi qualificado pelos serviços da administração tributária como um prédio autónomo, inscrito na matriz predial como prédio urbano (tipo “outros”) e ao qual foi atribuído o artigo matricial P- 571. …”.

Com este pano de fundo, resulta claro que não é aceitável a inscrição oficiosa desta realidade física na matriz predial como prédio urbano, o que coloca em crise o procedimento da AT, situação que conduz à improcedência do presente recurso, porquanto, nenhuma censura merece a decisão recorrida quando viabilizou a pretensão formulada pela aqui Recorrida no âmbito da presente acção administrativa especial relacionada com a anulação do acto de inscrição oficiosa na matriz do artigo P1... da freguesia de Cabril, concelho de Castro Daire.

Finalmente, cumpre ter presente que a ora Recorrente procurou sensibilizar o S.T.A. para a bondade da sua argumentação nos termos expostos em termos essenciais nestes autos, sendo que por Ac. do S.T.A. de 13-09-2017, Proc. nº 0543/17, www.dgsi.pt, não foi admitido o recurso de revista, reiterando o S.T.A. a pronúncia nesta matéria, tendo-se ponderado que:

“…

A recorrente justifica a admissibilidade deste recurso com a existência de um claro erro de julgamento, por se tratar de decisão que «assentou e foi fruto de um desacerto ou de um equívoco» e de haver necessidade de uma melhor aplicação do direito, porquanto «a decisão da questão se revela ostensivamente errada, juridicamente insustentável ou suscita fundadas dúvidas, o que gera incerteza e instabilidade na resolução dos litígios», sendo «fundamental intervenção do STA, na qualidade de órgão de regulação do sistema, como condição para dissipar dúvidas», assumindo a questão, na sua óptica, relevância jurídica e social de importância fundamental.

Todavia, como se deixou referido no acórdão que esta formação prolatou em 28/06/2017, no recurso de revista excepcional nº 0321/17, onde análoga questão fora colocada ao STA para (re)apreciação, com idêntica justificação, não se verificam os apontados requisitos de admissibilidade do recurso.

Como nele se deixou salientado, para além de o recurso de revista excepcional não ter como finalidade directa a eliminação de meros «erro de julgamento em que porventura tenham caído as instâncias, de modo a que o direito ou interesse do recorrente obtenha adequada tutela jurisdicional, no caso, também não se verificam as alegadas vicissitudes em que a Fazenda faz assentar a admissibilidade da revista: por um lado, a interpretação legal preconizada na sentença (…) e no recorrido acórdão (…), igualmente tem vindo a ser reafirmada quer pelo STA, conforme se pode constatar dos acórdãos aqui proferidos em 15/3/17, no proc. nº 0140/15 e de 7/6/17, no proc. nº 01417/16, quer em outros arestos do TCA (…), e, por outro lado, não se vê que a questão se configure como de relevância jurídica fundamental, pois que nem é de elevada complexidade jurídica ou de complexidade jurídica superior ao comum (…), nem se vislumbra que a respectiva apreciação revista complexidade hermenêutica determinante para a admissão da revista excepcional.». ...”.

A Recorrente refere ainda que o entendimento propugnado na sentença enferma ainda de um erro nas suas premissas, ofendendo claramente os mais basilares princípios constitucionais da equidade, justiça e segurança fiscais, na medida em que a sentença aquilatou que o aerogerador integrado num parque eólico não tem, valor económico próprio: pelo contrário, é no próprio parque eólico que se encontra a manifestação da capacidade contributiva que releva a existência de tal valor, motivo pelo qual é o parque eólico, e não o aerogerador que é remunerado e objecto de tributação e considerando que apenas o parque eólico deve ser objecto de tributação uma vez que apenas aquele preenche os requisitos para ser qualificado como prédio para efeitos de IMI, perguntar-se-á de que modo tal entendimento é compaginável com parques eólicos que se encontram inseridos em vários concelhos, cuja taxa de IMI é claramente díspar em todos eles? Qual então a taxa a aplicar? E como se tributa e inscreve tal realidade na matriz? Apenas num concelho? Onde se encontrem situados o maior número de componentes? Através de rotatividade?
O entendimento propalado na sentença é claramente violador do princípio da justiça, equidade e segurança fiscal, bastando para o efeito pensar-se que a seguir-se tal entendimento, e a tributar-se o parque eólico ao invés dos seus componentes (aerogeradores), originaria que em parque eólicos cuja área de circunscrição abrange vários concelhos, com taxas diferentes, fosse o parque eólico apenas inscrito num só concelho, ou no concelho que tivesse mais componentes, em detrimento de ou do concelho limítrofe com menos componentes, além de que também coloca em crise os mais elementares princípios da equidade, segurança e justiça fiscal, consignados no art.º 5.º da LGT e art.º 103.º e 104.º ambos da CRP.
Por outro lado, o entendimento vertido pela Recorrente é transversal em países da União Europeia, desde logo, e a título meramente exemplificativo veja-se o caso de Espanha no qual os parques eólicos são tributados em sede de Impuesto sobre Construcciones, Instalaciones y Obras (Inclusión en la base imponible del valor de las placas solares o de los aerogeradores), e em sede de BICES (Impuesto sobre Bienes Inmuebles de Caracteristicas Especiales, antes IBI), o qual se paga todos los años y se aplica al conjunto de la instalación. Se aplica sobre un valor catastral que determina Hacienda (ligado a las inversiones y las amortizacones), sobre el que los ayuntamientos aplican un impuesto que va del 0,4 al 1,3% (de entre 800 y 2.000 euros por Mwh al año. Para un parque de 50Mw, supone entre 40.000 y 130.000 euros a año) e de igual modo, no ordenamento jurídico francês La cotisation fonciére des entreprises (CFE) constitui um imposto baseado em valores de aluguer de propriedade a que os parques eólicos se encontram sujeitos.

Nesta matéria, cabe adiantar que o entendimento preconizado pela decisão recorrida e que não merece qualquer censura nos termos acima descritos não consubstancia qualquer violação dos princípios constitucionais da segurança, equidade e justiça fiscal, contrariamente ao que defende a Recorrente, embora sem densificar muito as ditas violações.
Na verdade, e quanto ao primeiro elemento a que se alude no art. 56º das alegações de recurso (“… de que modo tal entendimento vertido é compaginável com um parque eólico que é constituído por um único aerogerador? É o aerogerador considerado como parque eólico e por essa via sujeito a inscrição e posterior tributação?), a noção de parque eólico e seus elementos integradores descrita no primeiro aresto acima transcrito retira qualquer virtualidade ao exposto, sendo que as angústias descritas no art. 57º das alegações de recurso (Mais, seguindo o ideário argumentativo da sentença …, considerando que apenas o parque eólico deve ser objecto de tributação uma vez que apenas aquele preenche os requisitos para ser qualificado como prédio para efeitos de IMI, perguntar-se-á de que modo tal entendimento é compaginável com parques eólicos que se encontram inseridos em vários concelhos, cuja taxa de IMI é claramente díspar em todos eles? Qual então a taxa a aplicar? E como se tributa e inscreve tal realidade na matriz? Apenas num concelho? Onde se encontrem situados o maior número de componentes? Através de rotatividade?) não têm razão de ser, porquanto, cremos que o art. 79º do CIMI permite dar resposta a tais questões já que tal não constitui uma especialidade dos parques eólicos sendo aplicável a mesma lógica que em qualquer prédio que esteja fisicamente localizado em mais do que uma freguesia de mais do que um concelho, o que significa que o exposto pela Recorrente no sentido de que “o entendimento vertido na sentença viola princípios de equidade, segurança e justiça fiscal” não pode proceder, dado que, como se viu, não existe qualquer violação da equidade, segurança e justiça fiscal nos casos em que os parques eólicos se localizam em mais do que um concelho dado que a lei prevê uma forma de inscrição para os mesmos.

Finalmente, quando à questão de o entendimento da AT ser transversal em países da União Europeia, não vemos no exposto (arts. 63º/64º das alegações de recurso e conclusões 31 e 32) matéria capaz de trazer novos dados para a discussão da matéria em análise nos autos, até porque a afirmação é, no mínimo, exagerada, dado que, só é feita referência a Espanha e França e a realidade descrita deixa muito a desejar em termos de uma caracterização rigorosa e abrangente da situação em termos de este Tribunal poder sequer ponderar algo efectivamente relevante nesta sede.
Daí que na improcedência das conclusões da alegação da recorrente, se impõe, nos termos acima expostos, confirmar a decisão aqui sindicada, com todas as legais consequências.
Improcede, por conseguinte, o presente recurso jurisdicional.



4. DECISÃO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal, de harmonia com os poderes conferidos pelo art. 202.º da Constituição da República Portuguesa, em negar provimento ao recurso jurisdicional interposto pela Recorrente, mantendo-se a decisão judicial recorrida.
Custas pela Recorrente.
Notifique-se. D.N..
Porto, 22 de Fevereiro de 2018
Ass. Pedro Vergueiro
Ass. Ana Patrocínio
Ass. Ana Paula Santos