Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01234/07.2BEVIS
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:04/26/2018
Tribunal:TAF de Viseu
Relator:Ana Patrocínio
Descritores:AVALIAÇÃO INDIRECTA
PRESSUPOSTOS
FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO
Sumário:I - Em caso de determinação da matéria tributável por métodos indirectos, compete à administração tributária o ónus da prova da verificação dos pressupostos da sua aplicação, cabendo ao sujeito passivo o ónus da prova do excesso na respectiva quantificação (artigo 74.º, n.º 3 da LGT).
II - No domínio de utilização de métodos indirectos, a actuação da Administração Tributária não se limita à demonstração da ocorrência dos respectivos pressupostos, antes se lhe impõe que fundamente, ainda e também, os critérios de que venha a lançar mão na quantificação da matéria tributável.
III – Assentando a liquidação impugnada num acto emanado no procedimento de revisão, mais propriamente, na decisão do respectivo Director de Finanças, é nesse acto final que se deve colher a fundamentação adoptada pela Administração Tributária.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:Autoridade Tributária e Aduaneira
Recorrido 1:J..., Lda.
Decisão:Negado provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

I. Relatório

A Excelentíssima Representante da Fazenda Pública interpôs recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu, proferida em 12/06/2016, que julgou parcialmente procedente a impugnação judicial deduzida pela sociedade J..., Lda., NIPC 5…, com sede na Quinta…, 3500-000 Viseu, contra a liquidação n.º 2007 8310002353, relativa a IRC do ano de 2003, com imposto a pagar no valor de 360,49 €, derrama no valor de 186,05 € e juros compensatórios no valor de 58,51 €; e contra a liquidação n.º 2007 8310002362, relativa a IRC do ano de 2004, com imposto a pagar no valor de 2.275,76 €, derrama no valor de 361,67 € e juros compensatórios, no valor de 182,20 €.

A Recorrente terminou as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões:
A. Vem o presente recurso interposto do segmento decisório que decorre do conhecimento, pelo tribunal a quo, da questão relativa à errónea quantificação da matéria tributável, na sentença de 12/06/2016, que julgou parcialmente procedente a impugnação das liquidações de IRC relativas aos exercícios de 2003 e 2004 (e respetivos juros compensatórios), anulando-as na parte referente às correções por métodos indiretos, por ilegalidade da quantificação da matéria tributável.
B. É consabido que o procedimento de avaliação indiciária da matéria tributável assenta em duas fases:
a da qualificação e a da quantificação. A fase da qualificação traduz-se na aferição da existência ou não dos pressupostos do recurso à tributação por métodos indiciários e agrega todo o processo de validação ou invalidação dos dados disponibilizados pelo contribuinte, incluindo a avaliação da qualidade das omissões ou incorrecções verificadas, do ponto de vista da sua importância e extensão e a avaliação da credibilidade da escrita face a tais omissões ou incorrecções e, consequentemente, da sua capacidade de transmitir ou emanar a verdade fiscal daquele contribuinte. Por sua vez, a fase da qualificação reporta-se à escolha de um método de quantificação da matéria coletável, bem como à demonstração dos resultados correspondentes.
C. Decorre da sentença ora em apreço, em sede de erro sobre os pressupostos para o recurso a métodos indiretos: “…a Administração Tributária cumpriu o seu ónus de demonstrar que estava legitimada a recorrer à avaliação por métodos indiretos, coligindo indícios objetivos e seguros de que a contabilidade da impugnante não merece credibilidade e não dispunha de elementos para apurar o valor das vendas omitidas…”.
D. No que tange à alegada falta de fundamentação, esclarece a sentença ora em apreço: “… a Administração Tributária explicitou de forma clara e suficiente as razões pelas quais considerou que a contabilidade da impugnante não merecia credibilidade, as quais se reconduzem a: (i) omissão de compras e vendas; (ii) lançamentos financeiros não justificados; (iii) conta “Caixa” com um saldo credor em diversos momentos dos exercícios inspecionados; (iv) suprimentos não suportados em documentos idóneos…também explanou os motivos pelos quais estas irregularidades na contabilidade da impugnante impossibilitaram a comprovação e quantificação da matéria tributável, tendo sido necessário o recurso a métodos indiretos…De igual modo…enunciou e especificou os critérios de quantificação da matéria coletável em termos suficientes, precisos e sem qualquer obscuridade.” (o sublinhado é nosso).
E. No que à fase da quantificação concerne, conclui a Mma Juíza a quo (que não vislumbra irregularidades na fase da qualificação), que “quanto à premissa utilizada para apurar o valor de realização – considerar que os montantes supostamente contabilizados como suprimentos dos sócios correspondem, na realidade, a vendas omitidas e, como tal, valor de realização – e que constitui um elemento essencial no apuramento da matéria tributável, a Administração Tributária não apresentou qualquer justificação.”
F. Atente-se, contudo, nos pontos 2.2 a 2.6 do item IV do relatório inspetivo (págs. 7/11 a 8/11 do dito, transcritos, alias, a fls. 10 e 11 da sentença aqui em apreço), nos quais se descreve pormenorizadamente como era artificiosamente movimentada a conta de caixa para obstar à existência de saldos credores; ou seja, a contabilidade da impugnante apenas revela a transferência de determinadas quantias (origem) mas não se faz prova da natureza dessas quantias, o que, aliado à envolvente do caso concreto em que está assente que houve efetivamente omissão de proveitos, afasta qualquer fundada dúvida sobre a quantificação.
G. Poderia (e devia) a impugnante ter aproveitado para carrear matéria que permitisse melhorar o procedimento utilizado pela AT no projeto de relatório, fornecendo quaisquer outros dados que permitissem recurso a melhor métodos ou critério para atingir o objetivo da determinação da matéria tributável, provando eventual excesso na respetiva quantificação bem como outras ocorrências relevantes, mas, tendo tido essa oportunidade para o fazer, não parece tê-lo feito cabalmente nem da melhor forma:
- não exerceu o direito de audição;
- em sede de pedido de revisão da matéria tributável (Doc. 5 junto com a PI) e sem acrescentar qualquer prova documental, limita-se a afirmar que os suprimentos estão bem documentados (2003) e que os documentos em substância revelam a verdade material, de empréstimos de sócios à sociedade (2004);
- juntou à PI o doc. nº 6 (entrada de caixa € 16500,00, valor entregue pelos sócios para reforço de tesouraria); contudo, como bem se faz notar na sentença aqui em apreço (fls. 27) “a impugnante não comprova que as quantias contabilizadas como suprimentos tenham sido efetivamente efetuadas, já que os documentos onde a impugnante alicerça a prova desses suprimentos [apenas junta um documento interno – folha de caixa e apenas relativamente aos efetuados no exercício de 2003], bem como a prova testemunhal não permitem aferir da veracidade desses suprimentos.”
H. Assim, o itinerário cognoscitivo e valorativo percorrido pela AT neste assunto afigura-se, na generalidade e na circunstância, como consequência lógica, necessária, coerente e pertinente, pese embora melhorável.
I. Não desconhece a Fazenda Pública o princípio da livre apreciação da prova, de acordo com o qual o Tribunal baseia a sua decisão, em relação às provas produzidas, na sua íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a sua experiência de vida e de conhecimento das pessoas (cfr. art. 607º, nº 5, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6);
J. Não podemos esquecer, contudo, que o contribuinte teria o ónus de provar a inexistência dos pressupostos legais para a tributação por métodos indiciários ou que a realidade é completamente distinta do resultado a que conduziu a utilização das regras apontadas pela fiscalização, que o critério utilizado é ostensivamente desadequado e/ou inadmissível, que houve erro ou manifesto excesso na matéria tributável quantificada.
K. No caso dos autos a Impugnante não questiona o critério de quantificação utilizado; limitando-se a insistir que os sócios fizeram suprimento à impugnante, destinando-se tais suprimentos a suprir as dificuldades financeiras da dita.
L. Da prova testemunhal produzida ressalta terem sido efetuadas várias entradas em dinheiro na conta caixa sem qualquer justificação, senão os designados suprimentos; não sendo possível aferir da veracidade de tais suprimentos, como se retira de fls. 27 da sentença aqui em apreço.
M. Não se mostram igualmente registados na contabilidade nem tão pouco foram demonstrados acontecimentos relevantes a ponto de justificar uma acorrência de suprimentos à impugnante. Daí que a premissa de partida da AT se revele, atentas as particulares circunstâncias do caso, perfeitamente coerente com as regras da experiência comum: se entrou dinheiro na empresa (entradas concretamente reveladas na contra caixa), nada mais razoável do que assumi-lo como procedente da atividade efetivamente por esta exercida (compra e venda de veículos), mormente se tivermos presente o único documento apresentado pela impugnante para suporte da contabilização dos ditos suprimentos.
N. Contudo, ainda que assumindo um valor de realização (com IVA incluído) coincidente com o dos alegados suprimentos, sempre teria a AT que alcançar (ainda que por métodos indiretos) o valor do proveito omitido, o que faz aplicando ao valor de realização (expurgado do IVA) o rácio da margem bruta da venda de mercadorias da impugnante para os exercícios em questão.
O. Como se escreveu no Ac. do STA de 19/11/2014, P. 0407/12 “não pode perder-se de vista que a quantificação por presunção é imputável exclusivamente ao contribuinte, que se queria ser tributado pelo lucro real, deveria ter cumprido com as obrigações que sobre ele recaíam.” Assim sendo, in casu, o que cabia também provar no âmbito do excesso na quantificação é que aqueles valores correspondiam efetivamente a suprimentos e para além disso, que tais valores estavam corretamente inscritos na contabilidade enquanto suprimentos de tal modo que a AT tinha perfeito conhecimento daqueles valores e da sua origem, e nessa medida, poderia e deveria ter sido considerado pela AT e excluído do cálculo.
P. Também teria razão a Impugnante se em sede de comissão de revisão tivesse feito prova do excesso da quantificação e a AT não quisesse corrigir o apuramento da matéria coletável, passando a ser-lhe imputável tal erro.
Q. Na verdade, a avaliação indireta tem ínsita o apuramento de um valor que não corresponde exatamente à realidade, é aproximado, pois é apurado indiretamente. Assim sendo, o excesso na quantificação tem de ser um excesso relevante, dada a natureza aproximada daquela quantificação, e aferido casuisticamente.
R. Escreveu-se no Acórdão do STA de 16/11/2011, P. 0247/11: “É sabido que na quantificação por métodos indirectos – à qual a AT só pode recorrer na impossibilidade de determinar directamente a matéria tributável – há sempre dúvidas quanto ao resultado alcançado, pois apesar de também aqueles visarem a quantificação real, assentam em «indicadores que apenas podem fornecer uma indicação aproximada do valor que a matéria tributável provavelmente teria» (Cfr. JORGE LOPES DE SOUSA, Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado, Áreas Editora, 6.ª edição, volume II, anotação 6 ao art. 100.º, pág. 137.) Assim, para pôr em causa a quantificação da matéria tributável a que a AT chegou com recurso a métodos indirectos não basta ao sujeito passivo suscitar dúvidas quanto ao resultado obtido, antes se lhe impondo que demonstre a inadequação ou errada aplicação dos critérios de quantificação utilizados.”
Termos em que, dando provimento ao presente recurso, deverá a sentença recorrida ser substituída por outra, totalmente improcedente, com as legais consequências.
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A Recorrida não apresentou contra-alegações.
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O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de dever ser concedido provimento ao recurso.
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Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
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II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que importa apreciar se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento, na parte em que decidiu que a Administração Tributária não demonstrou as razões que a levaram a quantificar a matéria tributável com recurso a métodos indirectos, designadamente no que concerne ao critério de quantificação.

III. Fundamentação
1. Matéria de facto

Na sentença prolatada em primeira instância foi proferida decisão da matéria de facto com o seguinte teor:
“Com relevância para a decisão a proferir nos presentes autos consideram-se provados os seguintes factos:
A) A impugnante foi objeto de uma ação de inspeção, levada a cabo pelos Serviços de Inspeção Tributária da Direção de Finanças de Viseu, com base na ordem de serviço n.º OI200600496, de âmbito parcial (IRC e IVA), que incidiu sobre os anos de 2003 e 2004 – cfr. fls. 4 do processo administrativo apenso aos autos.
B) Através do ofício n.º 927, de 19/01/2007, foi a impugnante notificada do projeto de relatório da inspeção tributária e para, querendo, exercer o direito de audição. – cfr. fls. 2 e 14 do processo administrativo apenso aos autos; facto não controvertido.
C) Em 02/02/2007 foi elaborado o relatório de inspeção tributária que consta de fls. 3/14 do processo administrativo apenso aos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido, do qual se destaca o seguinte:
[…]
- imagens omissas -
D) As conclusões do relatório de inspeção tributária foram sancionadas superiormente. – cfr. fls. 3 frente e verso do processo administrativo apenso aos autos.
E) Através do ofício n.º 2932, de 08/02/2007, remetido por carta registada, foi a impugnante notificada do relatório de inspeção tributária, da fixação da matéria tributável, por métodos indiretos, bem como para, querendo, solicitar a revisão da matéria tributável, nos termos do artigo 91.º da LGT. – cfr. fls. 26/29 do processo administrativo apenso aos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
F) A impugnante apresentou pedido de revisão da matéria tributável nos termos constantes de fls. 37/40 do processo administrativo apenso aos autos, cujo teor se tem por reproduzido.
G) Em 11/04/2007, teve lugar a reunião dos peritos do sujeito passivo e da Fazenda Pública, tendo sido lavrada a ata n.º 05/07, constante de fls. 42/43 do processo administrativo apenso aos autos, da qual consta:
[…]
- imagem omissa -
H) Em 12/04/2007, o Sr. Diretor de Finanças de Viseu proferiu decisão com o seguinte teor:

- cfr. fls. 41 do processo administrativo apenso aos autos.
I) Na sequência da ação inspetiva, foram emitidos os seguintes atos de liquidação:
a. Liquidação n.º 2007 8310002353, relativa a IRC do ano de 2003, com imposto a pagar no valor de 360,49 €, derrama no valor de 186,05 € e juros compensatórios no valor de 58,51 €;
b. Liquidação n.º 2007 8310002362, relativa a IRC do ano de 2004, com imposto a pagar no valor de 2.275,76 €, derrama no valor de 361,67 € e juros compensatórios, no valor de 182,20 €. – cfr. fls. 24/28 dos autos.
Factos não provados
Não se provaram quaisquer outros factos com relevo para a decisão da causa, nomeadamente os vertidos nos artigos 6.º, 10.º, 11.º, 27.º, 28.º, 29.º, 30.º, 33.º, 35.º, 40.º e 48.º da petição inicial.
Motivação da matéria de facto
A convicção do Tribunal alicerçou-se na análise crítica do teor dos documentos constantes dos autos, cujo teor se dá integralmente por reproduzido, tudo conforme se encontra especificado em cada um dos pontos do probatório.
Para a formação da convicção do Tribunal também contribuiu o depoimento isento e credível da testemunha Vanda Sofia Abreu Ferreira, Inspetora Tributária, que levou a cabo o procedimento inspetivo e que, no essencial, relatou o que constava do relatório de inspeção tributária que faz parte do processo administrativo apenso aos autos.
Concretamente, sobre o modus operandi dos Serviços de Inspeção, referiu que, através da informação fornecida pela S…, S.A., e após contacto com os donos das viaturas e análise dos contratos de financiamento celebrados com a locadora, apuraram que, apesar de a impugnante figurar como fornecedora da viatura Volkswagen, modelo Golf, matrícula UN, a mesma não se encontrava registada na respetiva contabilidade.
E, relativamente à viatura Renault, modelo Espace, matrícula RC, através das declarações prestadas por A…, de acordo com o qual vendeu a referida viatura à impugnante, verificaram igualmente que a realização da transação não se encontrava evidenciada na contabilidade do sujeito passivo.
Confrontada com o documento de fls. 29 dos autos [venda a dinheiro n.º 660, emitida a F…], afirmou que do mesmo não consta a matrícula da viatura, o que inviabiliza que se estabeleça qualquer conexão com a viatura com matrícula UN.
Esclareceu que todas as situações de viaturas à consignação se mostravam claramente evidenciadas na contabilidade da impugnante, não sendo esse o caso das viaturas em questão.
Realçou ainda que apenas relativamente a essas viaturas nas quais foi impossível apurar o preço de venda ou de compra foram aplicados os métodos indiretos.
Mais referiu que foram efetuadas várias entradas em dinheiro na conta Caixa sem justificação e que os suprimentos foram utilizados para colmatar essas falhas.
Confrontada com o documento de fls. 36 [entrada de caixa], disse tratar-se de um mero documento interno, que nem sequer se encontra assinado pelos sócios e pela gerência e que não permite comprovar a proveniência do dinheiro.
Vejamos agora os depoimentos das testemunhas oferecidas pela impugnante.
A testemunha Jorge Santos Marques, técnico oficial de contas no gabinete de contabilidade que prestou serviços à impugnante, quando questionado sobre a atividade da sociedade, referiu que, nalgumas situações, a empresa empolava os valores de financiamento em relação ao valor real da venda, o que era prática corrente naquela altura.
Explicou que empolava-se o pedido na fatura pró-forma, de forma a obter um financiamento superior. No entanto, a verdade é que a impugnante não juntou aos autos qualquer fatura pró-forma, sendo certo que do relatório de inspeção tributária não resulta que fosse esse o procedimento adotado na contabilidade da impugnante.
Mais disse que noutras situações as viaturas eram colocadas à consignação no stand da impugnante, em troca de uma comissão de intermediação, pelo que não constava da contabilidade qualquer documento emitido pela venda das viaturas, mas apenas um documento respeitante à comissão pela angariação.
Relativamente à viatura de marca Volkswagen, Golf, referiu que a impugnante apenas interveio como intermediária, tendo emitido a venda a dinheiro n.º 660. No entanto, a instância da Fazenda Pública reconheceu que teve conhecimento desse facto, quando, na qualidade de perito nomeado no âmbito do procedimento de revisão da matéria tributável, foi verificar as existências da sociedade impugnante e constatou que que a viatura não constava das mesmas.
Quanto à viatura Mercedes Benz, disse que o negócio não se chegou a concretizar pelo que a impugnante emitiu o cheque de reembolso ao cliente.
Afirmou ainda que os sócios efetuaram empréstimos à sociedade para financiar a aquisição de viaturas e que regularizaram a situação através do documento constante de fls. 36 dos autos, com o qual foi confrontado.
Confrontado com o documento de fls. 29 dos autos [venda a dinheiro n.º 660] admitiu que não é possível relacioná-lo com a venda e o contrato de financiamento referentes ao veículo de marca Volkswagen.
A testemunha Maria do Patrocínio da Costa Martins, técnica oficial de contas no gabinete de contabilidade que presta serviços à impugnante confirmou que, por vezes, era preciso empolar o valor dos créditos, porque os clientes não dispunham da totalidade do preço de venda e, naquela altura, as financeiras não financiavam a 100%.
Mais referiu que algumas viaturas iam para o stand à consignação e caso fossem vendidas na contabilidade era registada a venda a dinheiro relativa à comissão recebida pelo serviço de angariação.
Acrescentou ainda que, por vezes, os sócios tinham de fazer empréstimos à sociedade para financiar a aquisição de viaturas e quando houvesse saldo suficiente era feito o reembolso. No entanto, não identifica essas viaturas, ao que acresce o facto de não concretizar minimamente as datas dos suprimentos supostamente realizados no exercício de 2004.
O Tribunal não valorou positivamente os depoimentos das testemunhas Jorge Santos Marques e Maria do Patrocínio da Costa Martins, porquanto, como, aliás, as próprias reconhecem, o seu conhecimento dos factos decorre, essencialmente, do manuseamento e lançamento dos documentos que lhe eram apresentados e do que lhe era relatado pelos sócios gerentes da impugnante, não revelando conhecimento direto e concreto da factualidade atinente às transações das viaturas.
A testemunha A…, vendedor de automóveis, referiu que colocou à consignação alguns veículos de retomas no stand da impugnante.
Mais disse que em 2003 e 2004 as instituições financeiras financiavam a aquisição a 100% (o que vem contrariar a tese sustentada pela impugnante de que nesses anos as locadoras financeiras não financiavam a totalidade do preço de aquisição das viaturas), mas que era mais obter a aprovação com um valor de entrada, e que, por vezes, aproveitava-se o crédito para outros fins.
A instância da Fazenda Pública afirmou que normalmente as instituições financeiras exigiam do stand fornecedor do bem uma fatura pró-forma.
Quanto à comissão alegadamente paga pela transação da viatura Volkswagen Golf disse nada saber.
Por último, a testemunha F…, amigo dos sócios da impugnante, questionado sobre a transação da viatura de marca Renault Espace, referiu que A…, seu primo, tentou vender-lhe a viatura, mas como não estava interessado, endereçou-o para o stand da impugnante.
Acrescentou que não teve conhecimento de que a impugnante tivesse adquirido a viatura em questão.
Relativamente à viatura Volkswagen Golf, referiu que encaminhou o seu irmão David Gonçalo Cardoso Ferreira para a sociedade impugnante, que interveio como intermediária. Todavia, apesar de a venda a dinheiro n.º 660 ter sido emitida em seu nome, a verdade é que limitou-se a referir que apenas sabia que a comissão paga foi de 1.000,00 €, nada mais acrescentando.
Ora, para além de o referido documento não fazer qualquer menção à mencionada viatura, não se alcançam as razões pelas quais o mesmo foi emitido a favor de um terceiro, no caso a testemunha F…, não interveniente no alegado negócio de intermediação. Tão pouco a testemunha as esclarece minimamente.
Assim, o depoimento desta testemunha revelou-se vago e impreciso, denotando mesmo algumas incongruências, pelo que não foi valorado positivamente.
Por outro lado, confrontando os depoimentos destas testemunhas com o da Sra. Inspetora, o Tribunal conclui que aqueles não se revelam consentâneos com os factos apurados nos autos, bem como com as regras de experiência.
Com efeito, à luz das regras da experiência, revela-se pouco plausível que um agente económico que tem em vista a obtenção do lucro conceda um empréstimo de determinado valor para financiar a compra de um bem cujo valor de mercado não atinja esse montante, sendo certo que é esse bem que constitui a garantia de pagamento do crédito.
De facto, concretamente quanto às correções descritas no capítulo III, 1.2 do relatório de inspeção, as declarações juntas pela impugnante já no âmbito da presente impugnação judicial, tendo em vista demonstrar que as propostas de financiamento eram efetuadas por montante superior ao preço da venda negociado, bem como os depoimentos das testemunhas são insuficientes para rebater a factualidade apurada no âmbito do procedimento inspetivo.
De igual modo, a prova documental e testemunhal produzida nos autos revelou-se manifestamente insuficiente para infirmar a conclusão extraída pela Administração Tributária, de acordo com a qual a contabilidade da impugnante não reflete a sua verdadeira situação tributária e que se mostra inviável o apuramento direto e exato da matéria tributável.”

2. O Direito

Como veremos, a fundamentação adoptada pela Administração Tributária é basilar no acto de determinação da matéria tributável por métodos indirectos – cfr. artigo 77.º, n.º 4 da Lei Geral Tributária (LGT).
O recurso dirige-se à decisão de parcial procedência da impugnação judicial, somente na parte desfavorável à Administração Tributária, considerando que esta não demonstrou as razões que a levaram a quantificar a matéria tributável partindo de uma determinada premissa escolhida, concluindo que o critério utilizado não estava materialmente fundamentado.
Na sentença sob recurso, após indagar junto do relatório de inspecção a fundamentação invocada pela Administração Tributária para proceder às correcções, agora impugnadas, por métodos indirectos, concluiu-se: “(…) Assim, nesta fase, compete à Administração Tributária indicar os critérios utilizados na determinação da matéria tributável por métodos indiciários, os quais deverão assentar em dados objetivos, racionais e fundamentados, ou seja, em dados aptos a inferir os factos tributários, e não meras hipóteses, suspeitas ou suposições.
Deste modo, o ónus que impende sobre a Administração Tributária não se queda pela demonstração de que se verificam os pressupostos legais para o recurso aos métodos indiretos, antes exige que fundamente, adequada e casuisticamente, os critérios que sustentam a quantificação da matéria tributável.
No entanto, não basta que a Administração Tributária se limite a indicar o critério utilizado, assim fundamentando formalmente a sua atuação, impondo-se-lhe igualmente que demonstre que o critério adotado constitui uma forma válida de aproximação à realidade.
Ora, os critérios utilizados pela Administração Tributária na quantificação da matéria tributável, em sede de IRC, do ano de 2003, foram os seguintes: (…)
Por sua vez, no que concerne ao ano de 2004, os critérios de quantificação da matéria tributável, em sede de IRC, consistiram nos seguintes: (…)
Afigura-se-nos que quanto à premissa utilizada para apurar o valor de realização - considerar que os montantes supostamente contabilizados como suprimentos dos sócios correspondem, na realidade, a vendas omitidas e, como tal, valor de realização – e que constitui um elemento essencial no apuramento da matéria tributável, a Administração Tributária não apresenta qualquer justificação.
Com efeito, a Administração Tributária não indica os motivos que a levaram a concluir que o valor das vendas omitidas [valor de realização] era de valor igual ao somatório dos suprimentos.
Trata-se, na verdade, de um mero juízo conclusivo, desprovido de qualquer suporte factual, sendo que a Administração Tributária não esclarece suficientemente as razões que a levaram a extrair aquela conclusão, muito menos com a amplitude que lhe foi dada.
Fica-se, portanto, sem se saber por que razões, a Administração Tributária considerou adequado para calcular o volume global dos proveitos omitidos em cada um dos exercícios inspecionados, considerar os montantes dos suprimentos contabilizados como vendas omitidas [valor de realização] e aplicar-lhes o rácio da margem bruta de vendas de mercadorias do sujeito passivo em cada um dos anos em questão para obter os respetivos valores de aquisição. (…)
Em suma, a Administração Tributária não demonstra as razões que a levaram a quantificar a matéria tributável partindo daquela premissa, pelo que não se pode ter o critério utilizado como materialmente fundamentado.
Pelas razões explanadas, impõe-se concluir pela ilegalidade da quantificação da matéria tributável operada pela Administração Tributária e, consequentemente, das liquidações impugnadas, na parte em que se encontrem influenciadas por aquela, ficando, assim, prejudicado o conhecimento da questão atinente à alegada falta de notificação para o exercício do direito de audição antes da decisão de aplicação de métodos indiretos [cfr. artigo 608.º, n.º 2 do CPC, ex vi artigo 2.º, alínea e) do CPPT]. (…)”

A matéria tributável, regra geral, é determinada directamente e com base nos elementos legalmente exigíveis e que o contribuinte tem de fornecer à administração tributária, uma vez que impende sobre os contribuintes obrigações acessórias de apresentação de declarações e de exibição da contabilidade ou escrita.
Nos termos do artigo 75.º, n.º 1 da LGT “Presumem-se verdadeiras e de boa fé as declarações dos contribuintes apresentadas nos termos previstos na lei, bem como os dados e apuramentos inscritos na sua contabilidade ou escrita, quando estas estiverem organizadas de acordo com a legislação comercial e fiscal”.
A presunção de veracidade das declarações dos contribuintes cessa, de acordo com os condicionalismos legais tipificados no n.º 2 do artigo 75.º, entre outros, se a contabilidade revelar omissões, erros, inexactidões ou indícios fundados de aquelas não reflectem ou impedem o conhecimento da matéria tributável real do sujeito passivo.
No caso de, por qualquer das razões previstas na lei, a presunção consagrada no artigo 75.º, n.º 1 da LGT deixar de funcionar, a administração tributária fica legitimada a efectuar a determinação da matéria tributável, com recurso para o efeito e preferencialmente de métodos directos ou, quando tal não seja possível, a métodos indirectos.
Assim, e de acordo com o ínsito no artigo 81.º, n.º 1 da LGT, o recurso a métodos indirectos é excepcional, sendo sempre subsidiária da avaliação directa, de acordo com o artigo 85.º, também da LGT.
Daí também que o legislador tenha estabelecido uma acrescida exigência de fundamentação da decisão administrativa que determine o recurso a esse método de avaliação (cfr. artigo 77.º, n.º 4 da LGT).
Em suma, o recurso a presunções ou métodos indirectos só é legitimado quando não existirem elementos que permitam apurar directamente o imposto, sendo patente a preocupação do legislador em objectivar as situações em que a matéria colectável pode ser fixada através dos denominados métodos indirectos e, portanto, o recurso a estes métodos depende da verificação dos respectivos pressupostos legais.
Por outro lado, compete à administração tributária demonstrar a verificação dos pressupostos legais que permitem a tributação por métodos indirectos, demonstrando nomeadamente que a liquidação não pode assentar nos elementos fornecidos pelo contribuinte e que o recurso àquele método se tornou a única forma de calcular o imposto, externando os elementos que a levaram a concluir nesse sentido e, feita essa prova, recai sobre o contribuinte o ónus de demonstrar que aqueles pressupostos não se verificam ou que, verificando-se, houve erro ou excesso na quantificação (artigo 74.º, n.º 3 da LGT). – cfr., nestes precisos termos, o Acórdão deste TCAN, de 27/11/2014, proferido no âmbito do processo n.º 255/05.4 BEBRG.
Da leitura dos artigos 85.º, 87.º e 88.º da LGT decorre de modo manifesto que os métodos indirectos só podem aplicar-se quando seja impossível proceder à determinação da matéria colectável de modo directo e exacto, nomeadamente através de correcções meramente aritméticas.
Dito por outras palavras, a Fazenda Pública, para além de demonstrar, fundamentando, a necessidade de determinação pelos métodos indirectos da matéria tributável, ao nível dos seus pressupostos, tem ainda que fundamentar os critérios utilizados na quantificação do valor tributável.
Cabe, assim, à Administração Tributária o ónus de provar os pressupostos da tributação por métodos indirectos, demonstrando que a liquidação não pode assentar nos elementos fornecidos pelo contribuinte e que o recurso àquele método se tornou a única forma de calcular o imposto, externando os elementos que a levaram a concluir nesse sentido. Bem como lhe cabe o ónus de indicar e fundamentar os critérios utilizados na determinação da matéria tributável por métodos indirectos, fazendo assentar o volume da matéria colectável presumida em dados objectivos, racionais e fundamentados, aptos a inferir os factos tributários, não em meras suspeitas ou suposições.
Com efeito, tendo a determinação da matéria tributável por métodos indirectos de ser feita por aproximação à realidade que se procura apurar, é necessário que se demonstre que teve por suporte elementos de facto possíveis e prováveis, extraídos de parâmetros adequados à situação. Por isso, a Administração Tributária tem de utilizar elementos de facto conhecidos que, segundo as regras da experiência, pautadas por critérios de razoabilidade e de normalidade, conduzam à extrapolação dos factos desconhecidos ou à aproximação da realidade que se procura alcançar.
Não conseguindo fazer essa prova, a questão relativa à legalidade do seu agir terá de ser resolvida contra ela.
Uma vez cumprido esse ónus, caberá, então, àquele a quem o método é oposto o ónus probandi de que a realidade é completamente distinta do resultado a que conduziu a utilização das mencionadas regras, que o critério utilizado é ostensivamente desadequado e/ou inadmissível, que houve erro ou manifesto excesso na matéria tributável quantificada.
Esta é, pois, a solução que corresponde à regra geral contida no artigo 342.º do Código Civil, segundo a qual quem invoca um direito tem o ónus de prova dos factos constitutivos, cabendo à contraparte a prova dos factos impeditivos, modificativos ou extintivos. [veja-se, por todos, nestes precisos termos, o Acórdão deste TCAN de 23/02/2006, proferido no âmbito do processo n.º 00437/04]
Importará, por fim, sublinhar que o direito à fundamentação, e o correspectivo dever por parte da Administração decorre do n.º 3 do artigo 268.º da Constituição da República Portuguesa: “Os actos administrativos estão sujeitos a notificação aos interessados, na forma prevista na lei, e carecem de fundamentação expressa e acessível quando afectem direitos ou interesses legalmente protegidos”. Por sua vez, também nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 77.º da LGT, “A decisão de procedimento é sempre fundamentada por meio de sucinta exposição das razões de facto e de direito que a motivaram, podendo a fundamentação consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, incluindo as que integrem o relatório de fiscalização tributária”. E, especificamente, quanto à tributação por métodos indiciários, o n.º 4 do mesmo artigo 77.º, referia que “A decisão da tributação por métodos indirectos, nos casos e com os fundamentos previstos na presente lei, especificará os motivos da impossibilidade da comprovação e quantificação directas e exacta da matéria tributável (…) e indicará os critérios utilizados na sua determinação”.
Como a jurisprudência tem vindo a afirmar, o regime jurídico da fundamentação dos actos administrativos visa, entre outros objectivos que ora não importa considerar (referimo-nos às finalidades endógenas, que visam garantir que os agentes ponderaram de forma cuidada toda a problemática envolvente, incluindo as próprias definições legais), o do perfeito esclarecimento dos administrados sobre o iter cognoscitivo e valorativo seguido pela Administração, dando-lhes a saber quais os motivos, as razões por que se pratica um acto, em ordem a permitir-lhes optar entre a aceitação da sua legalidade ou a reacção graciosa ou contenciosa contra o mesmo. Assim, para aferir do cumprimento do dever de fundamentação, costuma usar-se um critério prático, que consiste em saber se um destinatário normal, face ao itinerário cognoscitivo e valorativo externado como fundamentação do acto em causa, fica em condições de conhecer o motivo por que se decidiu num certo sentido e não noutro qualquer, de modo a, em consciência, poder optar entre a aceitação do acto e a sua impugnação.
Importa não esquecer que a fundamentação é um conceito relativo, variando em função do tipo concreto do acto e das circunstâncias em que o mesmo foi praticado, e que o grau de fundamentação exigível deverá estar directamente relacionado com o grau de litigiosidade existente, isto é, com a divergência existente entre a posição da Administração Tributária e a do contribuinte. (Veja-se, entre outros, nestes precisos termos, o Acórdão do STA, de 19/11/2014, proferido no âmbito do processo n.º 0407/12)

Tendo presente o acabado de expor, ressalta que a fundamentação adoptada pela Administração Tributária, e os motivos pelos quais considera legalmente justificado o recurso aos métodos indirectos de tributação e respectiva quantificação, se condensaram no despacho do Exmo. Director de Finanças de Viseu, por a liquidação impugnada assentar num acto emanado no procedimento de revisão, mais propriamente, na decisão do Exmo. Director de Finanças, de 12/04/2007, acta n.º 05/07 – cfr. alíneas G) e H) do probatório. Logo, será este o acto que cumpre analisar.
Todavia, como referido supra, a sentença, para concluir pela falta de fundamentação do critério utilizado para quantificar a matéria tributável por recurso aos métodos indirectos apreciou, apenas, o relatório inspectivo sem ponderar e relevar, como devia, o despacho do Director de Finanças, acto que esteve na origem da liquidação. E analisado o dito despacho de indeferimento do pedido de procedimento de revisão, constata-se que tal acto não faz qualquer alusão aos factos descritos em sede de procedimento de revisão nem tão pouco apela ao que consta do relatório, não explicando o itinerário cognoscitivo que levou à conclusão ali constante. Releia-se o ali decidido e que se encontra transcrito no ponto 6 dos factos dados como provados “Nos termos do nº 6 do art.92º da Lei Geral Tributária, cumpre ao órgão competente para a fixação da matéria tributável resolver, na falta de acordo entre os peritos.
Assim, considerando que o perito da Administração Tributária defende a manutenção dos valores objecto do pedido de revisão e o perito do contribuinte, sem nada de novo trazer à discussão, defende a manutenção dos valores inicialmente declarados pelo contribuinte, Decido, por falta de elementos, que, nesta fase, os ponham em causa, manter os valores fixados, aqui, em discussão.”
E, como já apreciado por este TCA Norte, no aresto de 07/12/2016, proferido no processo n.º 1206/07.7BEVIS “(…) a decisão em apreço é um exemplo daquilo que uma fundamentação mais exigente não pode ser, pois que, limita-se a constatar a posição dos peritos, não procedendo a qualquer discussão da realidade em apreço no sentido de justificar a manutenção dos valores em causa, não existindo qualquer remissão para o RIT, nem sequer qualquer referência a este elemento, o que significa que a AT não deu a conhecer à Recorrente os elementos que enquadram a sua decisão nesta sede, impedindo assim a Recorrente de aceitar tal decisão, conformando-se com a mesma, ou de contra a mesma reagir, discutindo o seu alcance.”
Assim, encontrando-se o Despacho supra transcrito despojado de qualquer matéria factual, não remetendo sequer para o conteúdo do relatório da Inspecção Tributária, não nos permite descortinar qualquer conteúdo fundamentador, quer quanto aos pressupostos de aplicação do método indirecto, quer em matéria de quantificação da matéria tributável, pelo que padece o mesmo de manifesta falta de fundamentação – cfr., entre outras decisões deste TCAN no mesmo sentido, o Acórdão, de 08/02/2018, proferido no âmbito do processo n.º 550/10.0BEVIS.
Face ao supra decidido, impõe-se, desde já, manter a sentença recorrida com a presente fundamentação, negando-se provimento ao recurso.

Conclusões/Sumário

I - Em caso de determinação da matéria tributável por métodos indirectos, compete à administração tributária o ónus da prova da verificação dos pressupostos da sua aplicação, cabendo ao sujeito passivo o ónus da prova do excesso na respectiva quantificação (artigo 74.º, n.º 3 da LGT).
II - No domínio de utilização de métodos indirectos, a actuação da Administração Tributária não se limita à demonstração da ocorrência dos respectivos pressupostos, antes se lhe impõe que fundamente, ainda e também, os critérios de que venha a lançar mão na quantificação da matéria tributável.
III – Assentando a liquidação impugnada num acto emanado no procedimento de revisão, mais propriamente, na decisão do respectivo Director de Finanças, é nesse acto final que se deve colher a fundamentação adoptada pela Administração Tributária.

IV. Decisão

Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte, em negar provimento ao recurso.
Custas a cargo da Recorrente, nos termos da tabela I-B – cfr. artigos 6.º, n.º 2, 7.º, n.º 2 e 12.º, n.º 2 do Regulamento das Custas Processuais.
Porto, 26 de Abril de 2018
Ass. Ana Patrocínio
Ass. Ana Paula Santos
Ass. Pedro Vergueiro