Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00767/10.8BECBR
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:02/02/2017
Tribunal:TAF de Coimbra
Relator:Ana Patrocínio
Descritores:EMBARGOS DE TERCEIRO
POSSE VS DETENÇÃO
Sumário:1. O contrato-promessa, só por si, não é susceptível de transferir a posse ao promitente-comprador.
2. Constituindo, por princípio, a tradição de imóvel, decorrente de contrato-promessa de compra e venda, mera detenção precária, ela pode, no entanto, consubstanciar uma verdadeira posse se envolver a transmissão, não só do “corpus”, mas do “animus”, o que caberá ser, casuisticamente, averiguado.
3. Nas situações excepcionais em que o promitente-comprador tem uma posse em nome próprio relativamente ao bem que lhe foi prometido vender e que, entretanto, foi penhorado em processo de execução fiscal, tal posse fundamentará a procedência dos embargos de terceiro que, com base nela, sejam deduzidos.
4. São sinais positivos dessa posse, no caso, do poder de controlo sobre o imóvel, concatenados entre si, a outorga de procuração irrevogável a conceder ao embargante poderes para vender o lote de terreno penhorado, incluindo a si próprio; o facto de a sociedade executada ter exigido o pagamento dos impostos relativos ao lote de terreno fundado nessa procuração, o embargante ter efectuado o seu pagamento; a limpeza, várias vezes, do terreno pelo embargante; a sua intenção de venda, em nome próprio, do lote e a concretização dessa vontade própria, colocando uma placa de venda no mesmo com o seu número de telemóvel.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:Autoridade Tributária e Aduaneira
Recorrido 1:A... e U..., Lda.
Decisão:Negado provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

I. Relatório

O Excelentíssimo Representante da Fazenda Pública interpôs recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, proferida em 15/09/2016, que julgou procedentes os embargos de terceiro deduzidos por A..., NIF 1…, residente no Lugar…, Leiria, contra a penhora efectuada ao prédio urbano sito na Urbanização…, concelho de Condeixa-a-Nova, inscrito na respectiva matriz sob o artigo 1... e descrito na Conservatória do Registo Predial de Condeixa-a-Nova sob o número 1... de Sebal Grande, nos autos de execução fiscal n.º 0736200707000120, que corre termos no Serviço de Finanças de Condeixa-a-Nova, em que é executada U... – Construções, Unipessoal, Lda.

O Recorrente terminou as suas alegações de recurso formulando as conclusões que se reproduzem de seguida:
“1 - O Mmo. Juiz do Tribunal “a quo” julgou procedente os embargos de terceiro supra identificados, deduzidos pelo autor, à penhora efectuada pelo Serviço de finanças de Condeixa-a-Nova, nos autos de execução fiscal n.° 0736200707000120, em que é executada U...-CONSTRUÇÕES UNIPESSOAL, LDA., ao prédio urbano, inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Sebal, concelho de Condeixa-a-Nova sob o artigo 1....° (actual art.° 1... da União das Freguesias de Sebal e Belide) e descrito na Conservatória do Registo Predial de Condeixa-a-Nova sob o artigo 1....°.
2 - Considerou o Mmo. Juiz, face à redacção do art. 237.° do CPPT, que os embargos foram deduzidos tempestivamente e que o embargante é terceiro.
3 - Relativamente ao terceiro requisito, previsto no referido artigo, existir a ofensa da posse ou de qualquer outro direito incompatível com a diligência realizada, entendeu o Mmo. Juiz, primeiro em termos genéricos, o referido no ponto 3.° supra.
4 - E seguidamente em concreto: “O Embargante alega que adquiriu o prédio penhorado em causa, à sociedade executada, em 31 de Outubro de 2012.
O artigo 408.º, nº 1 do Código Civil determina que a constituição ou transferência dos direitos reais sobre coisa determinada dá-se por mero efeito do contrato, salvas as exceções previstas na lei. O efeito real da transmissão da propriedade decorre, assim, do próprio contrato.
Resulta dos factos provados que o Embargante e a sociedade executada celebraram um contrato promessa de compra e venda do prédio penhorado no processo de execução fiscal em 05.01.2000, sendo que o preço total do mesmo era de 8.450.000$00 e iria ser pago em 4 tranches no valor de 2.112.500$00 (facto provado 1.). A primeira tranche foi paga no ato da assinatura do contrato promessa de compra e venda, conforme consta do mesmo.
Resulta também do probatório, o pagamento de mais duas tranches. Uma no dia 06.06.2001, data em que a sociedade executada assinou um recibo de quitação, e a outra foi paga em 4 prestações no valor de €2.634,28 euros, nos dias 15.02.2002, 15.03.2002, 15.04.2002 e 15.05.2002 (factos provados 2. e 3.).
Resulta, ainda dos factos provados que no dia 31.10.2002, a sociedade executada outorgou um procuração irrevogável em nome de A..., a conceder-lhe poderes para vender o lote de terreno penhorado, incluindo a si próprio (facto provado 5.)
Ora, como se sabe, neste tipo de procuração, considera-se que existiu uma procuração irrevogável (e não há provas nos autos que a revogaram) e o mandatário pode fazer negócio consigo mesmo).
Neste sentido que aqui perfilhamos, vide inter alias, o acórdão de 10.03.2011. P. 0286/10, proferido pelo Supremo Tribunal Administrativo, cujo sumário (na parte que aqui interessa) se transcreve:
“I - A outorga de procuração irrevogável que confira poderes de alienação de imóveis ao mandatário, considera-se transmissão onerosa determinando a liquidação e o pagamento de IMT antes da outorga notarial da respectiva procuração (art°s 2.°, n.°3, alínea c e 22°, n.°2 ambos do CIMT (…).”
É verdade que não existe documento nos autos que comprove o pagamento da tranche que falta para perfazer o preço total que consta do contrato promessa, mas tendo em conta a outorga de procuração irrevogável, o depoimento da testemunha, o facto da sociedade executada exigir o pagamento dos impostos relativos ao lote de terreno e o Embargante efetuar o seu pagamento, a limpeza do terreno, todos estes factos juntos, criaram a convicção que tal lote de terreno pertence ao aqui Embargante A... (factos provados 5., 6., 7., 8, 15. e 16.) Assim decidida a questão da propriedade fica decidida a questão da posse, fica resolvida a questão da posse porquanto o domínio da coisa prevalece sobre a tutela possessória, presumindo-se que o proprietário é quem tem esse poder de usar e fruir a coisa”.
5 - Com todo o respeito pela douta sentença “a quo”, entende esta Representação da Fazenda que existiu erro na apreciação da prova, que conduziu à decisão pela procedência dos embargos de terceiro.
6 - Conforme refere o Mmo. Juiz., não existe prova do pagamento da totalidade do preço e por outro lado, a lei apenas equipara a outorga de procuração irrevogável a transmissão onerosa de imóvel, para efeitos de tributação em Imposto Municipal sobre a Transmissão Onerosa de Imóveis (IMT).
7 - Tal resulta do Código do IMT, como ficção legal de transmissão para efeitos de tributação nesse específico imposto, e é assumido no próprio acórdão citado pelo Mmo Juiz no ponto II do respectivo Sumário: “Deste modo ainda que o negócio para o qual a procuração foi outorgada não chegue a realizar-se, não é aplicável o disposto nos art°s 22°, nº4 e 44º, nº1 ambos do CIMT, uma vez que para efeitos de IMT o acto translativo concretizou-se.”
8 - Pelo que, da prova produzida não é possível concluir, com todo o respeito, pela transmissão do direito de propriedade do imóvel, por não existir uma situação enquadrável no art. 1316.° do Código Civil.
9 - Conforme é referido no Acórdão do TCA Sul de 21/04/2009, CT 2.° Juízo, P.° 0292009, no ponto VII do respectivo Sumário: “Não tendo a promitente-compradora realizado o acto de aquisição do bem em nome do representado e de si próprio, já que não celebrou qualquer contrato consigo próprio e no seu exclusivo interesse apesar de ter poderes para o efeito, dessa representação não resultou directa e imediata do acto na esfera jurídica do representante, não tendo, por via disso, a promitente compradora adquirido a propriedade e a posse relevantes para efeitos de não sujeição ao IMI”
10 - Mas, com todo o respeito, também não permite concluir, salvo melhor opinião, pela existência de inversão do título da posse, por parte do Embargante, pois a verdade é que, o mesmo podendo realizar a qualquer momento a escritura de venda a si próprio, nunca o fez, não sendo os factos descritos incompatíveis com a atitude de um detentor do terreno, em circunstâncias especiais, reconhece-se, pois pode vendê-lo, mas um detentor.
11 - Detentor esse, que tendo pago já uma quantia substancial pelo imóvel, tem interesse em que não existam dívidas de impostos sobre o património relativas ao mesmo, que este esteja limpo e, por último, que a sua possibilidade de venda seja anunciada através de placa nele colocada (porque pode e quer vendê-lo!).
12 - Pelo que, face ao exposto, deve a douta sentença ser revogada e substituída por douto acórdão que julgue os embargos de terceiro deduzidos improcedentes.
Nestes termos e com o douto suprimento de V.ªs Ex.ªs, deve a decisão recorrida ser revogada e substituída por douto acórdão que julgue os embargos de terceiro deduzidos improcedentes, assim se fazendo JUSTIÇA.
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Não foram apresentadas contra-alegações.
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O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido da procedência do recurso – cfr. fls. 313 e 314 dos autos.
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Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
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II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelo Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que importa decidir se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento, ao julgar que a penhora efectuada incide sobre bem que não pertence à executada devedora, mas sim ao aqui embargante, ofendendo não só a sua posse, mas, também, a sua propriedade sobre o prédio urbano penhorado no processo de execução fiscal.

III. Fundamentação

1. Matéria de facto

Da sentença prolatada em primeira instância, consta decisão da matéria de facto com o seguinte teor:
IV.1. Factos provados:
Com interesse para a decisão a proferir, considero provados os seguintes factos:
1. Em 05.01.2000, a sociedade executada U... – Construções, Lda. e A..., aqui Embargante, celebraram contrato promessa de compra e venda, somente assinado pela primeira, com o seguinte teor:
“CONTRATO PROMESSA DE COMPRA E VENDA
Entre:
U..., Construções L.da, pessoa colectiva n.º 5…, sociedade comercial por quotas, matriculada na Conservatória do Registo Comercial de Ourém sob o n.º 1…, com o capital social de 25.000.000$00, com sede em…, 2490 Ourém, neste acto representada pelo sócio gerente Al…, com poderes para o acto, portador do B.I. n.º 9…, emitido em 22/11/95, por Lisboa, abaixo designada por primeira outorgante e promitente vendedora e,
A..., casado com L…, em regime de comunhão de adquiridos, residente na rua…, concelho de Leiria, contribuinte fiscal n.º 1…, portador do B.I. n.º 7…, emitido em 07/08/97 por Leiria, abaixo designado segundo outorgante e promitente comprador, é celebrado o presente contrato promessa de compra e venda, que se rege pelas seguintes cláusulas:
PRIMEIRA
A primeira outorgante é dona e legítima possuidora de um terreno rústico, sito em …, freguesia de Sebal Grande, concelho de Condeixa-a-Nova, descrito na Conservatória do Registo Predial sob os nrs. 2… e 2… respectivamente, com as áreas respectivas de 19 440 e 37 700 m2, terreno onde vai levar a efeito um loteamento urbano, para moradias geminadas e isoladas, unifamiliares, numerados de 1 a 60, destinados a habitação.
SEGUNDA
Por este contrato promessa, a primeira outorgante promete vender ao segundo outorgante e este a comprar, livre de ónus ou encargos o seguinte lote:
Lote n.º 18 com a área de 339.26 m2 pelo preço de 8.450.000$00 (Oito milhões e quatrocentos e cinquenta mil escudos);
Cuja planta de situação e áreas de construção se anexam ao presente contrato e se encontram rubricadas por todos os intervenientes.
TERCEIRA
O preço acordado de 8.450.000$00 (Oito milhões e quatrocentos e cinquenta mil escudos), será pago pelo segundo à primeira outorgante da seguinte forma:
a) - A quantia de 2.112.500$00 (Dois milhões e cento e doze mil e quinhentos escudos) no acto da assinatura deste contrato, através de cheque bancário, que servirá de sinal e princípio de pagamento, valor do qual se dá plena quitação também por este mesmo instrumento legal;
b) - A quantia de 2.112.500$00 (Dois milhões e cento e doze mil e quinhentos escudos) com o início das infraestruturas que se prevê ser em Março de 2000;
c) - A quantia de 2.112.500$00 (Dois milhões e cento e doze mil e quinhentos escudos) com a aplicação do lancil;
d) - Os restantes 2.112.500$00 (Dois milhões e cento e doze mil e quinhentos escudos) serão liquidados com a outorga da escritura dos referidos lotes, com os projectos aprovados.
QUARTA
O lote objecto deste contrato, inclui os respectivos projectos de arquitectura e complementares, que são da integral responsabilidade da promitente vendedora.
QUINTA
A escritura será feita ao segundo outorgante ou a quem este indicar, a partir de Outubro de 2000, logo que a primeira outorgante esteja na posse de toda a documentação necessária para o efeito e que as infraestruturas se encontrem efectuadas ou asseguradas perante as entidades competentes.
SEXTA
É da conta do segundo outorgante a sisa, escritura e registos do lote a seu favor.
SÉTIMA
A escritura pública será marcada pela primeira outorgante que avisará o segundo através de carta registada ou outro meio, com uma antecedência mínima de 15 dias, do dia hora e local da sua realização.
OITAVA
Ambos os outorgantes declaram prescindir do reconhecimento notarial do contrato, bem como renunciar ao direito de invocar a sua nulidade por esta omissão.
NONA
O presente contrato promessa de compra e venda fica sujeito ao regime de execução específica, nos termos do artº 830 do Código Civil, por forma que no caso de incumprimento do mesmo imputável a uma das partes, a parte cumpridora obter sentença que produza os efeitos da declaração negocial da parte faltosa.
DECIMA
Nos casos em que este contrato promessa de compra e venda for omisso aplicar-se-á a legislação em vigor, e estabelece-se como competente para dirimir qualquer conflito emergente do presente contrato, o foro da Comarca de Condeixa-a-Nova, com expressa renúncia de qualquer outro.
• Lido e explicado em voz alta o teor do presente contrato, que aceite mutuamente por ambas as partes, é assinado em conformidade com o que nele está escrito, destinando-se o original ao promitente comprador e ficando o duplicado na posse da promitente vendedora.”. – Cfr. fls. 20 e ss. dos autos (processo físico – PF), cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, o mesmo se dizendo para os demais elementos infra referidos.

2. Em 06.06.2001, a sociedade executada emitiu o recibo com o seguinte teor:
“RECIBO
U..., Construções, Lda., com sede em…, Concelho de Ourém, pessoa colectiva n.º 5…, declara ter recebido de A..., a quantia de Esc.: 2.112.500$00 (Dois milhões cento e doze mil e quinhentos escudos), para liquidação da cláusula terceira, da alínea c), conforme o contrato de promessa de compra e venda, outorgado a 5 de Janeiro de 2000, alusiva ao lote n.º 18 sito na Urbanização… - Condeixa.”. – Cfr. fls. 24 dos autos (processo físico – PF).

3. A… emitiu 4 cheques, cada um no valor de € 2.634,28 euros, à ordem da sociedade executada U... – Construções, Lda., datados de 15.02.2002, 15.03.2002, 15.04.2002 e 15.05.2002. – Cfr. fls. 25 dos autos (processo físico – PF).

4. Em 20.09.2002 a sociedade executada U... – Construções, Lda., endereçou uma carta a A..., com o seguinte teor:
“(…) Como é do conhecimento de V. Exa., temos vindo ao seu contacto, através de cartas enviadas, bem como pressionando a empresa imobiliária F…, na pessoa do Sr. F…, no sentido da marcação da escritura de compra e venda relativa ao contrato promessa outorgado entre V/ Exa e esta firma a 05 de Janeiro de 2000, referente ao lote 18 da "Urbanização…” sita em Condeixa.
Continuamos a alertar para a necessidade de uma solução rápida deste problema que já ultrapassou em muito o razoável, pelo que marcámos a respectiva escritura no 2° Cartório Notarial de Leiria, no dia 10 de Outubro do corrente ano, pelas 16 horas, para a qual solicitamos a entrega dos seguintes elementos nos nossos escritórios, na Rua…, 2495-552 Fátima.
* Fotocópia do bilhete de identidade.
* Fotocópia do contribuinte fiscal.
* Sisa.
Informamos ainda que no caso de não proceder a esta entrega no prazo estabelecido e em caso de não comparência consideramos que houve incumprimento definitivo do contracto por parte de V/ Exa e o mesmo resolvido com as consequências legais.
Agradecemos desde já a atenção dada ao exposto, ficando a aguardar o seu contacto. Sem outro assunto de momento, subscrevemo-nos com elevada estima e consideração.”.

5. Em 31.10.2002, a sociedade executada U... – Construções, Lda., outorgou uma Procuração em nome de A..., aqui Embargante, com o seguinte teor:
“PROCURAÇÃO
No dia trinta e um de Outubro do ano dois mil e dois, no Cartório Notarial de Ourém, perante mim M…, Segundo Ajudante do mesmo, compareceu como outorgante:
M…, casada, natural da freguesia de Rio de Couros, deste concelho, onde reside em Engenhos, que outorga como gerente em representação de:
"U... CONSTRUÇÕES LDA", sociedade comercial por quotas com sede no referido lugar de Engenhos, pessoa colectiva número 5…, com o capital social de cento e vinte e quatro mil seiscentos e noventa e nove euros e quarenta e oito cêntimos, matriculada na Conservatória do Registo Comercial de Ourém sob o número ….---
Verifiquei a identidade da outorgante por conhecimento pessoal, a qualidade em que outorga, bem como os poderes para o acto em face de uma fotocópia de certidão comercial, devidamente autenticada, arquivada neste Cartório por ter instruído a escritura lavrada a folhas cento e quarenta, do Livro de Escrituras diversas seiscentos e quarenta e um-A.
E POR ELA,NA REFERIDA QUALIDADE,FOI DITO: -
Que constitui procurador da sua representada, A… casado, natural da freguesia de Souto da Carpalhosa concelho de Leiria, residente em…, daquele concelho de Leiria, contribuinte número 149 132 743, a quem confere poderes para VENDER, incluindo a si próprio, e pelo preço máximo de TRINTA E SETE MIL OITOCENTOS E SESSENTA E SEIS EUROS E CINQUENTA E QUATRO CÊNTIMOS, o lote de terreno para construção urbana designado por lote dezoito situado na Urbanização …, freguesia de Sebal, concelho de Condeixa a Nova, em cuja matriz se encontra inscrito sob o artigo 1... podendo receber os preços, dar quitação, outorgar e assinar as competentes escrituras, os contratos de promessa de compra e venda;
Para na Conservatória do Registo Predial, proceder a quaisquer actos de Registo Predial, provisórios e definitivos averbamentos e cancelamentos, e ainda junto de quaisquer Repartições Públicas ou Privadas, nomeadamente na Repartição de Finanças, requerer, praticar e assinar tudo o mais que for preciso aos indicados fins.
-- Em virtude desta procuração ser passada no interesse do mandatário, que poderá fazer negócio consigo mesmo, é IRREVOGÁVEL, nos termos do número 3 do artigo 265 e do número 2 do artigo 1170, do Código Civil. (…)”. – Cfr. fls. 17 e ss. dos autos (processo físico – PF).

6. Em 03.03.2004, a sociedade executada U... – Construções, Lda., endereçou uma carta a A..., com o seguinte teor:
“Em data de 31 de Outubro de 2002, foi estabelecido entre n/firma e V. Exa., a procuração, referente à aquisição do lote nº 18, da n/ Urbanização…, freguesia de Sebal Grande, concelho de Condeixa-A-Nova.
Pela presente, informamos V.Exa. de que entretanto se venceu a Contribuição Autárquica no valor de 378,67 € (Lote 18), assim como a SISA no valor de 350,12 € (Lote 18), solicitando o favor de nos regularizar com a maior urgência possível, a soma de 728,79 €(Setecentos e vinte oito euros e setenta e nove cêntimos), montante este já pago, em seu nome pela nossa empresa.
Junto anexamos fotocópia dos documentos emitidos pela Repartição de Finanças.
Sem outro assunto de momento, subscrevemo-nos com elevada estima e consideração.”. – Cfr. fls. 27 e ss. dos autos (processo físico – PF).

7. Em 08.11.2004, o Advogado-Estagiário S…, em representação da sociedade executada U... – Construções, Lda., endereçou a A..., carta com o seguinte teor:
“(…) Dirijo-me a V. Ex.ª na qualidade de advogado da sociedade por quotas U... - CONSTRUÇÕES, LDA, por quem fui mandatado para proceder à cobrança judicial do montante de 965,08 €, titulado pela Contribuição Autárquica no valor de 378,67€ e 236,29€, bem como o valor da SISA no valor de 350,12€ referentes ao Lote 18.
Como V. Ex.ª bem sabe, os mencionados valores resultam da Procuração assinada por V. Excelência, cabendo-lhe a V. Ex.ª pagar os impostos devidos e que nunca foram pagos por V. Ex.ª, encontrando-se em mora no respectivo serviço de finanças, situação que está a criar inúmeros prejuízos à minha cliente.
Mais informo que a minha cliente já identificada em epígrafe, não realiza mais pagamentos referentes a esses lotes na respectiva repartição de finanças, pelo que é de todo o seu interesse liquidar as respectivas importâncias já descritas anteriormente.
Não obstante a gravidade da situação e das consequências que daí poderão decorrer, penso ser de toda a conveniência a procura de uma composição extrajudicial o presente litígio.
Neste sentido, aguardo contacto de V. Ex.ª até ao dia 15 de Novembro de 2004, sob pena de não me restar alternativa senão recorrer às instâncias judiciais.
No caso de vir a constituir advogado, fico a aguardar o s/contacto.”. – Cfr. fls. 26 e ss. dos autos (processo físico – PF).

8. Em 25.11.2004, a sociedade executada U... – Construções, Lda., emitiu um recibo com o seguinte teor:
“(…) U...- CONSTRUÇÕES, LDA, com sede em Rua…, em Fátima, freguesia de Fátima, concelho de Ourém, contribuinte fiscal n.º 5…, representada por Al…, com poderes para o acto, declara que recebeu do Sr. A..., a quantia de 965,08€ (novecentos e sessenta e cinco euros e oito cêntimos); referente ao pagamento da Contribuição Autárquica dos anos de 2002, 2003 e SISA, relativa ao lote n.º 18 da "Urbanização… ", sita em Condeixa - A- Nova". – Cfr. fls. 28 e ss. dos autos (processo físico – PF).

9. Nos autos de execução fiscal n.º 0736200707000120, instaurados pelo Serviço de Finanças de Condeixa-a-Nova contra U... – Construções Unipessoal, Lda., para cobrança coerciva de dívidas de IMI no valor de € 14.570,82 euros, foi penhorado, no dia 10.01.2008, o prédio urbano sito na Urbanização…, freguesia de Sebal, concelho de Condeixa-a-Nova, Coimbra, inscrito na respetiva matriz sob o artigo 1... e descrito na Conservatória do Registo Predial de Condeixa-a-Nova sob o número 1... de Sebal Grande, penhora esta registada sob a inscrição F – Ap. 24 de 2008/01/14. – Cfr. fls. 22 do processo executivo apenso (PEF).

10. Na certidão da Conservatória do Registo Predial de Condeixa-a-Nova descrita sob o n.º 1935/19991228, consta sob a inscrição G – AP.6 de 1999/12/28 e F – Ap. 6 de 2000/11/29, a aquisição a favor da sociedade executada de um terreno que depois foi autorizado o seu loteamento (de 1 a 62 lotes), sito na freguesia de Sebal Grande. – Cfr. fls. 17 e ss. do PEF.

11. O lote 18 referido em 10. está descrito na Conservatória do Registo Predial de Condeixa-a-Nova sob o n.º 1.../20070824. – Cfr. fls. 15 e ss. do PEF.

12. Por despacho do Sr. Chefe de Finanças de Condeixa-a-Nova, datado de 17.08.2010, foi determinada a "(...) venda do imóvel penhorado na modalidade de propostas em carta fechada (...)" referido em 9., cuja venda foi publicitada na página da internet da DGCI. – Cfr. fls. 16 do PF.

13. Por despacho do Chefe do Serviço de Finanças de Condeixa-a-Nova, datado de 12.11.2010 foi determinada a suspensão do procedimento de venda do bem referido em 9. – Cfr. fls. 104 e ss. do PEF.

14. Os presentes embargos de terceiro foram enviados para o Serviço de Finanças de Condeixa-a-Nova, via correio eletrónico, no dia 10.11.2010. - Cfr. fls. 5 do PF.

15. A... e J… limparam várias vezes o lote n.º 18, referido em 9.. – Cfr. Declarações de parte e da testemunha.

16. A... e J… colocaram placas para venda no lote n.º 18, referido em 9.. – Cfr. Declarações de parte e da testemunha.

IV.2. Factos não provados:

Inexistem outros factos, para além dos que foram dados como provados, que revelem interesse para a boa decisão da causa.

IV.3. Motivação:
A convicção do Tribunal quanto aos factos provados 1. a 14. resultou da análise crítica e conjugada do teor dos documentos não impugnados juntos aos autos, conforme referido em cada ponto do probatório e também da posição assumida pelas partes, na parte dos factos alegados não impugnados e corroborados pelos documentos juntos.
As declarações de parte e a prova testemunhal produzida em sede da diligência de inquirição de testemunhas foram apreciadas livremente e também com o recurso às regras da experiência comum [artigos 396.º do CC e 607.º, n.º 5 do CPC aplicável ex vi artigo 2.º, alínea e) do CPPT] e serviram para formar a convicção quanto aos factos provados 15. e 16.
Assim, A... prestou declarações de uma forma credível e clara que formou a convicção deste tribunal no sentido da veracidade das mesmas.
De facto, declarou que adquiriu um lote de terreno com um projeto de arquitetura associado, à sociedade “U...”, após insistência de um tal Rogério. Referiu que, com o pagamento da primeira prestação foram outorgar uma procuração irrevogável para depois fazer a escritura quando quisesse, uma vez que, a sua intenção era vender o lote que comprou. Afirmou que o preço foi cerca de 8.500.000$00 e que o pagou em 3 ou 4 prestações, que não se lembra muito bem. Disse que foi limpar o terreno várias vezes, de forma pacífica e que nunca ninguém lhe disse que o terreno não era seu. Mais afirmou que foi colocar no terreno uma placa para venda.
Foi-lhe exibido os documentos juntos aos autos, concretamente um recibo emitido pela “U...” pelo pagamento do valor de 2.112.500$00 referente à terceira cláusula, alínea c) do contrato promessa e 4 cheques emitidos por ele à ordem da “U...”. Relativamente ao recibo a parte já não se recordava do mesmo, mas reconheceu os cheques emitidos que foram para pagamento do lote de terreno.
É ainda de valorar o depoimento da testemunha J… (conhece há vários anos o A… porque levava o carro à sua oficina) porquanto afirma, com convicção e conhecimento direto dos factos, que o A... comprou o lote de terreno em questão nos autos e que foi o seu colega Rogério que o vendeu. Referiu que foi funcionário de uma imobiliária que estava a vender os lotes de terreno da “U...” e que tem conhecimento de que um foi para o A.... Exibiu a este Tribunal recibos de vencimento que comprovaram que foi funcionário da imobiliária em questão. Mais disse que foi limpar o terreno com o A..., mais de uma vez e que colocaram lá uma placa para venda.
A matéria de facto não provada redundou na ausência de prova produzida para o efeito.”

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2. O Direito

Assente a factualidade apurada cumpre, então, entrar na análise da realidade em equação nos autos, sendo que a este Tribunal está cometida a tarefa de indagar da bondade da decisão recorrida que atendeu a pretensão do ora Recorrido no âmbito dos presentes embargos de terceiro.
Para o efeito, além do mais, julgou-se o seguinte:
“(…) É verdade que não existe documento nos autos que comprove o pagamento da tranche que falta para perfazer o preço total que consta do contrato promessa, mas tendo em conta a outorga de procuração irrevogável, o depoimento da testemunha, o facto da sociedade executada exigir o pagamento dos impostos relativos ao lote de terreno e o Embargante efetuar o seu pagamento, a limpeza do terreno, todos estes factos juntos, criaram a convicção deste Tribunal de que tal lote pertence ao aqui Embargante A... (factos provados 5., 6., 7., 8, 15. e 16.).
Assim, decidida a questão da propriedade, fica resolvida a questão da posse porquanto o domínio da coisa prevalece sobre a tutela possessória, presumindo-se que o proprietário é quem tem esse poder de usar e fruir a coisa. Aliás, a entrega do bem a outrem mais não é do que uma manifestação desse poder pois, como refere Oliveira Ascensão, (Direitos Reais, ano 83, página 89), “podemos efectivamente dizer que, enquanto a coisa estiver submetida à vontade do sujeito, de tal modo que este possa renovar a actuação material sobre ela, querendo, há corpus.”
Em face do supra exposto, a penhora efetuada incide sobre bem que não pertence à executada devedora, U... – Construções, Lda., mas sim ao aqui Embargante, ofendendo, não só a sua posse, mas, também, a sua propriedade, sobre o prédio urbano penhorado no processo de execução fiscal. (…)”

Foi isto que o tribunal recorrido decidiu, em face da invocação do embargante de que terá adquirido o imóvel identificado nos autos à empresa executada U... Unipessoal, Lda., a 31 de Outubro de 2002, pelo preço de 42.148,42€ (8.450.000$00) e para esta compra não fizeram escritura pública, mas outorgaram no Cartório Notarial de Ourém, uma procuração irrevogável, a favor do embargante, sendo que a executada U... só emitiu procuração irrevogável porque o embargante já havia pago todo o preço, verificando-se ainda que o referido negócio teve subjacente um contrato promessa, o embargante pagou o respectivo sinal a que a executada deu quitação, pagou a sisa e outros encargos consequentes da compra do referido imóvel, que a executada o havia substituído no pagamento e depois da assinatura da procuração irrevogável entrou logo na plena propriedade e posse do bem ora objecto de venda pelo SF de Condeixa, exercendo-a com “corpus e “animus”, porque estava na posse efectiva do referido imóvel tendo para o efeito tentado vendê-lo, a diversos compradores, colocando no referido imóvel placas com anúncio de venda, com o seu telemóvel e porque exercia a mesma posse, como sendo um direito seu e em nome próprio, além de que o embargante exerceu a posse de boa-fé, à vista de toda a gente, sem que ninguém que passasse na zona do referido imóvel arrogasse direitos de posse ou propriedade, conflituantes com o embargante.
Após uma primeira decisão desfavorável ao aqui Recorrido, foi interposto recurso e proferido acórdão neste TCAN, em 17/12/2015, onde se concluiu encontrar-se o julgamento da matéria de facto, inscrito na sentença, inquinado por défice instrutório, porquanto existe a possibilidade séria de a produção da prova em falta (prova testemunhal) implicar o estabelecimento de outro, sobretudo mais alargado, cenário factual, capaz de, pela sua amplitude, esclarecer melhor todos os acontecimentos, com repercussão no sentido da decisão do mérito da causa. Mais se acrescentou que, no âmbito dos poderes consignados nos artigos 13.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) e 99.º da Lei Geral Tributária (LGT) competia ao Juiz realizar as diligências para apuramento da situação concreta e só após isso conhecer da questão suscitada nos autos. De modo que, não o tendo feito, procedeu esse recurso, volvendo os autos à 1ª instância para a realização das diligências tendentes a apurar a matéria acima descrita, a qual deveria ainda contar com o contributo da prova testemunhal arrolada pela executada, no sentido de se estabelecer um eventual quadro factual mais amplo, que serviria de base à decisão a proferir no âmbito dos presentes autos.
Assim se procedeu, tendo sido instruídos os autos, conforme determinado por este tribunal, e proferida nova decisão, desta feita favorável ao embargante, como vimos.
A Fazenda Pública insurge-se contra o agora decidido, porque entende que da prova produzida não é possível concluir pela transmissão do direito de propriedade do imóvel, por não existir uma situação enquadrável no artigo 1316.° do Código Civil. Também essa prova não permite concluir pela existência de inversão do título da posse, por parte do Embargante, pois a verdade é que, o mesmo podendo realizar a qualquer momento a escritura de venda a si próprio, nunca o fez, não sendo os factos descritos incompatíveis com a atitude de um detentor do terreno, pois pode vendê-lo. Alerta que também um detentor, que tendo pago já uma quantia substancial pelo imóvel, tem interesse em que não existam dívidas de impostos sobre o património relativas ao mesmo, que este esteja limpo e, por último, que a sua possibilidade de venda seja anunciada através de placa nele colocada (porque pode e quer vendê-lo!).
A essência dos direitos relacionados com as coisas - dos direitos reais de gozo e de alguns direitos reais de garantia e direitos pessoais - consiste na faculdade de sobre elas exercer poderes de retenção, de uso, de fruição e de transformação. Todos estes direitos têm por finalidade a utilização económica das coisas, das vantagens que das coisas se podem obter, sendo pelo exercício daqueles poderes que a utilização se realiza (cfr. Manuel Rodrigues in A Posse, Estudo de Direito Civil Português, 4ª.edição prefaciada por Fernando Luso Soares, Almedina, 1996, pág.7).
Como já se referiu no acórdão deste TCAN, de 17/12/2015, prolatado nos presentes autos, nos termos da lei civil substantiva o possuidor que veja a sua posse sobre determinada coisa ofendida por diligência ordenada judicialmente pode defender a mesma mediante embargos de terceiro – cfr. artigo 1285.º do Código Civil.
Ora, o artigo 1251.º do Código Civil define posse como “o poder que se manifesta quando alguém actua por forma correspondente ao exercício do direito de propriedade ou de outro direito real.”
A posse, face à concepção adoptada na definição legal, tem de se revestir de dois elementos: o “corpus”, ou seja a relação material com a coisa e o “animus”, ou seja, o elemento psicológico, a intenção de actuar como se o agente fosse titular do direito real correspondente, seja ele o direito de propriedade ou outro.
Tal significa que para que exista posse é necessário alguma coisa mais do que o simples poder de facto exercido sobre a coisa, tem que haver, por parte do detentor, a intenção (“animus”) de exercer, como seu titular, um direito real sobre a coisa, sendo que só esta, a posse efectiva e causal, que se traduz pelos mencionados elementos objectivo e subjectivo, pode fundamentar, regra geral, os embargos de terceiro.
Pois bem, a partir da reforma operada pelo D.L. n.º 329-A/95, 12-12, os embargos de terceiro deixaram de ter a natureza de processo especial, passando a ser configurados como modalidade do incidente de oposição, ampliando-se os pressupostos da sua admissibilidade, assim deixando de estar ligados, necessariamente, à defesa da posse do embargante, na medida em que, face a este novo regime, o embargante, através dos embargos, além da posse, pode defender qualquer outro direito incompatível com a realização ou o âmbito da diligência judicial, que se traduza num acto de agressão patrimonial.
De acordo com o estatuído no artigo 237.º, n.º 1, do CPPT, “quando o arresto, a penhora ou qualquer outro acto judicialmente ordenado de apreensão ou entrega de bens ofender a posse ou qualquer outro direito incompatível com a realização ou o âmbito da diligência, de que seja titular um terceiro, este pode fazê-lo por meio de embargos de terceiro”.
Os elementos a considerar nesta sede, de acordo com a lei processual tributária, são os seguintes:
1 - A tempestividade da petição de embargos;
2 - A qualidade de terceiro face ao processo de execução no âmbito do qual se verificou a diligência judicial ofensiva da posse ou de qualquer outro direito incompatível com a realização ou o âmbito da mesma diligência;
3 - A ofensa da posse ou de qualquer outro direito incompatível com a realização ou o âmbito da diligência judicial, que se traduza num acto de agressão patrimonial.
No processo vertente é o exame do terceiro requisito que está em causa, sendo que, como vimos, o Recorrido havia fundamentado a dedução de embargos de terceiro, além do mais, na existência de contrato-promessa de compra e venda que celebrou tendo por objecto o imóvel penhorado no processo de execução fiscal.
Mas o Recorrido, como referimos, aludiu, ainda, com maior insistência, ao facto de ter sido outorgada, no Cartório Notarial de Ourém, uma procuração irrevogável, a favor do embargante, sendo que a executada U... só emitiu procuração irrevogável porque o embargante já havia pago todo o preço.
A procuração irrevogável com poderes de alienação (no caso de imóvel) confere ao procurador mandato materialmente idêntico ao do proprietário.
Na verdade, as cláusulas de irrevogabilidade, bem como a circunstância de serem passadas no interesse do procurador, transmitem para o domínio deste, praticamente os mesmos poderes materiais que correspondem ao exercício dos poderes do proprietário, embora o procurador não seja o titular do direito de propriedade, porque não adquiriu o respectivo título, e exerça esses poderes em nome do mandante.
Para provar a posse própria numa situação como a acima considerada, mesmo que se admita a tradição da coisa, deverá provar-se a inversão do título através da demonstração da prática reiterada do embargante de actos de uso e fruição correspondentes aqueles que o dominus faz da coisa - “uti dominus” ou a prática dos actos correspondentes ao exercício pelo seu titular de qualquer outro direito próprio, para além de demonstrar que essa posse era efectuada em nome próprio.
Com efeito, a citada inversão do título da posse (transformação da posse precária em posse em nome próprio), nos termos dos artigos 1263.º, al. d) e 1265.º do C. Civil, tem por consequência que o promitente-comprador actue com o estado de espírito de verdadeiro proprietário, assim praticando diversos actos materiais correspondentes ao exercício do direito de propriedade, verificando-se que tais actos não são realizados em nome do promitente-vendedor, mas sim em nome próprio, com a intenção de exercer sobre a coisa um verdadeiro direito real.
Ora, neste domínio, para além dos elementos destacados nos documentos presentes nos autos, ficou, entretanto, provado que o Recorrido tentou vender o imóvel em causa a diversos compradores, colocando no referido imóvel placas com anúncio de venda, com o seu número de telemóvel, bem como limpou, várias vezes, esse lote, matéria que não poderá considerar-se despicienda para a análise em causa.
Como já salientámos, a posse é o poder que se manifesta quando alguém actua por forma correspondente ao direito de propriedade ou de outro direito real (cfr. artigo 1251.º do Código Civil) compondo-se de um elemento material – corpus - e de um outro de índole psicológica – animus - traduzindo-se, o primeiro, na “submissão da coisa à vontade do sujeito com continuada possibilidade de actuação material sobre ela” e o segundo na “intenção de agir como titular do direito” real “a que o poder material que o exercício do poder de facto sobre a coisa se refere” - Cfr. José de Oliveira Ascensão, in Direitos Reais, 1971, páginas 244/246.
Ora, a posse defensável pela presente via processual, terá que ser uma posse real e efectiva e, em princípio, será uma posse em nome próprio, distanciando-se, assim, de posse em nome de outrem, de natureza precária.
“É preciso ver se o acto ou a série de actos têm, segundo o consenso público, a energia suficiente para significar que, entre uma coisa e determinado indivíduo, se estabeleceu uma relação permanente e duradoura”, “Na verdade, sendo a relação possessória uma relação permanente, duradoura, ela só pode resultar de um facto ou de um conjunto de factos que, segundo o modo normal de conceber as coisas, signifiquem que, aquele que em determinado lugar os praticou, pretende exercer sobre a coisa um poder permanente”. “O carácter permanente, duradouro da aquisição da posse não exige, pois, necessariamente, a prática repetida de actos de uso e de gozo; mas exige (…) a prática de um acto ou de uma série de actos que, no consenso público, sejam considerados como meio de criar uma relação duradoura”. “Trata-se de uma questão de facto a resolver em cada caso pelo tribunal” – cfr. Manuel Rodrigues in A Posse, Estudo de Direito Civil Português, n.º 37, Coimbra Editora, Antiga Livraria França & Arménio, pp. 199-208.
A actuação material sobre a coisa ou a possibilidade dessa actuação supõe o controlo material dela ou, como alguns preferem dizer, o domínio da coisa. O corpus possessório projecta-se, por conseguinte, a um nível físico, significando que alguém pode praticar os actos de aproveitamento da coisa correspondentes ao direito que exterioriza – cfr. José Alberto Vieira in Direitos Reais, pág. 548.
“(…) O espaço ocupado pela discussão em torno do animus nos estudos jurídicos portugueses sobre a posse, revela-se totalmente desproporcionado em relação à sua importância dogmática. A única intenção relevante para a aquisição da posse consiste em se querer obter o controlo material da coisa. Nesta medida, o animus é imanente ao corpus, nada lhe acrescentando, pois não cabe admitir que alguém possa constituir um poder de controlo sobre uma coisa sem o querer adquirir, ou seja, não se obtém automaticamente a posse de coisas que ingressem por mera casualidade na respetiva esfera de domínio físico. (…)
Aquilo que distingue a posse da detenção é a existência ou não de corpus, havendo que averiguar a correta qualificação da situação, em face do jogo concertado das várias normas aplicáveis ao caso. (…)
A detenção limita-se a designar a situação de alguém que, tendo uma coisa fisicamente em seu poder, exerce poderes de facto sobre ela, sem que esse exercício signifique obviamente que o exercente seja titular de qualquer poder de controlo sobre a coisa, não o sendo decerto sempre que atua sob as ordens ou instruções de outrem. Não é demais insistir que o corpus não é o exercício de poderes de facto mas um conceito normativo que exprime um poder de controlo sobre a coisa, que tanto pode ser exercido pelo próprio, como por outrem sob a sua direcção” – cfr. Professor Doutor Rui Paulo Coutinho de Mascarenhas Ataíde in Sobre a Distinção entre Posse e Detenção, artigo publicado em Revista da Ordem dos Advogados.
Em face deste enquadramento, não podemos, sem mais, acolher a tese da Fazenda Pública ao alertar que também um detentor, que tendo pago já uma quantia substancial pelo imóvel, tem interesse em que não existam dívidas de impostos sobre o património relativas ao mesmo, que este esteja limpo e, por último, que a sua possibilidade de venda seja anunciada através de placa nele colocada (porque pode e quer vendê-lo!); tudo isto para afirmar que o embargante será um mero detentor.
Não podemos desligar-nos de todas as circunstâncias da actuação do Recorrido e elas mostram que o embargante é titular de um poder de controlo sobre o imóvel.
Vejamos.
O primeiro momento a considerar é a formalização do contrato-promessa de compra e venda do imóvel, impondo-se averiguar qual a natureza da posse decorrente da celebração do mesmo, ou seja, se a mesma se há-de configurar como mera detenção ou posse precária, ou, ao invés, como posse em nome próprio.
Trata-se de questão que, apesar de muito debatida, tem sido objecto de soluções divergentes por parte, quer da doutrina, quer da jurisprudência: saber se o promitente-comprador que obteve a tradição da coisa prometida vender e que, entretanto, foi objecto de penhora, pode, com êxito, deduzir embargos de terceiro em reacção a tal penhora.
Para parte da doutrina, secundada jurisprudencialmente, o contrato- -promessa, não é susceptível de conferir uma posse digna de ser defendida através do presente meio processual, na medida em que, por força dele, o promitente-comprador, daqueles dois elementos caracterizadores da posse acima enunciados, apenas adquire o material, ou “corpus”, e não também o psicológico ou “animus” - cfr. Código Civil anotado dos Profs. Pires de Lima e Antunes Varela, vol. III, 2ª ed. e H. Mesquita in Direitos Reais, 1967, página 80. Vide, ainda, entre outros, os Acórdãos do STJ de 93.03.31 e 96.01.23, in CJ do Supremo de 1993, tomo II, 44 e de 1996, tomo I, 70, e, ainda, os Acórdãos do STA tirados, entre outros, nos Recursos 16.571 e 18.857, respectivamente, de 94.10.12 e 98.02.11.
Porém, outra corrente doutrinal e jurisprudencial entende que o promitente-comprador para quem se opere a transmissão do imóvel, objecto do projectado negócio de compra e venda, antes da formalização desta, passa a praticar sobre ele os actos próprios do proprietário, com a intenção de assim os exercer, adquirindo, nessa medida, aqueles dois elementos referenciados e legitimando, por consequência, o recurso aos meios de tutela judicial da posse, nomeadamente dos embargos de terceiro – cfr., entre outros, Vaz Serra, in RLJ 109, 347 e ss. e 114, 20 e ss.
Posição intermédia é a sustentada por Calvão da Silva, na medida em que, partindo do princípio da transmissão de ambos os citados elementos em hipóteses de contrato promessa de compra e venda com tradição e, por consequência da possibilidade de defesa da posse por meio de embargos de terceiro, na medida em que o beneficiário daquela promessa goze de direito de retenção, considerando o estatuído nos artºs 758º, 759º/3 e 670º/a, todos do Código Civil, admite, no entanto, que tal qualidade de possuidor não decorra, automaticamente, do contrato-promessa, tudo dependendo, do elemento psicológico que casuisticamente acompanhe o corpus, que, casuisticamente também, haverá que indagar - cfr. Sinal e Contrato-Promessa, 112 e BMJ, 349.º, 86, nota 55.
Posição próxima desta, ainda que em termos algo diversos quanto ao ponto de partida, é, também, admitida por Pires de Lima e Antunes Varela, que consideram, ainda que em excepção à regra, que o promitente-comprador pode actuar sobre a coisa prometida vender, logo que para ele se dê a tradição, como “uti dominus”, casos em que reuniriam os referidos dois elementos caracterizadores da posse legitimadores do recurso à respectiva defesa pelo processo de embargos de terceiro.
A jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo, no seguimento, sobretudo, da doutrina de Antunes Varela, tem vindo a decidir no sentido de que “são concebíveis (…) situações em que a posição jurídica do promitente-comprador preenche excepcionalmente todos os requisitos de uma verdadeira posse”, dando-se como exemplo as situações em que, “havendo sido paga já a totalidade do preço ou que, não tendo as partes o propósito de realizar o contrato definitivo, (a fim de v.g. evitar o pagamento da sisa ou precludir o exercício de um direito de preferência), a coisa é entregue ao promitente-comprador como se sua fosse já e que, neste estado de espírito, ele pratica sobre ela diversos actos materiais correspondentes ao exercício do direito de propriedade” – cf. Acórdão do STA, de 10/02/2010, recurso n.º 1117/09, e que, nestas situações excepcionais em que o promitente-comprador tem uma posse em nome próprio relativamente ao bem que lhe foi prometido vender e que, entretanto, foi penhorado, tal posse fundamentará a procedência dos embargos de terceiro que, com base nela, sejam deduzidos – neste mesmo sentido, cfr. Acórdão do STA, de 10/04/2002, recurso n.º 26295 e Acórdão do STA, de 27/10/2010, processo n.º 0453/10.
É nossa convicção que, por princípio, o contrato-promessa não confere ao promitente-comprador do imóvel o animus sibi habendi, configurando-o, nessa medida, como um mero possuidor precário ou simples detentor. Contudo, excepcionalmente, pode ocorrer que se dê inversão do título de posse (cfr. artigo 1265.º do Código Civil), nomeadamente porque o promitente-vendedor se demita, para com o promitente-comprador, de exercer os actos correspondentes ao direito real de propriedade, ao mesmo tempo que este assuma tal intenção e do que constituirá, sem dúvida, um sinal forte e, eventualmente, bastante, a circunstância do último passar a dispor do imóvel, com pagamento integral do preço de aquisição acordado para a transmissão da propriedade.
No entanto, temos por certo, igualmente, que a circunstância de alguns “sinais factuais” se reunirem na pessoa do promitente-comprador, se bem que possa constituir uma presunção natural de passar a actuar como se dono fosse do imóvel em causa, ainda assim, não implica que, inelutavelmente, se tenha de concluir em tal sentido, podendo tal presunção mostrar-se fundadamente abalada por outros quaisquer condicionalismos de sinal contrário.
Vejamos, então, que sinais temos mais na situação em apreço caracterizadores da posse.
Como vimos, o contrato-promessa não tem a virtualidade de transferir quer a posse quer a propriedade quer outro direito real menor.
O seu objecto ou prestação devida consiste apenas na emissão de uma declaração de vontade negocial destinada a realizar o contrato prometido - cfr Almeida Costa in Obrigações, pp. 287.
Nesta conformidade, podemos, pelo menos, concluir que o embargante quis comprar o imóvel em apreço.
Resulta dos factos provados (ponto 5.) que, no dia 31/10/2002, a sociedade executada outorgou uma procuração irrevogável em nome de A..., a conceder-lhe poderes para vender o lote de terreno penhorado, incluindo a si próprio.
Ora, é nossa convicção que, a partir deste momento, a executada pretendeu demitir-se de exercer os actos correspondentes ao direito real de propriedade, ou seja, considerou já não ser proprietária do lote em causa, justificando-se, assim, que tivesse exigido ao embargante o pagamento da Contribuição Autárquica, referente aos anos de 2002 e 2003, bem como o pagamento da SISA (cfr. pontos 7 e 8 da factualidade assente), fundando tal exigência na procuração emitida. Lembramos que a Contribuição Autárquica era devida pelo proprietário do prédio em 31 de Dezembro do ano a que a mesma respeitar (cfr. artigo 8.º, n.º 1 do respectivo Código) e que a SISA era o imposto directo que incidia sobre as transmissões, a título oneroso, do direito de propriedade e de outros direitos equiparáveis sobre bens imobiliários, tendo sido substituída em 01/01/2004 pelo IMT, tal como a Contribuição Autárquica o foi pelo IMI. Recordamos, ainda, a jurisprudência do STA referida na sentença recorrida: “A outorga de procuração irrevogável que confira poderes de alienação de imóveis ao mandatário considera-se transmissão onerosa determinando a liquidação e o pagamento de IMT antes da outorga notarial da respectiva procuração (art°s 2.°, n.° 3, alínea c) e 22°, n.°2 ambos do CIMT) (…).”
Por outro lado, a outorga desta procuração irrevogável indicia que a executada já tivesse recebido a totalidade do preço devido pela alienação do dito lote, uma vez que fez constar desse instrumento notarial um valor inferior (€37.866,54) ao constante do contrato-promessa (€42.148,42), embora somente resulte demonstrado nos autos o pagamento de €31.611,36 (uma primeira tranche paga no acto da assinatura do contrato-promessa de compra e venda; uma segunda paga em 06/06/2001; e uma terceira, paga em prestações, em 15/02/2002, em 15/03/2002, em 15/04/2002 e em 15/05/2002) – cfr. pontos 1, 2 e 3 da decisão da matéria de facto.
Não podemos deixar de valorar o facto de o embargante ter sido ouvido pelo tribunal recorrido, em sede de declarações de parte, e ter afirmado que adquiriu um lote de terreno, com um projecto de arquitectura associado, à sociedade “U...”, e que foram outorgar uma procuração irrevogável, para depois fazer a escritura quando quisesse, uma vez que a sua intenção era vender o lote que comprou – cfr. motivação da decisão da matéria de facto.
Efectivamente, decorre dos elementos apurados nos autos que o embargante queria vender o lote que adquiriu, só assim fazendo sentido ter limpado várias vezes o terreno e ter colocado no mesmo uma placa de venda, com indicação do seu número de telemóvel – cfr. pontos 15 e 16 da decisão da matéria de facto.
Esta atitude continuada, estes comportamentos duradouros, a partir de 31/10/2002, são sinais positivos no sentido de um poder de controlo sobre o terreno em causa, dado que, se não tivesse intenção de exercer o direito de propriedade sobre o imóvel, não teria, realmente, colocado o mesmo à venda, nem teria procedido ao pagamento da respectiva Contribuição Autárquica e da SISA.
Na verdade, os sinais recolhidos, cada um por si só, poderão não ser suficientes para concluirmos a presença de “posse”, mas, todos conjugados e concatenados entre si, permitem verificar a existência do necessário poder de controlo sobre o imóvel, a título de exercício do direito de propriedade, compatível com o referido “corpus” e “animus” caracterizadores da posse. Referimo-nos à outorga de procuração irrevogável; ao depoimento da testemunha, ao depoimento de parte; ao facto de o embargante ter querido comprar o imóvel - espelhado no contrato-promessa de compra e venda - (pois só assim o poderia vender como bem próprio); ao facto de a sociedade executada ter exigido o pagamento dos impostos relativos ao lote de terreno, o embargante ter efectuado o seu pagamento; à limpeza, várias vezes, do terreno; à sua intenção de venda, em nome próprio, do lote e à concretização dessa vontade própria, colocando uma placa de venda no mesmo; a articulação de todas as circunstâncias e sinais descritos criam a convicção que tal lote de terreno pertence ao aqui embargante.
Nestes termos, encontram-se reunidos os pressupostos, referidos supra, para embargar de terceiro, impondo-se a confirmação da sentença recorrida que julgou os presentes embargos procedentes.

Conclusões/Sumário

1. O contrato-promessa, só por si, não é susceptível de transferir a posse ao promitente-comprador.
2. Constituindo, por princípio, a tradição de imóvel, decorrente de contrato-promessa de compra e venda, mera detenção precária, ela pode, no entanto, consubstanciar uma verdadeira posse se envolver a transmissão, não só do “corpus”, mas do “animus”, o que caberá ser, casuisticamente, averiguado.
3. Nas situações excepcionais em que o promitente-comprador tem uma posse em nome próprio relativamente ao bem que lhe foi prometido vender e que, entretanto, foi penhorado em processo de execução fiscal, tal posse fundamentará a procedência dos embargos de terceiro que, com base nela, sejam deduzidos.
4. São sinais positivos dessa posse, no caso, do poder de controlo sobre o imóvel, concatenados entre si, a outorga de procuração irrevogável a conceder ao embargante poderes para vender o lote de terreno penhorado, incluindo a si próprio; o facto de a sociedade executada ter exigido o pagamento dos impostos relativos ao lote de terreno fundado nessa procuração, o embargante ter efectuado o seu pagamento; a limpeza, várias vezes, do terreno pelo embargante; a sua intenção de venda, em nome próprio, do lote e a concretização dessa vontade própria, colocando uma placa de venda no mesmo com o seu número de telemóvel.

IV. Decisão

Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte, em negar provimento ao recurso.
Custas a cargo do Recorrente, nos termos da tabela I-B – cfr. artigos 6.º, n.º 2, 7.º, n.º 2 e 12.º, n.º 2 do Regulamento das Custas Processuais.
Porto, 02 de Fevereiro de 2017.
Ass. Ana Patrocínio
Ass. Ana Paula Santos
Ass. Fernanda Esteves