Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01287/13.4BEPRT
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:03/27/2014
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Nuno Filipe Morgado Teixeira Bastos
Descritores:DERROGAÇÃO DO SIGILO BANCÁRIO; SIGILO PROFISSIONAL; ADVOGADO
Sumário:1. Em caso de oposição o contribuinte à consulta de elementos bancários invocando segredo profissional, não está em causa apenas a proteção do segredo bancário, pelo que o acesso à informação bancária respetiva não pode fazer-se nos termos do artigo 63.º-B da Lei Geral Tributária – cfr. n.º 3 do artigo 63.º da mesma Lei.
2. Em tal caso, deve a administração tributária requerer ao tribunal competente a autorização de acesso à informação bancária nos termos dos n.ºs 2 e 6 do artigo 63.º da Lei Geral Tributária.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:Diretor Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira
Recorrido 1:L... e outra
Decisão:Negado provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

1. Relatório

1.1. O Diretor-Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira recorre da douta sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto que concedeu provimento ao recurso da decisão que determinou o acesso direto da administração tributária a todas as contas e documentos bancários relativos ao ano de 2010 e de que fossem titulares L..., n.i.f. 1… e M..., n.i.f. 1…, com domicílio indicado na Rua…, n.º …, r/c dt.º, 4100-244 Porto.

A rematar as respetivas alegações, formulou as conclusões que a seguir se transcrevem:

«…CONCLUSÕES

I - O presente recurso é deduzido contra a douta sentença proferida em 1ª instância pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, que julgou procedente o recurso interposto contra a decisão do Diretor-Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira, de derrogação de sigilo bancário, efetuado ao abrigo do artigo 63°-B, n° 1 alínea c) da Lei Geral Tributária.

II - Considerando que a mesma incorreu em erro de julgamento no que respeita á apreciação da matéria de facto e aplicação do direito.

III - A Administração Tributária não pretende ter acesso a qualquer informação protegida pelo segredo profissional a que o recorrente, sujeito passivo A, se encontra obrigado, dado que não pretende aceder diretamente a todas as contas e documentos bancários da sociedade de advogados com a denominação social P..., NIPC 5….

IV - Porquanto o declarado pelo recorrente, sujeito passivo A, para efeitos de IRS do ano de 2010, em que o rendimento global de 29 650,00 euros, conforme declaração modelo 3 de IRS de 2010, no seu anexo D (posteriormente de 29 750,00, em virtude de entrega de declaração de substituição) foi imputado ao Sp A pela sociedade de advogados da qual é sócio que como sociedade que é possui obrigatoriamente, entre outros requisitos, conta (s) bancária (s) e todo o registo de movimentos nomeadamente entradas e saídas de valores monetários respeitantes à atividade desenvolvida.

V - Conta (5) essa (s) que decerto refletirão informações respeitantes aos clientes dessa mesma sociedade, da qual o recorrente sujeito passivo A, é sócio e cujos rendimentos declarados para efeitos de IRS dela provieram e dos quais este, como advogado, se encontra abrangido e é obrigado a guardar sigilo profissional, nos exatos termos do artigo 87° do EOA.

VI - A ser como se deu por concluído na douta sentença ora recorrida, bastaria o facto de se ser advogado e deduzir oposição ao acesso às suas contas bancárias, referindo apenas genericamente que estas se encontram abrangidas pelo sigilo profissional, para se concluir que todas e quaisquer contas ou documentos bancários a este pertencentes, se encontra por aquele abrangidos.

VII - Notificado que foi o recorrente, sujeito passivo A, pelo Tribunal, para vir esclarecer se detém conta bancária associada à sua atividade profissional, este veio dizer ser cotitular de uma conta bancária afeta à sua atividade profissional de advogado, mas não identificou a mencionada conta, havendo portanto uma manifesta falta de sustentação da questão do segredo profissional, arguida pelo sujeito passivo A.

VIII - Analisados os elementos fáticos que suportaram a decisão de derrogação de sigilo bancário, verifica-se, por exemplo, que estão em causa valores monetários respeitantes a aquisição de imóvel pelos sujeitos passivos A e B e suprimentos respeitantes a uma sociedade, onde o sujeito passivo A é sócio-gerente, elementos estes que não se encontram relacionados com o exercício da advocacia, pelo que se não pode concluir ser inevitável que na situação dos autos a matéria investigada poder estar abrangida pelo segredo profissional.

IX - Verifica-se assim que a informação pretendida, in casu, não se encontra protegida pelo segredo profissional, dado que essa encontra-se numa ou várias contas bancárias pertencentes a uma sociedade e sobre essa ou essas contas a Administração Tributária não lançou mão da simples derrogação administrativa.

Nestes termos e nos demais de direito que V. Exa. doutamente suprirá, deve ser dado provimento ao presente recurso, revogando a decisão do tribunal a quo, com todas as legais consequências, assim se fazendo a Sã, Serena e Costumada Justiça.».

1.2. O recurso assim interposto foi admitido com subida imediata, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.

Não foram apresentadas contra-alegações.

A Exmª Sr.ª Procuradora-Geral adjunta teve vista dos autos e lavrou douto parecer, onde promoveu fosse negado provimento ao recurso.

Nada mais obstando e com dispensa dos vistos legais (artigos 36.º, n.º 2, do Código de Processo dos Tribunais Administrativos e 657.º, n.º 4, do Código de Processo Civil), cumpre, então, apreciar e decidir.

2. Do objeto do processo

A única questão a decidir é a de saber se o tribunal recorrido incorreu em erro de julgamento ao concluir que a administração tributária só poderia aceder às informações e documentação bancária dos Recorridos depois de obtida a devida autorização judicial nos termos do disposto no artigo 63.º, n.º s 2 e 6, da Lei Geral Tributária.

3. Do Julgamento de Facto

3.1. Foi o seguinte o julgamento de facto em primeira instância:

«A) Dos factos

Com interesse para a decisão a proferir considero provados os seguintes factos:

1. Pelo Ofício n° 26.249/0507 de 23/04/2013 (junto sob Doc. n° 1 com a Petição Inicial, a fls. 65 dos autos) foram os aqui Recorrentes, L…, NIF 1…e M..., NIF 183 954 190, notificados de que por decisão de 2013-04-08 do Sr. Director-Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira foi «autorizado que funcionários da Inspeção Tributária, devidamente credenciados, possam aceder diretamente a todas as contas e documentos bancários existentes nas instituições bancárias, em sociedade financeiras ou instituições de crédito portuguesas, de que sejam titulares (...) relativamente ao ano de 2010».

(cfr. Doc. nº 1 com a Petição Inicial, a fls. 65 dos autos)

2. Naquele ofício consta ainda a seguinte menção: «a autorização foi concedida ao abrigo da competência definida no n° 4 do artigo 63°-B da Lei Geral Tributária (LGT), verificados os condicionalismos entrevistos na alínea c) do n° 1 do mesmo artigo».

(cfr. Doc. n°1 junto com a Petição Inicial, a fls. 65 dos autos)

3. A referida decisão de 08/04/2013 do Diretor-Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira (constante de fls. 66 dos autos), tem o seguinte teor:


DECISÃO

1. Nos termos e com os fundamentos constantes da presente informação da Divisão de Inspeção Tributária IV da Direção de Finanças do Porto, bem como com o parecer e despachos nela exarados, verificando-se os condicionalismos previstos na alínea c) do nº 1 do artigo 63.º -B da Lei Geral Tributária, ao abrigo da competência que me é atribuída pelo n.° 4 do citado normativo, autorizo que funcionários da Inspeção Tributária, devidamente credenciados possam aceder directamente a todas as contas e documentos bancários existentes nas instituições bancárias, em sociedades financeiras ou instituições de crédito portuguesas, de que sejam titulares os sujeitos passivos L…, com o NIF 1…e M..., com o NIF 1…relativamente ao ano de 2010.

2. Devolva-se o processo à Direção de Finanças do Porto para efeitos do prosseguimento do procedimento de levantamento do segredo bancário.

(cfr. Doc. n° 1 junto com a Petição Inicial - fls. 66 dos autos)

4. A Informação de 19/03/2013 da Divisão de Inspeção Tributária da Direção de Finanças do Porto em que se suportou aquela decisão (junta sob Doc. n°1 com a Petição Inicial a fls. 67 as. dos autos), tem o seguinte teor:

I - NECESSIDADE DE ACEDER A DOCUMENTOS BANCÁRIOS

Na sequência do procedimento inspectivo aos sujeitos passivos L…, NIF 1…e M…, NIF 1…, com domicilio fiscal na Rua…, r/c dt.°, 4100-244 Porto, área do Serviço de Finanças de Porto - 4, que se encontra a decorrer ao abrigo da ordem de serviço interna n.° OI201203292 de 2012/06/06, com incidência temporal no ano de 2010, no âmbito do IRS e IVA, verificou-se que se encontram reunidos os pressupostos de avaliação indirecta previstos na alínea f) do n.° 1 do artigo 87.° da Lei Geral Tributária (LGT), pelos motivos que passamos a expor nos pontos seguintes, pelo que para apuramento da situação tributária dos sujeitos passivos em causa é necessária a investigação das contas bancárias, corno se infere do preceituado no n.° 11 do artigo 89.° A da LGT.

II - DESCRIÇÃO OS FACTOS E FUNDAMENTOS QUE JUSTIFICAM A NECESSIDADE DE ACESSO A DOCUMENTOS BANCÁRIOS

1 - MOTIVO DA INSPECÇÃO/SEU INICIO

A presente acção inspectiva teve subjacente um ficheiro de sp’s com indícios de incumprimento fiscal, elaborado pela DAPIT, no âmbito da acção especial Distrital de controlo de sp’s com o CIRS 6010, 6011 e 6012.

Segundo esse ficheiro, elaborado através dos elementos constantes das bases de dados da Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), verificou-se que os contribuintes em análise, no ano de 2010, apresentam incongruência entre a liquidação de IRS e as manifestações de fortuna, e omitiram na declaração de rendimentos m/3 e na declaração periódica do IVA um recibo emitido.

O procedimento de inspecção iniciou-se em 2012/10/09, data do registo da 1ª notificação enviada a pedir elementos e esclarecimentos, de que se Junta cópia em anexo 1.

2 – FACTOS VERIFICADOS

2.1. – Actividade exercida

O contribuinte L..., encontra-se colectado pela actividade de Jurisconsultos CAE 6011, desde 1991/09/16, estando enquadrado para efeitos de IVA no regime normal de periodicidade trimestral.

Verificou-se, também, conforme print extraídos do sistema informático, que no ano em análise é sócio da sociedade de advogados com a denominação social P… e Associados, sociedade de Advogados RL, NIPC 5…, e sócio gerente das sociedades C…, Ld.ª, NIPC 5…e C… - Investimentos Imobiliárias, Ld.ª, NIPC 5….

Era também administrador das sociedades C… SA, NIPC 5…, C… - SGPS, SA NIPC 5…, e vogal das sociedades E…, NIPC 5…e C… Imobiliários SA, NIPC 5….

A esposa, M..., também esteve colectada pela actividade de jurisconsulto, CAE 6011, actividade que cessou em 1996/12/31.

Não se conhece que exerça qualquer actividade nem consta a sua ligação a empresas.

2.2 - Rendimentos declarados

Aquando do início da inspecção tinham declarado o rendimento global de € 29.650,00, que foram imputados a L… pela sociedade de advogados P… e Associados, sociedade de Advogados RL.

No decorrer da inspecção, e após termos efectuado a notificação a pedir elementos e esclarecimentos referida no ponto 1 deste capitulo, onde se referia a omissão declarativa de € 600,00 que a empresa C…, NIPC: 5…, declarou ter pago a L..., foram entregues declarações de substituição para efeitos de IRS e de IVA, onde foi incluído aquele valor.

2.3 - Composição do agregado familiar

O agregado familiar dos contribuintes é composto por 5 pessoas, ou seja, os 2 conjugues e 3 dependentes.

2.4 - Benefícios fiscais e deduções mencionados no anexo H

No quadro 7 do anexo H da declaração modelo 3 de IRS declararam deduções à colecta e benefícios fiscais que totalizaram € 14.846.30. No quadro 8 do mesmo anexo declararam despesas de saúde e educação no valor de € 1.268,88 e de € 8.369,21, respectivamente.
Deduzindo as importâncias declaradas no anexo H, ao rendimento global declarado, o valor restante que perfaz apenas € 5.765,61 (30.250,00 - 24484,39) afigura-se-nos manifestamente insuficiente para manter um agregado familiar de 5 pessoas, com 3 dependentes em idade escolar.

2.5. Manifestações de fortuna evidenciadas

2.5.1 Suprimentos efectuados

L…, efectuou em 2010 suprimentos à empresa C…, Ld.ª, NIPC 5…, cujo saldo foi € 180.500,00, conforme anexo A apresentado por esta empresa.

2.5.2. Aquisição de um imóvel

Adquiriram o prédio urbano artigo …, da freguesia de Aldoar, através da escritura nº 152ª/37, de 2010/01/29, no valor de €310.000,00.

Verifica-se assim incongruência entre a liquidação de IRS e as manifestações de fortuna de despesa efectuada.

3 - NOTIFICAÇÃO EFECTUADA

Foram os contribuintes notificados, através do nosso ofício 6333/0507 de 2012/10/09 a que já atrás aludimos e que se junta em anexo 1, para no âmbito do procedimento inspectivo em curso, e em conformidade com o n.° 4 do artido 59.° da Lei Geral Tributária (LGT) e artigos 28.° e 48.º do Regime Complementar de Inspeção Tributária (RCPIT), no prazo de 15 dias, entre outros, entregarem por escrito ou remeterem para a Direcção de Finanças do Porto, Rua de Santa Catarina, 1011, 4049-050 PORTO, ao cuidado do técnico subscritor da notificação, os seguintes e1rnentos:

· Efectuar prova da fonte dos meios que permitiram, no ano de 2010, efetuar as aquisições e suprimentos referidos no ponto 2.5.2 e 2.5.1, pelo valor global de € 310.000,00 e 150.500,00 (era este o saldo conhecido à data), respectivamente, conforme preceitua o nº 3 do artigo 89°-A da LGT.

Foram advertidos de que a ausência de resposta ou a não indicação/apresentação dos
elementos solicitados, determinava:

1. A realização de avaliação indireta nos termos do artigo 87.° e seguintes da Lei Geral Tributária,

2. Ser considerada contra-ordenação fiscal punível com coima, nos termos do artigo 117° do Regime Geral das Infrações Tributárias (RGIT), aprovado pela Lei 15/2001, de 5 de Junho.

3.

4 - RESPOSTA À NOTIFICAÇÃO

Em resposta à notificação, os contribuintes justificaram parcialmente a aquisição do imóvel através do financiamento bancário no valor de € 275.000,00, conforme escritura de compra e venda e mútuo com hipoteca de que anexaram cópia. Quanto aos restantes € 35.00000, referem tê-los pago no ano anterior (2009), não tendo apresentado prova de que tais pagamentos tenham ocorrido no ano anterior, nem a origem dos meios que lhe permitiram efetuar esses pagamentos.

Quanto aos suprimentos efectuados, pretendem justificar € 180.00000 através de um financiamento do Banif sob forma de descoberto pontual em conta de depósitos à ordem (conta n.° 00/0387620567710). Segundo referem, emitiram da referida conta para realizar os suprimentos, um cheque no valor de € 90.000,00 e fizeram uma transferência de igual montante. Como meio de prova enviaram cópia de um contrato de Penhor do direito de resgate de 350 unidades de participação Banif Property - FEIIF, celebrado em 2010/05/04, que garante o cumprimento das obrigações assumidas derivadas do descoberto pontual em conta de depósitos à ordem no valor de € 350.000,00. Enviaram também o extrato da referida conta à data de 2010/05/31, onde tinham já utilizado € 303.231,03.
Nada referem quanto aos restantes € 500,00.

5 - ANÁLISE DA RESPOSTA RECEBIDA no que respeita aos suprimentos

Os elementos enviados, só por si, não demonstram que os valores movimentados na conta indicada tenham sido os utilizados para efetuar os suprimentos em questão, senão vejamos:

- Não totalizam o valor dos suprimentos;

- Do descritivo do extrato apresentado não é possível concluir que o cheque e a transferência indicados tenham sido utilizados para aquele fim, pois não há nenhum dado que revele que os mesmos tiveram como beneficiária a sociedade.

-

6 - NOTICAÇÃO PARA ESCLARECIMENTOS ADICIONAIS

Uma vez que:

- No tocante ao imóvel, a resposta recebida justificou parcialmente a sua aquisição através do financiamento bancário no valor de € 275.000,00, mas, quanto aos restantes € 35.000,00, referem tê-los pago no ano anterior, a titulo de sinal e inicio de pagamento, mas não apresentaram nem a prova do pagamento nem dos meios que lhe permitiram efectuá-lo; e

- No que respeita aos suprimentos efectuados também os elementos recebidos se revelam insuficientes;

foram os contribuintes novamente notificados, através do nosso ofício n.° 7408470507 de 2012/11/19, que se junta em anexo 2, para apresentarem:

· Prova inequívoca dos meios que lhe permitiram efectuar o pagamento dos restantes € 35.000,00 para a aquisição do imóvel.

· Demonstrar que os cheques e a transferência assinalados foram efectivamente os utilizados para a realização dos suprimentos, e quais os meios que permitiram realizar o restante.

· Como o contraio de penhor tem vencimento em 2010/10/13, torna-se também necessário conhecer os meios corri que foi feita a liquidação ou o pagamento percial do capital utilizado e demais encargos. Foram por isso também notificados para no prazo de 10 dias entregar por escrito ou remeter para esta Direcção de Finanças, os extratos da referida conta, com os movimentos efectuados em 2010, bem como esclarecer quais os meios que permitiram o eventual pagamento ou amortização do capital utilizados e dos respectivos encargos.

Os contribuintes não deram resposta a esta notificação, tendo a carta sido devolvida ao remetente por não ter sido reclamada.

7 - RECOLHA DE ELEMENTOS NA SOCIEDADE ONDE FORAM EFECTUADOS OS SUPRIMENTOS

Como os contribuintes não prestaram os esclarecimentos necessários, solicitámos emissão de despacho externo, com vista a recolher na sociedade os registos contabilísticos dos suprimentos em causa e respectivos documentos de suporte. Para esse fim foi emitido o despacho n.° DI201203210 ao abrigo do qual foi recolhida a conta corrente e fotocópia dos documentos de suporte dos valores registados.

Através dos elementos recolhidos verificamos que o valor dos suprimentos efectuados foi de € 279.250,00, apresentando o saldo da conta o valor de € 180.500,00 em virtude de terem sido transferidos para aumenta de capital € 98.750,00.

8 - NOTIFICAÇÃO PARA ESCLARECER OS MEIOS QUE PERMITIRAM EFETUAR O NOVO VALOR DOS SUPRIMENTOS CONHECIDO, E PARA AUTORIZAR O ACESSO ÀS CONTAS BANCÁRIAS

Atendendo a que o valor dos suprimentos agora conhecido era superior ao que tinha sido notificado ao contribuinte, efetuámos nova notificação, através do nosso ofício n.° 81800/0507, de 2012/12/18 que se junta em anexo 3, onde, para além dos elementos e esclarecimentos solicitados na 2ª notificação enviada (em anexo 2), solicitámos também autorização para acesso às contas bancárias.

Na resposta enviada, com entrada nestes serviços em 2013/01/08, portanto para além do prazo que lhes foi concedido mas que apesar disso analisámos, os contribuintes continuam a não fazer prova suficiente dos meios que lhe permitiram fazer as aquisições e suprimentos, senão vejamos:

1 - Referem que na resposta à 1ª notificação se limitaram a justificar o valor de € 180.500,00 de suprimentos, por ter sido esse o valor questionado pela Autoridade Tributária. Nessa base dizem ter justificado os 2 primeiros valores registados na respectiva conta corrente, ou seja € 97.500,00 e € 90.000,00, respectivamente, através da conta bancária n.° 000387620567710, conta essa em que os contribuintes estão autorizados num descoberto pontual.

Cumpre-nos referir que apesar do contribuinte afirmar que justificou a origem do valor questionado, conforme atrás se referiu, não fez então prova suficiente, e continua a não o fazer.

2 - Em relação ao descoberto pontual, garantido por um contrato de penhor assinado em
2010/05/04 e com vencimento em 2010/10/13, referem que foi prorrogado na data do vencimento, cujo documento comprovativo de renovação protestaram juntar, não o tendo feito até à presente data.

Mais uma vez referimos que a análise dos movimentos desta conta é fundamental para análise da situação tributária dos contribuintes, que recusam o acesso aos movimentos da mesma. A renovação do contrato de penhor mesmo que venha a ser apresentada, não dispensa a apresentação dos extractos bancários, que os contribuintes recusam.

3 - Quanto aos suprimentos registados na conta corrente, referem que o 1.º valor registado, no valor de € 97.500,00, teve origem no contrato de cessão de quotas, que adquiriram pelo valor de € 125.000,00, acompanhada de todos os ónus e direitos. O valor dos suprimentos que lhe estava associado era de € 97.500,00, tendo sido este o valor registado nessa conta. Por outro lado este valor, segundo afirmam, faz parte dos € 98.750,00 utilizados no aumento de capital, motivo pelo qual, no seu entender, não têm a natureza de suprimentos, porque não se trata de um valor que possa ser restituído aos sócios.
A este respeito refira-se que mesmo admitindo que foi aquele o valor transferido para aumento de capital, tal facto não retira aquele valor a qualidade de suprimentos pois trata-se da transferência de suprimentos para capital.

Mas para além deste facto, o que está em causa é a aquisição de uma quota por € 125.000,00 quando os contribuintes justificam apenas € 90.000,00 através da conta do descoberto pontual.

Encontram-se assim por justificar € 35.000,00 relativamente a esta aquisição, em que os contribuintes apenas indicam ter sido pago na data de celebração do contrato promessa, em Fevereiro de 2012. Entendemos que o ano de 2012 foi mencionado por lapso, pois tudo indica ter sido 2010 dado que a escritura de cessão de quotas teve lugar em 2010/04/15 e o contrato promessa que lhe está subjacente não podia ter data posterior.

Mais uma vez o contribuinte não justifica a totalidade do valor, para além de que a justificação apresentada não é suficiente por não terem sido exibidos os movimentos bancários da conta movimentada.

4 - Quanto ao 2.° 3.º, 5.°, 6.° e 9.° movimentos registados a crédito da conta suprimentos, no valor de € 90.000,00, € 15.000,00, € 10.000,00, € 10.000,00 e € 9.750,00, demonstram que tiveram origem na conta do descoberto pontual autorizado, mas cujos valores só podem ser considerados justificados após o contribuinte ter demonstrado como alimentou esta conta para que a mesma permitisse efetuar estes suprimentos, uma vez que no final do mês de Maio o descoberto já atingia € 303.231.03.

5 - O 4.° valor registado no valor de €26.500,00, referem ter origem num cheque da conta n.° 05534933500 do BIC, e que mencionam corresponder a uma retirada de suprimentos da empresa C… de que L... é Administrador.

6 - Os sétimo e oitavo registos, no valor de € 11.250,00 e € 9.250,00, respectivamente, são transferências da conta n.° 50119623648 de que são titulares, mas cujos movimentos desconhecemos por não serem exibidos os extratos.

7 - Entendem assim que a situação não se enquadra nas manifestações de fortuna e outros acréscimos patrimoniais, prevista no artigo 89.º-A da LGT, nem se verificam quaisquer acréscimos de património ou despesa que justifique a aplicação do artigo 87.° n.1 f) do mesmo diploma, pelo que também consideram que não há motivo para aplicação do seu artigo 63.º.

Diferente é o nosso entendimento, pois consideramos que os elementos apresentados são insuficientes, sendo necessária a análise das contas bancárias referidas com todo o movimento registado em 2010, que o contribuinte não apresentou nem concedeu autorização para acesso às mesmas.

9 - PEDIDO DE ELEMENTOS À SOCIEDADE C…

Como os contribuintes pretenderam justificar suprimentos no valor de € 26.500,00 efectuados na sociedade O…, Ld.ª com o levantamento de suprimentos da sociedade C…, SA, NIPC 5…, através do nosso oficio n.° 6601/0507 de 2013/01/29, que se junta em anexo 4, notificámos esta sociedade para enviar a esta Direcção de Finanças, o extrato da conta corrente do sócio L..., relativos ao ano 2010 e respectivos documentos de suporte.

Da análise dos documentos recebidos verificámos que também nesta sociedade foram efetuados suprimentos e levantamentos ao longo de 2010, tendo o valor dos suprimentos excedido o dos levantamentos em € 14.189,64.

10 - ACRÉSCIMO DE PATRIMÓNIO E DESPESAS NÃO JUSTIFICADAS

Dos factos descritos resultam os seguintes valores:
Acréscimo de património e despesas evidenciadasValor
Aquisição Habitação
310.000,00
Suprimentos O…
279.500,00
Suprimentos C… (aumento saldo)
14.189,64
Aquisição Quota O…
125.000,00
Despesas Anexo H - quadro 7
14.846,41
Despesas Anexo H – saúde
1.268,88
Despesas Anexo H – educação
8.369,21
I. selo pago
2.480,00
IUC pago
193,83
IMI pago
617,70
IMT pago
13.191,00
Total conhecido
769.656,67
Valor justificado - empréstimo habitação
275.000,00
Valor justificado - aquisição quota
90.000,00
Valor justificado – suprimentos
214.000,00
Total justificado
579.000,00
Divergência não justificada
190.656,67
O valor da divergência será ainda superior se considerarmos que os s.p.s não justificaram que o descoberto bancário não foi pago na data do vencimento.

11 - ENQUADRAMENTO DA SITUAÇÃO VERIFICADA

De acordo com o disposto na alínea d) do n.° 1 do artigo 87.° da LGT, há lugar à avaliação indirecta quando os rendimentos declarados para efeitos de IRS se afastarem significativamente, para menos, sem razão justificada, dos padrões de rendimentos que razoavelmente possam permitir as manifestações de fortuna evidenciadas pelos sujeitos passivos nos termos do artigo 89.° - A.

Por sua vez, o n.° 1 do artigo 89.°- A, especifica que há lugar à avaliação indirecta da matéria colectável quando o sujeito passivo evidencie alguma das manifestações de fortuna previstas na tabela a que se refere o nº 4, que inclui a aquisição de Imóveis de valor igual ou superior a 250.000,00 euros a realização de suprimentos de valor igual ou superior a 60.000,00 euros, e se verifique a falta de entrega da declaração de rendimentos ou que o rendimento líquido declarado mostre uma desproporção superior a 50% para menos, em relação ao rendimento padrão resultante da referida tabela.

Por outro lado, nos termos do disposto na alínea f) do artigo 87.°, a realização da avaliação indirecta, também ocorre quando se verifica um acréscimo de património ou de despesa efetuada, de valor superior a 100.000,00 euros, verificados simultaneamente com a falta de declaração de rendimentos ou com a existência, no mesmo período, de uma divergência não justificada com os rendimentos declarados.

Face ao exposto, constata-se uma divergência não justificada entre os rendimentos declarados e o acréscimo de património e despesa de valor superior a € 100.000,00, pelo que estão reunidos os condicionalismos previstos na alínea f) do n.° 1 do artigo 87.° da LGT

Assim, foram os sujeitos passivos notificados via postal, conforme notificações a que aludimos nos pontos anteriores1 para, e de forma a obstar a tributação nos termos referidos, apresentarem comprovativos de que correspondem à realidade os rendimentos declarados, no ano de 2010, e de que é outra a fonte das manifestações de fortuna e acréscimo de património ou da despesa efectuada.

Até ao momento, e findo o prazo estipulado nas notificações para obstar á tributação nos termos anteriormente descritos, os sujeitos passivos não apresentaram prova suficiente.

De acordo com o disposto no n.° 11 do referido art.° 89.° - A da LGT, este procedimento deve incluir e investigação das contas bancárias, pelo que se solicitou aos contribuintes autorização de acesso ás mesmas, acesso que não foi autorizado.

III- CONCLUSÕES E PROPOSTAS

Resulta do exposto anteriormente, que se encontram reunidos os pressupostos de avaliação indirecta previstos na alínea f) do n.° 1 do artigo 87.° da LGT, avaliação indirecta essa que deve ser efectuada no âmbito de um procedimento que inclua a investigação das contas bancárias, conforme se conclui da leitura do n° 11 do artigo 89.° A do referido diploma legal.

Considerando que os factos descritos na presente informação se enquadram na alínea c), n.° 1 do artigo 63.° 8 da LGT, e dado que os sujeitos passivos não apresentaram os comprovativos de que correspondem à realidade os rendimentos declarados no ano de 2010, de forma a obstar a tributação nos termos referidos, vem esta Direcção de Finanças propor a derrogação do sigilo bancário aos sujeitos passivos L... e Mana José Brazão Correia da Mota, relativamente a todas as suas contas bancárias.

(cfr. Doc. n°1 junto com a Petição Inicial - fls. 67 ss. dos autos)

5. A Petição Inicial pela qual foi instaurado o presente processo (de fls. 4 ss.) foi remetida a este Tribunal por correio eletrónico em 16/05/2013, constando o respetivo original de fls. 30 ss..

(cfr. fls. 4 ss. e fls. 30 ss. Dos autos)

Não existem outros factos provados nem factos não provados com relevância para a decisão a proferir.

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A matéria de facto dada como provada nos presentes autos foi a considerada relevante para a decisão da causa controvertida segundo as várias soluções plausíveis das questões de direito. A formação da nossa convicção para efeitos da fundamentação dos factos atrás dados como provados teve por base os documentos integrados nos autos supra referenciados.

4. Do Julgamento de Direito

4.1. Vem o presente recurso interposto da douta sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto que, julgando ilegal a derrogação administrativa do segredo bancário por não ter sido precedido de autorização legal nos termos do disposto no artigo 63.º, nºs 2 e 6, da Lei Geral Tributária, anulou a decisão respetiva.

Com o assim decidido não se conforma Recorrente por entender, basicamente, que o acesso às contas bancárias dos Recorridos não poderão revelar informação protegida pelo segredo profissional de advogado, seja porque essa informação só poderá estar contida nas contas da sociedade de advogados onde exerce a sua função, seja porque os elementos fácticos a indagar não se relacionam com a atividade de advogado.

A questão fundamental sobre a qual este tribunal de recurso é chamado a pronunciar-se é, por isso, a de saber se a administração tributária tem que requerer a autorização de acesso às contas bancárias de advogado no tribunal da comarca competente, nos termos do n.º 6 do artigo 63.º da Lei Geral Tributária quando verifique que o sujeito que recusa o acesso é advogado ou apenas quando também verifique que o objeto da inspeção contende (ou pode contender) com a consulta de elementos abrangidos pelo segredo profissional de advogado.

A esta questão respondemos que a administração tributária tem que requerer a autorização de acesso às contas bancárias de advogado no tribunal da comarca competente, nos termos do n.º 6 do artigo 63.º da Lei Geral Tributária quando o sujeito visado se oponha ao acesso às suas contas bancárias invocando segredo profissional. Ou seja, em tais circunstâncias, não compete à administração tributária indagar se o objeto da inspeção contende (ou pode contender) com a consulta de elementos abrangidos pelo segredo profissional de advogado, mas requerer ao tribunal competente essa indagação e a subsequente autorização.

Porque se coubesse à administração indagar previamente se a matéria contende com o sigilo profissional, isso significaria que não estávamos perante um acesso judicial, mas perante um acesso administrativo. No sentido de que a averiguação das condições de acesso não era feita no âmbito de um processo judicial, mas no âmbito de um procedimento administrativo.

Dizendo de outro modo, se coubesse à administração indagar previamente se a matéria contende com o sigilo profissional, isso significaria que não estávamos perante um acesso autorizado (pelo tribunal), mas perante um acesso imediato (da administração, seguido de eventual recurso judicial). No sentido de que de que a averiguação das condições de acesso não era feita, em primeira mão, pelo juiz, mas pela própria administração.

Sendo que, a ser assim, o legislador não teria dito nos n.ºs 2 e 6 do artigo 63º da Lei Geral Tributária que o acesso à informação protegida pelo segredo profissional dependia de autorização judicial. Em vez disso, teria dito que o contribuinte poderia opor-se à derrogação do dever de sigilo bancário mediante recurso judicial, invocando o segredo profissional.

A verdade é que o acesso direito da administração tributária à informação bancária tem natureza excecional e só está previsto para as situações em que esteja, de um lado, o interesse da administração tributária na informação bancária e do outro o interesse do cidadão na proteção do seu direito à reserva da intimidade da vida privada e familiar. Se a este se adicionar qualquer outro interesse protegido pelo dever de sigilo, nomeadamente o dever de sigilo profissional, esse acesso só pode efetuar-se pelas vias gerais.

O que significa que não compete à administração tributária, em sede administrativa, indagar se o acesso à informação bancária contende com o sigilo profissional, mas reconhecer que o sujeito passivo está profissionalmente adstrito ao dever de sigilo e que recusou o acesso à informação bancária com esse fundamento.

Porque assim é, entende-se também que não cabe a este tribunal indagar em concreto se a informação bancária pretendida pode ou não contender, concretamente, com a atividade profissional do sujeito passivo. Porque essa é precisamente a questão que deve ser colocada ao tribunal materialmente competente com vista à obtenção da autorização judicial.

Pelo que o recurso não pode merecer provimento e a douta sentença não pode senão ser confirmada.

5. Conclusões

5.1. Em caso de oposição o contribuinte à consulta de elementos bancários invocando segredo profissional, não está em causa apenas a proteção do segredo bancário, pelo que o acesso à informação bancária respetiva não pode fazer-se nos termos do artigo 63.º-B da Lei Geral Tributária – cfr. n.º 3 do artigo 63.º da mesma Lei.

5.2. Em tal caso, deve a administração tributária requerer ao tribunal competente a autorização de acesso à informação bancária nos termos dos n.ºs 2 e 6 do artigo 63.º da Lei Geral Tributária.

6. Decisão

Por todo o exposto, acordam os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte em negar provimento ao recurso.

Custas pelo Recorrente.

Porto, 27 de março de 2014

Ass. Nuno Bastos

Ass. Fernanda Esteves

Ass. Irene Neves