Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00004/20.7BCPRT
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:11/27/2020
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Helena Canelas
Descritores:ARBITRAGEM VOLUNTÁRIA – HONORÁRIOS
Sumário:I – A tarefa de decidir um litígio, a que um árbitro ou colégio de árbitros é chamado, por efeitos de convenção de arbitragem, será naturalmente remunerada, através de honorários e reembolso de despesas, que serão suportadas por aqueles que, sendo partes no litígio, o submeteram à arbitragem (cfr. artigos 1º e 17º da LAV).

II - Nos termos do disposto no nº 3 do artigo 17º da LAV (Lei nº 63/2011) qualquer das partes pode requerer ao tribunal estadual competente a redução dos montantes dos honorários ou das despesas e respetivos preparos fixados pelos árbitros, podendo esse tribunal fixar os montantes que considere adequados.

III – Em tal caso deve atender-se, designadamente, aos critérios referidos no nº 2 do artigo 17º da LAV (Lei nº 63/2011), isto é, à complexidade das questões decididas, ao valor da causa e ao tempo despendido ou a despender com o processo arbitral até à conclusão deste.*
* Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:MUNICÍPIO DE (...)
Recorrido 1:A., SA
Votação:Maioria
Meio Processual:Outros despachos
Decisão:INDEFERIR O PEDIDO
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:N/A
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:

I. RELATÓRIO
O MUNICÍPIO DE (...) veio, por referência à arbitragem voluntária constituída para dirimir o litígio, que identifica, entre si e a A., S.A., pessoa coletiva n.º (…), com sede na Rua (…), concessionária no “Contrato de Concessão da Exploração e Gestão dos Sistemas de Abastecimento de Água para Consumo Público e de Recolha, Tratamento e Rejeição de Efluentes do Concelho de (...)” – cujo respetivo tribunal arbitral foi integrado pelos árbitros (1) Professora Doutora R., na qualidade de presidente, designada pelo Exmo. Sr. Presidente do Tribunal Central Administrativo Norte (Proc. n.º 22/19.8BCPRT), e com domicílio profissional na Faculdade de Direito da Universidade Católica Portuguesa (Escola do Porto), (…), Porto, (2) Professor Doutor L., com domicílio profissional na Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, (…), designado pela concessionária A., S.A., e (3) pelo Professor Doutor J., com domicílio profissional na Av. (…), designado pelo MUNICÍPIO DE (...) – requerer junto deste Tribunal Central Administrativo Norte por requerimento de 13/07/2020 (fls. 1 SITAF) a redução dos montantes de honorários e encargos de arbitragem, ao abrigo das disposições conjugadas dos artigos 17º nº 3, 59º nº 1 alínea d) e nº 2 da Lei de Arbitragem voluntária (Lei nº 63/2011, de 14 de dezembro), nos termos seguintes:
«(…)requer-se a redução dos custos de arbitragem fixados pelo Tribunal Arbitral, considerando-se, para efeitos do Regulamento Arbitral e do Regulamento CACCIP (incluindo a Tabela n.º 1 anexa a este regulamento), um valor de arbitragem de €5.684.539,45 [correspondente à soma de €3.350.000,00 (pedido principal da Concessionária) com €2.334.539,45 (pedido reconvencional)], ou, caso assim se não se entenda, o que não se concede e apenas se admite como mera hipótese de raciocínio, um valor da arbitragem de €57.551.146,40 [correspondente à soma de €55.216.607,00 (pedido de maior valor formulado pela Concessionária – primeira parte do artigo 297.º, n.º 3, do CPC) com €2.334.539,45 (pedido reconvencional)].»
Suporta o requerido nas alegações que expõe ao longo do seu requerimento, reconduzindo as mesmas às seguintes conclusões, que ali enuncia nos seguintes termos:
a) O Tribunal por despacho de 30-06-2020, fixou os custos da arbitragem num total de €326.918,86, repartidos da seguinte forma: (i) Honorários: €297.902,58; (ii) Encargos: €29.016,28;
b) Para tanto, o Tribunal, invocando o artigo 17.º, n.º 2, da LAV, considerou i) o valor da causa, ii) a complexidade das questões, iii) o volume de trabalho e iv) a qualificação profissional dos árbitros – pontos 11, 12 e 15 do despacho de 30-06-2020;
c) A questão que se põe prende-se, no essencial, com o valor da causa que foi considerado pelo Tribunal: €60.901.146,45;
d) Valor esse que corresponde ao somatório dos pedidos (principal e subsidiário) formulados pela Concessionária [€3.350.000,00 do pedido principal e €55.216.607,00 do pedido subsidiário] e do pedido reconvencional deduzido pelo Município (€2.334.539,45), ao qual o Tribunal chegou por aplicação do disposto na cláusula 9.º, n.º 5, do Regulamento Arbitral, e no artigo 49.º, n.º 1, do Regulamento CACCIP (aplicável ex vi cláusula 7.ª daquele primeiro regulamento), tendo expressamente afastado a aplicação do CPC, em particular, o disposto no artigo 297.º, n.º 3;
e) Ora, salvo o devido respeito, a determinação dos encargos da arbitragem – e, a montante disto, o valor da arbitragem – não pode desconsiderar o disposto no CPC;
f) É verdade que os dois Regulamentos (Arbitral e CACCIP, respetivamente, cláusula 9.ª, n.º 5 e artigo 49.º, n.º 1) versam sobre a definição do valor de arbitragem;
g) No essencial, os dois regulamentos dizem exatamente o mesmo: o valor da arbitragem é determinado pelo tribunal, tendo em conta os pedidos formulados pelas partes;
h) Sucede, porém, que nenhum dos citados preceitos esclarece de que forma é que o Tribunal deverá ter em conta os “pedidos formulados pelas partes”, o que se afigura relevante nos casos em que é formulado mais do que um pedido pela mesma parte, como é esse o caso, visto que a Concessionária formula dois pedidos distintos, sendo que, da forma como os mesmos foram apresentados, entre eles existe uma relação de subsidiariedade;
i) Note-se que o Tribunal assume expressamente que o citado preceito do Regulamento Arbitral não indica nenhum critério para determinação do valor da arbitragem;
j) Todavia, o Tribunal já parece ter chegado a conclusão diferente relativamente ao citado artigo 49.º do Regulamento CACCIP, ao dizer que “não é necessário convocar legislação subsidiária (para fazer face a qualquer omissão ou lacuna), já que o Regulamento CACCIP contém disposição expressamente aplicável”;
k) O problema é que o artigo 49.º do CACCIP nada acrescenta relativamente ao disposto no Regulamento Arbitral: também ele não define o critério que deve ser utilizado para fixação do valor da causa e, consequentemente, para determinação dos custos da arbitragem;
l) Ora, não definindo (os ditos regulamentos) nenhum critério, torna-se necessário convocar o CPC, em particular, as disposições constantes dos artigos 297.º e seguintes;
m) Ora, de acordo com o citado preceito (artigo 297.º, n.º 3, do CPC), estando em causa (como estão), pedidos subsidiários (foi assim que a Concessionária os formulou), o valor da arbitragem, no que respeita aos pedidos formulados por aquela, tem de atender ao pedido formulado em primeiro lugar (pedido principal); ou seja, tem de se atender ao valor de €3.350.000,00, correspondente à quantia certa em dinheiro que a Concessionária pretende obter (artigo 297.º, n.º 1, do CPC) e nunca os €58.566.607,00;
n) Aliás e salvo o devido respeito, este último valor não poderia sequer ser considerado mesmo que estivessem em causa pedidos alternativos (que não estão), pois, nesse caso, por força do disposto na primeira parte do artigo 297.º, n.º 3, do CPC, teria de se atender ao pedido de maior valor, ou seja, aos €55.216.607,00 (correspondente ao pedido subsidiário);
o) Note-se, a este respeito, que o pedido subsidiário, da forma como está redigido, ao terminar com o pedido de compensação financeira única de €55.216.607,00, depois de enunciar as suas duas componentes, não pode deixar de ser entendido como o resultado da soma da compensação financeira de €3.350.000,00 (relativa ao período de 2017-2019) com a compensação anual de €3.160.000,00 (a partir de 2020);
p) Não obstante o que se vem de dizer, reconhece-se que, para efeitos da fixação dos custos da arbitragem, não releva apenas os pedidos da Concessionária, relevando também o pedido reconvencional do Município (isto no pressuposto, claro está, de que o mesmo é admitido),
q) De modo que, para estes efeitos, o Tribunal Arbitral, por força do disposto no artigo 297.º, n.º 3, do CPC, deveria ter (e deve ser) considerado um valor da arbitragem de €5.684.539,45, correspondente à soma de €3.350.000,00 (pedido principal da Concessionária) com €2.334.539,45 (pedido reconvencional);
r) Ou, quanto muito, caso se considere que, do lado da Concessionária, estão em causa pedidos alternativos (o que não se concede e apenas se admite como mera hipótese de raciocínio), um valor de €57.551.146,40, correspondente à soma de €55.216.607,00 (pedido de maior valor formulado pela Concessionária – primeira parte do artigo 297.º, n.º 3, do CPC) com €2.334.539,45 (pedido reconvencional).

Com o seu requerimento juntou dez (10) documentos.

Recebido o requerimento e notificados, nos termos do artigo 60º nº 2 da LAV, a contraparte na arbitragem bem como o tribunal arbitral para, no prazo de 10 dias, dizerem o que se lhes oferece sobre o mesmo, tal como determinado no nosso despacho de 15/07/2020 (cfr. fls. 386-394 SITAF), apenas se apresentaram a responder os árbitros (a fls. 397 SITAF), dizendo que o Tribunal Arbitral já teve ocasião de decidir a matéria do valor da arbitragem (cf. Despacho do Tribunal Arbitral de 30.06.2020, pontos 4 a 9, junto como Doc. n.º 10 pelo Município ao seu requerimento) e de a destrinçar da matéria, autónoma e distinta, da fixação do montante de encargos e honorários (cf. pontos 10 a 18 do referido Despacho do Tribunal Arbitral), não tendo nada a acrescentar ao que, enquanto Tribunal Arbitral, oportunamente, decidiram e que mantêm, reafirmando apenas que o montante de honorários e encargos resultante da decisão ali tomada realiza a necessária adequação entre a complexidade das questões decididas e a decidir, o valor da causa e o tempo despendido e a despender com o processo arbitral até à sua conclusão, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 2 e no n.º 3 (in fine) do artigo 17.º da LAV, não pretendendo intervir, de novo, nesta discussão com as partes, para evitarem qualquer tipo de suspeição quanto à sua posição super partes que se lhes impõe e se obrigam a manter.
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Em sede de preparação do processo para decisão, constatou-se que entre os documentos juntos pelo requerente MUNICÍPIO DE (...) com o seu Requerimento Inicial não constavam o Regulamento de Arbitragem anexo à ata de instalação do Tribunal Arbitral, datada de 03/02/2020 (junta sob Doc. nº 5 com o RI, a fls. 220 SITAF), a que a mesma se refere, nem o Regulamento de Arbitragem do Centro de Arbitragem da Câmara de Comércio e Indústria Portuguesa (2014), ali igualmente mencionado, ambos igualmente referidos do despacho de 30/06/2020. Pelo que tendo-se considerado tratarem-se de elementos com relevo para a decisão da questão trazida a este Tribunal Central Administrativo Norte, determinámos ao abrigo do artigo 60º nº 3 da LAV (a fls. 407 SITAF), a notificação ao requerente MUNICÍPIO DE (...) para que remetesse aos presentes autos o (i) Regulamento de Arbitragem anexo à ata de instalação do Tribunal Arbitral, datada de 03/02/2020 bem como o (ii) Regulamento de Arbitragem do Centro de Arbitragem da Câmara de Comércio e Indústria Portuguesa (2014), ali igualmente mencionado.
No seguimento do que o requerente MUNICÍPIO DE (...) veio juntar (a fls. 425 ss. SITAF) três documentos.
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Com dispensa de vistos foram submetidos à Conferência para julgamento.
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II. das questões a decidir
Este Tribunal Central Administrativo Norte é o competente em razão da matéria, da hierarquia e do território para conhecer do presente pedido de redução dos montantes de honorários e encargos de arbitragem – artigos 17º nº 3 e 59º nº 1 alínea d) e nº 2 da Lei de Arbitragem voluntária (Lei nº 63/2011, de 14 de dezembro).
Sendo a questão essencial a decidir a de saber se os honorários e encargos de arbitragem fixados pelo Tribunal Arbitral devem ser reduzidos nos termos requeridos pelo MUNICÍPIO DE (...), de que se passa a apreciar.
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III. FUNDAMENTAÇÃO

A – De facto
Dos elementos documentais juntos resultam, com relevância para a questão a decidir, os seguintes factos essenciais:
1. Entre o MUNICÍPIO DE (...) e a A., S.A. foi celebrado em 30/06/2004 o “Contrato de Concessão da Exploração e Gestão dos Sistemas de Abastecimento de Água para Consumo Público e de Recolha, Tratamento e Rejeição de Efluentes do Concelho de (...)”.
- Doc. nº 1 junto com o RI., a fls. 30 SITAF
2. A cláusula 100.ª daquele Contrato estabelece o seguinte:
CLÁUSULA 100ª
COMISSÃO PARITÁRIA ARBITRAL
1. Sempre que exista qualquer questão, divergência ou conflito acerca da interpretação ou execução do Contrato de Concessão, qualquer uma das Partes pode requerer a constituição de uma comissão paritária arbitral (“Comissão Paritária”), a qual decidirá, em primeira instância, sobre a questão, divergência ou conflito em causa.
2. A Parte que pretenda requerer a constituição da Comissão Paritária notificará, por escrito, a outra Parte da sua intenção, indicando o nome do árbitro por si escolhido e expondo os motivos porque julga assistir-lhe razão no litígio em causa.
3. No prazo de 10 (dez) dias, a outra parte contestará, por escrito, as razões apresentadas pela requerente e nomeará o seu árbitro.
4. Caso não haja contestação ou não seja nomeado árbitro nos termos do número anterior a Comissão Paritária será constituída, unicamente, pelo árbitro designado pela Parte requerente.
5. No prazo de 10 (dez) dias após o termo do prazo referido no número 3., os dois árbitros nomeados notificarão o IRAR, que indicará o presidente da Comissão Paritária.
6. A Comissão Paritária, após ter sido constituída, decidirá, no prazo máximo de 15 (quinze) dias, com base no requerimento referido no número 2. e na contestação referida no número 3.
7. A Comissão Paritária, sem prejuízo do prazo acima referido, poderá apreciar quaisquer outros elementos e proceder às diligências que entender serem úteis ou convenientes para a boa resolução do litígio.
8. A decisão da Comissão Paritária, caso não seja constituída unicamente pelo primeiro árbitro nomeado, será tomada por maioria de votos, admitindo-se o voto de vencido, com o registo da respectiva declaração e prevalecendo, em caso de empate, o voto do Presidente; a decisão será comunicada às Partes por escrito.
9. A decisão da Comissão Paritária é de aplicação imediata, excepto no que respeita ao disposto na Cláusula 93ª do presente Contrato.
10. Sem prejuízo do disposto no número anterior qualquer uma das Partes pode recorrer da decisão da Comissão Paritária, caso não concorde com o respectivo conteúdo, para o tribunal indicado na Cláusula 101ª.
11. Cada uma das Partes suportará os honorários, caso os haja, do árbitro por si nomeado, sendo os honorários do árbitro presidente repartidos, em partes iguais, por ambas as Partes.
12. Em tudo o não previsto na presente Cláusula aplicar-se-á o disposto na lei processual civil relativamente à arbitragem voluntária.
- Doc. nº 1 junto com o RI., a fls. 30 SITAF

3. Na sequência de pedido feito, nesse sentido, pela sociedade concessionária A., S.A., foi em 03/02/2020 constituído o Tribunal Arbitral composto pelos seguintes árbitros: Professora Doutora R., na qualidade de presidente, designada pelo Exmo. Sr. Presidente do Tribunal Central Administrativo Norte (Proc. n.º 22/19.8BCPRT), e com domicílio profissional na Faculdade de Direito da Universidade Católica Portuguesa (Escola do Porto), Rua de Diogo Botelho, 1327, 4169-005, Porto, (2) Professor Doutor L., com domicílio profissional na Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, (…), designado pela concessionária A., S.A., e (3) pelo Professor Doutor J., com domicílio profissional na Av. (…), designado pelo MUNICÍPIO DE (...).
- Docs. nº 2, 3, 4 e 5 juntos com o RI., a fls. 107-220 SITAF
4. Na ata de instalação do Tribunal Arbitral, datada de 03/02/2020 (junta sob Doc. nº 5 com o RI) delimitou-se do seguinte modo o objeto do litígio:
«Nos termos do n.º 1 da Cláusula 100.ª do Contrato de Concessão integram o objeto da presente arbitragem os litígios que deram origem à constituição deste Tribunal Arbitral, em especial as questões levantadas pela Parte que requereu a respetiva constituição, a saber:
a) Se se verifica a fixação pelo Concedente de um tarifário diferente do que resulta da aplicação do Contrato de Concessão;
b) Sendo afirmativa a resposta à questão colocada na alínea anterior, se tal facto constitui fundamento da atribuição à Concessionária do direito à reposição parcial do equilíbrio financeiro, com fundamento na modificação do Tarifário, nos termos previstos na Cláusula 86.º, número 1, alínea h) do Contrato de Concessão;
c) Sendo afirmativa a resposta à questão colocada na alínea anterior, integram ainda o objeto da arbitragem:
i) A determinação dos pressupostos do Caso Base que foram afetados pela alteração do tarifário para o Tarifário Reduzido e a adoção de um “Caso Base” alterado, nos termos da cláusula 86.ª, n.º 12 do Contrato de Concessão,
ii) A determinação da reposição parcial do equilíbrio financeiro da Concessão, nos termos da Cláusula 86.ª do Contrato de Concessão, nomeadamente a fixação do valor da compensação financeira direta a pagar pelo Demandado à Demandante, de acordo com a cláusula 86.ª, n.º 3, alínea c), do Contrato de Concessão, e a respetiva forma de pagamento.»
- Docs. nº 2, 3, 4 e 5 juntos com o RI., a fls. 107-220 SITAF
5. Delimitação que foi modificada na subsequente ata de 18/02/2020 (junta sob Doc. nº 3 com o requerimento de fls. 425 SITAF) na qual o objeto do litígio passou a ser definido do seguinte modo:
«Nos termos do n.º 1 da Cláusula 100.ª do Contrato de Concessão integram o objeto da presente arbitragem os litígios que deram origem à constituição deste Tribunal Arbitral, em especial as questões levantadas pela Parte que requereu a respetiva constituição, delimitando o objeto do diferendo nos seguintes termos:
“1. Não aplicação do Tarifário aprovado pela Câmara Municipal de Paços de Ferreira
em reunião em 20.03.2017 (“Tarifário Reduzido”)

Deverá a Comissão Paritária decidir

a) Se o Tarifário Reduzido foi aprovado no âmbito do processo de reposição do equilíbrio económico financeiro da Concessão e após intensas negociações, tendo o Município e a Concessionária alcançado um acordo;
b) Se o Tarifário Reduzido viola o Contrato de Concessão;
c) Se a imposição de vigência do Tarifário Reduzido constitui abuso de direito;
d) Se a Concessionária tem o direito de (i) não aplicar o Tarifário Reduzido, e de (ii) aplicar o Tarifário em vigor antes do aprovado em 20.03.2017;
e) E ainda, se a Concessionária tem o direito à compensação financeira pelo período em que aplicar o Tarifário Reduzido, fazendo-se para tal período o pedido de que a Comissão Paritária decida relativamente ao mesmo como solicitado nos pontos 2 e 3 infra.

Subsidiariamente, caso assim não se entenda
2) Constituição do direito à reposição parcial do equilíbrio financeiro da Concessão

Deverá a Comissão Paritária decidir:
a) Se se verifica a fixação pelo Concedente de um tarifário diferente do que resulta da aplicação do Contrato de Concessão;
b) E em caso afirmativo, se tal facto constitui fundamento da atribuição à Concessionária do direito à reposição parcial do equilíbrio financeiro, com fundamento na modificação do Tarifário, nos termos previstos na Cláusula 86ª do Contrato de Concessão, na alínea h) do seu n.º 1.

3) Modo de efectivação do reequilíbrio parcial da Concessão

Caso à Concessionária seja reconhecido o direito à reposição parcial do equilíbrio financeiro da Concessão, deverá a Comissão Paritária:

a) Determinar quais os pressupostos do Caso Base que foram afectados pela alteração do tarifário (para o Tarifário Reduzido), adoptando um “Caso Base” alterado, nos termos do número 12 da Cláusula 86ª do Contrato;
b) Determinar a reposição parcial do equilíbrio financeiro da Concessão, nos termos da Cláusula 86ª do Contrato de Concessão, nomeadamente fixar o valor da compensação financeira direta a pagar pelo Concedente à Concessionária (Cláusula 86ª, n.º 3, alínea c), do Contrato de Concessão) e a respectiva forma de pagamento.»
- Doc. de fls. 489 SITAF
6. Na ata de instalação do Tribunal Arbitral, datada de 03/02/2020 (junta sob Doc. nº 5 com o RI) estabeleceu-se o seguinte quanto às regras da arbitragem:
«O Tribunal reger-se-á pelas regras constantes do Regulamento em anexo, assim, como, nos casos omissos, pelo Regulamento de Arbitragem do Centro de Arbitragem da Câmara de Comércio e Indústria Portuguesa (2014) e pela Lei de Arbitragem Voluntária (Lei n.º 63/2011, de 14 de dezembro – LAV).»
- Doc. nº 5 junto com o RI., a fls. 220 SITAF
7. O que foi mantido na subsequente ata de 18/02/2020 (junta sob Doc. nº 3 com o requerimento de fls. 425 SITAF).
- Doc. de fls. 480 SITAF
8. O Regulamento de Arbitragem anexo à ata de instalação do Tribunal Arbitral, é o que foi junto com o requerimento de fls. 425 SITAF, sob Doc. nº 3.
- Doc. de fls. 480 SITAF
9. E o Regulamento de Arbitragem do Centro de Arbitragem da Câmara de Comércio e Indústria Portuguesa (2014) é o que foi junto com o requerimento de fls. 425 SITAF, sob Doc. nº 2.
- Doc. de fls. 442 SITAF
10. Datado de 30/06/2020 foi proferido pelo coletivo dos árbitros o seguinte despacho (junto sob Doc. nº 10 com o RI), cujo teor integral é o seguinte:
«Despacho sobre o requerimento relativo ao valor da causa
A) Objeto

Finda a fase dos articulados, é chegado o tempo de solicitar às Partes o pagamento de um montante adicional de Honorários e Encargos, nos termos do disposto na alínea b) do n.º 9 da Cláusula 17.ª do Regulamento, o que supõe também a fixação do valor da causa, nos termos do n.º 5 da Cláusula 9.ª do mesmo Regulamento, o que, atendendo à provisoriedade da posição das Partes (habilitadas que foram a apresentar articulados aperfeiçoados), foi também feito apenas provisoriamente e pelo montante de 58.566.607,00€.

B) Antecedentes

Vem requerido pelo Demandado e pela Demandante (que o secundou) a revisão do valor provisório da causa pelo Tribunal, pelo que, simultaneamente com a decisão que sempre caberia ao Tribunal tomar a esse respeito, se irão apreciar os requerimentos oferecidos pelas Partes, decidindo a questão que estes suscitam.

C) Requerimentos das Partes

1. A 2 de março, o Demandado apresentou requerimento contestando o valor do litígio fixado a título provisório, sustentando que tal valor se deveria reconduzir ao valor do pedido principal da Demandante, ao abrigo do disposto no n.º 3 do artigo 297.º do Código de Processo Civil (“CPC”).
Na fundamentação jurídica da sua pretensão, o Demandado invoca o seguinte:
(a) a inexistência de norma no Regulamento do Tribunal, no Regulamento subsidiariamente aplicável e na Lei de Arbitragem Voluntária (LAV) a estabelecer o(s) critério(s) sobre como calcular o valor da causa (n.ºs 5 e 12 do requerimento);
(b) perante tal ausência, e apesar da querela sobre a aplicação subsidiária do CPC às arbitragens voluntárias, sustenta que «deverá aplicar-se o critério objetivo consagrado no artigo 297.º, n.º 3, daquele código, nos termos do qual “no caso de pedidos alternativos, atende-se unicamente ao pedido de maior valor e, no caso de pedidos subsidiários, ao pedido formulado em primeiro lugar”» (n.º 12, parte final, do requerimento);
(c) tal aplicação conduzirá a que o valor da causa seja “€3.350.000,00, correspondente ao pedido formulado em primeiro lugar (pedido principal) e não os €58.566.607,00, correspondente ao pedido subsidiário.” (n.º 13 do requerimento).

Conclui o Demandado que deveria, então, o Tribunal ter aplicado subsidiariamente o n.º 3 do artigo 297.º do CPC, não só porque tal é consentido pelo disposto no n.º 3 do artigo 30.º da LAV, mas também porque não está em causa a aplicação integral da lei processual civil, mas apenas aquela concreta disposição, isto por se estar na presença de uma lacuna que reclamaria integração por aquele modo (n.ºs 15 e 16 do requerimento).
Além disso, sustenta o Demandado que o Tribunal se deveria inspirar na solução do CPC, que cristalizaria um critério objetivo, racional e proporcional (nº 21 do requerimento).
Ilustra o requerente a sua posição com a hipótese de, no limite, o pedido principal ser procedente e a fixação do valor da causa, como a que foi provisoriamente feita, conduzir a custos da arbitragem superiores ao ganho de causa (n.ºs 22 e ss. do requerimento).

2. A Demandante aderiu ao requerimento do Demandado, invocando “regra processual de que o valor da causa corresponde ao valor do pedido deduzido a título principal, e que este, no caso dos autos, corresponde a 3.350.000 € e atendendo aos efeitos consequentes de tal fixação em termos de custos”.

D) Apreciação do requerido

3. Os requerimentos das Partes confluem na interseção de dois temas cuja relação não é necessária nem obrigatória: (i) o valor da causa e (ii) o montante de Honorários Encargos. Dito de outro modo, o valor da arbitragem vem questionado não per se, mas
sim pelos efeitos e consequências que a sua fixação tem, nos termos do Regulamento adotado, na fixação referidos Honorários e Encargos.
Ora, o Tribunal entende que, apesar de ser aceitável e compreensível a argumentação expendida pelo Demandado (e a que Demandante aderiu), se trata de temas objetivamente distintos e cuja decisão convoca critérios e normas que não se confundem e importa manterem-se autónomos, em cumprimento da Lei, dos Regulamentos aplicáveis e, em última análise, em benefício da presente arbitragem.
Com efeito, a aplicação do critério e da tabela prevista no Regulamento de Arbitragem do Centro de Arbitragem da Câmara de Comércio e Indústria Portuguesa (2014) –Regulamento CACCIP para a fixação dos Honorários e Encargos da arbitragem constituiu uma opção do Tribunal que só se justifica e compreende em função dos dados (mesmo que provisórios) de que se dispunha à data para a fixação do valor da arbitragem; se o valor fosse diferente (inferior e/ou superior) tal opção teria necessariamente que ser revista à luz desses diferentes dados, tomando opção distinta ou até majorando/minorando o resultado de tal opção.
Esclarecido que se trata de questões distintas e apenas incidentalmente relacionadas, cumpre decidir o que vem suscitado ao Tribunal.

D.1) Do valor da causa

4. O regulamento do Tribunal prevê, no n.º 5 da cláusula 9.ª, que lhe cabe “definir o valor da arbitragem, tendo em conta o valor correspondente aos pedidos formulados pelas partes”, não indicando qualquer critério (destacado nosso).
Nos termos do disposto na cláusula 7.ª do mesmo regulamento, os casos omissos serão resolvidos “pelo Regulamento de Arbitragem do Centro de Arbitragem da Câmara de Comércio e Indústria Portuguesa (2014) – Regulamento CACCIP – e pela Lei de Arbitragem Voluntária (Lei n.º 63/2011, de 14 de dezembro – LAV)” (aplicáveis com as devidas adaptações), não se impondo ou prevendo a aplicação, subsidiária ou mesmo pontual, do CPC.
De todo o modo, para a resolução da questão que vem suscitada não é necessário convocar legislação subsidiária (para fazer face a qualquer omissão ou lacuna), já que o
Regulamento CACCIP contém disposição expressamente aplicável. Na verdade, o n.º 1 do artigo 49.º do Regulamento CACCIP regula a fixação do valor do litígio, estabelecendo que “compete ao tribunal arbitral, ouvidas as partes, definir o valor da arbitragem, tendo em conta o valor correspondente aos pedidos formulados pelas partes e eventuais pedidos de providências cautelares e ordens preliminares.” (destacado nosso).

5. Na petição inicial a Demandante apresenta dois pedidos, estabelecendo entre eles uma relação de subsidiariedade:
(a) o pedido principal: ser reconhecido o direito à reposição parcial do equilíbrio financeiro pelo período de vigência do tarifário reduzido e ser-lhe atribuída uma compensação financeira de € 3.350.000,00 em 2019, relativo ao período de 2017-2019;
(b) o pedido subsidiário: pagamento de “uma compensação financeira de € 3.350.000,00 em 2019 necessário para repor o equilíbrio relativamente ao período de 2017 a 2019 e uma compensação anual de € 3.160.000,00 a partir de 2020 até ao final da concessão para os anos futuros, compensação financeira única que consagra todos estes fluxos atualizados para 2019, de €55.216.607,00, caso improceda o pedido principal.” A compensação financeira única refere-se apenas ao lapso temporal a partir de 2020, devendo somar-se-lhe a quantia de 3 350 000,00€, atendendo à preposição “e” que une a primeira com a segunda parte do designado pedido subsidiário, perfazendo o valor global de € 58 566 607,00.

6. Sucede, por isso, que, no pedido subsidiário, a Demandante inclui o valor do pedido principal e, por outro lado, o pedido principal envolve, a ser procedente, utilidade idêntica à da procedência do pedido subsidiário: se este for procedente a Demandante obterá o mesmo resultado que lhe adviria da denominada “compensação financeira única” através do pagamento da compensação cumulada com a perceção, ao longo da concessão, dos montantes que resultassem da aplicação do tarifário que entende ser aplicável (em vez do reduzido). Se não proceder o pedido primeiramente formulado, a utilidade económica a retirar, caso proceda integralmente o segundo, é exatamente o mesmo porque, recorde-se, a própria demandante o formulou em duas partes: uma, correspondente ao dito pedido principal a que acresce a segunda parte, já supra explicitada. Esta circunstância demonstra à saciedade que ambos os pedidos evidenciam idêntica utilidade económica para a Demandante, critério primeiro a ponderar na fixação do valor da causa.

7. Acresce que, ao abrigo das disposições regulamentares ditadas para concretizar o princípio do contraditório, veio o Demandado utilizar a possibilidade de deduzir reconvenção, a que atribuiu o valor de 2 334 539,45€, montante a que acresceriam, nos termos do disposto no n.º 353 da contestação aperfeiçoada junta a 5 de março, “os custos associados à execução das referidas obras, designadamente, de elaboração de projetos e pavimentações, cuja liquidação, por não se conseguir quantificar neste momento, se relega para execução de sentença”.
Pela mera aplicação dos mesmos princípios de obtenção de imediata utilidade económica o valor da causa deve contemplar o valor já identificado do pedido reconvencional e, bem assim, quando e se for possível ao Tribunal liquidá-lo, o valor que o Demandado relega para execução de sentença.

8. Assim, entende o Tribunal não ser de aplicar, nem a título de mera inspiração, o n.º 3 do artigo 297.º do CPC. O legislador, ao elaborar tal regra, teve naturalmente em mente que o pedido subsidiário seria menor ou diferente do pedido principal (ainda que em conexão, naturalmente), assim se percebendo a relação de subsidiariedade e se surpreendendo a ratio legis. Ora, no presente litígio, o pedido subsidiário compreende e engloba o valor do pedido principal, pelo que poderia eventualmente ter sido formulado como pedido alternativo. Caso então que até haveria cobertura, nos termos da primeira parte do n.º 3 do artigo 297.º do CPC, para fixar o valor da arbitragem pelo pedido de maior valor.
Entretanto, sobreveio um pedido reconvencional que, por simplicidade, se adicionado singelamente ao valor provisório (e desconsiderando, para já, o valor da parte do pedido que o Demandado relega para execução de sentença), conduz a um valor global de 60 901 146,45 €.

9. Tendo em conta a fundamentação e apreciação que antecede, o Tribunal
(i) indefere o requerimento do Demandado de 02.03.2020 e o requerimento da Demandante de 02.03.2020, no que respeita à fixação do valor da causa;
(ii) fixa como valor da causa 60.901.146,45 € (sessenta milhões, novecentos e um mil, cento e quarenta e seis euros e quarenta e cinco cêntimos), sem prejuízo do que resultar da procedência ou improcedência do pedido reconvencional, para os devidos efeitos.

D.2) Da fixação montante de Honorários e Encargos
10. Muito embora tenha ficado claro que parte dos argumentos aduzidos pelo Demandado para sustentar a redução do valor da causa sejam meramente incidentais e, portanto, não possam nem devam ser considerados na decisão de fundo que o Tribunal terá de tomar nesta sede, reitera o Tribunal, apenas para que fique absolutamente claro, que a fixação dos custos da arbitragem e, muito concretamente, dos honorários dos Árbitros, foi objeto de cuidadosa ponderação em face da Lei e dos Regulamentos aplicáveis.

11. O n.º 2 do artigo 17.º da LAV estabelece que “caso a matéria não haja sido regulada na convenção de arbitragem, nem sobre ela haja sido concluído um acordo entre as partes e os árbitros, cabe aos árbitros, tendo em conta a complexidade das questões decididas, o valor da causa e o tempo despendido ou a despender com o processo arbitral até à conclusão deste, fixar o montante dos seus honorários e despesas”.
Assim, são vários os fatores previstos na lei para o apuramento do valor dos honorários dos árbitros: (i) complexidade das questões; (ii) valor da causa; (iii) tempo despendido ou a despender.
Não é caso, agora, de fazer uma incursão dogmática sobre a natureza da relação estabelecida entre árbitros e partes, importando tão só sublinhar, como José Miguel Júdice faz, que “os árbitros, também muito legitimamente, querem garantir uma adequada remuneração para o seu trabalho”. E o seu trabalho, que se relaciona igualmente com as suas qualificações profissionais, muito depende da complexidade das questões e do tempo a despender para as decidir com qualidade. Contudo, tais circunstâncias, como tão bem sublinha o mesmo A., são de difícil concretização ab initio pelos árbitros: “Muitas vezes ou até como regra, é difícil ou mesmo impossível aos árbitros saber, quando são convidados quais os valores em presença, e ainda mais preverem qual a complexidade do caso e o tempo que lhe terão de dedicar, e qual vai ser o comportamento dos advogados”. Daí que, na ausência de convenção entre as partes sobre os honorários dos árbitros, a lei preveja, entre outros, o critério do valor da arbitragem que pode, em certas circunstâncias tornar a fixação de honorários “automática”.

12. O valor dos pedidos formulados pelas Partes, que o Tribunal erigiu como variável determinante da fixação do montante de Honorários e Encargos, não o foi (como não o é, em geral) apenas pela sua objetividade, uma vez que nele se revelam ou indiciam fatores determinantes para a fixação daquele montante: a complexidade das questões a decidir e, consequentemente, o volume de trabalho que o mesmo implica e a responsabilidade associada ao encargo assumido pelos Árbitros.
O Tribunal, a este tempo, não sabe se a decisão do litígio passará pela apreciação e decisão do pedido subsidiário formulado pela Demandante. Sobre o pedido de compensação relativo ao período de 2017 a 2019 parece que sempre se terá de debruçar, seja no âmbito da decisão do primeiro pedido, seja porque tenha que apreciar o pedido subsidiário.
Neste contexto, a hipótese académica sugerida pelo Demandado (os custos da arbitragem puderem ser superiores ao ganho de causa) pode ser também desenhada no sentido da desproporcionalidade de ser pedida e obtida, a final, uma decisão sobre um valor substancialmente distinto daquele fixado inicialmente. A esse respeito, é já evidente o volume de trabalho que tem sido e será necessário, assim como é apodítica a complexidade das questões suscitadas nos articulados e a responsabilidade que a sua decisão implica para o Tribunal.
Com efeito, o critério da fixação do valor provisório da causa já considerava – como
agora se mantém – a desde logo evidente complexidade do litígio, que decorria já da extensão dos articulados iniciais e documentos juntos pela Demandante (cerca de quase 3000 pp de documentos), bem como da natureza das questões jurídicas que os mesmos indiciavam. Complexidade essa que se reforça pela solicitação de realização de (dupla) prova pericial e é sublinhada, em termos formais, pela tramitação entretanto ocorrida e que, breviter, se sintetiza:
(a) junção de peças aperfeiçoadas, com significativa alteração da respetiva extensão dos articulados;
(b) junção de documentos;
(c) respostas, longas, às peças aperfeiçoadas juntas;
(d) junção de mais documentos;
(e) junção de documentos após despacho de 22 de abril a determinar a continuidade do processo;
(f) resposta do Demandado à resposta da Demandante e junção de mais documentos;
(g) dedução de contestação ao pedido reconvencional;
(h) dedução de exceções.
O volume de peças, documentos e a complexidade de prova requerida sustentam ainda a complexidade das questões substantivas colocadas para decisão:
(i) pedidos formulados pela Demandante sobre “reposição parcial do equilíbrio financeiro pelo período de vigência do tarifário reduzido”, questão jurídica de elevada complexidade ou
(ii) reposição do “equilíbrio relativamente ao período de 2017 a 2019 e uma compensação anual de 3.160.000,00 € a partir de 2020 até ao final da concessão para os anos futuros, compensação financeira única que consagra todos estes fluxos atualizados para 2019, de € 55.216.607,00”,
a que acresce a dedução de exceções relativas à
(iii) à incompetência do Tribunal;
(iv) nulidade do contrato;
(v) divergência entre o caderno de encargos e o Contrato;
(vi) aceitação do tarifário;
(vii) caducidade do direito de ação;
(viii) preterição do procedimento contratual relativo à reposição do equilíbrio económico-financeiro do Contrato;
(ix) do incumprimento do contrato e o pedido reconvencional no sentido de ver reconhecido o incumprimento do contrato, o direito à resolução do mesmo e a concessão de uma indemnização no valor de 2.334.539,45 €.

13. Concomitantemente, esta complexidade formal e sobretudo material adensa o número de horas de trabalho dos árbitros, três profissionais altamente qualificados, dois deles livremente escolhidos pelas Partes. Por outro lado, esta complexidade também traduz e reforça o entendimento de que o valor económico dos pedidos não se resume já ao “pedido principal” formulado pela Demandante.

14. O próprio Demandado reconhece, diversas vezes e de forma expressa, na sua
contestação e contestação aperfeiçoada
- a complexidade do processo; também salientada no requerimento de 4 de maio (n.ºs 24 e 26);
- que a utilidade económica requerida pela Demandante não se circunscreve ao “designado pedido principal”: n.ºs 112 (“peticiona que lhe seja reconhecido o direito à reposição parcial do equilíbrio financeiro, numa dupla vertente: a) Pelo período de vigência do tarifário reduzido, mediante atribuição de uma compensação financeira de €3.350.000,00, em 2019, necessário para repor o equilíbrio relativamente ao período de 2017 a 2019; b) Pagamento à Concessionária de uma compensação financeira de €3.350.000,00 em 2019 necessário para repor o equilíbrio relativamente ao período de 2017 a 2019 e uma compensação anual de €3.160.000,00 a partir de 2020 até ao final da concessão para os anos futuros, compensação financeira única que consagra todos estes fluxos para 2019, de €55.216.607”), repete a nº. 122, n.º 265, n.º 268 (dizendo que são feitos dois pedidos distintos).

15. Em síntese, o Tribunal reitera que a fixação dos custos da arbitragem considerou
especificamente
(i) o alcance do maior beneficio que, em abstrato, é possível obter, ou seja, o valor do pedido subsidiário formulado pela Demandante, porque existe a hipótese de o Tribunal ter de se debruçar sobre este pedido, sendo que o mesmo abrange o valor do pedido principal,
(ii) a complexidade e valor económico inerente aos pedidos da Demandante, a que se soma a dedução de pedido reconvencional pelo Demandado,
(iii) o volume do trabalho decorrente da complexidade técnica e jurídica das questões sub iudice, e
(iv) a qualificação profissional dos árbitros.

16. O Tribunal entende que tais fatores são, no presente momento, adequadamente refletidos através do automatismo adotado para a fixação dos Honorários (i.e., aplicação da Tabela n.º 1 do Regulamento CACCIP), considerando o valor da causa fixado, sem prejuízo de poder (i) em resultado da alteração do valor da causa, determinar outro modo (não automático) de fixação daqueles Honorários ou (ii) vir a determinar, de modo fundamentado, a majoração dos mesmos nos termos legal e regulamentarmente previstos.

17. Por outro lado e no que tange ao montante dos Encargos, o Tribunal entendeu, num momento inicial, que os mesmos poderiam ser moderados face ao montante que resultaria do simples automatismo resultante da aplicação da Tabela n.º 2 do Regulamento CACCIP (cf. n.º 2 da Cláusula 17.ª do Regulamento de Arbitragem), tendo decidido reduzir substancialmente esse valor [para 55% (cinquenta e cinco por cento)].
No entanto, a complexidade que o processo tem evidenciado – nomeadamente em resultado da extensa prova documental que tem vindo a ser carreada em momentos sucessivos e sujeita, também, a verificações contínuas – e continuará, com grande grau de probabilidade, a revelar, exigem que o Tribunal reveja, com mesmo cuidado e proporcionalidade com que antecipou aquela redução inicial, o montante dos Encargos do processo.
Com efeito, a dificuldade acrescida resulta, além da complexidade do processo já bem evidenciada, do facto de os elementos probatórios não terem sido sempre oferecidos com as respetivas peças processuais e dos sucessivos aperfeiçoamentos a que as peças foram sujeitas. Do anteriormente exposto decorre a evidente e acrescida complexidade da condução processual o que implica necessariamente um apoio significativo das Exmas. Senhoras Secretárias ao Tribunal e que se consubstancia, nomeadamente na alocação de várias horas de trabalho na reunião e organização dos meios de prova de que atualmente se dispõe, bem como daqueles que ainda não dispõe na globalidade, em virtude de irregularidades detetadas nos documentos que visavam saná-las. Assim, entende o Tribunal que os Encargos do processo, muito embora se devam continuar a calcular por referência ao valor da arbitragem, devem ser objeto de majoração, de modo a passarem a corresponder a 80% (oitenta por cento) do valor resultante da aplicação da Tabela n.º 2 do Regulamento CACCIP, elevação que, embora inteiramente justificada, corresponde ainda ao limiar mínimo previsto no n.º 2 do artigo 52.º do referido Regulamento.

Com a sobredita fundamentação e ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 52.º do Regulamento CACCIP, o Tribunal determina que os Encargos da presente arbitragem se fixam em 80% (oitenta por cento) do valor resultante da aplicação da Tabela n.º 2 do referido Regulamento.

18. Considerando o valor da causa fixado no presente Despacho (60.901.146,45€) e a majoração determinada quanto aos Encargos, os custos da arbitragem computam-se nos seguintes montantes:
(i) Honorários: 297.902,58 €;
(ii) Encargos: 29 016,28 €;

Devem, em consequência, os pedidos de pagamento dirigidos às Partes considerar os sobreditos montantes, nomeadamente para efeitos de correção do valor dos preparos iniciais e de fixação dos que sejam doravante devidos.

Notifiquem-se as Partes do presente Despacho.
***
Procedam as Exmas. Senhoras Secretárias do Tribunal ao cálculo dos montantes devidos pelas Partes nos termos da alínea b) do n.º 9 da Cláusula 17.ª do Regulamento e à consequente solicitação do pagamento às Partes.»
*
B – De direito

1. O MUNICÍPIO DE (...) veio, por referência à arbitragem voluntária constituída para dirimir o litígio, que identifica, entre si e a A., S.A., pessoa coletiva n.º (…), com sede na Rua (…), concessionária no “Contrato de Concessão da Exploração e Gestão dos Sistemas de Abastecimento de Água para Consumo Público e de Recolha, Tratamento e Rejeição de Efluentes do Concelho de (...)” – cujo respetivo tribunal arbitral foi integrado pelos árbitros (1) Professora Doutora R., na qualidade de presidente, designada pelo Exmo. Sr. Presidente do Tribunal Central Administrativo Norte (Proc. n.º 22/19.8BCPRT), e com domicílio profissional na Faculdade de Direito da Universidade Católica Portuguesa (…), (2) Professor Doutor L., com domicílio profissional na Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, (…), designado pela concessionária A., S.A., e (3) pelo Professor Doutor J., com domicílio profissional na Av. (…), designado pelo MUNICÍPIO DE (...) – requerer junto deste Tribunal Central Administrativo Norte por requerimento de 13/07/2020 (fls. 1 SITAF) a redução dos montantes de honorários e encargos de arbitragem, ao abrigo das disposições conjugadas dos artigos 17º nº 3, 59º nº 1 alínea d) e nº 2 da Lei de Arbitragem Voluntária (Lei nº 63/2011, de 14 de dezembro).
Dispõe o artigo 17º da LAV (Lei de Arbitragem voluntária - Lei nº 63/2011, de 14 de dezembro), o seguinte a respeito dos honorários e despesas dos árbitros:
“Artigo 17.º
Honorários e despesas dos árbitros

1 - Se as partes não tiverem regulado tal matéria na convenção de arbitragem, os honorários dos árbitros, o modo de reembolso das suas despesas e a forma de pagamento pelas partes de preparos por conta desses honorários e despesas devem ser objeto de acordo escrito entre as partes e os árbitros, concluído antes da aceitação do último dos árbitros a ser designado.
2 - Caso a matéria não haja sido regulada na convenção de arbitragem, nem sobre ela haja sido concluído um acordo entre as partes e os árbitros, cabe aos árbitros, tendo em conta a complexidade das questões decididas, o valor da causa e o tempo despendido ou a despender com o processo arbitral até à conclusão deste, fixar o montante dos seus honorários e despesas, bem como determinar o pagamento pelas partes de preparos por conta daqueles, mediante uma ou várias decisões separadas das que se pronunciem sobre questões processuais ou sobre o fundo da causa.
3 - No caso previsto no número anterior do presente artigo, qualquer das partes pode requerer ao tribunal estadual competente a redução dos montantes dos honorários ou das despesas e respetivos preparos fixados pelos árbitros, podendo esse tribunal, depois de ouvir sobre a matéria os membros do tribunal arbitral, fixar os montantes que considere adequados.
4 - No caso de falta de pagamento de preparos para honorários e despesas que hajam sido previamente acordados ou fixados pelo tribunal arbitral ou estadual, os árbitros podem suspender ou dar por concluído o processo arbitral, após ter decorrido um prazo adicional razoável que concedam para o efeito à parte ou partes faltosas, sem prejuízo do disposto no número seguinte do presente artigo.
5 - Se, dentro do prazo fixado de acordo com o número anterior, alguma das partes não tiver pago o seu preparo, os árbitros, antes de decidirem suspender ou pôr termo ao processo arbitral, comunicam-no às demais partes para que estas possam, se o desejarem, suprir a falta de pagamento daquele preparo no prazo que lhes for fixado para o efeito.”

2. Este Tribunal Central Administrativo Norte é o competente em razão da matéria, da hierarquia e do território para conhecer do presente pedido de redução dos montantes de honorários e encargos de arbitragem – cfr. artigos 17º nº 3 e 59º nº 1 alínea d) e nº 2 da Lei de Arbitragem voluntária (Lei nº 63/2011, de 14 de dezembro).
Sendo a questão essencial a decidir a de saber se os honorários e encargos de arbitragem fixados pelo Tribunal Arbitral devem ser reduzidos nos termos requeridos pelo MUNICÍPIO DE (...).
3. O pedido de redução dos custos de arbitragem foi formulado pelo requerente MUNICÍPIO DE (...) nos termos seguintes:
«(…)requer-se a redução dos custos de arbitragem fixados pelo Tribunal Arbitral, considerando-se, para efeitos do Regulamento Arbitral e do Regulamento CACCIP (incluindo a Tabela n.º 1 anexa a este regulamento), um valor de arbitragem de €5.684.539,45 [correspondente à soma de €3.350.000,00 (pedido principal da Concessionária) com €2.334.539,45 (pedido reconvencional)], ou, caso assim se não se entenda, o que não se concede e apenas se admite como mera hipótese de raciocínio, um valor da arbitragem de €57.551.146,40 [correspondente à soma de €55.216.607,00 (pedido de maior valor formulado pela Concessionária – primeira parte do artigo 297.º, n.º 3, do CPC) com €2.334.539,45 (pedido reconvencional)].»
Suportando o requerido nas alegações que expôs no seu requerimento e que reconduziu às que ali verteu, que no essencial, se suportam no seguinte: que o Tribunal Arbitral por despacho de 30-06-2020, fixou os custos da arbitragem num total de €326.918,86, repartidos da seguinte forma: (i) Honorários: €297.902,58; (ii) Encargos: €29.016,28, invocando o artigo 17.º, n.º 2, da LAV, considerou i) o valor da causa, ii) a complexidade das questões, iii) o volume de trabalho e iv) a qualificação profissional dos árbitros – pontos 11, 12 e 15 do despacho de 30-06-2020; que a questão prende-se, no essencial, com o valor da causa que foi considerado pelo Tribunal: €60.901.146,45, valor esse que corresponde ao somatório dos pedidos (principal e subsidiário) formulados pela Concessionária [€3.350.000,00 do pedido principal e €55.216.607,00 do pedido subsidiário] e do pedido reconvencional deduzido pelo Município (€2.334.539,45), ao qual o Tribunal chegou por aplicação do disposto na cláusula 9.º, n.º 5, do Regulamento Arbitral, e no artigo 49.º, n.º 1, do Regulamento CACCIP (aplicável ex vi cláusula 7.ª daquele primeiro regulamento), tendo expressamente afastado a aplicação do CPC, em particular, o disposto no artigo 297.º, n.º 3; que a determinação dos encargos da arbitragem – e, a montante disto, o valor da arbitragem – não pode desconsiderar o disposto no CPC; que se é verdade que os dois Regulamentos (Arbitral e CACCIP, respetivamente, cláusula 9.ª, n.º 5 e artigo 49.º, n.º 1) versam sobre a definição do valor de arbitragem, no essencial, os dois regulamentos dizem exatamente o mesmo: o valor da arbitragem é determinado pelo tribunal, tendo em conta os pedidos formulados pelas partes; que sucede, porém, que nenhum dos citados preceitos esclarece de que forma é que o Tribunal deverá ter em conta os “pedidos formulados pelas partes”, o que se afigura relevante nos casos em que é formulado mais do que um pedido pela mesma parte, como é esse o caso, visto que a Concessionária formula dois pedidos distintos, sendo que, da forma como os mesmos foram apresentados, entre eles existe uma relação de subsidiariedade; que o Tribunal Arbitral assume expressamente que o citado preceito do Regulamento Arbitral não indica nenhum critério para determinação do valor da arbitragem, mas que todavia já parece ter chegado a conclusão diferente relativamente ao citado artigo 49.º do Regulamento CACCIP, ao dizer que “não é necessário convocar legislação subsidiária (para fazer face a qualquer omissão ou lacuna), já que o Regulamento CACCIP contém disposição expressamente aplicável”; que o problema é que o artigo 49.º do CACCIP nada acrescenta relativamente ao disposto no Regulamento Arbitral: também ele não define o critério que deve ser utilizado para fixação do valor da causa e, consequentemente, para determinação dos custos da arbitragem; que não definindo (os ditos regulamentos) nenhum critério, torna-se necessário convocar o CPC, em particular, as disposições constantes dos artigos 297.º e seguintes; que de acordo com o artigo 297.º, n.º 3, do CPC, estando em causa pedidos subsidiários o valor da arbitragem, no que respeita aos pedidos formulados por aquela, tem de atender ao pedido formulado em primeiro lugar (pedido principal); ou seja, tem de se atender ao valor de €3.350.000,00, correspondente à quantia certa em dinheiro que a Concessionária pretende obter (artigo 297.º, n.º 1, do CPC) e nunca os €58.566.607,00; que este último valor não poderia sequer ser considerado mesmo que estivessem em causa pedidos alternativos pois, nesse caso, por força do disposto na primeira parte do artigo 297.º, n.º 3, do CPC, teria de se atender ao pedido de maior valor, ou seja, aos €55.216.607,00 (correspondente ao pedido subsidiário); que o pedido subsidiário, da forma como está redigido, ao terminar com o pedido de compensação financeira única de €55.216.607,00, depois de enunciar as suas duas componentes, não pode deixar de ser entendido como o resultado da soma da compensação financeira de €3.350.000,00 (relativa ao período de 2017-2019) com a compensação anual de €3.160.000,00 (a partir de 2020); que reconhecendo que, para efeitos da fixação dos custos da arbitragem, não releva apenas os pedidos da Concessionária, relevando também o pedido reconvencional do Município, para estes efeitos, o Tribunal Arbitral, por força do disposto no artigo 297.º, n.º 3, do CPC, deveria ter (e deve ser) considerado um valor da arbitragem de €5.684.539,45, correspondente à soma de €3.350.000,00 (pedido principal da Concessionária) com €2.334.539,45 (pedido reconvencional), ou, quanto muito, caso se considere que, do lado da Concessionária, estão em causa pedidos alternativos (o que não se concede e apenas se admite como mera hipótese de raciocínio), um valor de €57.551.146,40, correspondente à soma de €55.216.607,00 (pedido de maior valor formulado pela Concessionária – primeira parte do artigo 297.º, n.º 3, do CPC) com €2.334.539,45 (pedido reconvencional).
4. Na origem do pedido assim formulado pelo requerente está o despacho datado de 30/06/2020 (junto sob Doc. nº 10 com o RI), que foi proferido pelo coletivo dos árbitros.
Esse despacho tem o seguinte teor integral, que aqui se reproduz, para melhor elucidação das questões:
«Despacho sobre o requerimento relativo ao valor da causa
A) Objeto

Finda a fase dos articulados, é chegado o tempo de solicitar às Partes o pagamento de um montante adicional de Honorários e Encargos, nos termos do disposto na alínea b) do n.º 9 da Cláusula 17.ª do Regulamento, o que supõe também a fixação do valor da causa, nos termos do n.º 5 da Cláusula 9.ª do mesmo Regulamento, o que, atendendo à provisoriedade da posição das Partes (habilitadas que foram a apresentar articulados aperfeiçoados), foi também feito apenas provisoriamente e pelo montante de 58.566.607,00€.

B) Antecedentes

Vem requerido pelo Demandado e pela Demandante (que o secundou) a revisão do valor provisório da causa pelo Tribunal, pelo que, simultaneamente com a decisão que sempre caberia ao Tribunal tomar a esse respeito, se irão apreciar os requerimentos oferecidos pelas Partes, decidindo a questão que estes suscitam.

C) Requerimentos das Partes

1. A 2 de março, o Demandado apresentou requerimento contestando o valor do litígio fixado a título provisório, sustentando que tal valor se deveria reconduzir ao valor do pedido principal da Demandante, ao abrigo do disposto no n.º 3 do artigo 297.º do Código de Processo Civil (“CPC”).
Na fundamentação jurídica da sua pretensão, o Demandado invoca o seguinte:
(a) a inexistência de norma no Regulamento do Tribunal, no Regulamento subsidiariamente aplicável e na Lei de Arbitragem Voluntária (LAV) a estabelecer o(s) critério(s) sobre como calcular o valor da causa (n.ºs 5 e 12 do requerimento);
(b) perante tal ausência, e apesar da querela sobre a aplicação subsidiária do CPC às arbitragens voluntárias, sustenta que «deverá aplicar-se o critério objetivo consagrado no artigo 297.º, n.º 3, daquele código, nos termos do qual “no caso de pedidos alternativos, atende-se unicamente ao pedido de maior valor e, no caso de pedidos subsidiários, ao pedido formulado em primeiro lugar”» (n.º 12, parte final, do requerimento);
(c) tal aplicação conduzirá a que o valor da causa seja “€3.350.000,00, correspondente ao pedido formulado em primeiro lugar (pedido principal) e não os €58.566.607,00, correspondente ao pedido subsidiário.” (n.º 13 do requerimento).

Conclui o Demandado que deveria, então, o Tribunal ter aplicado subsidiariamente o n.º 3 do artigo 297.º do CPC, não só porque tal é consentido pelo disposto no n.º 3 do artigo 30.º da LAV, mas também porque não está em causa a aplicação integral da lei processual civil, mas apenas aquela concreta disposição, isto por se estar na presença de uma lacuna que reclamaria integração por aquele modo (n.ºs 15 e 16 do requerimento).
Além disso, sustenta o Demandado que o Tribunal se deveria inspirar na solução do CPC, que cristalizaria um critério objetivo, racional e proporcional (nº 21 do requerimento).
Ilustra o requerente a sua posição com a hipótese de, no limite, o pedido principal ser procedente e a fixação do valor da causa, como a que foi provisoriamente feita, conduzir a custos da arbitragem superiores ao ganho de causa (n.ºs 22 e ss. do requerimento).

2. A Demandante aderiu ao requerimento do Demandado, invocando “regra processual de que o valor da causa corresponde ao valor do pedido deduzido a título principal, e que este, no caso dos autos, corresponde a 3.350.000 € e atendendo aos efeitos consequentes de tal fixação em termos de custos”.

D) Apreciação do requerido

3. Os requerimentos das Partes confluem na interseção de dois temas cuja relação não é necessária nem obrigatória: (i) o valor da causa e (ii) o montante de Honorários Encargos. Dito de outro modo, o valor da arbitragem vem questionado não per se, mas
sim pelos efeitos e consequências que a sua fixação tem, nos termos do Regulamento adotado, na fixação referidos Honorários e Encargos.
Ora, o Tribunal entende que, apesar de ser aceitável e compreensível a argumentação expendida pelo Demandado (e a que Demandante aderiu), se trata de temas objetivamente distintos e cuja decisão convoca critérios e normas que não se confundem e importa manterem-se autónomos, em cumprimento da Lei, dos Regulamentos aplicáveis e, em última análise, em benefício da presente arbitragem.
Com efeito, a aplicação do critério e da tabela prevista no Regulamento de Arbitragem do Centro de Arbitragem da Câmara de Comércio e Indústria Portuguesa (2014) –Regulamento CACCIP para a fixação dos Honorários e Encargos da arbitragem constituiu uma opção do Tribunal que só se justifica e compreende em função dos dados (mesmo que provisórios) de que se dispunha à data para a fixação do valor da arbitragem; se o valor fosse diferente (inferior e/ou superior) tal opção teria necessariamente que ser revista à luz desses diferentes dados, tomando opção distinta ou até majorando/minorando o resultado de tal opção.
Esclarecido que se trata de questões distintas e apenas incidentalmente relacionadas, cumpre decidir o que vem suscitado ao Tribunal.

D.1) Do valor da causa

4. O regulamento do Tribunal prevê, no n.º 5 da cláusula 9.ª, que lhe cabe “definir o valor da arbitragem, tendo em conta o valor correspondente aos pedidos formulados pelas partes”, não indicando qualquer critério (destacado nosso).
Nos termos do disposto na cláusula 7.ª do mesmo regulamento, os casos omissos serão resolvidos “pelo Regulamento de Arbitragem do Centro de Arbitragem da Câmara de Comércio e Indústria Portuguesa (2014) – Regulamento CACCIP – e pela Lei de Arbitragem Voluntária (Lei n.º 63/2011, de 14 de dezembro – LAV)” (aplicáveis com as devidas adaptações), não se impondo ou prevendo a aplicação, subsidiária ou mesmo pontual, do CPC.
De todo o modo, para a resolução da questão que vem suscitada não é necessário convocar legislação subsidiária (para fazer face a qualquer omissão ou lacuna), já que o
Regulamento CACCIP contém disposição expressamente aplicável. Na verdade, o n.º 1 do artigo 49.º do Regulamento CACCIP regula a fixação do valor do litígio, estabelecendo que “compete ao tribunal arbitral, ouvidas as partes, definir o valor da arbitragem, tendo em conta o valor correspondente aos pedidos formulados pelas partes e eventuais pedidos de providências cautelares e ordens preliminares.” (destacado nosso).

5. Na petição inicial a Demandante apresenta dois pedidos, estabelecendo entre eles uma relação de subsidiariedade:
(a) o pedido principal: ser reconhecido o direito à reposição parcial do equilíbrio financeiro pelo período de vigência do tarifário reduzido e ser-lhe atribuída uma compensação financeira de € 3.350.000,00 em 2019, relativo ao período de 2017-2019;
(b) o pedido subsidiário: pagamento de “uma compensação financeira de € 3.350.000,00 em 2019 necessário para repor o equilíbrio relativamente ao período de 2017 a 2019 e uma compensação anual de € 3.160.000,00 a partir de 2020 até ao final da concessão para os anos futuros, compensação financeira única que consagra todos estes fluxos atualizados para 2019, de €55.216.607,00, caso improceda o pedido principal.” A compensação financeira única refere-se apenas ao lapso temporal a partir de 2020, devendo somar-se-lhe a quantia de 3 350 000,00€, atendendo à preposição “e” que une a primeira com a segunda parte do designado pedido subsidiário, perfazendo o valor global de € 58 566 607,00.

6. Sucede, por isso, que, no pedido subsidiário, a Demandante inclui o valor do pedido principal e, por outro lado, o pedido principal envolve, a ser procedente, utilidade idêntica à da procedência do pedido subsidiário: se este for procedente a Demandante obterá o mesmo resultado que lhe adviria da denominada “compensação financeira única” através do pagamento da compensação cumulada com a perceção, ao longo da concessão, dos montantes que resultassem da aplicação do tarifário que entende ser aplicável (em vez do reduzido). Se não proceder o pedido primeiramente formulado, a utilidade económica a retirar, caso proceda integralmente o segundo, é exatamente o mesmo porque, recorde-se, a própria demandante o formulou em duas partes: uma, correspondente ao dito pedido principal a que acresce a segunda parte, já supra explicitada. Esta circunstância demonstra à saciedade que ambos os pedidos evidenciam idêntica utilidade económica para a Demandante, critério primeiro a ponderar na fixação do valor da causa.

7. Acresce que, ao abrigo das disposições regulamentares ditadas para concretizar o princípio do contraditório, veio o Demandado utilizar a possibilidade de deduzir reconvenção, a que atribuiu o valor de 2 334 539,45€, montante a que acresceriam, nos termos do disposto no n.º 353 da contestação aperfeiçoada junta a 5 de março, “os custos associados à execução das referidas obras, designadamente, de elaboração de projetos e pavimentações, cuja liquidação, por não se conseguir quantificar neste momento, se relega para execução de sentença”.
Pela mera aplicação dos mesmos princípios de obtenção de imediata utilidade económica o valor da causa deve contemplar o valor já identificado do pedido reconvencional e, bem assim, quando e se for possível ao Tribunal liquidá-lo, o valor que o Demandado relega para execução de sentença.

8. Assim, entende o Tribunal não ser de aplicar, nem a título de mera inspiração, o n.º 3 do artigo 297.º do CPC. O legislador, ao elaborar tal regra, teve naturalmente em
mente que o pedido subsidiário seria menor ou diferente do pedido principal (ainda que em conexão, naturalmente), assim se percebendo a relação de subsidiariedade e se surpreendendo a ratio legis. Ora, no presente litígio, o pedido subsidiário compreende e engloba o valor do pedido principal, pelo que poderia eventualmente ter sido formulado como pedido alternativo. Caso então que até haveria cobertura, nos termos da primeira parte do n.º 3 do artigo 297.º do CPC, para fixar o valor da arbitragem pelo pedido de maior valor.
Entretanto, sobreveio um pedido reconvencional que, por simplicidade, se adicionado singelamente ao valor provisório (e desconsiderando, para já, o valor da parte do pedido que o Demandado relega para execução de sentença), conduz a um valor global de 60 901 146,45 €.

9. Tendo em conta a fundamentação e apreciação que antecede, o Tribunal
(i) indefere o requerimento do Demandado de 02.03.2020 e o requerimento da Demandante de 02.03.2020, no que respeita à fixação do valor da causa;
(ii) fixa como valor da causa 60.901.146,45 € (sessenta milhões, novecentos e um mil, cento e quarenta e seis euros e quarenta e cinco cêntimos), sem prejuízo do que resultar da procedência ou improcedência do pedido reconvencional, para os devidos efeitos.

D.2) Da fixação montante de Honorários e Encargos
10. Muito embora tenha ficado claro que parte dos argumentos aduzidos pelo Demandado para sustentar a redução do valor da causa sejam meramente incidentais e, portanto, não possam nem devam ser considerados na decisão de fundo que o Tribunal terá de tomar nesta sede, reitera o Tribunal, apenas para que fique absolutamente claro, que a fixação dos custos da arbitragem e, muito concretamente, dos honorários dos Árbitros, foi objeto de cuidadosa ponderação em face da Lei e dos Regulamentos aplicáveis.

11. O n.º 2 do artigo 17.º da LAV estabelece que “caso a matéria não haja sido regulada na convenção de arbitragem, nem sobre ela haja sido concluído um acordo entre as partes e os árbitros, cabe aos árbitros, tendo em conta a complexidade das questões decididas, o valor da causa e o tempo despendido ou a despender com o processo arbitral até à conclusão deste, fixar o montante dos seus honorários e despesas”.
Assim, são vários os fatores previstos na lei para o apuramento do valor dos honorários dos árbitros: (i) complexidade das questões; (ii) valor da causa; (iii) tempo despendido ou a despender.
Não é caso, agora, de fazer uma incursão dogmática sobre a natureza da relação estabelecida entre árbitros e partes, importando tão só sublinhar, como José Miguel Júdice faz, que “os árbitros, também muito legitimamente, querem garantir uma adequada remuneração para o seu trabalho”. E o seu trabalho, que se relaciona igualmente com as suas qualificações profissionais, muito depende da complexidade das questões e do tempo a despender para as decidir com qualidade. Contudo, tais circunstâncias, como tão bem sublinha o mesmo A., são de difícil concretização ab initio pelos árbitros: “Muitas vezes ou até como regra, é difícil ou mesmo impossível aos árbitros saber, quando são convidados quais os valores em presença, e ainda mais preverem qual a complexidade do caso e o tempo que lhe terão de dedicar, e qual vai ser o comportamento dos advogados”. Daí que, na ausência de convenção entre as partes sobre os honorários dos árbitros, a lei preveja, entre outros, o critério do valor da arbitragem que pode, em certas circunstâncias tornar a fixação de honorários “automática”.

12. O valor dos pedidos formulados pelas Partes, que o Tribunal erigiu como variável determinante da fixação do montante de Honorários e Encargos, não o foi (como não o é, em geral) apenas pela sua objetividade, uma vez que nele se revelam ou indiciam fatores determinantes para a fixação daquele montante: a complexidade das questões a decidir e, consequentemente, o volume de trabalho que o mesmo implica e a responsabilidade associada ao encargo assumido pelos Árbitros.
O Tribunal, a este tempo, não sabe se a decisão do litígio passará pela apreciação e decisão do pedido subsidiário formulado pela Demandante. Sobre o pedido de compensação relativo ao período de 2017 a 2019 parece que sempre se terá de debruçar, seja no âmbito da decisão do primeiro pedido, seja porque tenha que apreciar o pedido subsidiário.
Neste contexto, a hipótese académica sugerida pelo Demandado (os custos da arbitragem puderem ser superiores ao ganho de causa) pode ser também desenhada no sentido da desproporcionalidade de ser pedida e obtida, a final, uma decisão sobre um valor substancialmente distinto daquele fixado inicialmente. A esse respeito, é já evidente o volume de trabalho que tem sido e será necessário, assim como é apodítica a complexidade das questões suscitadas nos articulados e a responsabilidade que a sua decisão implica para o Tribunal.
Com efeito, o critério da fixação do valor provisório da causa já considerava – como
agora se mantém – a desde logo evidente complexidade do litígio, que decorria já da extensão dos articulados iniciais e documentos juntos pela Demandante (cerca de quase 3000 pp de documentos), bem como da natureza das questões jurídicas que os mesmos indiciavam. Complexidade essa que se reforça pela solicitação de realização de (dupla) prova pericial e é sublinhada, em termos formais, pela tramitação entretanto ocorrida e que, breviter, se sintetiza:
(a) junção de peças aperfeiçoadas, com significativa alteração da respetiva extensão dos articulados;
(b) junção de documentos;
(c) respostas, longas, às peças aperfeiçoadas juntas;
(d) junção de mais documentos;
(e) junção de documentos após despacho de 22 de abril a determinar a continuidade do processo;
(f) resposta do Demandado à resposta da Demandante e junção de mais documentos;
(g) dedução de contestação ao pedido reconvencional;
(h) dedução de exceções.
O volume de peças, documentos e a complexidade de prova requerida sustentam ainda a complexidade das questões substantivas colocadas para decisão:
(i) pedidos formulados pela Demandante sobre “reposição parcial do equilíbrio financeiro pelo período de vigência do tarifário reduzido”, questão jurídica de elevada complexidade ou
(ii) reposição do “equilíbrio relativamente ao período de 2017 a 2019 e uma compensação anual de 3.160.000,00 € a partir de 2020 até ao final da concessão para os anos futuros, compensação financeira única que consagra todos estes fluxos atualizados para 2019, de € 55.216.607,00”,
a que acresce a dedução de exceções relativas à
(iii) à incompetência do Tribunal;
(iv) nulidade do contrato;
(v) divergência entre o caderno de encargos e o Contrato;
(vi) aceitação do tarifário;
(vii) caducidade do direito de ação;
(viii) preterição do procedimento contratual relativo à reposição do equilíbrio económico-financeiro do Contrato;
(ix) do incumprimento do contrato e o pedido reconvencional no sentido de ver reconhecido o incumprimento do contrato, o direito à resolução do mesmo e a concessão de uma indemnização no valor de 2.334.539,45 €.

13. Concomitantemente, esta complexidade formal e sobretudo material adensa o número de horas de trabalho dos árbitros, três profissionais altamente qualificados, dois deles livremente escolhidos pelas Partes. Por outro lado, esta complexidade também traduz e reforça o entendimento de que o valor económico dos pedidos não se resume já ao “pedido principal” formulado pela Demandante.

14. O próprio Demandado reconhece, diversas vezes e de forma expressa, na sua
contestação e contestação aperfeiçoada
- a complexidade do processo; também salientada no requerimento de 4 de maio (n.ºs 24 e 26);
- que a utilidade económica requerida pela Demandante não se circunscreve ao “designado pedido principal”: n.ºs 112 (“peticiona que lhe seja reconhecido o direito à reposição parcial do equilíbrio financeiro, numa dupla vertente: a) Pelo período de vigência do tarifário reduzido, mediante atribuição de uma compensação financeira de €3.350.000,00, em 2019, necessário para repor o equilíbrio relativamente ao período de 2017 a 2019; b) Pagamento à Concessionária de uma compensação financeira de €3.350.000,00 em 2019 necessário para repor o equilíbrio relativamente ao período de 2017 a 2019 e uma compensação anual de €3.160.000,00 a partir de 2020 até ao final da concessão para os anos futuros, compensação financeira única que consagra todos estes fluxos para 2019, de €55.216.607”), repete a nº. 122, n.º 265, n.º 268 (dizendo que são feitos dois pedidos distintos).

15. Em síntese, o Tribunal reitera que a fixação dos custos da arbitragem considerou especificamente:
(i) o alcance do maior beneficio que, em abstrato, é possível obter, ou seja, o valor do pedido subsidiário formulado pela Demandante, porque existe a hipótese de o Tribunal ter de se debruçar sobre este pedido, sendo que o mesmo abrange o valor do pedido principal,
(ii) a complexidade e valor económico inerente aos pedidos da Demandante, a que se soma a dedução de pedido reconvencional pelo Demandado,
(iii) o volume do trabalho decorrente da complexidade técnica e jurídica das questões sub iudice, e
(iv) a qualificação profissional dos árbitros.

16. O Tribunal entende que tais fatores são, no presente momento, adequadamente refletidos através do automatismo adotado para a fixação dos Honorários (i.e., aplicação da Tabela n.º 1 do Regulamento CACCIP), considerando o valor da causa fixado, sem prejuízo de poder (i) em resultado da alteração do valor da causa, determinar outro modo (não automático) de fixação daqueles Honorários ou (ii) vir a determinar, de modo fundamentado, a majoração dos mesmos nos termos legal e regulamentarmente previstos.

17. Por outro lado e no que tange ao montante dos Encargos, o Tribunal entendeu, num momento inicial, que os mesmos poderiam ser moderados face ao montante que resultaria do simples automatismo resultante da aplicação da Tabela n.º 2 do Regulamento CACCIP (cf. n.º 2 da Cláusula 17.ª do Regulamento de Arbitragem), tendo decidido reduzir substancialmente esse valor [para 55% (cinquenta e cinco por cento)].
No entanto, a complexidade que o processo tem evidenciado – nomeadamente em resultado da extensa prova documental que tem vindo a ser carreada em momentos sucessivos e sujeita, também, a verificações contínuas – e continuará, com grande grau de probabilidade, a revelar, exigem que o Tribunal reveja, com mesmo cuidado e proporcionalidade com que antecipou aquela redução inicial, o montante dos Encargos do processo.
Com efeito, a dificuldade acrescida resulta, além da complexidade do processo já bem evidenciada, do facto de os elementos probatórios não terem sido sempre oferecidos com as respetivas peças processuais e dos sucessivos aperfeiçoamentos a que as peças foram sujeitas. Do anteriormente exposto decorre a evidente e acrescida complexidade da condução processual o que implica necessariamente um apoio significativo das Exmas. Senhoras Secretárias ao Tribunal e que se consubstancia, nomeadamente na alocação de várias horas de trabalho na reunião e organização dos meios de prova de que atualmente se dispõe, bem como daqueles que ainda não dispõe na globalidade, em virtude de irregularidades detetadas nos documentos que visavam saná-las. Assim, entende o Tribunal que os Encargos do processo, muito embora se devam continuar a calcular por referência ao valor da arbitragem, devem ser objeto de majoração, de modo a passarem a corresponder a 80% (oitenta por cento) do valor resultante da aplicação da Tabela n.º 2 do Regulamento CACCIP, elevação que, embora inteiramente justificada, corresponde ainda ao limiar mínimo previsto no n.º 2 do artigo 52.º do referido Regulamento.

Com a sobredita fundamentação e ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 52.º do Regulamento CACCIP, o Tribunal determina que os Encargos da presente arbitragem se fixam em 80% (oitenta por cento) do valor resultante da aplicação da Tabela n.º 2 do referido Regulamento.

18. Considerando o valor da causa fixado no presente Despacho (60.901.146,45€) e a majoração determinada quanto aos Encargos, os custos da arbitragem computam-se nos seguintes montantes:
(i) Honorários: 297.902,58 €;
(ii) Encargos: 29 016,28 €;

Devem, em consequência, os pedidos de pagamento dirigidos às Partes considerar os sobreditos montantes, nomeadamente para efeitos de correção do valor dos preparos iniciais e de fixação dos que sejam doravante devidos.

Notifiquem-se as Partes do presente Despacho.
***
Procedam as Exmas. Senhoras Secretárias do Tribunal ao cálculo dos montantes devidos pelas Partes nos termos da alínea b) do n.º 9 da Cláusula 17.ª do Regulamento e à consequente solicitação do pagamento às Partes.»

5. Ora, importa desde logo explicitar que o que cumpre decidir a este Tribunal Central Administrativo Norte, e é para isso que este detém a respetiva competência, ao abrigo das disposições conjugadas dos artigos 17º nº 3, 59º nº 1 alínea d) e nº 2 da LAV (Lei nº 63/2011), como já referido supra, é se os montantes de honorários e encargos de arbitragem devem ser reduzidos.
Significando que a este Tribunal não cumpre conhecer ou apreciar se o valor da arbitragem (o valor da causa arbitral) que foi fixado pelo Tribunal Arbitral no montante de 60.901.146,45 € (sessenta milhões, novecentos e um mil, cento e quarenta e seis euros e quarenta e cinco cêntimos), o foi correta ou incorretamente, seja à luz e por aplicação das regras contidas no artigo 9º nº 5 do Regulamento Arbitral anexo à ata de instalação do Tribunal Arbitral e no artigo 49º nº 1 do Regulamento de Arbitragem do Centro de Arbitragem da Câmara de Comércio e Indústria Portuguesa (2014), para que remete o ponto 2 da ata de instalação do Tribunal Arbitral ao dispor sobre as regras de arbitragem, como fez o Tribunal Arbitral, seja por aplicação (subsidiária) do preceituado no artigo 297º n.º 3 do Código de Processo Civil, como propugna o requerente MUNICÍPIO.
6. É claro que o valor que foi fixado à causa arbitral tem, no caso, efeitos, ainda que reflexos, no valor dos honorários e encargos da arbitragem. Isto face aos termos em que os mesmos se encontram estabelecidos no artigo 17º do Regulamento da Arbitragem anexo à ata de instalação do Tribunal Arbitral (Doc. de fls. 480 SITAF), que estipula o seguinte:
17ª
(Honorários, encargos administrativos e despesas)
1. As partes são responsáveis pelo pagamento, em montantes iguais, dos honorários e despesas dos árbitros e dos encargos administrativos e despesas com a produção de prova, devendo, quer os honorários dos Árbitros, quer os encargos administrativos do processo, ser acrescidos de IVA, à taxa legal em vigor.
2. Os honorários dos árbitros e os encargos administrativos, e as respetivas provisões, são fixados, e o respetivo pagamento processa-se, de acordo com a Tabela n.º 1 anexa ao Regulamento de Arbitragem do Centro de Arbitragem da Câmara de Comércio e Indústria Portuguesa (Regulamento CACCIP), cabendo 40% desse montante ao Árbitro Presidente e 30% a cada um dos outros dois Árbitros. Do montante devido ao Árbitro Presidente, 10% será liquidado diretamente à Universidade Católica Portuguesa e o remanescente (90%) ao Árbitro Presidente. Os encargos administrativos do processo são calculados por referência ao valor da arbitragem, correspondendo a 55% (cinquenta e cinco por cento) do valor resultante da aplicação da Tabela n.º 2 («Encargos administrativos») anexa ao referido Regulamento de Arbitragem.
3. Se a arbitragem terminar antes da notificação do despacho que designa a data da audiência de julgamento, o Tribunal, ouvidas as partes e considerando a complexidade do trabalho até então realizado, poderá ponderar, consoante as circunstâncias, uma redução dos honorários.
4. Os encargos administrativos abrangem designadamente:
a) O secretariado genérico do processo, incluindo atendimento pessoal, telefónico e expediente de correio e arquivo;
b) Todos os custos administrativos, incluindo telefonemas, correio registado, fotocópias, material e equipamento de gravação.
5. As despesas ocasionadas por deslocações extraordinárias do Tribunal, devidamente documentadas, são suportadas, por igual, por ambas as partes, salvo decisão tomada pelo Tribunal, a pedido justificado da parte interessada.
6. No caso de recurso a prova pericial, cada uma das Partes suporta os encargos correspondentes ao perito que designe, sendo os encargos respeitantes ao perito presidente suportados, por igual, por ambas as partes.
7. Os pagamentos devem ter lugar no prazo de 20 (vinte) dias, contado dos despachos que os solicitem.
8. O acórdão arbitral consigna a distribuição dos custos totais da arbitragem por cada uma das partes, em função de eventuais decaimentos, fazendo-se o acerto entre elas, consoante o decidido.
9. O pagamento dos honorários dos árbitros e dos encargos administrativos do processo será distribuído da seguinte forma:
a) 25% do montante total do valor estimado para a causa, a título de preparos iniciais, aquando da notificação da versão definitiva do regulamento;
b) 25% do montante total do valor da causa, após a fase dos articulados, em valor já corrigido, se for o caso, tendo em conta o montante já cobrado a título de preparos iniciais, nunca podendo ser ultrapassados os 50% do valor da causa definitivamente fixado nesta fase do processo;
c) 50% do montante total do valor da causa, a liquidar do seguinte modo:
i) 25% com a notificação do despacho que designa a data de audiência de julgamento;
ii) 25% com a notificação para a apresentação das alegações.
10. No caso de falta de pagamento de preparos para honorários e despesas devidos aplicar-se-ão as regras da LAV quanto a esta matéria.

Decorrendo, assim, da remissão efetuada no ponto 2. daquele artigo 17º do Regulamento de Arbitragem para as Tabelas n.ºs 1 e 2 anexas ao Regulamento de Arbitragem do Centro de Arbitragem da Câmara de Comércio e Indústria Portuguesa (Regulamento CACCIP 2014) (que o Doc. de fls. 442 SITAF verte), que quer o valor dos honorários dos árbitros, quer o valor dos encargos administrativos da arbitragem, são achados em função das parcelas respetivas por referência ao valor da arbitragem (valor da causa arbitral).
7. Os tribunais arbitrais, em particular aquele que sejam voluntariamente constituídos pelas partes, como é o caso, não são órgãos estaduais, sendo a decisão do litígio cometida a árbitros, os quais não fazem parte da organização do poder político do Estado, correspondendo antes a sua atividade a um verdadeiro exercício privado da função jurisdicional, como se lê no Acórdão n.º 230/13 do Tribunal Constitucional (Processo n.º 279/2013), de 24/04/2013, disponível in, https://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/20130230.html.
A tarefa de decidir um litígio, a que um árbitro ou colégio de árbitros é chamado, por efeitos de convenção de arbitragem, será naturalmente remunerada, através de honorários e reembolso de despesas, que serão suportadas por aqueles que, sendo partes no litígio, o submeteram à arbitragem (cfr. artigos 1º e 17º da LAV).
A questão é saber como, em que termos e porque critérios se deve nortear a fixação dos respetivos honorários e encargos com as despesas.
8. Na situação presente, já se disse, por efeito da remissão efetuada no ponto 2. do artigo 17º do Regulamento de Arbitragem, anexo à ata de instalação do Tribunal Arbitral, para as Tabelas n.ºs 1 e 2 anexas ao Regulamento de Arbitragem do Centro de Arbitragem da Câmara de Comércio e Indústria Portuguesa (Regulamento CACCIP 2014) (que o Doc. de fls. 442 SITAF verte), quer o valor dos honorários dos árbitros, quer o valor dos encargos administrativos da arbitragem, deverão ser achados em função das parcelas respetivas por referência ao valor da arbitragem (valor da causa arbitral).
No que consubstanciará, assim, um critério de fixação de honorários e despesas assente de modo exclusivo, pelo menos tendencialmente, no valor da arbitragem (valor da causa arbitral), o qual compete ao Tribunal Arbitral fixar, e que haverá de expressar o valor económico correspondente aos pedidos formulados pelas partes (cfr. artigo 9º nº 5 do Regulamento de Arbitragem, anexo à ata de instalação do Tribunal Arbitral).
9. Este método, assente no valor da causa, encontra, aliás, paralelo nos termos em que são estabelecidas as taxas de justiça devidas nos Tribunais Estatuais (vejam-se as Tabelas anexas ao Regulamento das Custas Processuais, aprovado pelo DL. nº 34/2008, de 26 de fevereiro).
O Tribunal Constitucional pronunciando-se em matérias referentes à natureza jurídica das custas judiciais e, bem assim, relativas à fixação do seu valor, no contexto do Regulamento das Custas Processuais (RCP), tem admitido, em geral, um critério normativo de fixação do montante da taxa de justiça radicado no valor da causa. Designadamente não mereceram censura as soluções legais de tributação que, mesmo que determinadas em exclusivo por critérios de valor da ação, não conduziram, nos concretos casos ali em apreço, à fixação de taxa de justiça claramente desproporcionada, decididas nos acórdãos do Tribunal Constitucional n.º, 349/2001, nº 151/2009, nº 301/2009 e nº 534/2011, disponíveis in, www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos.
Mas, simultaneamente, o Tribunal Constitucional também tem entendido serem merecedoras de censura constitucional as normas que conduzam a que sempre que o funcionamento do critério da taxa de justiça assente no valor da ação, sem que se preveja um teto máximo ou outros mecanismos moderadores do seu crescimento linear em ações de maior valor, produzam uma manifesta desproporção entre o valor da taxa de justiça e o custo implicado no serviço de justiça. Assim se decidiu, designadamente nos acórdãos do Tribunal Constitucional nº 227/2007, nº 471/2007, nº 116/2008, nº 301/2009, nº 266/2010, nº 421/2013, nº 604/2013, nº 179/2014, nº 844/2014, nº 508/2015, nº 155/2017 e nº 803/2017, disponíveis in, www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos.
Como se lê no acórdão n.º 421/2013 do Tribunal Constitucional, citado no acórdão nº 803/2017 “…o que determinou tais julgamentos, incluindo estas últimas decisões de não inconstitucionalidade, foi a ideia central de que a taxa de justiça assume, como todas as taxas, natureza bilateral ou correspetiva, constituindo contrapartida devida pela utilização do serviço público da justiça por parte do respetivo sujeito passivo. Por isso que, não estando nela implicada a exigência de uma equivalência rigorosa de valor económico entre o custo e o serviço, dispondo o legislador de «uma larga margem de liberdade de conformação em matéria de definição do montante das taxas», é, porém, necessário que «a causa e justificação do tributo possa ainda encontrar-se, materialmente, no serviço recebido pelo utente, pelo que uma desproporção manifesta ou flagrante com o custo do serviço e com a sua utilidade para tal utente afeta claramente uma tal relação sinalagmática que a taxa pressupõe”.
10. E atualmente, fazendo jus a tais julgamentos, o nº 7 do artigo 6º do Regulamento das Custas Processuais, aprovado pelo DL. n.º 34/2008, de 26 de fevereiro, aditado pela Lei n.º 7/2012, de 13 de Fevereiro, dispõe que “…nas causas de valor superior a (euro) 275 000, o remanescente da taxa de justiça é considerado na conta a final, salvo se a especificidade da situação o justificar e o juiz de forma fundamentada, atendendo designadamente à complexidade da causa e à conduta processual das partes, dispensar o pagamento”.
11. Na situação presente não se coloca qualquer questão relativa às Tabelas constantes do Regulamento de Arbitragem do Centro de Arbitragem da Câmara de Comércio e Indústria Portuguesa (Regulamento CACCIP 2014), a aplicar no caso por remissão do ponto 2. do artigo 17º do Regulamento de Arbitragem. Sendo certo que elas contêm um teto máximo para os honorários dos árbitros e para as despesas, quando o valor da causa arbitral seja superior a 120.000.000€. E que, por outro lado, na situação presente, o valor da causa arbitral foi fixado em 60.901.146,45 €, situando-se, por conseguinte, a baixo do limiar do patamar máximo daquelas tabelas.
12. Acresce que o Tribunal Arbitral, convocando, aliás o nº 1 do artigo 52º do Regulamento de Arbitragem do Centro de Arbitragem da Câmara de Comércio e Indústria Portuguesa (Regulamento CACCIP 2014), que admite a possibilidade de, considerando as circunstâncias do caso concreto, serem diminuídos até um mínimo 80% do valor dos honorários e encargos a suportar pelas partes que decorreriam da aplicação daquelas tabelas, fixou precisamente, através daquele seu despacho de 30/06/2020, os encargos da presente arbitragem em 80% (oitenta por cento) do valor resultante da aplicação de tal tabela.
Implicando que o valor dos custos da arbitragem se computarão, tal como ali foram calculados, num total de 297.902,58 € de honorários aos árbitros e de 29.016,28 €, de encargos. Cabendo, no que respeita aos honorários dos árbitros, 40% desse montante à senhora árbitra presidente e 30% a cada um dos outros dois árbitros, nos termos do estipulado no ponto 2 do artigo 17º do Regulamento de Arbitragem, supra citado.
12. Sendo que nessa fixação não deixou de atender, como ali foi referido, o alcance do maior beneficio que, em abstrato, é possível obter, a complexidade e valor económico inerente aos pedidos da demandante, e de pedido reconvencional do demandado, o volume do trabalho decorrente da complexidade técnica e jurídica das questões, a qualificação profissional dos árbitros, a complexidade que o processo já tem evidenciado até ao momento, nomeadamente em resultado da extensa prova documental que tem vindo a ser carreada em momentos sucessivos e sujeita, também, a verificações contínuas, e que, com grande grau de probabilidade, continuará a ser.
13. Há também que ter presente que a fixação dos honorários e despesas efetuada pelo despacho de 30/06/2020 do Tribunal Arbitral constitui, face ao momento que no tramite do processo arbitral ele ocorreu, ainda e só, uma definição provisória do seu valor, e teve em vista o pagamento e reforço dos preparos iniciais pagos, a que alude o ponto 9 do artigo 17º do Regulamento de Arbitragem.
14. É certo que nos termos do disposto no nº 3 do artigo 17º da LAV (Lei nº 63/2011) qualquer das partes pode requerer ao tribunal estadual competente a redução dos montantes dos honorários ou das despesas e respetivos preparos fixados pelos árbitros, podendo esse tribunal, fixar os montantes que considere adequados, devendo em tal caso atender, designadamente, aos critérios referidos no nº 2 do mesmo artigo, isto é, à complexidade das questões decididas, ao valor da causa e ao tempo despendido ou a despender com o processo arbitral até à conclusão deste (vide, a título ilustrativo o acórdão do TCA Sul de 03/11/2016, Proc. nº 13225/16.8BCLSB, disponível, in, www.dgsi.pt/jtca).
Mas aqui somos confrontados com uma dupla dificuldade: uma, a de que o requerente MUNICÍPIO não se socorre nem apela a nenhum desses critérios com vista à redução dos honorários e despesas apenas provisoriamente fixados com vista ao reforço dos preparos, suportando-se apenas na invocação de que o valor da causa arbitral deveria ter fixado em quantia inferior; outra, a de que só a final do processo, e com a fixação definitiva dos honorários e despesas, poderá ser aferido, com rigor, do ajuste ou desajuste dos respetivos montantes, face ao que os árbitros do Tribunal Arbitral foram chamados a decidir e apreciar, seja quanto à questões de fundo ou às incidentais, à sua eventual complexidade, aos atos de instrução e prova a que tiveram que proceder, à sua respetiva análise, e por conseguinte, ao tempo que terão justificadamente despendido em todos esses atos e operações, e máxime, na decisão final quanto ao fundo das questões e dos pedidos que lhe foram submetidos.
15. De todo o modo, e não descurando os efeitos da fixação dos honorários e despesas com vista ao reforço dos preparos, não pode deixar de atender-se a que a decisão a ser proferida pelo Tribunal Arbitral envolverá o apelo de quadros normativos e clausulados contratuais tendencialmente densos, complexos e intricados, que os contratos de Concessão da Exploração e Gestão dos Sistemas de Abastecimento de Água para Consumo Público e de Recolha, Tratamento e Rejeição de Efluentes, como é o caso, normal e habitualmente apresentam, e que aliás justificam que os árbitros designados possuam elevadíssima qualificação, e grau de especialização quanto às matérias em apreço, de conhecimento público e notório, bem como aos pedidos formulados pelas partes e correspetivo valor económico e aos termos em que foi delimitado o objeto do litígio (cfr. ata de 18/02/2020, junta sob Doc. nº 3 com o requerimento de fls. 425 SITAF), que abrange questões como as de saber se o «Tarifário Reduzido» foi aprovado no âmbito do processo de reposição do equilíbrio económico financeiro da concessão e após intensas negociações, tendo o MUNICÍPIO e a Concessionária alcançado um acordo; se esse tarifário viola o Contrato de Concessão; se a imposição de vigência do Tarifário Reduzido constitui abuso de direito; se a Concessionária tem o direito de não aplicar o Tarifário Reduzido, e de aplicar o Tarifário anteriormente em vigor; se a Concessionária tem o direito à compensação financeira pelo período em que aplicar o Tarifário Reduzido. Ou ainda, se se verifica a fixação pelo Concedente de um tarifário diferente do que resulta da aplicação do Contrato de Concessão e em caso afirmativo, se tal facto constitui fundamento da atribuição à Concessionária do direito à reposição parcial do equilíbrio financeiro, com fundamento na modificação do Tarifário, nos termos previstos na Cláusula 86ª do Contrato de Concessão, na alínea h) do seu n.º 1; ou ainda se, caso à Concessionária seja reconhecido o direito à reposição parcial do equilíbrio financeiro da Concessão, deverá a Comissão Paritária, que seja de determinar quais os pressupostos do Caso Base que foram afetados pela alteração do tarifário (para o Tarifário Reduzido), adotando um “Caso Base” alterado, nos termos do número 12 da Cláusula 86ª do Contrato e de determinar a reposição parcial do equilíbrio financeiro da Concessão, nos termos da Cláusula 86ª do Contrato de Concessão, nomeadamente fixar o valor da compensação financeira direta a pagar pelo Concedente à Concessionária (Cláusula 86ª, n.º 3, alínea c), do Contrato de Concessão) e a respetiva forma de pagamento.
16. Em face do sobredito, nada aponta, pelo menos neste estádio, no sentido de que os honorários e despesas provisoriamente fixados pelo despacho de 30/06/2020 do Tribunal Arbitral, com vista ao reforço dos preparos, em montante correspondente a 80% do valor resultante da aplicação das tabelas anexas ao Regulamento de Arbitragem, por referência ao valor da causa arbitral fixada em 60.901.146,45€, seja desajustados ou desproporcionais à contrapartida, que consubstancia o recurso ao Tribunal Arbitral para dirimir o litígio que lhe foi submetido.
Pelo que, é de indeferir o presente pedido de redução de honorários e despesas apresentado pelo MUNICÍPIO DE (...). O que se decide.
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IV. DECISÃO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo deste Tribunal em indeferir o presente pedido de redução de honorários e despesas apresentado pelo MUNICÍPIO DE (...).
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Custas pelo requerente – artigo 527º nºs 1 e 2 do CPC novo (aprovado pela Lei nº 41/2013) e artigos 7º e 12º nº 2 do RCP (artigo 8º da Lei nº 7/2012, de 13 de fevereiro)
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Notifique.
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D.N.
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Porto, 27 de novembro de 2020



M. Helena Canelas
Isabel Costa
Rogério Martins (Voto de vencido)
Voto vencido este acórdão pelos seguintes fundamentos:

Ao contrário do que se diz no projecto de acórdão, este Tribunal é competente para apreciar e decidir questão de qual o valor a atribuir à acção para efeitos de fixação dos honorários devidos aos Senhores Árbitros.

Primeiro porque faz parte do objecto do recurso, tal como é delimitado pelas conclusões das alegações de recurso, saber qual o critério para fixar o valor da acção.

Segundo porque é um pressuposto directo e necessário para decidir a questão de determinar os honorários em concreto.

Neste pressuposto - que entendo correcto - é de aplicar ao caso, por uma questão de um mínimo de segurança e certeza jurídica quanto aos honorários a fixar, o disposto no n.º 3 do artigo 297º do Código de Processo Civil. Isto porque as normas constantes dos regulamentos invocados, na sua indeterminação, não permitem extrair um critério objectivo e, portanto, certo e seguro.

E sendo certo que estão em causa dinheiros públicos, do contribuinte, portanto, em concreto os honorários a pagar pelo MUNICÍPIO DE (...).

Ora quanto ao valor da acção, quando há pedidos subsidiários o n.º3 do artigo 297º do Código de Processo Civil não permite dúvidas interpretativas porque é claro e cristalino no seu teor literal:

"No caso de pedidos alternativos, atende-se unicamente ao pedido de maior valor e, no caso de pedidos subsidiários, ao pedido formulado em primeiro lugar. "

Assim apenas há que atender, no somatório dos valores a considerar, incluindo o valor do pedido reconvencional, ao valor do pedido principal, desprezando o valor do pedido subsidiário.

Outra leitura do preceito acima citado não tem o mínimo de suporte no seu teor literal pelo que não é de admitir - n.º 2 do artigo 9º do Código Civil.

Ainda que assim não se entendesse, e pese embora se possa entender que os árbitros não fazem parte da organização dos poderes do estado, "correspondendo antes a sua atividade a um verdadeiro exercício privado da função jurisdicional" não deixam de ser juízes precisamente porque exercem uma função jurisdicional.

O seu estatuto, designadamente para efeitos de atribuição de honorários, não pode pura e simplesmente ser equiparado ao de uma função privada, como a de advogado, por exemplo.

Sobretudo quando estão em causa dinheiros públicos, os honorários a pagar pelas entidades públicas em litígio.

Não pode ser deixada à discricionariedade dos próprios árbitros a fixação dos seus honorários. Compreendendo-se a fixação dos honorários, ainda, nessa função jurisdicional, seria permitir o julgamento em causa própria deixar ao critério dos árbitros fixar os seus honorários. Ainda que dentro de margens fixadas por tabelas legais.

Discricionariedade e julgamento em causa própria que fere, no meu entender, o mais simples bom senso e os basilares princípios de justiça e imparcialidade, com consagração constitucional – artigos 1º, 16º, n.º2 e 20º, n.º4, da Constituição da República Portuguesa, e artigo 10º da Declaração Universal dos Direitos Humanos.

Concederia provimento ao recurso e fixaria o valor dos honorários nos termos pedidos pelo Município recorrente.
Rogério Martins
27-11-2020