Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00600/17.0BEPNF
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:03/25/2021
Tribunal:TAF de Penafiel
Relator:Margarida Reis
Descritores:IRC DE 2014, CUSTOS, ART. 23.º DO CIRC; FATURAS FALSAS; PROVA; MATÉRIA DE FACTO
Sumário:Estando em causa custos titulados por “faturas falsas”, e tendo a ATA cumprido o que lhe era exigido quanto ónus probatório que sobre si recaía, reunindo indícios sérios de que a empresa que emitiu as faturas referentes aos custos desconsiderados (art. 23.º CIRC) não prestou os serviços supostamente titulados pelas mesmas, o que estava autorizada a fazer com recurso a fiscalização cruzada, cabia à Recorrente provar, para além de qualquer dúvida, a substância da prestação dos serviços em causa, o que não logrou fazer.

Apenas a alegação circunstanciada de factos concretos permitiria a produção de prova adequada a habilitar o Tribunal a quo a retirar as ilações pretendidas pela Recorrente, maxime, no sentido de concluir que as prestações de serviços tituladas pelas faturas desconsideradas realmente ocorreram..*
* Sumário elaborado pela relatora
Recorrente:D., Lda
Recorrido 1:Autoridade Tributária e Aduaneira
Votação:Unanimidade
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:
*

I. RElatório

D., Lda., inconformada com a sentença proferida em 2020-04-17 pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel que julgou improcedente a impugnação judicial que interpôs contra o ato de liquidação adicional de IRC referente ao exercício de 2014, e respetivos de juros compensatórios, no montante global de € 159.389,99, vem dela deduzir o presente recurso.
A Recorrente encerra as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões:
CONCLUSÕES
Vem o presente recurso interposto da sentença do TAF Penafiel que considerou não haver qualquer vicio de falta de fundamentação bem como qualquer vicio de violação de lei, por erro nos pressupostos de facto ou direito do ato tributário impugnado, concluindo pela improcedência da impugnação,
Não se conforma a Recorrente com a decisão proferida.
a - A AT, na sua actuação, não pode limitar-se a externar uma fundamentação meramente formal do juízo que formula quanto à indevida dedução de custos fiscais em sede de apuramento da matéria tributável, ou deduções de IVA, por parte do sujeito passivo.
b - Exige-se-lhe, ademais, que demonstre o bem fundado desse juízo, provando os indícios que o sustentaram e demonstrando que tais indícios possibilitam a conclusão de ser correcta, do ponto de vista material, a fundamentação que adoptou, mas terá de formar o seu próprio juízo probatório sobre a correspondência à realidade fáctico-jurídica dos elementos em que a
administração disse apoiar a sua consideração e aferir, então, sobre eles se esta deve ter-se por correcta.
c - à Administração caberá, assim, o ónus de provar, mesmo em tribunal, os pressupostos de facto suficientes, dentre os afirmados na fundamentação do acto, “para que o Tribunal possa ajuizar sobre se o juízo administrativo se deve ter por, objectiva e materialmente, fundamentado".
d - NO CASO DOS AUTOS, é notório que os factos indiciários recolhidos pela Administração Tributária e por esta externados no cumprimento do dever de fundamentação formal do acto impugnado, não permitem suportar, nos termos que suportaram, a conclusão a que chegou de que os documentos contabilizados não reproduzem factos ou transacções reais.
e - A AT limitou-se a enunciar factos sustentadores de ilações e formação de juízos meramente conclusivos, baseados sobretudo em elementos e factos relativos a empresas contratantes, o que de modo algum pode satisfazer as exigências implicadas por uma actuação correctiva da matéria tributável.
f - Carece - na forma especifica apontada - de fundamentação suficiente, expressa e inequívoca, o acto tributário impugnado. Sendo consequência da fundamentação insuficiente, a falta de fundamentação, o que impõe a ilegalidade do acto praticado e possibilita a Impugnação respectiva.
ACRESCE que as considerações avançadas supra, e seguintes, impõem, de todo o modo, a anulação do ato por vício de violação de lei por erro nos pressupostos da atuação da AT, ou seja da liquidação verificada.
Com efeito
g - A AT actuando no uso de poderes estritamente vinculados, submetida ao princípio da legalidade, incumbia-lhe o ónus de provar que se verificam os pressupostos fáctico-jurídicos fundamentadores da sua actuação, recaindo sobre esta o ónus de demonstrar a factualidade que a levou a desconsiderar os custos contabilizados pelo Impugnante, in casu, a falta de materialidade dos serviços correspondentes às facturas em causa.
h - A Administração Tributária - como lhe competia - não fez a prova da verificação de indícios que permitem minimamente concluir que aos documentos contabilizados pela Impugnante e emitidos pela empresa referida não subjazem as prestações dos serviços ou negócios subjacentes.
i - A base praticamente integral da suposta fundamentação das correções efetuadas está relacionada com a referencia a elementos coligidos em processos e procedimentos relativos à empresa emitente das faturas, T., LDA, pouco ou nada havendo de concreto no que toca especificamente à Impugnante.
j - E se é certo, não ser necessário, nesta fase, que a AT faça alegação e prova dos pressupostos da simulação, previstos no artigo 240.º do CC, certo é também que se exige, sem contemplações, a apresentação de indícios sérios, objectivos e firmes, que vertam uma probabilidade elevada, de que as facturas não titulam operações reais.
k - É completamente inusitada a afirmação constante do RIT, que divergência entre o rácio “rendimento pessoal” declarado pelo sujeito passivo se afasta de forma acentuada do rácio do sector, “o que afasta a necessidade de recurso a terceiros para a execução do trabalho a feitio”, quando tal desvio resulta da realidade da actividade desenvolvida, jamais permitindo, naturalmente, a conclusão pretendida.
l - O Tribunal a quo, não valorizou, minimamente os revelantíssimos elementos e factos, como seja a apresentação pela Requerente dos documentos de transporte, emitidos aquando da entrega das peças a confecionar à empresa T. bem como cópias das guias de remessa que emitiu aquando do envio das peças confecionadas aos clientes.
m - O Tribunal a quo, não deu qualquer relevância ao facto de os pagamentos relativos às faturas terem sido efetuados por cheque ou transferência bancária para uma conta titulada pela T.…
o - Os indicadores de facto de que o emitente da factura não tem capacidade para prestar o serviço não bastam, por si só, para obstar à sua contabilização, se não houver razões para pôr em causa a realização desse serviço por terceiro.
p - Constata-se, pois, que a Administração, como lhe competia, não avança um só facto certo que, com suficiente razoabilidade e justificação, lhe permita concluir pela incerteza da materialidade das operações, baseando-se em factores exógenos e laterais e, essencialmente, em elementos da entidade emitente das facturas limitando-se a analisar a contabilidade, declarações e actuação da entidade emitente, como se a Impugnante pudesse ou devesse controlar o comportamento das pessoas com quem contacta ou contrata …
q - A AT, desprezou, sem suficiente justificação ou razão, as explicações da Impugnante relativamente a actos e documentos que lhe diziam respeito… não curando, minimamente, de apurar da veracidade de tais documentos/declarações/explicações, tanto mais, que daí se poderia e deveria inferir decisivamente a convicção da (não) falaciosidade das faturas em apreço.
r - Não pode aceitar-se que o ónus da Fazenda Pública se baste com a recolha de indícios de falsidade relativamente aos emitentes das facturas, pois levaria a que os utilizadores das facturas falsas, que não sabem que o são, não pudessem deduzir custos ou efetuar deduções relativas a valores que efectivamente suportaram, sem que tivessem participado em qualquer esquema fraudulento.
s - MAL ANDOU O TRIBUNAL a quo, ao não levar à matéria assente alguns factos e considerar como não provados os factos 1 e 2, pois, nos termos das considerações supra, impunham o ónus da prova à AT, que, notoriamente, não logrou efetuar.
t - A Requerente, ao contrário do concluído na sentença, logrou mostrar elementos que impunha que tais factos fossem, claramente, dados como provados.
u - Não é verdade que nas inquirições tenha sido referido não haver contacto dos representantes da empresa com os representantes da T., mas sim, que, eles funcionários, não tinham esse contacto. Era o sócio gerente Sr D., que tinha a cargo toda a gestão.
v - Querer que as testemunhas afirmem que, há cinco anos - entre inúmeros produtos entregues e recebidos de variadas empresas - efetuaram trabalhos e pormenorizados procedimentos relativos a uma especifica empresa e concretos produtos relacionados nas faturas, resulta em prova de dificuldade extrema, impossível ou diabólica.
x - É manifesta a assertividade, uniformidade e inequivocidade, da afirmação das testemunhas, que, em 2014, a Impugnante teve relações comerciais do tipo das constantes das faturas, com a T., (que a AT, diz não ser possível).
z - A própria AT, considera, por norma, que a existência de documentos que titulam a transferência de mercadoria entre as empresas (guias de saída) relativas às facturas em causa e o respetivo pagamento, (nomeadamente por transferência bancária), se mostram formas de comprovar a materialidade das operações faturadas
aa - Não é inverosímil, bem pelo contrário, que funcionários das empresas cumpram ordens e não entrem nos relacionamentos comerciais que, nomeadamente, nas pequenas empresas, cabe em exclusivo aos gerentes, (que, como é sabido), não podem prestar depoimento testemunhal).
bb - Os indícios e factos verificados devem ser analisados de forma contextualizada e articulada entre si, nunca de forma isolada ou atomística – considerando, a prova testemunhal, a existência de guias de transporte e guias de remessa coincidentes com o constante das faturas e os pagamentos por transferência bancária.
….Não se entende e concorda, que saíram robustecidas as constatações e indícios recolhidos pela inspeção tributária, condensados no RIT, bem como as sua conclusões no sentido de as faturas emitidas à Impugnante e contabilizadas por si em nome da T. não titularem operações económicas reais e não corresponderem a um fornecimento efetivo dos serviços descritos nas visadas faturas.
cc - FACE A TODO EXPOSTO, (no respeitante), os factos dados como não provados na sentença deverão ser considerados provados, constando:
1) A "T.' forneceu à impugnante os produtos que constam das faturas desconsideradas pela administração tributária.
2) As faturas emitidas com o nome da "T.", registadas na contabilidade da impugnante nos exercícios de 2014, titulam operações económicas reais e correspondem a serviços efetivamente fornecidos por si.
dd - DOUTROSSIM, deverão constar da matéria assente:
- Foram elaboradas guias de transporte e guias de remessa referentes às mercadorias constante das faturas alegadamente falsas.
- Foram, por transferência bancária efetuados os pagamentos relativos às faturas alegadamente falsas.
- A AT, para cobrança de dívidas fiscais da T., penhorou os seus créditos notificando a Impugnante, a pagar ao Fisco, as eventuais quantias em divida a essa empresa fornecedora.
ee - Os serviços foram prestados, porquanto os artigos foram transformados, ainda que se desconheça, concretamente, como tal se processou.
ff - A Recorrente rejeita inequivocamente as conclusões constantes do Relatório de Inspecção, e decisão do Tribunal que as acolheu, pois são as facturas questionadas verdadeiros documentos que espelham, igualmente verdadeiras, operações comerciais, tendo o mesmo procedido à aquisição dos serviços e efectuado o pagamento do preço respectivo.
gg- Ao ter corrigido a matéria coletável e procedendo à liquidação de imposto com base nessa correcção, incorreu, pois, a AT, em violação do normativo legal implicante da invalidade da mesma e do ato tributário que a suporta.
Termina pedindo:
NESTES TERMOS E MELHORES DE DIREITO, com o douto suprimento de V/Ex.ªs Venerandos senhores Doutores Juízes Desembargadores, deve o presente Recurso ser julgado procedente, por provado e, por consequência, revogar-se a douta sentença recorrida, nos termos e fundamentos invocados substituindo-a por outra que julgue totalmente procedente a impugnação relativa à liquidação de IRC/2014.
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A entidade Recorrida não apresentou contra-alegações.
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O Digno Magistrado do M.º Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido da improcedência do presente recurso.
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Os vistos foram dispensados, com a prévia anuência dos Juízes-Adjuntos.
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Questões a decidir no recurso
Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objeto do recurso delimitado pelas conclusões das respetivas alegações de recurso.
Assim sendo, importa apreciar se a sentença recorrida padece de erro de julgamento de facto e de direito, por não ter dado como provada a factualidade indicada pela Recorrente, e por não ter anulado a liquidação adicional de IRC de 2014 em questão, quando, na tese da Recorrente, a mesma padece de erro de facto e de direito nos pressupostos.


II. Fundamentação
II.1. Fundamentação de facto
Na sentença prolatada em primeira instância consta a seguinte decisão da matéria de facto, que aqui se reproduz:

IV – FUNDAMENTAÇÃO
DE FACTO
Com interesse para a decisão da causa julgo provada a seguinte factualidade:
A) A Impugnante foi constituída em 2001 e tem por objeto o exercício de “Fabricação de artigos têxteis confecionados e sua comercialização. Confeção de vestuário interior e exterior e sua comercialização. Compra e venda de imóveis, Construção de edifícios residenciais e não residenciais”, encontrando-se-enquadrada no CAE 13920 – cfr. fls. 2 do RIT (de fls. 12 a 19 do PA);
B) Para efeitos de IRC, encontra-se enquadrada no regime de tributação geral e está obrigada a dispor de contabilidade organizada – cfr. fls. 2 e 3 do RIT (de fls. 12 a 19 do PA);
C) No exercício de 2014, a Impugnante registou na sua contabilidade as faturas n.º A361 a n.º A485 que constam de fls. 24 a 40 do PA, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido, as quais foram emitidas por T. Lda., NIPC (...), nas quais figuram descritos serviços de confeção a feitio e os respetivos preços, no valor global de € 732.339,83, dos quais € 139.941,60 correspondiam a IVA, conforme melhor se explicita na seguinte tabela:
[imagem que aqui se dá por reproduzida]

- cfr. faturas de fls. 25 a 40 do PA;
D) A Impugnante, para efeitos de apuramento do lucro tributável do exercício de 2014, deduziu o valor dos gastos reportados nessas faturas – cfr. RIT;
E) A coberto da Ordem de serviço n.º OI201603341, a Impugnante foi sujeita a um procedimento de inspeção tributária de caráter externo e de âmbito geral, incidente em IRC e IVA do ano de 2014 – cfr. fls. 1 do RIT (de fls. 12 a 19 do PA);
F) A ação inspetiva identificada na alínea anterior decorreu entre 25/10/2016 e 02/03/2017 - cfr. fls. 1 do RIT (de fls. 12 a 19 do PA);
G) A ação inspetiva foi “despoletada pelo de a AT (…) ter conhecimento de que D. LDA. tem registada na contabilidade e declarado em sede de IRC e IVA, faturas emitidas em nome da “T., LDA., NIPC (…)” (…), empresa que à data da emissão das mesmas não detinha qualquer estrutura empresarial suscetível do exercício de uma atividade económica, como foi verificado na sequência do procedimento inspetivo realizado nos anos de 2012, 2013 e 2014 a coberto das credenciais OI201303851, OI201402931 e OI201600376, respetivamente.” – cfr. fls. 1 do RIT (de fls. 12 a 19 do PA);
H) Na sequência da ação inspetiva identificada em E), a AT concluiu pela necessidade de proceder a correções meramente aritméticas, no valor de € 595.398,23, ao lucro tributável/matéria coletável da Impugnante atinente ao exercício de 2014, nos seguintes termos:
[imagem que aqui se dá por reproduzida]

cfr. fls. 1 do RIT (de fls. 12 a 19 do PA);
I) As correções descritas na alínea anterior foram originadas pela desconsideração das faturas descritas em C) para efeitos de determinação do lucro tributável/matéria coletável da Impugnante referente ao exercício de 2014, por a AT ter concluído que tais faturas não têm subjacentes operações económicas reais – cfr. RIT, de fls. 12 a 19 do PA;
J) Para assim concluir, os serviços de inspeção tributária da AT alicerçaram-se na motivação patenteada no Relatório de Inspeção Tributária (RIT), designadamente nos pontos II-C5 Valores declarados, II-C5.1) IRC Anexo A - IES (declaração Anual – Informação empresarial simplificada; II-C.5.3). MOD. 22 – Q07 (Acréscimos e deduções), II-D) Análise aos valores declarados; II-E) Análise dos Rácios; II-F). Notificação do sujeito passivo D., Lda.; III – Descrição dos factos e fundamentos das correções meramente aritméticas à matéria tributável; VII – Infrações verificadas; e IX – Direito de audição, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido e que é o que consta das cópias juntas à presente sentença, da qual fazem parte integrante - cfr. RIT de fls. 12 a 19 do PA; anote-se que o PA não se encontra digitalizado, nem no suporte físico dos autos; por outro lado, a aqui signatária encontra-se a trabalhar a partir de casa, em virtude da declaração do estado de emergência nacional, e não dispõe de scanner. A solução aqui preconizada foi a única possível face ao contexto descrito e a que melhor satisfaz as exigências de celeridade e economia processuais, sem se perder de vista, nesse intento, os direitos das Partes (daí ter sido ordenada, a final, a junção das folhas relevantes do RIT);
K) Em 30/03/2017 foi concluído e assinado o RIT – cfr. data e assinatura constantes de fls. 19 (verso) dos autos;
L) O Chefe de Equipa da DF do Porto emitiu parecer sobre o dito RIT em 31/03/2017, no qual confirma as correções propostas no RIT – cfr. parecer de fls. 12 do PA apenso;
M) Em 31/03/2017, o Chefe de Divisão, por subdelegação, proferiu despacho de concordância com o teor do RIT e determinou a notificação “nos termos do artigo 62.º do RCPIT” – cfr. despacho de fls. 12 do PA;
N) Em decorrência das correções meramente aritméticas descritas em H), em 20/04/2017 e em 24/04/2017, a AT efetuou a liquidação adicional de IRC de 2014 n.º 2017 8310029270 e a liquidação dos correspondentes juros compensatórios n.º 2017 90920, respetivamente, no valor global € 159.389,99 – cfr. demonstração de liquidação de IRC, junta com a p.i. como “doc. 1”;
O) A demonstração de liquidação de IRC descrita na alínea anterior foi remetida à Impugnante e tem o seguinte teor:
[imagem que aqui se dá por reproduzida]

- cfr. demonstração de liquidação, junta com a p.i.;
P) As liquidações descritas na alínea anterior tinham como data limite de pagamento o dia 21/06/2017 – cfr. doc. de fls. 9 do PA;
Q) A petição inicial dos presentes autos foi remetida ao TAF de Penafiel no dia 27/07/2017– cfr. comprovativo de entrega de documentos, de fls. 2 dos autos;
R) Em 06/10/2017, as liquidações aqui impugnadas encontravam-se parcialmente regularizadas pelo montante de € 5.922,21, encontrando-se em dívida a quantia de € 153.467,78 – cfr. doc. 9 “notas de cobrança Demonstração de Compensação”.
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Com relevância para a decisão da causa não se provou que:
1) A T. forneceu à Impugnante os produtos que constam discriminados nas faturas desconsideradas pela AT, identificadas supra em C) dos factos provados – cfr. faturas de fls. 25 a 40 do PA;
2) As faturas emitidas com o nome da T., registadas na contabilidade da Impugnante no exercício de 2014, titulam operações reais e correspondem a serviços efetivamente fornecidos por si – cfr. faturas de fls. 25 a 40 do PA.
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Motivação
O Tribunal julgou provada a matéria de facto relevante para a decisão da causa com base na análise crítica e conjugada dos documentos juntos aos autos e ao PA, na parte em não foram impugnados, e, bem assim, na parte dos factos alegados pelas partes que não tendo sido impugnados (artigo 74.º da LGT) também são corroborados pelos documentos juntos aos autos (artigo 76.º, n.º 1, da LGT e artigo 362.º e ss., do CC), nos termos identificados a propósito de cada alínea do probatório, conjugados com as regras da experiência comum e com a prova testemunhal produzida.
A matéria de facto não provada resultou da insuficiência ou da falta de prova.
É que o ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos da AT ou dos contribuintes recai sobre quem os invoque (artigo 74.º, n.º 1, da LGT). Outrossim, a dúvida sobre a realidade de um facto e sobre a repartição do ónus da prova resolve-se contra a parte a quem o facto aproveita (artigo 414.º do CPC).
Sendo factos alegados pela Impugnante e constitutivos do seu direito (da invocada ilegalidade das correções realizadas pela AT e das consequentes liquidações), recaía sobre ela o respetivo ónus da prova (artigo 74.º, n.º 1, da LGT).
Para prova dos factos alegados, a Impugnante juntou documentos e arrolou testemunhas.
Os documentos juntos pela Impugnante, desacompanhados de outros documentos e de prova testemunhal satisfatoriamente consistente, credível e materialmente objetiva, revelam-se insuficientes para comprovar que os serviços descritos nas faturas descritas de fls. 25 a 40 do PA titulam operações económicas reais, atinentes a alegados serviços subcontratados de confeção a feitio.
Por esse motivo, o Tribunal considerou não provados os factos descritos em 1) e 2), porquanto não foi produzida pela Impugnante, conforme lhe competia (artigo 74.º, n.º 1, da LGT), prova suficientemente robusta e consistente apta a demonstrar – e, portanto, a convencer o Tribunal – que os serviços descritos nas faturas foram efetivamente prestados pela T. e efetivamente adquiridos pela Impugnante e, por isso, que as faturas em causa titulam operações económicas reais.
É que a Impugnante alega, em abstrato, que os serviços faturados titulam operações reais, mas não foi capaz de demonstrar através da prova que carreou para os autos (documental e testemunhal), minimamente, que assim fosse (também não logrou fazê-lo, saliente-se, durante a ação inspetiva de que foi alvo). Perante a insuficiência de tal prova, como veremos, esses factos têm de ser julgados contra si, isto é, têm de ser julgados não provados, por força do artigo 414.º, do CPC (ex vi artigo 2.º, alínea e), do CPPT).
Desde já se diga que a prova testemunhal produzida pela Impugnante não revelou consistência e assertividade bastantes para abalar a coerência da prova da AT carreada para os autos pelo RIT e, por conseguinte, para convencer o Tribunal que as faturas desconsideradas pelos serviços da AT correspondem a serviços efetivamente prestados pela T., em nome da qual foram emitidas as faturas e registadas na contabilidade da Impugnante. Por seu turno, a AT logrou carrear para o RIT indícios suficientemente objetivos, sólidos, coerentes, consistentes e idóneos a revelar que os serviços descritos nas faturas não foram prestados e, por conseguinte, que tais faturas não titulam operações económicas reais.
Vejamos.
As testemunhas C. e P., funcionários da Impugnante, não lograram demonstrar minimamente, de forma objetiva, coerente e assertiva, que os trabalhos por si executados se reportavam diretamente à T..
Por um lado, a testemunha C., encarregada de confeção da Impugnante, afirmou que a Impugnante trabalhava com outras empresas subcontratadas – designadamente em 2014 (“desde sempre subcontratamos” – o que é corroborado pelas restantes testemunhas e figura evidenciado no RI, no ponto II-C2)) – e que a sua função se cingia a colocar a matéria-prima a confecionar pelas subcontratadas no armazém da Impugnante, para posterior carga, e que esse trabalho não se localizava no mesmo espaço físico das cargas e descargas; que não tinha qualquer contacto com empresas subcontratadas ou com os respetivos funcionários e motoristas, nem exercia qualquer controlo de qualidade. Afirmou que nunca viu nenhum funcionário ou camião da T. nas instalações, e manifestou que desconhece, por completo, esta empresa. Ou seja, a testemunha é uma simples intermediária (e não “intermédia” como, por lapso, a aqui Signatária referiu em sede de audiência de julgamento, porquanto o que aí se queria dizer era que a testemunha atuava numa fase intermédia entre a fase comercial de subcontratação e a carga dos tecidos pelas empresas subcontratadas) que atua entre a fase da subcontratação de empresas de confeção (função que cabia ao Sr. D.) e a fase da carga da matéria-prima a confecionar (a feitio) por essas empresas subcontratadas (matéria-prima que a testemunha previamente selecionava).
Portanto, a partir da descrição que fez do trabalho que executava, não é possível estabelecer uma relação direta com a empresa T., porquanto descreveu as funções que geral e tipicamente executava, sem desvelar qualquer elemento suscetível de demonstrar que conhecia a T., de a identificar nesse processo ou de a discriminar, de alguma forma, face às demais subcontratadas. A descrição que fez das funções que desempenha na Impugnante não nos permite estabelecer qualquer nexo causal com os serviços descritos nas faturas, pois as funções que descreveu podem reportar-se a todas as empresas subcontratadas, que não especificamente à T..
E o mesmo se diga quanto ao depoimento da testemunha P., empregado de armazém da Impugnante, que apenas trabalhava nas cargas e descargas de tecidos e de peças confecionadas. A sua função na Impugnante, que descreveu com pormenor, também vale para qualquer subcontratada (que não apenas para uma alegada empresa T.). Aliás, a testemunha, pese embora tenha afirmado que conhecia o motorista da empresa T. (que “era sempre o mesmo”), acabou por afirmar que “supostamente devia ser funcionário da empresa, digo eu, se ia lá carregar…eu tinha-o como funcionário da empresa”. Portanto, a testemunha também manifestou desconhecer a empresa T. e admitiu que apenas concluiu que as cargas/descargas que efetuava para/de uma carrinha destinavam-se/provinham à/da T. por supor que a pessoa que se apresentava para carregar e descarregar era um funcionário desta empresa. Ou seja, os serviços alegadamente prestados pela T., assentam em juízos conclusivos, opinativos e exclusivamente subjetivos da testemunha, que podem não corresponder, necessariamente, à realidade dos factos.
Por último, a testemunha C., contabilista da Impugnante, também manifestou desconhecer a empresa T., que apenas a conhecia por via das faturas que lhe chegavam ao escritório (que se localiza fora das instalações da Impugnante) pelas mãos do Sr. D., já conferidas por este, e que os pagamentos eram efetuados para um NIB que a empresa indicou. Sublinhou que apenas registava as faturas e que só era responsável pela parte financeira, que não lida com clientes ou subcontratados, só o Sr. D.. O depoimento da testemunha não logrou demonstrar, sequer minimamente, que os serviços descritos nas concretas faturas em causa foram, pois, prestados pela T. à Impugnante.
A prova produzida pela Impugnante é, pois, muito ténue e vaga, não sendo suscetível de demonstrar, com as necessárias objetividade, consistência e idoneidade, que os serviços concretamente descritos nas faturas lhe foram efetivamente prestados e que, por isso, incorreu efetivamente nesse custo.
Já no RIT (não impugnado) encontra-se cabalmente demonstrado que os serviços de inspeção tributária verificaram que entre 2013 e 2014 a sede da T. localizava-se em casas de habitação, sem indícios de aí ser exercida qualquer atividade económica; que a T. não dispunha de uma estrutura empresarial, material e humana, suscetível de prestar os serviços discriminados nas faturas em causa; que não tinha instalações para prestar os serviços faturados; que não tinha consumos de energia registados; que não tinha declarado o pagamento de salários à Segurança Social; e o que o único fornecedor conhecido era a empresa “O PER”, que também não dispunha de meios materiais e humanos para prestar esses serviços (cfr. p. 6 e 7 do RIT).
Por outro lado, evidenciou que o rácio do “rendimento pessoal” de valor visivelmente inferior à média do setor de atividade, ao invés dos restantes rácios declarados, que são manifestamente superiores, indiciam a desnecessidade daquelas prestações de serviços.
Por último, a falta de credibilidade e de verosimilhança da forma como foram descritas e alegadamente estabelecidas as relações comerciais com a T. são manifestas.
É que se extrai do RIT que o gerente da Impugnante, em sede de procedimento inspetivo, informou que “foi contatado na empresa por pessoas que informaram trabalhar para a T., que prestava serviços de confeção” e que “nunca tinha contactado com qualquer responsável da T., nem deslocado às respetivas instalações, sendo o transporte das peças (recolha e entrega) feito por carros da T., mas não se lembra do nome de nenhum dos motoristas, porque não eram sempre os mesmos.” (fls. 9 do RIT).
Na verdade, não é credível que a Impugnante tivesse sido contactada por pessoas que alegadamente trabalhavam para a T. e, sem que as conhecesse e/ou tivesse qualquer outro tipo de relacionamento com maior proximidade e conhecimento dessa empresa e/ou pessoas que a representavam (que não eram sempre os mesmos), encetasse acordos de subcontratação com esta, sem qualquer garantia da produção dos artigos a feitio, da devolução do produto acabado e da qualidade da produção (o que, aliás, poderia comprometer a sua reputação perante os seus clientes).
Face às máximas da vida e às regras da experiência comum, não é verosímil este tipo de relação comercial. A Impugnante não entregaria os seus artigos aos motoristas duma determinada empresa para os levar e confecionar, sem que conhecesse a empresa e/ou os seus responsáveis, quanto mais não seja, como forma de estar assegurada a garantia mínima da devolução dos artigos entregues.
Portanto, a comprovada falta de capacidade da T. para o fornecimento efetivo dos serviços constantes das faturas desconsideradas pela AT, bem como a comprovada inexistência de subcontratação com a T. desses serviços e a falta de credibilidade e verosimilhança da alegada relação comercial subjacente à prestação de serviços pela T., relevam fortes indícios de que as faturas emitidas em nome desta empresa não titulam operações económicas reais.
É que a Impugnante não tem qualquer prova objetiva que comprove que formalizou relações comerciais com a T., que os serviços descritos nas faturas em causa foram efetivamente prestados pela T., nem que essa empresa tinha meios, por si ou por intermédio de outras pessoas e/ou empresas, para prestar esses serviços. Muito menos logrou demonstrar a mínima correspondência entre as peças a feitio contratadas por clientes e os trabalhos a feitio subcontratados (alegadamente) à T. e descritos nas faturas.
Ou seja, a Impugnante não demonstrou que os serviços indicados nas faturas foram efetivamente prestados pela T. ou por alguém subcontratado por si.
Apesar de ter apresentado documentos de transporte e guias de remessa dos artigos entregues aos motoristas da T. e dos meios de pagamento das faturas, cheques e transferências bancárias para a conta dessa empresa, ainda assim entendemos que esses elementos não são suficientes para comprovar a prestação efetiva dos serviços constantes das faturas, porquanto a emissão desses documentos pode inserir-se numa aparência da sua prestação efetiva e não são bastantes para, só por si, infirmar a comprovada falta de meios materiais e humanos da T. para os prestar, tanto mais que também não se demonstrou que tivesse sido subcontratada a sua prestação.
Todas estas circunstâncias, conjugadas com a falta de credibilidade e verosimilhança da alegada relação comercial estabelecida com a T., em particular com o alegado desconhecimento dos responsáveis da empresa e das suas instalações, sendo os negócios realizados através dos motoristas que recolhiam os artigos e entregavam os produtos confecionados, com a discrepância dos rácios de rendimento do pessoal e com a falta de correspondência entre os produtos alegadamente produzidos pela T. e os produtos faturados aos clientes finais, reforçam os fortes indícios que as faturas em causa não titulam operações económicas reais.
Além destes documentos, a única prova disponível foi o depoimento das testemunhas que, apesar de corroborarem os factos alegados na petição inicial, não lograram convencer o Tribunal, como vimos.
Aliás, é de assinalar a discrepância entre os factos invocados pela própria Impugnante no procedimento de inspeção e o depoimento da testemunha P., que abala o referido depoimento e a versão da Impugnante, designadamente na parte em que a testemunha diz que conhecia o motorista da T., que era sempre o mesmo, mas não se lembra do nome do mesmo, versão que contraria a informação da Impugnante no procedimento de inspeção em que disse que não sabia os nomes dos motoristas, que não eram sempre os mesmos. Por outro lado, e como referimos supra, porque os restantes depoimentos não lograram demonstrar que foi a T. que, por si ou por intermédio de outra pessoa ou empresa, prestou os serviços descritos nas faturas, nem que essa empresa tinha capacidade para o fazer, porque não conheciam a empresa, nem nunca a contactaram, limitavam-se a entregar os artigos e a receber os produtos confecionados, sem saber em que circunstâncias é que as mesmas eram produzidas e por quem.
Todavia, este tipo de relação comercial, como se deixou sobredito, não é verosímil face às regras da experiência comum. Não é crível que a Impugnante entregasse os seus artigos a pessoas que se apresentam como motoristas de uma determinada empresa que presta serviços de confeção para os levar e confecionar, sem que conhecesse a empresa e/ou os seus responsáveis, quanto mais não seja, como forma de estar assegurada a garantia mínima da devolução dos artigos entregues ou do produto acabado, e de modo a poder precaver-se face a eventuais incumprimentos ou cumprimentos defeituosos, pela T., do acordo eventualmente estabelecido.
O que é seguro concluir é que a T. não prestou os serviços descritos nas faturas: (i) é que, por um lado, se a Impugnante conhecia a empresa T., então sabia que esta não tinha capacidade para prestar os serviços que constavam das faturas e sabia que esses artigos apesar de, formalmente, estarem a ser entregues à T., materialmente destinavam-se a outra empresa; (ii) por outro lado, se não conhecia a T. e os seus responsáveis, como disse no procedimento de inspeção, então não entregaria os artigos para confeção à pessoa que se apresentava como seu motorista, porque não sabia a quem estava a entregar esses artigos e não tinha qualquer tipo de garantia da devolução dos artigos entregues ou dos produtos confecionados, não havendo nenhuma certeza que os artigos eram efetivamente entregues à T., porque os funcionários da Impugnante limitavam-se a entregar os artigos a uma pessoa que se apresentava como motorista dessa empresa, mas sem saber o seu destino real, nem a entidade alegadamente responsável pela sua confeção, porquanto nunca contactaram com essa empresa, nem com as suas instalações.
Em suma, o que não é verosímil é que a Impugnante entregasse os artigos para confeção à pessoa que se apresentava como motorista da T. sem saber o destino efetivo desses artigos e/ou sem conhecer as pessoas a quem eram entregues, sob pena de não ter qualquer tipo de garantia da sua devolução (e até de poder reagir perante eventuais falhas, incumprimentos ou cumprimentos defeituosos dos serviços subcontratados, junto dos respetivos responsáveis), tanto mais que os seus funcionários também não conheciam essa empresa, nem nunca foram às suas instalações, e desconheciam o destino efetivo desses artigos e o alegado local da sua confeção.
Conjugados todos estes factos e provas produzidas, e perante a inconsistência da versão da Impugnante relativamente à relação comercial que alegadamente mantinha com a T., saem aqui robustecidas as constatações e indícios recolhidos pela inspeção tributária, condensados no RIT, bem como as sua conclusões no sentido de as faturas emitidas à Impugnante e contabilizadas por si em nome da T. não titularem operações económicas reais e não corresponderem a um fornecimento efetivo dos serviços descritos nas visadas faturas.
Mesmo a alegada penhora de direito de crédito não comprova que a T. era um verdadeiro agente económico e que tinha capacidade para prestar os serviços que constavam das faturas. A alegada penhora de direito revela tão só a existência duma dívida dessa empresa.
Em suma, ponderada a prova produzida, a Impugnante não logrou convencer o Tribunal de que a T. lhe forneceu os serviços que constam discriminados nas faturas emitidas em 2014, que foram contabilizadas pela Impugnante. Deste modo, na falta de produção de prova bastante (cfr. artigo 341.º do CC), os factos alegados pela Impugnante (que as faturas em causa titulam operações económicas reais, porque os serviços que delas constam foram efetivamente fornecidos pela T. em nome da qual foram emitidas as faturas), enquanto factos constitutivos do seu direito e sobre quem recaía o respetivo ónus da prova, têm de ser julgados contra si (artigos 74.º, n.º 1, da LGT e 414.º, do CPC), isto é, têm de ser julgados não provados, tal como consta dos pontos 1) e 2).
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A restante matéria alegada pelas partes não foi julgada provada ou não provada por constituir conceito de direito, matéria conclusiva ou não relevar para a decisão da causa.
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II.2. Fundamentação de Direito
Importa apreciar se a sentença recorrida padece dos erros de julgamento que lhe são imputados pela Recorrente.
Começa a Recorrente por se insurgir com o que entende ser a falta de fundamentação substancial da liquidação de IRC de 2014, argumentando nas conclusões a a j do seu recurso que a ATA não provou indícios suficientes que permitam suportar a liquidação, tendo-se limitado a enunciar “factos sustentadores de ilações e juízos meramente conclusivos, baseados sobretudo em elementos e factos relativos a empresas contratantes” (conclusão e), e que “A base praticamente integral da suposta fundamentação das correções efetuadas está relacionada com a referencia a elementos coligidos em processos e procedimentos relativos á empresa emitente das faturas, T., LDA, pouco ou nada havendo de concreto no que toca especificamente à Impugnante” (conclusão i), quando era à ATA que cabia o ónus da prova nesta matéria, pelo que a liquidação padece, na sua tese, de erro de facto nos pressupostos, e a sentença, correlativamente, de erro de julgamento de direito, por não ter determinado a respetiva anulação com este fundamento.
Vejamos se tem razão.
Com relevância para a apreciação desta questão, consta da sentença a fundamentação que se passa a reproduzir.
b) Do erro sobre os pressupostos de facto e de direito
(…)
In casu, como se deixou evidenciado na motivação da matéria de facto, essa prova da AT encontra-se amplamente evidenciada e demonstrada no RIT, e consubstancia-se, sobretudo, na circunstância de a T. não possuir meios humanos e materiais, nem uma estrutura empresarial adequada a fornecer esses serviços – o que, aliás, viria a ser corroborado em Tribunal, porquanto a Impugnante não logrou demonstrar o contrário (designadamente através das testemunhas que arrolou) –, bem como a circunstância do valor do rácio “rendimento pessoal” declarado pelo sujeito passivo se afastar de forma muito acentuada do valor do rácio do sector de atividade (CAE 13920), quer ainda da média para a unidade orgânica, quer da média nacional, o que afasta a necessidade de nesse exercício, recorrer a subcontratados para a execução de trabalho a feitio (cfr. ponto II-F) Conclusão, do RIT) – note-se que a Impugnante encontra-se enquadrada no CAE 13920, e que no ano em causa prestou sobretudo serviços de “acabamentos” (trabalho a feitio) em atoalhados e roupa de banho; ora, se é certo que o CAE em causa abrange também a confeção e a comercialização de artigos têxteis, e que o valor acrescentado desta é superior à dos trabalhos a feitio, ainda assim a desproporção das médias evidenciadas no RIT é bastante considerável. Ao que se juntou, nesse juízo da AT, a circunstância de o gerente da Impugnante apenas ter apresentado, como prova da prestação efetiva desses serviços pela T. e correspetiva aquisição dos mesmos pela Impugnante, documentos de transporte. É certo que esses documentos de transporte correspondem aos serviços descritos nas faturas, porém, não permitiram estabelecer uma relação inequívoca entre as peças alegadamente confecionadas pela T. e as peças faturadas pela Impugnante aos seus clientes, uma vez que a Impugnante também confeciona o mesmo tipo de peças e porque nas faturas emitidas aos clientes usa outras referências (as referências dos clientes).
A estes factos narrados no RIT acrescem as inverosimilhanças que respaldam da prova produzida pela Impugnante, designadamente a forma não credível como se terá estabelecido e desenvolvido a sua relação comercial com a T., não sendo crível que a Impugnante não conhecesse a falta de capacidade da T. para fornecer os respetivos serviços ou, se não a conhecesse, que entregasse a motoristas os artigos para confeção, sem qualquer tipo de garantia da devolução dos artigos entregues ou dos produtos confecionados, bem como para se precaver face a eventuais incumprimentos/cumprimentos defeituosos da confeção das peças, não havendo nenhuma certeza que os artigos eram efetivamente entregues à T., pois até os funcionários da Impugnante desconheciam por completo esta empresa, limitando-se a entregar os artigos a uma pessoa que se apresentava como motorista, mas sem saber o seu real destino. Ademais, a existência dos documentos de transporte não tem a virtualidade de, só por si, abalar as conclusões que antecedem e de provar que os serviços foram efetivamente prestados, pois esses documentos, a par com as faturas, podiam ter sido criados apenas com o intuito de criar uma (falsa) aparência de realidade e de legalidade das operações neles descritas.
Vislumbrando-se no RIT (e nos autos) prova consistente da existência de fortes, sérios e bastantes indícios que as faturas emitidas em nome da T., registadas na contabilidade da Impugnante no ano de 2014, não titulam operações económicas reais, está afastada a presunção de veracidade da sua escrita (artigo 75.º da LGT) e formal e materialmente fundamentada a decisão de não aceitar a dedução fiscal desses gastos, ou seja, do valor dessas faturas (cfr. artigos 23.º e 23.º-A, do CIRC).
(…)
Com efeito, e como é referido na sentença em apreciação, no ponto II – D2) do RIT (cf. ponto E, da fundamentação de facto) é referido um conjunto de factos que suportam a conclusão de que as faturas desconsideradas não “consubstanciaram verdadeiras prestações de serviços” por parte da T., factos esses recolhidos pelos SIT em inspeções efetuadas à mesma relativamente aos exercícios de 2012 a 2014, a saber, a sua sede não tinha condições para o exercício de qualquer tipo de atividade, tratando-se de uma casa de habitação e uns anexos usados como arrumos, contendo diversos materiais de uso comum, e não materiais usados na confeção, não existindo ali qualquer estrutura, administrativa ou industrial, necessária ao exercício da atividade; não tinha a seu cargo nenhum trabalhador; não tinha qualquer contrato de fornecimento de energia elétrica; as despesas básicas necessárias ao exercício da atividade foram debitadas por uma empresa sem estrutura para fornecer os serviços em questão; alguns dos “utilizadores” de faturas por ela emitidas desconsideraram voluntariamente o respetivo valor em sede de IRC e IVA com o envio de declarações de substituição; e o seu principal fornecedor, a empresa O PER, também não tinha uma estrutura empresarial para gerar os bens ou serviços faturados, tudo isto circunstanciado através de factos concretos elencados a páginas 7 e 8 do RIT referente à liquidação de IRC de 2014 aqui em apreciação.
Donde resulta ter sido coligido pelos SIT um conjunto de indícios sérios de que a emitente das faturas desconsideradas não tinha condições para prestar os serviços nelas faturados, tendo a ATA cumprido o que lhe era exigido quanto ónus probatório que sobre si recaía, como de resto resulta da abundante jurisprudência dos tribunais superiores citada na sentença em crise.
De facto, e lançando mão da jurisprudência emanada do Acórdão do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, proferido em 2016-11-16 no proc. 0600/15 “Para que a AT proceda à correcção do lucro tributável por desconsideração dos custos suportados por facturas existentes na escrita do contribuinte e relativamente às quais considera não se terem efectivamente realizado as operações nelas consubstanciadas, não tem de fazer prova da existência de acordo simulatório (existência de divergência entre a declaração e a vontade negocial das partes por força de acordo entre o declarante e o declaratário, no intuito de enganar terceiros – cfr. art. 240.º do CC) para satisfazer o ónus de prova que sobre si impende. (…) Basta à AT provar a factualidade que a levou a não aceitar esses custos, factualidade essa que tem de ser susceptível de abalar a presunção de veracidade das operações constantes da escrita do contribuinte e dos respectivos documentos de suporte, só então passando a competir ao contribuinte o ónus de prova do direito de que se arroga (o de exercer o direito de deduzir os custos ao lucro tributável) e que não é reconhecido pela AT, ou seja, o ónus de prova de que as operações se realizaram efectivamente e ocorrem os pressupostos de que depende o seu direito àquela dedução.” (destacado nosso; cf., no mesmo sentido, os acórdãos do Pleno da Secção de CT do STA proferidos em 19-10-2016, no proc. n.º 0511/15 e em 2019-02-27, no proc. 01424/05.2BEVIS 0292/18, ambos disponíveis para consulta em www.dgsi.pt).
Ora, e como resulta profusamente documentado na jurisprudência dos nossos tribunais superiores, essa prova será meramente indiciária, bastando que a ATA demonstre, como é o caso nos autos, “os indícios de falsidade e que estes são consistentes, sérios e reveladores de uma alta probabilidade de que as faturas são «falsas»”, com o que cumprirá o seu ónus probatório (cf., designadamente, o Acórdão proferido por este Tribunal Central Administrativo Norte em 2020-03-05, no proc. 00177/17.6BEPNF, disponível para consulta em www.dgsi.pt).
De facto, “no que concerne à prova que compete à Administração, o que é imprescindível é que aquela a faça de factos suficientemente indiciadores a que o Tribunal possa concluir, em virtude de leis naturais conhecidas pelos homens e que funcionam como máximas de experiência, pela elevada probabilidade (ou até certeza) de que o negócio declarado por aquelas partes não corresponde à realidade materializada naquela factura”, sendo certo que, e ao contrário do que pretende a Recorrente, a ATA poderá nessa tarefa, como é aqui o caso “lançar mão de elementos obtidos com recurso à fiscalização cruzada, junto de outros contribuintes, para obter os referidos indícios, pelo que tais indicadores de falsidade das facturas não têm necessariamente que advir de elementos do próprio contribuinte fiscalizado” (cf. o Acórdão proferido pelo TCAS em 2017-05-25, no proc. 08666/15, e no mesmo sentido, designadamente, os Acórdãos proferidos pelo TCAS em 2019-02-14, no proc. 509/09.0BELRA, em 2019-04-11, no proc. 1834/10.3BESNT, ambos disponíveis para consulta em www.dgsi.pt).
Por outro lado, sublinhe-se que de entre os indícios reveladores da alta probabilidade de falsidade das faturas, avultam, como não podia deixar de ser, aqueles que conduzem à conclusão de a respetiva emitente não possui a estrutura empresarial necessária à prestação dos serviços evidenciados nas faturas desconsideradas.
Ou seja, e concluindo, tendo a ATA reunido indícios sérios de que a empresa que emitiu as faturas referentes aos custos desconsiderados não prestou os serviços supostamente titulados pelas mesmas, o que, como foi já referido, estava autorizada a fazer com recurso a fiscalização cruzada, nada há a censurar à sentença proferida pelo Tribunal a quo neste segmento.
Prossegue a Recorrente insurgindo-se com o facto de no RIT ser valorizada a existência de uma divergência entre o rácio “rendimento pessoal” declarado pelo sujeito passivo e o rácio do sector, por entender que “tal desvio resulta da realidade da actividade desenvolvida, jamais permitindo, naturalmente, a conclusão pretendida” (conclusão k).
Por outro lado, argumenta que a ATA e o Tribunal deveriam ter valorizado os documentos que apresentou e a explicação que ofereceu para os mesmos, no caso, documentos de transporte, cópias de guias de remessa, assim como ao facto de ter efetuado pagamentos referentes às faturas em causa por cheque ou transferência bancária para uma conta titulada pela T. (conclusões l a r), insistindo no entendimento de que não bastava que a liquidação se baseasse em “em factores exógenos e laterais e, essencialmente, em elementos da entidade emitente das facturas limitando-se a analisar a contabilidade, declarações e actuação da entidade emitente, como se a Impugnante pudesse ou devesse controlar o comportamento das pessoas com quem contacta ou contrata” (conclusão p).
E persevera neste argumento, referindo não poder aceitar “que o ónus da Fazenda Pública se baste com a recolha de indícios de falsidade relativamente aos emitentes das facturas, pois levaria a que os utilizadores das facturas falsas, que não sabem que o são, não pudessem deduzir custos ou efetuar deduções relativas a valores que efectivamente suportaram, sem que tivessem participado em qualquer esquema fraudulento” (conclusão r).
Vejamos então.
Quanto à questão da divergência entre o rácio “rendimento pessoal” declarado pelo sujeito passivo e o rácio do sector, o que resulta da leitura atenta do RIT é que em causa está claramente de um argumento secundário, ou de apoio à argumentação principal ali despendida, e que repousa, essencialmente, na circunstância de se terem apurado indícios sérios de que as faturas desconsideradas são falsas, não tendo os serviços a que se referem sido prestados, desde logo porque a respetiva emitente das faturas desconsideradas não possuía uma estrutura empresarial que o permitisse.
Por outro lado, esta questão foi assim cuidadosamente sopesada na sentença em apreço, tendo sido enquadrada no conjunto das circunstâncias apuradas, maxime, à “falta de credibilidade e verosimilhança da alegada relação comercial estabelecida com a T.”.
Com efeito, resulta da sentença a este propósito o seguinte (destacado nosso):
In casu, como se deixou evidenciado na motivação da matéria de facto, essa prova da AT encontra-se amplamente evidenciada e demonstrada no RIT, e consubstancia-se, sobretudo, na circunstância de a T. não possuir meios humanos e materiais, nem uma estrutura empresarial adequada a fornecer esses serviços – o que, aliás, viria a ser corroborado em Tribunal, porquanto a Impugnante não logrou demonstrar o contrário (designadamente através das testemunhas que arrolou) –, bem como a circunstância do valor do rácio “rendimento pessoal” declarado pelo sujeito passivo se afastar de forma muito acentuada do valor do rácio do sector de atividade (CAE 13920), quer ainda da média para a unidade orgânica, quer da média nacional, o que afasta a necessidade de nesse exercício, recorrer a subcontratados para a execução de trabalho a feitio (cfr. ponto II-F) Conclusão, do RIT) – note-se que a Impugnante encontra-se enquadrada no CAE 13920, e que no ano em causa prestou sobretudo serviços de “acabamentos” (trabalho a feitio) em atoalhados e roupa de banho; ora, se é certo que o CAE em causa abrange também a confeção e a comercialização de artigos têxteis, e que o valor acrescentado desta é superior à dos trabalhos a feitio, ainda assim a desproporção das médias evidenciadas no RIT é bastante considerável. Ao que se juntou, nesse juízo da AT, a circunstância de o gerente da Impugnante apenas ter apresentado, como prova da prestação efetiva desses serviços pela T. e correspetiva aquisição dos mesmos pela Impugnante, documentos de transporte. É certo que esses documentos de transporte correspondem aos serviços descritos nas faturas, porém, não permitiram estabelecer uma relação inequívoca entre as peças alegadamente confecionadas pela T. e as peças faturadas pela Impugnante aos seus clientes, uma vez que a Impugnante também confeciona o mesmo tipo de peças e porque nas faturas emitidas aos clientes usa outras referências (as referências dos clientes).
A estes factos narrados no RIT acrescem as inverosimilhanças que respaldam da prova produzida pela Impugnante, designadamente a forma não credível como se terá estabelecido e desenvolvido a sua relação comercial com a T., não sendo crível que a Impugnante não conhecesse a falta de capacidade da T. para fornecer os respetivos serviços ou, se não a conhecesse, que entregasse a motoristas os artigos para confeção, sem qualquer tipo de garantia da devolução dos artigos entregues ou dos produtos confecionados, bem como para se precaver face a eventuais incumprimentos/cumprimentos defeituosos da confeção das peças, não havendo nenhuma certeza que os artigos eram efetivamente entregues à T., pois até os funcionários da Impugnante desconheciam por completo esta empresa, limitando-se a entregar os artigos a uma pessoa que se apresentava como motorista, mas sem saber o seu real destino. Ademais, a existência dos documentos de transporte não tem a virtualidade de, só por si, abalar as conclusões que antecedem e de provar que os serviços foram efetivamente prestados, pois esses documentos, a par com as faturas, podiam ter sido criados apenas com o intuito de criar uma (falsa) aparência de realidade e de legalidade das operações neles descritas.
Quanto aos documentos que a Recorrente apresentou (no âmbito do procedimento de inspeção tributária) e à explicação que ofereceu para os mesmos, não é correta a asserção que faz de que o Tribunal e a ATA não terão retirado as devidas consequências dos mesmos, pois a sentença não deixou de apreciar e ponderar a referida documentação, também ela no conjunto da prova produzida.
Com efeito, sobre esta questão é referido na sentença em apreço o seguinte, no segmento em que explicita, de modo circunstanciado, os fundamentos que foram decisivos para a formação da convicção do julgador, na apreciação do conjunto da prova (destacado nosso):
Os documentos juntos pela Impugnante, desacompanhados de outros documentos e de prova testemunhal satisfatoriamente consistente, credível e materialmente objetiva, revelam-se insuficientes para comprovar que os serviços descritos nas faturas descritas de fls. 25 a 40 do PA titulam operações económicas reais, atinentes a alegados serviços subcontratados de confeção a feitio.
Por esse motivo, o Tribunal considerou não provados os factos descritos em 1) e 2), porquanto não foi produzida pela Impugnante, conforme lhe competia (artigo 74.º, n.º 1, da LGT), prova suficientemente robusta e consistente apta a demonstrar – e, portanto, a convencer o Tribunal – que os serviços descritos nas faturas foram efetivamente prestados pela T. e efetivamente adquiridos pela Impugnante e, por isso, que as faturas em causa titulam operações económicas reais.
É que a Impugnante alega, em abstrato, que os serviços faturados titulam operações reais, mas não foi capaz de demonstrar através da prova que carreou para os autos (documental e testemunhal), minimamente, que assim fosse (também não logrou fazê-lo, saliente-se, durante a ação inspetiva de que foi alvo). Perante a insuficiência de tal prova, como veremos, esses factos têm de ser julgados contra si, isto é, têm de ser julgados não provados, por força do artigo 414.º, do CPC (ex vi artigo 2.º, alínea e), do CPPT).
Desde já se diga que a prova testemunhal produzida pela Impugnante não revelou consistência e assertividade bastantes para abalar a coerência da prova da AT carreada para os autos pelo RIT e, por conseguinte, para convencer o Tribunal que as faturas desconsideradas pelos serviços da AT correspondem a serviços efetivamente prestados pela T., em nome da qual foram emitidas as faturas e registadas na contabilidade da Impugnante. Por seu turno, a AT logrou carrear para o RIT indícios suficientemente objetivos, sólidos, coerentes, consistentes e idóneos a revelar que os serviços descritos nas faturas não foram prestados e, por conseguinte, que tais faturas não titulam operações económicas reais.
Vejamos.
As testemunhas C. e P., funcionários da Impugnante, não lograram demonstrar minimamente, de forma objetiva, coerente e assertiva, que os trabalhos por si executados se reportavam diretamente à T..
Por um lado, a testemunha C., encarregada de confeção da Impugnante, afirmou que a Impugnante trabalhava com outras empresas subcontratadas – designadamente em 2014 (“desde sempre subcontratamos” – o que é corroborado pelas restantes testemunhas e figura evidenciado no RI, no ponto II-C2)) – e que a sua função se cingia a colocar a matéria-prima a confecionar pelas subcontratadas no armazém da Impugnante, para posterior carga, e que esse trabalho não se localizava no mesmo espaço físico das cargas e descargas; que não tinha qualquer contacto com empresas subcontratadas ou com os respetivos funcionários e motoristas, nem exercia qualquer controlo de qualidade. Afirmou que nunca viu nenhum funcionário ou camião da T. nas instalações, e manifestou que desconhece, por completo, esta empresa. Ou seja, a testemunha é uma simples intermediária (e não “intermédia” como, por lapso, a aqui Signatária referiu em sede de audiência de julgamento, porquanto o que aí se queria dizer era que a testemunha atuava numa fase intermédia entre a fase comercial de subcontratação e a carga dos tecidos pelas empresas subcontratadas) que atua entre a fase da subcontratação de empresas de confeção (função que cabia ao Sr. D.) e a fase da carga da matéria-prima a confecionar (a feitio) por essas empresas subcontratadas (matéria-prima que a testemunha previamente selecionava).
Portanto, a partir da descrição que fez do trabalho que executava, não é possível estabelecer uma relação direta com a empresa T., porquanto descreveu as funções que geral e tipicamente executava, sem desvelar qualquer elemento suscetível de demonstrar que conhecia a T., de a identificar nesse processo ou de a discriminar, de alguma forma, face às demais subcontratadas. A descrição que fez das funções que desempenha na Impugnante não nos permite estabelecer qualquer nexo causal com os serviços descritos nas faturas, pois as funções que descreveu podem reportar-se a todas as empresas subcontratadas, que não especificamente à T..
E o mesmo se diga quanto ao depoimento da testemunha P., empregado de armazém da Impugnante, que apenas trabalhava nas cargas e descargas de tecidos e de peças confecionadas. A sua função na Impugnante, que descreveu com pormenor, também vale para qualquer subcontratada (que não apenas para uma alegada empresa T.). Aliás, a testemunha, pese embora tenha afirmado que conhecia o motorista da empresa T. (que “era sempre o mesmo”), acabou por afirmar que “supostamente devia ser funcionário da empresa, digo eu, se ia lá carregar…eu tinha-o como funcionário da empresa”. Portanto, a testemunha também manifestou desconhecer a empresa T. e admitiu que apenas concluiu que as cargas/descargas que efetuava para/de uma carrinha destinavam-se/provinham à/da T. por supor que a pessoa que se apresentava para carregar e descarregar era um funcionário desta empresa. Ou seja, os serviços alegadamente prestados pela T., assentam em juízos conclusivos, opinativos e exclusivamente subjetivos da testemunha, que podem não corresponder, necessariamente, à realidade dos factos.
Por último, a testemunha C., contabilista da Impugnante, também manifestou desconhecer a empresa T., que apenas a conhecia por via das faturas que lhe chegavam ao escritório (que se localiza fora das instalações da Impugnante) pelas mãos do Sr. D., já conferidas por este, e que os pagamentos eram efetuados para um NIB que a empresa indicou. Sublinhou que apenas registava as faturas e que só era responsável pela parte financeira, que não lida com clientes ou subcontratados, só o Sr. D.. O depoimento da testemunha não logrou demonstrar, sequer minimamente, que os serviços descritos nas concretas faturas em causa foram, pois, prestados pela T. à Impugnante.
A prova produzida pela Impugnante é, pois, muito ténue e vaga, não sendo suscetível de demonstrar, com as necessárias objetividade, consistência e idoneidade, que os serviços concretamente descritos nas faturas lhe foram efetivamente prestados e que, por isso, incorreu efetivamente nesse custo.
Já no RIT (não impugnado) encontra-se cabalmente demonstrado que os serviços de inspeção tributária verificaram que entre 2013 e 2014 a sede da T. localizava-se em casas de habitação, sem indícios de aí ser exercida qualquer atividade económica; que a T. não dispunha de uma estrutura empresarial, material e humana, suscetível de prestar os serviços discriminados nas faturas em causa; que não tinha instalações para prestar os serviços faturados; que não tinha consumos de energia registados; que não tinha declarado o pagamento de salários à Segurança Social; e o que o único fornecedor conhecido era a empresa “O PER”, que também não dispunha de meios materiais e humanos para prestar esses serviços (cfr. p. 6 e 7 do RIT).
Por outro lado, evidenciou que o rácio do “rendimento pessoal” de valor visivelmente inferior à média do setor de atividade, ao invés dos restantes rácios declarados, que são manifestamente superiores, indiciam a desnecessidade daquelas prestações de serviços.
Por último, a falta de credibilidade e de verosimilhança da forma como foram descritas e alegadamente estabelecidas as relações comerciais com a T. são manifestas.
É que se extrai do RIT que o gerente da Impugnante, em sede de procedimento inspetivo, informou que “foi contatado na empresa por pessoas que informaram trabalhar para a T., que prestava serviços de confeção” e que “nunca tinha contactado com qualquer responsável da T., nem deslocado às respetivas instalações, sendo o transporte das peças (recolha e entrega) feito por carros da T., mas não se lembra do nome de nenhum dos motoristas, porque não eram sempre os mesmos.” (fls. 9 do RIT).
Na verdade, não é credível que a Impugnante tivesse sido contactada por pessoas que alegadamente trabalhavam para a T. e, sem que as conhecesse e/ou tivesse qualquer outro tipo de relacionamento com maior proximidade e conhecimento dessa empresa e/ou pessoas que a representavam (que não eram sempre os mesmos), encetasse acordos de subcontratação com esta, sem qualquer garantia da produção dos artigos a feitio, da devolução do produto acabado e da qualidade da produção (o que, aliás, poderia comprometer a sua reputação perante os seus clientes).
Face às máximas da vida e às regras da experiência comum, não é verosímil este tipo de relação comercial. A Impugnante não entregaria os seus artigos aos motoristas duma determinada empresa para os levar e confecionar, sem que conhecesse a empresa e/ou os seus responsáveis, quanto mais não seja, como forma de estar assegurada a garantia mínima da devolução dos artigos entregues.
Portanto, a comprovada falta de capacidade da T. para o fornecimento efetivo dos serviços constantes das faturas desconsideradas pela AT, bem como a comprovada inexistência de subcontratação com a T. desses serviços e a falta de credibilidade e verosimilhança da alegada relação comercial subjacente à prestação de serviços pela T., relevam fortes indícios de que as faturas emitidas em nome desta empresa não titulam operações económicas reais.
É que a Impugnante não tem qualquer prova objetiva que comprove que formalizou relações comerciais com a T., que os serviços descritos nas faturas em causa foram efetivamente prestados pela T., nem que essa empresa tinha meios, por si ou por intermédio de outras pessoas e/ou empresas, para prestar esses serviços. Muito menos logrou demonstrar a mínima correspondência entre as peças a feitio contratadas por clientes e os trabalhos a feitio subcontratados (alegadamente) à T. e descritos nas faturas.
Ou seja, a Impugnante não demonstrou que os serviços indicados nas faturas foram efetivamente prestados pela T. ou por alguém subcontratado por si.
Apesar de ter apresentado documentos de transporte e guias de remessa dos artigos entregues aos motoristas da T. e dos meios de pagamento das faturas, cheques e transferências bancárias para a conta dessa empresa, ainda assim entendemos que esses elementos não são suficientes para comprovar a prestação efetiva dos serviços constantes das faturas, porquanto a emissão desses documentos pode inserir-se numa aparência da sua prestação efetiva e não são bastantes para, só por si, infirmar a comprovada falta de meios materiais e humanos da T. para os prestar, tanto mais que também não se demonstrou que tivesse sido subcontratada a sua prestação.
Todas estas circunstâncias, conjugadas com a falta de credibilidade e verosimilhança da alegada relação comercial estabelecida com a T., em particular com o alegado desconhecimento dos responsáveis da empresa e das suas instalações, sendo os negócios realizados através dos motoristas que recolhiam os artigos e entregavam os produtos confecionados, com a discrepância dos rácios de rendimento do pessoal e com a falta de correspondência entre os produtos alegadamente produzidos pela T. e os produtos faturados aos clientes finais, reforçam os fortes indícios que as faturas em causa não titulam operações económicas reais.
Além destes documentos, a única prova disponível foi o depoimento das testemunhas que, apesar de corroborarem os factos alegados na petição inicial, não lograram convencer o Tribunal, como vimos.
Aliás, é de assinalar a discrepância entre os factos invocados pela própria Impugnante no procedimento de inspeção e o depoimento da testemunha P., que abala o referido depoimento e a versão da Impugnante, designadamente na parte em que a testemunha diz que conhecia o motorista da T., que era sempre o mesmo, mas não se lembra do nome do mesmo, versão que contraria a informação da Impugnante no procedimento de inspeção em que disse que não sabia os nomes dos motoristas, que não eram sempre os mesmos. Por outro lado, e como referimos supra, porque os restantes depoimentos não lograram demonstrar que foi a T. que, por si ou por intermédio de outra pessoa ou empresa, prestou os serviços descritos nas faturas, nem que essa empresa tinha capacidade para o fazer, porque não conheciam a empresa, nem nunca a contactaram, limitavam-se a entregar os artigos e a receber os produtos confecionados, sem saber em que circunstâncias é que as mesmas eram produzidas e por quem.
Todavia, este tipo de relação comercial, como se deixou sobredito, não é verosímil face às regras da experiência comum. Não é crível que a Impugnante entregasse os seus artigos a pessoas que se apresentam como motoristas de uma determinada empresa que presta serviços de confeção para os levar e confecionar, sem que conhecesse a empresa e/ou os seus responsáveis, quanto mais não seja, como forma de estar assegurada a garantia mínima da devolução dos artigos entregues ou do produto acabado, e de modo a poder precaver-se face a eventuais incumprimentos ou cumprimentos defeituosos, pela T., do acordo eventualmente estabelecido.
O que é seguro concluir é que a T. não prestou os serviços descritos nas faturas: (i) é que, por um lado, se a Impugnante conhecia a empresa T., então sabia que esta não tinha capacidade para prestar os serviços que constavam das faturas e sabia que esses artigos apesar de, formalmente, estarem a ser entregues à T., materialmente destinavam-se a outra empresa; (ii) por outro lado, se não conhecia a T. e os seus responsáveis, como disse no procedimento de inspeção, então não entregaria os artigos para confeção à pessoa que se apresentava como seu motorista, porque não sabia a quem estava a entregar esses artigos e não tinha qualquer tipo de garantia da devolução dos artigos entregues ou dos produtos confecionados, não havendo nenhuma certeza que os artigos eram efetivamente entregues à T., porque os funcionários da Impugnante limitavam-se a entregar os artigos a uma pessoa que se apresentava como motorista dessa empresa, mas sem saber o seu destino real, nem a entidade alegadamente responsável pela sua confeção, porquanto nunca contactaram com essa empresa, nem com as suas instalações.
Em suma, o que não é verosímil é que a Impugnante entregasse os artigos para confeção à pessoa que se apresentava como motorista da T. sem saber o destino efetivo desses artigos e/ou sem conhecer as pessoas a quem eram entregues, sob pena de não ter qualquer tipo de garantia da sua devolução (e até de poder reagir perante eventuais falhas, incumprimentos ou cumprimentos defeituosos dos serviços subcontratados, junto dos respetivos responsáveis), tanto mais que os seus funcionários também não conheciam essa empresa, nem nunca foram às suas instalações, e desconheciam o destino efetivo desses artigos e o alegado local da sua confeção.
Conjugados todos estes factos e provas produzidas, e perante a inconsistência da versão da Impugnante relativamente à relação comercial que alegadamente mantinha com a T., saem aqui robustecidas as constatações e indícios recolhidos pela inspeção tributária, condensados no RIT, bem como as sua conclusões no sentido de as faturas emitidas à Impugnante e contabilizadas por si em nome da T. não titularem operações económicas reais e não corresponderem a um fornecimento efetivo dos serviços descritos nas visadas faturas.
Mesmo a alegada penhora de direito de crédito não comprova que a T. era um verdadeiro agente económico e que tinha capacidade para prestar os serviços que constavam das faturas. A alegada penhora de direito revela tão só a existência duma dívida dessa empresa.
Ou seja, o que a sentença revela, em particular no excerto transcrito, mas também ao longo do segmento dedicado à subsunção dos factos ao direito contante da fundamentação de direito, é uma apreciação e ponderação cuidadosa da prova produzida no seu todo, resultando ali explicitados à saciedade os motivos pelos quais o Tribunal não se convenceu com a prova, também documental, produzida pela ali Impugnante, e aqui Recorrente.
Por outro lado, a ponderação que ali é feita da totalidade da prova produzida no processo é corretamente enquadrada no direito aplicável, no que se refere às regras da repartição do ónus probatório, ali se concluindo, corretamente, que tendo a ATA cumprido o seu ónus de elencar indícios sérios que suportavam a conclusão de que os serviços titulados pelas faturas desconsideradas não foram prestados, a Recorrente não logrou preencher o seu ónus, que era aqui o de provar, para além de qualquer dúvida, a substância das prestações de serviços em causa.
Com efeito, “quando a Administração Tributária desconsidera facturas que reputa de falsas, aplicam-se as regras do ónus da prova do artigo 74.º da LGT, competindo à Administração fazer prova de que estão verificados os pressupostos legais que legitimam a sua actuação, ou seja, de que existem indícios sérios de que a operação constante da factura não corresponde à realidade. Feita esta prova, passa a recair sobre o sujeito passivo o ónus da prova da veracidade da transacção” (cf. Acórdão proferido pelo TCAS em 2019-10-31, no proc. 1729/14.1BELRA, disponível para consulta em www.dgsi.pt).
Não é por isso correta a afirmação feita pela Recorrente que a sentença se sustentou “em factores exógenos e laterais e, essencialmente, em elementos da entidade emitente das facturas limitando-se a analisar a contabilidade, declarações e actuação da entidade emitente (…)”, pois o que se constata é que a prova que a Recorrente aportou ao processo foi apreciada exaustivamente na sentença.
Quanto à prova documental, importará acrescentar que a sentença fez uma correta contextualização da mesma, atendendo a que, como é sabido, “O fenómeno da facturação falsa é, muitas vezes, acompanhado pela preocupação em documentar todo o circuito de pagamento através de cheques, com cópias dos documentos emitidos, de forma a que se estabeleça a exacta correspondência entre a factura e o meio de pagamento. Contudo, este circuito documental não tem a suportá-lo, muitas vezes, o correspondente circuito financeiro ou do dinheiro, tratando-se, por isso, de uma mera aparência de pagamentos e recebimentos” (cf. Acórdão do TCAS proferido em 2019-10-31, no proc. 08666/15, disponível para consulta em www.dgsi.pt).
Importa ainda sublinhar que a Impugnante, aqui Recorrente, na respetiva PI nada alega em concreto quanto ao alegado transporte e pagamento das supostas transações tituladas pelas faturas desconsideradas, o mesmo se passando relativamente à alegada penhora de créditos.
Por fim, de referir que num contexto de faturação falsa, como é o caso, e e atendendo à circunstância de a Recorrente não ter logrado provar, como lhe cabia, a substancialidade das prestações de serviço tituladas pelas faturas desconsideradas, a existência na sua contabilidade de um alegado crédito detido sobre a emitente das referidas faturas, não seria de molde a inverter a decisão que recaiu sobre a prova produzida nos autos, por se tratar, assim, de um documento interno à Recorrente.
Por fim, a ora Recorrente conclui o seu Recurso insurgindo-se contra o facto de, na sua tese, o Tribunal a quo não ter levado à matéria assente alguns factos que entende terem sido provados, e ter considerado como não provados os factos 1 e 2 (conclusões s a gg).
Quanto a esta questão importa, antes de mais, sublinhar que não só na respetiva PI a Recorrente não alega qualquer facto concreto, como também nas suas conclusões de recurso pretende que sejam dados por provados, não quaisquer factos concretos, mas meras conclusões, ou ilações, que não encontram sustento em factualidade concreta que tenha sido sequer por si alegada.
Com efeito, sobre a sua relação comercial com a T., limita-se na PI a referir, nos artigos 30.º a 35.º, que “a Impugnante, desconhecia os termos em que a "T. ... exercia, concreta e especificamente, a sua actividade económica, nomeadamente se esta sociedade possuía a adequada estrutura física para a exercer” (cf. art. 30.º), “a Impugnante dedica-se à fabricação de artigos têxteis e a sua comercialização, centrando-se a sua actividade na prestação de serviços "acabamentos" em atoalhados e roupa de banho realizados em artigos fornecidos pelo cliente final e subsequente entrega ao mesmo após realização dos trabalhos de acabamento necessários (trabalho a feitio) (art. 31.º), “Recorre, essencialmente, a subcontratação de entidades terceiras.” (art. 32.º); “Contratou, nomeadamente, a T. para esse efeito.” (art. 33.º); “Os artigos saíram das suas instalações com as correspondentes guias de remessa e transporte.” (art. 34.º); “E regressaram às suas instalações, já transformados, acompanhados das respectivas guias de remessa e transporte.” (art. 35.º)
Ou seja, nada de específico é concretizado e alegado que permita concluir pela efetiva realização das prestações de serviços desconsideradas, a saber, que artigos saíram das suas instalações, quando e como, que guias de remessa titularam o transporte de que artigos, quem efetuou o transporte, exatamente que serviços foram prestados, e exatamente quando e como regressaram cada um desses artigos às suas instalações.
Com efeito, apenas a alegação circunstanciada de factos concretos permitiria a produção de prova adequada a habilitar o Tribunal a quo a retirar as pretendidas ilações, maxime, no sentido de concluir que as prestações de serviços tituladas pelas faturas desconsideradas realmente ocorreram.
Ora, o que pretende, nas suas alegações de recurso, é também que este Tribunal conclua pela “prova” não de factos concretos, mas sim de conclusões, no caso, que “A T. forneceu à impugnante os produtos que constam das faturas desconsideradas pela administração tributária”, e que “As faturas emitidas com o nome da "T.", registadas na contabilidade da impugnante nos exercícios de 2014, titulam operações económicas reais e correspondem a serviços efetivamente fornecidos por si”.
Não eram, por esse motivo, alegações adequadas à produção da prova pretendida, e muito menos, a convencer o Tribunal da bondade da sua tese, motivo pelo qual, falece à partida a sua argumentação.
Por outro lado, e como claramente resulta da lei processual, o juiz do Tribunal de primeiro conhecimento da causa aprecia livremente as provas segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto [cf. n.º 5 do art. 607.º do CPC, aplicável ex vi art. 2.º, alínea e) do CPPT], cabendo-lhe a obrigação de revelar os fundamentos que foram decisivos para a formação da sua convicção, na apreciação do conjunto da prova.
Como foi já aqui referido, e demonstrado, da sentença em apreço resultam explicitados à saciedade os fundamentos que se revelaram decisivos para a formação da convicção do julgador e que refletem uma apreciação cuidada do conjunto da prova produzida nos autos.
Por fim, de acrescentar que após cuidado exame dos depoimentos indicados pela Recorrente, não se vislumbra a ocorrência de qualquer erro na sua interpretação ou apreciação por parte do Tribunal a quo, que assim justificasse a necessidade de alterar a decisão pelo mesmo proferida sobre a matéria de facto.
Com efeito, andou bem o Tribunal a quo em não considerar provado que “era o sócio-gerente Sr. D., que tinha a cargo toda a gestão” que mantinha contacto com os “representantes da T.”, pois não só nada em concreto é alegado na sua PI pela Recorrente que sustente estas conclusões – pois repita-se, o que a Recorrente pretende é que o Tribunal tivesse dado como provadas conclusões, e não factos,- como o depoimento prestado pelas testemunhas C., P. e C. não seria idóneo a sustentar as mesmas.
De facto, não bastava uma referência genérica e descontextualizada de qualquer enquadramento delimitado em circunstâncias concretas e reais para que o Tribunal desse como provado o que se pretende, e, sobretudo, para que pudesse concluir que as transações desconsideradas ocorreram efetivamente.
Não bastava, para tanto, a referência genérica feita pela Sr.ª C. a que “o patrão é que tem os contactos”, ou da Sr.ª C., a que “o Sr. D. é que faz essa subcontratação”, referindo-se assim a um procedimento genérico da Recorrente.
Como não bastava o depoimento prestado pelo Sr. P., o único que tinha efetivamente contacto direto com as mercadorias provenientes das empresas subcontratadas, mas que apenas conferia (“algumas”, como frisou) caixas fechadas contra guias de transporte, e que, como acertadamente é referido pelo Tribunal a quo, a propósito do seu depoimento, “também manifestou desconhecer a empresa T. e admitiu que apenas concluiu que as cargas/descargas que efetuava para/de uma carrinha destinavam-se/provinham à/da T. por supor que a pessoa que se apresentava para carregar e descarregar era um funcionário desta empresa. Ou seja, os serviços alegadamente prestados pela T., assentam em juízos conclusivos, opinativos e exclusivamente subjetivos da testemunha, que podem não corresponder, necessariamente, à realidade dos factos.”.
Com efeito, e atentamente ouvidos os depoimentos prestados pelas testemunhas indicadas pela Recorrente no processo de impugnação, o que se conclui é que o Tribunal a quo fez uma correta apreciação dos mesmos, tal como deixou transparecer na – repita-se - detalhada fundamentação da motivação da matéria de facto que ficou, aliás, abundantemente, plasmada na sentença em apreço.
Em face do exposto, deve o presente Recurso ser julgado integralmente improcedente.
***
Atendendo ao seu total decaimento no presente recurso, a Recorrente é condenada em custas [cf. art. 527.º, n.ºs 1 e 2 do CPC, aplicável ex vi art. 2.º, alínea e) do CPPT].
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Conclusão:

Preparando a decisão, formulamos a seguinte síntese conclusiva:

Estando em causa custos titulados por “faturas falsas”, e tendo a ATA cumprido o que lhe era exigido quanto ónus probatório que sobre si recaía, reunindo indícios sérios de que a empresa que emitiu as faturas referentes aos custos desconsiderados (art. 23.º CIRC) não prestou os serviços supostamente titulados pelas mesmas, o que estava autorizada a fazer com recurso a fiscalização cruzada, cabia à Recorrente provar, para além de qualquer dúvida, a substância da prestação dos serviços em causa, o que não logrou fazer.

Apenas a alegação circunstanciada de factos concretos permitiria a produção de prova adequada a habilitar o Tribunal a quo a retirar as ilações pretendidas pela Recorrente, maxime, no sentido de concluir que as prestações de serviços tituladas pelas faturas desconsideradas realmente ocorreram.

III. DECISÃO

Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte, em negar provimento ao presente recurso.

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Custas pela Recorrente.
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Porto, 25 de março de 2021
Margarida Reis (relatora) – Maria do Rosário Pais (em substituição) – Paulo Moura.