Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01253/20.3BEBRG
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:05/19/2023
Tribunal:TAF de Braga
Relator:Ricardo de Oliveira e Sousa
Descritores:PRINCIPIO DA LEGALIDADE;
DESINTEGRAÇÃO JURIDICA DE ATO ADMINISTRATIVO;
EXTINÇÃO DA LIDE;
Sumário:I - Encontrando-se a Administração vinculada ao princípio da legalidade - o qual postula a obediência à lei [vertente positiva] e a impossibilidade de atuação da mesma na falta de expressa norma legal habilitante [vertente negativa], não podia a mesma indeferir a pretensão da Autora com fundamento na falta de apresentação da ata da assembleia geral, precisamente, por falta de previsão legal nesse sentido.

II- Não se verificando, para a mesma situação concreta, a produção por parte de um ato administrativo de efeitos incompatíveis com ato administrativo anterior, não se verifica o pressuposto da desintegração tácita de atos administrativos.

III- Revelando-se a argumentação mobilizada pelo Recorrente manifestamente insuficiente no sentido da sua conformação com a impossibilidade absoluta de cumprimento do dever da Administração de reconstituir a situação que existiria se o acto anulado não tivesse sido praticado, bem como de dar cumprimento aos deveres que não tenha cumprido com fundamento no acto entretanto anulado, por referência à situação jurídica e de facto existente no momento em que deveria ter, não constituindo suporte para logicamente se concluir a necessidade, ou, sequer, a probabilidade da verificação da mesmo, apresenta-se distintivo o interesse na continuação da lide processual.*
* Sumário elaborado pelo relator
(art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Comum
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:
* *
I – RELATÓRIO
1. MINISTÉRIO DA AGRICULTURA, melhor identificado nos autos à margem referenciados de AÇÃO ADMINISTRATIVA em que é Autora [SCom01...], S.A, vem interpor o presente RECURSO JURISDICIONAL da sentença promanada nos autos, que julgou “(…) procedente a presente ação e, em consequência, condeno[u] a Entidade Demandada a aprovar as alterações ao programa operacional de 2019 e 2020 nos termos apresentados pela Autora (…)”.
2. Alegando, o Recorrente formulou as seguintes conclusões: “(…)
1. A sentença recorrida envereda por um entendimento errado ao argumentar que o pedido de alterações, para ser deferido, não tinha que ser instruído com a ata Assembleia Geral da Requerente, de onde constasse a deliberação relativa à alteração do programa operacional e relativamente à violação pelo ato administrativo impugnado (19.03.2019), de ato administrativo prévio (13.03.2019).
2. Tal entendimento conduziu a um erro de julgamento que a este Tribunal de apelação cabe corrigir.
3. Pese embora o quadro legal aplicável à execução do PO para o triénio 2018-2020, nos termos do disposto no artigo 11.° da Portaria n.° 1325/2008, de 18 de novembro, atento o disposto no artigo 44.°, n.° 1, a) da Portaria n.° 295-A/2018, de 2 novembro, não exija expressamente que a alteração ao programa operacional esteja dependente da ata da Assembleia Geral, na realidade, a junção desse documento constitui um elemento essencial da apresentação dos Programas Operacionais pelas organizações de produtores.
4. Trata-se de um princípio fundamental de aplicação democrática, pois se os Programas Operacionais estão fundamentados em atas de Assembleia Geral que os aprovam, as suas alterações devem também ser devidamente aprovadas pelos sócios.
5. Caso contrário, seria uma forma do respetivo Programa Operacional deixar de estar sob escrutínio dos seus sócios/associados.
6. Posteriormente, o n.° 5 do artigo 27.° da Portaria n.° 295-A/2018, de 2 de novembro, que revogou a Portaria n.° 1325/2008, de 18 de novembro, alterada pelas Portarias n.°s 1247/2009, de 13 de outubro, e 166/2012, de 22 de maio (artigo 45.°), veio consagrar expressamente que os pedidos de alteração devem ser instruídos com alguns elementos, de entre os quais se destaca a ata da Assembleia Geral com a deliberação relativa à alteração ao programa operacional (artigo 27.°, n.° 5, ex vi artigo 30.°, n.° 10).
7. Ou seja, o legislador veio resolver a incerteza do normativo vigente (Portaria n.° 1325/2008, de 18 de novembro, com as alterações introduzidas, respetivamente pelas Portarias n.°s 1247/2009, de 13 de outubro, e 166/2012, de 22 de maio) anteriormente à alteração legislativa (Portaria n.° 295-A/2018, de 2 de novembro).
8. Portanto, o requerimento apresentado pela Autora, ao ser indeferido com base na falta da ata da Assembleia Geral é legal.
9. A decisão final de 19.03.2020, que indeferiu o pedido de alterações ao Programa Operacional da [SCom01...] para os anos de 2019 e 2020 (ato impugnado) não anulou ou revogou administrativamente a decisão de 13.03.2019, que aprovou o pedido de alterações ao Programa Operacional, relativamente ao ano de 2018.
10. A decisão de 13.03.2019, não produz plenos efeitos na ordem jurídica dado que o PO 2018-2020 já foi encerrado em 31.12.2020.
11. Tendo sido, entretanto, aprovado o PO 2021-2023.
12. Assim sendo, não é possível aprovar as alterações ao programa operacional de 2019 e 2020 nos termos apresentados pela Autora, conforme determinado pela sentença recorrida.
14. O efeito jurídico da procedência da presente ação deixou de ser atingível, estamos perante uma situação de impossibilidade da reconstituição natural, - verificando-se, assim, uma perda do direito à execução, o que integra a hipótese normativa da alínea e) do artigo 277.° do Código de Processo Civil, ex vi artigo 1.° do Código de Processo nos Tribunais Administrativos.
15. Deste modo, concluiu-se pela verificação de uma causa de extinção da lide incidental por inutilidade superveniente. (…)”.
*
3. Notificada que foi para o efeito, a Recorrida [SCom01...], S.A., produziu contra-alegações, que rematou com o seguinte quadro conclusivo: “(…)
A. O Ministério da Agricultura, ora Recorrente, interpôs recurso da sentença recorrida que decidiu que o ato de indeferimento praticado pela DRAP Norte, e impugnado pela Autora, ora Recorrida, foi ilegal, «por erro nos pressupostos de Direito» e assente «em pressupostos de facto inexistentes».
B. Nas suas alegações, a Recorrente pugna essencialmente contra dois segmentos decisórios da sentença recorrida.
C. Primeiro, alega que andou mal o Tribunal a quo ao decidir pela ilegalidade do indeferimento das alterações ao programa operacional de 2019 e 2020 com fundamento na falta da ata da Assembleia Geral dos membros da Autora, ora Recorrida;
D. Segundo, depois de confirmar que a decisão final de 19.03.2020, que indeferiu o pedido de alterações ao Programa Operacional, não anulou ou revogou administrativamente, o ato impugnado, ensaia que o encerramento do Programa Operacional 2018-2020 e a aprovação do novo Programa Operacional da ora Recorrida configura uma situação de impossibilidade da reconstituição natural, consubstanciada numa causa de extinção da lide incidental por inutilidade superveniente.
E. Sucede que o recuso interposto pelo Ministério da Agricultura, ora Recorrente, não merece procedência a qualquer título, sendo absolutamente infundado, pelo que não poderá deixar de julgado totalmente improcedente.
Por um lado,
F. O indeferimento das alterações ao Programa Operacional 2018-2020 apresentado pela requerida para os anos de 2019 e 2020 foi ilegal uma vez que, nos termos do quadro normativo aplicável, não há qualquer menção da necessidade de se juntar ata da assembleia geral nos pedidos de alteração aos programas operacionais do próprio ano ou relativos ao ano seguinte (cf. artigo 11.° da Portaria n.° 1325/2008, de 18 de novembro).
G. Em concreto, a Recorrente, à boleia de um putativo ‘princípio fundamental da aplicação democrática', convoca uma interpretação por maioria de razão por a ata da assembleia geral ser um dos elementos discriminados pelo legislador como necessário para instruir os pedidos de apresentação dos Programas Operacionais submetidos pelas organizações de produtores.
H. Resulta, porém, evidente que a criação interpretativa não encontra fundamento legal, nem hermenêutico.
I. Ora, sabendo-se que o artigo 9.° do Código Civil configura a letra da lei como o ponto de partida e o limite da atividade interpretativa, não se pode olvidar que, no pedido em que radicou o indeferimento do ato impugnado, a Autora, ora Recorrida cumpriu com todos os requisitos e exigências formais e objetivas que o legislador estabeleceu como os necessários para as organizações de produtores alterarem os seus programas operacionais.
J. Nesses requisitos não se encontra a necessidade de o requerente do pedido de alteração ao programa operacional juntar a ata da Assembleia Geral, ao contrário do que sucede noutras situações (cf. artigos 2.°, n.° 4 e 8.°, n.° 3, alínea a) da Portaria n.° 1325/2008, de 18 de novembro).
K. É a própria Recorrente quem confirma que, no enunciado gramatical do artigo 11.° da Portaria n.° 1325/2008, de 18 de novembro, «não vem feita qualquer referência expressa a atas da Assembleia Geral das organizações de produtores» na instrução dos pedidos de alteração dos programas operacionais relativos aos anos seguintes.
L. Pelo que o resultado interpretativo exigido é o de uma interpretação declarativa, uma vez que há uma coincidência total entre a dimensão semântica e a dimensão pragmática da norma.
M. A ilegalidade do indeferimento sai reforçada com a disposição transitória que o legislador incluiu no artigo 44.° da Portaria n.° 295-A/2018, de 2 de novembro, que revogou a Portaria n.° 1325/2008, de 18 de novembro, e que estabeleceu a possibilidade de as organizações de produtores continuarem a ser regulados pela Portaria n.° 1325/2008, de 18 de novembro, com as suas alterações, até ao termo dos programas operacionais daqueles, aprovados ao abrigo daquele quadro normativo.
N. Como explica João Baptista Machado «os problemas de sucessão de leis no tempo suscitados pela entrada em vigor de uma LN podem, pelo mesmo em parte, ser diretamente resolvidas por esta mesma lei, mediante disposições adrede formuladas, chamadas disposições transitórias» (cf. João Baptista Machado, Introdução ao direito e ao discurso legitimador, Almedina, 26ª reimpressão, p. 229) (com sublinhado nosso).
O. Ora, ao ter optado pela regulação nos termos da Portaria n.° 1325/2008, de 18 de novembro, conforme intencionalmente proposto pelo legislador na disposição transitória ínsita ao diploma revogador, o indeferimento do pedido de aprovação de alterações não pode ter por fundamento a falta de entrega de um documento que não se encontrava previsto no complexo normativo aplicável.
Por outro lado,
P. A Recorrente parece desvendar a incerteza interpretativa suscitada pela Autora, ora Recorrida na sua petição inicial (depois confirmada pelo Tribunal a quo na sentença recorrida), de que o ato de indeferimento praticado pela DRAP Norte possa ter violado um ato administrativo anterior - e insuscetível, ao momento, de revogação/anulação administrativa -, ao impor que as alterações ao programa operacional tivessem em consideração o programa operacional inicial, conquanto que tal não correspondia à realidade jurídica existente.
Q. Na verdade, as alegações da Recorrente neste segmento sugerem que a Recorrente se conformou com a sentença recorrida, pelo que não se compreende, por imperativo lógico, qual o erro de julgamento em causa...
R. O único desvio ao iter decidendi da sentença recorrida, que se deslinda, a este respeito, é o de que o ato impugnado deixou de produzir plenos efeitos jurídicos na ordem jurídica, «uma vez que o PO 2018-2020 já foi encerrado em 31.12.2020».
S. Ora, parece ser com fundamento no encerramento do Programa Operacional 2018-2020 que a Recorrente conclui que «o efeito jurídico da presente ação deixou de ser atingível, estamos perante uma situação de impossibilidade da reconstituição natural — verificando-se, assim, uma perda do direito à execução, o que integra a hipótese normativa da alínea e) do artigo 277.° do Código de Processo Civil, ex vi artigo 1.° do Código de Processo nos Tribunais Administrativos».
T. Resulta evidente - aliás, expressamente declarado - que a alegação da Recorrente procura, sim, legitimar uma alegada extinção da lide incidental por inutilidade superveniente, com fundamento em hipotéticas causas de inexecução.
U. Ou seja, a construção jurídica adjetiva da Recorrente só poderia verificar-se - o que apenas por mera hipótese se concebe, e sempre sem prescindir do seu direito de pronúncia na fase processual adequada - no âmbito da fase executiva do processo administrativo.
V. E conforme explicita VIEIRA DE ANDRADE, o processo executivo «visa obter, pela via judicial, as providências materiais que concretizem, no plano dos factos, aquilo que foi juridicamente determinado pelo tribunal no processo declarativo».
W. Pois bem: o presente recurso foi interposto de uma sentença administrativa, proferida no âmbito da tutela declarativa do processo administrativo...
X. Que alegadamente «não analisou corretamente os vícios invocados pela Autora, tendo incorrido em erro de julgamento, considerando-os procedentes, quando, na realidade, como demonstraremos, a boa interpretação e aplicação das normas aplicáveis determina uma decisão de sentido oposto» (cf. p. 2 das alegações de recurso).
Y. Ou seja: a sentença recorrida, e o recurso interposto pela Recorrente, respeitam à tutela declarativa do processo administrativo, cujos propósitos, efeitos e méritos não se confundem com o da tutela executiva.
Z. Pelo que: declarar procedente a alegada inutilidade superveniente da lide ensaiada pela Recorrente desvirtuaria toda a lógica processual administrativa e violaria manifestamente o princípio de acesso à justiça administrativa e da tutela jurisdicional efetiva (artigos 7.° e 2. ° do CPTA), ínsitos ao artigo 268.°, n.° 4 da Constituição da República Portuguesa.
AA. Mas mais: declarar procedente a suposta inutilidade superveniente da lide é totalmente contrário e prejudicial aos interesses da ora Recorrida.
BB. E isto por duas ordens de razões: por um lado, a Recorrida necessita de uma sentença declarativa que obrigue a DRAP Norte a aprovar as alterações ao programa operacional para depois poder acionar o IFAP para obter os pagamentos dos investimentos executados (i.e., sem a aprovação dessas alterações ao programa operacional por parte da DRAP, a Recorrida não consegue obter do IFAP o pagamento das despesas respetivas).
CC. E, por outro lado, sem a sentença declarativa por parte do Tribunal que obrigue a DRAP Norte a aprovar as alterações ao programa operacional, fica a Recorrida à mercê da aplicação de penalidades do IFAP pelo facto de não ter sido executado o programa operacional tal como apresentado pela Recorrida.
DD. Assim, qualquer eventual declaração de uma suposta inutilidade superveniente da lide põe em causa o direito a uma tutela jurisdicional efetiva da ora Recorrida (…)”.
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4. O Tribunal a quo proferiu despacho de admissão do recurso, fixando os seus efeitos e o modo de subida.
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5. O/A Digno[a] Magistrado[a] do Ministério Público junto deste Tribunal Superior silenciou quanto ao propósito a que se alude no nº.1 do artigo 146º do C.P.T.A.
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6. Com dispensa de vistos prévios, cumpre apreciar e decidir.
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II- DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO - QUESTÕES A DECIDIR
7. O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, de acordo com o disposto nos artigos 144.º n.º 2 e 146.º n.º 4 do C.P.T.A. e dos artigos 5.º, 608.º n.º 2, 635.º n.ºs 4 e 5 e 639.º do novo CPC ex vi dos artigos 1.º e 140.º do CPTA.
8. Neste pressuposto, a questão essencial a dirimir é a de determinar (i) se a sentença recorrida incorreu em erro[s] de julgamento de direito, bem como (ii) se verifica uma causa de extinção da lide incidental, por inutilidade superveniente.
9. É na resolução de tais questões que se consubstancia a matéria que a este Tribunal Superior cumpre solucionar.
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III- FUNDAMENTAÇÃO
III.1 – DE FACTO
10. O quadro fáctico apurado na decisão judicial recorrida foi o seguinte: “(…)
1. O Programa Operacional (“OP”) para o triénio 2018-2020, apresentado pela Autora à Entidade Demandada foi aprovado em 2018.
- Facto não controvertido.
2. Em 16.08.2018, a Autora submeteu, junto da Entidade Demandada, pedido de alterações ao Programa Operacional referido em 1., relativamente ao ano de 2018.
- Cfr. documento ..., junto com o p.i., cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
3. Em 05.11.2018, a Entidade Demandada expediu mensagem eletrónica, dirigida à Autora, de onde se extrai o seguinte: “(…)
No dia 2 de novembro de 2018 foi publicada a Portaria n° 295-A/2018 de 2 de novembro, que se anexa, que revoga a Portaria n° 1325/2008, de 18 de novembro. Esta Portaria entrou em vigor no dia .3 de novembro passado.
Nos termos do n° 4 do art° 44° da citada Portaria "As alterações aos programas operacionais com entrada em vigorem 2019 são apresentadas até 15 de novembro de 2018 “.
Assim, vimos informar que as alterações apresentadas nesta DRAP para o ano de 2019 terão que respeitar os requisitos previstos na Portaria n° 295 -A/2018 de 2 de novembro e ser entregues na DRAPN até 15 de novembro.
As alterações apresentadas até 30 de setembro serão devolvidas."
- Cfr. documento ..., junto com a p.i., cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
4. Em 12.11.2018, a Autora expediu mensagem eletrónica, dirigida à Entidade Demandada, com o seguinte teor: “(…)
-Boa tarde Eng. «AA»,
No seguimento do email recebido e após consulta junto da FNOP que nos apoia no processo do Programa Operacional, obtivemos a informação de que podemos manter as alterações de acordo com o quadro regulamentar anterior. Neste sentido informamos que não queremos a devolução das alterações apresentadas em setembro e pretendemos que as mesmas sejam analisas no âmbito da anterior portaria.
Agradeço desde já a atenção,
Ao dispor, [...]"
- Cfr. documento ..., junto com a p.i., cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
5. Em 13.03.2019, a Entidade Demandada proferiu despacho, dirigido à Autora, informando que o pedido de alterações ao Programa Operacional para o triénio 2018-2020 havia sido aprovado.
- Cfr. documento ..., junto com a p. i., cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
6. Em 16.10.2019, o Instituto de Financiamento da Agricultura e Pescas remeteu à Entidade Demandada ofício com o assunto “Ajuda aos Fundos Operacionais das OP de Frutas e Produtos Hortícolas [SCom01...] SA - PO 2018 - 2020", com o seguinte teor: “(…)
- Relativamente ao assunto em epígrafe, e na sequência da ação de controlo levada a cabo por este Instituto ao PO 2018 da OP [SCom01...], temos a informar que:
- A OP [SCom01...] encontra-se a executar o programa operacional aprovado para o período de 2018 -2020,
- A OP apresentou um pedido de alteração aos anos de 2018 (próprio ano), 2019 e 2020 junto da vossa Direção Regional.
- De acordo com a vossa informação n.° ...19, na sequência do pedido de alteração, foram solicitados elementos adicionais à OP, designadamente a ata de Assembleia Geral a deliberar a aprovação das alterações ao PO.
- Dado que a OP não enviou a totalidade dos elementos solicitados, foi decisão superior da vossa Direção Regional indeferir o pedido de alterações, tendo a OP sido notificada por oficio de audiência prévia de 24 de janeiro de 2019 da decisão de indeferimento.
- Como resposta ao ofício, a OP apresentou os elementos antes solicitados pela Direção Regional, designadamente ata de Assembleia Geral n.° 19 de 21 de janeiro de 2019.
- Face aos elementos recebidos, e apesar da Assembleia Geral ter ocorrido em 21 de janeiro de 2019 (à posteriori), foi decisão da Direção Regional aprovar em 13 de março de 2019, o pedido de alterações aos anos de 2018, 2019 e 2020.
- Em 15 de fevereiro 2019, a DP apresentou junta do IFAP o pedido de ajuda relativo à execução do ano de 2018, o qual reflete a execução do PO face à alteração aprovada pela DRAPN.
- O processo de pedido ajuda suprarreferido foi avaliado por controlo in loco, tendo sido considerado que a alteração ao PO não era válida. De facto, de acordo com o disposto no n.° 2 do artigo 34.° do Regulamento Delegado (UE) n.° 2017/891, os Estados-Membros podem autorizar alterações a PO durante o ano em curso, devendo tomar as decisões até 20 de janeiro do ano seguinte àquele em que as alterações são solicitadas. Assim, face ao definido na legislação, e constatado que a Assembleia Geral, na qual foram deliberadas as alterações ao PO 2018-2020, foi realizada em 21 de janeiro de 2019, o IFAP não considerou a alteração, tendo baseado a sua análise na aprovação inicial do ano de 2018.
[…]
Face ao acima exposto, alertamos essa Direção Regional para a importância de cumprir com o estipulado na legislação relativamente à aprovação de alterações ao PO. Alertamos ainda para a necessidade de avaliação de eventuais consequências da informação agora transmitida nos anos de 2019 e 2020,
Adicionalmente foi verificado que, aquando da aprovação do PO, foi condicionada a elegibilidade da Ação 6.4. Seguros de Colheitas à apresentação por parte da OP da listagem de membros produtores aderentes aos seguros, não existindo qualquer comunicação subsequente por parte da Direção Regional para o IFAP relacionada com o levantamento da condicionante. Assim, recomenda-se a essa Direção Regional, que de futuro proceda à análise das condicionantes aplicadas com a maior brevidade, por forma a que as mesmas se encontrem ultrapassadas e devidamente comunicadas ao IFAP, aquando da análise dos pedidos de ajuda (…)”.
- Cfr. ofício junto com o processo administrativo a fls. 624 e 625 do SITAF, junto do processo cautelar 946/20.... apenso, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
7. Em 27.09.2019, a Autora expediu, por correio postal, comunicação dirigida à Entidade Demandada, de cujo teor importa destacar: “(…)
- De acordo com o definido pela Portaria 1325/2008, Art° 11, comunicamos as alterações ao conteúdo do Programa Operacional da Organização de Produtores n.° 520 - [SCom01...], S.A, inferiores a 20% do valor aprovado para o ano em questão e permanecendo inalteráveis os objetivos globais.
Seguem-se os pontos a comunicar:
1- Confirmação do VPC ANO 2017 (valor de referência para o cálculo do fundo de 2019);
Inicialmente a previsão foi de 5.742,410,00€ no entanto o VPC final é de 5,877.870,S3€ (diferença inferior a 10% para o estimado). Este valor pode ser confirmado no Quadro Resumo VPC (2017) enviado em anexo e em email para [...]
ANO 2018 (valor de transferência para o cálculo do fundo de 2020):
O VPC apurado do ano de 2018 é de 8.072.186,46€. Este valor pode ser confirmado no Quadro Resumo VPC (2018) enviado em anexo e em email para [...]
2- Ajuste dos valores de referência atribuídos a cada medida mediante a confirmação do VPC:
De referir que estes acertos são inferiores a 20% e estão de acordo com as atualizações do VPC de 2017 e 2018. Segue em anexo o modelo C l com as referidas atualizações e enviado em email para [...]".
- Cfr. documento ..., junto com a p.i., cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
8. Em 28.10.2019, a Entidade Demandada expediu mensagem eletrónica, dirigida à Autora, solicitando a remessa de elementos, de cujo teor importa destacar:
"[...] De acordo com o vosso ofício, de 27 de setembro de 2019, onde comunicam que as alterações ao conteúdo do PO são inferiores a 20%, relembramos que qualquer alteração ao PO aprovado carece de validação pela Assembleia Geral.
Tendo por base o mesmo ofício e Ficha Financeira do Programa Operacional, comunicam que pretendem retirar os valores associados à despesa da Ação 7.4 - Poupança de energia mediante a utilização de energia renováveis, situação que se reveste de uma alteração ao PO aprovado.
Assim, solicitamos cópia da Ata da Assembleia Geral a autorizar as alterações apresentadas e respectiva lista de presenças.
Através de ofício do IFAP, datado de 16 de outubro de 2019, fomos informados que as alterações ao Programa Operacional para os anos 2018, 2019 e 2020 aprovadas pela DRAP Norte não foram consideradas válidas pelo IFAP. Pelo referido, as alterações/comunicações para os anos de 2019 e 2020, deverão ter como base o PO inicialmente aprovado [...]".
- Cfr. documento ..., junto com a p.i., cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
9. Em 05.11.2019, a Autora expediu mensagem eletrónica, dirigida à Entidade Demandada, de cujo teor importa destacar: “(…)
- Relembramos que o Programa Operacional da [SCom01...] foi aprovado ao abrigo da Portaria n.° 1325/2008 de 18/11. Questionada esta sociedade se pretendia continuar com o PO em execução até ao seu termo nas condições aplicáveis na portaria 1325/2008 ou se pretendia adaptá-la à nova legislação, esta OP respondeu que pretendia manter a execução até final ao abrigo do disposto na portaria 1325/2008, devendo portanto aplicar-se as disposições constantes desta portaria.
Seguindo o previsto no artigo l1.0 da Portaria 1325/2008, nos pontos 5 e 6, a [SCom01...] comunicou à DRAP Norte, a 27-09-2019, as alterações ao PO para o ano em curso, inferiores a 20% do montante aprovado para este ano, juntamente com as alterações para o ano seguinte, devidamente justificadas e acompanhadas de documentação que fundamenta os motivos, caráter e respetivas implicações, demonstrando que os objetivos globais do programa permanecem inalteráveis. [...]
- Gostaríamos de ver esclarecidas as seguintes questões:
- De acordo com o vosso ofício, de 27 de setembro de 2019, onde comunicam que as alterações ao conteúdo do PO são inferiores a 20%, relembramos que qualquer alteração ao PO aprovado carece de validação pela Assembleia Geral"
Essa portaria 1325/2008 não contempla qualquer menção à necessidade das alterações carecerem de validação pela Assembleia Geral e nem a legislação comunitária tem essa indicação, Assim sendo gostaríamos que a DRAP Norte nos indicasse qual a legislação que suporta a afirmação feita.
"Através de ofício do IFAP, datado de 16 de outubro 2019, fomos informados que as alterações ao Programa Operacional para os anos 2018, 2019 e 2020 aprovadas pela DRAP Norte não foram consideradas válidas pelo IFAP. Pelo referido, as alterações/comunicações para os anos de 2019 e 2020, deverão ter como base o PO inicialmente aprovado."
Quanto a este ponto, da análise da legislação aplicável verificamos que é da exclusiva competência da DRAP a decisão sobre a aprovação rios PO e das alterações solicitadas aos mesmos (artigo 9.0 e 11.0 da portaria 1325/2008).".
- Cfr. documento ..., junto com a p.i., cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
10. Em 29.01.2020, a Entidade Demandada expediu, por via postal, ofício dirigido à Autora, com o assunto "Audiência Prévia. Programa Operacional da [SCom01...], S.A. Alterações relativas aos anos 2019 e 2020", de cujo teor importa destacar: “(…)
"O Programa Operacional (PO) da [SCom01...], S.A., para o triénio 2018-2020, foi aprovado pela DRAPN em 19 de janeiro de 2018, no uso da competência conferida no n.° 1 do artigo 9.° da Portaria n.° 1325/2008, de 18 de novembro, alterada pela Portaria n.° 1247/2009, de 13 de outubro, e Portaria n.° 166/2012, de 22 de maio.
Em 01 de outubro 2019, deu entrada nesta Direção Regional de Agricultura e Pescas, um pedido de alterações ao PO para os anos 2019-2020, que consiste no seguinte:
Anos 2019 e 2020
- Redução do valor na Ação 3.2.3 - Pessoal Qualificado para a melhoria da comercialização.
- Supressão da Ação Ambiental 7.4 - Poupança de energia mediante a utilização de energias renováveis
Procedeu-se à análise do processo e foram solicitados à OP, via email, em 28 de outubro de 2019, os documentos que se transcrevem:
4) Através de oficio do IFAP, datado de 16 de outubro de 2019, fomos informados que as alterações ao Programa Operacional para os anos 2018, 2019 e 2020 aprovadas pela DRAP Norte não foram consideradas válidas pelo IFAP. Pelo referido, as alterações/comunicações para os anos de 2019 e 2020, deverão ter como base o PO inicialmente aprovado." [...]
Em 06 de novembro de 2019 a DRAPD, considerando as respostas da OP, solicitou a colaboração ao GPP e ao IFAP para responderem às questões colocadas pela mesma e informou a [SCom01...], em 08 de novembro, que as questões colocadas foram remetidas a esses organismos para se pronunciarem, ficando a DRAPN a aguardar resposta.
Como não obtivemos nenhuma resposta do GPP nem do IFAP, em 13 de janeiro de 2020 foi reiterado o pedido ao qual o IFAP respondeu o que se transcreve: "O processo da [SCom01...] está a ser reanalisado, na sequência da reunião tida com a responsável da OP e da informação adicional, que nos foi, entretanto, remetida."
Pelos motivos e fundamentos explicitados, não foram aprovadas as alterações ao PO para os anos 2019 e 2020, apresentados pela [SCom01...], S. A. Assim, e de acordo com o disposto nos artigos 121.0 e 122.0" do Código do Procedimento Administrativo, aprovado em anexo ao Decreto Lei n.° 4/2015, de 7 de janeiro, dispõe de 10 dias úteis para dizer o que se lhe oferecer sobre a decisão de indeferimento desta Direção Regional de Agricultura e Pescas sobre o pedido de alteração aos anos 2019 e 2020.
Com os melhores cumprimentos, [...]".
- Cfr. documento ...1, junto com a p.i., cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
11. Em 11.02.2020, a Autora expediu, por correio postal com aviso de receção, comunicação com o assunto “audiência prévia", dirigida à Entidade Demandada, de onde se extrai o seguinte: “(…)
- [SCom01...], S.A. […]
Vêm exercer o seu direito de audição prévia, o que o faz. nos termos e com os seguintes fundamentos:
[…]
SEM PRESCINDIR:
Caso assim não se entenda sempre se dirá:
4 - Por carta rececionada a 30 de janeiro de 2020, foi a requerente notificada de que não foram aprovadas as alterações ao PO para os anos de 2019 e 2020, o que não se aceita como infra se demonstrará.
5 - Quanto às alterações para o ano de 2019, e contrariamente ao alegado pela DRAP NORTE, a verdade é que a ata da Assembleia Geral - ACTA N.° ...9- datada de 21/01/2019, já tinha sido remetida a esse serviço no inicio do mês de fevereiro do ano de 2019, e que aqui se junta novamente corno documento n.° ... e cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.
6 - Na referida ata foram aprovadas as diversas alterações ao PO, nomeadamente a substituição da acção 7.4 pelas ações 7.9 e 7.10 e consequentemente o reforço financeiro na acção 1.1.9.;
7 - Bem como foi aprovado que a [SCom01...] pretende continuar com as novas medidas (7.9 e 7.10) para os anos seguintes de Programa Operacional, mas manter também a medida 7.4 - Poupança de energia mediante a utilização de energias renováveis." sublinhado nosso.
8 - Assim e pelo que se deixa exposto, devem ser aprovadas as alterações constantes da ata n....19 de 21/01/2019, e em consequência ser aprovadas as referidas alterações para o ano de 2019.
9 - Quanto ás alterações solicitadas para o ano de 2019 e 2020 e constantes da nossa carta datado de 27/09/2019, cumpre informar que a requerente mantém na integra o teor do e-mail enviado em 05/1 1/2019 (nossa resposta aos elementos solicitados pela DRAPN), e por isso entende não necessitar de ata de Assembleia Geral a aprovar as alterações pois para além das alterações solicitadas serem inferiores a 20%, também a portaria n.°1325/2008 e a legislação comunitária não exigem qualquer ata para aprovação de alterações Motivo pelo qual devem aceitar as alterações submetidas. Relembramos que o PO da requerente se encontra ao abrigo da portaria n.° 1325/2008. [...]".
- Cfr. documento ...2, junto com a p.i., cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
12. Em 19.03.2020, a Entidade Demandada expediu, por correio postal, ofício com o assunto “Decisão Final - Programa Operacional da [SCom01...], S.A. - Alterações Relativas aos Anos 2019 e 2020", de cujo o teor importa destacar: “(…)”
- No âmbito do pedido de alterações ao Programa Operacional (PO), da [SCom01...], S.A, relativas aos anos de 2019 e 2020, foi essa OP notificada em sede de Audiência Prévia [...]
Em sede de alegações, através do Ofício datado de 11 de fevereiro do corrente ano, a [SCom01...], alega e remete nos pontos 1, 2 e 3, para a figura do deferimento tácito, em virtude de ter decorrido o prazo fixado no artigo 65.° e 66.° do Regulamento CE n.° 1580/2007 da comissão e art.0 34.° do Regulamento Delegado (EU) 2017/891.
Ora, ao abrigo do disposto no Código do Procedimento Administrativo, aprovado pelo Decreto Lei n.° 4/2015, de 7 de janeiro, não existe na atual redação a figura do deferimento tácito, salvo nas situações expressamente previstos na Lei, o que não é o caso.
Assim, o argumento apresentado por V. Ex.a não colhe, já que como poderão constatar, a legislação invocada não faz qualquer referência à figura do deferimento tácito, reiterando-se o princípio de que é sempre necessária previsão específica, para dar o valor positivo ao silêncio.
Ante o exposto, esta Direção Regional não pode acolher a V. pretensão. Ademais mesmo que tal figura pudesse operar, o que não é o caso, existiu decisão por parte da Administração dentro dos prazos que a Lei estabelece para decidir (20 de janeiro de 2020), em virtude da prorrogação do prazo entretanto efetuado.
No que concerne aos demais argumentos invocados nos pontos seguintes do supra referido ofício, mantém-se o explicitado no n/ofício de audiência prévia enviado no dia 29-01-2020.
Face ao que precede, e considerando que não foram alegados elementos novos que possam alterar os pressupostos que conduziram ao projeto de decisão de indeferimento, o projeto de decisão, converter-se-á em decisão final, pelo que se mantém o indeferimento do pedido de alterações ao Programa Operacional (PO), da [SCom01...], relativas aos anos de 2019 e 2020.".
- Cfr. documento ...3, junto com a p.i., cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido (…)”.
*
III.2 – DE DIREITO
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11. A Autora, aqui Recorrida, intentou a presente ação, tendo formulado o seguinte petitório: “(…) Nestes termos e nos mais de direito aplicáveis, deve a presente ação ser considerada procedente por provada e, em consequência, ser a Entidade Demandada condenada a aprovar as alterações ao programa operacional de 2019 e 2020 nos termos apresentados pela Autora (documento n.° ... atrás junto) (…)”.
12. Estribou tal pretensão, brevitatis causae, no entendimento que o ato de indeferimento do pedido de alterações ao Programa Operacional relativas aos anos de 2019 e 2020 [13.03.2020] enferma de vício[s] de violação de lei, por (i) erro nos pressupostos de direito e (ii) ofensa de ato administrativo prévio.
13. O T.A.F. de Braga, como sabemos, promanou decisão judicial a julgar procedente a presente ação, tendo condenado a Entidade Demandada a aprovar as alterações ao programa operacional de 2019 e 2020 nos termos apresentados pela Autora.
14. A ponderação de direito na qual se estribou o juízo de procedência integral da presente ação foi a seguinte: ”(…)
No caso em apreço, a questão que ao Tribunal cumpre apreciar é saber se assiste à Autora o direito à aprovação das alterações ao programa operacional de 2019 e 2020.
Apesar da presente ação, conforme ficou dito, dirigir-se à pretensão da Autora, ou seja, um ato de deferimento, importa recordar que [o] objeto do processo em que se peticione a condenação da prática de um ato administrativo envolve, à semelhança da pretensão impugnatória, todos os vícios que possam determinar a condenação da Administração à prática de um ato administrativo que, do ponto de vista legal, é devido à parte cuja pretensão concreta é, na verdade, o pedido de condenação" à prática de um ato que cumpra as determinações formais e substanciais impostas por lei (neste sentido, o Acórdão do TCA-Norte, de 12.10.2018, proc. 02730/13.8BEPRT).
Vejamos.
A Entidade Demandada indeferiu a pretensão da Autora porque entende que qualquer alteração ao PO aprovado carece de validação pela Assembleia Geral e que, por outro lado, o IFAP informou que as alterações ao Programa Operacional para os anos 2018, 2019 e 2020 aprovadas pela DRAP Norte não foram consideradas válidas pelo IFAP.
Analisemos, então, tendo em conta as ilegalidades invocadas, se o ato impugnado é válido.
Do vício de violação de lei por erro nos pressupostos de Direito
Quanto ao facto da alteração do PO aprovado depender de validação pela Assembleia Geral, sustenta a Autora que o quadro legal aplicável à execução do PO para o triénio 2018-2020 é o que decorre da Portaria n.° 1325/2008, de 18 de novembro, atento o disposto no artigo 44.°, n.° 1, a) da Portaria n.° 295-A/2018, de 2 novembro. Sendo assim, não só a alteração do PO, referente aos anos de 2019 e 2020, não estava dependente da apresentação da ata da Assembleia Geral da Requerente, de onde constasse a aprovação interna da alteração do programa, como a alteração ao PO referente ao ano de 2019 não carecia de autorização prévia da Entidade Demandada.
A Entidade Demandada aduz que a junção da ata da Assembleia Geral constitui um elemento essencial da apresentação dos Programas Operacionais pelas organizações de produtores, pelo que, por maioria de razão, deve aquele documento instruir também os pedidos de alteração aos Programas Operacionais. Refere, ainda, que a junção da ata da Assembleia Geral das organizações de produtores constitui uma exigência expressamente consagrada na Portaria n.° 295-A/2018, de 2 novembro.
Apreciemos.
A legalidade da decisão administrativa estará necessariamente comprometida se padecer de vício de violação de lei, por erro de interpretação ou aplicação da norma (situação em que o vício de violação de lei decorre de um erro nos pressupostos de Direito), ou de violação de lei por erro nos pressupostos de facto (neste sentido, vide os Acórdãos do STA, de 11.11.2004, proc. 1953/02, e do TCA-Norte, de 22.02.2020, proc. 00569/19.6BEAVR).
O vício de violação de lei por erro nos pressupostos de Direito consubstancia uma ilegalidade que afeta a própria substância do ato administrativo, e não a sua forma, por a decisão administrativa final contrariar o disposto numa norma jurídica que, em face da situação em apreço, seria aplicável ao caso. Este vício compreende o conjunto de situações em que não existe uma correspondência entre a situação abstratamente delineada na previsão normativa e os concretos pressupostos de Direito que integram a situação concreta, levando a que a administração decida coisa distinta da estabelecida em lei, ou se abstenha de decidir quando a lei exigia que o fizesse.
À altura em que o PO para o triénio 2018-2020 da Autora foi aprovado, estava em vigor a Portaria n.° 1325/2008, de 18 de novembro, com as alterações introduzidas, respetivamente pelas Portarias n.°s 1247/2009, de 13 de outubro, e 166/2012, de 22 de maio (cfr. facto 1. da matéria assente).
Resulta do disposto no artigo 11.° da supra enunciada Portaria, com a epígrafe -Alterações dos programas operacionais", que:
«1 - As organizações e associações de organizações de produtores reconhecidas podem apresentar, junto da respetiva DRAP [Direção Regional de Agricultura e Pescas] ou dos serviços competentes das RA [Regiões Autónomas], alterações dos programas operacionais para o ano em curso ou para o ano seguinte, nos termos do disposto no presente artigo.
2 - Dependem de autorização prévia das DRAP ou dos serviços competentes das RA, as seguintes alterações a realizar no ano em curso:
a) De conteúdo dos programas operacionais, de 20 % até ao limite máximo de 40 % do valor aprovado para o ano em questão, desde que permaneçam inalteráveis os objetivos globais do programa operacional;
b) Do fundo operacional, até um aumento máximo de 25 % ou redução até 20 % do montante inicialmente aprovado, desde que permaneçam inalteráveis os objetivos globais do programa operacional.
5 - As alterações previstas na alínea a) do n.° 2 quando não ultrapassem o limite de 20 % do montante aprovado para o programa operacional para o ano em causa devem ser comunicadas de imediato às DRAP ou aos serviços competentes das RA no máximo até 30 de setembro de cada ano.
6 - Os pedidos de alteração dos programas operacionais para o ano seguinte devem ser apresentados, até 30 de setembro, devidamente justificados e acompanhados de documentação que fundamente os motivos, o carácter e as respetivas implicações e demonstrar que os objetivos globais do programa permanecem inalteráveis. [...]»
Do enunciado, extrai-se que, no que respeita aos pedidos de alteração que não ultrapassassem o limite de 20% do montante aprovado relativamente o PO, para o ano em causa, deve haver lugar a uma comunicação à DRAP, e não já - por contraposição com o n.° 2 do preceito - a uma autorização prévia.
Já as alterações que incidissem sobre o ano seguinte [ao ano em causa, i.e., do ano em que se efetua o pedido de alteração] do PO estavam sujeitas à apresentação de pedido, acompanhado pelos elementos enunciados no n.° 6, onde não vem feita qualquer referência a atas da Assembleia Geral das organizações de produtores.
Posteriormente, em 02.11.2018, foi aprovada a Portaria n.° 295-A/2018, que revogou a Portaria n.° 1325/2008, de 18 de novembro, alterada pelas Portarias n.°s 1247/2009, de 13 de outubro, e 166/2012, de 22 de maio (artigo 45.°), com efeitos a partir de 03.11.2018 (artigo 46.°).
Decorria, contudo, do artigo 44.° da Portaria n.° 295-A/2018 que:
«1 - A pedido de uma organização de produtores, os programas operacionais aprovados ao abrigo da Portaria n.° 1325/2008, de 18 de novembro, alterada pelas Portarias n.°s 1247/2009, de 13 de outubro, e 166/2012, de 22 de maio, podem:
a) Continuar em execução até ao seu termo nas condições aplicáveis nos termos da referida portaria;
b) Ser alterados a fim de cumprir os requisitos previstos na presente portaria e regulamentação comunitária em vigor aplicável;
c) Ser substituídos por um novo programa operacional aprovado ao abrigo da presente portaria e regulamentação comunitária em vigor aplicável.»
Olhando a disposição normativa em apreço, facilmente se constata que, apesar de revogada a Portaria n.° 1325/2008, de 18 de novembro, mediante pedido da organização de produtores, um programa operacional que houvesse sido aprovado ao abrigo daquela legislação poderia continuar, até ao seu termo, a ser executado nos termos da referida portaria. Sem embargo, as organizações de produtores poderiam, alternativamente, pedir que o programa operacional fosse alterado de modo a cumprir com os requisitos entretanto contemplados na Portaria n.° 295-A/2018 e demais legislação comunitária aplicável ou solicitar a substituição do programa operacional aprovado por um novo, elaborado com base na Portaria n.° 295-A/2018 e regulamentação comunitária aplicável.
À luz da nova Portaria n.° 295-A/2018, passou a dispor o artigo 30.°, com a epígrafe —Alterações dos programas operacionais":
«1 - As organizações de produtores podem apresentar junto da respetiva DRAP ou dos serviços competentes das RA, alterações aos programas operacionais nos termos do disposto no presente artigo:
a) Para o ano em curso;
b) Para o ano seguinte.
2 - Os pedidos de alteração devem ser devidamente justificados e acompanhados de documentação que fundamente os motivos, o carácter e as respetivas implicações e demonstrar que os objetivos globais do programa permanecem inalteráveis, sendo objeto de análise e decisão pelas DRAP ou pelos serviços competentes das RA.
3 - As alterações aos conteúdos dos programas operacionais para o ano em curso que, individualmente ou na totalidade dos pedidos de alteração apresentados pela organização de produtores, não ultrapassem 20 % do montante aprovado para o programa operacional para o ano em causa, podem ser executados após a apresentação do pedido de alteração, sem prejuízo da decisão de aprovação referida no n.° 7. [...]
7 - Os pedidos de alteração para o ano em curso são apresentados até 30 de setembro, sendo objeto de decisão no prazo máximo de 30 dias úteis a contar da data de apresentação do pedido.
10 - Aos pedidos de alteração aplicam-se as disposições previstas nos n.°s 2 a 5 do artigo 27.°, com as necessárias adaptações».
Nesta sequência, dispõe o n.° 5, do artigo 27.°, da Portaria n.° 295-A/2018:
«[...] 5 - Os programas operacionais devem ainda ser instruídos com a ata da assembleia geral da qual constem as deliberações relativas ao seguinte:
a) Apresentação do programa operacional;
b) Conteúdo do programa operacional;
c) Aspetos financeiros inerentes ao programa operacional».
Com base nesta nova Portaria, todas as alterações aos programas operacionais estão sujeitas à apresentação de pedido, ainda que, relativamente àquelas que não ultrapassem 20% do montante aprovado para o programa operacional para o ano em causa, seja admissível a sua execução imediata, sem prejuízo de posterior deferimento ou indeferimento por parte da entidade administrativa (v. n.°s 3 e 7 do artigo 30.°). Em qualquer caso, os pedidos de alteração devem ser instruídos com alguns elementos, de entre os quais se destaca a ata da Assembleia Geral com a deliberação relativa à alteração ao programa operacional (artigo 27.°, n.° 5, ex vi artigo 30.°, n.° 10).
Compulsados os autos, vejamos, então, qual o quadro legal aplicável à Autora no momento em que procedeu à apresentação do pedido de alterações, em 25.09.2019 (cfr. facto 7) da matéria assente), que cominou com a prática do ato impugnado.
Decorre da factualidade provada que, em 05.11.2018, a Entidade Demandada terá alertado a Autora para o facto de ter entrado em vigor a Portaria n.° 295-A/2018 de 2 de novembro, indicando, ainda, que as alterações apresentadas na DRAP para o ano de 2019 deveriam respeitar os requisitos previstos naquele diploma (cfr. facto 3. da matéria assente). Em resposta datada de 12.11.2018, a Autora informou a Entidade Demandada de que pretendia que as alterações requeridas viessem a ser analisadas à luz da anterior Portaria n.° 1325/2008 (cfr. facto 4. da matéria assente).
Do exposto, ajuizando o quadro fático-jurídico patente, tudo parece indicar que a Autora cumpriu com o disposto no artigo 44.°, n.° 1, alínea a) da Portaria n.° 295-A/2018 de 2 de novembro, normativo que, conforme se constatou, admite que as organizações de produtores com PO aprovado na vigência da Portaria n.° 1325/2008, como é aqui o caso (cfr. facto provado em 1.), informem a DRAP de que pretendem que este continue a ser executado, até ao seu termo, à luz do quadro legal introduzido por esta última portaria, entretanto revogada.
Ora, a Portaria n.° 1325/2008 apenas exigia a apresentação da ata da Assembleia Geral da organização de produtores aquando da apresentação dos programas operacionais (artigo 2.°, n.° 4 da Portaria) e de ações em explorações dos associados das organizações de produtores (artigo 7.° da Portaria), não contemplando uma norma semelhante à do artigo 30.°, n.° 10 da Portaria n° 295-A/2018 de 2 de novembro, que, conforme se secundou, passou a exigir que esse elemento fosse, também, instruído com os pedidos de alteração ao PO.
Aqui chegados, tudo parece apontar que o quadro legal aplicável ao pedido de alteração apresentado pela Autora era o decorrente da Portaria n.° 1325/2008.
Conforme se firmou na matéria de facto provada, em 27.09.2019, a Autora solicitou a alteração ao PO, relativamente aos anos de 2019 e 2020, sendo que, no que tange ao ano de 2019, a diferença entre o valor aparentemente aprovado para o programa operacional para o ano em causa (€ 5.742.410,00) e aquele que posteriormente foi comunicado (€ 5,877.870,93) é inferior a 20% (cfr. facto 6. do probatório), pelo que, por aplicação do artigo 11.°, n.° 5 da Portaria n.° 1325/2008, bastava a comunicação imediata da alteração à DRAP, sem necessidade de autorização prévia.
No que se refere ao pedido de alterações ao PO na parte em que respeita ao ano de 2020 (“ano seguinte” ao ano de apresentação da proposta de alteração), tudo parece indicar que este dependia de autorização prévia da DRAP (artigo 11.°, n.° 6 da Portaria n.° 1325/2008).
Nestes termos, apreciados os elementos coligidos, as alterações requeridas ao PO, relativamente ao ano de 2019, não se encontravam dependentes de autorização prévia, mas de comunicação imediata à DRAP Norte, e que, no que tange ao ano de 2020, o pedido de alterações, para ser deferido, não tinha de ser instruído com a ata da Assembleia Geral da Requerente, de onde constasse deliberação relativa à alteração do referido programa operacional.
Portanto, o requerimento apresentado pela Autora, tendo sido indeferido por este facto, é ilegal por violação de lei, por erro nos pressupostos de Direito.
Da alegada violação, pelo ato impugnado, de ato administrativo prévio
Quanto ao facto do IFAP ter informado que as alterações ao Programa Operacional para os anos 2018, 2019 e 2020 aprovadas pela DRAP Norte não terem sido consideradas válidas, sustenta a Autora que, uma vez que, foi aprovada pela DRAP Norte uma primeira alteração ao OP para o triénio 2018-2020, entende que o ato impugnado é ilegal, pois, por um lado, viola um ato administrativo prévio, que não foi sujeito a anulação ou revogação administrativas e, por outro, funda-se no aparente exercício de uma competência que não pertence ao IFAP, mas à DRAP Norte.
A Entidade Demandada refere que não procedeu, com a prática do ato impugnado, à anulação do ato de aprovação das alterações ao PO, de 13.02.2019.
Vejamos, então.
Efetivamente, em 16.08.2018, a Autora submeteu um pedido de alterações ao Programa Operacional, relativamente ao ano de 2018, que veio a ser expressamente aprovado pela Entidade Demandada, em 13.03.2019 (cfr. factos provados 2. e 5.).
Resulta, também, da factualidade assente que, por via do despacho de 29.01.2020 (cfr. facto 10. da matéria assente), para cuja fundamentação remete o ato impugnado, vem feita referência a segmento de uma das comunicações mantidas entre Entidade Demandada e a Autora, onde a primeira referiu que "[através de ofício do IFAP, datado de 16 de outubro 2019, fomos informados que as alterações ao Programa Operacional para os anos 2018, 2019 e 2020 aprovadas pela DRAP Norte não foram consideradas válidas pelo IFAP. Pelo referido, as alterações/comunicações para os anos de 2019 e 2020, deverão ter como base o PO inicialmente aprovado.".
Ora, do probatório não resulta do ato impugnado qualquer cominação dirigida à anulação administrativa do despacho de 13.03.2019.
Poderá, quando muito, dizer-se que o ato impugnado, no segmento em que refere que as alterações e comunicações para os anos de 2019 e 2020 devem ter por base o PO inicialmente aprovado, em razão de uma invalidação, pelo IFAP, das alterações ao PO para os anos 2018, 2019 e 2020, previamente aprovadas pela DRAP Norte, atendeu a factos desconformes com a realidade.
Senão vejamos.
O ofício do IFAP, datado de 16.10.2019, teve por destinatário a Entidade Demandada e não a Autora. Desse ofício, não se retira qualquer invalidação do ato que aprovou as primeiras alterações ao PO da Autora, mas apenas uma recomendação à "[Direção Regional para a importância de cumprir com o estipulado na legislação relativamente à aprovação de alterações ao PO" e para a "[p]ara a necessidade de avaliação de eventuais consequências da informação [...] transmitida nos anos de 2019 e 2020", aconselhando, ainda, a mesma DRAP para que, de "[futuro proceda à análise das condicionantes aplicadas com a maior brevidade, por forma a que as mesmas se encontrem ultrapassadas e devidamente comunicadas ao IFAP, aquando da análise dos pedidos de ajuda" (cfr. facto 6. dos factos provados).
Mesmo que esse ofício contivesse alguma pretensão invalidante do ato de 13.03.2019 (o que, reitera-se, não é o caso), a mesma não constituiria, juridicamente, uma anulação administrativa. Em primeiro lugar, não decorre, nem do quadro legal instituído pela Portaria n.° 1325/2008, nem da Portaria n.° 295-A/2018, que outra entidade que não a DRAP ou as Regiões Autónomas tenha competência para conhecer dos pedidos de alteração aos programas operacionais (respetivamente, artigo 11.°, n.°s 1, 2 e 5 e artigo 30.°, n.° 1, 2, 4 e 9). Em segundo, a anulação administrativa é levada a efeito por via da prática de um ato administrativo de segundo grau; ora, o ofício de 16.10.2019 não tem as características de um ato administrativo, para efeitos do disposto no artigo 148.° do CPA, tratando-se de um mero ofício que espelha uma comunicação efetuada entre duas entidades administrativas.
Compulsados os presentes autos, não se vislumbra que o despacho datado de 13.03.2019 tenha sido anulado ou revogado administrativamente, tudo indiciando que o mesmo continua a produzir plenos efeitos na ordem jurídica.
Portanto, a atuação da Entidade Demandada, vertida no ato impugnado, assentou em pressupostos de facto inexistentes.
Por conseguinte, ante o exposto, assuma a conclusão que a pretensão da Autora tem que proceder (…)”.
15. O Recorrente discorda do assim decidido, impetrando-lhe erro[s] de julgamento de direito.
16. Realmente, clama o Recorrente que a junção da junção da ata da Assembleia Geral constitui um elemento essencial da apresentação dos Programas Operacionais pelas organizações de produtores, pelo que o requerimento apresentado pela Autora, tendo sido indeferido por falta de junção deste elemento, é legal, incorrendo, por isso, a sentença recorrida em errada interpretação do disposto no artigo 11.º da Portaria n.º 1325/2008, com as alterações introduzidas, respetivamente pelas Portarias n.ºs 1247/2009, e 166/2012.
17. Apregoa ainda não ser verdade que o despacho datado de 13.03.2019 não tenha sido anulado ou revogado administrativamente, uma vez que o PO 2018-2020 já foi encerrado em 31.12.2020, tendo, entretanto, sido aprovado o PO 2021-2023 em 19.01.2021.
18. Derradeiramente, invoca a verificação de uma causa de extinção da lide incidental, por inutilidade superveniente, emergente da impossibilidade de aprovação das alterações ao programa operacional de 2019 e 2020, uma vez que o PO 2018-2020 já foi encerrado.
19. Espraiadas as considerações pertinentes da constelação argumentativa do Recorrente, adiante-se, desde já, que a razão não está do seu lado.
20. Na verdade, do cotejo da matéria de facto apurada resulta que o Programa Operacional 2018-2020 da Autora, ora Recorrida, foi aprovado no ano de 2018 [cfr. facto nº.1].
21. Ora, as partes não questionam que, com reporte à data de aprovação do PO da Autora, se aplique a Portaria n.º 1325/2008, de 18 de novembro, com as alterações introduzidas, respetivamente pelas Portarias n.ºs 1247/2009, de 13 de outubro, e 166/2012, de 22 de maio, pelo que seguir-se-á o regime jurídico aí consignado.
22. Pois bem, perlustrando atentamente o teor do artigo 11º da citada Portaria 1325/2008 - cujo teor nos escusamos aqui de reproduzir em virtude do mesmo resultar já citado e transcrito na página 16 da decisão judicial recorrida -, não se descortina em momento a exigência de apresentação da ata de assembleia geral das organizações dos produtores no tocante aos pedidos de alteração ao PO.
23. Realmente, em bom rigor, o que dali se extrai é que para os pedidos de alteração que não ultrapassassem o limite de 20% do montante aprovado relativamente o PO para o ano em causa deve haver lugar a uma comunicação à DRAP, diversamente aos pedidos de alteração que incidam sobre os anos seguintes ao ano do PO, que estão sujeitos à apresentação de um pedido instruído devidamente instruído, mas sem qualquer necessidade de apresentação da ata de assembleia geral.
24. Neste enquadramento, resulta inequívoca a insubsistência de qualquer exigência legal no quadro da Portaria n.º 1325/2008 de apresentação de atas da Assembleia Geral das organizações de produtores na instrução dos pedidos de alteração do PO.
25. Realidade que, aliás, é expressamente reconhecida pela Recorrente na conclusão 3) das alegações de recurso.
26. Não se descura a importância procedimental da necessidade de junção de tal elemento documental.
27. Contudo, encontrando-se a Administração vinculada ao princípio da legalidade - o qual postula a obediência à lei [vertente positiva] e a impossibilidade de atuação da mesma na falta de expressa norma legal habilitante [vertente negativa], não podia a mesma indeferir a pretensão da Autora com fundamento na falta de apresentação da ata da assembleia geral, precisamente, por falta de previsão legal nesse sentido.
28. Sendo assim, ressuma com evidência que a sentença recorrida, na parte que assim também o entendeu, não enferma de qualquer erro de julgamento em análise.
29. Idêntica asserção é atingível no tocante ao segundo grupo de razões invocadas pela Recorrente.
30. De facto, o Recorrente alega não ser verdade que “(…) o despacho datado de 13.03.2019 [não] tenha anulado ou revogado administrativamente, tudo indiciando que o mesmo continua a produzir plenos efeitos na ordem jurídica (…)”, uma vez que o PO já foi encerrado em 31.12.2020.
31. Porém, esta alegação não corporiza nenhuma forma de desintegração expressa de atos.
32. Nem se verificam os pressupostos de uma desintegração tácita de atos administrativos.
33. Nestas situações, estamos perante um acto que não indica [nem contém] um conteúdo revogatório expresso mas produz, para a mesma situação concreta, efeitos incompatíveis com os do acto anterior, de modo que não podem ambos subsistir na ordem jurídica.
34. Como refere Mário Esteves de Oliveira Vide, obra citada, pág. 689, a propósito da revogação tácita, a mesma é possível “nos casos em que é patente o órgão administrativo ter tido em conta a existência do acto revogando, embora a sua decisão não seja reportada àquele mas à situação sobre que ele versou”.
35. No caso versado, é nosso entendimento que o encerramento do PO 2018-2020 não é incompatível com o despacho datado de 13.03.2019, que aprovou o pedido alterações ao Programa Operacional para o triénio 2018-2020 [cfr. ponto 5) do probatório coligido nos autos].
36. Com efeito, o encerramento dos programas operacionais não se mostra reservado às situações em que não tenha havido aprovação da alteração dos programas operacionais, incluindo, naturalmente, e como não podia deixar de ser, este tipo de situações.
37. Como tal, não se verifica o pressuposto da desintegração tácita, que atinge de improcedência o erro de julgamento de direito assacado à decisão recorrida.
38. Naturalmente, pode equacionar-se o eventual efeito desintegratório [parcial] do ato de indeferimento do pedido de alterações ao Programa Operacional relativas aos anos de 2019 e 2020 [13.03.2020] em relação ao aludido despacho de 13.03.2019, que aprovou o pedido alterações ao Programa Operacional para o triénio 2018-2020 [cfr. ponto 5) do probatório coligido nos autos].
39. Contudo, mesmo a admitir-se este efeito desintegratório, sempre o mesmo seria ilegal, por se mostrar, como antes se expôs, destituído de fundamento legal [exigência de apresentação de atas da assembleia geral].
40. E não se invoque que “(…) o nº. 5 do artigo 27.º da Portaria n.º 295-A/2018, de 2 de novembro, que revogou a Portaria n.º 1325/2008, de 18 de novembro, alterada pelas Portarias n.ºs 1247/2009, de 13 de outubro, e 166/2012, de 22 de maio (artigo 45.º), veio consagrar expressamente que os pedidos de alteração devem ser instruídos com alguns elementos, de entre os quais se destaca a ata da Praça ..., Assembleia Geral com a deliberação relativa à alteração ao programa operacional (artigo 27.º, n.º 5, ex vi artigo 30.º, n.º 10) (…)”.
41. É que a Portaria nº 295-A/2018, de 2 de novembro – que entrou em vigor no dia 03.11.2018 -, ressalvou a possibilidade dos PO aprovados ao abrigo da Portaria nº. 1325/2008 poderem, a pedido da organização dos produtores, continuar em execução até ao seu termo nas condições aplicáveis nos termos da referida portaria [cfr. artigo 44º, nº.1].
42. Detetando-se a existência de tal pedido por parte do Recorrida e a aceitação do mesmo pelo Recorrente [cfr. ponto 4) e 5) do probatório], é de manifesta evidência a vigência do quadro regulamentar anterior, ou seja, a Portaria nº. 1235/2008.
43. Donde, o dever concluir-se que o eventual ato desintegratório encerra uma atuação viciada de ilegalidade, situação que tem um verdadeiro efeito de implosão em relação à demonstração da tese exposta.
44. Resta-nos, pois, a questão de saber se se verifica [ou não] uma causa de extinção da lide incidental, por inutilidade superveniente, emergente da impossibilidade de aprovação das alterações ao programa operacional de 2019 e 2020, uma vez que o PO 2018-2020 já foi encerrado.
45. A resposta é, manifestamente, desfavorável às pretensões do Recorrente.
46. Na verdade, a argumentação que o Recorrente mobiliza no domínio em apreço é manifestamente insuficiente no sentido da sua conformação com a impossibilidade absoluta de cumprimento do dever da Administração de reconstituir a situação que existiria se o acto anulado não tivesse sido praticado, bem como de dar cumprimento aos deveres que não tenha cumprido com fundamento no acto entretanto anulado, por referência à situação jurídica e de facto existente no momento em que deveria ter, não constituindo suporte para logicamente se concluir a necessidade, ou, sequer, a probabilidade da verificação da mesmo.
47. Donde se apresenta distintivo o interesse na continuação da lide, tanto mais que as questões que o Recorrente suscita enquadram-se no domínio da execução de julgado, “(…) e em relação aos quais a Recorrida não prescinde de se pronunciar na fase jurisdicional administrativa adequada (…)” [cfr. ponto 78 das contra-alegações].
48. Por tudo o quanto ficou exposto, o presente recurso jurisdicional não pode deixar de improceder, impondo-se confirmar a sentença recorrida.
49. Ao que se provirá no dispositivo.
* *
IV – DISPOSITIVO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção do Contencioso Administrativa deste Tribunal, de harmonia com os poderes conferidos pelo artigo 202º da CRP, em NEGAR PROVIMENTO ao recurso e confirmar a sentença recorrida.
Custas pelo Recorrente.
Registe e Notifique-se.
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Porto, 19 de maio de 2023,

Ricardo de Oliveira e Sousa
Rogério Martins
Luís Migueis Garcia