Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01276/14.1BEAVR
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:05/27/2022
Tribunal:TAF de Aveiro
Relator:Helena Ribeiro
Descritores:RESTITUIÇÃO DE PRESTAÇÕES SOCIAIS DE SUBSIDIO DE DESEMPREGO- ATO REVOGATÓRIO- FUNDAMENTAÇÃO
Sumário:I-Um ato administrativo está fundamentado quando o seu conteúdo revele uma “sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito”, ou remeta para uma “mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas que constituirão neste caso parte integrante do respetivo ato”.

II- Sendo o ato de atribuição de prestações sociais de desemprego um ato constitutivo de direitos, a suspensão do pagamento dessas prestações e a ordem de reposição das prestações entretanto recebidas pelo beneficiário, reclamam da Administração que previamente emita um ato revogatório com a indicação das razões de facto e de direito que expliquem o motivo pelo qual o mesmo é exarado.

III- A restituição direta dos montantes devidos à Segurança Social, não opera de forma automática. Para tanto, exige-se que seja aberto um procedimento que permita a intervenção do destinatário do ato e que conduza a uma decisão de concessão indevida das prestações (cfr. artigo 5º do DL nº 133/88).

IV- Constatando-se que a Autora apenas foi notificada de uma “nota de restituição”, não lhe tendo sido comunicada a intenção da Apelada de revogar a decisão administrativa de deferimento da concessão do subsídio social de desemprego, para exercer, querendo o direito de audiência prévia, sequer da prolação de uma decisão final de revogação desse ato inicial, não pode ter-se “a nota de restituição” como o ato final desse procedimento.
Sumário (elaborado pela relatora – art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil).
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Especial para Impugnação de Acto Administrativo (CPTA) - Recurso Jurisdicional
Decisão:Conceder provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido da procedência do recurso.
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Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes desembargadores da Secção Administrativa do Tribunal Central Administrativo Norte:

I.RELATÓRIO
1.1.AA..., residente em (…), intentou a presente ação administrativa contra o INSTITUTO DA SEGURANÇA SOCIAL, I.P., com sede na Rua Rosa Araújo, n.º 43,1250- 194 Lisboa, pedindo a declaração de nulidade do ato administrativo praticado pelo Vice-Presidente do Conselho Diretivo, datado de 16/09/2014, que julgou improcedente o recurso hierárquico por si interposto, da nota de reposição nº 5546269, emitida pelo Centro Distrital de Aveiro do ISS, I.P., que lhe foi comunicada pelo ofício de 24/11/2008 e que determinou a obrigatoriedade de reposição da quantia de € 4.107,16, por alegadamente ter sido indevidamente paga à Autora a título de prestações de desemprego no período de dezembro/2007 a setembro/2008.
Para tanto, alega, em síntese, que o ato impugnado padece do vício de falta de fundamentação, por não referir com a devida clareza a base legal na qual sustenta “que com a notificação da suspensão da prestação se deve considerar que existiu revogação da decisão de atribuição do subsídio” e omitir a apreciação das questões de facto e de direito que foram suscitadas (cf. artigos 5.º e 6.º da petição inicial).
Só com a notificação do despacho proferido em 29.09.2014, a Autora tomou conhecimento da fundamentação do ato de suspensão do pagamento das prestações, porque nunca foi notificada desta suspensão, e nunca foi notificada dos fundamentos da decisão de restituição das prestações de 25.11.2008;
E não tendo o Réu revogado o ato de atribuição do subsídio, nos termos legais e no prazo legalmente previsto, não é exigível a reposição do valor em causa, sendo evidente a violação dos princípios da justiça, proporcionalidade, legalidade, boa fé e da confiança.
1.3. Citado, o Réu contestou a ação, defendendo-se por exceção e por impugnação.
Na defesa por exceção, invocou a inimpugnabilidade do ato de segundo grau e, bem assim, a caducidade do direito de ação quanto ao ato de primeiro grau.
Na defesa por impugnação, alegou, em síntese, que em 03/05/2005, na sequência de ter cessado o contrato de trabalho com a entidade empregadora, e do requerimento apresentado para a concessão de subsídio de desemprego, foi atribuído à Autora subsídio de desemprego por 720 dias, com início em 14/10/2005.
Em outubro de 2007, a Autora requereu a atribuição de subsídio de desemprego parcial, uma vez que havia celebrado contrato de trabalho a tempo parcial e reunia as demais condições legalmente previstas, tendo-lhe sido concedido o mesmo, por um período de 72 dias, com início em 03/07/2007.
Finda tal prestação começou a auferir subsídio social de desemprego subsequente por 360 dias com início em 15/12/2007, mas durante esse período nunca deixou de exercer a atividade profissional que havia cumulado com o subsídio de desemprego parcial, pelo que, em 30/09/2008, tendo os serviços do Réu apercebido da concessão indevida da prestação social de desemprego subsequente, foi determinada a suspensão, com efeitos a 15/12/2007.
Nessa sequência, foi emitida, a 24/11/2008 a correspondente nota de reposição referente ao período durante o qual a Autora recebeu indevidamente tal subsídio.
A regra da prestação é a da inacumulabilidade com rendimentos do trabalho, com exceção do subsídio de desemprego parcial, pelo que, tendo a Autora sido notificada da suspensão do pagamento da prestação e da data da produção dos seus efeitos, na esteira do preceituado nos artigos 52.º, n.º1, alínea a) e 56.º do D.L. 220/2006 em virtude do exercício da atividade profissional, antes de decorrido o prazo de um ano previsto no artigo 141.º do CPA, tal implica para a Autora a obrigação de restituição dos valores indevidamente recebidos.
Daqui decorre que a obrigação de restituir é independente do ato administrativo considerado em si mesmo, pois ela nasce diretamente do recebimento indevido de prestações, não podendo assim a Autora, ao contrário do alegado no artigo 36 da p.i., vir dizer que a não revogação do ato administrativo de atribuição do subsídio importa a não exigibilidade do valor em causa.
Conclui, pugnando pela improcedência da ação.
1.3. Em 10/09/2021, proferiu-se despacho a ordenar ao Réu a junção aos autos do original da notificação à Autora da decisão de suspensão do pagamento das prestações de subsídio de desemprego.
1.4. O Réu respondeu que “de acordo com informação prestada pelos respetivos serviços, o processo físico já não se encontra disponível em arquivo, sendo que o mesmo terá sido eliminado ao abrigo do Regulamento Arquivístico do ISS, I.P.” (cf. fls. 205 do SITAF).
1.5. Em 03/11/2021, proferiu-se despacho saneador que julgou improcedentes as exceções dilatórias deduzidas, e ordenou-se a notificação das partes para apresentarem, querendo, alegações escritas (cf. fls. 236 e 256 do SITAF).
1.6. Ambas as partes apresentaram alegações escritas, reiterando a posição assumida nos respetivos articulados.
1.7. Em 11/01/2022, foi proferida sentença, contendo essa sentença o julgamento de facto e de direito, onde se julgou improcedente a presente ação, a qual consta da seguinte parte dispositiva:
«Em face do exposto, porque não provada, julga-se a presente ação totalmente improcedente e, consequentemente, mantém-se o ato administrativo na ordem jurídica.
Custas a cargo da A., sem prejuízo do apoio judiciário.
Registe e notifique.
Aveiro, 11.01.2022 »

1.8. Inconformada com o assim decidido, a Autora interpôs o presente recurso de apelação, em que formula as seguintes Conclusões:

«Considerando que:
1.ª - No que se refere ao ato contido no despacho de 16/09/2014 exarado pelo Vice- Presidente do Conselho Diretivo do Instituto da Segurança Social, I.P. que negou provimento ao recurso interposto e determinou a obrigatoriedade de reposição do montante de € 4.107,16, consta do referido despacho, levado ao ponto 11 dos factos provados, em 14. e 15, o seguinte “Encontra-se demonstrado por consulta ao processo administrativo que o subsídio social de desemprego subsequente atribuído à beneficiária foi suspenso com efeitos ao início da concessão (15/12/2007), e que a interessada foi desse ato notificada, por oficio de 30/09/2008, com o seguinte fundamento: "Exercer atividade profissional por conta própria ou por conta de outrem (...) A suspensão produz efeitos em 2007-12-15", "sem prejuízo da restituição de prestações indevidas, se for caso disso"; “Assim, conclui-se que a interessada foi oportunamente notificada dos motivos pelos quais se constituiu na obrigação de repor, ainda que, com menor rigor, os serviços tenham notificado a interessada da "suspensão da prestação" com efeitos à data de início e não, como deviam, da revogação da decisão de atribuição do citado subsídio, por violação de lei, pelo que o prazo geral de um ano aplicável à revogação dos atos administrativos e previsto no artigo 141º do CPA se mostra cumprido na presente situação.”;
2.ª - Dispõe o artigo 124º CPA (DL 442/91 de 15 de Novembro) sob a epígrafe “Dever de Fundamentação” que, “devem ser fundamentados os atos administrativos que, total ou parcialmente: neguem, extingam, restrinjam ou afetem por qualquer modo direitos e interesses legalmente protegidos” e o artigo 125º do mesmo diploma legal que “A fundamentação deve ser expressa, através de sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito da decisão, podendo consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, que constituem nestes casos, parte integrante do respetivo ato”; Estes preceitos vêm regular o direito fundamental à fundamentação expressa e acessível a todos os atos que afetem direitos ou interesses legalmente protegidos, consagrado no artigo 268º n.º 3 da Constituição da República Portuguesa;
3.ª - No caso dos autos está em causa a fundamentação de um ato de “suspensão” que a entidade demandada entende dever considerar-se como “ato de revogação”, que não foi notificado à Autora, que assim desconhecia em absoluto, até à data em que é proferido o despacho recorrido, a fundamentação subjacente ao ato executório de restituição; Ato de revogação legalmente imposto que determina a produção de efeitos especialmente gravosos para os interessados, circunstância que, por isso, implica a existência de um dever acrescido de fundamentação, na medida em que a fundamentação será determinante para o interessado identificar e acompanhar as efetivas motivações do autor do ato;
4.ª - Como doutamente explana o STA ”A fundamentação do ato administrativo é um conceito relativo que varia conforme o tipo de ato e as circunstâncias do caso concreto, mas a fundamentação só é suficiente quanto permite a um destinatário normal aperceber-se do itinerário cognoscitivo valorativo seguido pelo autor do ato para proferir a decisão, isto é, quando aquele possa conhecer as razões por que o autor do ato decidiu como decidiu e não de forma diferente, de forma a poder desencadear os mecanismos administrativos ou contenciosos de impugnação”(AC STA de 18.12.2022, proc. 048366, in ww.dgsi.pt);
5.ª - Há que aferir então se foi possível à Autora, destinatária do ato de anulação, aperceber-se do itinerário cognoscitivo e valorativo efetuado pela entidade demandada, por tal forma que possam considerar-se cumpridas as três funções do dever de fundamentação; habilitar o interessado a optar pela impugnação do ato, a de assegurar uma ponderação das decisões e a de permitir um controlo judicial eficaz;
6.ª - Dos autos decorre que o Vice-Presidente do Conselho Diretivo considerou que a Autora teve conhecimento da fundamentação subjacente à decisão que determinou a reposição das quantias, através da notificação de “suspensão” e que esta deveria ser tida como revogação, encontrando-se assim cumprido o prazo de 1 ano que dispunham para a revogação dos atos;
7.ª - Não comprovando a Entidade Demandada do Réu que a Autora foi notificada, por ofício de 30/09/2008, do ato de suspensão, NUNCA poderia esta ser tida como revogação do ato...Nem poderia ser entendido, como o fez o Tribunal “A QUO” que a Autora teve conhecimento da fundamentação expendida pela entidade demandada que permite perceber o arrazoado factual em que se baseou para decidir no sentido que decidiu, pois, só teve conhecimento efetivo da fundamentação subjacente ao ato executório de restituição aquando da notificação do Despacho proferido pelo Vice- Presidente do Conselho Diretivo, de 16/09/2014, comunicado à Autora em 02/10/2014(conforme pontos 11 e 12 dos factos provados) sendo que, também no âmbito deste não decorre do mesmo a fundamentação legal para considerar que um ato inexistente de “suspensão”, que não se mostra notificado à Autora, pode ser tido como ato de revogação; (sublinhado nosso)
8.ª - Só mediante a indicação do direito aplicável, ainda que sucinta, poderia a Autora perceber o exato enquadramento legal expendido pelo autor do ato, por forma a poder contestar, de forma esclarecida e eficaz, o motivo pelo qual foi exarado. Sendo que, nunca foi concedido à Autora essa possibilidade, e quando se pode pronunciar sobre o ato de restituição, fê-lo procedendo ao enquadramento jurídico que considerava aplicável, sem que lhe fosse possível sindicar diretamente o enquadramento jurídico do ato, por NUNCA lhe ter sido notificado e para o qual o Vice-Presidente do Conselho Diretivo remete...;
9.ª - Ao contrário do expendido na sentença de que se recorre verifica-se no presente caso vício de forma por falta de fundamentação, em virtude da omissão dos fundamentos de facto (que só 26 se tornaram cognoscíveis à Autora quando notificada do Despacho recorrido em setembro de 2014), e de direito da decisão impugnada;
10.ª - O ato que despoletou o recurso hierárquico da aqui Recorrente foi a Nota de Restituição a que alude o ofício datado de 25/11/2008(facto 3 dado como provado), ato praticado pelo Instituto da Segurança Social, I.P., nos termos do Decreto-Lei n.º133/88 de 20 de abril, que disciplina a responsabilidade emergente do pagamento indevido de prestações de segurança social: Estatui o artigo 1º do referido diploma, sob a epígrafe “obrigação de restituir” que: “O recebimento indevido de prestações no âmbito dos regimes de segurança social dá lugar à obrigação de restituir o respetivo valor, sem prejuízo da observância do regime de revogabilidade dos atos administrativos”. Sendo que, nos termos do art.º 2º do mesmo diploma “consideram-se prestações indevidas as que sejam concedidas sem observância das disposições legais em vigor” (nº 1);
11.ª - Prevê o art.º 5º do diploma referido anteriormente sob a epígrafe “Procedimento administrativo” no seu nº 1 que, “Verificada a concessão indevida de prestações, devem as instituições cessar de imediato os pagamentos, averiguar a identidade de quem as recebeu e proceder à sua interpelação para efetuar a restituição e informar sobre os respetivos valores e termos que a mesma pode revestir”. E, estabelece o artigo 15º sob a epígrafe “Revogabilidade dos atos de atribuição das prestações” que “(1) – Os atos administrativos de atribuição de prestações feridos de ilegalidade são revogáveis nos termos e nos prazos previstos para os atos administrativos constitutivos de direitos”: Dispõe, ainda, o artigo 17º que “A revogação dos atos administrativos de atribuição de prestações tem como efeito a obrigação de repor, por parte dos beneficiários, os valores das prestações indevidamente recebidas”;
12.ª - Nos termos do 1 do artigo 141º do Código do Procedimento Administrativo(CPA), aplicável ex vi artigo 15º do Decreto Lei n.º 133/88 de 20 de abril “Os atos administrativos que sejam inválidos só podem ser revogados com fundamento na sua invalidade e dentro do prazo do respetivo recurso contencioso ou até à resposta da entidade recorrida”: E, que o ato de revogação deve revestir a forma legalmente prescrita para o ato revogado(artigo 143º do CPA), isto é, a revogação de qualquer ato administrativo está sujeito à disciplina prevista dos artigos 138º e ss do CPA;
13.ª - No presente caso retira-se, do ponto 3 dos factos provados, que a Autora foi notificada para proceder à restituição do montante de €4.107,16 que lhe havia sido processado e que lhe foi ainda comunicado que, na hipótese de não proceder ao pagamento do montante referido no prazo de 30 dias...E da informação dos serviços da entidade da Ré, ponto 10 dos factos provados, que “...não existe comprovativo da efetiva receção da decisão “suspensão” do subsídio social de desemprego subsequente(uma vez que a comunicação seguiu, presume-se, por correio simples)..., do processo administrativo também não consta cópia do despacho que, à data, reconheceu o pagamento indevido e determinou a revogação do ato de atribuição, com as legais e devidas consequências, existindo apenas uma informação, manuscrita, com data de 01/07/2013”...Resulta assim, inequívoco, dos factos provados, que a Autora não terá sido notificada da decisão de suspensão, onde, alegadamente, a entidade demandada fez constar os fundamentos para a suspensão das prestações. E, que, por via disso, NUNCA a Autora tomou conhecimento dos fundamentos subjacentes à decisão e ao pedido de restituição das prestações;
14.ª - O ato notificado à Autora, restituição de prestações, é um ato consequente, um ato de execução de um ato que teria de ter existido previamente, que definisse a situação jurídica da Autora, no qual ficasse patente a decisão de restituição da prestação indevidamente paga e os fundamentos de facto e de direito que sustentam tal decisão. A Recorrente da nota de restituição apenas retira o montante a devolver e que o mesmo respeita a prestações, desconhecendo o fundamento que determinou a devolução;
15.ª - Decorre do art.º 1º do CPA que “entende-se por procedimento administrativo a sucessão ordenada de atos e formalidades relativos à formação, manifestação e execução da vontade dos órgãos da Administração Pública”. Tal
significa, para o que aqui releva, que a formação da vontade da Administração, tem de responder a um procedimento administrativo, a uma sucessão ordenada de 28 atos tendentes à obtenção da decisão final. Tal procedimento, em respeito pelas garantias dos administrados, tem de ser necessariamente respeitado, sob pena de entorpecer a formação da vontade da administração, diminuindo a proteção dos destinatários dos atos. Tal como resulta do art.º 5º do DL nº 133/88, a restituição direta dos montantes devidos à Segurança Social, não opera de forma automática, sem que exista um procedimento que permita a intervenção do destinatário do ato e conduza a uma decisão de concessão indevida das prestações;
16.ª - Na situação dos autos verifica-se que a Autora foi notificada apenas da Nota de restituição (cfr. ponto 3 dos factos provados) e nunca da intenção do ISS, I.P. declarar a nulidade do ato administrativo de deferimento e para exercer, querendo o direito de audiência prévia (direito de resposta) e que, contrariamente ao que sugere a Entidade Ré, a Autora nunca teve conhecimento nem oportunidade de se pronunciar no âmbito do procedimento administrativo. E, muito menos que houve comunicação da “suspensão”, pois, como resulta do ponto 10 dos factos provados, na informação dada pelos serviços da Ré, “ … não existe comprovativo nos autos da efetiva receção da decisão de “suspensão” do subsídio social de desemprego subsequente indevidamente recebido pela interessada(uma vez que a comunicação seguiu, presume-se, por correio simples), sendo que a interessada não admite ter conhecimento da mesma; do processo administrativo também não consta cópia do despacho que, à data, reconheceu o pagamento indevido e determinou a revogação do ao de atribuição, com as legais e devidas consequências, existindo apenas uma informação, manuscrita, com data de 01.07:2013...(cf. Fls. 30 do PA)”;
17.ª - Não resulta dos autos a notificação à Autora de qualquer decisão de suspensão, também não se pode entender que o ato notificado pelo Instituto da Segurança Social, I.P., seja efetivamente o ato final desse procedimento. Isto porque, este ato, de restituição, depende de um ato anterior definidor da situação jurídica da Autora. O ato praticado pelo Instituto da Segurança Social, tem como único escopo a restituição das verbas, não se pronunciando sequer quanto ao fundamento da restituição, o que o leva a ser qualificado como um ato consequente de um outro ato administrativo que, a existir, teria de ter apreciado a concreta situação de facto e direito da Autora, ponderado os argumentos apresentados e decidido por uma arrecadação indevida de uma prestação ou subsídio(neste sentido se mostra decidido no Ac. TCAN, de 19/11/2021, proc. 00619/16.8BEPNF, in www.dgsi.pt);
18.ª - Perante as concretas circunstâncias em presença, haverá que se concluir que, o ato administrativo impugnado dependia de um ato administrativo prévio que definisse a situação jurídica da Autora e que tivesse efetivamente declarado a nulidade do ato administrativo de deferimento da prestação, o que não ocorreu. Deste modo, o ato praticado pelo Instituto da Segurança Social, é ilegal, porque praticado com pressuposto num ato administrativo inexistente, ou seja, praticado sem que tivesse sido definida a título definitivo a situação jurídica da Autora;
19.ª - No âmbito do Despacho proferido pelo Vice-Presidente do Conselho Diretivo, com data de 16-09-2014, ponto 11 dos factos provados, não ficou demonstrado que a interessada tenha sido notificada do ato de suspensão do subsídio social subsequente, por ofício de 30/09/2008(cfr. Informação dos serviços da Ré/ponto 10 dos factos provados), não poderia, nunca, proceder o argumento avançado pela Ré, que “a interessada foi oportunamente notificada dos motivos pelos quais se constituiu na obrigação de repor, ainda que, com menor rigor, os serviços tenham notificado a interessada da “suspensão da prestação” com efeitos à data de início e não, como deviam, da revogação da decisão de atribuição do citado subsídio, por violação da lei, pelo que o prazo geral de um ano aplicável à revogação de atos administrativos... se mostra cumprido na presente situação.”;
20.ª - Só com a notificação do ato proferido pelo Vice-Presidente do Conselho Diretivo é que a Autora tomou conhecimento formal da fundamentação subjacente à restituição determinada, ato executório do ato administrativo prévio inexistente pois o mesmo se proferido (?) nunca foi notificada a Autora. Assim, não releva nestes autos discutir se a Autora “continuou a exercer atividade profissional(...)” na medida em que inexiste um ato administrativo final no procedimento, que defina a concreta situação jurídica da Autora, convocando as razões de facto e de direito que sustentam essa definição, permitindo depois que se discutam os fundamentos da mesma. Aliás, analisar nestes autos se existiu ou não efetiva prestação de trabalho, estar-se-ia, no limite, a discutir um fundamento hipotético, pois desconhece-se a concreta fundamentação em que assentaria um suposto ato de declaração de nulidade De onde que, conclui-se pela ilegalidade do ato administrativo praticado Instituto da Segurança Social I.P., por inexistência de ato definidor da situação jurídica da Autora, o que conduz à anulação do mesmo com todas as demais consequências legais, nas quais se incluem a restituição de tudo o que houver sido prestado (art.º 173º, nº 1 do CPTA), ou seja a restituição das quantias indevidamente retidas à Autora;
21.ª - A eventual reposição das prestações sempre dependeria da revogação tempestiva da sua atribuição. O que não ocorreu, quer com a inverificada “suspensão”, quer com a notificação para restituição, a que alude a sentença ora recorrida;
22ª – A Autora, pese embora o facto de aparentemente não preencher os pressupostos para que lhe pudesse ser atribuída a prestação, tem no entanto o beneplácito de proteção do artigo 141 do CPA, e do princípio de segurança jurídica que o enforma;
23.ª - Não estando em conformidade legal a atuação administrativa que determinou a restituição das quantias auferidas entretanto a título de prestações, nem a atuação administrativa de entender que o ato de suspensão, NÃO NOTIFICADO, deverá ser entendido como revogação do ato, e que este se mostra cumprido no prazo de 1 ano, tanto mais que, NUNCA poderia o Réu aproveitar uma hipotética notificação de “ suspensão da prestação”, para entender que a mesma se deva considerar como notificação “da revogação da decisão do citado subsídio, por violação de lei...” Pois além de nunca a Autora ter sido notificada da suspensão da prestação, são figuras afins diferentes, já que a revogação é um ato administrativo que visa cessar os efeitos de uma ato anterior por motivos de mérito, conveniência e oportunidade, para além da anulação, e distingue-se e não se confunde com a figura afim como é a suspensão, pois enquanto que na revogação existe uma paralisação definitiva dos efeitos do ato, na segunda existe uma paralisação temporária de tais efeitos.
24.ª – Existiu no presente processo vício de preterição do procedimento administrativo legalmente devido por preterição das formalidades essenciais;
25.ª - Tratando-se o ato de atribuição do subsídio social de desemprego de um ato constitutivo de direitos o mesmo, por força do estatuído no artigo 141º do CPA, só poderia ser objeto de anulação dentro de o prazo de um ano, a contar da respetiva emissão, o que não veio a acontecer nos autos, como exuberante resulta do PA junto aos autos;
26.ª - Ultrapassado que foi o momento em que o Réu poderia ter utilizado o seu poder revogatório relativamente à atribuição do subsídio, sem que o tivesse feito, estabilizou-se, sendo já insuscetível a reposição de quaisquer montantes anteriormente atribuídos a título de subsídio. O subsídio social de desemprego é já insuscetível de ser reposto face da verificada impossibilidade de revogação desses atos ocorridos em 2007, não estando em conformidade legal a atuação administrativa que determinou a reposição das quantias atribuídas(neste sentido se mostra decidido no acórdão do TCAN, de 02-10-2020, no processo n.º 1193/17.3BEBRG, disponível in www.dgsi.pt.);
27.ª - No presente caso a argumentação /interpretação legislativa efetivada no Tribunal “A Quo”, não reflete toda a contribuição com que cada uma das partes participou na decisão impugnada, pois que apenas atribui culpa à Autora, isentando de qualquer reparo a atuação do ISS,I.P., o que, manifestamente não colhe, sob pena de à administração tudo ser possível e ao administrado, numa situação, em regra, mais frágil – como é o caso dos autos, ser compelido a pautar a sua conduta pelo estrito conhecimento de todos os enredos legais...Na verdade se à Autora não pode deixar de ser imputada coresponsabilidade na perceção do subsídio... com o argumento de que o desconhecimento da lei lhe não aproveita – mais responsabilidade tem de ser imputada aos serviços do ISS, a quem era exigida muito maior cuidado com a observância das normas legais, quando laboram todos os dias com esses problemas e, mesmo dispondo de todos os elementos fácticos necessários “exercício por parte da autora de atividade profissional, que esta nunca escondeu” atuam em desconformidade com as normas legais expressas ...”(neste sentido se mostra decidido no AC TCA de 14/06/2013, processo 02031/09.6BEPRT);
28.ª - Do exposto, não poderá obter acolhimento a posição/interpretação do Tribunal “A Quo” ao considerar que com o ato de restituição, nos termos em que foi concretizado, é um ato revogatório do ato constitutivo de direito que atribuiu o subsídio social de desemprego à A. dentro do prazo de um ano, previsto no artigo 141 do CPA;
29.ª- Ao decidir nos termos da douta sentença em recurso, quer quanto à matéria de facto tida por provada, quer quanto ao seu enquadramento jurídico-legal, o Tribunal “A Quo” violou o disposto nos artºs. 66º, 124º, 125º, 127º, 141º do CPA, artigos 1º, 15º, 16º, 17º do Decreto Lei 133/88 de 20 de abril e o artigo 268º n.º 3 da CRP.
NESTES TERMOS, e com o douto suprimento desse Venerando Tribunal, revogando a douta Sentença em recurso, julgando a ação procedente, por provada, e condenando o Réu do pedido contra ele formulado, Vªs. Exªs. farão, como sempre, a habitual
J U S T I Ç A»

1.9. O Apelado contra-alegou, apresentando as seguintes Conclusões:

«1. O presente Recurso vem interposto pela Recorrente AA..., não concordando com a improcedência do vício de falta de fundamentação nem com improcedência da violação de lei. Mais veio alegar que houve falta de revogação do ato de atribuição no prazo legal.
Sobre o alegado vício de falta de fundamentação
2. A Recorrente alega que se verifica um vício de falta de fundamentação em relação ao ato de restituição das quantias pagas indevidamente, datado de 25/11/2008 – ato este que não foi impugnado pela Recorrente. De facto, o ora, ato aqui em crise é o ato que decidiu o recurso hierárquico, datado de 16/09/2014 e notificado pelo ofício n.º 98235/2014.
3. Cita-se a douta Sentença: «Ora, no caso em concreto, analisando o teor da decisão proferida pelo Vice-Presidente do Conselho Diretivo do Réu (fundamentação formal), verifica-se que a mesma é clara quanto às razões de facto e direito que conduziram à tomada de decisão, e que cumpre a exigência legal e constitucional de fundamentação do ato administrativo que é a de dar a conhecer ao seu destinatário, ora A., o ato praticado e o itinerário cognoscitivo do órgão decisor.» (pág. 19 da Sentença).
4. A Recorrente alega que só teve conhecimento da fundamentação com o Despacho proferido pelo Vice-Presidente do Conselho Diretivo, de 16/09/2014, porém apresentou recurso hierárquico em 12/03/2009 (ponto 8 dos factos dados como provados), e, pelo conteúdo do recurso hierárquico apresentado pela Recorrente, denota-se que esta tinha conhecimento que o que estava em dissídio, era efetivamente ter recebido quantias a título de subsídio de desemprego subsequente enquanto desempenhava uma atividade por conta de outrem.
5. Além do mais, a Recorrente não aduziu nas suas Alegações de Recurso qualquer erro de julgamento de facto quanto ao ponto n.º 4 da Sentença do douto Tribunal a quo, que considerou: «Após receber a comunicação acima referida, a A. foi informada pelos serviços do Réu que a restituição era devida por estar a exercer atividade profissional (facto admitido por acordo)», e conforme o ponto da Sentença refere, o facto foi admitido por acordo.
6. E, volte-se a referir que a Sentença do Tribunal a quo deu como provado que a Recorrente foi informada pelos serviços do Réu que a restituição era devida por estar a exercer atividade profissional (facto admitido por acordo) e constante dos factos provados em ponto 4 da Sentença.
7. Ora, um ato está suficientemente fundamentado quando o destinatário do ato, colocado na posição de um destinatário normal possa ficar a conhecer as razões de facto e de direito que estão na sua génese, de modo a permitir-lhe optar, de forma esclarecida, entre a aceitação do ato ou reagir contra ele e, em última circunstância, que permita ao tribunal também exercer o efetivo controle da legalidade do ato, aferindo o seu acerto jurídico em face da sua fundamentação contextual.
8. Não há dúvidas, que a Recorrente conseguiu entender esclarecidamente as razões de facto e de direito, e para tanto, que reagiu contra o ato (e, neste ponto à cautela de patrocínio, diga-se que reagiu contra o ato de restituição, através do recurso hierárquico, e reagiu contra o despacho proferido pelo Vice-Presidente do Conselho Diretivo, de 16/09/2014).
9. A fundamentação entende-se como a obrigação de enunciar expressamente os motivos e as razões de facto e de direito que levaram o órgão da Administração Pública, enquanto autor do ato, a decidir daquela forma e não de outra.
10. A fundamentação não necessita de ser uma exaustiva descrição de todas as razões que estiveram na base da decisão, bastando que se traduza numa “sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito”, ou até numa “mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas que constituirão neste caso parte integrante do respetivo ato” – artigo 125.º do CPA.
11. O Supremo Tribunal afirmou expressamente, no Acórdão n.º 762/02, de 19 fevereiro de 2003, que “(…) a fundamentação dos atos administrativos visa, por um lado, dar a conhecer aos seus destinatários o iter cognoscitivo e valorativo seguido pela Administração, de molde a permitir-lhes uma opção consciente entre a aceitação do ato e a sua impugnação contenciosa, e, por outro, que a Administração, ao ter de dizer a forma como agiu, porque decidiu desse modo e não de outro, tenha de ponderar aceitavelmente a sua decisão (…)”.
12. Todos os elementos de que tomou conhecimento, à luz do padrão de um destinatário médio, denotam que a Recorrente tenha ficado na posse dos fundamentos que estiveram na base da prolação da decisão, uma vez que a mesma, quando impugnou contenciosamente o ato, tinha a perfeita cognoscibilidade de todos os factos.

Sobre o ato revogatório
13. A revogação é o ato administrativo que determina a cessação dos efeitos de outro ato, por razões de mérito, conveniência ou oportunidade.
14. O artigo 54.º, n.º 1, alínea a), do Decreto-Lei n.º 220/2006, de 03/11, estabelece que o direito às prestações de desemprego cessa por razões inerentes à situação dos beneficiários perante os sistemas de proteção social de inscrição obrigatória.
15. Estabelecia o artigo 2.º, n.º 1, alínea a), do Decreto-Lei n.º 133/88 de 20/04, que estabelece o Regime Jurídico da Responsabilidade Emergente do Pagamento Indevido de Prestações da Segurança Social, na redação em vigor à data dos factos, que se consideram prestações indevidas as que são concedidas sem observância das condições legais de atribuição.
16. Determina o n.º 1 do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 133/88 de 20/04, que: “Verificada a concessão indevida de prestações, devem as instituições cessar de imediato os pagamentos, averiguar a identidade de quem os recebeu e proceder à sua interpelação para efetuar a restituição e informar sobre os respetivos valores e termos que a mesma pode revestir”.
17. Nos termos do artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 113/88, de 20/04, “O recebimento indevido de prestações no âmbito dos regimes de segurança social dá lugar à obrigação de restituir o respetivo valor, sem prejuízo da observância do regime de revogabilidade de atos administrativos”.
18. Por conseguinte, o artigo 15.º do Decreto-Lei n.º 133/88, de 20/04, com a epígrafe “Revogabilidade dos atos de atribuição das prestações”, determina que:
“1 - Os atos administrativos de atribuição de prestações feridos de ilegalidade são revogáveis nos termos e nos prazos previstos para os atos administrativos constitutivos de direitos, salvo o disposto no número seguinte.
(…)”.
19. Por sua vez, o artigo 16.º dispõe que:
“1 - O prazo de revogação dos atos administrativos de atribuição das prestações começa a contar a partir da data em que o ato foi praticado, ainda que os seus efeitos se reportem a momentos anteriores, ou da data de decisão judicial de que resulte ilegalidade na atribuição da prestação.
2 - No caso em que os atos de atribuição das prestações não possam conter expressamente, em atenção às regras do processo de formação dos mesmos atos, a data da atribuição, considera-se que a mesma se reporta à do primeiro pagamento”.
20. No anterior CPA, o prazo de revogação estava vinculado ao prazo máximo de impugnação para o Ministério Público – 1 ano – mais precisamente referia o artigo 141.º, n.º 1, do anterior CPA, que “os atos administrativos que sejam inválidos só podem ser revogados com fundamento na sua invalidade e dentro do prazo do respetivo recurso contencioso ou até à resposta da entidade recorrida”.
21. E, por fim, o artigo 17.º do Decreto-Lei n.º 133/88, de 20/04, com a epígrafe “Efeitos da revogação” estipula que: “A revogação dos atos administrativos de atribuição de prestações tem como efeito a obrigação de repor, por parte dos beneficiários, os valores das prestações indevidamente recebidas”.
Sobre a alegada violação de lei.
Em Outubro de 2007, requereu a atribuição de subsídio de desemprego parcial, uma vez que havia celebrado contrato de trabalho a tempo parcial e reunia as demais condições legalmente previstas. Assim, foi-lhe o mesmo concedido, por um período de 72 dias (período remanescente do subsídio de desemprego), com início em 03/10/2007, (data da celebração do contrato de trabalho a tempo parcial).
23. Finda tal prestação, a Recorrente começou a auferir subsídio social de desemprego subsequente por 360 dias com início em 15/12/2007, mas durante esse período nunca deixou de exercer a atividade profissional que havia cumulado com o subsídio de desemprego parcial.
24. Em 30/09/2008, tendo os serviços se apercebido da concessão indevida da prestação social de desemprego subsequente, foi determinada a sua suspensão, com efeitos a 15/12/2007.
25. Para tanto houve a decisão de suspensão com os seguintes fundamentos «Haver exercício de atividade profissional por conta de outrem/por conta própria. A prestação cessa após um período consecutivo de 3 anos (alínea a) do n.º 1 do art.º 52 (…)» (cfr. pág. 13 do PA. –tratando-se de uma 2.º via do ato de suspensão com data de 04/09/2013).
26. O diploma que se encontra atualmente em vigor, e que estava em vigor à data dos factos em matéria de proteção no desemprego, é o Decreto-Lei n.º 220/2006, de 3/11, e que estabelece o quadro legal de reparação da eventualidade de desemprego dos trabalhadores por conta de outrem, inserido no subsistema previdencial da Segurança Social.
27. Nos termos do artigo 18.º do Decreto-Lei n.º 220/2006, de 3 de novembro, na redação à data em vigor, o reconhecimento do direito às prestações de desemprego depende da caracterização da relação laboral, da situação de desemprego e da verificação de prazos de garantia, e o reconhecimento do direito ao subsídio social de desemprego depende ainda do preenchimento da condição de recursos e do termo da concessão do subsídio de desemprego, quando lhe for subsequente.
28. Sem ser a situação específica do subsídio de desemprego parcial que a lei prevê, a prestação de desemprego não é cumulável com rendimentos provenientes do exercício da atividade profissional (artigos 54.º n.º 1 alínea a) do Decreto-Lei n.º 220/2006, de 3 de novembro). (sublinhado nosso)
29. De acordo com as normas sobre a matéria, há uma regra da inacumulabilidade das prestações de subsídio social de desemprego com rendimentos de trabalho.
30. A prestação social de desemprego, tendo na sua base a ausência involuntária das retribuições resultantes emprego, não permite que se possa acumular a mesma com retribuição do trabalho.
31. O princípio da não acumulação aplica-se às prestações de desemprego quando se verifique o pagamento de prestações de pré-reforma e outras atribuições pecuniárias regulares, por exemplo aquelas que são pagas pelo empregador aos trabalhadores por motivo de cessação do contrato de trabalho, logo nem se pode colocar em questão que a Recorrente deva proceder à restituição dos montantes auferidos indevidamente, pelo simples facto de os ter cumulado com retribuição do trabalho.
32. O subsídio social de desemprego é uma prestação incorporada no subsistema de solidariedade, exigindo-se para o seu deferimento, a apresentação dos meios de prova específicos das condições que justificam a sua atribuição no prazo de 90 dias consecutivos a contar da data da cessação do subsídio de desemprego (cfr. artigo 78.º n.º 1 do DL n.º 220/2006).
33. Estatui no n.º 4 do artigo 24.º do mesmo diploma legal que: “Nas situações em que o beneficiário esteja a receber subsídio de desemprego parcial e o contrato de trabalho a tempo parcial cesse após o termo do período de concessão daquele subsídio sem que tenha sido adquirido novo direito a prestações de desemprego, mantém-se o acesso ao subsídio social de desemprego subsequente desde que se encontre preenchida a condição de recursos”.
34. Assim, a ora Recorrente, ao continuar a exercer atividade profissional, ainda que a tempo parcial, findo o subsídio de desemprego parcial, não tinha direito (como veio a suceder) a receber as prestações do subsídio social de desemprego subsequente, verificando-se assim o pagamento indevido de tais prestações.
35. Com efeito, tendo a Recorrente sido notificada da restituição dos valores indevidamente recebidos, na esteira do preceituado nos artigos 52.º n.º 1 alínea a) e 56.º do Decreto-Lei 220/2006, deverá proceder à sua restituição.
Nestes termos e nos mais de Direito aplicáveis, com o douto suprimento de V. Exa., deverá a decisão recorrida ser mantida, por legal, não se concedendo provimento ao presente recurso.
Tudo com as devidas e legais consequências, como é de inteira,
Justiça!»

1.10. O Ministério Público junto deste TCA Norte, notificado nos termos e para efeitos do disposto no artigo 146.º do CPTA, emitiu parecer, pugnando pela procedência do recurso.
1.11. Prescindindo-se dos vistos legais, mas com envio prévio do projeto de acórdão aos juízes desembargadores adjuntos, foi o processo submetido à conferência para julgamento.
**
II- DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO.
2.1.Conforme jurisprudência firmada, o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do apelante, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso – cfr. artigos 144.º, n.º 2 e 146.º, n.º4 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), 608.º, n.º2, 635.º, nºs 4 e 5 e 639.º, nºs 1 e 2, do CPC ex vi artigos 1.º e 140.º do CPT.
Acresce que por força do artigo 149.º do CPTA, o tribunal ad quem, no âmbito do recurso de apelação, não se queda por cassar a sentença recorrida, conquanto ainda que a declare nula, decide “sempre o objeto da causa, conhecendo de facto e de direito”.
2.2. Assentes nas mencionadas premissas, as questões que se encontram submetidas à apreciação deste TCAN resumem-se a saber se a sentença recorrida enferma de erro de julgamento ao considerar que o ato impugnado não padece dos vícios de falta de fundamentação e de violação de lei assacados pela Apelante, e que, consequentemente, é legalmente exigível à Autora a reposição do valor de € 4.107,16 recebido a título de pagamento indevido de prestação social de subsídio de desemprego.
**
III. FUNDAMENTAÇÃO

A. DE FACTO
3.1.Com interesse para a apreciação da causa, o Tribunal a quo julgou provada a seguinte facticidade:
«1. Por ofício com data de 18.12.2007, o Réu comunicou à A. o deferimento do pedido de atribuição do subsídio social de desemprego subsequente, por um período de 12 meses, no valor de € 397,80 (cf. fls. 4 do PA);

2. Em 29.10.2008, a sociedade BB---, S.A., declarou que a A. “encontra-se ao n/ serviço desde 03-10-2007, na situação contratual a termo, com uma carga horária de 22,5 horas semanais” (cf. fls. 1 do PA);

3. Por ofício, com data de 25.11.2008, foi comunicado à A. o seguinte (por excertos):

RESTITUIÇÃO DE PRESTAÇÕES
Decreto-Lei n.º 133/88, de 20 de Abril
NOTA DE REPOSIÇÃO N.º
5546269
(…)
Assunto: Restituição de Prestações indevidamente pagas
Informa-se que, pelos motivos anteriormente comunicados, V.Ex.ª, recebeu indevidamente o valor abaixo indicado, pelo que, nos termos do n.º 5 do diploma acima referido, haverá lugar à restituição do mesmo valor se, no prazo de 10 dias úteis a contar da data da receção deste ofício, não der entrada nestes serviços, resposta por escrito, da qual constem elementos que possam obstar à referida restituição, juntando meios de prova se for caso disso.
Na falta de resposta, considera-se exigida a restituição no primeiro dia útil seguinte ao do termo do prazo referido, data a partir da qual se inicia a contagem dos prazos de 15 dias úteis para reclamar, 3 meses para recorrer hierarquicamente e 3 meses para recorrer contenciosamente, prazo que se suspende caso tenha reclamado ou recorrido hierarquicamente.
(…)
Valor a Restituir € 4107,16
(…) Diretor Distrital”
(cf. documento n.º 5, junto à petição inicial);

4. Após receber a comunicação acima referida, a A. foi informada pelos serviços do Réu que a restituição era devida por estar a exercer atividade profissional (facto admitido por acordo);

5. Em 11.12.2008, na sequência da receção da comunicação acima referida, a A. requereu nomeação de patrono (facto admitido por acordo – artigo 13.º da petição inicial, e fls. 86 e ss. do SITAF);

6. A nomeação do patrono ocorreu nesse mesmo dia (cf. fls. 86 e ss. do SITAF);

7. Por ofício com data de 11.02.2009, foi comunicada à A. a nomeação de patrono (facto admitido por acordo);

8. Em 12.03.2009, a A. enviou por fax requerimento de interposição de recurso hierárquico dirigido ao Conselho Diretivo do Réu, subscrito pela patrona nomeada, do qual consta o seguinte (por excertos):

(Texto integral no original; imagem”)
- (cf. fls. 8 e ss. do PA);

9. Os serviços do Réu elaboraram ofício, com data de 04.10.2013, dirigido à A., do qual consta o seguinte (por excertos):

“(…)
2ª via
Informa-se V.Ex.ª de que haverá lugar à suspensão do pagamento do subsídio se, no prazo de 10 dias úteis a contar da data de receção deste ofício, não der entrada nestes serviços resposta por escrito, da qual constem elementos que possam obstar à referida suspensão, juntando meios de prova se for caso disso.
Os fundamentos para a suspensão são os seguintes:
- Haver exercício de atividade profissional por conta de outrem/por conta própria. A prestação cessa após um período consecutivo de 3 anos (alínea a) do n.º 1 do art. 52º e alínea a) do art. 56º do Decreto-Lei n.º 220/2006, 3 de Novembro).
(…)
(nome e cargo)”. (cf. fls. 13 do PA);

10. Em data não apurada, os serviços do Réu elaboraram a seguinte informação (por excertos):

Coloca-se à consideração superior a proposta de despacho em anexo, a qual, atenta a questão em análise, bem como os objetivos de agilização e simplificação desta Equipa, contém fundamentação que se afigura adequada e suficiente.
Note-se porém que com base nos elementos de que dispomos não nos é possível aferir da tempestividade do recurso hierárquico interposto, pois não é possível determinar com segurança (face à antiguidade dos factos, ocorridos em 2008) em que data foi efetivamente recebida a nota de reposição aqui impugnada. Por outro lado, o registo de entrada do recurso também não se mostra totalmente percetível, embora o Centro Distrital indique a data de 12.03.2009.
Note-se ainda que não existe comprovativo nos autos da efetiva receção da decisão de “suspensão" do subsídio social de desemprego subsequente indevidamente recebido pela interessada (uma vez que a comunicação seguiu, presume-se, por correio simples), sendo que a interessada não admite ter conhecimento da mesma; do processo administrativo também não consta cópia do despacho que, à data, reconheceu o pagamento indevido e determinou a revogação do ato de atribuição, com as legais e devidas consequências, existindo apenas uma informação, manuscrita, com data de 01.07.2013.
Finalmente, note-se que o recurso foi interposto no início de 2009 e só foi enviado, para análise, a este Gabinete em 21.10.2013, procedimento que urge corrigir, atento o lapso de tempo entretanto decorrido
(cf. fls. 30 do PA);

11. Por ofício n.º 98235/2014, enviado através de carta dirigida à A., o Réu comunicou o despacho proferido pelo Vice-Presidente do Conselho Diretivo, com data de 16.09.2014, de indeferimento do recurso hierárquico interposto, do qual consta o seguinte (por excertos):

“(…)
Analisados os factos e os argumentos de direito expendidos no recurso hierárquico interposto pela beneficiária acima identificada, e de harmonia com as disposições legais aplicáveis à situação em apreço, no uso dos poderes que me foram delegados pela Deliberação n° 610/2014, de 18 de fevereiro, do Conselho Diretivo do Instituto da Segurança Social, I.P. (ISS, I.P.), publicada no Diário da República, 2ª Série, nº 43, de 3 de março de 2014, decido negar provimento ao recurso, com os fundamentos seguintes:
1. A recorrente, NISS (...), veio interpor, em 12/03/2009, recurso hierárquico da nota de reposição nº 5546269, emitida pelo Centro Distrital de Aveiro do ISS, I.P., que lhe foi comunicada pelo ofício de 24/11/2008 e que determinou a obrigatoriedade de reposição da quantia de € 4.107,16, indevidamente paga à interessada a título de prestações de desemprego no período de dezembro/2007 a setembro/2008;
2. Alega discordar da decisão pois, no seu entender, não lhe sendo imputável qualquer conduta que, aquando da atribuição das prestações de desemprego, possa ter determinado os serviços do ISS, I.P. a fazer uma apreciação errónea da situação concreta da recorrente, não lhe podem ser exigidas as quantias reclamadas, mesmo porque a revogação de qualquer ato administrativo está sujeita à disciplina prevista nos artigos 138° e seguintes do Código do Procedimento Administrativo (CPA), não tendo essa revogação ocorrido no caso em análise;
3. Encontra-se demonstrado por consulta ao processo administrativo, bem como ao Sistema de Informação da Segurança Social (SISS) que a beneficiária, ora recorrente, cessou em 03/10/2005 o vínculo contratual que mantinha com a então entidade empregadora (CC---, Lda.), tendo-lhe sido concedido o correspondente subsídio de desemprego, pelo período de 720 dias e no montante diário de € 12,49, com início em 14/10/2005;
4. Em outubro de 2007 a beneficiária requereu a atribuição de subsídio de desemprego parcial, uma vez que havia celebrado contrato de trabalho a tempo parcial e reunia as demais condições legalmente previstas, subsídio que lhe foi concedido, por um período de 72 dias (período remanescente do subsídio de desemprego), com início em 03/10/2007 (data da celebração do contrato de trabalho a tempo parcial);
5. Em 15/12/2007, a beneficiária começou a auferir subsídio social de desemprego subsequente, mas durante esse período nunca deixou de exercer a atividade profissional que havia cumulado com o subsídio de desemprego parcial;
6. Em 30/09/2008, data em que os serviços se aperceberam da concessão indevida da prestação de subsídio social de desemprego subsequente, foi determinada a suspensão da mesma, com efeitos a 15/12/2007, tendo sido emitida, em 24/11/2008, a correspondente nota de reposição, referente ao período no qual a interessada recebeu indevidamente o subsidio social de desemprego subsequente;
7. Nos termos do artigo 18° do Decreto-Lei n° 220/2006, de 3 de novembro, na redação em vigor, o reconhecimento do direito às prestações de desemprego depende da caraterização da relação laboral, da situação de desemprego e da verificação de prazos de garantia, e o reconhecimento do direito ao subsídio social de desemprego depende ainda do preenchimento da condição de recursos e do termo da concessão do subsídio de desemprego, quando lhe for subsequente;
8. Nos termos do n° 4 do artigo 24º, sob a epigrafe "Condições especiais de atribuição do subsídio social de desemprego", nas situações em que o beneficiário esteja a receber subsídio de desemprego parcial e o contrato de trabalho a tempo parcial cesse após o termo do período de concessão daquele subsídio sem que tenha sido adquirido novo direito a prestações de desemprego, mantém-se o acesso ao subsídio social de desemprego subsequente desde que se encontre preenchida a condição de recursos;
9. O subsídio social de desemprego é uma prestação instituída no âmbito do subsistema de solidariedade, o que implica que a sua concessão está restrita aos casos de manifesta carência socioeconómica, aferida pela designada condição de recursos, pelo que a beneficiária, tendo continuado a exercer atividade profissional, ainda que a tempo parcial, não tinha direito a receber as prestações em causa;
10. Alega a interessada ser alheia ao erro cometido pelos serviços e nessa medida não lhe poderem ser exigidas as quantias a esse título recebidas. Não obstante,
11. O Decreto-Lei nº 133/88, de 20 de abril, estabelece o regime jurídico da responsabilidade emergente do recebimento indevido de prestações no âmbito dos regimes de segurança social, recebimento esse que, nos termos do artigo 1º, dá lugar à obrigação de repor o respetivo valor;
12. Consideram-se prestações indevidas as que sejam concedidas sem observância das disposições legais em vigor, designadamente, as que forem concedidas após terem cessado as respetivas condições de atribuição (artigo 2º);
13. Os princípios que enformam o relacionamento da administração com os particulares - da boa-fé, cooperação, justiça, proteção dos interesses dos cidadãos, prestação de informações legalmente corretas e da proporcionalidade - impõem que a responsabilidade pelo recebimento indevido das prestações de subsídio de desemprego para além de prazo e termos legalmente previstos, seja imputada, dentro dos limites legais (designadamente, dentro do prazo geral de revogação dos atos administrativos), ao próprio beneficiário, pois que, mesmo numa situação mais fragilizada e apesar de o seu comportamento não denotar qualquer atuação dolosa, o desconhecimento da lei não lhe pode aproveitar;
14. Encontra-se demonstrado por consulta ao processo administrativo que o subsídio social de desemprego subsequente atribuído à beneficiária foi suspenso com efeitos ao início da concessão (15/12/2007), e que a interessada foi desse ato notificada, por oficio de 30/09/2008, com o seguinte fundamento: "Exercer atividade profissional por conta própria ou por conta de outrem (...) A suspensão produz efeitos em 2007-12-15", "sem prejuízo da restituição de prestações indevidas, se for caso disso";
15. Assim, conclui-se que a interessada foi oportunamente notificada dos motivos pelos quais se constituiu na obrigação de repor, ainda que, com menor rigor, os serviços tenham notificado a interessada da "suspensão da prestação" com efeitos à data de início e não, como deviam, da revogação da decisão de atribuição do citado subsídio, por violação de lei, pelo que o prazo geral de um ano aplicável à revogação dos atos administrativos e previsto no artigo 141º do CPA se mostra cumprido na presente situação;
16. Pelo que se nega provimento ao recurso, confirmando-se a obrigatoriedade de reposição da quantia em causa.
(…)”.
(cf. documento n.º 1, junto à petição inicial);

12. O ofício n.º 98235/2014 foi comunicado à A. em 02.10.2014 (facto admitido por acordo).

IV. 2 Factos não provados
Com relevo para a decisão a proferir não foram apurados factos não provados. »
**

III.B.DE DIREITO
3.2.Do mérito
Está em causa a decisão proferida pela 1.ª Instância que julgou improcedente a ação movida pela Apelante contra a Entidade Demandada, ora Apelada, julgando válida a ordem de reposição de prestações de subsídio de desemprego, e como tal, exigível à Apelante a obrigação de reposição do valor de € 4.107,16, por se tratar de prestações que foram indevidamente recebidas por aquela.
A Apelante não se conforma com a sentença recorrida, sustentando que a 1.ª Instância fez uma incorreta aplicação do direito aos factos, assacando-lhe erro de julgamento quanto ao mérito, pretendendo a sua revogação e substituição por outra que julgue a ação procedente e, consequentemente, que declare nulo o ato impugnado e a desonere da obrigação de reposição das quantias que recebeu a título de prestação de subsídio social de desemprego no período de dezembro de 2007 a setembro de 2008.
Está em causa o julgamento efetuado pela 1.ª Instância no segmento em que considerou improcedentes os vícios de falta de fundamentação e de violação de lei do ato impugnado.
Vejamos.
*
b.1- da falta de fundamentação do ato impugnado

A primeira ordem de razões pelas quais a Apelante se insurge contra a sentença recorrida têm a ver com o facto de nela se ter considerado que foi devidamente notificada das razões que levaram a Apelada a determinar a reposição da quantia reclamada como indevidamente paga a título de subsídio de desemprego no sobredito período.

A Apelante na linha da argumentação que expendeu na petição inicial, insiste na falta de fundamentação do ato impugnado, referindo que apenas teve conhecimento da fundamentação com a notificação do despacho proferido pelo Vice-Presidente do Conselho Diretivo do Réu de 16/09/2014, que negou provimento ao recurso interposto e determinou a obrigatoriedade de reposição do montante de € 4.107,16 e que, mesmo relativamente ao ato contido no despacho de 16/09/2014, fica sem saber os motivos que determinaram a restituição das prestações pagas de subsídio social de desemprego no aludido período.
Realça que consta dos itens 14 e 15 do ato impugnado -conforme ponto 11 dos factos assentes- que: “Encontra-se demonstrado por consulta ao processo administrativo que o subsídio social de desemprego subsequente atribuído à beneficiária foi suspenso com efeitos ao início da concessão (15/12/2007), e que a interessada foi desse ato notificada, por oficio de 30/09/2008, com o seguinte fundamento: "Exercer atividade profissional por conta própria ou por conta de outrem (...) A suspensão produz efeitos em 2007-12-15", "sem prejuízo da restituição de prestações indevidas, se for caso disso"; “Assim, conclui-se que a interessada foi oportunamente notificada dos motivos pelos quais se constituiu na obrigação de repor, ainda que, com menor rigor, os serviços tenham notificado a interessada da "suspensão da prestação" com efeitos à data de início e não, como deviam, da revogação da decisão de atribuição do citado subsídio, por violação de lei, pelo que o prazo geral de um ano aplicável à revogação dos atos administrativos e previsto no artigo 141º do CPA se mostra cumprido na presente situação.”.
Porém, diferentemente do que consta desses itens, afirma que o Réu não comprovou que a mesma foi notificada, por ofício de 30/09/2008, do ato de suspensão, não estando demonstrado que alguma vez tenha tido conhecimento da fundamentação subjacente à decisão que determinou a reposição da referida quantia, concretamente, através da notificação de “suspensão” do pagamento da prestação do subsídio social de desemprego, que nunca ocorreu. Conclui que, não comprovando o Apelado que a Autora foi notificada, por ofício de 30/09/2008, do ato de suspensão, nunca poderia a invocada “suspensão” ser tida como revogação do ato, nem poderia ser entendido, como o fez o Tribunal “a quo” que a Apelante teve conhecimento da fundamentação expendida pela entidade demandada que permite perceber o arrazoado factual em que se baseou para decidir no sentido que decidiu. Na verdade, reitera que apenas teve conhecimento efetivo da fundamentação subjacente ao ato executório de restituição aquando da notificação do despacho proferido pelo Vice-Presidente do Conselho Diretivo, de 16/09/2014, que lhe foi comunicado em 02/10/2014(conforme pontos 11 e 12 dos factos provados).
Ademais, acrescenta que também no âmbito deste ato, dele não decorre a fundamentação legal para considerar que um ato inexistente de “suspensão”, que não se mostra notificado à Autora, possa ser tido como ato de revogação.
Adianta que só mediante a indicação do direito aplicável, ainda que sucintamente, poderia perceber o exato enquadramento legal expendido pelo autor do ato, por forma a poder contestar, de forma esclarecida e eficaz, o motivo pelo qual foi exarado, sendo que, nunca lhe foi concedida essa possibilidade. E quando se pode pronunciar sobre o ato de restituição, fê-lo procedendo ao enquadramento jurídico que considerava aplicável, sem que lhe fosse possível sindicar diretamente o enquadramento jurídico do ato «por NUNCA lhe ter sido notificado e para o qual o Vice-Presidente do Conselho Diretivo remete...».
O que dizer?
Lê-se na sentença recorrida a este respeito, que «(…) no caso em concreto, analisando o teor da decisão proferida pelo Vice-Presidente do Conselho Diretivo do Réu (fundamentação formal), verifica-se que a mesma é clara quanto às razões de facto e direito que conduziram à tomada de decisão, e que cumpre a exigência legal e constitucional de fundamentação do ato administrativo que é a de dar a conhecer ao seu destinatário, ora A., o ato praticado e o itinerário cognitivo do órgão decisor.
Nestes termos, entende-se que o Réu apreciou todas as questões suscitadas no recurso hierárquico, ainda que a A. não concorde com o sentido da decisão, e se a A. não concorda com as razões explicitadas, é matéria que pertence à substância do ato administrativo (fundamentação material).
Pelo exposto, julga-se improcedente o vício de falta de fundamentação formal. »:
Antecipamos que a decisão proferida pelo Tribunal a quo quanto a esta questão não pode manter-se, por enfermar de erro de julgamento.
De acordo com a matéria de facto dada como assente na sentença recorrida, apurou-se que a entidade demandada, por ofício de 18/12/2007, comunicou à Autora o deferimento do pedido de atribuição do subsídio social de desemprego subsequente, por um período de 12 meses, no valor de € 397,80- ponto 1 do elenco dos factos assentes. Posteriormente, em 29.10.2008, a sociedade “BB---, S.A.”, declarou que a A. “encontra-se ao n/ serviço desde 03-10-2007, na situação contratual a termo, com uma carga horária de 22,5 horas semanais” (cf. fls. 1 do PA) – ponto 2 dos factos assentes. Mais se apurou que a Apelada enviou à Apelante o ofício de 25/11/2008- ponto 3 dos factos assentes-, constituído por uma nota de reposição, alusivo às prestações de subsídio de desemprego « indevidamente pagas» à Apelante, no qual se refere designadamente que: « pelos motivos anteriormente comunicados, V.Ex.ª, recebeu indevidamente o valor abaixo indicado, pelo que, nos termos do n.º 5 do diploma acima referido, haverá lugar à restituição do mesmo valor se, no prazo de 10 dias úteis a contar da data da receção deste ofício, não der entrada nestes serviços, resposta por escrito, da qual constem elementos que possam obstar à referida restituição, juntando meios de prova se for caso disso.
Na falta de resposta, considera-se exigida a restituição no primeiro dia útil seguinte ao do termo do prazo referido, data a partir da qual se inicia a contagem dos prazos de 15 dias úteis para reclamar, 3 meses para recorrer hierarquicamente e 3 meses para recorrer contenciosamente, prazo que se suspende caso tenha reclamado ou recorrido hierarquicamente.
(…)
Valor a Restituir € 4107,16
(…) Diretor Distrital” »
Ora, esta comunicação enviada à Apelante, como dela claramente se extrai, não contém a indicação dos fundamentos de facto e de direito pelos quais a Apelada entende terem sido indevidamente pagas à Apelante as prestações de subsídio de desemprego em causa. É certo que neste ofício se faz alusão a uma anterior comunicação remetida à Apelante, na qual terão sido indicadas as razões que levaram a Apelada a considerar indevidamente pagas as prestações de subsídio de desemprego processadas à Apelante.
Porém, como bem nota a Apelante, nenhuma prova foi produzida que comprove esse facto, uma vez que, da factualidade assente não resulta que a Autora tivesse sido notificada da decisão que alegadamente determinou a suspensão do pagamento das prestações de subsídio de desemprego, ato onde alegadamente a Apelada terá feito constar os fundamentos para a suspensão das ditas prestações.
A Apelada contra-alega que pese embora a Apelante invoque que apenas teve conhecimento da fundamentação com o Despacho proferido pelo Vice-Presidente do Conselho Diretivo da Ré, de 16/09/2014, a verdade é que apresentou recurso hierárquico em 12/03/2009 (ponto 8 dos factos dados como provados), e, pelo conteúdo do recurso hierárquico apresentado pela Recorrente, denota-se que esta tinha conhecimento que o que estava em dissídio, era efetivamente ter recebido quantias a título de subsídio de desemprego subsequente enquanto desempenhava uma atividade por conta de outrem.
Aduz ainda que nas respetivas conclusões de recurso a Apelante não imputou qualquer erro de julgamento de facto quanto à matéria dada como assente no ponto 4 da fundamentação de facto da sentença recorrida, no qual se consignou que «Após receber a comunicação acima referida, a A. foi informada pelos serviços do Réu que a restituição era devida por estar a exercer atividade profissional (facto admitido por acordo)».
E conclui não haver dúvidas, que a mesma conseguiu entender esclarecidamente as razões de facto e de direito, e para tanto, que reagiu contra o ato - reagiu contra o ato de restituição, através do recurso hierárquico, e reagiu contra o despacho proferido pelo Vice- Presidente do Conselho Diretivo, de 16/09/2014.
É irrefragável que a Apelante, na sequência da notificação para a reposição da referida quantia - pontos 4, 5,6,7,8 dos factos assentes- interpôs recurso hierárquico, que dirigiu ao Conselho Diretivo do Réu, no qual se insurge contra a dita ordem de reposição.
Porém, logo aí invocou a falta de notificação de uma decisão de revogação da atribuição das prestações de subsídio social de desemprego, que contivesse a indicação dos fundamentos da revogação desse ato e da suspensão do pagamento das prestações que se encontrava a auferir.
Também é inquestionável que no ponto 4 do elenco dos factos provados o Tribunal a quo deu como assente que na sequência da comunicação enviada á Autora pelo ofício de 25/11/2008- ponto 3 dos factos assentes- a Autora foi informada «pelos serviços do Réu que a restituição era devida por estar a exercer atividade profissional».
Mas salvo o devido respeito, essa facticidade não permite extrair a conclusão de que a Apelada cumpriu o dever legal de fundamentação da decisão que determinou a reposição da quantia reclamada à Apelante a título de restituição de prestações de subsidio de desemprego alegadamente pagas de forma indevida, desde logo, mas não só, porque a fundamentação dos atos administrativos tem de ser contemporânea e não posterior à prática do ato administrativo e tem de ser contextual.
Vejamos.
O artigo 124º do Código de Procedimento Administrativo (CPA), na versão conferida pelo Decreto-lei n.º442/91, de 15 /11- aplicável à situação vertente- em concretização do dever de fundamentação expressa de todos os atos que afetem direitos ou interesses legalmente protegidos consagrado no artigo 268.º, n.º3, da Constituição, dispõe sob a epígrafe “ Dever de fundamentação” que “devem ser fundamentados os atos administrativos que, total ou parcialmente: neguem, extingam, restrinjam ou afetem por qualquer modo direitos e interesses legalmente protegidos”.
Por seu turno, o artigo 125º do mesmo diploma legal estabelece que “A fundamentação deve ser expressa, através de sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito da decisão, podendo consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, que constituem nestes casos, parte integrante do respetivo ato”.
Constitui jurisprudência consolidada que “(…) a fundamentação dos atos administrativos visa, por um lado, dar a conhecer aos seus destinatários o iter cognoscitivo e valorativo seguido pela Administração, de molde a permitir-lhes uma opção consciente entre a aceitação do ato e a sua impugnação contenciosa, e, por outro, que a Administração, ao ter de dizer a forma como agiu, porque decidiu desse modo e não de outro, tenha de ponderar aceitavelmente a sua decisão (…)” - cfr. Acórdão do STA, de 19/02/2003, processo n.º 762/02.
Ou, como expressivamente se expende no Acórdão do STA de 18/12/2022, proferido no processo n.º 048366: ”A fundamentação do ato administrativo é um conceito relativo que varia conforme o tipo de ato e as circunstâncias do caso concreto, mas a fundamentação só é suficiente quanto permite a um destinatário normal aperceber-se do itinerário cognoscitivo valorativo seguido pelo autor do ato para proferir a decisão, isto é, quando aquele possa conhecer as razões por que o autor do ato decidiu como decidiu e não de forma diferente, de forma a poder desencadear os mecanismos administrativos ou contenciosos de impugnação”.
Para que uma resolução administrativa se considere suficientemente fundamentada a mesma deve conter de forma sucinta, clara e expressa as razões factuais e os fundamentos de direito que determinaram o autor do ato a decidir como decidiu. Assim, um ato administrativo está fundamentado quando o seu conteúdo revele uma “sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito”, ou remeta para uma “mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas que constituirão neste caso parte integrante do respetivo ato”.
Assinale-se ainda que a fundamentação de um ato administrativo tem de ser contemporânea à prática do ato administrativo e não posterior ou sucessiva, só assim podendo o seu destinatário optar em tempo oportuno pela sua aceitação ou impugnação.
Partindo destas premissas, e considerando os factos apurados, não pode aceitar-se que a Apelada cumpriu o dever de fundamentação.
Elucidativo neste sentido, é o parecer elaborado pela Senhora Procuradora Geral Adjunta deste TCAN (Dra. Helena Cluny), proferido nos termos e para efeitos do disposto no n.º1 do artigo 146.º do CPTA, que subscrevemos, onde se lê que : «(…) contrariamente ao decido na sentença, ora recorrida, entendemos que o ato não se encontra fundamentado.
Dispõe o Artigo 27.º do Dec.-Lei nº 220/2006 de 3 de Novembro, sob a epígrafe condições de atribuição do subsídio de desemprego parcial o seguinte:
O direito ao subsídio de desemprego parcial é reconhecido aos beneficiários que, estando a receber subsídio de desemprego, reúnam as seguintes condições cumulativas:
a) Celebrem contrato de trabalho a tempo parcial;
b) O valor da retribuição do trabalho a tempo parcial seja inferior ao montante do subsídio de desemprego;
c) O número de horas semanal do trabalho a tempo parcial seja igual ou superior a 20% e igual ou inferior a 75% do período normal de trabalho a tempo completo.
Foi certamente com fundamento neste artigo que o subsidio foi inicialmente atribuído à recorrente, embora não conste da matéria dada como provada o conteúdo do ato revogado, o que se nos afigura, se não essencial, pelo menos útil à apreciação da presente ação.
E, sendo tal ato constitutivo de direitos, a sua revogação tem que ser fundamentada nos termos do estatuído no art. 141º nº1 do CPA antigo, ou seja a revogação de um ato inválido, tem que referir de modo expresso a razão da sua invalidade do ato. Esta não se presume.
No caso concreto o ato revogatório teria que fundamentar porque razão a A. não reunia os pressupostos da atribuição de subsidio de desemprego parcial, constantes no art. 24º do Dec.-Lei nº 220/2006, que lhe havia sido concedido e, só depois de verificar que tais circunstancialismos não estavam reunidos, poderia concluir como faz o recorrido, no ponto 28 das suas contra-alegações, onde refere:
Sem ser a situação específica do subsídio de desemprego parcial que a lei prevê, a prestação de desemprego não é cumulável com rendimentos provenientes do exercício da atividade profissional (artigos 54.º n.º 1 alínea a) do Decreto-Lei n.º 220/2006, de 3 de novembro).
A fundamentação que se exigia era, precisamente porque razão na situação específica a recorrente não tinha direito ao subsidio de desemprego parcial.
Tal fundamentação era não só necessária ao conhecimento do iter cognoscitivo, do ato, como era essencial para que a recorrente pudesse reagir adequadamente contra o ato.
Assim sendo, entendemos que o ato impugnado, ainda que seja considerado ato administrativo, carece de fundamentação, sendo que a invocada ilegalidade da atribuição do subsídio é meramente conclusiva.
Mesmo depois de lida a matéria de facto, e o conteúdo quer dos atos, quer das próprias peças processuais juntas pelo recorrido, fica-se sem saber, qual a razão de a recorrente não ter direito ao subsidio de desemprego parcial.
Pelo, exposto somos do parecer que o ato deve ser anulado por falta de fundamentação.»

Como vimos, resulta do recurso hierárquico interposto pela Apelante do ato que lhe foi comunicado por ofício de 25/11/2008 para a repor a quantia de €4.107,16, que a mesma desconhecia as razões de facto e de direito que foram consideradas pela Administração para lhe ordenar a reposição dessa importância. E pese embora se tenha dado como provado que logo após a notificação desse ato os serviços da Ré a informaram que «a restituição era devida por estar a exercer atividade profissional», a indicação dessa razão não constitui fundamentação suficiente para explicar a ordem de reposição, uma vez que, a autora não foi notificada de nenhum ato de revogação da atribuição do referido subsídio, tendo simplesmente sido confrontada com aquele aviso de reposição da quantia de € 4.107,16.
Destarte, também o ato impugnado nestes autos não comporta no seu conteúdo a indicação das concretas razões de facto e de direito que, tendo levado a Administração a conceder-lhe as prestações de subsídio de desemprego cujo reembolso é reclamado, deixaram de se verificar e que, nos termos legais, reclamam a restituição das prestações peticionadas pela Apelada.
Diferentemente do que se faz constar do teor do ato impugnado a Apelante nunca foi notificada do ato de suspensão do subsídio social de desemprego, não se tendo provado que lhe tenha sido remetido o ofício datado de 30/09/2008, de que se faz menção no conteúdo do ato impugnado, e do qual constasse como fundamento: "Exercer atividade profissional por conta própria ou por conta de outrem (...) A suspensão produz efeitos em 2007-12-15", "sem prejuízo da restituição de prestações indevidas, se for caso disso".
Apenas se provou que a Autora foi notificada de uma nota de restituição da qual se retira unicamente o montante a devolver e que o mesmo respeita a prestações, sem que se descortine o fundamento que determinou a devolução, designadamente, quais os fundamentos de direito que no quadro factual considerado pela Apelada, impunham uma decisão de revogação da atribuição do subsídio social de desemprego. Só mediante a indicação do direito aplicável, ainda que sucintamente, poderia a Autora perceber o exato enquadramento legal expendido pelo autor do ato, por forma a poder contestar, de forma esclarecida e eficaz, o motivo pelo qual o mesmo foi exarado.
Era mandatório, no caso, que a Apelada tivesse proferido uma decisão de revogação, indicando as razões pelas quais considerava que a Autora continuou a exercer atividade profissional, ainda que a tempo parcial, findo o subsídio de desemprego parcial, e os fundamentos de direito por referência aos quais se impunha considerar que a Autora não tinha direito a receber as prestações do subsídio social de desemprego subsequente, o que não fez. Sendo o ato de atribuição de prestações sociais de desemprego um ato constitutivo de direitos, a suspensão do pagamento dessas prestações e a ordem de reposição das prestações entretanto recebidas pelo beneficiário, impõe à Administração a prolação de um ato revogatório com indicação das razões de facto e de direito que expliquem o motivo pelo qual o mesmo é exarado.
No caso, impunha-se que fosse indicado motivo a Autora não reunia os pressupostos da atribuição de subsídio de desemprego parcial, constantes no art. 24º do Dec.-Lei nº 220/2006, que lhe havia sido concedido. “A fundamentação que se exigia era, precisamente porque razão na situação específica a recorrente não tinha direito ao subsidio de desemprego parcial”.
Ademais, sempre se dirá, que não se tendo provado que alguma vez tivesse sido proferido um ato de revogação da atribuição do subsídio social de desemprego à Apelante, sequer de suspensão, prévio à comunicação da ordem de reposição da quantia de € 4.107,16, remetendo o ato impugnado para um ato inexistente, não pode senão concluir-se que o mesmo padece do vício de falta de fundamentação.

Termos em que se impõe julgar procedente o invocado fundamento de recurso e revogar a decisão recorrida neste segmento.

b.2.Do vício de violação de lei decorrente da consideração do ato de restituição como ato revogatório do ato constitutivo de direito que atribuiu o subsídio social de desemprego à Autora.

A segunda ordem de razões pelas quais a Apelante discorda da sentença proferida pelo Tribunal a quo prendem-se com o segmento decisório em que aquela instância considerou que o ato de restituição, nos termos em que foi concretizado, é um ato revogatório do ato constitutivo de direitos que lhe atribuiu o subsídio social de desemprego, do qual a Autora teve conhecimento oportuno, e de cujas razões foi notificada.
Lê-se na sentença recorrida, a este respeito, a seguinte fundamentação:
« No caso em apreço, ainda que não se tenha apurado a data concreta da decisão de suspensão que fez cessar o pagamento das prestações e dos autos não constem o texto original da decisão, a A. não coloca em causa a existência da decisão de suspensão, antes refere nos autos que, em data anterior ao pedido do apoio judiciário, foi informada pelos serviços dos motivos da suspensão, reiterando, na petição inicial, que o sentido desta decisão foi dado a conhecer novamente com a notificação da decisão de indeferimento do recurso hierárquico ocorrida em 02.10.2014 (cf. factos provados n.ºs 4 e 5).
Assim sendo, resulta dos autos que o ato de suspensão foi praticado em data anterior a 11.12.2008 e produz os seus efeitos desde a data em que foi praticado (cf. artigo 127.º do CPA)
Também resulta da factualidade provada que a A. no período que beneficiou do subsídio social de desemprego auferiu rendimentos do trabalho por conta de outrem, pelo que beneficiou da acumulação da prestação do subsídio social de desemprego com o salário que auferiu da entidade patronal (cf. factos provados n.ºs 1 e 2).
(…)
Nestes termos, considera-se que o ato de atribuição do subsídio social de desemprego, emitido no dia 18.12.2007, é inválido em virtude da violação do princípio da não acumulação de rendimentos, pelo que nos termos do artigo 141.º do CPA a Administração podia revogá-lo no prazo de um (1) ano ou, uma vez ultrapassado este prazo, apenas com eficácia para o futuro.
Prosseguindo, mais resulta da factualidade assente nos autos que no dia 11.12.2008 a A. tinha conhecimento da notificação e do sentido da decisão de restituição de prestações pagas indevidamente, bem como da decisão de suspensão do ato de pagamento das prestações, pelo que se conclui que este ato é oponível à A. porquanto foi devidamente notificada da decisão de restituição das quantias pagas indevidamente, ainda que a mesma não contenha os fundamentos da decisão por força do artigo 60.º, n.º 2, do CPTA e da suspensão do ato de pagamento (cf. facto provado n.º 5).
Ora, em face dos elementos constantes dos autos, uma vez que a A. foi notificada da decisão de restituição antes de completar um (1) ano da atribuição do subsídio de desemprego social (cf. artigo 141.º), resta saber se o ato administrativo que determinou a restituição das quantias pagas indevidamente constitui um ato administrativo revogatório do ato constitutivo de direito praticado em 18.12.2007 (cf. facto provado n.º 1).
Atente-se, a este propósito, ao decidido no Acórdão do TCA Sul de 19.12.2013, Processo n.º 09849/13, em situações análogas à dos autos, com a qual se concorda na íntegra, “Como é há muito pacífico para o STA, constitui ato administrativo revogatório de atos (constitutivos de direitos ou de interesses legítimos) de concessão e processamento de abonos o envio ao interessado de ordem de reposição de quantias recebidas anteriormente”.
E, bem assim, o Acórdão do STA de 17.03.2010, Processo n.º 0413/09, com o qual se concorda, “Ora, constitui revogação “o acto administrativo que tem por objecto destruir ou fazer cessar os efeitos de outro acto administrativo anterior praticado pelo mesmo órgão ou por um seu delegado ou subalterno" In Marcelo Caetano - Manual de Direito Administrativo, a pág. 532. Cf. Sérvulo Correia, in, Noções de Direito Administrativo, a pág. 471 e definição unívoca nesse sentido pela jurisprudência., considerando-se implícita a revogação quando, sem o dizer expressamente, a Administração praticou acto posterior de conteúdo e sentido diferente ao do primeiro”, ambos disponíveis em www.dgsi.pt
Acresce que, como é consabido, os critérios da interpretação legal permitem ao intérprete alcançar o verdadeiro sentido e alcance do texto da lei, sendo que o ponto de partida é a letra da lei na tarefa hermenêutica, impondo-se ao intérprete conjugá-la com o recurso aos elementos lógicos, através do qual se procura determinar o espírito da lei, por via dos elementos histórico, sistemático e racional ou teleológico – cf. artigo 9.º do CC e J Baptista Machado, Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, 22.ª Reimpressão, Almedina, 2012, p. 181 e ss.

Ante o exposto, julga-se improcedente o vício de violação de lei invocado pela A.».

Vejamos.
No artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 133/88, de 20/04- diploma legal que estabelecia o regime jurídico da responsabilidade emergente do pagamento indevido de prestações da segurança social, na redação vigente à data dos factos- prevê-se que “O recebimento indevido de prestações no âmbito dos regimes de segurança social dá lugar à obrigação de restituir o respetivo valor, sem prejuízo da observância do regime de revogabilidade de atos administrativos”.
Por sua vez, de acordo com o disposto no artigo 2.º, n.º 1, alínea a), desse diploma- Decreto-Lei n.º 133/88 de 20/04- consideram-se prestações indevidas as que são concedidas sem observância das condições legais de atribuição.
E nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 133/88, de 20/04: “Verificada a concessão indevida de prestações, devem as instituições cessar de imediato os pagamentos, averiguar a identidade de quem os recebeu e proceder à sua interpelação para efetuar a restituição e informar sobre os respetivos valores e termos que a mesma pode revestir”.
Já no n.º1 do artigo 15.º do Decreto-Lei n.º 133/88, de 20/04, sob a epígrafe “Revogabilidade dos atos de atribuição das prestações” prevê-se que “Os atos administrativos de atribuição de prestações feridos de ilegalidade são revogáveis nos termos e nos prazos previstos para os atos administrativos constitutivos de direitos, salvo o disposto no número seguinte” , estabelecendo-se no artigo 16.º do mesmo diploma que:
“1 - O prazo de revogação dos atos administrativos de atribuição das prestações começa a contar a partir da data em que o ato foi praticado, ainda que os seus efeitos se reportem a momentos anteriores, ou da data de decisão judicial de que resulte ilegalidade na atribuição da prestação.
2 - No caso em que os atos de atribuição das prestações não possam conter expressamente, em atenção às regras do processo de formação dos mesmos atos, a data da atribuição, considera-se que a mesma se reporta à do primeiro pagamento”.
No anterior CPA, o prazo de revogação estava vinculado ao prazo máximo de impugnação para o Ministério Público – 1 ano – mais precisamente referia o artigo 141.º, n.º 1, do anterior CPA, que “os atos administrativos que sejam inválidos só podem ser revogados com fundamento na sua invalidade e dentro do prazo do respetivo recurso contencioso ou até à resposta da entidade recorrida”.
Por fim, o artigo 17.º do Decreto-Lei n.º 133/88, de 20/04, com a epígrafe “Efeitos da revogação” estipula que: “A revogação dos atos administrativos de atribuição de prestações tem como efeito a obrigação de repor, por parte dos beneficiários, os valores das prestações indevidamente recebidas”.
Já o artigo 54.º, n.º 1, alínea a), do Decreto-Lei n.º 220/2006, de 03/11, estabelece que o direito às prestações de desemprego cessa por razões inerentes à situação dos beneficiários perante os sistemas de proteção social de inscrição obrigatória.

No caso, diferentemente do que foi considerado pelo Tribunal a quo, não se provou que a Apelada tivesse proferido um ato de revogação da concessão da prestação social de desemprego que tivesse determinado a suspensão do pagamento e a consequente devolução das quantias recebidas pela Autora desde dezembro de 2007.
Vejamos os factos.
Em outubro de 2007, a Autora requereu a atribuição de subsídio de desemprego parcial, uma vez que tinha celebrado contrato de trabalho a tempo parcial e reunia as demais condições legalmente previstas. O subsídio requerido foi-lhe concedido, por um período de 72 dias (período remanescente do subsídio de desemprego), com início em 03/10/2007, (data da celebração do contrato de trabalho a tempo parcial). Finda tal prestação, começou a auferir subsídio social de desemprego subsequente por 360 dias com início em 15/12/2007.
Alega a Apelada que durante esse período a Apelante nunca deixou de exercer a atividade profissional que havia cumulado com o subsídio de desemprego parcial, pelo que, em 30/09/2008, tendo-se os serviços da Ré apercebido da concessão indevida da prestação social de desemprego subsequente, foi determinada a sua suspensão, com efeitos a 15/12/2007.
Acontece que, diferentemente do que considerou o Tribunal a quo não resulta provado que a Apelada tenha proferido decisão de suspensão do pagamento das prestações do subsídio social de desemprego e que a Autora tivesse sido notificada desse ato onde alegadamente constariam os fundamentos para a suspensão das prestações, o que nunca foi aceite pela Apelante, contrariamente ao julgado pelo Tribunal a quo.
É apodítico que não foi realizada prova em como tivesse sido proferida uma decisão de suspensão com os seguintes fundamentos: «Haver exercício de atividade profissional por conta de outrem/por conta própria. A prestação cessa após um período consecutivo de 3 anos (alínea a) do n.º 1 do art.º 52 (…)» e que o ato de 04/09/2013 tenha sido uma segunda via desse primeiro ato de suspensão.
Em boa verdade, dos factos apurados não resulta que a Apelada tivesse proferido, como se lhe impunha, por referência ao quadro legal supra enunciado, uma decisão de revogação da atribuição do subsídio social de desemprego, com notificação da Autora para efeitos de audiência prévia, sequer que proferiu uma decisão de suspensão do pagamento dessas prestações que pudesse ser havida como decisão de revogação do ato de atribuição das prestações que estavam a ser abonadas.
Resulta claramente da facticidade levada ao ponto 3 da fundamentação de facto da sentença recorrida que a Autora apenas foi notificada para proceder à restituição do montante de €4.107,16 que lhe havia sido processado, sem que previamente tivesse sido notificada da prática de um ato de revogação da concessão do subsídio em causa, que contivesse os fundamentos de facto e de direito para a suspensão do pagamento dessas prestações e da obrigação de restituir as importâncias pagas pela Apelada. E resulta do ponto 10 dos factos provados, que a própria Apelada admite que “...não existe comprovativo da efetiva receção da decisão “suspensão” do subsídio social de desemprego subsequente(uma vez que a comunicação seguiu, presume-se, por correio simples)..., do processo administrativo também não consta cópia do despacho que, à data, reconheceu o pagamento indevido e determinou a revogação do ato de atribuição, com as legais e devidas consequências, existindo apenas uma informação, manuscrita, com data de 01/07/2013”.
Como tal, não só resulta provado que a Autora não foi notificada da decisão de revogação, onde, alegadamente, a entidade demandada fez constar os fundamentos para a suspensão das prestações, como não se provou que esse ato tivesse sido praticado e apenas não notificado à Autora.
E sendo assim, não pode considerar-se que exista um ato de revogação, estando o Tribunal impedido de sindicar a validade ou invalidade do mesmo.
Como bem sustenta a Apelante, o aviso de notificação que lhe foi remetido para que procedesse à restituição das prestações pagas no período de dezembro de 2007 a setembro de 2008, é um ato consequente, um ato de execução de um ato que teria de ter existido previamente, que definisse a situação jurídica da Autora.
A restituição direta dos montantes devidos à Segurança Social, não opera de forma automática. Para tanto, exige-se que seja aberto um procedimento que permita a intervenção do destinatário do ato e que conduza a uma decisão de concessão indevida das prestações ( cfr. artigo 5º do DL nº 133/88).
Na situação vertente, a autora apenas foi notificada de uma Nota de restituição (cfr. ponto 3 dos factos provados) e nunca da intenção do Apelado para declarar a invalidade do ato administrativo de atribuição do subsidio social de desemprego, e para exercer, querendo o direito de audiência prévia quando a tal intenção de ato final revogatório.
E sendo assim, não se pode haver o ato notificado pelo Apelado como o ato final desse procedimento, faltando a prática do ato anterior definidor da situação jurídica da Autora.
Como tal, a eventual reposição das prestações sempre dependeria da revogação prévia do ato que atribuiu as prestações sociais de desemprego em causa, o que não ocorreu, pelo que, pese embora o facto de a Apelante aparentemente não preencher os pressupostos para que lhe pudesse ser atribuída a prestação, não pode a Apelada impor-lhe a restituição dos montantes que percebeu a esse título com base no ato proferido.

A este respeito, lê-se no parecer proferido pela Senhora Procuradora Geral Adjunta, e com acutilância para a economia dos presentes autos que:
«Compulsadas as alegações de recurso, afigura-se-nos que as questões a dirimir são as seguintes:
1.º- O ato que revogou o ato que concedeu o subsidio de desemprego parcial, à A. ora recorrente, é ou não um ato inexistente.
2.º- O ato que ordenou a reposição dos montantes indevidamente percebidos é ou não um ato de execução do ato que revogou o ato de atribuição de subsídio de desemprego parcial.
3.º- Mas admitir-se que ato que ordenou a reposição dos montantes indevidamente percebidos é um ato administrativo revogatório, encontra-se o mesmo devidamente fundamentado?
4º- A revogação do ato ocorreu dentro do período de um ano a contar da prolação do ato revogado, ou pelo contrário foi proferido após o decurso do período de um ano e como tal não pode ter efeitos retroativos.
Vejamos, então…
Antes do mais há que esclarecer que aos atos se aplica o anterior CPA., atentas as datas constantes da matéria dada como provada.
1.º- O ato que revogou o ato que concedeu o subsidio de desemprego parcial, à A. ora recorrente, é ou não um ato inexistente.
Refere a sentença a este propósito:
“Nestes termos, considera-se o acto de atribuição do subsídio social de desemprego, emitido no dia 18.12.2007, é inválido em virtude da violação do princípio da não cumulação de rendimentos, pelo que nos termos do artigo 141.º do CPA a Administração podia revogá-lo no prazo de um (1) ano ou, uma vez ultrapassado este prazo, apenas com eficácia para o futuro.
Prosseguindo, mais resulta da factualidade assente nos autos que no dia 11.12.2008 a A. tinha conhecimento da notificação e do sentido da decisão de restituição de prestações indevidamente pagas indevidamente, bem como da decisão de suspensão do acto de pagamento das prestações, pelo que se conclui que este acto é oponível à A. porquanto foi devidamente notificada da decisão de restituição das quantias pagas indevidamente, ainda que a mesma não contenha os fundamentos da decisão por força do artigo 60.º, n.º 2, do CPTA e da suspensão do acto de pagamento (cf. facto provado n.º 5).”
Foi dada como provada a seguinte matéria de facto, com interesse para a presente questão:
10. Em data não apurada, os serviços do Réu elaboraram a seguinte informação (por excertos):
“Coloca-se à consideração superior a proposta de despacho em anexo, a qual, atenta a questão em análise, bem como os objetivos de agilização e simplificação desta Equipa, contém fundamentação que se afigura adequada e suficiente.
Note-se porém que com base nos elementos de que dispomos não nos é possível aferir da tempestividade do recurso hierárquico interposto, pois não é possível determinar com segurança (face à antiguidade dos factos, ocorridos em 2008) em que data foi efetivamente recebida a nota de reposição aqui impugnada. Por outro lado, o registo de entrada do recurso também não se mostra totalmente percetível, embora o Centro Distrital indique a data de 12.03.2009.
Note-se ainda que não existe comprovativo nos autos da efetiva receção da decisão de “suspensão" do subsídio social de desemprego subsequente indevidamente recebido pela interessada (uma vez que a comunicação seguiu, presume-se, por correio simples), sendo que a interessada não admite ter conhecimento da mesma; do processo administrativo também não consta cópia do despacho que, à data, reconheceu o pagamento indevido e determinou a revogação do ato de atribuição, com as legais e devidas consequências, existindo apenas uma informação, manuscrita, com data de 01.07.2013.
Finalmente, note-se que o recurso foi interposto no início de 2009 e só foi enviado, para análise, a este Gabinete em 21.10.2013, procedimento que urge corrigir, atento o lapso de tempo entretanto decorrido” (cf. fls. 30 do PA);
Daqui decorre que a própria recorrida reconhece que do procedimento administrativo não consta cópia do despacho que revogou o ato de atribuição de subsídio.
Daqui decorre que não se encontra comprovada a prática do ato, e se assim é tal ato é inexistente, e como tal não pode ser revogado, precisamente por não existir.
A este propósito veja o sumário constante do Ac. proferido no STA, datado de 19.11.1996-Rec.nº 39 410, no âmbito do anterior CPA, que é o aplicável ao caso dos autos:
1.º- É ato juridicamente inexistente o que foi notificado ao interessado, mas não se praticou.
2.º- Tendo o Vice-Presidente da Junta Autónoma das Estradas comunicado ao recorrente, através de ofício, que a sua pretensão fora indeferida por despacho exarado em certa informação dos serviços, mas não tendo sido proferido qualquer despacho, verifica-se a inexistência jurídica de tal ato, cuja a aparência foi criada pela notificação.
E, consta do sumário do Ac. do STA., proferido em 5.11.1998 – Rec nº 40 652, o seguinte:
1- È inexistente o ato gerador de uma conduta legalmente inexistente se pretende os mesmos efeitos práticos dum verdadeiro ato administrativo.
2- A inexistência do ato administrativo não determina a rejeição do recurso por carência de objeto, mas impõe ao tribunal a sua declaração oficiosa.”
Pelo exposto, entendemos que o ato administrativo revogatório é inexistente o que deve ser reconhecido por sentença.
2.º- O ato que ordenou a reposição dos montantes indevidamente percebidos é ou não um ato de execução do ato que revogou o ato de atribuição de subsídio de desemprego parcial.
Os atos de execução são aqueles que se destinam a pôr em prática a determinação contida no ato a executar.
Afigura-se-nos, assim que o ato que notificou a A. para repor os montantes indevidamente percebidos, não constitui um ato implícito de revogação do ato anterior, mas um mero ato de execução, consequente do pretenso ato de revogação, do ato anterior, que concedeu o subsidio de desemprego parcial, que como já referimos é inexistente, ou pelo menos é nulo por carecer em absoluto de forma legal ( cfr. art. 133.º nº2 al.f) CPA».

Subscrevemos a análise efetuada.
É certo que nos termos do artigo 18.º do DL n.º 220/2006, de 03/11, que estabelece o quadro legal de reparação da eventualidade de desemprego dos trabalhadores por conta de outrem, inserido no subsistema previdencial da Segurança Social, o reconhecimento do direito às prestações de desemprego depende da caracterização da relação laboral, da situação de desemprego e da verificação de prazos de garantia, e o reconhecimento do direito ao subsídio social de desemprego depende ainda do preenchimento da condição de recursos e do termo da concessão do subsídio de desemprego, quando lhe for subsequente.
Não se olvida que fora dos casos de atribuição do subsídio de desemprego parcial que a lei prevê, a prestação de desemprego não é cumulável com rendimentos provenientes do exercício da atividade profissional (artigos 54.º n.º 1 alínea a) do Decreto-Lei n.º 220/2006, de 3 de novembro), pelo que, a prestação social de desemprego, tendo na sua base a ausência involuntária das retribuições resultantes de emprego, não permite que se possa acumular a mesma com retribuição do trabalho.
É consabido que o subsídio social de desemprego é uma prestação incorporada no subsistema de solidariedade, exigindo-se para o seu deferimento, a apresentação dos meios de prova específicos das condições que justificam a sua atribuição no prazo de 90 dias consecutivos a contar da data da cessação do subsídio de desemprego (cfr. artigo 78.º n.º 1 do DL n.º 220/2006).
Não se ignora igualmente que nos termos do n.º 4 do artigo 24.º do mesmo diploma legal, “Nas situações em que o beneficiário esteja a receber subsídio de desemprego parcial e o contrato de trabalho a tempo parcial cesse após o termo do período de concessão daquele subsídio sem que tenha sido adquirido novo direito a prestações de desemprego, mantém-se o acesso ao subsídio social de desemprego subsequente desde que se encontre preenchida a condição de recursos”.
Porém, independentemente de poder afirmar-se que a Apelante, ao continuar a exercer atividade profissional, ainda que a tempo parcial, findo o subsídio de desemprego parcial, não tinha direito a receber as prestações do subsídio social de desemprego subsequente, e de eventualmente se estar perante uma situação de pagamento indevido de tais prestações, a verdade é que, para ser exigível à Apelante a restituição dos montantes assim percebidos, impunha-se à Apelada que tivesse observado o procedimento legalmente previsto, revogando o ato de atribuição do subsídio social de desemprego, para o que devia não só ter notificado a Autora da intenção de proferir uma tal decisão, indicando as razões de facto e de direito que lhe impunham determinar a revogação do ato de atribuição desse subsídio, como o dever de proferir decisão final expressa, devidamente fundamentada, de revogação do ato de atribuição do subsídio social de desemprego, o que não fez.

Sendo assim, a notificação da autora para restituir o montante que recebeu a título de prestação social de desemprego a partir de dezembro de 2007, não tem suporte legal.
Para que uma tal decisão fosse vinculativa, a mesma teria de traduzir-se num ato consequente de uma (prévia) resolução administrativa de revogação da atribuição do subsídio social de desemprego, não bastando para determinar a Apelante à restituição dos montantes em causa que se conclua pela ilegalidade da decisão de atribuição do subsídio em causa.
Resulta do disposto no artigo 5º do DL nº 133/88, que a restituição direta dos montantes devidos à Segurança Social, não opera de forma automática.
No caso, reafirma-se, é incontornável que a Autora apenas foi notificada da nota de restituição (vide ponto 3 do elenco dos factos provados), sem que tivesse sido notificada da intenção da Apelada de revogar a decisão administrativa de deferimento da concessão do subsídio social de desemprego, para exercer, querendo o direito de audiência prévia, não tendo, sequer sido proferida nenhuma decisão final de revogação desse ato inicial, sequer da prolação de uma qualquer decisão de suspensão, pelo que, não pode ter-se a nota de restituição como o ato final desse procedimento.
Assim sendo, impõe-se julgar procedentes todos os invocados fundamentos de recurso e, consequentemente, revogar a sentença recorrida e, em substituição, julgar procedente a ação.
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IV- DECISÃO

Nesta conformidade, os Juízes Desembargadores do Tribunal Central Administrativo do Norte, acordam em conferência
, em conceder provimento ao recurso, e em consequência:
(i) revogam a decisão recorrida e,
(ii) em substituição, julgam a ação totalmente procedente, anulando-se o ato impugnado consubstanciado na decisão de 16/09/2014 do Vice-Presidente do Conselho Diretivo, que determinou a Autora a repor a quantia de € 4.107,16 ( quatro mil cento e sete euros e dezasseis cêntimos).
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Custas pelo apelado ( Art.º 527.º, n.ºs 1 e 2 do CPC)
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Notifique
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Porto, 27 de maio de 2022

Helena Ribeiro
Nuno Coutinho
Paulo Ferreira de Magalhães, em substituição